You are on page 1of 107

Título VII

Dos Crimes e das Infrações Administrativas

Capítulo I
DOS CRIMES

Seção I
Disposições Gerais

Art. 225. Este Capítulo dispõe sobre crimes praticados contra a criança e o
adolescente, por ação ou omissão, sem prejuízo do disposto na legislação penal.1

1. Disposições gerais: constituem a introdução a uma lei específica ou a um capítulo


especial de um Código ou Estatuto. Porém, precisam ser, em primeiro lugar, normas úteis. Dispor
sobre obviedades não representa introito juridicamente válido. Este é o caso do art. 225 desta Lei.
Não há necessidade de se “explicar” que um capítulo se destina a expor crimes, pois isso é
facilmente detectável por qualquer operador do Direito, bastando visualizar o tipo penal,
composto pelo preceito primário, descrevendo a conduta proibida, acompanhado do preceito
secundário, em que consta a sanção, relativa a reclusão ou detenção, como regra. Em segundo, é
integralmente inócuo afirmar, como se fosse uma autêntica disposição geral, que os delitos
podem ser comissivos (ação) ou omissivos. Finalmente, toda legislação penal especial se vale da
Parte Geral do Código Penal, que, aliás, assim dispõe no seu art. 12. A elaboração de leis, no
Brasil, precisa, urgentemente, de técnica e objetividade.
Art. 226. Aplicam-se aos crimes definidos nesta Lei as normas da Parte Geral do
Código Penal e, quanto ao processo, as pertinentes ao Código de Processo Penal. 2

2. Aplicação subsidiária: o dispositivo é inócuo, pois óbvio. Especifica-se que os delitos


previstos neste Estatuto se valerão da Parte Geral do Código Penal e, quanto ao processo, do
Código de Processo Penal. E não poderia ser diferente. Na verdade, poucas são as reformas que
criam normas realmente importantes. Na jurisprudência: TJGO: “O STJ firmou o entendimento
de que, uma vez aplicada medida socioeducativa sem termo final, deve ser considerado o período
máximo de 3 anos de duração da medida de internação, previsto no art. 121, § 3º, do ECA (STJ,
HC340.073/SP, DJe 15/02/2016). Logo, nos termos dos arts. 109, IV, c/c o art. 115 do CP, apenas
declarar-se-ia extinta a punibilidade desde que superado o lapso de 4 anos, o que não é o caso.
Nulidade do processo por violação devido processo legal. Inexistente prejuízo, não há falar-se em
nulidade, conforme disposto no artigo 563 do CPP, aplicável à espécie por força do artigo 226 da
Lei 8.069/90 (...)” (Ap. 162281-75.2010.8.09.0049-GO, 2ª Câmara Criminal, rel. Edison Miguel
da Silva Jr., 14.02.2017, v.u.).
Art. 227. Os crimes definidos nesta Lei são de ação pública incondicionada.3
3. Ação pública incondicionada: para quem é da área criminal, o disposto neste artigo
é inútil. Para quem não é e não conhece penal e processo penal, pode se tratar de norma
fundamental. A realidade, pura e simples, é que todo tipo penal que não acusar, expressamente,
tratar-se de ação privada (“somente se procede mediante queixa”) ou de ação pública
condicionada (“somente se procede mediante representação da vítima” ou “somente se procede
mediante requisição do Ministro da Justiça”) é ação pública incondicionada. E esta significa que
o Ministério Público pode agir, propondo a ação penal, independentemente de qualquer condição.
Naturalmente, para o ajuizamento da demanda criminal, não basta o convencimento do órgão
acusatório, mas é preciso existir prova pré-constituída, evidenciando a materialidade (prova da
existência do crime) e indícios suficientes de autoria. Por outro lado, mesmo se tratando de ação
pública incondicionada, permite-se a propositura da ação civil subsidiária da pública, pela vítima,
quando o Ministério Público não agir, no prazo legal.
Art. 227-A. Os efeitos da condenação prevista no inciso I do caput do art. 92 do
Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), para os crimes
previstos nesta Lei, praticados por servidores públicos com abuso de autoridade, são
condicionados à ocorrência de reincidência.3-A
Parágrafo único. A perda do cargo, do mandato ou da função, nesse caso,
independerá da pena aplicada na reincidência.

3-A. Facilitação da perda do cargo, função ou mandato: especifica o art. 92, I, do


Código Penal, o seguinte: “são também efeitos da condenação: I – a perda de cargo, função
pública ou mandato eletivo: a) quando aplicada pena privativa de liberdade por tempo igual ou
superior a um ano, nos crimes praticados com abuso de poder ou violação de dever para com a
Administração Pública; b) quando for aplicada pena privativa de liberdade por tempo superior a
4 (quatro) anos nos demais casos”. Em vez de manter a perda do cargo, função ou mandato tal
como delineado no referido art. 92, I, do CP, quando houver abuso de autoridade, mormente no
contexto dos crimes previstos no Estatuto da Criança e do Adolescente, dá-se uma chance mais
extensa ao criminoso. Ele somente sofrerá os efeitos descritos no Código Penal quando houver
reincidência. Pelo menos, havendo a reincidência já não importará o montante da pena, como
preceitua o parágrafo único.

Seção II
Dos Crimes em Espécie4

4. Comentários aos crimes previstos neste Estatuto: já o fizemos em nossa


obra Leis penais e processuais comentadas. Portanto, para manter esta obra completa,
transportamos o exposto naquela obra para este trabalho, com eventuais acréscimos.
Art. 228. Deixar5-7 o encarregado de serviço ou o dirigente de estabelecimento de
atenção à saúde de gestante de manter registro das atividades desenvolvidas, na forma
e prazo referidos no art. 10 desta Lei, bem como de fornecer à parturiente ou a seu
responsável, por ocasião da alta médica, declaração de nascimento, onde constem as
intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato:8-9
Pena – detenção de seis meses a dois anos.10
Parágrafo único. Se o crime é culposo:11
Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa.12

5. Análise do núcleo do tipo: deixar (não considerar, omitir) é a conduta central, que
se une aos outros verbos manter (conservar ou preservar) e fornecer (entregar algo a alguém). Os
objetos são o registro das atividades desenvolvidas nos estabelecimentos de saúde e o
fornecimento de declaração de nascimento, com anotações sobre as intercorrências do parto e
desenvolvimento do neonato (recém-nascido). Cuida-se de um tipo remetido, embora de redação
criticável. Faz-se menção à obrigação de se manter registro das atividades desenvolvidas nos
estabelecimentos de saúde, na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei, para onde se remete,
então, o interessado em conhecer os detalhes acerca do tipo penal. Porém, na segunda parte,
insere-se a obrigação de fornecimento à parturiente ou seu responsável da declaração de
nascimento com os dados necessários, algo que também faz parte do descrito no art. 10 da Lei
8.069/90. Portanto, a expressão na forma e prazo referidos no art. 10 desta Lei deveria ter sido
deslocada para o final do tipo penal e sem necessidade de repetir parcela do art. 10 no texto do
próprio art. 228, caput, desta Lei. Essa redação é remetida, e, ao mesmo tempo, tautológica. O
objetivo, no entanto, é criminalizar a conduta daqueles que devem cumprir o disposto no art. 10
e não o fizerem, dolosa ou culposamente. Preceitua o art. 10 da Lei 8.069/90 o seguinte: “Os
hospitais e demais estabelecimentos de atenção à saúde de gestantes, públicos e particulares, são
obrigados a: I – manter registro das atividades desenvolvidas, através de prontuários individuais,
pelo prazo de 18 (dezoito) anos; II – identificar o recém-nascido mediante o registro de sua
impressão plantar e digital e da impressão digital da mãe, sem prejuízo de outras formas
normatizadas pela autoridade administrativa competente; III – proceder a exames visando ao
diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido, bem como prestar
orientação aos pais; IV – fornecer declaração de nascimento onde constem necessariamente as
intercorrências do parto e do desenvolvimento do neonato; V – manter alojamento conjunto,
possibilitando ao neonato a permanência junto à mãe; VI – acompanhar a prática do processo de
amamentação, prestando orientações quanto à técnica adequada, enquanto a mãe permanecer na
unidade hospitalar, utilizando o corpo técnico já existente”. Vale ressaltar que o tipo incriminador
do art. 228 leva em consideração, em relação ao mencionado art. 10, apenas a não mantença de
registro das atividades desenvolvidas e o não fornecimento de declaração de nascimento, com as
anotações importantes. Porém, não se incluem, nesse tipo, a identificação do recém-nascido
(inciso II do art. 10), a realização de exames para orientar os pais (inciso III do art. 10), nem
mesmo a obrigação de manter alojamento conjunto do filho com a mãe (inciso V do art. 10) e o
acompanhamento da prática do processo de amamentação, prestando orientações quanto à técnica
adequada, enquanto a mãe permanecer na unidade hospitalar, utilizando o corpo técnico já
existente (inciso VI do art. 10). Preferiu o legislador, valendo-se de critérios contestáveis, pois
idênticas são as penas, criar outro tipo penal (art. 229). Cremos que, por uma questão de melhor
sistematização, todas as figuras referentes ao art. 10 deveriam estar concentradas em um só tipo
incriminador. Sem criminalização, entretanto, restou a parte concernente à mantença de
alojamento conjunto para mãe e recém-nascido (inciso V do art. 10). Outro ponto relevante a
salientar é quanto ao verbo manter, normalmente considerado ícone do crime
denominado habitual. No caso do art. 228 desta Lei, foge-se à regra, justamente pela sua
conjugação com o verbo deixar. Não se trata, pois, de manter (sustentar, prover) registro
simplesmente, auferindo um caráter de habitualidade, mas de não cumprir a obrigação de anotar
ou registrar a atividade desenvolvida. Logo, uma só vez que tal não se dê, desde que por dolo ou
culpa, pode configurar-se o delito.
6. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo somente pode ser o encarregado do serviço
ou o dirigente do estabelecimento de saúde, que lide com a gestante, porém, a depender de cada
lugar, torna-se curial buscar o efetivo responsável pela realização dos registros das atividades
desenvolvidas. Em suma, não se pode pretender a criminalização de eventual omissão de um
diretor do hospital, se a este não cabe o controle do setor de registro das várias ações ali
desenvolvidas. Por isso, quando a lei faz referência ao dirigente do estabelecimento, quer-se crer
ser o responsável pelo encarregado das anotações. Em outros termos, pode-se punir o dirigente
que, dolosa ou culposamente, deixa de determinar o registro; ou, tomando ciência de que o
registro não é feito, podendo interferir para regularizar a situação, aceita a omissão como algo
natural. A punição do encarregado do serviço de registro é mais fácil, pois de maior visibilidade.
A do dirigente é complexa, uma vez que depende de prova de seu conhecimento da carência dos
registros obrigatórios, aceitando-a como normal. O sujeito passivo principal, em nosso
entendimento, é a criança recém-nascida. Lembremos que já é pessoa humana, logo, sujeito de
direitos. Note-se que é a ela que se volta o Estatuto da Criança e do Adolescente nesse tópico. O
registro das atividades é guardado por 18 anos, quando a pessoa humana atinge a maioridade.
Além disso, a declaração de nascimento interessa, em primeiro plano, a quem nasceu, até pelo
fato de que, no futuro, qualquer problema de saúde, advindo do parto, será igualmente do seu
interesse. Como sujeitos passivos secundários, estão a parturiente e seu eventual responsável.
Aliás, permitimo-nos incluir, também, o pai do recém-nascido, outro interessado na declaração
de nascimento de seu filho, contendo todas as intercorrências do parto e do desenvolvimento do
neonato.
7. Elemento subjetivo: é o dolo ou a culpa, conforme o caso (caput ou parágrafo único).
Não há elemento subjetivo específico.
8. Objetos material e jurídico: os objetos materiais são o registro das atividades
desenvolvidas (por qualquer forma viável: livros, cadernos, fichas, CD, DVD, disco rígido de
computador etc.) e a declaração de nascimento. O objeto jurídico é a proteção à vida e à saúde da
criança.
9. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido por pessoa qualificada, conforme
indicação feita no tipo); formal (independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente
em efetivo prejuízo à criança ou aos seus pais); de forma vinculada (só pode ser cometido pelos
modos aventados no tipo, inclusive em face da referência feita ao art. 10 desta Lei); omissivo (os
verbos implicam inações); instantâneo (a consumação se dá em momento determinado), porém,
na primeira modalidade, cuida-se da figura do crime instantâneo de efeitos permanentes, pois o
reflexo do não registro se prolonga no tempo; de perigo abstrato (presume-se o prejuízo à criança,
caso as condutas do tipo sejam praticadas); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa);
unissubsistente (praticada em um ato), como típico crime omissivo que é; não admite tentativa,
pois delito omissivo e unissubsistente.
10. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, nas formas dolosa e
culposa, cabendo transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
11. Culpa: é o comportamento descuidado, que infringe o dever de cuidado objetivo,
gerando resultado involuntário, previsível, embora não previsto (forma inconsciente) ou previsto,
mas esperando não aconteça (forma consciente), que poderia ter sido evitado. Segundo o art. 18,
II, do Código Penal, a culpa se divide em imprudência (conduta comissiva e desatenciosa),
negligência (conduta omissiva em face da desatenção) ou imperita (conduta de quem deveria ser
especialista em determinada área, mas exerce a atividade sem o conhecimento necessário).
12. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, nas formas dolosa e
culposa, cabendo transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 229. Deixar13-15 o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de
atenção à saúde de gestante de identificar corretamente o neonato e a parturiente, por
ocasião do parto, bem como deixar de proceder aos exames referidos no art. 10 desta
Lei:16-17
Pena – detenção de seis meses a dois anos.18
Parágrafo único. Se o crime é culposo:19
Pena – detenção de dois a seis meses, ou multa.20

13. Análise do núcleo do tipo: deixar (não considerar, omitir) é o verbo central, que se
associa aos outros dois: identificar (determinar o conjunto de características individuais de uma
pessoa, de modo a torná-la única) e proceder (realizar, concretizar). Há, pois, em relação às
condutas obrigatórias previstas no art. 10 desta Lei, duas figuras típicas a merecer análise: a) a
omissão do médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de saúde quanto à identificação
do neonato e sua mãe, por ocasião do parto; b) a omissão das mesmas pessoas em relação aos
exames visando ao diagnóstico e terapêutica de anormalidades no metabolismo do recém-nascido.
O tipo também é remetido, nos moldes do art. 228. Contém idêntica formulação equivocada.
Deveria referir-se ao art. 10 da Lei 8.069/90 nas duas condutas. Se assim tivesse feito, evitaria o
uso da dúbia palavra corretamente, prevista na primeira parte. O que significa identificar o
neonato e a parturiente corretamente? É natural que o termo é impróprio para a taxatividade que
o tipo incriminador exige, além de ser frugal. Melhor seria a referência feita, de modo mais
apurado, no art. 10: “(...) mediante o registro de sua impressão plantar e digital e da impressão
digital da mãe, sem prejuízo de outras formas normatizadas pela autoridade administrativa
competente”. É assim que se identifica corretamente alguém. Além disso, abrir-se-ia espaço para
uma norma penal em branco, levando-se em conta as regras normatizadas pela autoridade
administrativa competente. Do modo como ficou redigido, tornou-se o
termo corretamente sujeito a interpretações variadas, incompatíveis com a segurança exigível de
um tipo penal. Entretanto, devemos utilizar o disposto no art. 10 desta Lei para lhe dar um sentido
razoável. O importante é identificar o neonato pela impressão plantar e digital, assim como de sua
mãe, para evitar os transtornos lamentáveis trazidos pela eventual “troca de bebês”.
14. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo somente pode ser o médico, enfermeiro ou
dirigente de estabelecimento de atenção à saúde da gestante. Cremos que o tipo penal deveria ter
sido mais aberto, como se previu no art. 228. Olvidou-se o encarregado pelo estabelecimento de
fazer a identificação e os exames. Não necessariamente há de ser o médico ou o enfermeiro e
muito menos o dirigente do estabelecimento a fazê-lo pessoalmente. Quanto ao dirigente, valem
as mesmas observações já traçadas anteriormente, ou seja, depende da sua ciência a respeito da
não identificação ou não realização dos exames, com sua concordância expressa ou tácita, porém
dolosa ou culposa. Dificilmente, será o dirigente incriminado pela conduta pessoal e direta em
relação a tais atividades, que não são da sua alçada, como regra. Quanto ao médico, deve
prescrever os exames, mas outro profissional pode ser o encarregado de concretizá-lo. Por isso, o
tipo é falho. Se o médico determinar, mas alguém não fizer, torna-se impune, por falta de previsão
legal. Por outro lado, é possível que o médico determine ao enfermeiro e este não realize o exame
necessário. Nesse caso, será responsabilizado criminalmente, se agir com dolo ou culpa. Não se
pode usar a figura genérica do art. 13, § 2.º, do Código Penal, para atingir outra pessoa, não
prevista no art. 229, pois este é um tipo penal especial, que afasta a norma geral. O sujeito passivo,
na primeira figura, é duplo: o neonato e a parturiente; na segunda, somente o recém-nascido.
Secundariamente, encontra-se o pai da criança, também vítima do sofrimento causado pela
eventual troca de bebês ou pelo advento de algum mal ao seu filho, caso os exames indispensáveis
não sejam realizados.
15. Elemento subjetivo: é o dolo ou a culpa, conforme o caso (caput e parágrafo único).
Não há elemento subjetivo específico.
16. Objetos material e jurídico: o objeto material é o neonato e a parturiente, quando
não identificados, bem como o recém-nascido, privado dos exames necessários. O objeto jurídico
é a proteção ao estado de filiação.
17. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido por pessoa qualificada,
conforme indicação feita no tipo); formal (independe da ocorrência de resultado naturalístico,
consistente em efetivo prejuízo à criança ou aos seus pais); de forma vinculada (só pode ser
cometido pelos modos aventados no tipo, inclusive em face da referência feita ao art. 10 desta
Lei); omissivo (os verbos implicam em inações); instantâneo (a consumação se dá em momento
determinado); de perigo abstrato (presume-se o prejuízo à criança, caso as condutas do tipo sejam
praticadas); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente (praticada em
um ato), como típico crime omissivo que é; não admite tentativa, pois omissivo e unissubsistente.
18. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, nas formas dolosa e
culposa, cabendo transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
19. Culpa: é o comportamento descuidado, que infringe o dever de cuidado objetivo,
gerando resultado involuntário, previsível, embora não previsto (forma inconsciente) ou previsto,
mas esperando não aconteça (forma consciente), que poderia ter sido evitado. Segundo o art. 18,
II, do Código Penal, a culpa se divide em imprudência (conduta comissiva e desatenciosa),
negligência (conduta omissiva em face da desatenção) ou imperita (conduta de quem deveria ser
especialista em determinada área, mas exerce a atividade sem o conhecimento necessário).
20. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, nas formas dolosa e
culposa, cabendo transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 230. Privar21-23 a criança ou o adolescente de sua liberdade, procedendo à sua
apreensão24 sem estar em flagrante de ato infracional ou inexistindo ordem escrita da
autoridade judiciária competente:25-26
Pena – detenção de seis meses a dois anos.27
Parágrafo único. Incide na mesma pena aquele que procede à apreensão sem
observância das formalidades legais.28

21. Análise do núcleo do tipo: privar (tolher, tirar o gozo de algo) é o núcleo do tipo,
possuindo como objeto a liberdade de locomoção (ir, vir e ficar) da pessoa humana, no caso a
criança ou o adolescente. É uma modalidade branda de crime de sequestro ou cárcere privado,
especialmente previsto na Lei 8.069/90. Porém, não se confunde com o crime do art. 148 do
Código Penal, em particular com a figura qualificada prevista no art. 148, § 1.º, IV. Cuida-se de
figura mais amena que a prevista no Código Penal, envolvendo somente a apreensão de menor
de 18 anos, sem flagrante ou ordem judicial. Apreender significa, nesse caso, prender, mas não
colocar em cárcere. É uma das formas de se evitar a chamada prisão para averiguação, que, no
caso do menor de 18 anos, seria a apreensão para averiguação. Em outros termos, quem fizer a
apreensão do menor, sem as formalidades legais (cf. art. 106 desta Lei), incide na figura do art.
230. Aquele que privar o menor de 18 anos de sua liberdade, inserindo-o em cárcere, deve
responder pelo art. 148, § 1.º, IV, do Código Penal, com pena mais grave. Insistimos: a mera
apreensão (retenção, prisão por algumas horas, detenção para averiguação) configura o delito do
art. 230; outras formas mais duradouras de privação de liberdade equivalem, em nosso
entendimento, ao sequestro ou cárcere privado. Aliás, não teria o menor sentido uma lei de
proteção à criança ou adolescente considerar infração de menor potencial ofensivo a privação
ilegal e duradoura da liberdade do menor de 18 anos, prevendo pena de detenção, de seis meses
a dois anos, enquanto o Código Penal comina pena de reclusão, de dois a cinco anos. Vale registrar
o disposto no art. 106 desta Lei: “Nenhum adolescente será privado de sua liberdade senão em
flagrante de ato infracional ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária
competente. Parágrafo único. O adolescente tem direito à identificação dos responsáveis pela sua
apreensão, devendo ser informado acerca de seus direitos”.
22. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo
é a criança ou adolescente.
23. Elemento subjetivo: é o dolo. Não se pune a forma culposa, nem existe elemento
subjetivo específico. Conferir: TJSC: “Agindo o acusado impelido por intento outro que não o de
privar o menor da sua liberdade, não se configura crime do art. 230 do ECA, por faltar o elemento
subjetivo que o constitui, ou seja, a vontade livre e consciente de privar alguém de sua liberdade
de locomoção” (Apelação 2000.008079-9, 1.ª Câm. Criminal, rel. Genésio Nolli, 15.08.2000).
24. Elementos normativos: ao mencionar que a privação da liberdade se dá por meio
de apreensão do menor, queremos crer, como já expusemos em nota anterior, tratar-se de uma
detenção momentânea, mas não uma inserção em cativeiro ou cárcere. Há quem abuse do poder
(especialmente funcionários públicos), em relação a menores de 18 anos, apreendendo-os, como
se fossem seres humanos privados de direitos, unicamente por não serem, ainda, adultos. Soltam,
na sequência, mas não havia estado de flagrância ou ordem judicial. É o que se busca evitar com
a figura típica do art. 230.
25. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a liberdade de locomoção da criança ou do adolescente.
26. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); material
(depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente na efetiva privação da liberdade,
ainda que momentânea, da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por
qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica em ação), excepcionalmente,
comissivo por omissão (art. 13, § 2.º, CP); permanente (a consumação se prolonga, enquanto
durar a apreensão); de dano; unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa);
plurissubsistente (praticada em vários atos); admite-se a tentativa, embora de rara configuração,
até pelo fato de se cuidar de privação momentânea da liberdade.
27. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
28. Figura correlata: a privação da liberdade, ainda que momentânea, sob pena de incidir
a figura típica mais grave do art. 148, § 1.º, IV, do Código Penal, quando realizada
sem outras formalidades legais, diversas das que foram mencionadas no caput (estar em flagrante
de ato infracional ou inexistir ordem escrita de autoridade judiciária competente), dá margem à
aplicação do art. 230, parágrafo único. Nos arts. 106, parágrafo único, 107 e 109 da Lei 8.069/90,
podemos encontrar outros exemplos de formalidades a serem respeitadas para a apreensão de um
menor.
Art. 231. Deixar 29-31
a autoridade policial responsável pela apreensão de criança ou
adolescente de fazer imediata comunicação à autoridade judiciária competente e à
família do apreendido ou à pessoa por ele indicada:32-33
Pena – detenção de seis meses a dois anos.34

29. Análise do núcleo do tipo: deixar (omitir, não considerar) é o núcleo do tipo,
chamando como complemento a imediata comunicação (transmissão de notícia de modo urgente)
ao juiz, à família do menor ou a outra pessoa por ele indicada. No caso deste artigo, nota-se que
a apreensão ocorre em situação de flagrante de ato infracional, pois, do contrário, incidiria a figura
do art. 230 ou mesmo o crime do art. 148, § 1.º, IV, do Código Penal. Não se trata, ainda, da
aplicação do art. 230, parágrafo único, pois é situação alheia ao flagrante. Outro ponto merece
destaque: cuida-se, realmente, de estado de flagrância, pois se menciona a comunicação à
autoridade judiciária competente. Logo, não pode a ordem partir do juiz. Com relação a crianças
e adolescentes, aplica-se o art. 231 desta Lei.
30. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é a autoridade policial. Devemos entender
tratar-se somente do delegado de polícia. Este seria a autoridade policial autêntica. Investigadores
de polícia ou detetives, bem como policiais militares, devem ser considerados apenas agentes da
autoridade policial, conforme o caso. Assim, a figura típica destina-se à autoridade que lavrou o
termo de apreensão e deixou de fazer as comunicações exigidas por lei. Outros policiais que
tenham apreendido o menor, sem as formalidades legais, devem ser inseridos em tipos diversos.
O sujeito passivo é a criança ou adolescente.
31. Elemento subjetivo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo do tipo específico,
nem se pune a forma culposa. Se a comunicação deixar de ser feita por negligência ou outra causa
correlata, deve a autoridade policial responder, somente, na órbita administrativa.
32. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a proteção à liberdade de locomoção da criança ou do adolescente.
33. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido pela autoridade policial); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a criança
ou adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente);
omissivo (os verbos conjugados implicam em inação); instantâneo (a consumação se dá em
momento determinado); de perigo abstrato (presume-se prejuízo à criança e ao adolescente);
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente (praticada em um ato, como
é típico do delito omissivo próprio); não admite tentativa.
34. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 232. Submeter35-37 criança ou adolescente sob sua autoridade, guarda ou
vigilância a vexame ou a constrangimento:38-39
Pena – detenção de seis meses a dois anos.40

