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Efeitos de Espécies Arbóreas Nativas Na Qualidade e Disponibilidade de Forragens Na Amazônia Mato-Grossense
Efeitos de Espécies Arbóreas Nativas Na Qualidade e Disponibilidade de Forragens Na Amazônia Mato-Grossense
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OLIVAL, A. A.; SOUZA, S. E. X. F.; LELES, G. M.. Efeitos de espécies
arbóreas nativas na qualidade e disponibilidade de forragens na
Amazônia Mato-Grossense. Revista Ibero Americana de Ciências
DOI: 10.6008/CBPC2179-6858.2021.012.0015 Ambientais, v.12, n.12, p.146-156, 2021. DOI:
http://doi.org/10.6008/CBPC2179-6858.2021.012.0015
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Efeitos de espécies arbóreas nativas na qualidade e disponibilidade de forragens na Amazônia Mato-Grossense
OLIVAL, A. A.; SOUZA, S. E. X. F.; LELES, G. M.
INTRODUÇÃO
O Brasil é um dos países com maior potencial de produção pecuária a pasto no mundo. Este fato é
determinado principalmente por suas condições climáticas e vasta extensão territorial (SERAFIM et al.,
2012). No país, existem por volta de 170 milhões de hectares ocupados por algum tipo de planta forrageira
sendo que, destes, aproximadamente 100 milhões de hectares são de pastagens cultivadas (IBGE, 2012).
No entanto, a atividade ainda carrega o estigma da baixa produtividade e de alto impacto ambiental,
principalmente em decorrência da alta prevalência de pastagens degradadas (DIAS FILHO, 2014).
O debate sobre os impactos socioambientais dos sistemas de produção tem motivado o avanço de
novos arranjos e possibilidades para os sistemas a pasto. Neste sentido, o uso de sistemas silvipastoris
torna-se uma alternativa para recuperação das pastagens de forma sustentável permitindo ainda elevar a
rentabilidade por hectare da atividade (ALMEIDA et al., 2019). Os sistemas silvipastoris constituem uma
modalidade de sistema agroflorestal, combinando forrageiras, árvores e animais em uma mesma área, por
meio da conservação/manutenção de árvores previamente existentes, pelo plantio de mudas de espécies
arbustivas ou arbóreas ou pela condução da regeneração da vegetação natural (ALMEIDA et al., 2014).
Nos sistemas silvipastoris a disponibilidade e qualidade da forragem são influenciadas pela
densidade arbórea, que reduz a radiação fotossinteticamente ativa e aumenta a competição por água e
nutrientes (SANTOS, 2016). Assim, a quantidade da radiação interceptada pela copa das árvores torna-se
fator determinante, uma vez que o sombreamento pode modificar as características estruturais e
produtivas das forrageiras, refletindo na produção animal (ALMEIDA et al., 2019). Outro aspecto relevante
relacionado às árvores nas pastagens é sua relação com a qualidade da matéria orgânica depositada no
solo decorrente da decomposição de folhas, frutos e galhos das árvores. Assim, diferentes espécies
arbóreas poderiam contribuir em diferentes magnitudes para a melhoria de parâmetros físicos, químicos e
biológicos relacionados à fertilidade do solo, o que também pode impactar na produção e qualidade da
forrageira disponível aos animais (TREYDTE et al., 2009; OLIVEIRA et al., 2012).
Aprofundar o conhecimento dos efeitos das espécies arbóreas no ecossistema pastagem, em
especial aqueles relacionados com diferentes espécies florestais nativas do bioma Floresta Amazônica,
pode representar importante avanço no planejamento dos sistemas agrossilvipastoris na região, ajustando
os benefícios ecossistêmicos desejados ao arranjo mais eficiente na área (PACIULLO et al., 2011). Este
trabalho teve como objetivo avaliar a influência de diferentes espécies arbóreas nativas da Amazônia mato-
grossense na disponibilidade de matéria seca e na qualidade da Brachiaria decumbens em sistemas
familiares de produção na região norte do Estado de Mato Grosso. A hipótese trabalhada foi a de que
diferentes espécies arbóreas podem influenciar positivamente nos parâmetros de qualidade nutricional e
produtividade da planta forrageira.
