You are on page 1of 10
& crianga, ¢ ‘OM © tempo, o sentido do con ceito amp ara designar toda sobre a educagio. Ao dis deia, os gregos esbogaram Conscientes da agio pedagigica ¢ Auenciaram por séculos a cultura ocidental AAs questdes: o que & melhor ensina é melhor ensinar? ¢ para que c Ceram as reflexdes dos filésolos e marearam diver teoria, s tendéncias, como veremos a s ‘gui: Alias, vale observar que até hoje essas per guntas so fundamentais para a pedagogia. Para compreender melhor essa nova forma de pensar, lembramos que a divisio _classica da filosofia_grega esta centralizada na figura de Sécrates dai a denominagio dada aos wé3 periodos, conforme mostra 0 quadro a seguir. Periodos da filosofia grega “+ Pré-socritico Réculos VIL ¢ VI :G.):_os_pritficiros filésofos surgi: ram nas colénias gregas da Jénia ¢ na Magna Grécia. Ao iniciar 0 pro- cesso de separagio entre a filosofia ¢ © pensamento mitico, ocupavam-se com questdes cosmolégicas sobre os elementos constitutivos de todas as coisas: ( Socritico ou cléssico (séculos V-e IV a:G3}rdesse periodo fazem par- te 0 proprio Sécrates, seu disefpulo Plato ¢ posteriormente o diseipulo deste, Aristétcles; os sofistas ¢ tam- bém Isdcrates so dessa época. (* Pls-socrdtico (Réculos Te Tt a.C}-apés-a torte do imperador Alexandre, teve inicio o helenismo ¢ surgiram as correntes filosdficas do estoicismo e do epicurismo, 68 2. Sofistas: a arte da persuasGo ti va) Gomecemos pelo periodo clissico, que justamente pelo tipo diferente Gio prestes a se formar. Os novos mestres cram os solistas, sabios itinerantes de todas as partes do mundo grego © que entio se encontravam em Atenas, Os m: famosos foram: Protigoras de Abdera (485- -410 a.C.), Gorgias de Ledncio (485-380 a.C.), Hippias de Elis, e outros, como Trasi- maco, Prédico, Hipédamos. A palavra sofista, ctimologicamente, vem de sophas, que significa “sabio”, ou melhor, “professor de sabedoria”. Pejorativamente passou a designar quem emprega sofismas, on seja, quem usa de raciocinio capcioso, de ma-fé, com intengio de enganar. Deve- se essa imagem caricatural as criticas de S6- crates ¢ Plato & atitude intelectual dos so- fistas ¢ ao costume de cobrarem muito bem, por suas aulas. Recentemente essa avalia- ao depreciativa foi atenuada, redimensio- nando-se a importancia da sofistica para a educagio democratica. Enquanto os primeiros filésofos pré- -socraticos se voltavam sobretudo para as questées sobre a natureza (physis), 0s sofis- “las procederam a passagem para a reflexio propriamente antropoldgica, centrada nas discussdes sobre moral ¢ politica. Foram também responsdveis por elaborar teorica- mente € legitimar 0 ideal democratic da classe em ascensfio, a dos comerciantes en~ riquecidos. Na nova ordem politica da cidade, as virtudes louvadas nao tinham como mode- Jo o aristocrata bem-nascido, “de origem divina”, que se destacava pela coragem na guerra. Diferentemente, a virtude do cida- dio da polis € civica ¢ nos inte! de educi na sua capacida- de de discutir e deliberar nas assembleias. Por isso os sofistas fascinavam a juventude com o brilhantismo de sua retérica e se pro- punham a ensinar a arte da persuasio, do Historia da Educacao e da Pedagogia — Geral e Brasil ia bem to, do discurso, que s¢ yencimen ove on 1 plibliea (dora), sede 0 ori apm emblcia democrilica, , Lae vento, os sofistas foram os criado- *gncagio intelectual, que se tornow ao fisiew © dit mue ante da edu fo predominantes nos ginisios. seg, amphanany a nox de fie Ages elacagi da eviangay extend enti forage do adulto, capa we repensar por si mesmo a cultura centio ose MPO | revelia das criticas de Sécrates, 0s s0- fans valorizaram a figura do professor ¢, joesigir remuncraggio, deram destaque ao ariter profissional dessa fungio. Outra obra importante dos sofistas re- fere-se i sistematizagao do ensino, por te- iniciado os estudos de.gramatica, em énfi ase a retérica © (dia além de tica. Por influéncia dos pitagoricos, de- aritmé astronom ica. Ficou assim con} tituida a tradicional divisiio das s ais, assim chamadas por se de 2 homens livres, desobrigados das lurefas manuais. Esse curriculo. sera mais bem organizado no periodo helenistico € na Idade Média, Das obras dos sofistas s6 nos resta fragmentos, al rios — como, 4 Vimos, tendenciosos s fildsofos do ‘eu tempo, E bem verdade que alguns so- fstas abusavan da ret6rica, elaborando um senvolveram ica, a gcometria, a cami tina- am am dos coment deo Pia vazio, um palavreado oco, ou jus- rapa ual maestria, posigBes con- Vi Sabre o mesmo assunto, Tale excessive atengio ao aspecto formal San ato © defesa de ideias, ja que se int Mele moment hse, msi los na a Nerdade: “pode de- a exporic ste da pers dio do que na da argumentagio, No entanto, no Kenerali ar esse tipo de critica. singe, >oistica ja prenuncia a hata peda- {We movimentara o século seguinte, Wigs geass eg a paideia on seja, 0 duclo entr como v Mowolia A reibriea, mo! 3) O didlogo socrético Séerates (©. 469-399 aC, € anna figura cmblenidtica na historia da flosofia, Ape: de, no sew tempo, muitos o terem cone ft fundide com os sofistas, na verdade a eles ne tenaz, eriticando-en por urem pelas aulas © também discordane do da maneira pela qual encasminhavarn is discussde Procu va horas discutindo nox locais pablicos de Ate interpe aos que julgavam entender d assunto, Mas geralmente 0» de saida ¢ obrigados a reconhecer # prépria ignordinc Esse procedimento, conhec socraticn, Wasee Iésolo diante do oriculo de Delfos, qui identificara c« m mais Por nao se considerar sabio, mas ado pelos jovens, Sécrates pra ga ou 0 gindsio, onde COMO it PF os transcuntes, com pergunta terminado sem lo por mé- da perplexidade do fi- o bio” n de- ar do oriculo, consultou as pesso- s que se diziam sibias ¢ descobriu a fra- gilidade desse saber, Pereebcu entio que a sabedoria comeca pelo reconhecimento da propria ignordncia GP atitude em que se assume a tarefa ver 6 sei que nada sei” Socrates, 0 principio da sabedoria, ramente filoséfica de superar 0 enganoso saber baseado em idéias preconcebidas A primeira parte do método socratico chan tar, fingitide-ignors ed norincia. Ase s¢innia (lo grego eironaia, “pergun- ), proceso negative -strutivo de descoberta da propria ig- nda parte, a matéutica de maieutiké, “relative ao parte”), € construtiv: e-consiste em dar a luz novas ideia Socrates nada de s. KOU ESCTILO, 1O= mamos conhecimento do contetido dessas discussires pe as obras de seus discipulos, 69 questdes morais, como ser omit een, Bes, pera Soares iniia as discus do saber d ‘Que 0s interlocutores, Tos caper aSUM, Se pede em ape cee eeti contingents, come fos emplos, mantendo-se no nivel empirico da simples opinigio, Sécrates assume uma Postura mais radical e procura definir rigo- Yosamente aquilo de que se fala, pois no basta descrever as diversas virtudes, mas saber a esséncia Yelas. Por exemplo, diante dos atos de coragem, € preciso descobrir 0 que éa coragem. Com isso Socrates chega & definigdo do conceit. Todo esse trabalho, no entanto, no visa a um objetivo puramente intelectual. O que Sécrates pretende, usando a maxima “Gonhece-te a ti mesmo”) é 0 reto conhe- cimento das virtudes humanas, a fim de se poder levar uma vida igualmente reta. A filosofia favorece, portanto, a vida moral, porque conhecer o bem-e"pratic&lo sio para Sécrates a mesma coisa, assim como a maldade provém da ignorncia, jé que nin- guém é mau voluntariamente, Chamamos de intelectualisno étco a doutrinia socratica que identifica 0 sabio e o virtuoso. Derivam dai diversas consequéncias para a educacio, tais como: 0 conhecimen- to tem por fim tornar possivel a vida moral; © processo para adquirir o saber é 0 didlo- go; nenhum conhecimento pode ser dado dogmaticamente, mas como condicao para desenvolver a capacidade de pensar; toda educagio é essencialmente ativa ¢, por ser autoeducagio, leva ao conhecimento de si mesmo; a anilise radical do contetido das discusses, retirado do cotidiano, provo- ca 0 questionamento do modo de vida de cada um e, em tiltima instancia, da propria cidade. Essa doutrina, considerada subversiva por colocar em questio os valores vigentes, 70 , julgan- LZ Jevantou contra Sécrates inimigos rancoro- sos. Acusado de corromper a mocidade ¢ de nao crer nos deuses da cidade, foi conde nado A morte. A histéria da sua acusagio, defesa ¢ execugao é contada nos belos dis. logos de Platio, Apologia de Sécrates ¢ Fédon. 