35. Análise do núcleo do tipo: submeter (sujeitar, subjugar) é o núcleo do tipo, que se
conjuga a vexame (vergonha, ultraje) ou constrangimento (situação de violência ou coação
psicológica). O objeto dessa conduta é a criança ou o adolescente. Não se deve levar em conta a
lei de abuso de autoridade, pois prevalece o art. 232, por se tratar de lei especial em relação àquela.
Deve estar o menor, no caso do tipo do art. 232, legalmente sob custódia, guarda ou vigilância;
do contrário, outras figuras típicas de privação da liberdade incidirão. Esse tipo penal é
demasiadamente aberto, ferindo o princípio da taxatividade. Contém dois elementos normativos
– vexame e constrangimento –, cuja valoração cultural é muito vaga, não se coadunando com a
segurança exigida pelo princípio da legalidade. Na jurisprudência: STJ: “3. Neste caso, imputa-
se ao paciente a conduta descrita no art. 232 do Estatuto da Criança e do Adolescente, porque ele
teria causado constrangimento a um adolescente, durante uma aula de História. 4. A conduta
narrada, embora possa, até certo ponto, ser considerada reprovável, não é suficiente para justificar
seu enquadramento no tipo penal em discussão. De fato, não se consegue extrair dos autos a
prática de atos que expressam a submissão da vítima a situação evidente de vexame e humilhação.
A controvérsia girou em torno de questionamentos sobre a análise histórico-política de
determinada época nos EUA (ideologias e opiniões pessoais). Exame da jurisprudência do STJ a
respeito do art. 232 do ECA. Distanciamento da hipótese vertente. 5. Por mais que se vislumbre
eventual excesso na conduta acadêmica do docente, não parece razoável a atribuição de
responsabilidade criminal pelos fatos aqui narrados. Não se ignora a possibilidade de
sancionamento da conduta por outros ramos do Direito. Porém, não se pode perder de vista que a
lei penal não deve ser invocada para atuar em hipóteses desprovidas de significação social-
criminal, razão pela qual o princípio da intervenção mínima surge para atuar como instrumento
de interpretação restrita do tipo penal. 6. Habeas corpus não conhecido. Ordem concedida de
ofício para determinar o trancamento da Ação Penal n. 0133059-42.2018.8.05.0001, ajuizada em
desfavor do paciente, confirmando a liminar” (HC 548.875/BA, 5.ª Turma, rel. Reynaldo Soares
da Fonseca, DJe 19.12.2019). TJSP: “Revisão criminal. Art. 218-B do Código Penal. Pleito de
desclassificação para o art. 232 do ECA. Necessidade. Genitor que obrigava a filha, maior de 14
anos de idade, a presenciar e registrar em vídeo relações sexuais homossexuais extraconjugais
praticadas com o corréu. Inexistência de exploração sexual da ofendida. Necessária interpretação
analógica da expressão exploração sexual, devendo ser interpretada como situação similar à
prostituição, exigindo a prática de atos libidinosos pela vítima ou com a vítima. O ato de registrar
a prática libidinosa não se configura em exploração sexual. Ademais, sendo a vítima maior de 14
anos, não se tipifica no art. 218-A do CP. Correta a desclassificação para o art. 232 do ECA, posto
ter sido a ofendida submetida a constrangimento. Gravidade concreta da conduta. Pena-base
fixada no patamar máximo, em 2 anos de detenção, posto ter sido a conduta revestida de grave
ameaça. Regime semiaberto mantido. Revisão criminal julgada procedente” (Revisão Criminal
2167280-98.2019.8.26.0000. 8.º Grupo de Direito Criminal, rel. Guilherme de Souza Nucci, j.
12.06.2020). TJRS: “1. Ré que, na condição de mãe da vítima, posa para fotografia, juntamente
com seu marido e filho de 5 anos, em uma banheira de motel, e omite-se com relação à exposição
em rede social, pratica o crime previsto no art. 232 do ECA. 2. Prova produzida nos autos que
comprova a presença das elementares do tipo penal” (Recurso Crime 71008081010, Turma
Recursal Criminal, rel. Keila Lisiane Kloeckner Catta-Preta, j. 10.12.2018, v.u.). TJGO: “1 –
Comprovadas a materialidade e autoria do crime de estupro de vulnerável, maus-tratos e
submissão de criança a constrangimento (artigos 136 e 217-A do Código Penal e 232 do ECA),
impossível acolher o pleito absolutório, mesmo porque a palavra da vítima, ainda que menor,
quando corroborada com outros elementos de provas, adquire grande valor probante. Aplicação
do princípio da consunção entre os crimes de maus-tratos e submissão de criança a
constrangimento. Inviabilidade. 2 – Sendo o apelante condenado por delitos autônomos, previstos
nos artigos 136 do CP e 232 do ECA, e presente a pluralidade de condutas e de resultados lesivos,
torna-se inconcebível o reconhecimento do princípio da consunção (...)” (Ap. Crim. 128034-
92.2016.8.09.0167-GO, 1ª Câmara Criminal, rel. Eudelcio Machado Fagundes, 15.08.2017, v.u.).
TJSC: “A conduta do agente que passa as mãos na vítima, embora reprovável, quando não
evidenciado o intento lascivo de forma segura, configura o crime do artigo 232 da Lei 8.069/90,
que protege a integridade física, moral e psicológica da criança ou adolescente. O crime previsto
no artigo 232 da Lei 8.069/1990 é específico e prevalece sobre a contravenção penal disposta no
artigo 65 do Decreto-Lei 3.688/1941 quando o caso envolver criança ou adolescente” (Ap. Crim.
0006081-78.2012.8.24.0008-SC, 1ª Câmara Criminal, rel. Carlos Alberto Civinski, 27.07.2017,
v.u.).
35-A. Desclassificação proveniente do art. 217-A do CP: tem-se utilizado a
jurisprudência do art. 232 deste Estatuto, o que, com a devida vênia, é um equívoco. Se houver
desclassificação, deve dirigir-se à contravenção penal de importunação ofensiva ao pudor. O art.
232 não cuida de nenhum objeto jurídico de natureza sexual. Em sentido oposto: STJ: “1. Segundo
a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, ‘o delito de estupro de vulnerável se consuma
com a prática de qualquer ato de libidinagem ofensivo à dignidade sexual da vítima, incluindo
toda ação atentatória contra o pudor praticada com o propósito lascivo, seja sucedâneo da
conjunção carnal ou não, evidenciando-se com o contato físico entre o agente e a vítima durante
o apontado ato voluptuoso’ (HC 264.482/RJ, rel. Min. Gurgel de Faria, 5.ª T., j.
23.06.2015, DJe 03.08.2015). Assim, o crime de estupro de vulnerável, na redação dada pela Lei
12.015/2009, configura-se quando o agente mantém conjunção carnal ou qualquer ato libidinoso
contra menor de 14 (catorze) anos, sendo irrelevante, ainda, o consentimento da vítima. 2. O
Tribunal a quo, segundo as circunstâncias específicas do caso, concluiu pela desclassificação do
segundo fato para o crime do art. 232 do ECA, uma vez que não ficou comprovado o dolo inerente
ao atentado violento ao pudor, pois ‘a prova colacionada indica que a conduta não revelou luxúria
e desejo incontido’. 3. Para modificar o entendimento do Tribunal de origem e afastar
desclassificação operada quanto ao segundo fato, seria imprescindível a incursão no conjunto
fático-probatório e nos elementos de convicção dos autos, o que é vedado em sede de recurso
especial a teor do enunciado da Súmula 7/STJ: ‘A pretensão de simples reexame de prova não
enseja recurso especial’. 4. Agravo regimental improvido” (AgRg no REsp 1589420 – GO, 5.ª T.,
rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 24.05.2016, v.u.).
36. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo somente pode ser a pessoa que possua
autoridade, guarda ou poder de vigilância em relação à criança ou ao adolescente. Assim, tanto
pode ser o pai, como o agente do Estado que cuide do menor, tudo a depender do caso concreto.
O sujeito passivo é a criança ou o adolescente.
37. Elemento subjetivo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo do tipo específico,
nem se pune a forma culposa. Conferir: TJGO: “Não há previsão de modalidade culposa, sendo
o tipo subjetivo formado pelo dolo, consistente na vontade consciente de submeter criança ou
adolescente a vexame ou constrangimento. Então, para a subsunção da conduta ao tipo penal, não
basta a ocorrência de vexame ou constrangimento” (Ap. Crim. 25146-65.2012.8.09.0044-GO, 2ª
Câmara Criminal, rel. Edison Miguel da Silva Jr., 16.02.2017, v.u.).
38. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a proteção às integridades física e moral da criança e do adolescente.
39. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido pela pessoa qualificada,
indicada no tipo); material (depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente na
efetiva prática de ato que exponha a criança ou o adolescente a vexame ou constrangimento); de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica
em ação); instantâneo (a consumação se dá em momento determinado), porém pode transformar-
se em permanente, caso a situação constrangedora ou vexatória seja mantida sem qualquer
interrupção; de dano; unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente
(praticada em um só ato) ou plurissubsistente (praticada em vários atos), conforme o meio eleito
pelo autor; admite tentativa na forma plurissubsistente.
40. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 233. (Revogado pela Lei 9.455/1997.)
Art. 234. Deixar 41-43
a autoridade competente, sem justa causa,44 de ordenar a
imediata45 liberação de criança ou adolescente, tão logo tenha conhecimento da
ilegalidade da apreensão:46-47
Pena – detenção de seis meses a dois anos.48

41. Análise do núcleo do tipo: deixar (omitir, não considerar) associa-se


a ordenar (mandar que se faça algo), tendo por objeto a liberação imediata da criança ou
adolescente. Portanto, cuida-se de um tipo penal voltado, primordialmente, ao juiz, como regra.
Em segundo plano, ao delegado de polícia. Se a apreensão é feita formalmente pela autoridade
policial, cabe a esta oficiar ao magistrado, dando-lhe ciência (se não o fizer, pode incidir a figura
prevista no art. 231 desta Lei). Se o juiz deixar de determinar a liberação, caso ilegal a apreensão,
agindo com dolo, configura-se o crime do art. 234. Secundariamente, pode atuar o delegado de
polícia, ao tomar conhecimento, por exemplo, de apreensão feita por subordinado seu, sem estado
de flagrância, como na hipótese prevista no art. 230 desta Lei. Deve ordenar a liberação imediata
do menor e tomar as providências para punir o responsável pela ilegal apreensão. Dentro das
atribuições constitucionais e legais, vislumbramos somente o juiz e o delegado como sujeitos
ativos dessa modalidade de crime.
42. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é, principalmente, o magistrado.
Secundariamente, o delegado de polícia. O sujeito passivo é a criança ou adolescente.
43. Elemento subjetivo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo do tipo específico,
nem se pune a forma culposa.
44. Elementos normativos: a expressão sem justa causa faz parte do campo da licitude
ou ilicitude da conduta. Porém, trazido para o contexto do tipo penal, caso a apreensão do menor
tenha preenchido as formalidades legais, em lugar de se cuidar de um estrito cumprimento do
dever legal, passa a ser fato atípico. Portanto, quando a apreensão for juridicamente correta, é
natural que a autoridade possa deixar de ordenar a liberação imediata.
45. Imediatidade: é outro elemento normativo que depende de valoração. Tratando-se de
privação da liberdade, mormente ilegal, deve-se dar ao termo interpretação literal, vale dizer,
imediato é urgente, feito no momento, sem qualquer tipo de delonga.
46. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a proteção à liberdade de locomoção da criança ou do adolescente.
47. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido pela autoridade competente em
dar ordem à liberação); material (depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em
efetivo prejuízo para a criança ou adolescente no que toca ao seu direito de ir, vir e ficar); de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); omissivo (os verbos
conjugados implicam em inação); permanente (a consumação se protrai no tempo, enquanto
durem a privação ilegal e a possibilidade de ordem para a liberação); de dano; unissubjetivo (pode
ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente (praticada em um ato, como é típico do delito
omissivo próprio); não admite tentativa.
48. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 235. Descumprir,49-51 injustificadamente,52 prazo fixado nesta Lei em benefício
de adolescente privado de liberdade:53-54
Pena – detenção de seis meses a dois anos.55

49. Análise do núcleo do tipo: descumprir (deixar de executar ou tornar algo efetivo)
é a conduta nuclear, cujo objeto é prazo relativo à privação da liberdade de adolescente. Em outros
termos, há sempre um período de tempo máximo, em que se pode deter o adolescente, aplicando-
lhe medidas socioeducativas ou por mera cautela. A Lei 8.069/90 estabelece tais prazos e prevê,
como figura típica incriminadora, a sua inobservância. Ilustrando, podemos conferir alguns prazos
estabelecidos no Estatuto da Criança e do Adolescente: a) “a internação, antes da sentença, pode
ser determinada pelo prazo máximo de quarenta e cinco dias” (art. 108, caput); b) “o prazo
máximo e improrrogável para a conclusão do procedimento, estando o adolescente internado
provisoriamente, será de quarenta e cinco dias” (art. 183); c) “a internação constitui medida
privativa da liberdade, sujeita aos princípios de brevidade, excepcionalidade e respeito à condição
peculiar de pessoa em desenvolvimento. (...) § 2.º A medida não comporta prazo determinado,
devendo sua manutenção ser reavaliada, mediante decisão fundamentada, no máximo a cada 6
(seis) meses. § 3.º Em nenhuma hipótese o período máximo de internação excederá a 3 (três) anos.
§ 4.º Atingido o limite estabelecido no parágrafo anterior, o adolescente deverá ser liberado,
colocado em regime de semiliberdade ou de liberdade assistida. § 5.º A liberação será compulsória
aos vinte e um anos de idade. § 6.º Em qualquer hipótese a desinternação será precedida de
autorização judicial, ouvido o Ministério Público. (...)” (art. 121); d) não havendo liberação do
menor, “a autoridade policial encaminhará, desde logo, o adolescente ao representante do
Ministério Público, juntamente com cópia do auto de apreensão ou boletim de ocorrência. § 1.º
Sendo impossível a apresentação imediata, a autoridade policial encaminhará o adolescente a
entidade de atendimento, que fará a apresentação ao representante do Ministério Público no prazo
de vinte e quatro horas. § 2.º Nas localidades onde não houver entidade de atendimento, a
apresentação far-se-á pela autoridade policial. À falta de repartição policial especializada, o
adolescente aguardará a apresentação em dependência separada da destinada a maiores, não
podendo, em qualquer hipótese, exceder o prazo referido no parágrafo anterior” (art. 175); e)
quando a internação for a medida determinada pelo juiz, não pode ser cumprida em
estabelecimento prisional comum. Por isso, não havendo na comarca lugar adequado, o
adolescente deve ser transferido imediatamente para local próximo. “Sendo impossível a pronta
transferência, o adolescente aguardará sua remoção em repartição policial, desde que em seção
isolada dos adultos e com instalações apropriadas, não podendo ultrapassar o prazo máximo de
cinco dias, sob pena de responsabilidade” (art. 185, § 2.º).
50. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é, principalmente, o juiz; secundariamente,
a autoridade policial, autoridades encarregadas de ordenar a liberação ou a apresentação do menor
a outra autoridade. O sujeito passivo é o adolescente.
51. Elemento subjetivo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo do tipo específico,
nem se pune a forma culposa.
52. Elemento normativo do tipo: inseriu-se, no tipo incriminador, o
termo injustificadamente, concernente à esfera do ilícito, para demonstrar que a impossibilidade
de cumprir os prazos estabelecidos pela Lei 8.069/90 representa fato atípico e não mera
excludente de antijuridicidade. Excesso de processos e falta de juízes e/ou funcionários em uma
Vara que cuide de adolescentes infratores poderia redundar em detenções cautelares superiores a
45 dias, por exemplo, sem que se possa dizer ter havido crime. Pode-se até buscar a soltura do
menor e exigir uma indenização do Estado, mas não se deve processar a autoridade judiciária que
não deu causa à lentidão do trâmite processual.
53. Objetos material e jurídico: o objeto material é o prazo fixado em lei, que deixa de
ser respeitado. O objeto jurídico é a proteção à liberdade do adolescente.
54. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido pela autoridade competente em
providenciar o escorreito cumprimento dos prazos); material (depende da ocorrência de resultado
naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a criança ou adolescente no que toca ao seu
direito de ir, vir e ficar); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente);
omissivo (o verbo implica em inação); permanente (a consumação se protrai no tempo, enquanto
dure a privação ilegal e a possibilidade de ordem para a liberação); de dano; unissubjetivo (pode
ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente (praticada em um ato, como é típico do delito
omissivo próprio); não admite tentativa.
55. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 236. Impedir ou embaraçar56-58 a ação de autoridade judiciária, membro do
Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público no exercício de função prevista
nesta Lei:59-60
Pena – detenção de seis meses a dois anos.61

56. Análise do núcleo do tipo: impedir (colocar obstáculo, interromper)


ou embaraçar (perturbar, complicar a realização de algo) são os verbos alternativos, cujo objeto
é a ação de juiz, representante do Conselho Tutelar ou do Ministério Público, quando exercerem
as funções previstas na Lei 8.069/90. Outros modos de impedimento ou embaraço às atividades
de autoridades devem ser punidos por tipos penais diversos, previstos no Código Penal ou em
diversas leis especiais. Registre-se que esse é um tipo misto alternativo, ou seja, se o autor praticar
ambas as condutas (embaraçar e impedir), responde por um só delito. Cabe ao juiz, ao Conselho
Tutelar e ao Ministério Público a fiscalização das entidades governamentais e não governamentais
de atendimento à criança ou ao adolescente (art. 95 desta Lei). À Vara da Infância e da Juventude
compete: “I – conhecer de representações promovidas pelo Ministério Público, para apuração de
ato infracional atribuído a adolescente, aplicando as medidas cabíveis; II – conceder a remissão,
como forma de suspensão ou extinção do processo; III – conhecer de pedidos de adoção e seus
incidentes; IV – conhecer de ações civis fundadas em interesses individuais, difusos ou coletivos
afetos à criança e ao adolescente, observado o disposto no art. 209; V – conhecer de ações
decorrentes de irregularidades em entidades de atendimento, aplicando as medidas cabíveis; VI –
aplicar penalidades administrativas nos casos de infrações contra norma de proteção a criança ou
adolescentes; VII – conhecer de casos encaminhados pelo Conselho Tutelar, aplicando as medidas
cabíveis. Parágrafo único. Quando se tratar de criança ou adolescente nas hipóteses do art. 98, é
também competente a Justiça da Infância e da Juventude para o fim de: a) conhecer de pedidos
de guarda e tutela; b) conhecer de ações de destituição do poder familiar, perda ou modificação
da tutela ou guarda; c) suprir a capacidade ou o consentimento para o casamento; d) conhecer de
pedidos baseados em discordância paterna ou materna, em relação ao exercício do poder
familiar; e) conceder a emancipação, nos termos da lei civil, quando faltarem os pais; f) designar
curador especial em casos de apresentação de queixa ou representação, ou de outros
procedimentos judiciais ou extrajudiciais em que haja interesses de criança ou adolescente; g)
conhecer de ações de alimentos; h) determinar o cancelamento, a retificação e o suprimento dos
registros de nascimento e óbito” (art. 148 desta Lei). E, ainda, cabe ao juiz disciplinar, por meio
de portaria, ou autorizar, mediante alvará: “I – a entrada e permanência de criança ou adolescente,
desacompanhado dos pais ou responsável, em: a) estádio, ginásio e campo desportivo; b) bailes
ou promoções dançantes; c) boate ou congêneres; d) casa que explore comercialmente diversões
eletrônicas; e) estúdios cinematográficos, de teatro, rádio e televisão; II – a participação de criança
e adolescente em: a) espetáculos públicos e seus ensaios; b) certames de beleza. § 1.º Para os fins
do disposto neste artigo, a autoridade judiciária levará em conta, dentre outros fatores: a) os
princípios desta Lei; b) as peculiaridades locais; c) a existência de instalações adequadas; d) o
tipo de frequência habitual ao local; e) a adequação do ambiente a eventual participação ou
frequência de crianças e adolescentes; f) a natureza do espetáculo. § 2.º As medidas adotadas na
conformidade deste artigo deverão ser fundamentadas, caso a caso, vedadas as determinações de
caráter geral” (art. 149 desta Lei). Por outro lado, as atribuições do Conselho Tutelar são as
seguintes: “I – atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105,
aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII; II – atender e aconselhar os pais ou
responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII; III – promover a execução de
suas decisões, podendo para tanto: a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação,
serviço social, previdência, trabalho e segurança; b) representar junto à autoridade judiciária nos
casos de descumprimento injustificado de suas deliberações; IV – encaminhar ao Ministério
Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança
ou adolescente; V – encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência; VI –
providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de
I a VI, para o adolescente autor de ato infracional; VII – expedir notificações; VIII – requisitar
certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário; IX – assessorar
o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de
atendimento dos direitos da criança e do adolescente; X – representar, em nome da pessoa e da
família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3.º, inciso II da Constituição Federal;
XI – representar ao Ministério Público para efeito das ações de perda ou suspensão do poder
familiar, após esgotadas as possibilidades de manutenção da criança ou do adolescente junto à
família natural; XII – promover e incentivar, na comunidade e nos grupos profissionais, ações de
divulgação e treinamento para o reconhecimento de sintomas de maus-tratos em crianças e
adolescentes. Parágrafo único. Se, no exercício de suas atribuições, o Conselho Tutelar entender
necessário o afastamento do convívio familiar, comunicará incontinenti o fato ao Ministério
Público, prestando-lhe informações sobre os motivos de tal entendimento e as providências
tomadas para a orientação, o apoio e a promoção social da família” (art. 136 desta Lei). Quanto
ao Ministério Público, cabe-lhe: “I – conceder a remissão como forma de exclusão do processo;
II – promover e acompanhar os procedimentos relativos às infrações atribuídas a adolescentes; III
– promover e acompanhar as ações de alimentos e os procedimentos de suspensão e destituição
do poder familiar, nomeação e remoção de tutores, curadores e guardiães, bem como oficiar em
todos os demais procedimentos da competência da Justiça da Infância e da Juventude; IV –
promover, de ofício ou por solicitação dos interessados, a especialização e a inscrição de hipoteca
legal e a prestação de contas dos tutores, curadores e quaisquer administradores de bens de
crianças e adolescentes nas hipóteses do art. 98; V – promover o inquérito civil e a ação civil
pública para a proteção dos interesses individuais, difusos ou coletivos relativos à infância e à
adolescência, inclusive os definidos no art. 220, § 3.º, inciso II, da Constituição Federal; VI –
instaurar procedimentos administrativos e, para instruí-los: a) expedir notificações para colher
depoimentos ou esclarecimentos e, em caso de não comparecimento injustificado, requisitar
condução coercitiva, inclusive pela polícia civil ou militar; b) requisitar informações, exames,
perícias e documentos de autoridades municipais, estaduais e federais, da administração direta ou
indireta, bem como promover inspeções e diligências investigatórias; c) requisitar informações e
documentos a particulares e instituições privadas; VII – instaurar sindicâncias, requisitar
diligências investigatórias e determinar a instauração de inquérito policial, para apuração de
ilícitos ou infrações às normas de proteção à infância e à juventude; VIII – zelar pelo efetivo
respeito aos direitos e garantias legais assegurados às crianças e adolescentes, promovendo as
medidas judiciais e extrajudiciais cabíveis; IX – impetrar mandado de segurança, de injunção
e habeas corpus, em qualquer juízo, instância ou tribunal, na defesa dos interesses sociais e
individuais indisponíveis afetos à criança e ao adolescente; X – representar ao juízo visando à
aplicação de penalidade por infrações cometidas contra as normas de proteção à infância e à
juventude, sem prejuízo da promoção da responsabilidade civil e penal do infrator, quando
cabível; XI – inspecionar as entidades públicas e particulares de atendimento e os programas de
que trata esta Lei, adotando de pronto as medidas administrativas ou judiciais necessárias à
remoção de irregularidades porventura verificadas; XII – requisitar força policial, bem como a
colaboração dos serviços médicos, hospitalares, educacionais e de assistência social, públicos ou
privados, para o desempenho de suas atribuições. § 1.º A legitimação do Ministério Público para
as ações cíveis previstas neste artigo não impede a de terceiros, nas mesmas hipóteses, segundo
dispuserem a Constituição e esta Lei. § 2.º As atribuições constantes deste artigo não excluem
outras, desde que compatíveis com a finalidade do Ministério Público. § 3.º O representante do
Ministério Público, no exercício de suas funções, terá livre acesso a todo local onde se encontre
criança ou adolescente. § 4.º O representante do Ministério Público será responsável pelo uso
indevido das informações e documentos que requisitar, nas hipóteses legais de sigilo. § 5.º Para o
exercício da atribuição de que trata o inciso VIII deste artigo, poderá o representante do Ministério
Público: a) reduzir a termo as declarações do reclamante, instaurando o competente
procedimento, sob sua presidência; b) entender-se diretamente com a pessoa ou autoridade
reclamada, em dia, local e horário previamente notificados ou acertados; c) efetuar
recomendações visando à melhoria dos serviços públicos e de relevância pública afetos à criança
e ao adolescente, fixando prazo razoável para sua perfeita adequação” (art. 201 desta Lei).
Portanto, obstáculos interpostos por terceiros às atuações supradescritas são suficientes e capazes
de gerar o crime descrito no art. 236 da Lei 8.069/90. Na jurisprudência: STF: “A expressão
envolve toda e qualquer autoridade judiciária no desempenho da função, não se restringindo à
figura do juiz da Vara da Infância e do Adolescente” (HC 84.394, 1.ª T., rel. Marco Aurélio,
03.08.2004, v.u.). TJRS: “O conjunto probatório logrou demonstrar as elementares do tipo penal,
uma vez que a ré agrediu Conselheiras Tutelares, impedindo sua atuação. Comprovada, portanto,
a prática da conduta prevista no art. 236 do ECA. Sentença condenatória mantida, inclusive no
tocante à pena” (Apelação Criminal, 71008459737, Turma Recursal Criminal, rel. Edson Jorge
Cechet, j. 25.11.2019, v.u.).
57. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo
é o Estado, no cenário da proteção aos interesses da criança e do adolescente.
58. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
59. Objetos material e jurídico: o objeto material é a ação da autoridade judiciária,
membro do Conselho Tutelar ou representante do Ministério Público. O objeto jurídico é o
interesse da Administração da Justiça, no campo da proteção aos interesses da criança e do
adolescente.
60. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a atuação
dos órgãos mencionados no tipo); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito
pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação se dá em
momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo
(pode ser cometido por uma só pessoa); unissubsistente (praticada em um só ato) ou
plurissubsistente (praticada em vários atos), conforme o meio eleito pelo autor; admite tentativa
na forma plurissubsistente.
61. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 237. Subtrair 62-64
criança ou adolescente ao poder de quem o tem sob sua
guarda em virtude de lei ou ordem judicial, com o fim de colocação em lar substituto: 65-66
Pena – reclusão de dois a seis anos, e multa.67

62. Análise do núcleo do tipo: subtrair (retirar de um lugar, levando a outro) é a


conduta que tem por objeto a criança ou o adolescente sob guarda de terceiros. A conjugação que
se faz do verbo subtrair com a expressão ao poder de quem o tem sob sua guarda, demonstra a
ilegalidade do ato de retirada do menor do local onde se encontra, levando-o a outro diverso.
Observa-se, ainda, na construção do tipo penal, de que a guarda sobre o menor é fruto de ordem
judicial (ex.: tutor) ou de lei (ex.: pais). Há uma finalidade específica, que é a colocação em lar
substituto, ou seja, fazer com que a criança ou o adolescente passe a viver em outra família,
adotado oficialmente ou não. Em confronto com o disposto no art. 249 do Código Penal (subtração
de incapazes), verifica-se que o tipo do art. 237 deve prevalecer por existir finalidade especial
para agir, além de ser lei mais recente. Na jurisprudência: TJSP: “Art. 237 da Lei n. 8.069/90 e
art. 330 do Código Penal. Recurso defensivo. Absolvição por insuficiência probatória ou ausência
de dolo. Insuficiência probatória. Inocorrência. Conjunto probatório harmônico e coeso que
comprova a materialidade e autoria do delito. Alegação de ausência de dolo insubsistente.
Apelante que ocultou o neto por quase quatro anos, não obstante a intimação da Justiça para que
o entregasse à genitora. Desclassificação da conduta prevista no Estatuto da Criança e do
Adolescente para o delito previsto no art. 249 do Código Penal. Impossibilidade. Finalidade de
colocação em lar substituto devidamente demonstrada. Desobediência à ordem judicial que
constituiu meio para a prática do crime de subtração de criança ou adolescente. Princípio da
consunção reconhecido. Dosimetria. Possibilidade de redução da pena imposta pelo delito de
desobediência. Regime aberto bem fixado. Substituição da pena privativa de liberdade por uma
restritiva de direitos e multa corretamente operada. Recurso parcialmente provido” (Apelação
Criminal 0008390-70.2011.8.26.0196; 16.ª Câmara de Direito Criminal, rel. Leme Garcia, j.
10.12.2018, v.u.).
63. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. Basta não possuir
a guarda do menor. O sujeito passivo é a criança ou o adolescente. Secundariamente, deve-se
inserir, também, a pessoa que possui, legalmente, a guarda do menor.
64. Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se o elemento subjetivo do tipo específico,
consistente na finalidade de inserção em lar substituto. Não se pune a forma culposa. Conferir:
TJPR: “1. O tipo previsto no art. 237 do Estatuto da Criança e do Adolescente exige um especial
fim de agir, consistente na subtração de criança ou de adolescente para colocação em família
substituta, bem assim a ausência de autorização ou de ciência dos genitores. 2. Inconcebível
manter a condenação nas sanções do referido art. 237 de pessoa que tem, junto de si, criança
voluntariamente entregue pela própria mãe, por faltar a esta condições de sustento relativamente
à prole” (Apelação 831.497-2, 2.ª Câm. Criminal, rel. José Mauricio Pinto de Almeida,
28.06.2012, v.u.).
65. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a proteção dos interesses da criança e do adolescente em ser orientado e guiado pela
família indicada pela lei ou pelo juiz.
66. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para o menor
com a inserção em lar substituto. Se isso ocorrer, está-se diante do exaurimento do crime); de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica
em ação); instantâneo (a consumação se dá em momento determinado). Pode haver rastro do
crime, mantendo-se, por exemplo, a criança subtraída no lar substituto, motivo pelo qual o delito
não se torna permanente, mas deve ser considerado instantâneo de efeitos permanentes; de dano
(fere-se o direito do menor de estar com a família legalmente prevista); unissubjetivo (pode ser
cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite tentativa.
67. Benefícios penais: não é infração de menor potencial ofensivo, descabendo
transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95. Se houver condenação, no mínimo
legal, cabe a aplicação de sursis. Acima do mínimo – e até quatro anos –, pode haver a substituição
da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, por não se tratar de crime com violência
ou grave ameaça à pessoa. Eventualmente, torna-se viável, ainda, o sursis etário ou humanitário
(art. 77, § 2.º, CP), para montante de até quatro anos. Acima disso, o regime carcerário pode ser
o semiaberto ou fechado, conforme a análise das circunstâncias do art. 59 do Código Penal.
Art. 238. Prometer ou efetivar68-70 a entrega de filho ou pupilo a terceiro, mediante
paga ou recompensa:71-72
Pena – reclusão de um a quatro anos, e multa.73
Parágrafo único. Incide nas mesmas penas quem oferece ou efetiva a paga ou
recompensa.74

