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UNIVERSIDADE FEDERAL DO ESPÍRITO SANTO - UFES

FABÍOLA DE ALMEIDA MOREIRA

DESAFIOS PARA O ENSINO DA MÚSICA ATUAL

VITÓRIA, 2012
DESAFIOS PARA O ENSINO DA MÚSICA ATUAL

Para entender o ensino da música atual é preciso uma reflexão crítica da


história da música no Brasil, pois esta história é marcada por um processo lento e
descontínuo. A partir do momento em que a reflexão se torna uma ferramenta
geradora de um processo de conscientização e consequente transformação, é
possível vislumbrar uma nova forma de fazer e ensinar música.
Segundo algumas das literaturas que falam a respeito da história musical
brasileira, os jesuítas foram os pioneiros no ensino da música, no período da
colonização. Mesmo desprovidos de intenção, acabaram implementando uma nova
proposta pedagógica, caracterizada pelo rigor metodológico, para o ensino da época
e para os anos que viriam. Com o objetivo de impor cultura e valores, a música foi
utilizada como ferramenta de ensino.
Vale ressaltar que, nesse contexto, não houve, por parte dos portugueses,
interesse na música que se produzia pelos índios antes da chegada dos
colonizadores. Certamente havia entre os nativos uma expressão artística e musical
rica e enraizada, que foi desconsiderada e desvalorizada pelos homens europeus.
A respeito da desvalorização da música brasileira, a imposição cultural
europeia marcou os anos que viriam, uma vez que, a música que se ouvia e se
ensinava no país era baseada na música europeia. Com a chegada da corte
portuguesa ao Brasil, em 1808, alguns músicos europeus foram trazidos para
produzir “boa” música no país, sobrepondo-se à música nacional.
Em 1854, um decreto regulamentou o ensino da música no país e passou a
orientá-lo, que até então era restrito a poucos. A música passa a fazer parte do
currículo dentre as disciplinas existentes, embora ainda apresentasse aspectos
europeus.
Mais tarde, por volta de 1920, as ideias nacionalistas passaram a influenciar o
cenário nacional, através de Mário de Andrade, que valorizou a música brasileira,
pois defendia a função social da música e a importância do folclore e música
popular, dando importância às culturas regionais. A partir daí, a música brasileira
reflete o aspecto nacionalista e patriota.
Nesse contexto, Villa Lobos surge como um agente importante para o
fortalecimento da identidade nacional na arte. Durante o governo de Getúlio Vargas,
desempenha um papel de democratização da música, através grandes
agrupamentos de corais a serviço da identidade musical brasileira.
Ao final da década de 30, o alemão Koellreutter lidera uma nova maneira de
pensar em ensino na área musical. Seus valores influenciaram grandemente o modo
de ensinar e fazer música da época no Brasil, através de uma postura questionadora
e reflexiva, que valorizava uma visão aberta e integradora do ser e considerava
aspectos econômicos, políticos e sociais, além de uma formação cultural que aborda
antropologia, psicologia, filosofia, física, arte, educação. Koellreutter foi um defensor
do ensino que valoriza a participação ativa, a criação, o debate, a elaboração de
hipóteses, a análise crítica, e o questionamento.
Na década de 60 ampliou-se o interesse de músicos brasileiros pela
educação musical, o que contribuiu para o seu desenvolvimento, influenciados por
pensadores europeus que apresentavam novas propostas no ensino musical
baseadas no incentivo à pratica musical, uso do corpo e a ênfase no
desenvolvimento da percepção auditiva.
A história brasileira fala de momentos de grande evolução, desencadeados
por pensadores importantes, mas também de um retrocesso musical. Não que a
música tivesse inexistido em algum momento da história, mas recua à medida que
deixa de ser uma reflexão do contexto sócio- político.
Na década de 70, a não obrigatoriedade da aula de música, estabelecida pela
lei nº5.692/71, resultou em um retrocesso no ensino da música, uma vez que se
tornou privilégio de poucos. Nas escolas, a disciplina educação musical foi
substituída pela atividade de educação artística.
Os professores de educação artística não eram suficientemente qualificados
para o ensino musical, de tal forma que limitavam-se a reproduzir conteúdos rasos,
sem embasamento teórico e métodos menos reflexivos e mais impositivos,
limitando-se a sequência de atividades prontas. A formação do profissional tem
influência direta na capacidade de ser um agente de reflexão, transformação do
ensino, do método, da técnica.
Ainda hoje, sentem-se os reflexos dessa lei. De acordo com Tourinho, a
música era “vista como uma mera disciplina, a música não é tratada como um tipo
de conhecimento a ser ensinado, estudado, compreendido e recriado.”
Essa visão se perpetua, até para muitos dos profissionais de música.
Repetindo, imitando e repassando o mesmo método. A influência deste ensino
acomodou a música a um programa estático e pronto, com ausência de reflexão e
de interação. O professor preocupa-se mais com os resultados do que com o
processo de aprendizado ignorando a vivência, a inovação e o repensar musical.
No decorrer da história da música brasileira, novos pensadores e métodos
vieram reaparecendo no cenário, recriando um novo ensinar musical. No entanto o
ensino tradicional encontra-se enraizado nas instituições e na prática cotidiana do
ensino, dificultando uma reflexão crítica e, consequentemente, novas manifestações
musicais.
Atualmente, a falta da consciência crítica no processo de ensino-
aprendizagem na área musical tem produzido, alem de outras coisas, uma
defasagem cultural no que diz respeito à valorização do produto nacional, assim
como aconteceu no período colonial. Não é raro encontrarmos professores de
música que valorizam a música industrializada, em detrimento de músicas regionais,
fruto da cultura local, na medida em que introduzem aquela no contexto de
aprendizagem.
Finalmente, concluímos que o pensar musical não é um papel de um agente,
mas sim fruto de discussão de vários agentes sociais.

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