4, Autopia de Platéio “Anistocles era 0 verdadeiro nome de Pla- tio (428-347 a.C.), assim apelidado talvez por possuir ombros largos. Ateniense de fa- milia aristocratica, sentiu-se atratdo por po- Iitica, apesar de ter sofrido pesados reveses ao tentar por em pratica suas teorias. Por exemplo, apés ser bem recebido na Sicilia por Dionisio, 0 Velho, foi vendido como escravo, mas por sorte um rico armador o reconheceu ¢ libertou. Em Atenas, lecionou durante quarenta anos na Academia, um dos ginasios de en- sino superior da cidade. Seus Didlogos repro- duzem muitas das discusses efetuadas por Sécrates, seu mestre. No entanto, o vigor ¢ a originalidade do seu pensamento nos fa- zem questionar 0 que de fato se deve a Sé- crates ¢ que é de sua criagio pessoal. Para compreender a proposta pedag6- gica de Platio é preciso associd-la ao seu projeto inicial, que é politico, antes de tudo. Por isso veremos algumas caracteristicas do seu pensamento filoséfico, // J A alegoria da caverna No Livro VII de A Repiiblica, Platio ex- poe o “mito” da caverna, na verdade uma alegoria usada para melhor explicar sua te- oria. Segundo esse famoso relato, homens se encontram acorrentados em uma caver- na desde a infancia, de tal forma que, nao podendo olhar para a entrada, apenas cn- xergam 0 fundo da caverna. Ai sio projeta- das as sombras das coisas que passam as suas costas, onde ha uma fogueira. Se um desses Historia da Educacao e da Pedagogia — Geral e Brasil omens conseguisse se soltar das correntes ra contemplar, A luz do dlia, os verdadeinos Fjqos, a0 vegressar para contar o que vira, fo mereceria 0 crédito de seus antigos Fompanbeitos, que 0 tomariam por louco, ‘Aanalise desse “mito” pode ser feita sob dois pontos de vista: 0 eistemoléico (relative fo conhecimento) ¢ o politico (que por s “exdesdobrara implicagdes pedagégicas). Quanto a dimensio epistemoldgica, Pla- tao compara 0 acorrentado ao individuo comum, dominado pelos sentidos ¢ pelas paixdes, € que alcanga apenas um conhe- cimento imperfeito da realidade, restrito go mundo dos fenmenos, no qual as coisas do meras aparéncias ¢ esto em constante fluxo. A esse conhecimento Plato chama doxa, “opiniao”. Aquele que se liberta dos grilhdes é 0 filésofo, capaz de atingir o verdadeiro co- nhecimento, a episteme, “ciéncia”, quando a razio ultrapassa o mundo sensivel atinge o mundo das ideias, lugar da esséncia imutavel de todas as coisas, dos verdadeiros mode- Jos ou arquétipos. Este é 0 tinico verdadei- 10, € 0 mundo sensivel s6 existe enquanto participa do mundo das ideias, do qual é apenas sombra ou cépia. Por exemplo, se percebemos intimeras abelhas dos mais va- riados tipos, a ideia de abelha deve ser una, imutavel, a verdadcira realidade. Essas ideias gerais estio hierarquizadas no topo encontra-se a ideia do Bem, a mais alta em perfeigao € a mais ge! al de todas. Os seres ¢ as coisas nao existem sendio A medida que participam do Bem. E o Bem supremo é também a Suprema Beleza, 0 Deus de Plato, Conclui-se dessa interpre tagio epistemoldgica 0 idealismo de Platao: conforme sua teoria do conhecimento, as ideias so mais reais que as proprias coisas Retornemos ao relato da alegori da cay verna, O filésofo, aquele que se liberta dos grilhdes, passa do conhecimento opinative Para o cientifico, por isso tem a obrigacte das € Antiguidade grega: a paideia de orientar os clemais. Bis ai a dim Titica © peclagogica d da penguni fio vee! sendosthe ‘io po- alegoria, decorrente “como influenciar aqueles que ™, Ora, cae ao sibio dirigi-los, rvada a clevada fungio da acho politica, Ao apresentar sua proposta de governo-modelo, Platio desereve a pe- dagogia ideal na obra A Repiblica. Na continuidade do relato do “mito”, na mesma obra, imagina uma cidade ulipica, Callipolis (“Cidade Bela”). Etimologicamen- te, wlopia significa “em nenhum lugar” (do grego, ou-lopos), Platio imagina, portanto, um lugar que nio existe, mas que deve ser o modelo da cidade, em que sio climinadas a propriedade ¢ a familia, ¢ todas as crian- gas recebem educagiio do Estado. A educa- do deve ser ministrada de acordo com as diferengas que certamente existem entre as pessoas, a fim de ocuparem suas posigbes na sociedade, 0 que € feito por meio de se- guidas selecies. 