68. Análise do núcleo do tipo: prometer (obrigar-se a dar ou fazer algo no futuro)
ou efetivar (concretizar algo, realizar) são os verbos, cujo objeto é a entrega de filho ou pupilo a
terceiro, envolvendo paga (benefício pecuniário) ou recompensa (outro benefício qualquer).
Busca-se evitar o tráfico de crianças, impedindo-se que famílias pobres, seduzidas por dinheiro
ou outros bens, prometam a venda de filhos a terceiros endinheirados. Almeja-se, ainda, contornar
o problema da denominada barriga de aluguel, situação em que mães, durante a gestação,
prometem entregar seus filhos, após o nascimento, a outras famílias, mediante recompensa. A
entrega do filho, em adoção, a terceiros, não é vedada, desde que ausente o fito de obter lucro ou
vantagem. Por isso, conforme a situação concreta, torna-se muito complexa e difícil a prova de
que houve a promessa ou a efetivação da entrega de filho, mediante paga ou recompensa. Se as
partes envolvidas negarem o ocorrido, torna-se quase impossível ao Estado provar o contrário.
Confrontando-se com o art. 245 do Código Penal, conclui-se pela concomitante vigência de
ambos. Entretanto, o art. 238, por ser especial, afasta a aplicação do art. 245 do Código Penal.
Este, por seu turno, fica reservado para outras hipóteses, mais genéricas, como o pai que entrega
o filho menor de 18 anos a pessoa de má reputação, para simples convivência, com ou sem intuito
de lucro, mas sem caráter definitivo. Na jurisprudência: TJRS: “Prova testemunhal segura a
demonstrar que a mãe prometeu a entrega da filha, fruto de um relacionamento extraconjugal,
para preservar o relacionamento com o seu companheiro, nutrida da ilusão de que lhe seria
garantido o sigilo e a possibilidade de manter contato com a menina no futuro. Subsunção da
conduta à norma inserta no parágrafo único do artigo 238 do ECA, que não exige, à sua
conformação, seja a recompensa de natureza puramente patrimonial” (Apelação Crime,
70069943512, 8.a Câmara Criminal, rel. Dálvio Leite Dias Teixeira, j. 31.08.2016, v.u.).
69. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo é o pai, a mãe, o tutor ou o guardião. O
sujeito passivo é a criança ou o adolescente privado de sua família biológica ou do tutor ou
guardião determinado pelo juiz.
70. Elemento subjetivo: é o dolo. Exige-se o elemento subjetivo específico, consistente
na obtenção de paga ou recompensa. Não se pune a forma culposa.
71. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente (filho ou
pupilo). O objeto jurídico é a proteção dos interesses da criança e do adolescente na mantença dos
laços familiares legais ou mesmo da situação familiar determinada pelo juiz.
72. Classificação: é crime próprio (só pode ser cometido pelos pais, tutores ou
guardiões); formal (independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente na entrega do
menor a terceiros), na modalidade prometer, porém material (exige-se a efetiva entrega da criança
ou do adolescente, mediante paga ou recompensa), no formato efetivar; de forma livre (pode ser
cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações);
instantâneo (a consumação se dá em momento determinado); de dano (fere-se o direito do menor
de estar com a família legalmente prevista); plurissubjetivo (somente pode ser cometido por mais
de uma pessoa). Não visualizamos a possibilidade de alguém prometer ou efetivar a entrega de
filho, por exemplo, a terceira pessoa, sem que esta nada lhe dê em troca. Assim ocorrendo, não
se preencheria o tipo penal, que demanda a paga ou recompensa. Por isso, é fundamental a
existência de alguém, além do pai ou da mãe, que corresponda, entregando o dinheiro ou outro
valor qualquer. Tanto assim que se prevê a mesma pena para quem oferece ou efetiva a paga ou
recompensa (art. 238, parágrafo único); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite
tentativa.
73. Benefícios penais: não é infração de menor potencial ofensivo, mas é admissível a
suspensão condicional do processo, pois a pena mínima não ultrapassa um ano (art. 89, Lei
9.099/95). Por se tratar de crime sem violência ou grave ameaça à pessoa, havendo condenação,
é possível a substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Outra
possibilidade, se a pena não ultrapassar dois anos, é a aplicação do sursis.
74. Figura correlata: a pessoa que oferece (a quem promete) ou paga (a quem efetiva) o
dinheiro ou a recompensa também responderá pelo delito. Cuida-se de previsão óbvia, tendo em
vista ser um delito plurissubjetivo. Para que se possa oferecer uma criança, mediante paga, é
fundamental haver, de outro lado, quem efetue o pagamento.
Art. 239. Promover ou auxiliar 75-77
a efetivação de ato destinado ao envio de criança
ou adolescente para o exterior com inobservância das formalidades legais 78 ou com o
fito de obter lucro:79-82
Pena – reclusão de quatro a seis anos, e multa.83
Parágrafo único. Se há emprego de violência, grave ameaça ou fraude: 84 Pena –
reclusão, de 6 (seis) a 8 (oito) anos,85 além da pena correspondente à violência.86

75. Análise do núcleo do tipo: promover (proporcionar o implemento de algo,


impulsionar) ou auxiliar (fornecer ajuda ou suporte de qualquer espécie) são os verbos, cujo
objeto é a efetivação de ato (concretização de determinada ação) voltado a enviar criança ou
adolescente para o exterior. A conduta criminosa, no entanto, vem acompanhada de elementos
normativos alternativos: a) sem observar as formalidades legais, ainda que sem o intuito de obter
lucro; b) observando ou não as formalidades legais, mas com o objetivo de obter lucro. Busca-se
evitar o tráfico internacional de crianças, preocupação reinante em todo o mundo. A consumação
do delito, no entanto, independe da remessa efetiva da criança ou do adolescente para o
estrangeiro. Basta a concretização de ato, cujo objetivo seja esse. Na realidade, se o menor for
para o exterior, dá-se o exaurimento do crime. Conferir: STJ: “I – O crime de tráfico internacional
descrito no art. 239, do ECA, não exige, para a sua consumação, a saída da criança ou adolescente
para o exterior, contentando-se com a execução de qualquer ato de promoção ou auxílio da
efetivação de ato destinado ao envio da vítima ao estrangeiro, sem as formalidades legais, ou com
o fito de obter lucro. II – Trata-se de crime formal, que se consuma com a simples prática de
qualquer ato destinado ao envio de criança ou adolescente ao exterior, com ou sem obtenção de
lucro, nas circunstâncias referidas no tipo penal. Precedentes do STJ” (AgRg no AREsp
160.951/RJ, 5.ª T., rel. Regina Helena Costa, 17.09.2013, v.u.); “O delito tipificado no art. 239
do Estatuto da Criança e do Adolescente é formal, porque consuma-se com a simples conduta de
auxiliar na efetivação de atos destinados ao envio de criança ao exterior, sem a observância das
formalidades legais ou com a finalidade de obter lucro, não sendo exigido o efetivo envio do
menor ao exterior” (REsp 1.023.002/PE, 6.ª T., rel. Alderita Ramos de Oliveira, 09.08.2012, v.u.);
“1. A promoção ou auxílio na prática de ato destinado ao envio de criança ou adolescente ao
exterior, com inobservância das formalidades legais, é crime formal, do qual a obtenção do
passaporte ou mesmo auxílio para a sua obtenção são apenas formas, entre múltiplas outras, do
seu cometimento. 2. Ordem denegada” (HC 39.332/RJ, 6.ª T., rel. Hamilton Carvalhido,
09.12.2005, não unânime). TRF-1: “1. O crime de que trata o art. 239 do ECA é crime formal,
não se exigindo para sua consumação a saída do menor do país. Bastando, para tanto, que o ato
destinado ao envio não observe as formalidades legais ou que tenha o agente o objetivo de lucro”
(RESE 0009879-24.2010.4.01.3813, 4.ª T., rel. Hilton Queiroz, 30.10.2012, v.u.). TRF-2: “1. O
art. 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente se perfaz em duas hipóteses distintas, que são o
tráfico oneroso de criança ou adolescente, quando a pessoa obtém lucro direto com a utilização
da criança ou do adolescente como objeto material do crime, ou quando o agente promove ou
auxilia nos atos destinados ao envio de criança ou de adolescente ao exterior, sem a observação
das formalidades legais, o que exatamente aconteceu no caso dos autos. 2. Encontram-se presentes
todos os elementos descritos no tipo penal do art. 239 do ECA, restando comprovado, no decorrer
da instrução criminal, que o réu auxiliou a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou
adolescente ao exterior com a inobservância das formalidades legais, tendo, conscientemente,
fornecido ajuda à genitora do menor, providenciando a certidão de nascimento falsa, onde atribuía
a si a paternidade da criança, para que, de posse deste documento, fosse concedida autorização
para o requerimento de passaporte e para viajar ao exterior, consumando-se o referido crime,
ainda que não se tenha logrado êxito em tal intento” (Apelação 2002.50.01.007654-6, 2.ª T., rel.
Liliane Roriz, 24.11.2010, v.u.); Há decisão no sentido de que, existindo processo de adoção em
andamento, o fato é atípico: TRF-5: “1. O crime encartado na Lei 8.069/90, em seu art. 239
(‘promover ou auxiliar a efetivação de ato destinado ao envio de criança ou adolescente para o
exterior com inobservância das formalidades legais ou com o fito de obter lucro’), não é
compatível com a existência formal do processo de adoção, haja vista que, uma vez adotada a
criança, o natural é que acompanhe os (novos e definitivos) pais – inclusive para o exterior, se
estes forem, como são, estrangeiros; 2. A melhor inteligência acerca do tipo referido no item
anterior diz, ao revés, com situações nas quais as crianças são enviadas para o exterior de modo
informal, inoficioso, em franca violação ao Art. 85 daquele diploma legal (‘sem prévia e expressa
autorização judicial, nenhuma criança ou adolescente nascido em território nacional poderá sair
do País em companhia de estrangeiro residente ou domiciliado no exterior’); 3. Porque atípicas
as condutas debatidas nos autos, as apelações devem ser providas” (Apelação Criminal 0004917-
13.2005.4.05.0000, 3.ª T., rel. Paulo Roberto de Oliveira Lima, 12.06.2008, v.u.).
76. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo
é a criança ou o adolescente.
77. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não se pune a forma culposa. Pode haver
elemento subjetivo do tipo específico, consistente em “ter o fito de obter lucro”. Na
jurisprudência: TRF-1: “Conjunto probante que não comprovou o dolo necessário à configuração
de atos tendentes, por um dos denunciados, ao envio de criança para o exterior mediante fraude
consistente na troca da mãe biológica, em documentos públicos, pela mãe adotante ‘à brasileira’.
3. Competência da Justiça Estadual para processamento e julgamento do crime previsto no art.
242 do Código Penal. 4. Recurso em sentido estrito não provido” (RESE 2007.35.00.009056-2,
3.ª T., rel. Tourinho Neto, 13.10.2009, v.u.). TRF-3: “I – Ré surpreendida pelas autoridades de
imigração americanas ao tentar ingressar em Nova York/EUA, juntamente com sua filha menor,
portando passaportes falsificados, inadmitida e repatriada. II – Caracterizada, em face da
singularidade do caso, a inexigibilidade de conduta diversa, pois não é punível a conduta da
genitora que utiliza passaporte falso buscando a reconstituição da família com melhores condições
de vida no exterior, para tentar livrar-se da exclusão social e também reunir a família. V – Não
restou caracterizado o delito de tráfico de menores, previsto no art. 239 do ECA, pois não houve
o ato do envio da criança para fins de adoção ilegal, existiu, outrossim a intenção da mãe de levar
a filha menor ao encontro do pai para construir uma vida melhor nos Estados Unidos” (Apelação
2002.61.19.000813-0, 1.ª T., rel. José Lunardelli, 30.08.2011, v.u.).
78. Formalidades legais: crianças e adolescentes podem seguir para o exterior, em
situações variadas, desde que sejam respeitadas as regras estabelecidas pelo Estatuto da Criança
e do Adolescente. Por exemplo, se um menor pretende estudar no exterior, autorizado pelos pais
– ou pelo juiz da Vara da Infância e Juventude –, pode seguir viagem sem que isso represente um
crime para quem o auxilie ou promova a sua ida.
79. Confronto com o art. 245, § 2.º, do Código Penal: analisando detidamente os
dois tipos penais, cremos que o art. 239 da Lei 8.069/90, por ser mais abrangente e também
especial, revogou, tacitamente, o referido art. 245, § 2.º, do Código Penal. Neste, o agente auxilia
a efetivação de ato destinado ao envio de menor para o exterior, com o fito de obter lucro.
Naquele, o autor auxilia ou promove a efetivação de ato destinado a enviar criança ou adolescente
ao exterior, com o fito de obter lucro ou com inobservância das formalidades legais. Logo, mais
amplo e abrangente.
80. Objetos material e jurídico: o objeto material é o ato destinado ao envio de criança
ou adolescente ao exterior. O objeto jurídico é proteção à família da criança e do adolescente.
81. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a família
ou para a criança ou adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito
pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação se dá em
momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo
(pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite
tentativa.
82. Competência: conforme o caso concreto, respeitado o disposto no art. 109, V, da
Constituição Federal, é da Justiça Federal. Na jurisprudência: STF: “A suposta incompetência
funcional do juiz estadual que, despachando processo de outra vara, determinou sua redistribuição
à Justiça Federal, constitui nulidade relativa, a qual não gerou prejuízo algum ao paciente nem foi
arguida em tempo oportuno, tornando-se preclusa. Questão, ademais, irrelevante e superada,
diante da remessa do processo à Justiça Federal, competente para processar e julgar o crime
descrito no art. 239 do Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 109, V, Constituição Federal).
Inexistência de flagrante ilegalidade ou teratologia que justifique a superação do óbice processual
ao conhecimento da impetração” (HC 121472/PE, 1.ª T., rel. Dias Toffoli, 19.08.2014, m.v.).
83. Benefícios penais: nesse caso, já que o objetivo do legislador é atingir
o traficante de crianças e adolescentes, a pena é elevada. Se aplicada no mínimo legal, poderá o
juiz conceder o regime aberto. Porém, acima disso, o regime pode ser o semiaberto ou fechado,
conforme o caso. Em situações excepcionais (para maiores de 70 anos ou enfermos), poderia
haver sursis (art. 77, § 2.º, CP).
84. Fraude: é o uso de artifício, mecanismos de engodo ou ardil, podendo configurar-se na
forma de falsidade documental – material ou ideológica. Além disso, a utilização da fraude pode
voltar-se contra a vítima ou qualquer outra pessoa, desde que facilite a execução do delito.
Conferir: STJ: “O art. 239 do ECA pune quem promove ou auxilia o envio de criança ou
adolescente para o Exterior com intuito de lucro independentemente da finalidade do envio, vale
dizer, para fins lícitos ou ilícitos. E a fraude que qualifica o delito no seu parágrafo único pode se
configurar na falsidade material e ideológica perpetrada para a consecução do objetivo criminoso,
podendo ser empregada tanto contra a criança quanto contra a Administração Pública e seus
agentes” (REsp 1.202.292/RJ, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura, DJ 21.05.2013).
85. Benefícios penais: havendo violência, grave ameaça ou fraude, a pena é ainda mais
elevada. Aplicada no mínimo, o regime mais favorável é o semiaberto.
86. Acumulação material: o sistema adotado é o da acumulação material, vale dizer,
ainda que o agente pratique uma só conduta (promover a efetivação de ato destinado ao envio de
criança ou adolescente ao exterior, sem as formalidades legais ou com o intuito de lucro, com
fraude, violência ou grave ameaça), responderá pela pena prevista no art. 239, parágrafo único,
associada àquela destinada ao tipo penal relacionado à violência.
Art. 240. Produzir,87 reproduzir, dirigir, fotografar, filmar ou registrar,88-90 por
qualquer meio, cena de sexo explícito ou pornográfica, 91 envolvendo criança ou
adolescente:92-93
Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.94-95
§ 1.º Incorre nas mesmas penas quem agencia, facilita, recruta, coage,96-98 ou de
qualquer modo intermedeia a participação de criança ou adolescente nas cenas
referidas no caput deste artigo, ou ainda quem com esses contracena.99-100
§ 2.º Aumenta-se a pena de 1/3 (um terço) se o agente comete o crime:101
I – no exercício de cargo ou função pública ou a pretexto de exercê-la;102
II – prevalecendo-se de relações domésticas, de coabitação ou de
hospitalidade;103 ou
III – prevalecendo-se de relações de parentesco consanguíneo ou afim até o
terceiro grau, ou por adoção, de tutor, curador, preceptor, empregador da vítima ou de
quem, a qualquer outro título, tenha autoridade sobre ela, ou com seu consentimento. 104