METODOLOGIA
O experimento foi conduzido nos municípios de Carlinda, Nova Santa Helena e Nova Guarita, todos
localizados no extremo norte do estado de Mato Grosso, em uma região de transição entre os biomas
Cerrado e Floresta Amazônica. O clima da região é do tipo Am, de acordo com a classificação de Köppen,
com índice pluviométrico que pode atingir médias superiores a 2.000 mm anuais e inverno seco, com
temperatura média anual em torno dos 26⁰C (INMET, 2019).
O estudo envolveu o efeito do sombreamento de pastagens de B. decumbens por quatro espécies
arbóreas nativas, sendo: Chloroleucon acacioides (Ducke) Barneby e J.W.Grimes (amarelinho), Trattinnickia
rhoifolia Willd. (amesclão), Cedrela fissilis Vell. (cedro-rosa) e Dipteryx odorata (Aubl.) Forsyth f.
(champanhe). Para cada espécie arbórea foi identificado um piquete que possuísse cinco indivíduos adultos
completamente isolados de outras árvores. Para cada indivíduo foram coletadas quatro amostras simples
de forragem aproximadamente na metade da distância entre o tronco e o limite de projeção da copa de
cada árvore, sendo considerada como forragem sob influência direta da árvore, e quatro amostras simples
distantes cinco metros do limite da projeção da copa, sendo considerada a área sem influência direta da
árvore. Das quatro amostras simples de cada condição foram feitas amostras compostas. O procedimento
foi feito na época da chuva (janeiro de 2019) e da seca (agosto de 2018). Desta forma, todas a análises
foram realizadas considerando cinco repetições em cada uma das condições (sombra/pleno sol e período
chuvoso/período seco).
A média de altura total dos indivíduos de C. acacioides amostrados foi de 9,40 m, enquanto o
diâmetro a altura do peito (DAP) foi de 0,83 m e área de copa de 39,21 m2. Árvores de T. rhoifolia estiveram
dentre as mais altas amostradas, com média 16,60 m de altura, 0,76 m de DAP e 42,99 m2 de área de copa.
Os indivíduos de C. fissilis tinham 13,56 m de altura, 0,39 m de DAP e 27,20 m2 de área de copa. Por fim, a
altura média de D. odorata foi de 16,70 m, com 0,47 m de DAP e 36,46 m2 de área de copa. A área de copa
foi estimada a partir da medição de 08 raios a partir do tronco até o limite da copa, formando 08 triângulos.
A área total de copa foi calculada a partir da somatória da área de cada um dos triângulos.
Para a coleta da planta forrageira, após pastejo em cada piquete, foram respeitados os dias de
descanso estabelecidos de acordo com o manejo de cada propriedade participante da pesquisa, sendo o
mesmo para a época de seca e chuva. Assim, os dias de descanso da pastagem foram de 28 para as
pastagens com C. acacioides, 25 para C. fissilis e 26 para D. odorata e T. rhoifolia, respectivamente. Todas
as propriedades possuíam bovinos de corte, sendo a lotação dos piquetes de cerca de 1 UA/ hectare
A coleta de planta forrageira foi realizada utilizando quadro de 1m2, posicionado aleatoriamente
em quatro pontos sob a copa. O corte da forrageira foi manual, respeitando 2/3 da altura da planta. O
material coletado foi separado por massa verde e material senescente, os quais foram pesados para
mensuração da disponibilidade de massa seca (MS) e do rendimento da forragem, o qual é a relação
proporcional entre material vivo e senescente. O mesmo procedimento foi realizado para as amostras das
áreas sem influência direta das árvores.