0s 20 anos, a educagiio é a mesma para todos. O primeiro corte identifica aqueles que tém a alma de bronze, ou seja, aa que os qualifica para a agricultura, o artesanato € 0 comér- cio. A eles seria confiada a subsisténcia da cidade. Qs outros continuam na escola por mais de anos, Com 0 segundo corte, aqueles que tém a coragem dos guerreitos de “alma de prata” interrompem os estuclos a fim de constituir a guarda do Estado, como solda- dos encarregados da defesa da cidade, Desses sucessivos cortes sobram os mal notaveis, que, por terem “aln serio instruidos na arte de dialogar: Apren- dem, entio, a filosofia, eapaz de elevar alma até o conhecimento mais puro, fonte de toda a verdade. ‘Aos 50 anos, aqueles que passaram com ie de provas estario uma sensibilidade grossei a de ouro”, sucesso por essit_ sé aptos a ser admitidos no corpo supremo dos magistrados. Cabe-lhes 0 exercicio do n poder, pois apenas eles tém a ciéncia politica. Note-se que Platio desenvolve_ideias avangadas para sew tempor o Estado sassu= me a educagio: a educagio da mulher é melhante a do homemy; os estigios superio- tum e no res dependem do mérito de ¢ da riqueza; valorizs edlucagiio inte- Iectual, coroada pelo estudo das ci (com especial destaque para a matemética) ¢ pela dialética, proceso que eleva a alma das aparéncias sensiveis as ideias. Essa utopia representa um modelo aris- tocritico de poder, em oposigao & demo- cracia, que, segundo Plato, confia indevi- damente nas decisdes do cidadio comum, incapaz. de conhecer a ciéncia politica. N&o defende, porém, a aristocracia de bergo ou riqueza, mas aquela em que o governo € confiado aos mais sabios. Platio prope, portanto, uma sofacracia (ctimologicamen- te, “poder dos sabios”) e diz que, para um Estado ser bem governado, é preciso que os filsofos sc tornem reis, ou que 0s reis se tornem filésofos”. gio da Aprender é lembrar jo contraposta por © 0 mun- Retomando 3 Plato entre o mundo das idei do sensivel dos fendmenos, veremos que 0 filésofo parte do pressuposto de que a alma teria vivido a contemplacio do mundo das ideias, na qual conheceu as esséncias por simples intuigio (conhecimento direto € imediato). Ao se encarnar, no entanto, & alma teria se esquecido de tudo. Por isso, para Platio, aprender é lembrar. undo teoria da reminiscéncia, todo conhecimento consiste no esforgo para su- perar as dificuldades que os sentidos ples ocasido, © no causa do conhecimento — jnterpdem para aleangar a verdade, Portanto, educar nio é levar o conheci mento de fora para dentro, mas despertar sim- ro individuo 0 que ele j4 sabe, Proporcion min no corpo e a alma a realizagio do fram e da beleza que cles possuem © nao tigeram ocasiio dle manifestar. Para Plato, aan corpo seja inferior & alma intelec- tambén possul una alma irracional, tiva, rh irascivel, composta de duas partes: wma impulsiva, localizada no peito; outra con. jos de bens para os de cupiscivel, voltad sexual, localizada no materiais € apetite ventre. ‘© desafio da moral, para Platdo, en- contra-se na tentativa de dominar a alma inferior, Esta perturba 0 conhecimento ver- dadeiro, porque, escravizada pelo sensivel, leva A opiniao ¢, consequentemente, a0 erro. O corpo é também ocasido de corrup- gio e decadéncia moral, Se a alma superior ao souber controlar as paixdes ¢ os desejos, seré impossivel 0 comportamento moral. Que consequéncias resultam dessas teo- rias para definir um ideal de educacao? Primeiramente, a educacio fisica pro- porciona ao corpo uma satide perfeita, per- mitindo que a alma ultrapasse o mundo dos sentidos e melhor se concentre na contem- plagio das ideias. Caso contrario, a fraque- za fisica torna-se empecilho & vida supe- rior do espirito. Do mesmo modo, 0 amor sensivel se suborcina ao amor intelectual. No didlogo O banquete, Platio nos faz ver que, se na juventude predomina a admira- Gao pela beleza fisica, o adulto amadureci obrir que a verdadeira do é capaz de des beleza é espiritual. Essa_transposi io. pode ser favorecida com a educagio do corpo e do espitito pela gindstica, Também pela mvisica, entendida no amplo sentido de formagio literitia « artistica. As criangas aprendem o ritmo ¢ a harmonia, condigio para aleangar a hat monia da alma. Platio recomenda ainda © ensino di geometria, © segundo uma tradigio anti- ga parece que na entrada da Academic R Historia da Educagao e da Pedagogia — Geral e Brasil jg desincava a inscriso: “Nao entre aqui “em no souber geometria”. A aritméti- Ga geometria ¢ @ astronomia, formando fj eurriculo de base cientifica, nao tm, no snranto, 0 objetivo de formar especialistas, mas preparar para a mais elevada atividade ‘mana, 0 filosofar. Contrariando a educacio tradicional, paseada nos textos das epopeias, sobretudo as de Homero, Platdio recomendava que a poesia fosse excluida do ensino, limitando- fea proporcionar 0 goz0 artistico. O moti vo da critica deve-se ao fato de que o poeta, go imitar a realidade, cria um mundo de mera aparéncia, afastando-nos do conheci- mento verdadeiro ao estimular as paixées ¢ 0s instintos. Ao contrario, Platio defende a aprendizagem da resisténcia racional & dor, ao sofrimento, para nao sucumbirmos 4 vida dos sentimentos. Numa breve conclusio sobre Plato, po- demos ressaltar que ele se contrapée a di- versas tendéncias do seu tempo. Por exem- plo, a sofocracia contraria as concepgaes democraticas, embora nessa época Atenas ja estivesse sofrendo uma série de reveses politicos. Como veremos a seguir, ao defen- der a formagio cientifico-filoséfica, Platéo perdeu em popularidade para o educador Isécrates, que representa a tendéncia lite- rario-retérica. Apesar desses insucessos, as ideias platénicas fecundaram de maneira decisiva a filosofia crist, sobretudo nos seus primérdios. hut 5. Isécrates e a retrica Isbcrates (436-338 a.C.), contemporaneo de Plato e, de certa forma, seu opositor, defendia posigdes que agitaram as discus- ses sobre educag&o na antiga Atenas. Dis- cipulo do sofista Gorgias ¢ de Sécrates, fun- dou uma escola de nivel superior, na qual formou varias geracbes durante 55 anos. Pouco restou da abundante producao de Antiquidade qreaa: a paideia discursos, na maior parte destinados aos exercicios didaticos para as aulas de ret~ rica, a “arte de bem dizer”, mas também discursos forenses encomendados. Vimos que a ret6rica se tornou importan- te instrumento para a cidade democratic na qual os cidadios procuravam convencer seus iguais nas assembleias do povo ou nos tribunais. Sabemos também como Sécrates ¢ Plato criticaram os sofistas ~ muitas ve~ zes injustamente — por se ocuparem com um palavreado vazio e formal. Para Platio, embora o bem falar (ou es crever) nao possa ser desprezado, é, no en- tanto, secundario, Antes de aprender ret6- rica para convencer um oponente, é preciso esforgar-se por conhecer a verdade, porque 36 0 conhecimento dara estrutura organica ¢ ordenagio légica ao discurso. Caso con- trario, este se torna mero amontoado de banalidades e equivocos. Em contraposigao, para Iséerates Plato era muito intelectualista e seus ensinamen- tos restritos demais a um piblico elitista. Duvidava até que fosse possivel alcangar a ¢pisteme, meta do projeto platénico. Mais praticos, 0s get6ricos cagoavam dos filéso- fos, acusand6-os de se dedicarem a discus- SOes~estéreis, intiteis, distanciadas da vida cotidiana, Para Is6crates, seria melhor con- tentar-se com a opiniao razoavel. Isécrates foi importante pelo fato de cen- trar sua atengio na linguagem, descobrin- do formas que facilitassem a aprendizagem do discurso. Assim como o corpo necesita de exercicio, para treinar o espirito des as vantagens da repeticao, além de desen- volver diversas técnicas de desdobramento do discurso. Ensina como reunir material de pesquisa, distingue as partes de que se compée a pega oratoria ¢ formula regras para orientar as maneiras de apresentagao, como o processo de refuutagiio de teses, as sentengas, a ironia, Para ilustrar um bom, discurso, sugere ainda recorrer a historia, ca 73 a moral € fecunda em exemplos de conduta pol Muitas vezes Is6 es se opas também concep> 05 sofistas, por considerar que Glo de cloqui n dissor da formagio mot nica A historia nos mostra que a atuagao ¢o% ‘a foi retéricos no tempo da Grécia cliss mais mareante do que a dos filésofos, como Platio, cuja influéncia s6 se faria sentir pos- teriormente. Naquele momento, a énfase &s questées de linguagem e de literatura orientow a educagio de maneira definitiva. A propésito, 0 filésofo e orador romano Ci- cero diz que Isécrates “ensinou a Grécia a falar”. 