87. A dignidade da criança e do adolescente e sua liberdade sexual: a reforma


introduzida pela Lei 11.829, de 25 de novembro de 2008, no Estatuto da Criança e do
Adolescente, teve por finalidade acompanhar os passos da modernidade e da tecnologia, cada vez
mais disseminada entre os jovens, com livre e fácil acesso, não somente no Brasil, mas também
em outros países. Indiscutivelmente, uma das prioridades, no Estado Democrático de Direito, é
assegurar a boa formação e o proveitoso desenvolvimento educacional das pessoas durante a fase
infantojuvenil. Segue-se a meta proposta pelo art. 227 da Constituição Federal, proporcionando
segurança para que toda criança e todo adolescente possam viver em ambiente saudável, com
respeito à dignidade da pessoa e livre de qualquer forma de exploração. Dentre as mais comuns e
nefastas formas de opressão, prejudicial à correta formação de personalidade humana, encontra-
se a exploração sexual. O Código Penal busca assegurar, por meio dos tipos incriminadores, a
punição dos agentes que cometam atos violentos contra a liberdade sexual, além de outros,
configuradores de fraudes, assédios e investidas diretas em relação às vítimas. O Estatuto da
Criança e do Adolescente, em visão mais particularizada, tem por fim a punição, no cenário da
liberdade sexual, de agentes que envolvam crianças e adolescentes, em práticas sexuais, com o
objetivo de satisfação da lascívia, em grande parte dos casos, porém sem haver o contato sexual
direto, ao menos necessariamente. Volta-se a Lei 8.069/90 aos crimes cometidos contra os
menores de 18 anos no contexto da exposição visual, abrangendo fotos, filmes e outras formas de
registro de imagens e sons. As anteriores redações dos arts. 240 e 241 cuidavam dos delitos
relacionados à exploração das crianças e dos adolescentes, por meio da criação e divulgação, em
geral, de imagens vinculadas a sexo explícito ou pornografia. Havia, entretanto, lacunas a serem
supridas. Parece-nos positiva a edição da Lei 11.829/2008, com a geração de inéditas figuras
típicas incriminadoras, mormente em tempos de Internet e fácil acesso dos jovens à informação.
Ademais, cumpre salientar o maior detalhamento às atitudes dos denominados pedófilos, que se
valem da rede mundial de computadores, em especial, para suas atividades criminosas. A
pedofilia é um distúrbio psicossexual, consistente em intenso desejo de manter práticas sexuais,
reais ou fantasiosas com crianças. É natural que, por extensão, possa-se entender como pedófilo,
igualmente, aquele que se liga a adolescentes, em particular os mais novos, uma vez que a
proteção legal se dá no mesmo diapasão. Nesse sentido, a Lei 11.829/2008 ampliou as
possibilidades de punição, preenchendo determinados vazios e conferindo modernidade ao texto
do Estatuto da Criança e do Adolescente. Em parte, o desiderato da novel lei teve por finalidade
a alteração das penas, o que se deu no cenário dos arts. 240 e 241, ambos com outra redação. Sob
outro aspecto, criaram-se figuras novas, buscando penalizar aqueles que mantêm fotos e outros
registros de menores de 18 anos, envoltos em cenas pornográficas ou de sexo explícito. Além
disso, visou-se à formação de tipos penais que pudessem alcançar os que se comprazem em
montagens e edições de fotos e filmes em geral, igualmente contendo imagens sexuais de jovens.
Finalmente, a lei ampliou a criminalização dos agentes que buscam jovens em programas de
comunicação, com o fim de praticar ato libidinoso, mormente em sites específicos da Internet,
como salas de bate-papo e outros sistemas de interação. Soa-nos positiva a reforma legislativa e
promissoras as possibilidades de punir os agentes infratores no contexto dos delitos sexuais contra
a criança e o adolescente. Na mesma linha de proteção, a Lei 12.650/2012 alterou o prazo
prescricional dos crimes contra a dignidade sexual de crianças e adolescentes, previstos no Código
Penal ou em legislação especial. Passa-se a computar a prescrição a partir da data em que a vítima
completar 18 anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal (art. 111, V, CP).
88. Análise do núcleo do tipo: produzir (criar, gerar, financiar, dar
origem), reproduzir (significa tanto tornar a produzir como também imitar ou
copiar), dirigir (comandar, orientar), fotografar (reproduzir imagem por meio de
fotografia), filmar (registrar imagem e som em filme) e registrar (lançar imagem, som ou sinal
em base material apropriada, de modo a reproduzir dados e informações) são os verbos
componentes do núcleo do tipo, cujo objeto é cena de sexo explícito ou pornográfica, abrangendo
criança ou adolescente. O tipo é misto alternativo, significando que qualquer das condutas
empreendidas é suficiente para a configuração do delito. Por outro lado, se mais de uma conduta
for realizada, no mesmo contexto, cuida-se de crime único (ex.: o agente fotografa e filma
adolescente em cena de sexo explícito; comete um só delito, previsto no art. 240). Observe-se que
o verbo registrar é o gênero, do qual se podem extrair as espécies de registro
como fotografar e filmar. Por outro lado, incluiu a reforma trazida pela Lei 11.829/2008 a
forma reproduzir, na realidade, voltada à tendência de copiar algo sob imitação, conduta que pode
ser aplicada, também, para fotos e filmes modificados em relação ao original. Vale
salientar, ainda, a correção de rumo adotada pelo legislador, tornando a incluir no tipo
incriminador o verbo fotografar. A anterior Lei 10.764/2003 havia excluído essa conduta,
trazendo consequências para o âmbito penal. Como ilustração, confira-se o acórdão prolatado
pelo Tribunal de Justiça de São Paulo: “Como se vê a conduta imputada aos réus (a de fotografar
etc.) não se insere no novo tipo legal, o qual pune a divulgação, a publicação de foto ou imagens
pornográficas envolvendo crianças ou adolescentes. A simples tomada de fotos não mais é
considerada criminosa. Destarte, a ação descrita na exordial (fotografar) passou a ser atípica, face
a nova redação dada ao art. 241 do ECA” (Ap. 444.907-3/9, São Paulo, 3.ª C., rel. Segurado Braz,
03.05.2005, m.v., porém o voto vencido dizia respeito a outra temática). Porém, o STF permitia
uma interpretação extensiva à época: STF: “1. A conduta consubstanciada em ‘fotografar’ cenas
com pornografia envolvendo crianças e adolescentes amolda-se ao tipo legal previsto no art. 241
do Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei 8.069/90), com redação dada pela Lei 10.764/2003,
notadamente à expressão ‘produzir fotografia’, cujo valor semântico denota o comportamento de
‘dar origem ao registro fotográfico de alguma cena’. 2. In casu, o paciente foi condenado à pena
de 3 (três) anos e 9 (nove) meses de reclusão pela prática do crime previsto no art. 241 do ECA,
em razão de ter fotografado sua enteada de seis anos de idade em cenas de sexo explícito.
Tipicidade da conduta devidamente caracterizada e apenada” (HC 110960/DF, 1.ª T., rel. Luiz
Fux, 19.08.2014, m.v.). De toda forma, foi correta a reinserção da conduta fotografar. Cumpre
destacar, ainda, pretender o legislador envolver toda e qualquer maneira de lidar, manipular ou
construir registros de imagens em geral, abarcando crianças e adolescentes em situações
consideradas perniciosas (cenas de sexo explícito ou pornográficas). Por isso, valeu-se da
genérica expressão “por qualquer meio”. A finalidade do tipo penal é evitar o envolvimento de
menores em produções de entretenimento sexual, o que não deixa de ser uma forma de corrupção
de menores. O art. 218-A do Código Penal cuida de situação similar, porém sem o disfarce da
produção artística, tratando de relacionamento pessoal. O art. 240 desta Lei envolve cenário de
produção de imagens, não se exigindo a prática de relação sexual entre o agente e a vítima. Aliás,
igualmente, não se demanda qualquer correção moral por parte do ofendido, pouco importando
se é pessoa moralmente íntegra ou corrompida. Nem mesmo importa o seu consentimento. Na
jurisprudência: STJ: “6. É típica a conduta de fotografar cena pornográfica (art. 241-B do ECA)
e de armazenar fotografias de conteúdo pornográfico envolvendo criança ou adolescente (art. 240
do ECA) na hipótese em que restar incontroversa a finalidade sexual e libidinosa das fotografias,
com enfoque nos órgãos genitais das vítimas – ainda que cobertos por peças de roupas –, e de
poses nitidamente sensuais, em que explorada sua sexualidade com conotação obscena e
pornográfica” (REsp 1.543.267/SC, 6.ª Turma, rel. Maria Thereza de Assis
Moura, DJe 16.02.2016, v.u.). TJRJ: “No caso concreto, e isto é incontroverso, as fotografias
retratam a adolescente usando jaquetas, com calcinha abaixada na altura da coxa, de botas, com
blusa transparente, com seios e parte de sua genitália à mostra, sendo que muitas fotos enquadram
única e exclusivamente essas partes do corpo da menor, não retratando cenas de sexo, nem estando
a adolescente totalmente nua. Sem maiores debates, sexo explícito, no caso, não há. No entanto,
entende-se configurada a cena pornográfica, eis que restou incontroversa a finalidade sexual e
libidinosa das fotografias, com enfoque nos órgãos genitais da vítima – ainda que cobertos por
peças de roupas –, e de poses nitidamente sensuais, em que é explorada sua sexualidade com
conotação obscena e pornográfica. Precedente do STJ” (Ap. 0022222-86.2013.8.19.0038-RJ, 7ª
Câmara Criminal, rel. Maria Angélica Guimarães Guerra Guedes, 16.05.2017). TJRO: “A simples
conduta de filmar imagens de adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica perfaz a
conduta prevista no tipo penal do art. 240 do ECA. O consentimento não ilide a tipificação da
conduta” (Ap. 0000273-63.2014.8.22.0013 – RO, 1.ª Câm. Criminal, rel. Valter de Oliveira,
29.10.2015, m.v.).
88-A. Fotografar e possuir ou armazenar fotos: tratando-se o ato de fotografar o
menor “A”, em cena pornográfica, configurando-se o delito previsto no art. 240, caso o sujeito
ativo mantenha essa foto armazenada, em nosso entendimento, não configura o crime do art. 241-
B, pois este último é somente ato posterior não punível. No entanto, fotografar “A” (art. 240) e
possuir fotos de “B”, também menor, em cena pornográfica, permite a configuração dos dois
delitos (arts. 240 e 241-B). Na jurisprudência: TJRS: “A responsabilização pelo art. 241-B do
ECA refere-se a inúmeras fotos e arquivos com diversas crianças e adolescentes (de identidade
desconhecida) em cenas de sexo ou de pornografia, cuja origem e autoria são incógnitas, que o
condenado possuía e armazenava, as quais não se confundem com as imagens que ele mesmo
fotografou em sua residência com o adolescente W. (art. 240 do ECA). Condutas independentes,
de modo que são plenamente puníveis todos os fatos narrados na denúncia” (Ap. Crim.
70068206101 – RS, 6.ª Câm. Criminal, rel. Bernadete Coutinho Friedrich, 02.06.2016, v.u.).
89. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo
é a criança ou o adolescente. Fazíamos uma crítica à anterior redação do art. 240, que não abrangia
as pessoas que pudessem agenciar ou intermediar, de um modo geral, as atividades artísticas
pornográficas ou contendo cenas de sexo explícito com menores de 18 anos. A reforma
introduzida pela Lei 11.829/2008 corrigiu essa distorção e passa a figurar, expressamente, no art.
240, § 1.º, todas as possibilidades de participação no evento criminoso.
90. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa. É interessante observar que a proteção voltada aos menores de 18 anos
prescinde de qualquer finalidade especial do agente, o que é correto. Portanto, se o autor do delito
tem fim libidinoso, lucrativo, especulador, deletério, incerto ou mesmo gratuito, é inteiramente
irrelevante. A utilização da criança ou adolescente em ambiente inadequado coloca em risco a sua
formação moral, independentemente do objetivo do agente. Conferir: TJRS: “O crime previsto
no art. 240 do ECA apresenta como elemento subjetivo o dolo, consubstanciado na vontade
consciente de praticar quaisquer dos verbos nucleares previstos em lei, não sendo exigida
finalidade específica – o que derrui o argumento apresentado no voto minoritário, que absolvia o
réu por ausência de dolo de fomentar o mercado pedófilo ou de, preordenadamente, expor a
vítima. Ainda que estivesse presente, o eventual consentimento da adolescente quanto ao uso
pessoal do material registrado não afastaria a ocorrência do delito. Precedente do Superior
Tribunal de Justiça” (EI e de Nulidade 70072329840-RS, 4º Grupo de Câmaras Criminais, rel.
José Conrado Kurtz de Souza, 27.04.2017, m.v.).
91. Elementos normativos do tipo: os termos utilizados em lei necessitam de
valoração cultural, não se cuidando de expressões de conteúdo meramente descritivo. Cena
pornográfica é a situação de libidinagem ou devassidão, com ou sem contato físico. Cena de sexo
explícito é a que envolve relações sexuais aparentes e visíveis.
92. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou adolescente em cena
de sexo explícito ou pornográfica. O objeto jurídico é a proteção à formação moral das crianças
e adolescentes.
93. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação
se dá em momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano);
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos);
admite tentativa.
94. Benefícios penais: a Lei 11.829/2008 elevou substancialmente as penas em abstrato
do delito, alterando a faixa anterior, de dois a seis anos, para quatro a oito anos de reclusão,
mantida a cumulação com multa. Em face disso, diminuem muitos benefícios penais, não cabendo
transação, suspensão condicional do processo e suspensão condicional da pena, como regra. A
condenação à pena mínima – quatro anos – pode resultar na imposição de regime aberto (art. 33,
§ 2.º, c, CP). Se o magistrado aplicar mais de quatro anos, mas até oito anos, permite-se a fixação
do regime semiaberto. Convém registrar, ainda, o cabimento, para o patamar mínimo de quatro
anos, da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata
de crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
95. Concurso material: é muito comum que o registro de cenas sexuais ou pornográficas
praticadas com menores de 18 anos decorra justamente de atos libidinosos entre o agente e a
vítima; por isso, admite-se concurso material entre estupro e o crime previsto neste artigo.
Conferir: TJSP: “Apelação criminal. Atentado violento ao pudor. Dois consumados e um tentado.
Art. 240, ECA. Materialidade e autoria demonstradas. Réu que constrangeu vítima, por duas
vezes, mediante violência e grave ameaça, a praticar atos libidinosos diversos da conjunção
carnal, e, em outra oportunidade, tentou constranger a vítima a praticar atos libidinosos diversos
da conjunção carnal, bem como filmou cena pornográfica envolvendo criança e adolescente.
Palavras da vítima. Validade. Coerência com as demais provas dos autos. Filmagem dos atos
libidinosos que confirmam as declarações da vítima e do irmão dela. Concurso material. Delitos
consumados foram praticados em circunstâncias diversas da do tentado e os consumados, embora
praticados na mesma data, foram autônomos. Condenação inafastável. Pena corretamente fixada.
Pena-base acima do mínimo legal. Circunstâncias e consequências do crime. Regime prisional
fechado o adequado para prevenção e repressão do delito. Art. 2.º, § 1.º, da Lei 8.072/90.
Preliminar rejeitada, recurso desprovido” (Apelação 990.10.405152-5, 6.ª Câm. Criminal, rel.
Machado de Andrade, 24.03.2011, v.u.). TJRS: “No caso dos autos, há indícios suficientes de que
o paciente teria praticado estupro contra sua sobrinha menor, havendo notícias, também, de
fotografias da menor em poses sensuais, além da apreensão de uma arma de fogo” (HC
70058863952, 5.ª Câm. Criminal, rel. Lizete Andreis Sebben, 30.04.2014, v.u.).
96. Análise do núcleo do tipo: agenciar (promover o encontro entre duas ou mais
pessoas como representante de uma das partes), facilitar (tornar algo possível de ser realizado
sem custo ou esforço), recrutar (angariar adepto), coagir (constranger) e intermediar (colocar-se
entre duas ou mais pessoas, com o fito de levar e trazer mensagens, promovendo contato) são as
condutas alternativas, cujo objeto é a participação da criança ou do adolescente nas cenas de sexo
explícito ou pornográficas. A prática de uma ou mais das ações descritas neste parágrafo provoca
a concretização de uma só infração penal. No caput do artigo, encontram-se as condutas dos
agentes que, diretamente, lidam com o material inadequado, envolvendo menores. No § 1.º, estão
as ações dos autores que, indiretamente, promovem o mesmo. Seriam autênticos partícipes das
condutas de terceiros, mas a construção do tipo básico específico tem o condão de transformá-los
em autores. Vale destacar, ainda, a inserção do verbo coagir, configurador de uma modalidade
especial de constrangimento ilegal (art. 146, CP). Porém, a pena prevista no art. 240, § 1.º, da Lei
8.069/90, modificado pela Lei 11.829/2008, é específica e muito superior, razão pela qual afasta
a aplicação do tipo penal do art. 146 do Código Penal. Contracenar (participar de representação
teatral, televisiva, cinematográfica ou fotográfica) é o verbo nuclear, que se associa ao
envolvimento com crianças ou adolescentes. Cuida-se de uma figura suplementar àquelas
previstas no caput. Em outros termos, quem produz, reproduz, dirige, fotografa, filma ou registra
as cenas está sujeito a uma pena de quatro a oito anos, mas o ator, que trabalha com o menor,
igualmente, responde pela corrupção moral, devendo, como regra, receber a mesma pena.
Conferir: TJPB: “Nos crimes de pedofilia, descritos no Estatuto da Criança e do Adolescente, o
eventual consentimento da vítima menor é de todo irrelevante para a consumação dos delitos.
Aquele que mantém conjunção carnal com adolescente de 15 anos e armazena, em mídia pessoal,
fotos íntimas dos encontros sexuais, responde pelos ilícitos do art. 240, § 1º, e art. 241-B, caput,
ambos do ECA, em concurso material, não se falando em aplicação do princípio da consunção
penal. Precedente” (Ap. Crim. 00012752020128150341-PB, Câmara Especializada Criminal, rel.
Márcio Murilo da Cunha Ramos, 18.07.2017, v.u.). TJRS: “1. Comprovado nos autos, através
diversos elementos, bem como pelas narrativas das vítimas, criança e adolescente, de onze e
quinze anos de idade respectivamente, que o acusado tentou recrutá-las e coagi-las a participar de
cenas de sexo explícito ou pornográficas, a contracenar e por ele serem fotografadas ou registradas
por outros meios, tais como filmagens e capturações de imagens no aparelho celular, correta a sua
condenação por infração ao art. 240, § 1.º, do ECA, combinado com o art. 14, inciso II, do CP. 2.
Demonstrado, ainda, pelas diversas fotografias, relatório dos vídeos, relatos das testemunhas e
dos policiais, que o acusado fotografou e filmou diversas adolescentes em cenas sexuais e
pornográficas, resultando a negativa do acusado totalmente insulada no contexto probatório,
também é mantida a sua condenação por infração ao art. 240, caput, e § 1.º, da Lei 8.069/90”
(Apelação Criminal 70062289657, 5.ª Câm. Criminal, rel. Cristina Pereira Gonzales, 11.02.2015).
TJMS: “1. O crime em comento tem sujeito ativo comum, ou seja, qualquer pessoa que produza,
reproduza, dirija, fotografe, filme, registre ou ainda nos termos do § 1.º, agencie, facilite, recrute,
coaja, intermedeie ou contracene com criança ou adolescente. Não há dúvida, portanto, que a
conduta do apelante está abarcada pela norma incriminadora do art. 240 do ECA. A conduta do
autor estava voltada à satisfação da sua lascívia, independentemente do consentimento da vítima,
por se tratar de adolescente, com proteção integral estabelecida pelo Estatuto da Criança e
do Adolescente, cujo objetivo é justamente tutelar a criança e o adolescente de forma ampla, como
o melhor interesse destas, sobretudo porque, como já dito, a liberdade sexual da vítima
adolescente foi atingida. 2. O erro de tipo é a falsa percepção da realidade acerca dos elementos
constantes do tipo penal. Esse instituto impede o agente de compreender o aspecto ilícito do fato
por ele praticado. A alegação do apelante de que desconhecia a idade da vítima não encontra, na
minha compreensão, respaldo nos autos constantes dos autos do processo. Há elementos no
processo suficientes para que o apelante pudesse presumir a menoridade da vítima” (Apelação
Criminal n.º 0005172-24.2011.8.12.0002, 2.ª Câm. Criminal, rel. Luiz Gonzaga Mendes Marques,
02.03.2015, m.v.).
97. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito passivo
é a criança ou o adolescente.
98. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa. Em grande parte dos casos, o agenciador ou intermediário tem fim
lucrativo. A anterior redação do art. 240 previa esse específico intuito, punindo--o com sanção
mais rigorosa. A Lei 11.829/2008, entretanto, expurgou qualquer causa de aumento de pena no
tocante à intenção de obter vantagem patrimonial. Deve o magistrado, a despeito disso, no
processo de aplicação da pena, analisar as finalidades do agente (os motivos do crime, como
determina o art. 59 do Código Penal) e, sendo o caso, valorar o intuito de lucro para elevar a
reprimenda. Afinal, agir com intenção de ganho patrimonial, em detrimento da formação moral
de crianças e adolescentes, soa-nos motivação deveras negativa.
99. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança ou o adolescente. O objeto
jurídico é a proteção à escorreita formação moral da criança ou do adolescente.
100. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação
se dá em momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano);
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos);
admite tentativa.
101. Causas de aumento de pena: para as situações descritas nos incisos do § 2.º,
instituem-se causas de aumento de pena, que são de obrigatória aplicação e ingressam no terceiro
estágio da fixação da pena, nos termos do art. 68, caput, do Código Penal. Na anterior redação do
art. 240, § 2.º, previa-se a existência de qualificadoras, alterando-se a faixa abstrata das penas
mínima e máxima. Com a edição da Lei 11.829/2008, manteve-se como causa de elevação da
pena, com o acréscimo de um terço, o cometimento do delito no exercício de cargo ou função
pública, aprimorando-se a redação do dispositivo. Eliminou-se a circunstância de haver finalidade
específica do agente, consistente na obtenção de vantagem patrimonial. Acrescentaram-se novas
situações para o aumento da pena, descritas nos incisos II e III.
102. Exercício de cargo ou função pública: cargo é o posto criado por lei, com
denominação própria na estrutura administrativa, número certo e remunerado pelos cofres do
Estado, vinculando o servidor à Administração estatutariamente; função pública é a atribuição
feita pelo Estado aos seus servidores para que realizem serviços nos três Poderes, sem ocupar
cargo ou emprego. Por interpretação extensiva, necessária para conferir lógica ao sistema, deve-
se incluir, também, o emprego público, que é o posto criado por lei, na estrutura hierárquica da
administração, com denominação própria e padrão de vencimentos específico, ocupado por
servidor com vínculo contratual diverso do estatutário. A previsão legal é correta: o agente
encontra-se no exercício do cargo, função ou emprego público ou, mesmo que não esteja, vale-se
disso para a prática do crime (a pretexto de exercê-la).
103. Relações domésticas, coabitação e hospitalidade: as relações domésticas são
as ligações estabelecidas entre participantes de uma mesma vida familiar, com ou sem laços de
parentesco. Normalmente, as relações domésticas existem entre parentes, quando vivem sob o
mesmo teto e possuem atividades em comum. Nada impede, entretanto, que amigos ou parentes
mais distantes estabeleçam uma vida rotineira própria de integrantes da mesma família,
constituindo, pois, um núcleo de relação doméstica. Exemplo disso é a família formada por
companheiros, independentemente do matrimônio. As relações de coabitação consistem em
ligações formadas por pessoas que habitam sob o mesmo teto. Não se exige amizade ou
intimidade entre elas. Ilustrando, coabitam os moradores de uma pensão ou estudantes que
dividam um apartamento. As relações de hospitalidade são formadas por ocasião de visitas ou
estadas temporárias em lar alheio. Originam-se das relações sociais e de convívio. Cuida-se de
causa inédita de aumento de pena no contexto dos crimes envolvendo sexo e pornografia, com
inequívoco acerto por parte do legislador. Muitos produtores ou intermediários para fotos, filmes
e outras atividades, nesse cenário, originam-se do núcleo de convivência da vítima, justamente
pela maior proximidade que possuem e acesso facilitado.
104. Relações de parentesco: complementando o disposto no inciso anterior, insere-
se no texto legal a possibilidade de haver laços de parentesco ou de qualquer forma de
subordinação entre agente e vítima. Soa-nos correta a introdução dessas causas de aumento de
pena, pois há maior proximidade e acesso livre do autor do delito em relação à pessoa ofendida.
Não importa, para a configuração da causa de elevação da pena, se o parentesco é consanguíneo
ou originário da adoção. Incluem-se, ainda, os vínculos formados entre tutor e tutelado, curador
e curatelado, preceptor e aluno ou aprendiz, empregador e empregado. Afirma-se, por derradeiro,
com correção, a viabilidade de qualquer outra forma de relação de autoridade criada entre agente
e vítima, tal como a de guarda e pupilo. Neste cenário, admite-se a relação de autoridade criada
com o consentimento do ofendido, algo razoável, pois se cuida de criança ou adolescente. A
aquiescência do menor de 18 anos não deve ter relevo, quando se cuida da proteção de sua
formação moral no âmbito sexual.
Art. 241. Vender ou expor105-107 à venda fotografia, vídeo ou outro registro que
contenha cena de sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente:108-
109

Pena – reclusão, de 4 (quatro) a 8 (oito) anos, e multa.110-111

105. Análise do núcleo do tipo: vender (alienar por determinado preço) e expor à
venda (apresentar algo para que seja objeto de alienação) são as condutas alternativas, cujo objeto
é a fotografia (processo de fixação da imagem estática de algo ou alguém em base material,
valendo-se de câmaras aptas a tanto), vídeo (obra audiovisual, que proporciona a fixação de
imagens e/ou som, em sequência) ou registro (base material apropriada, apta a fixar dados em
geral) de criança ou adolescente em cenas de sexo explícito (relações sexuais aparentes e visíveis)
ou em cenário pornográfico (situações de libidinagem ou devassidão). A figura típica é inédita e
cuida, especificamente, do comerciante de fotos e imagens em geral de crianças e adolescentes
envoltas em situações pornográficas ou de sexo explícito. Parece-nos correta a sua inserção na
Lei 8.069/90. Por outro lado, o adquirente das fotos ou vídeos, antes do advento da Lei
11.829/2008, por carência de tipo penal incriminador, poderia ficar impune. Essa situação foi
modificada com a criação do art. 241-B, conforme se verá. Não há menção do meio circulante de
tais fotos, vídeos ou registros, muito embora, atualmente, a maioria dos casos circunscreva-se à
rede mundial de computadores (Internet). Na jurisprudência: STJ: “Não se olvida que a
jurisprudência desta Corte posicionou-se no sentido de que o delito capitulado no art. 241, da Lei
8.069/90 se consuma com o ato de publicação das imagens” (CC 130.134/TO, 3.ª Seção, rel.
Marilza Maynard 09.10.2013, v.u.); “Inexiste no ordenamento jurídico norma penal não
incriminadora explicativa que esclareça o conceito de pornografia infantil ou infantojuvenil, razão
pela qual a previsão contida no art. 241 do Estatuto da Criança e do Adolescente, antes da redação
dada pelas Leis n. 10.764/2003 e 11.829/2008, não se limita à criminalização somente da conduta
de publicar fotos de crianças e adolescentes totalmente despidas. Cabe ao intérprete da lei,
buscando a melhor aplicação da norma ali contida, diante do caso concreto, analisar se a conduta
praticada pelo paciente se amolda à prevista no dispositivo em questão, de modo que nada impede
que se analise, além das fotos, isoladamente, o contexto em que elas estão inseridas (publicadas).
Deve o magistrado se valer dos meios de interpretação colocados à sua disposição para adequar
condutas, preencher conceitos abertos e, por fim, buscar a melhor aplicação da norma de acordo
com a finalidade do diploma em que ela está inserida, que, no caso dos autos, é a proteção da
criança e do adolescente em condição peculiar de pessoas em desenvolvimento (art. 6.º do ECA).
Dos documentos constantes dos autos, observa-se que foram publicadas na internet fotos de
crianças e adolescentes seminuas, algumas de roupas de banho, outras mostrando partes do corpo
e outras em poses relativamente sensuais, situação que reforça a impossibilidade de mudança do
convencimento a respeito da conduta imputada ao paciente” (HC 168.610/BA, 6.ª T., rel.
Sebastião Reis Júnior, 19.04.2012, v.u.). TJDF: “Configura a conduta prevista no art. 241, do
ECA, na redação da Lei 10.764/2003, o ato de fotografar crianças em cenas sexualizadas, por
poses e ângulos sensuais, ou despidas em cenas pornográficas” (Apelação 0008122-
28.2008.807.0009, 2.ª T. Criminal, rel. Sérgio Rocha, 06.08.2009, v.u.).
106. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou o adolescente.
107. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa. Embora o tipo penal encerre a venda de fotos, vídeos e outros registros,
o que, na maioria das vezes, implica em ânimo de lucro ou percepção de vantagem patrimonial,
não se exige tal finalidade específica. O agente pode vender ou expor à venda as fotos, vídeos ou
registros por motivo diverso da finalidade lucrativa, devendo ser punido da mesma forma.
108. Objetos material e jurídico: o objeto material é a foto, vídeo ou registro, contendo
pornografia ou sexo explícito com criança ou adolescente. O objeto jurídico é a proteção à
formação moral de crianças e adolescentes.
109. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente). Conferir: STJ: “Conforme entendimento desta
Corte, o delito previsto no art. 241 da Lei 8.069/90 consuma-se no momento da publicação das
imagens, ou seja, aquele em que ocorre o lançamento na Internet das fotografias de conteúdo
pornográfico” (CC 66.981/RJ, 3.ª S., rel. Og Fernandes, 16.02.2009, v.u.; REsp 617.221/RJ, 5.ª
T., rel. Gilson Dipp, 19.10.2004, v.u); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito
pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação se dá em
momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo
(pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite
tentativa.
110. Benefícios penais: não cabe transação, suspensão condicional do processo e
suspensão condicional da pena, como regra. A condenação à pena mínima – quatro anos – pode
resultar na imposição de regime aberto (art. 33, § 2.º, c, CP). Se o magistrado aplicar mais de
quatro anos, mas até oito anos, permite-se a fixação do regime semiaberto. Convém registrar,
ainda, o cabimento, para o patamar mínimo de quatro anos, da substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata de crime cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa.
111. Competência: se o trânsito das fotos, vídeos ou outros registros se der,
exclusivamente, no território nacional, cabe à Justiça Estadual. Entretanto, havendo interligação
com outros países, de modo que se possa considerar o delito iniciado ou finalizado no exterior, a
competência é da Justiça Federal. Conferir: STJ: “‘Aos juízes federais compete processar e julgar:
os crimes previstos em tratado ou convenção internacional, quando, iniciada a execução no País,
o resultado tenha ou devesse ter ocorrido no estrangeiro, ou reciprocamente’ (Constituição
Federal, art. 109, V). 2. Em se evidenciando que os crimes de divulgação de fotografias e filmes
pornográficos ou de cenas de sexo explícito envolvendo crianças e adolescentes não se deram
além das fronteiras nacionais, restringindo-se a uma comunicação eletrônica entre duas pessoas
residentes no Brasil, não há como afirmar a competência da Justiça Federal para o processo e
julgamento do feito” (CC 57.411/RJ, 3.ª S., rel. Hamilton Carvalhido, 13.02.2008, v.u.); “Fixado
nas instâncias ordinárias de que houve efetivo acesso das imagens pornográficas, envolvendo
crianças e adolescentes, por pessoas de outros países, pois teria o paciente criado um sítio
eletrônico na internet para fazer a publicação do material, inclusive enviando-o à Europa, o que
atraiu a atenção da INTERPOL, caracterizada está a competência da Justiça Federal, pois há
transnacionalidade dos fatos tidos por delituosos. Precedentes da Terceira Seção” (HC
200.356/PE, 6.ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura, 24.10.2013, v.u.); “No caso, não há
divergências acerca da transnacionalidade necessária à determinação da competência da Justiça
Federal, já que se trata de site de relacionamento internacional – Orkut – que possibilita a qualquer
pessoa dele integrante o acesso dos dados constantes da página em qualquer local do mundo” (CC
130.134/TO, 3.ª Seção, rel. Marilza Maynard 09.10.2013, v.u.); “Para fixar a competência da
Justiça Federal, não basta o Brasil ser signatário de tratado ou convenção internacional que prevê
o combate a atividades criminosas relacionadas a pedofilia, inclusive por meio da Internet. O
crime há de se consumar com a publicação ou divulgação, ou quaisquer outras ações previstas no
tipo penal do art. 241, caput e §§ 1.º e 2.º, da Lei 8.069/90, na rede mundial de computadores
(Internet), de fotografias ou vídeos de pornografia infantil, dando o agente causa ao resultado da
publicação, legalmente vedada, dentro e fora dos limites do território nacional. Precedentes do
STF e do STJ” (CC 103.011/PR, 3.ª Seção, rel. Assusete Magalhães, 13.03.2013, v.u.). TRF-4:
“O fato do crime ser cometido através da ‘Internet’ não é suficiente para firmar a competência da
Justiça Federal, sendo necessária a prova de que houve execução ou consumação do delito no
exterior. 3. Sendo o crime iniciado no Brasil, sem prova da publicização em outro país, não é caso
de crime à distância, cuja competência para processar e julgar é da Justiça Estadual” (RESE
0000178-76.2010.404.7201, 7.ª T., rel. Sebastião Ogê Muniz, 13.04.2010, v.u.).
Art. 241-A. Oferecer,112-114 trocar, disponibilizar, transmitir, distribuir, publicar ou
divulgar por qualquer meio, inclusive por meio de sistema de informática ou telemático,
fotografia, vídeo ou outro registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente:115-116
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos, e multa.117 § 1.º Nas mesmas penas
incorre quem:
I – assegura118-120 os meios ou serviços para o armazenamento das fotografias, cenas
ou imagens de que trata o caput deste artigo;121-122
II – assegura,123-125 por qualquer meio, o acesso por rede de computadores às
fotografias, cenas ou imagens de que trata o caput deste artigo.126-127 § 2.º As condutas
tipificadas nos incisos I e II do § 1.º deste artigo são puníveis 128 quando o responsável
legal129 pela prestação do serviço, oficialmente notificado,130 deixa de desabilitar o
acesso131 ao conteúdo ilícito de que trata o caput deste artigo.132-133