As amostras foram submetidas à pré-secagem em estufa a 65⁰C por 72 horas, posteriormente
moídas em moinho tipo Willey, com malha de 1 mm e encaminhadas para análise bromatológica e de
digestibilidade. Para as análises laboratoriais foram feitas amostras compostas misturando as quatro
coletas de cada espécie arbórea na mesma proporção, isso para ambas as situações sob a copa e fora da
copa. Foram realizadas análises de matéria seca (MS), proteína bruta (PB) e digestibilidade (DIV), todas
estas realizadas no Laboratório de Nutrição Animal do Grupo de Estudos e Trabalho em Agropecuária, no
Centro de Ciências Agrárias, da Universidade Federal de São Carlos, em Araras, São Paulo. Seguindo a
metodologia proposta pela Associação Nacional dos Fabricantes de Rações (ANFAR, 1992). Considerou-se
como rendimento da forragem a relação entre material verde e material senescente na área amostrada.
Os dados de disponibilidade e rendimento de forragem (%), PB (% da MS) e DIV (% da MS) foram
submetidos à análise estatística. Primeiramente os dados foram examinados quanto à sua natureza e
aderência aos pressupostos de distribuições teóricas de dados possíveis através de análise gráfica, através
do ambiente computacional R (R CORE TEAM, 2019). A distribuição teórica à que mais se aderiu os dados
de PB, DIV e rendimento foi a distribuição Beta (BOLKER, 2007). A disponibilidade de forragem, expressa
em g/m2, foi modelada a partir da distribuição Gamma.
Foram construídos e selecionados modelos lineares generalizados mistos (GLMM), considerando o
sombreamento (duas condições: sombra e pleno sol), o período do ano (dois períodos: seca e chuva) e a
espécie arbórea (quatro espécies) como efeitos fixos. Com isso, foram construídos nove modelos com
diferentes estruturas dos efeitos fixos para cada variável de interesse, todos considerando os indivíduos
arbóreos como efeitos aleatórios. Os modelos foram implementados através dos pacotes ‘lme4’ e
‘glmmTMB’ (BATES et al., 2015; BROOKS et al., 2017). A seleção dos modelos foi feita através da
comparação dos valores de AIC (Akaike Information Criteria) e verossimilhança (BURNHAM et al., 2002). Em
seguida, foi realizada Análise de Variância dos efeitos fixos pelo teste de Qui-quadrado de Wald tipo II,
seguidas por comparações múltiplas pelo teste de Tukey ajustado. São apresentadas tabelas com estatística
descritiva das variáveis modeladas, bem como gráficos das estimativas dos modelos selecionados.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
Primeiramente, apresenta-se as estatísticas descritivas dos dados obtidos nas diferentes condições
de influência arbórea e período do ano, demonstrando em linhas gerais a forte influência da estação seca e
efeitos aparentemente distintos das diferentes espécies sobre a qualidade nutricional e produtividade
(Tabela 1). Em seguida apresenta-se todos os parâmetros dos quatro modelos estatísticos selecionados
para avaliar as quatro variáveis de qualidade nutricional e produtividade na Tabela 2, na qual se verifica os
termos que se diferenciaram dos valores médios do intercepto, além de apontar a maior influência da
variação aleatória individual de cada árvore amostrada para proteína bruta e disponibilidade da forragem.
Na Figura 1 é possível observar as estimativas dos modelos nas escalas das variáveis respostas, sendo
possível comparar o desempenho nutricional e produtivo das forragens considerando os efeitos das
interações entre espécie, sombreamento e época do ano.
Tabela 01: Efeito da condição de sombreamento e período na proteína bruta (PB), digestibilidade (DIV),
disponibilidade de matéria seca (DISP) e rendimento de rendimento (REND) de acordo com a espécie arbórea
presente na pastagem.