6. Realismo aristotélico Arist6teles (384-332 a.C.) nasceu na ci- dade de Estagira, ao norte da Grécia. Di rigindo-se a Atenas, foi discipulo de Plato, tendo permanecido por vinte anos na Aca- demia. Posteriormente teria sido preceptor do futuro imperador Alexandre, 0 Grande. Mais tarde fundou em Atenas sua pré- pria escola, o Liceu, no ginsio de Apolo Licio, em uma dependéncia chamada peri- patos, dai o fato de sua filosofia ser conheci- da como peripatélicaSegundo hipétese cor- rente, Aristételes daria suas aulas andando pelos jardins da escola, no peripals (de peri, “ao redor”, pateo, “passear”). Ja a helenis. ta Maria Helena da Rocha Pereira discorda dessa interpretagio, afirmando que peripatos significa “passeio coberto”, como costuma- va existir naqueles edificios, uuperando a influéncia do mestre, Aris. tteles claborou um sistema filoséfico ori. ginal, que abrangia os mais diversos tos do saber do seu tempo, inclusive das ciéneias. Filho de médico, herdou 0 gosto pela observagiv, tendo classiticady cc de 540 espécies de animais, aspec- rea, © que mostra a spam vatorizada MA SU CONCEP py tam dagegic® . algumas linhas do pensameny, ico, para melhor comprecniderm, as pedagogieas: ‘Aprenelemos ue, Para Plato, as coisas capias, em constante movimento, si, coc aparencias, sombras da verdadeing sine do mundo das ideias, do munds Fmsvel dos conceitos. Arist6tcles critica g ideatismo do mestre ¢ desenvolve uma tes. via realista, segundo a qual a imutabilidade to conceito € 0 movimento das coisas po. dem ser compreendidos a partir das coisas mesmas, recusando, portanto, 0 artificio do mundo das ideias. ; Para explicar 0 ser, AristOteles usa dois elementos indissociaveis: a inatéria é a forma, ‘A matéria é pura passividade; contendo-%s virtualidades da forma em poténcia, A for- ma € o principio inteligivel, a esséncia co- mum aos individuos de uma mesma espéce, pela qual cada um é 0 que é. Fazendo uma analogia um tanto grosseira com uma esti- tua, a matéria seria o marmore, enquantoa forma seria a idéia que o escultor realiza ¢ pela qual individualiza ¢ determina. Apoiado na nogdo de matéria ¢ forma, Arist6teles explica o devir (ou movimento} Todo ser tende a atualizar a forma que tem em si como poténcia, a atingir a perfeicio que lhe é prépria e o fim a que se destina Assim, a semente do carvalho, enterrada, tende a se desenvolver e se transformar n0. carvalho que era em poténcia. O movimen- ‘0 & pois, a passagem da poténcia para © a0. A teoria do movimento leva A distinga0 “hire as causas possiveis dos seres. Voltando mre aemPlo da estétua, para haver transfor SA, atuam varias delas: a causa materitl eee 2 usa oficiente éo escultor: B eh canang 8 rma que a estétua adqui Ou sejas ante eterminada form 7 lidade da estatua. sua Histo a Wa da Educacao e da Pedagogia — Geral e Bra i importincia dad & investigacio ciency 74 i Apedagogia aristotélica Como consequéncia dessa teorig vimento € das causas, toda edlucacio deve jevar em conta o fato de que o ser humane seqncontra em constante devin, Ae yanrcomo finalidade ajucki-lo aa plenitude e a realiza atuali- garas forgas que tem em poténcia, Note-se aquiuma caracteristica da pedagngia da essay. y pois a educacio pretende levar a pessoa, a“tornarse 0 que deve ser” esi Nio mais discutindo como os seres mas como podem vir a ser, encontramo. nos inalmente no campo da ética, parte da filosofia que trata da ago humana tendo - em vista o bem. O sumo bem é alcangar 3" felicidade. Ela consiste na plenitude da rea- lizagio humana, ao desenvolver suas facul- | dades fisicas, morais ¢ intelectuais, Para Aristételes, no entanto, aquilo que * mais fundamentalmente caracteriza o ser humano e o distingue do animal é a capa- cidade de pensar e, portanto, sua perfeigio > encontra-se no exercicio dessa atividade, Sea sua virtude é viver conforme a razio,|| cabe a esta disciplinar os sentimentos ¢ os | instintos, Diferentemente de Sécrates, que identi- ficava saber e virtude, Aristoteles enfatiza a agio da vontade, exercitada pela repetigio, que conduz ao habito: s6 é virtuoso quem fem 0 habito da virtude. Dai a imitagio ser ©insttumento por exceléncia desse proces- “segundo o qual a crianga se educa repe- Undo os atos de vida dos adultos, adquirin- th habitos que vo formar uma “segunda Ratureza”, do mo- cago a realizar suia > ._ Essa aprendizagem se faz pela escolha lire do,justo meio entre dois vieios (que re- Presentam os extremos por falta ou por ex- (9). Por exemplo, a coragem ¢ 0 meio- ‘ermo entre a. covardia ea temeridade; a Bentileza, entre a indiferenga ¢ a irascibi- Antiguidade grega: a paideio > lidade Prodi 3. liberalidade, entre a avareza Balidade, ¢ assim por diante, Na sua obra Politica, Aristétcles define 8 condigées da vida boa em sociedade aga uma teoria da cducagio, discutin- stado deve se ocupar com a © para a cidadania, Coerente com p Pensamento de seu tempo, restringe 0 beneficio da cidadania aos homens livres, sobretudo aos que dispéem de tempo para ° 6cio digno, excluindo, portanto, os que se dedicam as artes mecanicas, como os arte- Sios ¢ 0s escravos, A metodologia de Aristételes merece um destaque. Ii bem verdade que desde Sécra- tes ¢ 0s sofistas jé existiam questées meto- dologicas, mas deve-se a Aristételes a onga- nizacio rigorosa do’ Organon, ou “érga0”, “instrumento de pensar”, que mais tarde recebeu a denominagio de légica formal. A compreensio precisa dos processos de anilise}e(sintesé, induco, dedugao ¢ analo- gia ajudara a desenvolver também o méto- do logico de ensinar. “A repercussio do pensamento aristotélic co nao se deu de imediato na Grécia do seu tempo. Sabe-se que seus trabalhos foram Jevados para a Asia Menor por volta de 287 a.C. ¢ teriam se perdido por cerca de due zentos anos, até reaparecerem na biblioteca de Alexandria, onde foram classificados © posteriormente levados para Roma. Durante a Idade Média, sua obra neceu muito tempo desconhecida, re do inici Depois, a partir do século XH, foi incorpo- rada pela filosofia escolastica, que adaptou seu. paganismo as concepgdes até 08 nossos tempos, sempre foi mare: sua influéncia na filosofia ocidental, ea a do como o FE: forma perma- 7. Os pés-socratices AOS POSTOCTONCOS EE oN Ota Na segunda metade do século IV a.C, com a conquista macedénica, as cidades. 75 a autonomia. De- estados gregas perderam es aram mais pois dessa época, os tempos fi A ério conturbados pela expansio do Imp: Alexandrino. A inseguranga das guerras ¢ 0 cont 1 mudaram to com o pensamento orient © centro das reflexdes filosoficas, Fz surgir um novo tipo de intelectual. A énf ¢ foi destocada da metafisica ou da polf- tica para as questdes éticas, sobretudo no que dizia respeito A realizacao subjetiva € pessoal, Na impossibilidade de controlar 0 que se acha fora de si, 0 individuo procu- raa serenidade interior. Representam essa tendéncia as escolas filosoficas do estoicis- mo e do-epicurismo. © estoicismd nao teve origem mica, mas sofréti influéncia de diversas tendén- cias. Segundo seu principal representan- te, Zeno de Citio (336-264 a.C.), ao bus- car a félicidade 0 ser humano deve fugir do prazer, que em dltima anélise apenas proporciona dor ¢ sofrimento. O-exerci= cio da virtude consiste naautossuficiéncia,) aleangada quando o individuo conseguir is ¢ dominar no. énfa- afastar-se dos bens materia as paixdes que trazem intranquilidade & alma. O dominio racional leva a aceitagéo do destino ¢ A resignagio, por isso o ideal do sdbio é a ataraxia (imperturbabilidade), a apatia (auséncia de paixiio) ¢ a aponia (auséncia de dor). No epicurismo, doutrina iniciada por Epicuro (341-270 a.C,), 0 ideal do sibio é atingir igualmente a ataraxia, embora dife- rentemente dos estéicos. Epicuro é um he- donista (hedoné, “prazer”) e, por isso, ao con iderar a felicidade como busca do prazer, niio nega as afecgies humans, nem prope a insensibilidade. O individtiondeve-evitar tudo 0 que se opie di felicidade (temor, dor, softimento) ¢ aproximarse de tudo 0 que i proporciona, como a satisfagio das neces: sidades fisicas ¢ espirituais, entre as quais distingue especialmente a amizade, | 76 Histéria da Educacao e da Pedagogia — endo as pessoas que julgam jcurismo @ busca desenfreada de pra. o epict picuro_destaca © papel da raz ics, ja que a sua Tealizacig wala pode trazer sofrimento no futy. Pr Mtender as verdadeiras necessidades hy. mi ruscar o prazer duradouro, Contradiz na scle significa b ‘itual. mana sereno, esi ; . ‘Ay tendéncias estoicas ¢ epicuristas que vam a filosofia helenistica acha. caimese em consonancia com uma concep. Go de educagio