112. Análise do núcleo do tipo: oferecer (dar como presente ou apresentar para
aceitação), trocar (substituir determinada coisa por outra), disponibilizar (tornar acessível para
aquisição), transmitir (enviar de um lugar a outro), distribuir (entregar a várias
pessoas), publicar (tornar público, de maneira expressa e ampla) e divulgar (difundir, ainda que
implicitamente) são as condutas alternativas, cujo objeto é a fotografia (processo de fixação da
imagem estática de algo ou alguém em base material, valendo-se de câmaras aptas a tanto), o
vídeo (obra audiovisual, que proporciona a fixação de imagens e/ou som, em sequência) ou
registro (base material apropriada, apta a fixar dados em geral) de criança ou adolescente em
cenas de sexo explícito (relações sexuais aparentes e visíveis) ou em cenário pornográfico
(situações de libidinagem ou devassidão). A figura típica tem por escopo atingir todos os meios
de comunicação, em especial a rede mundial de computadores (Internet). O tipo é misto
alternativo, vale dizer, a prática de uma ou mais condutas sequenciais implica no cometimento de
um único delito. O meio ligado a sistema de informática diz respeito a todos os instrumentos
vinculados ao computador; a telemática liga-se a sistemas mistos de computador e meios de
comunicação. Na jurisprudência: TJMG: “A punição do réu, namorado da vítima, por
enquadramento na descrição do tipo penal do art. 240, caput, do ECA, no caso dos autos, ensejará
penalidade muito maior que os danos causados ao bem jurídico ora tutelado, principalmente
considerando que ele já foi punido com os constrangimentos que vem passando, juntamente com
a vítima, perante a sociedade e familiares. Enquadra-se na conduta descrita no Art. 241-A do CP
a transmissão em meio eletrônico de vídeo que continha cena de sexo explícito envolvendo
adolescente” (Apelação 10043100013226001, 1.ª Câm. Criminal, rel. Silas Vieira, 16.04.2013,
v.u.).
112-A. Competência: para facilitar a apuração do crime, levando-se em conta a
consumação, o foro competente deve ser o do lugar da postagem, pouco importando onde se situa
o servidor. Ademais, o advento da rede mundial de computadores não contou com previsão
expressa do CPP, pois muito mais moderna do que a lei processual penal. Vale verificar quando
se consuma o delito. Ora, sendo formal, basta introduzir na rede. Este é o local competente para
a apuração no tocante a quem promove a transmissão, enfim, insere na Internet. Deve-se apurar,
ainda, se há prova da transnacionalidade do delito, de modo a transferir a competência para a
Justiça Federal; não sendo o caso, cabe à Justiça Estadual o julgamento. Conferir: STJ: “1. A
consumação do delito, que atualmente tem previsão no art. 241-A do Estatuto da Criança e do
Adolescente, ‘ocorre no ato de publicação das imagens pedófilo-pornográficas, sendo indiferente
a localização do provedor de acesso à rede mundial de computadores onde tais imagens
encontram-se armazenadas, ou a sua efetiva visualização pelos usuários’ (CC 29.886 – SP, rel.
Min. Maria Thereza de Assis Moura, Terceira Seção, j. 12.12.2007, DJ 01.02.2008, p. 427). 2. A
conduta delituosa a ser apurada, na hipótese, refere-se à veiculação de imagens de menores
aliciadas para exposição em cenas obscenas, via webcam, por meio do MSN/Orkut e Twitter,
além de hackeamento e utilização do perfil de uma delas, fazendo-se o agente passar por esta,
para comunicar-se com terceiros. 3. Ausentes indícios de transnacionalidade do crime, a tanto não
servindo o mero meio Internet, competente é o juízo estadual do local de indicada residência do
suspeito, em Londrina/PR, na forma do art. 70 do Código de Processo Penal. 4. Conflito
conhecido para declarar competente o Juízo de Direito da Vara Criminal da Comarca de Londrina
– TJ/PR, juízo estranho ao conflito” (CC 136257 – PR, 3.ª S., rel. Nefi Cordeiro, 11.03.2015,
m.v.); “1. A Justiça Federal é competente, conforme disposição do inciso V do art. 109 da
Constituição da República, quando se tratar de infrações previstas em tratados ou convenções
internacionais, como é caso do racismo, previsto na Convenção Internacional sobre a Eliminação
de todas as Formas de Discriminação Racial, da qual o Brasil é signatário, assim como nos crimes
de guarda de moeda falsa, de tráfico internacional de entorpecentes, de tráfico de mulheres, de
envio ilegal e tráfico de menores, de tortura, de pornografia infantil e pedofilia e corrupção ativa
e tráfico de influência nas transações comerciais internacionais. 2. Deliberando sobre o tema, o
Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário n. 628.624/MG,
em sede de repercussão geral, assentou que a fixação da competência da Justiça Federal para o
julgamento do delito do art. 241-A do Estatuto da Criança e do Adolescente (divulgação e
publicação de conteúdo pedófilo-pornográfico) pressupõe a possibilidade de identificação do
atributo da internacionalidade do resultado obtido ou que se pretendia obter. Por sua vez, a
constatação da internacionalidade do delito demandaria apenas que a publicação do material
pornográfico tivesse sido feita em ‘ambiência virtual de sítios de amplo e fácil acesso a qualquer
sujeito, em qualquer parte do planeta, que esteja conectado à internet’, e que ‘o material
pornográfico envolvendo crianças ou adolescentes tenha estado acessível por alguém no
estrangeiro, ainda que não haja evidências de que esse acesso realmente ocorreu’ (RE 628.624,
Relator Min. Marco Aurélio, Relator p/ Acórdão Min. Edson Fachin, Tribunal Pleno, julgado em
29/10/2015, Acórdão Eletrônico Repercussão Geral – Mérito, DJe-062 divulg. 05-04-2016
public. 06-04-2016). 3. Situação em que os indícios coletados até o momento revelam que as
imagens da vítima foram trocadas por particulares via Whatsapp e por meio de chat na rede social
Facebook. 4. Tanto no aplicativo WhatsApp quanto nos diálogos (chat) estabelecidos na rede
social Facebook, a comunicação se dá entre destinatários escolhidos pelo emissor da mensagem.
Trata-se de troca de informação privada que não está acessível a qualquer pessoa. 5. Diante de tal
contexto, no caso concreto, não foi preenchido o requisito estabelecido pela Corte Suprema de
que a postagem de conteúdo pedófilo-pornográfico tenha sido feita em cenário propício ao livre
acesso. 6. A possibilidade de descoberta de outras provas e/ou evidências, no decorrer das
investigações, levando a conclusões diferentes, demonstra não ser possível firmar
peremptoriamente a competência definitiva para julgamento do presente inquérito policial. Isso,
não obstante, tendo em conta que a definição do Juízo competente em tais hipóteses se dá em
razão dos indícios coletados até então, revela-se a competência do Juízo Estadual. 7. Conflito
conhecido, para declarar a competência do Juízo de Direito da Vara Criminal e Execução Penal
de São Sebastião do Paraíso/MG, o suscitado” (CC 150564-MG, 3ª S., rel. Reynaldo Soares da
Fonseca, 26.04.2017, v.u.). Em outro sentido: STJ: “1. Fixou o Supremo Tribunal Federal, em
sede de repercussão geral, nos autos do RE 628.624/SP, Relator para acórdão Ministro Edson
Fachin, que: ‘Compete à Justiça Federal processar e julgar os crimes consistentes em
disponibilizar ou adquirir material pornográfico envolvendo criança ou adolescente (arts. 241,
241-A e 241-B da Lei nº 8.069/1990) quando praticados por meio da rede mundial de
computadores.’ 2. No caso, a conduta foi praticada pela rede mundial de computadores, com
utilização de programas de compartilhamento de arquivos, cujo acesso é franqueado a todos, em
qualquer lugar, que fazem uso da ferramenta. 3. Sendo o Brasil signatário de tratados
internacionais objetivando a repressão criminal de condutas relacionadas à pornografia infantil,
bem como verificada a disponibilidade do material pornográfico inclusive no exterior, de rigor o
reconhecimento da competência da Justiça Federal para a causa, nos termos do art. 109, inciso V,
da Carta Magna. 4. Ordem concedida para declarar nulos os atos praticados pelo Juízo Estadual,
com determinação de remessa dos autos à Justiça Federal, bem como de expedição de alvará de
soltura” (HC 392644-SP, 6ª T., rel. Maria Thereza de Assis Moura, 06.06.2017, v.u.).
113. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou adolescente.
114. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa. O ânimo específico do agente pode ser qualquer um (obtenção de
vantagem patrimonial, satisfação da lascívia, entre outros), porém, parece-nos deva ser levado em
consideração para a fixação da pena, nos termos do art. 59 do Código Penal (motivos do crime).
115. Objetos material e jurídico: o objeto material é a foto, o vídeo ou outro registro,
contendo pornografia ou sexo explícito com criança ou adolescente. O objeto jurídico é a proteção
à formação moral de crianças e adolescentes.
116. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação
se dá em momento determinado), porém é viável considerá-lo permanente nas modalidades
“disponibilizar” e “divulgar”, conforme o meio escolhido pelo agente. A disponibilização de fotos
ou vídeos, pela Internet, proporcionando o livre acesso de qualquer pessoa a qualquer momento,
evidencia a contínua exposição da imagem da criança ou adolescente, resultando em permanência;
de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano), vide o acórdão citado acima;
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos);
admite tentativa.
117. Benefícios penais: não cabe transação, suspensão condicional do processo e
suspensão condicional da pena, como regra. A condenação à pena mínima – três anos – pode
resultar na imposição de regime aberto (art. 33, § 2.º, c, CP). Se o magistrado aplicar mais de
quatro anos, mas até seis anos, permite-se a fixação do regime semiaberto. Convém registrar,
ainda, o cabimento, para o patamar de três a quatro anos, da substituição da pena privativa de
liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata de crime cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa.
118. Análise do núcleo do tipo: assegurar (garantir, proporcionar a realização de algo
com certeza) é o verbo nuclear, cujo objeto é o meio (recurso empregado para a obtenção de algo)
ou serviço (desempenho de trabalho ou atividade, como regra, remunerada) para o
armazenamento (manter em depósito ou outro lugar a isso destinado) das fotografias e demais
imagens referidas no caput. Busca-se deixar clara a necessidade de punição do partícipe, que,
embora não tenha divulgado, por exemplo, as fotos de pornografia infantojuvenil, em qualquer
meio de comunicação, proporciona os mecanismos para o acúmulo do material. Ainda ilustrando,
pode ser a pessoa que possui computadores com elevada capacidade de armazenamento, em
discos rígidos, de fotografias digitais (que consomem muito espaço em base material apropriada,
como cartuchos e CDs), propiciando àquele que oferece, troca, disponibiliza, transmite, distribui,
publica ou divulga maiores opções de escolha quando inserir as fotos nos meios de comunicação,
comumente a Internet.
119. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou o adolescente.
120. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
121. Objetos material e jurídico: o objeto material é o meio ou serviço de
armazenamento de fotos, vídeos ou registros pornográficos, envolvendo menores. O objeto
jurídico é a proteção à formação moral de crianças e adolescentes.
122. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica em ação); permanente (a consumação se
protrai no tempo, enquanto durar o armazenamento); de perigo abstrato (presume-se a
probabilidade de dano); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente
(praticada em vários atos); admite tentativa.
123. Análise do núcleo do tipo: assegurar (garantir, proporcionar a realização de algo
com certeza) é o verbo nuclear, cujo objeto é o acesso (estabelecer comunicação, como regra, por
computador), por rede de computadores (Internet ou outra forma de sistema de conexão de
máquinas), às fotos, cenas ou imagens pornográficas, envolvendo crianças ou adolescentes. É o
partícipe ligado à mantença de sites, que hospedam o material inadequado, a ser visualizado por
terceiros, usuários da Internet, como regra. Pode ser, inclusive, o provedor, que possibilita o
acesso à Internet, bem como a navegação em sites de conteúdo indevido, como também o criador
do site, hospedeiro do material pornográfico. Este último somente deve ser punido se tiver ciência
do tipo de site que está criando e qual sua finalidade. A atual redação do art. 241-A, § 1.º, II,
amplia a tipificação incriminadora antes existente no art. 241, § 1.º, III. Neste artigo mencionava-
se apenas a rede mundial de computadores (Internet). Após a edição da Lei 11.829/2008, passa-
se a punir a mantença de qualquer tipo de rede de computadores (inclusive, por exemplo, a
existente dentro de uma empresa), que proporcione o acesso ao material pornográfico envolvendo
menores de 18 anos. Logicamente, a ampliação mantém o foco voltado à Internet, pois esta não
deixa de ser uma rede de computadores. Na jurisprudência: STJ: “Não obstante a origem do
material em questão seja, em tese, advinda da Internet, a conduta que se pretende apurar consiste
no download realizado, pelo investigado, e na armazenagem de vídeos, em computadores de
escolas municipais – o que se amolda ao crime previsto no art. 241-A, § 1.º, II, da Lei 8.069/90,
cuja redação, vigente ao tempo dos fatos, é anterior a Lei 11.829/2008 –, inexistindo, por ora,
como destacou o Ministério Público Federal, indícios de que o investigado tenha divulgado ou
publicado o material pornográfico além das fronteiras nacionais” (CC 103.011/PR, 3.ª Seção, rel.
Assusete Magalhães, 13.03.2013, v.u.).
124. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou o adolescente.
125. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
126. Objetos material e jurídico: o objeto material é o meio que permite o acesso às
fotos, cenas ou imagens pornográficas, envolvendo menores, em navegação por rede de
computadores. O objeto jurídico é a proteção à formação moral de crianças e adolescentes.
127. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica em ação); permanente (a consumação se
protrai no tempo, enquanto durar a manutenção do acesso ao material inadequado); de perigo
abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só
pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite tentativa.
128. Condição objetiva de punibilidade: considera-se condição objetiva de
punibilidade a condição exterior à conduta delituosa, não abrangida pelo elemento subjetivo, que,
como regra, encontra-se fora do tipo incriminador, tornando-se parâmetro para a punição do
agente. A inserção do disposto no § 2.º do art. 241-A é inédita. A lei anterior, ao cuidar das
mesmas condutas no art. 241, § 1.º, II e III, deixou de prever qualquer tipo de obstáculo para a
punição do agente. A atual previsão evidencia cautela por parte do legislador e não deixa de ter
significado prático, bem como utilidade razoável. Em primeiro lugar, vale destacar que as
condutas incriminadas envolvem, em grande parte, as pessoas que lidam com a Internet,
particularmente, os provedores de acesso e mantenedores de sites. Assim sendo, quando o
material pornográfico infantojuvenil é viabilizado na rede mundial de computadores, torna-se
mais fácil localizar o provedor do que propriamente o criador da imagem. No entanto, há inúmeros
profissionais que alegam ignorância ou procuram isentar-se de responsabilidade, afirmando que
única e tão somente sustentam o acesso aos sites, mas não fiscalizam o seu conteúdo. Alegam,
ainda, ser impossível controlar todo o material circulante pela Internet, durante 24 horas, sem
interrupção. Eis por que se insere essa condição objetiva de punibilidade, que passa a funcionar
como anteparo às alegadas situações de erro ou ignorância. O tipo penal é preenchido, nas formas
dos incisos I ou II, do § 1.º, do art. 241-A, porém, antes de qualquer medida penal, demanda-se a
notificação do responsável pela prestação do serviço, alertando-o acerca do material pornográfico
e, ao mesmo tempo, possibilitando-lhe que desative o acesso imediatamente, o que demonstraria
a ausência de ligação com o agente criminoso. Naturalmente, muitos profissionais que atuam
como autênticos partícipes da conduta delituosa, cientes e coniventes com a divulgação de
imagens de menores envolvidos em pornografia, terminarão favorecidos pela condição
estabelecida em lei. Afinal, ainda que eles tenham agido com dolo e bem certos de que o material
acessível pela rede de computadores era ilícito, não poderão ser punidos enquanto não for
preenchida a formalidade legalmente imposta. Por isso, voltamos a insistir, cuida-se de condição
objetiva de punibilidade, que não se liga ao dolo do agente. Havendo ou não a vontade de divulgar
fotos ou imagens pornográficas, exige-se a notificação e, consequentemente, a possibilidade de
evitar a punição criminal se o serviço for desabilitado. Os bons profissionais, que, porventura,
possam ser ludibriados, possibilitando o acesso de pedófilos, por exemplo, à rede de
computadores, assim que oficialmente alertados, terão condições de sustar a prestação do serviço,
interrompendo o acesso ao material. De todo modo, parece-nos positiva a inserção dessa
condição, uma vez que a maioria dos casos envolve operadores honestos, muitas vezes alheios ao
conteúdo que circula pela rede de computadores, particularmente, a Internet.
129. Responsável legal: é a pessoa que possui condições técnicas e efetivas de alcançar
a interrupção do serviço de acesso à rede de computadores. A referência ao responsável
legal deve circunscrever-se àquele que detém poder de mando, vale dizer, o sujeito com
possibilidade real de interferir no meio de acesso, ordenando a sua interrupção. De nada adiantaria
notificar um funcionário qualquer de empresa provedora do serviço de acesso, quando ele nada
possa fazer para bloquear, de imediato, a situação indesejada. Deve-se, pois, buscar a pessoa capaz
de receber citação em nome da empresa, pois é legalmente capaz de, em nome desta, agir. A
condição objetiva de punibilidade volta-se, basicamente, ao universo das empresas, que mantêm
sites e serviços de acesso à Internet. Acrescente-se, ainda, que o responsável pela prestadora de
serviços é justamente, como regra, aquele que ignora a circulação do material ilícito. Alertado,
deve desabilitar o acesso. Não o fazendo, demonstra que a mantença do meio ou do serviço de
acesso lhe é vantajosa de algum modo, razão pela qual o preenchimento do tipo incriminador fica
patente, incluindo-se a condição para punir. Lembremos que, tecnicamente, inexiste obstáculo à
configuração plena do tipo penal após a notificação, uma vez que as formas descritas nos incisos
I e II do § 1.º do art. 241-A são permanentes. Desse modo, enquanto durar o acesso ao material
pornográfico, o crime se encontra em fase de consumação.
130. Notificação oficial: é a comunicação formal emitida por autoridade competente
para apurar o cometimento do crime. Cuida-se, portanto, de uma intimação, dando-se ciência da
ocorrência de fato relevante (o serviço de armazenamento ou de acesso a material pornográfico
infantojuvenil) e aguardando-se providência (a desativação do referido serviço). Parece-nos
fundamental seja feita pessoalmente, por mandado, afinal, o descumprimento dos seus termos
implica a viabilização de punição criminal. Entretanto, se for realizada por outra forma (meio
eletrônico ou por correio), depende-se, para o preenchimento da condição objetiva de
punibilidade, de prova idônea do seu recebimento pelo destinatário. Exemplos: pelo correio, o
aviso de recebimento deve ser assinado diretamente pelo responsável legal; por meio eletrônico,
o acesso ao e-mail deve ser validado pela assinatura digital, por certificação. Não são notificações
oficiais outras formas de comunicação, como cartas enviadas pela vítima ou seus parentes;
reportagens em meios de comunicação; cartas emitidas por organizações não governamentais,
embora de apoio à criança ou adolescente. Preenche o perfil da notificação oficial a intimação
realizada por juiz ou promotor da Infância e da Juventude, pois se trata de autoridade encarregada
de zelar pelo bem-estar de crianças e adolescentes. Ademais, apurando-se o envolvimento de
criança ou adolescente em pornografia, cabe às autoridades ligadas à Vara da Infância e da
Juventude atuar imediatamente, antes mesmo que o fato chegue ao conhecimento da esfera
criminal. Seria demasiado apego à forma exigir que a notificação fosse feita exclusivamente pela
autoridade policial, representante do Ministério Público ou juiz criminal.
131. Prazo para as providências: é indispensável, evitando-se qualquer dúvida quanto
ao preenchimento da condição objetiva de punibilidade. A lei menciona apenas a notificação
oficial, mas há uma providência aguardada por parte do destinatário. Por isso, a cautela demanda
a fixação de um prazo, ainda que curto, para a desativação do serviço, objeto da notificação. O
período variável de 24 a 48 horas parece-nos suficiente.
132. Prisão em flagrante: é viável, pois os crimes tratados pelos incisos I e II do § 1.º
são permanentes. Assim, ultrapassada a fase da notificação, não cessado o serviço de acesso ou
armazenamento, preenche-se a condição objetiva de punibilidade, permitindo a ocorrência de
prisão em flagrante do responsável legal. Por outro lado, convém salientar a inviabilidade dessa
modalidade de prisão antes de efetivada a notificação. Aliás, para que não haja qualquer dúvida,
é recomendável que tal notificação contenha um prazo para a desativação do serviço (ex.: 24 ou
48 horas). Acrescente-se, ainda, não ser possível a banalização da prisão em flagrante de
funcionários ou prepostos da empresa provedora do serviço de armazenamento ou acesso, pois o
crime é condicionado e a referida condição diz respeito ao responsável legal. Portanto, somente
quando este for notificado e não desativar o serviço, pode-se falar em punição do autor principal
– eleito, pela lei, como o responsável legal – e de eventuais coautores ou partícipes. Em suma,
tornando-se viável a prisão em flagrante do responsável legal (após a notificação), inclui-se a
possibilidade, em tese, de se prender, também, os colaboradores diretos, cientes do conteúdo
ilícito do material.
133. Formalidades para a persecução penal: a notificação, constituindo condição
objetiva de punibilidade, passa a representar, no âmbito processual, uma condição de
procedibilidade. Portanto, permite-se a instauração de inquérito policial para investigar os delitos
previstos nos incisos I e II do § 1.º do art. 241-A, mas o indiciamento dos autores e partícipes
somente se fará após o decurso do prazo fixado pela notificação realizada com sucesso. Antes, a
medida se constituirá em constrangimento ilegal. O mesmo se diga em relação ao início da ação
penal. Somente cabe denúncia ou queixa quando a notificação tiver sido, efetivamente, realizada,
e o serviço de armazenamento ou acesso não tiver sido desabilitado. Lembremos, ademais, que a
tardia desativação não impede a consumação do crime, nem o preenchimento da condição objetiva
de punibilidade. Em outras palavras, se o prazo da notificação decorrer, preenchida a condição,
torna-se punível o fato. Se, porventura, em momento posterior, o responsável legal resolver
interromper o serviço, não mais evitará a ação penal, que é pública incondicionada. Pode-se
utilizar a sua atitude como atenuante (art. 65, III, b, CP).
Art. 241-B. Adquirir,134-136 possuir ou armazenar, por qualquer meio, fotografia,
vídeo ou outra forma de registro que contenha cena de sexo explícito ou pornográfica
envolvendo criança ou adolescente:137-138
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos, e multa.139
§ 1.º A pena é diminuída de 1 (um) a 2/3 (dois terços) se de pequena quantidade o
material a que se refere o caput deste artigo.140
§ 2.º Não há crime141 se a posse ou o armazenamento tem a finalidade de comunicar
às autoridades competentes a ocorrência das condutas descritas nos arts. 240, 241,
241-A e 241-C desta Lei, quando a comunicação for feita por:
I – agente público no exercício de suas funções;142
II – membro de entidade, legalmente constituída, que inclua, entre suas finalidades
institucionais, o recebimento, o processamento e o encaminhamento de notícia dos
crimes referidos neste parágrafo;143
III – representante legal e funcionários responsáveis de provedor de acesso ou
serviço prestado por meio de rede de computadores, até o recebimento do material
relativo à notícia feita à autoridade policial, ao Ministério Público ou ao Poder
Judiciário.144
§ 3.º As pessoas referidas no § 2.º deste artigo deverão manter sob sigilo o material
ilícito referido.145

134. Análise do núcleo do tipo: adquirir (obter ou alcançar algo), possuir (ter algo em
sua posse ou detenção) e armazenar (manter em depósito) são as condutas alternativas do tipo
penal, tendo por objeto fotografia (processo de fixação da imagem estática de algo ou alguém em
base material, valendo-se de câmaras aptas a tanto), vídeo (obra audiovisual, que proporciona a
fixação de imagens e/ou som, em sequência) ou registro (base material apropriada, apta a fixar
dados em geral), contendo cenas de sexo explícito ou pornográfica, com criança ou adolescente.
A prática de mais de uma conduta implica a realização de um só delito (ex.: adquirir e armazenar
fotos pornográficas constitui um crime). O tipo penal é inédito e corretamente idealizado, tendo
por finalidade atingir a pessoa que obtém o material, guardando-o consigo. Anteriormente,
inexistia punição para essa situação, como regra. Em casos excepcionais, demandando prova mais
detalhada e específica, poder-se-ia encaixar o receptor das fotos, vídeos ou outros registros como
partícipe do delito cometido por aquele que apresentava, vendia, fornecia, divulgava ou publicava
o material. Com a inclusão da figura criminosa prevista no art. 241-B, torna-se mais simples a
possibilidade de punição do sujeito que mantém as imagens de menores de 18 anos, envolvidos
em pornografia. Lembremos, no entanto, a maior cautela para verificar o dolo do agente, pois a
posse de material pornográfico, por si só, não é crime. A figura delitiva surge quando abrange
menores de 18 anos. Por isso, é fundamental analisar se não houve erro do agente quanto à idade
das pessoas retratadas ou filmadas. A maneira pela qual o autor do crime adquire, possui ou
armazena o material é livre, valendo-se o tipo da expressão “por qualquer meio”. Comumente,
com o avanço da tecnologia e da difusão dos computadores pessoais, dá-se a obtenção de extenso
número de fotos e vídeos pela Internet, guardando-se o material no disco rígido do computador,
em disquetes, DVDs, CDs, pen drives, entre outros. Na jurisprudência: STJ: “6. É típica a conduta
de fotografar cena pornográfica (art. 241-B do ECA) e de armazenar fotografias de conteúdo
pornográfico envolvendo criança ou adolescente (art. 240 do ECA) na hipótese em que restar
incontroversa a finalidade sexual e libidinosa das fotografias, com enfoque nos órgãos genitais
das vítimas – ainda que cobertos por peças de roupas –, e de poses nitidamente sensuais, em que
explorada sua sexualidade com conotação obscena e pornográfica” (REsp 1.543.267/SC, 6.ª
Turma, rel. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 16.02.2016, v.u.). TJAP: “1) A conduta
consubstanciada em manter conversa com criança e disponibilizar, mediante a utilização da rede
mundial de computadores, fotografias, vídeos ou outra forma de registro que contenha cena de
sexo explícito ou pornográfica envolvendo criança ou adolescente é crime previsto no art. 241-B
do ECA. Autoria e materialidade robustamente comprovadas. Condenação mantida” (Ap.
0039977-16.2015.8.03.0001-AP, Câmara Única, rel. Eduardo Freire Contreras, 18.07.2017, v.u.).
TJMS: “Não há falar em ausência de provas do crime de manter vídeo pornográfico envolvendo
criança ou adolescente, se o apelante não comprovou de quem adquiriu o celular contendo o vídeo
pornográfico, e os laudos periciais confirmam que o celular do apelante continha material
pornográfico, incluindo cenas de sexo envolvendo criança/adolescente, do sexo feminino, fato
também confirmado pelas testemunhas que atuaram nas investigações. Recurso improvido” (Ap.
0000884-04.2011.8.12.0044-MS, 1ª Câmara Criminal, rel. Maria Isabel de Matos Rocha,
11.04.2017, v.u.).
134-A. Princípio da insignificância: é aplicável a qualquer delito, incluindo-se este,
cujo bem jurídico tutelado é a formação moral de crianças e adolescentes, garantindo a sua
dignidade sexual. Se a conduta do agente destina-se a fotografar e armazenar cenas sensuais de
quem era ou é sua namorada, com idade superior a 14 anos, não há que se falar em crime. Confira-
se: TJDFT: “2. Como se sabe, o Direito Penal é o segmento do ordenamento jurídico que tem por
função selecionar os comportamentos humanos mais graves e nocivos à sociedade, capazes de
colocar em risco valores fundamentais para convivência social. Assim, a conduta que expressa
ofensividade insignificante, mesmo que formalmente típica, não deve ser alcançada pelo poder
punitivo, ficando, assim, excluída da persecução penal por ausência da tipicidade material. 3. O
Estatuto da Criança e do Adolescente traz em seu bojo artigos que combatem crimes relacionados
à pedofilia na rede mundial de computadores, crimes que têm como foco principal a utilização de
imagens pornográficas infantis. O art. 241-B, especificamente, tem o objetivo de criminalizar a
aquisição e a posse de materiais de conteúdo relacionados à pornografia infantil. 4. O objeto de
proteção da norma, ou seja, o bem jurídico tutelado, é a dignidade da criança e do adolescente,
pois busca protegê-los da exploração sexual decorrente da exposição de suas imagens em material
pornográfico. 5. Na presente hipótese, não há ofensividade relevante ao bem jurídico protegido
pelo tipo penal. Embora seja certo que o acusado possuiu e armazenou imagens de conteúdo
sensual de adolescente, caracterizando formalmente a conduta típica, não se verifica uma ação
relacionada à pedofilia, objeto de proteção do referido tipo penal. 6. O relacionamento íntimo
havido entre as partes, o grau de maturidade da adolescente, a ausência de difusão das imagens e
a falta de qualquer outro indício que sugira a predileção do acusado por pornografia infantil
demonstram que, embora caracterizada a tipicidade formal, não há tipicidade material. É dizer: a
adolescente sequer sofreu o risco de ser explorada sexualmente por meio da exposição de suas
imagens com conteúdo pornográfico. 7. Preliminar rejeitada, e, no mérito, recurso provido” (Ap.
20140710069205APR – DFT, 2.ª T. Criminal., rel. Silvânio Barbosa dos Santos, 25.05.2016,
v.u.).
134-B. Competência: ver a nota 112-A ao artigo anterior.
135. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou o adolescente.
136. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
137. Objetos material e jurídico: o objeto material é a foto, vídeo ou outro registro
pornográfico, envolvendo menores de 18 anos. O objeto jurídico é a proteção à formação moral
de crianças e adolescentes.
138. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação
se dá em momento determinado), na forma adquirir, e permanente (a consumação se protrai no
tempo, enquanto durar a posse ou armazenagem do material inadequado), nas
modalidades possuir e armazenar; de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano);
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos);
admite tentativa.
139. Benefícios penais: não cabe transação, mas é admissível a suspensão condicional
do processo. Em hipótese de condenação, pode ser aplicada a suspensão condicional da pena.
Além disso, é viável o regime aberto (art. 33, § 2.º, c, CP). Convém registrar, ainda, o cabimento
da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata de
crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
140. Causa de diminuição de pena: a possibilidade de diminuição da pena se volta ao
volume do material apreendido, registrando-se, desde logo, tratar-se de infração penal que deixa
vestígio material, razão pela qual é indispensável o exame pericial. O legislador foi sensível à
existência de casos em que se apure ser mínima a quantidade de fotos, vídeos ou outros registros,
envolvendo pornografia infantojuvenil. Por isso, a punição ocorrerá quase como um alerta para
que tais fatos não se repitam, mas com uma diminuição razoável de pena. A medida da redução
(1/3 a 2/3) deve dar-se no cenário da qualidade do material apreendido. Pensamos devam existir
três faixas: a) ínfima quantidade (uma foto de conteúdo levemente obsceno, por exemplo), capaz
de configurar o crime de bagatela, tornando o fato atípico; b) pequena quantidade (algumas fotos
ou um vídeo, que é a composição sequencial de várias fotos), apta a gerar a diminuição de um a
dois terços; c) grande quantidade (várias fotos ou inúmeros vídeos, ou mesmo um vídeo muito
extenso), que fomenta a aplicação da pena nos patamares normais (de um a quatro anos de
reclusão). Levando-se em conta que a pequena quantidade é fator desencadeante de redução da
pena, resta, ainda, a análise do quantum a ser aplicado. Ora, outro elemento essencial para a
avaliação do grau de censura merecido pela conduta criminosa é o conteúdo do material
pornográfico. Há fotos, vídeos e registros expondo situações grotescas, envolvendo menores de
18 anos. Nesse caso, a apreensão de algumas fotografias desse quilate permite a diminuição da
pena, porém valendo-se o juiz do mínimo possível (um terço). Em casos de fotos, vídeos e outros
registros espelhando situações obscenas sutis ou indiretas, sugestivas de sexo, sem explicitação,
pode-se operar a diminuição em patamar máximo (dois terços). Outros percentuais devem ser
aplicados, conforme o prudente critério do magistrado no caso concreto. Na jurisprudência: TJSC:
“Apreendido apenas um vídeo contendo cenas de sexo de uma infante com um adulto, não
armazenado no hard disc, possível o reconhecimento da benesse contida no § 1º do art. 241-B da
Lei n. 8.069/90” (Ap. Crim. 0027177-83.2009.8.24.0064-SC, 3ª Câmara Criminal, rel. Moacyr
de Moraes Lima Filho, 16.05.2017, v.u.); “É viável a incidência da causa de diminuição de pena
do art. 241-B, § 1º, do Estatuto da Criança e do Adolescente em seu patamar máximo se o agente
armazena quatro imagens de adolescentes em poses cândidas, e em apenas uma delas as menores
aparecem despidas, sem que estivessem envolvidas em ato sexual explícito” (Ap. Crim. 0003153-
85.2013.8.24.0052-SC, 2ª Câmara Criminal, rel. Sérgio Rizelo, 15.08.2017, v.u.).
141. Excludente de ilicitude: a expressão não há crime é indicativa do afastamento da
antijuridicidade da conduta, que não deixa de ser típica. Cuida-se, na hipótese retratada no § 2.º,
de exercício regular de direito ou de estrito cumprimento do dever legal, conforme o caso (conferir
o disposto no art. 5.º, I, e § 3.º, do Código de Processo Penal). Em verdade, nem seria necessária
a existência do preceituado neste dispositivo, pois as excludentes estão previstas, de modo
genérico, no art. 23, III, do Código Penal. Por cautela, entretanto, o legislador deixou bem clara
a viabilidade de armazenamento do material para o fim de denúncia dos delitos envolvendo
criança ou adolescente no âmbito da pornografia. Aliás, outra não poderia ser a hipótese, pois,
como já mencionado, tratando-se de crime que deixa vestígios, torna-se fundamental a apreensão
das fotos, vídeos ou registros para a elaboração do laudo pericial. Eis por que agentes públicos e
outros entes ligados à proteção dos interesses infantojuvenis podem – e devem – atuar. Não é
demais ressaltar a precaução que se deve ter ao avaliar a posse ou o armazenamento desse tipo de
material pornográfico, justamente para que não exista a camuflagem de agentes do crime, sob o
pretexto de terem consigo fotos, vídeos e outros registros com o fim de comunicação à autoridade
competente. É fundamental a produção de provas a respeito, demandando-se análise minuciosa
em relação à quantidade de material guardado, o tempo de posse ou armazenagem, a específica
atividade ou função exercida pelo agente, dentre outros pontos essenciais para a configuração da
excludente de ilicitude.
142. Agente público: cuida-se do servidor ocupante de cargo, emprego ou função
pública. Embora a lei não especifique, como regra, envolve o agente público cujas atividades se
vinculam à área da infância e da juventude, além de abranger aquele que for ligado à investigação
criminal em geral. Por outro lado, quando a posse ou o armazenamento se realizar, nesse cenário,
trata-se de especial hipótese de estrito cumprimento do dever legal. Entretanto, se o agente não
estiver no exercício de suas funções, ainda assim pode atuar, cuidando-se, então, de exercício
regular de direito. Afinal, como já mencionado na nota anterior, qualquer pessoa pode levar ao
conhecimento da autoridade a ocorrência de crime, mormente os de ação pública incondicionada.
143. Membro de entidade de proteção ao menor: o inciso II do § 2.º volta-se, em
grande parte, às entidades não governamentais, que se envolvam em atividades de proteção à
criança e ao adolescente, o que, certamente, abrange a manipulação de dados acerca da exploração
do menor de 18 anos. Por isso, vários desses entes recebem, registram, encaminham e
acompanham as denúncias relativas ao envolvimento de crianças e adolescentes em atos
pornográficos. É natural que, assim procedendo, devam reter material consigo, de modo a instruir
as comunicações às autoridades competentes. Trata-se de hipótese específica de exercício regular
de direito.
144. Representante legal ou funcionário de provedor: as empresas prestadoras de
serviços na área da rede de computadores, particularmente os provedores de acesso à Internet,
lidam com o armazenamento de material variado, podendo abranger fotos, vídeos e outros
registros de crianças ou adolescentes em cena de sexo explícito ou pornográfica. Portanto, em
razão da atividade diretamente ligada ao conhecimento desse material, torna-se natural que
possam manter esses registros com o fim de comunicação à autoridade competente. Aliás, quando
notificadas oficialmente, nos termos do art. 241-A, § 2.º, desta Lei, devem desabilitar o acesso do
público ao conteúdo ilícito do material, não significando destruí-lo ou inutilizá-lo de qualquer
forma. Mantém-se o volume de registros para que permita a utilização pelas autoridades
competentes e para a feitura do exame de corpo de delito. Tal mantença deve ser breve, em tempo
suficiente para transmitir os dados aos agentes públicos.
145. Dever de sigilo: impõe a lei o dever de ser mantido em sigilo o material ilícito sob
posse ou armazenamento feito pelos agentes públicos, membros de entidades de proteção ao
menor ou empregados de empresa provedora de serviços de acesso à rede de computadores. A
violação desse preceito, quando dolosa, pode acarretar a configuração do crime previsto no art.
241-A desta Lei.
Art. 241-C. Simular 146-148
a participação de criança ou adolescente em cena de sexo
explícito ou pornográfica por meio de adulteração, montagem ou modificação de
fotografia, vídeo ou qualquer outra forma de representação visual:149-150
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.151
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas quem vende,152-154 expõe à venda,
disponibiliza, distribui, publica ou divulga por qualquer meio, adquire, possui ou
armazena o material produzido na forma do caput deste artigo.155-156