Espécie Período Condição PB (%) DIV (%) DISP (g/m2) REND (%)
Média DP Média DP Média DP Média DP
C. acacioides Chuva Sombra 7,708 0,576 60,516 7,147 252,858 58,012 89,448 2,784
Pleno Sol 4,932 0,681 57,148 2,088 258,564 49,564 89,150 3,273
Seca Sombra 5,430 0,762 60,026 5,551 88,426 8,900 72,114 6,960
Pleno Sol 4,338 0,199 59,898 2,539 43,108 10,157 41,240 6,096
T. rhoifolia Chuva Sombra 8,522 0,997 73,162 2,027 185,692 37,905 95,046 1,735
Pleno Sol 9,122 0,926 69,732 4,848 164,208 26,153 91,986 1,755
Seca Sombra 7,472 0,513 69,728 13,059 60,226 11,058 56,690 4,475
Pleno Sol 5,972 0,538 63,486 1,662 36,938 7,269 39,882 5,590
C. fissilis Chuva Sombra 7,800 0,684 69,973 1,705 171,083 81,210 85,238 7,704
Pleno Sol 8,517 1,330 68,892 5,355 102,895 36,573 75,667 5,675
Seca Sombra 6,498 0,646 61,842 2,934 33,038 11,032 28,792 8,820
Pleno Sol 5,212 0,817 61,354 2,425 23,878 9,848 21,142 3,323
D. odorata Chuva Sombra 9,360 1,097 68,912 3,406 205,998 24,060 94,278 0,675
Pleno Sol 8,400 0,218 67,370 2,056 153,446 18,792 93,174 1,758
Seca Sombra 6,898 0,351 63,810 0,914 35,170 6,491 43,662 6,515
Pleno Sol 5,572 0,287 63,818 0,531 31,260 7,732 38,886 5,910
Figura 01: Estimativas (pontos) e erro padrão (barras) dos modelos para a) proteína bruta (% da MS), b) digestibilidade
in vitro (% da MS), c) disponibilidade de forragem (g de MS/ m2 e d) rendimento da forragem (%) em relação as
diferentes épocas do ano, condições de sombreamento por diferentes espécies arbóreas. Amarelinho: Chloroleucon
acacioides, Amescla: Trattinnickia rhoifolia, Cedro: Cedrella fissilis, Champanhe: Dypterix odorata.
Tabela 02: Parâmetros dos modelos estatísticos de qualidade e disponibilidade de forrageira em pastagens na região
norte de Mato Grosso. Valores em negrito indicam diferença significativa dos termos rem relação ao intercepto, ou do
intercepto em relação ao valor zero.
Rendimento de
Proteína Bruta Digestibilidade in Disponibilidade de
forragem
(link=logito) vitro (link-logito) forragem (link-log)
Parâmetros (link=logito)
Modelo Gamma
Modelo Beta misto Modelo Beta misto Modelo Beta misto
misto
Estimat Erro Estimat Erro Estimat Erro Estimat Erro
Efeitos fixos iva Padrão iva Padrão iva Padrão iva Padrão
(Intercepto) -2,482 0,043 0,511 0,064 5,525 0,102 2,116 0,151
Pleno sol -0,480 0,065 -0,100 0,053 0,026 0,134 -0,025 0,212
Período seco -0,378 0,063 -0,161 0,053 -1,040 0,134 -1,157 0,184
Espécie Trattinnickia rhoifolia 0,106 0,060 0,450 0,075 -0,310 0,145 0,780 0,254
Espécie Cedrella fissilis 0,005 0,065 0,261 0,074 -0,337 0,153 -0,303 0,214
Espécie Dypterix odorata 0,209 0,059 0,276 0,074 -0,196 0,145 0,602 0,243
Pleno sol : Período seco 0,252 0,097 -0,749 0,189 -1,289 0,256
Pleno sol : Espécie Trattinnickia rhoifolia 0,555 0,085 -0,143 0,189 -0,475 0,339
Pleno sol : Espécie Cedrella fissilis 0,582 0,089 -0,661 0,193 -0,652 0,279
Pleno sol : Espécie Dypterix odorata 0,366 0,085 -0,324 0,189 -0,127 0,336
Período seco : Espécie a Trattinnickia
rhoifolia 0,239 0,087 -0,078 0,197 -1,471 0,291
Período seco : Espécie Cedrella fissilis 0,188 0,090 -0,662 0,196 -1,584 0,261
Período seco : Espécie Dypterix odorata 0,051 0,088 -0,727 0,197 -1,817 0,282
Pleno sol : Período seco : Espécie
Trattinnickia rhoifolia -0,567 0,128 0,375 0,267 1,111 0,392
Pleno sol : Período seco : Espécie