muito diferente daqucla do periodo cléssico. Nos novos tempos di fainuiu o interesse pela educagzo fisica, en- Gquanto a razao adquiria primazia no con. trole dos sentidos e das paixdes. (© pensamento helenistico aproximou-se das religides do Oriente e, mais tarde, das concepgdes cristas predominantemente as- caracteri céticas. ‘As filosofias epicuristas e, sobretudo, as estoicas (nas suas tendéncias ecléticas) mar- caram 0 pensamento romano nas figuras de Cicero, Séneca, Epicteto ¢ Marco Aurélio. Posteriormente, 0 ascetismo cristo medie- val foi tributario do estoicismo. ConclusGo No longo periodo que se estende desde 08 tempos heroicos até o helenismo, o ideal grego de educacao sofreu significativas al- teragées. Embora © cuidado com o corpo fosse uma constante, de inicio era dada én- fase a habilidade militar do guerreiro, Em seguida, 0 cidadao da polis passou a fi quentar os gindsios, onde a educacio era Predominantemente fisica ¢ esportiva, até ue, por fim, os assuntos de literatura ¢ re- torica se tornaram prioritarios, Quanto & concepezio do corpo, de inicio eae I de beleza fisica foi muito valorizado. Sai apes © ascerism9 da Igreja crista Inpregecdnltenelado por um platonismo : pe © pela vis ascética, transformou ™ obsticulo para a vida espiritual. Geral e Brasil yr jutro aspecto a ser realgado é que, por cer a uma sociedade pert am a formag sec o trabalho manual ase achava associada » desinteressado da forma fisi- de intelectual permaneceram s ocios ys desvalori Enquanto atividade se 3 lass foi ainda o bergo das primeiras educacionais, fecundadas pelo em- pluralistas. Apés as cagies dos sofistas, Isderates exerceu impor fine atwagio, animando a polémica com Séerates, Plato ¢ Aristételes, Embora estes {ikimos nao tenham influenciado a educagio do seu tempo tanto quanto os opositores, a coniribuigio dos filésofos clissicos para pedagogia encontra-s¢ na: concepgio-de na- jureza humana, cuja esséncia é a racionali- dade, Essa visto foi retomada pela tadigio ¢ ‘marcou profundamente a cultura ocidental, sobretudo a partir da Idade Moderna. A concepgao de natureza humana uni- versal servi de base para o delineamen- 10- 1 = A Olimpiada era um dos quatro grandes. festivais pan-helénicos que reuniam participantes de todo o mun- do grego. De origem muito antiga, foi organizada no século VIII a.C. © rea- lizava-se na cidade de Olimpia, a cada quatro anos, no versio. Por essa ocasidio havia uma tégua sagrada, que inter- tompia qualquer atividade guerreira Os atletas disputavam diversos jogos, © os vencedores cram coroados com folhas de oliveira, recebendo as home- nagens das cidades que representa Poetas e oradores falavam em pr Dliea, ¢ havia ainda uma grande feira, Antiguidade grega: a paideia to da tendéncia 6 Ou seja, para Platio, a educagio é o ins tumento para desenvolver no ser humano tudo o que implica sua participagio na rea lidade ideal, tudlo 0 que define sua essénei verdadeira, embora asfixiada pt cia empirica, Também segundo Arist6t a educago é um proceso da passagem da poténcia para o ato, pela qual atualizamos a forma humana. . ‘A concepgio essencialista durou longo periodo. Segundo 0 pedagogo Suchodolski, | Rousseau (século XVIII) representa “a pri-_ meira tentativa radical ¢ apaixonada de - oposigéio fundamental 4 pedagogia da es- séncia ¢ de criagao de perspectivas para uma pedagogia da existéncia”, processo| que assumiu uma forma mais definida no século XIX ¢ sobretudo no XX, como ve~ remos. Por fim, como j4 dissemos, no mundo contemporaneo pressionado pela especia- lizagao e pela tecnocracia, renasce o ideal grego da paideia, da educagio integral. O estidio de Olimpia podia acomodar 40 mil espectadores sentados. 2 = Livros —Na Grécia, por volta do sé- culo VIa.G., era utilizado 0 rolo de pa piro, também conhecido por byblos (de biblion, “livro”; dai, biblioteca). O papiro inta do vale do Nilo, com que os egipcios fabricavam uma tira com- prida de mais ou menos 40 centimetros de altura e cerca de seis a nove metros de comprimento. Sobre ela escrevia-se com uma pena de junco fino em colunas sucessivas na direcio em que era enro- Jada (sua maior dimensio), Nao se dei- m espagos entre as palavras, nem se usavam sinais de pontuagiio, No século 7

You might also like