146. Análise do núcleo do tipo: simular significa representar ou reproduzir algo com a
aparência de realidade. O objeto da conduta é a participação de criança ou adolescente em cena
de sexo explícito ou pornográfica. Na realidade, o que se busca nesta figura típica é a punição
daquele que, não possuindo material verdadeiro (fotos, vídeos ou outros registros contendo
imagens de menores de 18 anos em cenas pornográficas), promove o simulacro necessário,
alterando cenas, por meio de programas específicos, com o fim de criar imagens dissimuladas.
Ilustrando, o agente possui fotos de cenas de sexo explícito, abrangendo maiores de 18 anos;
entretanto, promove a modificação desse material, inserindo rostos de adolescentes no lugar dos
verdadeiros protagonistas das referidas cenas. Embora não se esteja lidando com uma produção
autêntica, de qualquer modo fere-se o bem jurídico tutelado, vale dizer, a boa formação moral da
criança ou adolescente. Divulgar fotos ou outras imagens simuladas, contendo pornografia, causa,
igualmente, prejuízo às pessoas retratadas, além de estimular outras a buscar cenas reais. As
condutas possíveis são as seguintes: simular a participação do menor, adulterando (falsificar,
modificar); simular a participação do menor, montando (reunir peças ou elementos para constituir
um todo); simular a participação do menor, modificando (alterar, transformar). As ações
de adulterar e modificar são similares, constituindo a primeira uma espécie de falsificação.
147. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou adolescente envolvidas na cena simulada.
148. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não se exige elemento subjetivo específico,
nem se pune a forma culposa.
149. Objetos material e jurídico: o objeto material é a foto, vídeo ou outra forma de
representação visual pornográfica, envolvendo menores de 18 anos. O objeto jurídico é a proteção
à formação moral de crianças e adolescentes.
150. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (o verbo implica em ação); instantâneo (a consumação se dá
em momento determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano);
unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos);
admite tentativa.
151. Benefícios penais: não cabe transação, mas é admissível a suspensão condicional
do processo. Em hipótese de condenação, pode ser aplicada a suspensão condicional da pena.
Além disso, é viável o regime aberto (art. 33, § 2.º, c, CP). Convém registrar, ainda, o cabimento
da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata de
crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
152. Análise do núcleo do tipo: vender (alienar por certo preço), expor à
venda (oferecer algo para alienação), disponibilizar (tornar acessível para
aquisição), distribuir (entregar a várias pessoas), publicar (tornar público, de maneira expressa e
ampla), divulgar (difundir, ainda que implicitamente), adquirir (obter), possuir (ter em seu
poder, sob posse ou detenção) e armazenar (guardar, manter em depósito) são as condutas
alternativas, cujo objeto é o material adulterado, montado ou modificado, simulando a
participação de criança ou adolescente em cena de sexo explícito ou pornográfica. Cuida-se de
natural decorrência da figura criminosa descrita no caput, pois interessa punir, igualmente, quem,
de qualquer forma, difunde ou mantém o material simulado.
153. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou adolescente, participante da simulação realizada.
154. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
155. Objetos material e jurídico: o objeto material é a foto, vídeo ou outra forma de
representação visual pornográfica simulada, envolvendo menores de 18 anos. O objeto jurídico é
a proteção à formação moral de crianças e adolescentes.
156. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança ou do adolescente); de forma livre (pode ser cometido por qualquer
meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação
se dá em momento determinado) na maior parte das condutas, porém adquire o caráter permanente
(a consumação se protrai no tempo) nos formatos disponibilizar e divulgar, dependendo do meio
eleito pelo agente; de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo (pode
ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite tentativa.
Art. 241-D. Aliciar, assediar, instigar ou constranger,157-159 por qualquer meio de
comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso:160-161
Pena – reclusão, de 1 (um) a 3 (três) anos, e multa.162
Parágrafo único. Nas mesmas penas incorre quem:
I – facilita ou induz163-165 o acesso à criança de material contendo cena de sexo
explícito ou pornográfica com o fim de com ela praticar ato libidinoso;166-167
II – pratica as condutas descritas no caput deste artigo com o fim de induzir criança
a se exibir de forma pornográfica ou sexualmente explícita.168

157. Análise do núcleo do tipo: aliciar (seduzir, atrair), assediar (perseguir,


importunar), instigar (incentivar, fomentar) e constranger (incomodar, obrigar pela força) são as
condutas componentes de tipo misto alternativo, cujo objeto é a criança. A finalidade do cerco
empreendido pelo agente é a prática de ato libidinoso (envolvimento lascivo, apto a gerar prazer
sexual). O tipo incriminador é inédito e corretamente inserido no Estatuto da Criança e do
Adolescente pela Lei 11.829/2008. Volta-se, primordialmente, ao agente que se comunica, via
Internet (embora a lei mencione qualquer meio de comunicação), por intermédio de salas de bate-
papo, sites, mensagens eletrônicas, dentre outros instrumentos, com crianças, buscando atraí-las
para a mantença de relacionamento sexual. Lembremos que outros atos, cuidando do mero
registro de imagens pornográficas, provoca a configuração de delitos diversos. No caso da figura
do art. 241-D, preocupou-se o legislador com o sujeito que percorre diversificados meios de
comunicação, mas basicamente a Internet, para encontrar crianças disponíveis ao sexo. E,
atualmente, as crianças já possuem acesso facilitado à rede mundial de computadores. São os
agentes denominados pedófilos. Note-se que não se exige o efetivo envolvimento sexual, pois, se
tal ocorrer, configura-se estupro de vulnerável (art. 217-A, CP). Vale destacar que o tipo penal é
essencialmente preventivo: punindo-se o pedófilo em atividade de captação do menor, evita-se o
mal maior, que é, justamente, a ocorrência da relação ou outro envolvimento sexual. Outro ponto
a merecer destaque é a não inclusão do adolescente. Afigura-se correta essa posição, pois o maior
de 12 anos já possui discernimento suficiente, na maior parte dos casos, para evitar o assédio.
Ademais, passados os 14 anos, nem mesmo a relação sexual efetiva é suficiente para configurar,
por si só, crime contra a liberdade sexual. Por isso, o mero aliciamento deve circunscrever-se, em
cenário de crime, ao contexto da criança. Na jurisprudência: STJ: “5. Da interpretação do art. 241-
D, c/c art. 2º, ambos do ECA, conclui-se que o crime imputado ao réu somente restará configurado
se a vítima tiver menos de 12 anos na data do crime. Trata-se, em verdade, de critério objetivo
para análise da figura típica, que proíbe que alguém alicie, assedie, instigue ou constranja, por
qualquer meio de comunicação, criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso. Os bens
jurídicos tutelados, por certo, são a dignidade sexual do menor de 12 anos, bem como o seu direito
a um desenvolvimento sexual condizente com a sua idade. 6. Se comprovado que a vítima, à
época dos fatos criminosos descritos na peça acusatória, contava como mais de 12 anos de idade,
restaria flagrante a atipicidade da conduta, por não ter sido preenchida elementar do crime
imputado ao réu, pois o tipo penal incriminador prevê como sujeito passivo a criança, não o
adolescente. Assim, para que o agente possa ser responsabilizado penalmente, mister se faz a
comprovação da idade da vítima, através de documento fidedigno, tais como carteira de
identidade, certidão de nascimento ou instrumento dotado de fé pública, nos termos do art. 155
do Código de Processo Penal. Precedente. 7. A Súmula 74/STJ estabelece que, ‘para efeitos
penais, o reconhecimento da menoridade do réu requer documento hábil’. Tal raciocínio deve ser
estendido à idade da vítima, por igualmente versar sobre estado da pessoa. Logo, a mera indicação
etária no bojo de documento produzido ainda na fase inquisitorial, que não restou acostado em
sua integralidade, não permite concluir pela atipicidade da conduta, por ausência de elementar do
crime. [...]” (HC 334.570/PE, 5.ª Turma, rel. Ribeiro Dantas, DJe 11.10.2017, v.u.). TJMS: “Não
há de se falar em insuficiência probatória e por conseguinte em absolvição se o conjunto de provas
é apto a demonstrar sem sombra de dúvida a autoria e a materialidade delitiva quanto ao crime do
art. 241-D do ECA (aliciar, assediar, instigar ou constranger, por qualquer meio de comunicação,
criança, com o fim de com ela praticar ato libidinoso). Na hipótese, as declarações da vítima, além
de firmes e coerentes, estão em total harmonia com os relatos de sua genitora e de sua bisavó, no
sentido de ter o réu oferecido à infante doces e dinheiro para que o encontrasse em reservado, sem
a presença de qualquer outra pessoa, com o fito de praticar com ela atos libidinosos. Com o
parecer, recurso a que se nega provimento” (Ap. 0201180-13.2012.8.12.0010-MS, 2ª Câmara
Criminal, rel. José Ale Ahmad Netto, 24.08.2017, v.u.). TJDFT: “O delito do artigo 241-D, caput,
do Estatuto da Criança e do Adolescente exige, necessariamente, o uso de ‘meio de comunicação’
para a sua prática, não englobando condutas praticadas em fala presencial entre o acusado e a
vítima, ainda que o réu tente aliciá-la com a promessa de presenteá-la com um computador caso
entre no carro dele. 3. A descrição feita na denúncia de que o acusado abordou a vítima (criança),
em via pública, convidando-a a entrar no veículo dele, onde ele manipulava seu pênis de forma
ostensiva, permitindo à infante visualizar a cena, notar o perito e gritar, afugentando o réu, se
amolda ao artigo 61 da Lei de Contravenções Penais (importunação ofensiva ao pudor). 4. A
prova segura dos autos revela que o acusado importunou a vítima, de maneira ofensiva ao pudor,
portanto, a condenação deve ser ajustada ao tipo do artigo 61 da Lei de Contravenções Penais e a
pena definitiva deve ser unicamente a pecuniária. 5. Diante da aplicação exclusiva de pena de
multa, não há falar em fixação de regime (art. 33, CP), em detração (art. 387, § 2º, CPP) nem em
substituição por medida restritiva de direitos (art. 44, CP). 6. Recurso parcialmente provido”
(APR 20161510016853-DFT, 2ª Turma Criminal, rel. Silvanio Barbosa dos Santos, 10.08.2017,
v.u.). TJMG: “Nos crimes sexuais, que geralmente ocorrem às escondidas, as declarações das
vítimas constituem prova de suma importância e são suficientes para alicerçar o decreto
condenatório, quando coesas e harmônicas com os indícios e as circunstâncias apurados no
processo. Comprovado de forma segura que os réus praticaram atos libidinosos com as vítimas
menores de 14 anos, a condenação pela prática do crime de estupro de vulnerável é medida de
justiça. Se a denúncia narra que os réus mostravam às crianças vídeos pornográficos, as
assediando e instigando com o fim de com elas praticarem atos libidinosos, resta configurado o
crime previsto no art. 241-D do ECA” (Ap. Crim. 1.0473.11.000327-3/001-MG, 1ª Câmara
Criminal, rel. Flávio Leite, 31.01.2017).
158. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança (pessoa com até 11 anos completos).
159. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Exige-se o elemento subjetivo específico,
consistente na finalidade de praticar ato libidinoso. Não se pune a forma culposa.
160. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança. O objeto jurídico é a
proteção à formação moral de crianças, em primeiro plano. Porém, deve-se incluir a liberdade
sexual da criança, sob outro prisma, pois o tipo penal é nitidamente preventivo. Evitando-se o
assédio com finalidade libidinosa, impede-se a ocorrência de crime sexual (estupro).
161. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo
agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação se dá em momento
determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo (pode ser
cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite tentativa.
162. Benefícios penais: não cabe transação, mas é admissível a suspensão condicional
do processo. Em hipótese de condenação, pode ser aplicada a suspensão condicional da pena.
Além disso, é viável o regime aberto (art. 33, § 2.º, c, CP). Convém registrar, ainda, o cabimento
da substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos, já que não se trata de
crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
163. Análise do núcleo do tipo: facilitar (tornar simplificado) e induzir (dar a ideia)
são as condutas alternativas, cujo objeto é o acesso da criança a material contendo cena de sexo
explícito ou pornográfica. A figura típica constitui-se em desdobramento do caput, pois a maneira
de aliciar, assediar, instigar ou constranger o menor dá-se de forma camuflada. Por intermédio do
acesso da criança ao material pornográfico, o agente busca dar ar de normalidade àquelas cenas,
visando manter com o infante ato libidinoso.
164. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança (pessoa com até 11 anos completos).
165. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Exige-se o elemento subjetivo do tipo,
consistente na finalidade de praticar ato libidinoso. Não se pune a forma culposa.
166. Objetos material e jurídico: o objeto material é a criança. O objeto jurídico é a
proteção à formação moral de crianças, em primeiro plano. Porém, deve-se incluir a liberdade
sexual da criança, sob outro prisma, pois o tipo penal é nitidamente preventivo. Evitando-se o
assédio com finalidade libidinosa, impede-se a ocorrência de crime sexual (por exemplo, estupro).
167. Classificação: é crime comum (pode ser cometido por qualquer pessoa); formal
(independe da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
formação moral da criança); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo
agente); comissivo (os verbos implicam em ações); instantâneo (a consumação se dá em momento
determinado); de perigo abstrato (presume-se a probabilidade de dano); unissubjetivo (pode ser
cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (praticada em vários atos); admite tentativa.
168. Tipo remetido: a figura típica do inciso II do parágrafo único é constituída dos
mesmos verbos constantes do caput, bem como se volta ao mesmo objeto, a criança. Entretanto,
altera-se o elemento subjetivo específico, que, nesta hipótese, é a finalidade de obter cenas
pornográficas ou de sexo explícito de criança (“com o fim de induzir criança a se exibir de forma
pornográfica ou sexualmente explícita”). O agente deste delito não pretende manter
relacionamento sexual com o infante, mas almeja conseguir fotos, vídeos ou outros registros. A
infração penal do inciso II é a prevenção à configuração das outras figuras típicas dos arts. 240,
241 e 241-A, substancialmente.
Art. 241-E. Para efeito dos crimes previstos nesta Lei, a expressão “cena de sexo
explícito ou pornográfica”compreende qualquer situação que envolva criança ou
adolescente em atividades sexuais explícitas, reais ou simuladas, ou exibição dos
órgãos genitais de uma criança ou adolescente para fins primordialmente sexuais. 169

169. Norma penal explicativa: pretendendo evitar contratempos em matéria de


interpretação, define o legislador o que vem a ser a cena de sexo explícito ou pornográfica. É um
conceito amplo, que, embora passível de captação pela vivência cultural, tornou-se legalmente
explicitado. Entretanto, a busca pela definição perfeita não foi atingida. A pornografia pode
envolver atividades sexuais implícitas e poses sensuais, sem a expressa mostra dos órgãos
genitais, constituindo situações igualmente inadequadas. Entretanto, não há previsão, para tanto,
no art. 241-E. Infelizmente, a tentativa de tornar mais clara a redação dos tipos incriminadores
trouxe a redução do contexto da pornografia. Teria sido melhor permitir a interpretação dos
operadores do Direito em relação às cenas de sexo explícito e, sobretudo, à cena pornográfica. Na
jurisprudência: STJ: “5. A definição legal de pornografia infantil apresentada pelo artigo 241-E
do Estatuto da Criança e do Adolescente não é completa e deve ser interpretada com vistas à
proteção da criança e do adolescente em condição peculiar de pessoas em desenvolvimento (art.
6º do ECA), tratando-se de norma penal explicativa que contribui para a interpretação dos tipos
penais abertos criados pela Lei nº 11.829/2008, sem contudo restringir-lhes o alcance” (REsp
1.543.267/SC, 6.ª Turma, rel. Maria Thereza de Assis Moura, DJe 16.02.2016, v.u.).
Art. 242. Vender, fornecer ainda que gratuitamente ou entregar,170-172 de qualquer
forma, a criança ou adolescente arma,173 munição174 ou explosivo:175-178
Pena – reclusão, de 3 (três) a 6 (seis) anos.179
170. Análise do núcleo do tipo: vender (alienar algo mediante preço
determinado), fornecer (abastecer, munir do necessário) ou entregar (colocar algo à disposição
de alguém) são as condutas alternativas, cujo objeto é arma, munição ou explosivo (ver as notas
próprias sobre a definição de cada um dos termos). O destinatário da venda, fornecimento ou
entrega é a criança ou adolescente. No caso do verbo fornecer, deixa claro o tipo penal poder ser
a título gratuito, vale dizer, sem qualquer contraprestação, valor ou recompensa. Vale mencionar
o disposto no art. 81, I, desta Lei: “É proibida a venda à criança ou ao adolescente de: I – armas,
munições e explosivos”. Na jurisprudência: TJRS: “1. O porte ilegal de arma de fogo é crime de
perigo abstrato e de mera conduta, mostrando-se prescindível a demonstração de perigo concreto.
Precedentes. Na esteira do entendimento dos Tribunais, em especial o Supremo Tribunal Federal,
não são inconstitucionais os crimes de perigo abstrato, a exemplo daqueles previstos na Lei
10.826/03, que teve sua constitucionalidade assentada na ADI 3.112/DF. 2. A partir das provas
produzidas, não houve dúvida que a arma apreendida pertencia ao acusado, que a portava em via
pública irregularmente. Os policiais ouvidos foram firmes ao apontar terem visto o denunciado
jogar um objeto no pátio de uma casa, que posteriormente verificaram se tratar da arma
apreendida. Condenação mantida. 3. As provas carreadas aos autos demonstram claramente, por
meio de fotografias, que o réu entregou revólver ao seu sobrinho, incorrendo nas penas do art.
242, do ECA” (Apelação Criminal 70082304056, 4. a Câmara Criminal, rel. Julio Cesar Finger, j.
07.05.2020, v.u.).
171. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou adolescente. Secundariamente, devemos incluir a sociedade, uma vez
que crianças e adolescentes armados configuram nítido perigo à coletividade.
172. Elemento subjetivo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem se pune
a forma culposa.
173. Arma: é o instrumento destinado à defesa ou ataque. Dividem-se em armas próprias,
cuja finalidade primordial é servir para ataque ou defesa (ex.: revólver, espingarda, espada,
punhal), e armas impróprias, cujo destino é diverso da utilização para ataque ou defesa, mas
assim podem ser usadas (ex.: machado, foice, faca de cozinha). O tipo penal não fez referência
específica à arma de fogo (como ocorreu com o art. 13 da Lei 10.826/2003 – vide nota infra),
razão pela qual se pode incluir qualquer modalidade de arma, capaz de gerar perigo à
incolumidade física, desde que colocada em mãos de criança ou adolescente. De fato, um
machado entregue a uma criança pode causar tanto estrago quanto um revólver. Por isso, não há
que se vender, fornecer ou entregar nenhum tipo de arma, especialmente as denominadas próprias
a menores de 18 anos. Quanto às impróprias, no entanto, deve-se ter cautela para promover a
tipificação da conduta, o que dependerá, em grande parte, da intenção do agente. Ilustrando:
vender um conjunto de facas pontiagudas, mesmo que para cozinha, a um menino de oito anos,
tendo noção de que ele utilizará os instrumentos para brincar, pode configurar o crime previsto
no art. 242 desta Lei. Por outro lado, fazer o mesmo em relação a um rapaz de 17 anos, que deseja
presentear alguém, é completamente diferente. Naturalmente, poder-se-ia dizer que, por uma
questão de segurança jurídica, somente as armas próprias seriam passíveis de tipificação no
referido art. 242. Porém, não tem cabimento pensarmos na exclusão do delito, quando o agente
fornecedor da arma imprópria tem perfeito conhecimento de que a criança ou adolescente irá
utilizar determinado instrumento (como um facão) para brincadeiras ou mesmo para a prática de
atos infracionais. Pensamos, pois, ser melhor manter a possibilidade de se encaixar nesse tipo
qualquer espécie de arma. Quanto às armas de fogo, cujo controle estatal deve ser absoluto, nem
se tem dúvida. Em relação às demais armas, somente o caso concreto irá delimitar a possibilidade
de adequação típica.
174. Munição: é, basicamente, o artefato explosivo utilizado pelas armas de fogo (ex.:
cartucho íntegro, que permite o disparo de projétil de chumbo). Porém, no caso presente, pode-se
considerar todo material disposto a abastecer o funcionamento de armas (ex.: flechas para serem
usadas com um arco). Se as armas exigirem material específico para o seu funcionamento,
podemos considerá-lo como munição (outro exemplo: o fornecimento de chumbo em formato
pontiagudo ou setas de metal para serem disparadas com espingardas de pressão).
175. Explosivo: é a substância inflamável, capaz de produzir explosão (abalo seguido de
forte ruído causado pelo surgimento repentino de uma energia física ou expansão de gás).
176. Objetos material e jurídico: o objeto material é a arma, munição ou explosivo. O
objeto jurídico é a proteção à integridade física das crianças e adolescentes, bem como de outras
pessoas com as quais tenham contato.
177. Classificação: é crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal
(não depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para o
menor ou para qualquer outra pessoa); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito
pelo agente); comissivo (os verbos indicam ações); instantâneo (a consumação ocorre em
momento definido); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente
(cometido por mais de um ato); admite tentativa.
178. Confronto com o art. 13 da Lei 10.826/2003: preceitua o referido art. 13 o
seguinte: “Deixar de observar as cautelas necessárias para impedir que menor de 18 (dezoito)
anos ou pessoa portadora de deficiência mental se apodere de arma de fogo que esteja sob sua
posse ou que seja de sua propriedade: Pena – detenção, de 1 (um) a 2 (dois) anos, e multa”. Esse
tipo penal é omissivo e o elemento subjetivo é a culpa. No caso do art. 242 da Lei 8.069/90, cuida-
se de conduta comissiva e o elemento subjetivo é o dolo. Portanto, ambos coexistem para
aplicação conforme a hipótese do caso concreto.
179. Benefícios penais: não se trata de infração de menor potencial ofensivo, nem se
pode utilizar a suspensão condicional do processo. Afastada está a aplicação da Lei 9.099/95.
Havendo condenação no mínimo legal, como regra, não se aplica o sursis, mas se poderia
substituir a pena privativa de liberdade por restritiva de direitos (condenação a até quatro anos de
reclusão), por não se tratar de delito praticado com violência ou grave ameaça à pessoa. Se a pena
ultrapassar os quatro anos, o regime inicial pode ser o semiaberto ou fechado, dependendo das
circunstâncias do art. 59 do Código Penal.
Art. 243. Vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar, 180-182
ainda que
gratuitamente, de qualquer forma, a criança ou o adolescente, bebida alcoólica ou, sem
justa causa,183 outros produtos cujos componentes possam causar dependência física
ou psíquica:184-188 (Redação dada pela Lei n.º 13.106, de 2015)
Pena – detenção de 2 (dois) a 4 (quatro) anos, e multa,189 se o fato não constitui
crime mais grave.190 (Redação dada pela Lei n.º 13.106, de 2015)