Cedrella fissilis -0,592 0,132 1,038 0,270 1,587 0,351
Tanto as variáveis separadas como a interação entre elas foram consideradas estatisticamente
significativas para explicar a variação de PB (p<0,05), exceto a interação entre período do ano e espécie
arbórea (χ2=3,379; gl=3; p=0,336). Assim, estimou-se que a forragem à pleno sol apresentou 38% menos
proteína bruta que à sombra, e que as pastagens na seca tiveram 31% menos proteína bruta do que na
chuva. Com relação ao efeito isolado das espécies, a D. odorata foi a que apresentou o maior efeito sobre a
quantidade de proteína bruta, sendo 23% maior que a estimada para C. acacioides e demais espécies.
Analisando os contrastes do teor de PB entre as duas condições de sombreamento pra cada espécie
arbórea, verificamos que houve aumento significativo na sombra para todas as espécies durante a seca
(p<0,05), sendo os teores semelhantes durante a estação chuvosa para cedro e amescla (p>0,05).
Não foi detectada influência significativa do sombreamento sobre a DIV (p= 0,0589). Já o período e
espécie arbórea foram consideradas variáveis que tem influência significativa para explicar a variação da
DIV (p= 0,0023 p= 0,0000, respectivamente). Dentre as espécies estudadas, a forragem sombreada pelo C.
acacioides foi a que apresentou menor DIV. Todas as demais não diferiram estaticamente, sendo a DIV, em
média, 25 a 57% superior ao amarelinho.
Com respeito a disponibilidade de forragem, foi observada vantagem para a pastagem sombreada
no período seco, com destaque para o C. acacioides que produziu disponibilizou 48% a mais forragem sob a
área de copa quando comparado com a pastagem a pleno sol. Esta foi a espécie que também demostrou
maior potencial de manutenção do rendimento da forragem independentemente da época do ano, seja na
chuva ou na seca, enquanto nas demais espécies foram observadas grandes quedas de rendimento entre as
estações do ano, com aumento da porcentagem de material senescente.
Os resultados do estudo permitem identificar vantagens no uso de espécies arbóreas nativas em
pastagens da região norte de Mato Grosso. Para todas as espécies estudadas não foram observados efeitos
negativos como a diminuição da qualidade nutricional da forragem ou sua menor disponibilidade. Desta
forma, todas as espécies se mostraram com potencial para uso em sistemas silvipastoris. Os dados
corroboram com outros trabalhos que indicam importantes contribuições das árvores para manutenção da
fertilidade do solo, incremento da biodiversidade local, formação de corredores ecológicos e melhoria da
produção e qualidade da planta forrageira (PANG et al., 2019; CARVALHO et al., 2018; BERNARDI et al.,
2016; VERGNE et al., 2016; MARTINEZ et al., 2014; CARVALHO et al., 2005).
Entretanto, existe grande variação no desempenho produtivo e nutricional de forrageiras
submetidas ao sombreamento. Características relacionadas a cada espécie forrageira ou cultivar, condições
de solo e manejo a que são submetidas e o nível de sombreamento são alguns dos elementos que
influenciam tanto na produção de MS quanto na qualidade da forragem (MARTUSCELLO et al., 2009). Níveis
mesmo como cercas vivas, podem representar benefícios ecossistêmicos importantes para a pastagem
(PIZARRO et al., 2019), muito embora tais benefícios possam não ser claramente percebidos pelos
produtores.