180. Análise do núcleo do tipo: vender (alienar algo mediante preço


determinado), servir (colocar algo à disposição de alguém para consumo), fornecer (abastecer,
munir do necessário), ministrar (aplicar algo em alguém) ou entregar (colocar algo à disposição
de alguém) são as condutas alternativas, cujo objeto é o produto cujo componente pode causar
dependência física ou psíquica. O destinatário da venda, fornecimento, apresentação, aplicação
ou entrega é a criança ou adolescente. No caso do verbo fornecer, deixa claro o tipo penal poder
ser a título gratuito, vale dizer, sem qualquer contraprestação, valor ou recompensa. A prática de
mais de uma conduta, no mesmo cenário, para a mesma vítima, implica o cometimento de um só
delito. Vale mencionar o disposto no art. 81, II e III, desta Lei: “É proibida a venda à criança ou
ao adolescente de: (...) II – bebidas alcoólicas; III – produtos cujos componentes possam causar
dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida”. A Lei 13.106/2015 alterou a
redação desse artigo para incluir, claramente, a bebida alcoólica, pois, infelizmente, seguia-se na
jurisprudência a tendência, que não era a nossa posição, de somente aceitar outros produtos,
exceto a bebida, causadores de dependência. Vide a nota 185 infra. Na jurisprudência: STJ: “III
– O delito previsto no art. 243 do Estatuto da Criança e do Adolescente se consuma com a efetiva
venda, ministração ou entrega à criança ou adolescente, de produtos cujos componentes possam
causar dependência física ou psíquica. É, portanto, crime de perigo concreto, devendo haver
perícia avaliando a potencialidade da substância” (AgInt no REsp 1.621.246/SC, 5.ª Turma, rel.
Felix Fischer, DJe 06.04.2018, v.u.). TJMT: “O réu sabia ser a vítima menor de idade, seja pela
sua compleição física, seja porque há informação no sentido de que eles se conheciam há algum
tempo. O crime tipificado no artigo 243, ECA, é formal: basta a prática de quaisquer das condutas
ali elencadas que o crime já se consuma, não se exigindo que a criança ou adolescente de fato
ingiram a bebida alcoólica” (Ap. 6734/2017-MT, 1ª Câmara Criminal, rel. Paulo da Cunha,
02.05.2017, v.u.). TJGO: “O tipo penal do artigo 243 da Lei nº 8.069/90 (ECA) exige a
constatação de que o produto vendido, fornecido, ministrado ou entregue à criança ou adolescente
tenha componentes que possam causar dependência física ou psíquica, mantendo-se, assim, a
absolvição quando inexistir prova técnica a respeito, não sendo o caso de supri-la por prova
testemunhal. Apelo ministerial conhecido e improvido” (Ap. Crim. 279989-13.2014.8.09.0048-
GO, 1ª Câmara Criminal, rel. Itaney Francisco Campos, 09.03.2017, v.u.). TJMS: “A conduta do
apelante que, sem justa causa, deixou à disposição em sua casa bebidas alcoólicas e ofereceu
copos aos adolescentes, servindo-lhes as bebidas, colmata os elementos previstos no tipo do art.
243 do ECA, sendo desinfluente a constatação de quem efetivamente comprou as bebidas” (Ap.
0012922-38.2015.8.12.0002-MS, 1ª Câmara Criminal, rel. Geraldo de Almeida Santiago,
22.08.2017, v.u.). TJRS: “1. O art. 243 da Lei nº 8.069/90 não contempla apenas a proteção da
saúde de crianças e de adolescentes, mas salvaguarda a própria sociedade, pois o uso de bebida
alcoólica afeta a saúde pública e traz como corolário o estímulo ao uso de outras substâncias
causadoras de dependência física ou psíquica, reclamando a prevenção geral. 2. Pena de prestação
de serviços à comunidade fixada de acordo com a pena privativa de liberdade (2 anos de
detenção), não havendo qualquer reparo a ser feito. No que pertine à minoração da prestação
pecuniária, nenhuma informação acerca da impossibilidade financeira veio aos autos. Apelação
desprovida” (Ap. Crim. 70072466303-RS, 5ª Câmara Criminal, rel. Lizete Andreis Sebben,
29.03.2017, v.u.). TJDFT: “I – Comprovado pelas declarações das vítimas e da informante que o
réu forneceu bebidas alcoólicas às ofendidas, menores de 18 anos, além de ter fumado narguilê
com sua filha de 14 anos de idade, a manutenção da condenação pela prática do crime descrito no
art. 243 do ECA é medida que se impõe. II – Recurso desprovido” (APR 20161610050826-DFT,
3ª Turma Criminal, rel. Nilsoni de Freitas Custodio, 10.08.2017, v.u.).
181. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança ou adolescente.
182. Elemento subjetivo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem se pune
a forma culposa.
183. Elementos normativos do tipo: acrescentou-se a expressão sem justa causa,
particular forma de evidenciar aspecto ligado à ilicitude, no tipo penal. Portanto, se o agente
ministra, como médico, por exemplo, uma droga capaz de gerar dependência física ou psíquica,
com o intuito de curar qualquer enfermidade de criança ou adolescente, o fato é atípico.
184. Produtos geradores de dependência física ou psíquica: são todas as
substâncias, geralmente químicas, aptas a produzir dependência, ou seja, viciar alguém na sua
utilização. Os produtos proscritos, no Brasil, tais como as drogas constantes da relação apropriada
da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA) – maconha, cocaína, heroína etc. –, se
forem destinados a crianças e adolescentes, servem para configurar o tráfico ilícito de
entorpecentes (art. 33, Lei 11.343/2006), inclusive com agravamento de pena (art. 40, VI, Lei
11.343/2006). Restam, pois, os produtos de utilização livre ou controlada, tais como o álcool, o
cigarro, os remédios em geral, dentre outros.
185. Confronto com o art. 63 da Lei de Contravenções Penais: esta contravenção
previa, no tipo penal, a seguinte conduta: servir bebidas alcoólicas a menor de 18 anos (inciso I).
Está revogada, agora, pela nova redação desse artigo. Sob outro aspecto, quando a
expressão bebida alcoólica não constava desse tipo, interpretávamos que ela estava incluída no
rol de produtos causadores da dependência e dávamos aplicação ao art. 243 em detrimento do art.
63 da LCP. Era a nossa posição: “buscando-se resolver ao conflito aparente de normas, a solução
encontra-se em aplicar o art. 243 deste Estatuto em detrimento do art. 63 da LCP. Em primeiro
lugar, porque a lei especial afasta a geral. Esta Lei cuida, especificamente, da proteção dos
menores de 18 anos, ao passo que a Lei de Contravenções Penais é genérica. Em segundo lugar,
pelo critério da sucessividade, lei mais nova afasta a mais antiga, sendo o Estatuto mais recente
que a Lei de Contravenções Penais. Indica-se, pois, como aplicável o art. 243 do CP,
para qualquer produto apto a gerar dependência física ou psíquica, em que se encaixa, com
perfeição, a bebida alcoólica. Há um argumento, afastando-se o art. 243 em favor do art. 63: alega-
se que o art. 81, ao cuidar da proibição de venda à criança ou adolescente de certos produtos,
separou em dois incisos o produto específico (bebida alcoólica – inciso II) e o produto genérico
(cujo componente possa causar dependência física ou psíquica – inciso III); depois, ao redigir o
tipo penal do art. 243, incluiu somente o genérico, significando, portanto, pretender excluir o
específico. Com a devida vênia, o argumento é inconvincente pelos seguintes motivos: a) o tipo
penal do art. 243 não é norma penal em branco, que precise de um complemento, razão pela qual
o art. 81 não se presta a isso; b) o tipo penal também não é remetido, que necessite da explicação
de outra norma, como o art. 81; c) a expressão produtos cujos componentes possam causar
dependência física ou psíquica é absolutamente autônoma e constitui elemento normativo do tipo,
passível de valoração cultural – e não jurídica; todo e qualquer produto capaz de gerar
dependência inclui-se nesse contexto, exatamente o caso do álcool; d) não menos importante, há
de se ressaltar os incontáveis erros de redação e as contradições que o legislador comete em
inúmeras leis; especificamente, neste Estatuto, tivemos a oportunidade de apontar um expressivo
montante de equívocos, repetições e contradições; assim sendo, cabe ao intérprete dar a solução
às falhas legislativas. No art. 81, sem dúvida, bastaria a previsão do inciso III e já teria abrangido
o cenário das bebidas alcoólicas. Por que separá-los? Pela força inequívoca que o álcool possui
no universo infantojuvenil, muito mais do que qualquer outra droga lícita (lembremos que as
ilícitas são regidas pela Lei de Drogas). Em suma, o art. 243 prevalece, sempre, sobre o art. 63 da
Lei de Contravenções Penais quando qualquer adulto servir, entregar, vender, colocar em mãos
do menor de 18 anos qualquer produto que provoque dependência física e psíquica, como é o caso
do álcool. Ademais, a proteção criada pelo art. 243 atende o princípio maior do superior
interesse da criança e do adolescente, constitucionalmente previsto”. No entanto, caminhava a
jurisprudência majoritária pela aplicação do art. 63 da LCP. Diante da gravidade do quadro, o
legislador interveio e incluiu, explicitamente, a expressão bebida alcoólica no tipo do art. 243,
pondo fim ao conflito aparente de normas e dando primazia ao crime em detrimento da
contravenção penal.
186. Utilização indevida: esta é outra expressão que constava da antiga redação e foi
retirada. Agora, basta a análise da falta de justa causa para se chegar ao mesmo destino
configurador do delito.
187. Objetos material e jurídico: o objeto material é o produto capaz de gerar
dependência física ou psíquica. O objeto jurídico é a proteção à integridade física da criança ou
adolescente.
188. Classificação: é crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal
(não depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo prejuízo para a
criança ou adolescente, vale dizer, independe de causação de vício); de forma livre (pode ser
cometido por qualquer meio eleito pelo agente), o que fica bem claro no tipo com a expressão de
qualquer forma; comissivo (os verbos indicam ações); instantâneo (a consumação ocorre em
momento definido); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente
(cometido por mais de um ato); admite tentativa.
189. Benefícios penais: não é infração de menor potencial ofensivo, descabendo
transação e os demais benefícios previstos na Lei 9.099/95. Se houver condenação, no mínimo
legal, cabe a aplicação de sursis. Acima do mínimo, pode haver a substituição da pena privativa
de liberdade por restritiva de direitos, por não se tratar de crime com violência ou grave ameaça
à pessoa. Eventualmente, torna-se viável, ainda, o sursis etário ou humanitário (art. 77, § 2.º, CP).
190. Crime subsidiário: deixou claro o tipo penal tratar-se de infração penal subsidiária,
ou seja, somente se aplica o art. 243 da Lei 8.069/90 se não estiver configurado delito mais grave.
Exemplo disso é o tráfico ilícito de drogas (art. 33, Lei 11.343/2006), como entregar cocaína a
um adolescente, infração mais grave que a prevista no art. 243 desta Lei.
Art. 244. Vender,191-193 fornecer ainda que gratuitamente ou entregar, de qualquer
forma, a criança ou adolescente fogos de estampido194 ou de artifício,195 exceto196 aqueles
que, pelo seu reduzido potencial, sejam incapazes de provocar qualquer dano físico em
caso de utilização indevida:197-198
Pena – detenção de seis meses a dois anos, e multa.199

191. Análise do núcleo do tipo: vender (alienar algo mediante preço


determinado), fornecer (abastecer, munir do necessário) ou entregar (colocar algo à disposição
de alguém) são as condutas alternativas, cujo objeto é fogo de estampido ou artifício (vide os
conceitos nas notas próprias). O destinatário da venda, fornecimento ou entrega é a criança ou
adolescente. No caso do verbo fornecer, deixa claro o tipo penal poder ser a título gratuito, vale
dizer, sem qualquer contraprestação, valor ou recompensa. É fundamental ressaltar que tais fogos,
em mãos de crianças e adolescentes, sem a supervisão de pessoa adulta e responsável, constituem
situação de efetivo perigo à incolumidade física tanto do menor que os manipula, como também
de quem estiver por perto. Há vários casos registrados de crianças e adolescentes, vítimas de
mutilações de seus próprios corpos, em razão da má utilização dos fogos de estampido ou de
artifício. A criminalização da conduta feita nesse tipo penal é correta. Vale mencionar o disposto
no art. 81, IV, desta Lei: “É proibida a venda à criança ou ao adolescente de: (...) IV – fogos de
estampido e de artifício, exceto aqueles que pelo seu reduzido potencial sejam incapazes de
provocar qualquer dano físico em caso de utilização indevida”.
192. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo é a criança e o adolescente. Secundariamente, podemos incluir a sociedade, pois fogos de
estampido ou de artifício em mãos de menores podem gerar perigo coletivo.
193. Elemento subjetivo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem se pune
a forma culposa.
194. Fogos de estampido: são as peças e instrumentos fabricados em atividade
pirotécnica, capazes de queimar, produzindo barulho. Ex.: são os rojões e as bombinhas (também
conhecidos como fogos de São João), capazes de gerar explosões, embora sem a produção de
desenhos ou luzes coloridas.
195. Fogos de artifício: são as peças e instrumentos fabricados em atividade pirotécnica,
capazes de queimar, produzindo luzes e fogo de caráter ornamental. Ex.: rojões ou foguetes
disparados para o céu, que, ao explodir, provocam desenhos e figuras coloridas.
196. Exceção à criminalização da conduta: há determinados fogos de estampido ou
de artifício, considerados inofensivos, ainda que sejam queimados ou sofram explosão.
Ilustrando, é o que ocorre com as denominadas, vulgarmente, biribinhas, que são pequeninas
bombinhas com quantidade ínfima de pólvora, cercada por pedrinhas e envoltas em papel que,
atiradas ao chão ou contra outro objeto, estouram, produzindo barulho reduzido. Ainda que se
pressione a biribinha entre os dedos, a explosão gerada não é suficiente para gerar qualquer
mutilação. Aliás, atualmente, existem fogos, em formato de vela, para serem queimados em cima
de bolos de aniversário, produzindo fagulhas coloridas, porém inofensivas.
197. Objetos material e jurídico: o objeto material é o fogo de estampido ou de artifício.
O objeto jurídico é a proteção à incolumidade física de crianças e adolescentes. Secundariamente,
protege-se a integridade física de outras pessoas.
198. Classificação: é crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal
(não depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetivo dano à integridade
física da criança, do adolescente ou de outra pessoa); de forma livre (pode ser cometido por
qualquer meio eleito pelo agente), o que o tipo penal deixa claro com a utilização da expressão de
qualquer forma; comissivo (os verbos indicam ações); instantâneo (a consumação ocorre em
momento definido); unissubjetivo (pode ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente
(cometido por mais de um ato); admite tentativa.
199. Benefícios penais: é infração de menor potencial ofensivo, cabendo transação e os
demais benefícios previstos na Lei 9.099/95.
Art. 244-A.200 Submeter201-203 criança ou adolescente, como tais definidos
no caput do art. 2.º desta Lei,204 à prostituição ou à exploração sexual:205-206
Pena – reclusão de quatro a dez anos e multa, além da perda de bens e valores
utilizados na prática criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do
Adolescente da unidade da Federação (Estado ou Distrito Federal) em que foi cometido
o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-fé.207 § 1.º Incorrem nas mesmas penas
o proprietário, o gerente ou o responsável pelo local em que se verifique a submissão
de criança ou adolescente às práticas referidas no caput deste artigo.208 § 2.º Constitui
efeito obrigatório da condenação a cassação da licença de localização e de
funcionamento do estabelecimento.209

200. Confusão legislativa: todo o conteúdo do art. 244-A foi reproduzido pelo art. 218-
B do Código Penal, inserido pela Lei 12.015/2009. Tratando-se esta de lei mais recente, o art.
218-B afastaria a aplicação do art. 244-A. Opinamos pela revogação tácita do art. 244-A.
Entretanto, diante da edição da Lei 13.440/2017, alternando a pena do art. 244-A, quer-se crer
tenha o legislador acreditado na mantença do mencionado art. 244-A. Valeu-se, então, do critério
de lei especial afastando lei geral. O art. 244-A afastaria o art. 218-B, na parcela nele prevista.
Subsistiria o referido art. 218-B quanto à conduta não tutelada pelo art. 244-A.
201. Análise do núcleo do tipo: submeter (subjugar, dominar moralmente) é o verbo
nuclear, cujo objeto é a prostituição (realização de ato sexual mediante paga, em caráter habitual)
ou exploração sexual (tirar proveito de ato sexual). O destinatário da submissão é a criança ou o
adolescente. Menciona-se, primeiramente, a prostituição, que significa entregar-se à devassidão
e à corrupção moral, relacionando-se sexualmente com alguém em troca de dinheiro ou outra
vantagem. Cuida-se de conduta visivelmente habitual, exigindo regularidade. Não se pode
sustentar haver prostituição se, em uma única ocasião, alguém se relaciona sexualmente em troca
de alguma recompensa. Por outro lado, a exploração sexual não exige esse caráter duradouro. O
agente que se vale de criança ou adolescente, obrigando-o, por domínio moral, à prática da
prostituição ou de atos sexuais isolados, porém lucrativos, encaixa-se nesse tipo penal. O mesmo
se diga do autor que, valendo-se de fraude ou engodo, consegue levar o menor à prática sexual.
Se o domínio for físico, ou envolva menor de 14 anos, pode haver concurso com estupro. A pessoa
que mantém relação sexual com o menor de 18 anos, tendo conhecimento da exploração sofrida
pela criança ou adolescente, pode responder, como autor, pelo delito previsto no art. 218-B, § 2.º,
I, do Código Penal (complementando o art. 244-A desta Lei). A configuração de um ou mais
crimes, em relação a quem mantém com o menor de 18 anos relação sexual, depende do caso
concreto. Eventualmente, nenhuma infração penal se configura (ex.: mantém-se relação sexual
consentida com adolescente já prostituída(o), maior de 14 anos, sem estar sob exploração de quem
quer que seja, mas atuando por conta própria). Observe-se, entretanto, ser o consentimento da
vítima irrelevante, desde que haja a submissão provocada por outrem. Nessa ótica: STJ:
“Conquanto o paciente tenha realizado pelo menos três ‘programas’ com as adolescentes –
condutas manifestamente atentatórias à integridade física, psíquica e moral das menores – importa
reconhecer, repita-se, que tal comportamento não se adequa ao verbo ‘submeter’ para fins do art.
244-A do ECA, sendo certo que a novel legislação, que derrogou tal dispositivo de lei, trazendo
maior repressão à prostituição infantojuvenil e ao chamado ‘turismo sexual’, somente entrou em
vigor anos após os fatos apurados no processo-crime ora em exame. 9. Writ não
conhecido. Habeas corpus concedido, de ofício, para reconhecer a atipicidade das condutas
descritas na peça acusatória e, por consectário, absolver o paciente, com fulcro no art. 386, III, do
CPP” (HC 160.901/GO, 5.ª Turma, rel. Ribeiro Dantas, DJe 25.09.2018, v.u.). Sobre o caráter
eventual: STJ: “É entendimento consolidado nesta eg. Corte que a conduta praticada pelo cliente
ocasional não configura o tipo penal do art. 244-A do ECA” (AgRg no REsp 1334507 – MS, 5.ª
T., rel. Félix Fischer, 12.02/2015, v.u.). TJMG: “Ainda que o acusado tenha se utilizado dos
favores sexuais da menor envolvida, o STJ tem entendimento no sentido de que o cliente eventual
da adolescente não comete o delito do art. 244-A do ECA, por falta de adequação típica”
(Apelação Criminal n.º 1.0520.05.009975-0/001, 4.ª Câm. Criminal, rel. Doorgal Andrada,
04.03.2015). Ainda, na jurisprudência: TJRS: “Ao enquadramento da conduta no disposto no art.
244-A do ECA, desimporta que a criança ou adolescente tenha consentido em prostituir-se ou ser
explorada sexualmente. Interpretação sistemática das regras da novel legislação, que veio no
intuito de aumentar a proteção das crianças e adolescentes, bem como o desenvolvimento
psicológico incompleto desses indivíduos, tornando irrelevante o seu consentir. Exigir a
submissão, tida como coerção física ou moral, seria fazer do preceito letra morta, privilegiando
aqueles que auferem grande lucro na mantença de jovens em seus prostíbulos, atraindo toda sorte
de pedófilos. Precedentes do E. STJ. Hipótese na qual a prova mostrou-se segura quanto ao fato
de a ré, proprietária de um prostíbulo, ter submetido a vítima, adolescente com 16 anos de idade,
à prostituição. Relatos coerentes e convincentes da ofendida, confirmando que estava na boate
mantida pela acusada para realizar programas sexuais, sendo que recebera outro documento de
identidade e orientação de decorar os dados nele constantes, o que corroborado pelos depoimentos
dos policiais militares que efetivaram sua apreensão, em um dos quartos, momento em que
confirmara que lá estava para trabalhar como prostituta. Acusada que, durante as investigações,
negou soubesse a idade da adolescente e, em pretório, fez-se revel. Prova segura à condenação,
que vai mantida” (Ap. Crim. 70063826515-RS, 8ª Câmara Criminal, rel. Fabianne Breton Baisch,
28.06.2017, v.u.).
202. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa, inclusive os
pais da criança ou adolescente. Admitindo a mãe da vítima como coautora do delito previsto no
art. 244-A, pois recebia vantagem econômica, por permitir o contato do corréu com sua filha de
quinze anos, condenando-a: TJSC, Ap. 2005.004828-7, Lauro Muller, 2.ª C., rel. Torres Marques,
26.04.2005, v.u. O sujeito passivo é o menor de 18 anos. Deve ser, entretanto, maior de 14 anos,
pois, do contrário, configura-se estupro de vulnerável e não mera exploração sexual.
203. Elemento subjetivo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem se pune
a forma culposa. Embora a prostituição e a exploração sexual impliquem, naturalmente, proveito
pecuniário ou de outra ordem, o agente do delito previsto no art. 244-A não precisa ter essa
finalidade. Exemplificando, alguém pode submeter um adolescente à prostituição por achar que
é um meio de vida adequado, até por também exercer o agente a mesma atividade. Logo, não visa
ao lucro, que fica com o menor, mas comete o delito do mesmo modo.
204. Tipo remetido: a menção ao art. 2.º, caput, desta Lei, tem por fim deixar claro que
os sujeitos passivos dessa infração penal são somente os menores de 18 anos. Isso porque o
parágrafo único do referido art. 2.º explicita que, excepcionalmente, aplica-se a Lei 8.069/90
àqueles que possuem entre 18 e 21 anos.
205. Objetos material e jurídico: o objeto material é o menor de 18 e maior de 14 anos.
O objeto jurídico é a proteção à formação moral da criança ou adolescente.
206. Classificação: é crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); material
(depende da ocorrência de resultado naturalístico, consistente em efetiva prática da prostituição
ou da exploração sexual, que levam, automaticamente, ao prejuízo para a formação moral do
menor); de forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (o
verbo indica ação); instantâneo (a consumação ocorre em momento definido), porém, quando se
tratar de prostituição, é o que denominamos de crime instantâneo de continuidade habitual (ver a
nota 5 ao Título II da Parte Geral do nosso Código Penal comentado); unissubjetivo (pode ser
cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (cometido por mais de um ato). A figura típica do
art. 218-B do Código Penal possui outros verbos, além de submeter. De toda forma, não cabe
tentativa nos modelos submeter, atrair, induzir e facilitar, pois é crime condicionado, dependente
da prática da prostituição ou da exploração sexual. Admite tentativa nas
formas impedir e dificultar.
207. Benefícios penais: as penas são elevadas, em face da gravidade da situação,
buscando-se o combate à prostituição infantojuvenil, que já gerou, inclusive, o
denominado turismo sexual, especialmente em países com população muito pobre ou miserável.
Se for aplicada a pena mínima, pode-se substituí-la por restritiva de direitos, por não se tratar de
crime cometido com violência ou grave ameaça à pessoa. Acima do mínimo, pode o magistrado
aplicar os regimes semiaberto ou fechado, conforme a pena concretizada e os elementos previstos
no art. 59 do Código Penal. Acrescentou-se a “perda de bens e valores utilizados na prática
criminosa em favor do Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente da unidade da Federação
(Estado ou Distrito Federal) em que foi cometido o crime, ressalvado o direito de terceiro de boa-
fé”. Todo o produto ou proveito do crime é confiscado pelo Estado, algo já previsto pelo art. 91,
II, do Código Penal. A modificação deve voltar-se ao destinatário dos bens apreendidos e dos
valores confiscados, que passa a ser o Fundo dos Direitos da Criança e do Adolescente do Estado-
membro, e não mais a União.
208. Explicitação do partícipe: embora desnecessária, pois se poderia aplicar o
disposto no art. 29 do Código Penal, dispõe o art. 244-A, § 1.º, desta Lei, o dever de responder
pelo crime o proprietário, gerente ou outro responsável pelo lugar onde o menor se prostitui ou é
explorado sexualmente, desde que haja submissão a tais situações. Esse conteúdo é reproduzido
pelo art. 218-B, § 2.º, II, do Código Penal.
209. Efeito específico e obrigatório da condenação: impõe o art. 244-A, § 2.º, desta
Lei (reproduzido pelo art. 218-B, § 3.º, do CP), que, havendo condenação do proprietário, gerente
ou responsável pelo lugar onde se dá a submissão do menor à prostituição ou exploração sexual,
deve haver a cassação da licença de funcionamento (ex.: hotel, motel, bar, casa de massagem,
sauna etc.).
Art. 244-B. Corromper 210-212
ou facilitar a corrupção de menor213 de 18 (dezoito)
anos, com ele praticando infração penal ou induzindo-o a praticá-la:214-217
Pena – reclusão, de 1 (um) a 4 (quatro) anos.218
§ 1.º Incorre nas penas previstas no caput deste artigo quem pratica as condutas ali
tipificadas utilizando-se de quaisquer meios eletrônicos, inclusive
salas de bate-papo da internet.219
§ 2.º As penas previstas no caput deste artigo são aumentadas de um terço no caso
de a infração cometida ou induzida estar incluída no rol do art. 1.º da Lei n.º 8.072, de
25 de julho de 1990.220