As espécies envolvidas no presente estudo possuem características consideradas desejáveis para o
consórcio com pastagens, como o crescimento em áreas de média e baixa fertilidade, altura total (com
exceção do C. acacióides) e formato e densidade de copa adequados ao crescimento das plantas forrageiras
(LORENZI, 2000; SALMAN et al., 2008; CECCONELLO et al., 2003). Além disso, são espécies que usos
econômicos adicionais, como madeira para comercialização e/ou uso no estabelecimento rural e uso de
frutos para alimentação animal (OLIVAL et al., 2021, SALMAN et al., 2008). A própria presença destas
espécies nas pastagens da região indica, de forma empírica, a percepção de alguns produtores rurais de
possíveis efeitos positivos no sistema produtivo. Aprofundar a investigação sobre os conhecimentos e
saberes dos produtores a este respeito pode ampliar ainda mais as opções de uso de espécies nativas na
arborização de pastagens.
Os resultados aqui apresentados demonstram a influência positiva do sombreamento para o
conteúdo de proteína da forrageira. Apesar de não ter sido identificado o nível de sombreamento exercido
pelas árvores, tanto as características das árvores amostradas neste estudo, como a condição de
isolamento, distante de outras árvores, determinou um nível de sombreamento intermediário e
intermitente. Em condições de sombreamento moderado usualmente observa-se melhoria da qualidade
nutricional da forrageira, com elevação dos teores de proteína bruta. Este fato está relacionado ao maior
tamanho de folhas e maior tamanho das células, o que resulta em maior conteúdo celular e,
consequentemente, maiores teores de nutrientes intracelulares, como proteínas (PEREIRA et al., 2018,
2017; MOREIRA et al., 2013). Explicações para essa alteração podem estar relacionadas ao atraso no
desenvolvimento ontogenético que ocorre em plantas cultivadas sob sombreamento, prolongando sua fase
vegetativa juvenil e permitindo a manutenção mais elevadas dos níveis metabólicos por maior período de
tempo (SOUSA, 2009). Outro mecanismo pode estar ligado a maior degradação da matéria orgânica e
ciclagem de nitrogênio sob as condições de sombreamento, especialmente quando o componente arbóreo
é constituído por leguminosas (PACIULLO et al., 2017; LEDESMA et al., 2017; WILSON, 1996).
Modificações anatômicas, morfológicas e químicas nas forrageiras em sistemas silvipastoris podem
levar a melhoria na digestibilidade e maior eficiência da fermentação ruminal, com diminuição da produção
de metano e melhor aproveitamento energético da forragem pelo animal (FROTA et al., 2017). No entanto,
estes resultados podem ser variáveis dependendo da forragem e do nível de sombreamento (PACIULLO et
al., 2017). A melhoria do processo de fermentação ruminal pode ainda ser favorecida de forma indireta
pela melhor condição de conforto térmico nos pastos arborizados, levando a melhoria em indicadores de
bem-estar animal, em especial a melhor regulação entre os tempos de ruminação, pastejo e ócio por parte
dos animais (OLIVAL et al., 2020; MANCERA et al., 2018).
Para a otimização ecológica e produtiva, a escolha das espécies para arborizar as pastagens pode
estar embasada nas funções que as diferentes espécies poderão exercer no sistema. Neste sentido, além
do fornecimento de sombra para os animais e madeira, seja para venda ou para uso interno nos
estabelecimentos rurais, pode-se planejar a arborização para o incremento de produtividade das
pastagens, seja pela melhoria na qualidade nutricional da planta forrageira ou na diminuição dos impactos
da sazonalidade, garantindo produção de biomassa de forma mais regular ao longo do ano. A despeito das
limitações metodológicas do presente estudo, dada a dificuldade em encontrar pastagens que atendam aos
critérios de pesquisa, os resultados indicam que todas as espécies estudadas apresentam características
desejáveis para estabelecimento de sistemas silvipastoris biodiversos.
CONCLUSÃO
REFERÊNCIAS
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