210. Análise do núcleo do tipo: corromper (perverter, estragar) ou facilitar a


corrupção (tornar mais fácil tal perversão) são os verbos do tipo misto alternativo, cujo objeto é
o menor de 18 anos. O meio utilizado pelo agente, para atingir a corrupção da criança ou
adolescente, desagregando sua personalidade, ainda em formação, é a sua inserção no mundo do
crime, por dois modos: a) a prática conjunta (agente + vítima) de infração penal (crime ou
contravenção penal); b) a indução (dar a ideia) à prática da infração penal, atuando a vítima por
sua conta. Essa nova figura típica, inserida na Lei 8.069/90, substitui a prevista anteriormente na
Lei 2.252/54, ora revogada pela Lei 12.015/2009. Lembremos que o menor de 18 anos, pela
legislação brasileira, não comete crime ou contravenção penal (art. 228, CF; art. 27, CP).
Portanto, quando o tipo penal faz referência ao termo infração penal, está-se referindo a dois
prismas: a) do ponto de vista do maior de 18 anos, ele comete um crime ou uma contravenção
penal; b) do ponto de vista do menor de 18 anos, ele comete um ato infracional (conduta
descrita como crime ou contravenção, conforme dispõe o art. 103 do Estatuto da Criança e do
Adolescente). De um modo ou de outro, o que se busca punir é a associação do maior com o
menor, gerando a corrupção deste último que, precocemente, insere-se no mundo da
criminalidade. Essa inserção tem origem, em grande parte das vezes, por atuação do maior, pessoa
amadurecida, que se vale do menor, imaturo, para fins ilícitos. Na jurisprudência: STJ: “1. Para a
configuração do crime de corrupção de menores – atual artigo 244-B do Estatuto da Criança e do
Adolescente –, a Terceira Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp n.
1127954/DF, DJe 01/02/2012, e do REsp n. 1112326/DF, DJe 08/02/2012, ambos julgados em
14/12/2011, de relatoria do Ministro Marco Aurélio Bellizze, sob o rito do art. 543-C, c/c o art.
3º do CPP, consolidou o entendimento no sentido de que não se faz necessária a prova da efetiva
corrupção do menor, uma vez que se trata de delito formal, cujo bem jurídico tutelado pela norma
visa, sobretudo, a impedir que o maior imputável induza ou facilite a inserção ou a manutenção
do menor na esfera criminal. 2. O tema está sedimentado, inclusive, na Súmula n° 500 do STJ,
segundo a qual a configuração do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva
corrupção do menor, por se tratar de delito formal. 3. Agravo regimental não provido” (AgRg no
REsp 1642271-SP, 5ª T., rel. Reynaldo Soares da Fonseca, 17.03.2017, v.u.); “1. “A configuração
do crime do art. 244-B do ECA independe da prova da efetiva corrupção do menor, por se tratar
de delito formal.” Súmula 500 desta Corte. Agravo regimental desprovido” (AgRg no REsp
1574831-RJ, 5ª T., rel. Joel Ilan Paciornik, 04.04.2017, v.u.). TJAL: “I – As provas carreadas aos
autos demonstram que o apelante foi um dos autores do assalto do veículo HB20, notadamente o
depoimento do policial militar responsável pela prisão em flagrante, bem como as declarações
das vítimas e confissão do réu na fase policial. Descrição dos fatos harmônicas. II – O tipo penal
previsto no art. 244-B do ECA se trata de crime formal, que se consuma apenas com a prática de
ilícito criminal na companhia de adolescente, sem que seja necessária, para a sua configuração, a
existência de prova que demonstre a efetiva corrupção do menor” (Ap. 0707961-
58.2016.8.02.0001-AL, Câmara Criminal, rel. Sebastião Costa Filho, 09.08.2017, v.u.). TJMT:
“É cediço na jurisprudência que o delito de corrupção de menor é de natureza formal, sendo
prescindível para a sua configuração a efetiva corrupção do adolescente que adere à conduta
criminosa desempenhada pelo imputável, bastando que o crime seja praticado por um adulto, na
companhia do menor. Tal hipótese se amolda ao caso concreto, na medida em que tanto o
adolescente quanto o apelante confessaram o cometimento do delito de latrocínio, e o réu ainda
admitiu que tinha conhecimento da menoridade do comparsa” (Ap. 69354/2017-MT, 3ª Câmara
Criminal, rel. Gilberto Giraldelli, 30.08.2017, v.u.). TJPA: “1. O crime de corrupção de menores,
previsto no ECA, é um delito que atenta contra a vulnerabilidade/hipossuficiência do menor, na
qual o sujeito ativo incentiva o menor a praticar condutas que expressem desprezo pelo
ordenamento jurídico, prejudicando a boa formação de seus valores morais. Com efeito, no
presente caso, não se pode dizer que restou descaracterizado o crime de corrupção de menores,
embora o menor tenha declarado que participou do delito juntamente com o acusado por sua
própria vontade, há entendimento sedimentado por nossos Tribunais Superiores de que o crime
de corrupção de menores é crime formal ou de consunção antecipada, sendo suficiente, para a
consumação do delito, que o agente pratique a infração penal com o menor ou induza-o a praticá-
la, não sendo necessária a prova da efetiva corrupção do menor. 2. In casu, a participação do
adolescente resta cristalina pela confissão do acusado, pelas declarações do próprio menor em
sede policial e pela palavra da vítima e demais testemunhas, formando um arcabouço probatório
suficiente à condenação. 3. Recurso conhecido e improvido, à unanimidade” (Ap.
2017.00369144-28-PA, 1ª Turma de Direito Penal, rel. Vania Lucia Carvalho da Silveira,
31.01.2017, v.u.).
211. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa. O sujeito
passivo deve ser o menor de 18 anos. Secundariamente, encontra-se a família do menor e também
a sociedade, interessada na boa formação moral dos jovens. Para a condenação do corruptor
(maior de 18 anos), é preciso prova concreta e indubitável da menoridade da vítima. Segundo o
art. 155, parágrafo único, do CPP, o estado das pessoas, como é o caso da idade, somente se prova,
conforme a lei civil, por documento, mitigando o princípio da persuasão racional do juiz para
acolher, neste caso, o sistema da prova legal (sobre o tema, conferir a nota 6 ao art. 155 do
nosso Código de Processo Penal comentado). Ademais, em hipótese de dúvida quanto à idade da
vítima, adota-se o princípio constitucional da presunção de inocência, que conduz ao in dubio pro
reo (na dúvida, decide-se em favor do réu). Nesse sentido, exigindo documento hábil para provar
a idade: STF: “A menoridade para fins de tipificação do delito previsto no artigo 244-B da Lei nº
8.069/1990 pode ser comprovada mediante documentos diversos da certidão de nascimento ou
carteira de identidade” (HC 161557, 1.ª Turma, rel. Marco Aurélio, 11.05.2020, v.u.); “1. A Corte
já decidiu que, ‘para efeitos penais, a comprovação da idade, como as outras situações quanto ao
estado das pessoas, há de ser realizada mediante prova documental hábil, de acordo com as
restrições estabelecidas na lei civil’ (HC nº 132.204/DF, Segunda Turma, Relator o Ministro Teori
Zavascki, DJe de 11/5/16). 2. O art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, ao descrever
abstratamente a conduta punível, destacou a menoridade da vítima como elemento essencial do
tipo penal, de tal modo que, ausente essa circunstância elementar, não restará configurado o delito
de corrupção de menores. 3. O comando normativo consubstanciado nesse preceito primário de
incriminação destaca, como um dos essentialia delicti, a circunstância de o sujeito passivo da
ação delituosa ser, necessariamente, pessoa ‘menor de 18 anos’. 4. A inexistência, nos autos da
ação penal, de prova documental idônea que dê substrato à acusação concernente ao delito de
corrupção de menores acarreta sua atipicidade. 5. Ordem concedida para restabelecer o acórdão
proferido pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais na parte em que absolveu o paciente da
imputação de corrupção de menores (art. 244-B da Lei nº 8.069/90)” (HC 144160-DF, 2ª T., rel.
Dias Toffoli, 29.08.2017, v.u.); “Habeas corpus. Processo Penal. Corrupção de menores. Art.
244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente. Art. 155, parágrafo único, do Código de Processo
Penal. Comprovação da menoridade do adolescente. Certidão de nascimento. 1. A regra do art.
155 do Código de Processo Penal não é absoluta. Em seu parágrafo único, com o intuito de
resguardar as garantias do acusado e do devido processo legal na busca da verdade dos fatos,
prevê a mitigação do princípio do livre convencimento quando a questão abrange o estado das
pessoas, hipótese de prevalência das restrições estabelecidas na legislação civil. 2. Inexiste nos
autos prova específica, idônea e inequívoca, para fins criminais, da idade do adolescente
envolvido no delito, nos termos do parágrafo único do art. 155 do Código de Processo Penal, de
modo a justificar a condenação quanto ao crime de corrupção de menores. 3. A jurisprudência
deste Supremo Tribunal Federal é no sentido de que o reconhecimento da menoridade, para efeitos
penais, supõe prova hábil (certidão de nascimento). Precedentes. 4. Ordem de habeas
corpus concedida para restabelecer o juízo absolutório do acórdão da Corte Estadual quanto à
prática, pelo paciente, do crime de corrupção de menores tipificado no art. 244-B da Lei 8.069/90”
(HC 123779/MG, 1.ª T., rel. Rosa Weber, 03.03.2015, v.u.); “Habeas corpus. Penal. Crime de
corrupção de menores. Art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente. Menoridade do
adolescente. Reconhecimento pelo juízo sentenciante. Comprovação nos autos. Revolvimento do
conjunto fático-probatório. Inocorrência. Ordem denegada. I – Agiu bem o magistrado
sentenciante, que, à luz do conjunto fático-probatório dos autos, entendeu provada a materialidade
do delito previsto no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente. Como bem destacou o
representante do Parquet Federal, o adolescente apresentou o documento de identidade à
autoridade policial por ocasião da lavratura do Boletim de Ocorrência, no qual se comprova sua
menoridade à época dos fatos” (HC 121709/SC, 2.ª T., rel. Ricardo Lewandowski, 27.05.2014,
v.u.). STJ: “1. Segundo o acórdão recorrido, o único documento utilizado para demonstrar a
menoridade, apesar de ter sido lavrado perante a autoridade policial, possui em seu conteúdo
somente as declarações prestadas pela suposta própria vítima do crime de corrupção de menores,
que afirmou ter 16 anos. Tal declaração, contudo, não foi conferida pela autoridade pública, a
partir da análise de qualquer outro documento idôneo, como, por exemplo, o registro civil ou a
carteira de identidade, nem confirmada em consulta aos registros da polícia civil. 2. Embora se
trate de documento formalmente público, o conteúdo nele trazido, por ter sido fruto apenas da
declaração do particular, sem nenhum tipo de conferência da sua veracidade pelo agente estatal,
não possui a idoneidade para a comprovação da menoridade do réu. Em outras palavras, é ele
suficiente apenas para comprovar que a suposta vítima declarou-se menor de 18 anos, mas não
para comprovar que essa assertiva correspondia à verdade. Nesse contexto, não está atendida a
orientação da Súmula 74/STJ. 3. Agravo regimental provido para restabelecer a absolvição do
agravante quanto ao crime previsto no art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente” (AgRg
no REsp 1544141 – DF, 6.ª T., rel. Sebastião Reis Júnior, 23.02.2016, v.u.). Sobre a prova
documental não se tratar necessariamente da certidão de nascimento: STF: “O Supremo Tribunal
Federal tem entendido revelar-se juridicamente idônea, para fins penais, seja para demonstrar a
idade do acusado, seja para comprovar a idade da vítima, não só a certidão de nascimento, que
constitui prova específica, como quaisquer outros documentos oficiais, emanados de órgãos
estatais competentes e revestidos, por isso mesmo, de fé pública, à semelhança da cédula de
identidade, do certificado de reservista e do título de eleitor, entre outros. Precedentes” (HC
145.688 AgR, 2ª Turma, rel. Celso de Mello, 04.05.2020, v.u.). STJ: “1. A jurisprudência desta
Corte Superior de Justiça firmou-se no sentido de que a comprovação do delito de corrupção de
menores pode se dar por qualquer documento idôneo, sendo prescindível para tal fim a certidão
de nascimento. Precedentes. 2. O termo de Comunicação de Ocorrência Policial expedido pela
Delegacia de Polícia Civil do DF atestando a menoridade do agente é suficiente para a
comprovação da corrupção de menores. 3. Agravo regimental a que se nega provimento” (AgRg
no AREsp 721386 – DF, 5.ª T., rel. Jorge Mussi, 01.03.2016, v.u.); “1. A comprovação da
menoridade da vítima do crime de corrupção de menores requer prova por documento hábil.
Aplicação da Súmula 74 do STJ. 2. É assente na jurisprudência deste Superior Tribunal o
entendimento de que a certidão de nascimento não é o único documento idôneo para comprovar
a idade do adolescente corrompido, que também pode ser atestada por outros documentos oficiais,
dotados de fé pública, emitidos por órgãos estatais de identificação civil e cuja veracidade
somente pode ser afastada mediante prova em contrário. 3. O Ministério Público provou a
menoridade da vítima de maneira idônea ao instruir a ação penal com certidão de antecedentes
infracionais, na qual consta a filiação do adolescente, o número da cédula de identidade e a data
de seu nascimento, além do registro de apuração de ato infracional e de execução de medida
socioeducativa. Revaloração probatória que não fere o disposto na Súmula 7 do STJ. 4. Agravo
regimental não provido” (AgRg no REsp 1485543 – MG, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz,
05.02.2015, v.u.).
212. Elemento subjetivo do tipo: é o dolo. Não há elemento subjetivo específico, nem
se pune a forma culposa.
213. Conceito de corrupção de menores: há várias formas de se perverter a boa
formação dos jovens, desde o aliciamento para a vida sexual precoce até o cometimento de crimes.
Lembremos, pois fundamental, que a formação da personalidade ocorre, de forma decisiva e
concentrada, durante a adolescência. Personalidade, como já tivemos oportunidade de explicitar
em trabalho anterior, constitui o papel que desempenhamos em sociedade, formando o conjunto
dos caracteres exclusivos de uma pessoa, parte herdada, parte adquirida. A personalidade é a
síntese do “eu”, compondo o núcleo inconfundível de cada indivíduo. A ela devem-se os valores
e a particular visão do mundo de cada um. Revela a individualidade humana, com as escolhas e
preferências dadas a determinado caminho ou a certo modo de agir e ser (do
nosso Individualização da pena). Não há seres humanos idênticos no mundo, ao menos no que
tange à formação da personalidade – seu modo particular de reação aos estímulos da vida em
sociedade. Embora a constituição do ego (personalidade) dê-se, basicamente, na fase da
adolescência, que segue, segundo o disposto no Estatuto da Criança e do Adolescente, a partir dos
12 anos, a infância (fase anterior aos 12 anos) não perde seu caráter essencial na formação
equilibrada do ser humano. Traumas e sofrimentos atrozes vivenciados nesse estágio certamente
podem levar ao descortino de uma personalidade repleta de aspectos negativos, por ausência de
valores superiores a inspirar o jovem a portar-se de acordo com os regramentos sociais. Elege-se
a idade de 18 anos como o marco – presunção absoluta – ideal para o alcance da maturidade civil
e penal. Assim, antes dessa idade, o menor está sujeito às influências dos adultos, pois imaturo,
podendo ser vítima de corrupção de seus valores positivos, o que representa problema grave para
si mesmo e para a sociedade que o cerca. Há várias formas de deturpação da formação da
personalidade do menor de 18 anos. O tipo penal construído pelo art. 244-B (antiga previsão da
Lei 2.252/54) cuida, apenas, de um aspecto, que é a inserção do jovem na criminalidade. Não se
deve olvidar o disposto nos arts. 218-A e 218-B do Código Penal, que cuidam da corrupção de
menores no campo sexual, favorecendo a depravação precoce do ser humano adolescente que,
levado pelo adulto, passa a praticar o ato sexual como se fosse algo banal, prejudicando a boa
formação de seus valores morais. No mesmo prisma, há o art. 240 da Lei 8.069/90, referindo-se
a produção, reprodução, direção, fotografia, filme ou outro registro de cenas de sexo explícito ou
pornográfica, envolvendo criança ou adolescente, o que não deixa de constituir, igualmente,
corrupção de menor no cenário da boa formação dos seus valores morais.
214. Objetos material e jurídico: o objeto material é o menor de 18 anos. O objeto
jurídico é a boa formação moral da criança e do adolescente.
215. Classificação: é crime comum (pode ser praticado por qualquer pessoa); formal
(basta a prática da conduta, possibilitando a depravação do menor, independentemente de
resultado naturalístico). Nesse sentido: Súmula 500, STJ: “a configuração do crime previsto no
art. 244-B do Estatuto da Criança e do adolescente independe da prova da efetiva corrupção do
menor, por se tratar de delito formal”. Alteramos a nossa anterior posição (ver a nota abaixo); de
forma livre (pode ser cometido por qualquer meio eleito pelo agente); comissivo (os verbos
indicam ações); instantâneo (a consumação ocorre em momento definido); unissubjetivo (pode
ser cometido por uma só pessoa); plurissubsistente (cometido por mais de um ato); admite
tentativa, embora de difícil configuração.
216. Crime de atividade: sustentávamos ser o delito de corrupção de menores, no
contexto da classificação dos delitos de atividade e dos de resultado naturalístico, como material,
ou seja, os dependentes da produção de um resultado visível no mundo fático para que possa
consumar-se. Era o que nos soava mais lógico, pois, se o adolescente já fosse corrompido pelas
próprias atitudes e pela força do tempo, não seria justo punir o agente. Entretanto, dois pontos de
apoio nos fizeram alterar nosso entendimento: a) o estudo aprofundado deste Estatuto, suas metas
e seus fundamentos, mormente o princípio da proteção integral, constitucionalmente assegurado;
b) a confusão que ora se desfaz entre o delito material ou formal e o crime impossível. O objeto
jurídico deste e de outros crimes previstos nesta Lei é a boa formação moral da criança e do
adolescente. Essa formação se desenvolve, na realidade, ao longo de toda a vida humana,
constituindo-se na personalidade, sempre dinâmica e mutável. Ninguém passa pelos anos sem
alterar o seu comportamento – para bem ou para mal. No tocante ao adulto, em face da sua
liberdade de pensamento, expressão e julgamento crítico de seus próprios atos, o Direito Penal
passa ao largo, não havendo tipo incriminador cuidando a corrupção moral. Na realidade, a
corrupção ativa ou passiva, delitos previstos no Código Penal, tutela a Administração Pública,
mas não a formação moral do agente. Aliás, a vítima é a própria Administração e não outro ser
humano, que possa ser moralmente corrompido. Diante disso, vislumbra-se acerto nas posições
daqueles que sustentam a confiança a ser depositada na formação moral permanente de crianças
e adolescentes, vale dizer, deve-se preservar essa boa formação até que se chegue à maioridade.
Não acreditar nisso, permitindo visualizar um quadro separatista entre adolescentes
corrompidos e adolescentes não corrompidos, seria o mesmo que decretar a falência da medida
socioeducativa, antes mesmo de aplicá-la. É preciso crer na reforma interior de cada menino ou
menina, desde seus primeiros passos no caminho do entendimento e da compreensão, até atingir
a juventude. Aliás, justamente para isso existem as várias normas previstas neste Estatuto. Nunca
é tarde demais para educar ou reeducar o menor de 18 anos e com isso deve preocupar-se e
ocupar-se o Estado. Precisa-se de fé na recuperação dos maus passos em direção oposta, motivo
pelo qual apontar o adolescente (nem se pense na criança) como corrompido, inviável como
vítima desse delito do art. 244-B, significa decretar a inviabilidade de sua reordenação de valores
e princípios. Em face disso, convencem-nos os argumentos que sustentam a plausibilidade de se
condenar alguém pela corrupção de menores, quando o agente com ele (criança ou adolescente)
pratica infração penal ou o induz a praticá-la, pois está obstando qualquer possibilidade de
recuperação. Por outro lado, mesmo sendo formal o delito, é possível encontrar alternativas de
configuração do crime impossível. Eis o fundamento pelo qual se torna mais adequada a
classificação desse crime como formal. Sobre o crime impossível, ver a próxima nota. Sobre o
delito ser formal, o STJ editou a Súmula 500: “A configuração do crime do art. 244-B do ECA
independe da provada efetiva corrupção do menor, por se tratar de delito formal”. Na
jurisprudência: STJ: “1. Na esteira do entendimento firmado pela Terceira Seção desta Corte, no
julgamento do REsp 1.112.326/DF, submetido ao rito dos recursos repetitivos, para a
configuração do crime de corrupção de menores, atual art. 244-B do Estatuto da Criança e do
Adolescente, não se faz necessária a prova da efetiva corrupção do menor. 2. Por se tratar de
crime formal, exige-se apenas a participação do menor na empreitada criminosa para a
configuração do delito, o que prescinde de revolvimento fático-probatório dos autos, a afastar a
incidência da Súmula 7 do STJ. 3. Provido o recurso especial, imperativo o retorno dos autos ao
Tribunal de origem para apreciação do pedido remanescente de redução da pena, deduzido no
recurso de apelação da defesa, mostrando-se improcedente a pretensão acusatória de
restabelecimento da pena imposta na sentença condenatória. 4. Agravos regimentais improvidos”
(AgRg no REsp 1539475 – MG, 6.ª T., rel. Nefi Cordeiro, 07.06.2016, v.u.); “1. Este Superior
Tribunal de Justiça tem o entendimento de que o crime em referência é delito formal, portanto,
não se faz necessária a prova da efetiva corrupção do menor. 2. ‘Para a configuração do crime de
corrupção de menores, atual art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente, não se faz
necessária a prova da efetiva corrupção do menor, uma vez que se trata de delito formal, cujo bem
jurídico tutelado pela norma visa, sobretudo, impedir que o maior imputável induza ou facilite a
inserção ou a manutenção do menor na esfera criminal’ (REsp 1.127.954/DF, rel. Min. Marco
Aurélio Bellizze, Terceira Seção, DJe 01.02.2012)” (AgRg no AREsp 319.524/DF, 5.ª T., rel.
Jorge Mussi, 25.06.2013, v.u.). TJSP: “Furto qualificado e corrupção de menores. Condenação
somente pelo delito patrimonial, conformado o réu. Apelo ministerial com vistas à condenação
também pelo delito do art. 244-B do ECA, majorando-se, inclusive, a pena do furto. Resultado
que se impõe. Delito formal, a independer de prova da efetiva corrupção do menor, bastando que
participe da ação criminosa. Exegese da Súmula 500 do STJ. Recurso provido” (Apelação
0000167-25.2013.8.26.0240, 4.ª Câm. Criminal, rel. Ivan Sartori, 03.06.2014, v.u.); “Roubo e
corrupção de menores. Conduta de subtrair, em concurso de pessoas e mediante grave ameaça,
exercida com um canivete, a aliança, a carteira e o celular da vítima. Configuração. Prova. Prisão
em flagrante do acusado e de seu comparsa ainda ao lado da vítima. Confissão. Suficiência para
a condenação. Causa de aumento bem configurada. Tentativa. Tese inadmissível. Iter
criminis integralmente percorrido. Suficiência da inversão da posse da rei furtivae. Corrupção de
menor. Art. 244-B do ECA. Inteligência da Súmula n.º 500 do STJ. Penas e regime bem dosados.
Apelo improvido” (Apelação 3000573-46.2013.8.26.0223, 16.ª Câm. Criminal, rel. Almeida
Toledo, 20.05.2014, v.u.). TJMG: “Restando evidenciada a participação do menor na prática
delituosa juntamente com o acusado maior de 18 anos, impossível a absolvição deste pelo delito
previsto no art. 244-B do ECA, eis que por se tratar de crime formal, dispensa prova efetiva da
corrupção do menor para sua configuração” (Apelação 10433130251419001, 6.ª Câm. Criminal,
rel. Jaubert Carneiro Jaques, 06.05.2014, v.u.). TJAL: “I – É prescindível, para a caracterização
do crime de corrupção de menor, a efetiva corrupção ou degradação da personalidade da criança
ou adolescente por parte do agente corruptor, tendo em vista tratar-se de crime formal, e, portanto,
com resultado naturalístico dispensável. Basta, portanto, para a manutenção do juízo condenatório
por essa figura delitiva, que os autos provem a participação do menor na empreitada delitiva
juntamente com o agente penalmente imputável. Precedentes do Superior Tribunal de Justiça e
desta Corte. (...)” (Ap. 0000012-78.2010.8.02.0051 – AL, Câm. Criminal, rel. Sebastião Costa
Filho, 01.06.2016, v.u.). TJAM: “1. A materialidade e autoria dos delitos restaram devidamente
comprovadas, em especial pela própria confissão do apelante, no entanto, em relação ao delito
previsto no Estatuto menorista, desassiste razão a tese defensiva acerca da imprescindibilidade da
efetiva corrupção do menor pelo agente. Isto porque, o C. Superior Tribunal de Justiça, ao editar
a Súmula 500, consagrou o entendimento no sentido de que o crime previsto no art. 244-B, do
ECA, é formal, sendo dispensável a prova da efetiva corrupção do menor, bastando a participação
deste no delito” (Ap. 0000240-50.2015.8.04.4601 – AM, 1.ª Câm. Criminal, rel. Jorge Manoel
Lopes Lins, 20.06.2016). TJAP: “Cumulação de pena. 1) O crime de corrupção de menores é de
natureza formal, bastando a participação do menor de 18 (dezoito) anos para que se verifique a
subsunção da conduta do réu imputável ao referido tipo penal, agora descrito no art. 244-B do
Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA. Destarte, comprovada a participação de menor de
idade em ilícito penal praticado na companhia dos apelados os quais à época dos fatos já eram
maiores de idade, estes incorreram na prática do crime previsto no art. 244-B da Lei 8.069/90. 2)
Aplicável ao caso a regra estatuída pelo art. 70, do Código Penal, Segunda Parte, frente à
existência de uma única ação, a qual se desdobrou na execução de dois atos distintos, praticados
com desígnios autônomos – prática do roubo majorado e da corrupção de menores, que tiveram
suas penas individuais devidamente dosadas em patamares diversos, devendo as penas ser
cumuladas. 3) Apelação provida” (Ap. 0060084-81.2015.8.03.0001 – AP, Câm. Única, rel. Carlos
Tork, 21.06.2016, v.u.). TJES: “1. Havendo prova judicializada acerca da participação do réu nos
eventos narrados na exordial, inviável a reforma da sentença condenatória. 2. O crime de
corrupção de menores de que trata o art. 244-B do Estatuto da Criança e do Adolescente é tido
como de natureza formal, tanto para a doutrina como para a jurisprudência pátrias, bastando para
a sua caracterização a comprovação da participação de menor infrator em prática delituosa na
companhia de maior imputável. 3. Embora tenha ficado clara a ocorrência de dois crimes em um
mesmo contexto fático (roubo e corrupção de menores), não restou caracterizada a existência de
mais de uma ação por parte do agente, já que o delito de corrupção dos menores se deu em
concomitância com a prática do crime patrimonial, atraindo, assim, a regra do concurso formal.
4. Recurso ao qual se dá provimento parcial” (Ap. 0002561-92.2014.8.08.0006 – ES, 1.ª Câm.
Criminal, rel. Willian Silva, 08.06.2016, v.u.). TJGO: “O crime de corrupção de menores é
formal, consumando-se com a conduta do agente, maior de idade, de praticar crime na companhia
de menor, sendo desnecessária a comprovação da efetiva corrupção da vítima à época dos fatos,
consoante dispõe a Súmula 500 do Superior Tribunal de Justiça” (Ap. Criminal 15991-
30.2014.8.09.0024 – GO, 1.ª Câm. Criminal, rel. Itaney Francisco Campos, 23.06.2016, v.u.).
TJMA: “Comprovada, inequivocamente, a participação de um adolescente na subtração
patrimonial, de rigor a condenação do réu pelo crime previsto no art. 244-B, do ECA, que é de
natureza formal, ou seja, prescinde de efetiva prova de corrupção do adolescente. Inteligência da
Súmula 500, do STJ. 4. Apelo conhecido e provido. Réu condenado” (Ap. 0610682015 – MA, 2.ª
Câm. Criminal, rel. José Luiz Oliveira de Almeida, 16.06.2016, v.u.). TJPE: “1. O delito previsto
no art. 244-B do ECA é crime formal, dispensando a comprovação da efetiva corrupção do
adolescente, bastando a demonstração inequívoca de que o agente praticou a conduta criminosa
em companhia de indivíduo menor de 18 (dezoito) anos. 2. Entendimento do STJ restou
consolidado com a edição do Verbete Sumular 500: ‘A configuração do crime do art. 244-B do
Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) independe da prova da efetiva corrupção do menor,
por se tratar de delito formal’. 3. Apelo provido. Decisão unânime” (Ap. Crim. 0000332-
12.2012.8.17.1290 – PE, 1.ª Câm. Criminal, rel. Fausto de Castro Campos, 17.05.2016, v.u.).
TJPR: “A jurisprudência do STJ já se firmou no sentido de que a corrupção de menor não exige
que este seja inserido pela primeira vez no universo criminoso; mesmo que o jovem seja um
infrator contumaz, o fato de um adulto, ao invés de dar o exemplo que deveria a quem está em
plena formação de caráter, vender entorpecente a ele ou na sua companhia, incentivando-o a
permanecer com a conduta desvirtuada, é suficiente para a caracterização do tipo penal” (Ap.
Crim. 1494733-6 – PR, 5.ª Câm. Criminal, rel. Luiz Osório Moraes Panza, 05.05.2016).
216-A. Crime formal e o princípio do in dubio pro reo: constituir o delito um crime
de atividade (mera conduta ou formal) não o transforma em infração de condenação certa. Pode
– e deve – haver a absolvição do acusado, quando o juiz tiver dúvida acerca de sua colaboração
efetiva na atividade delituosa. Logo, embora não se exija qualquer resultado naturalístico para a
consumação do crime, demanda-se o mínimo necessário para subjugar o princípio da prevalência
do réu, significando haver provas suficientes de ter ele cometido a atividade prevista no tipo penal.
Nessa ótica: STJ: “1. Por ocasião do julgamento do Recurso Especial Representativo de
Controvérsia 1.127.954/DF (DJe 1º.02.2012), a Terceira Seção deste Superior Tribunal
uniformizou o entendimento de que, para a configuração do crime de corrupção de menores, basta
que haja evidências da participação de menor de 18 anos no delito e na companhia de agente
imputável, sendo irrelevante o fato de o adolescente já estar corrompido, porquanto se trata de
delito de natureza formal. 2. O ônus da prova, na ação penal condenatória, é todo da acusação,
decorrência natural do princípio do favor rei, bem assim da presunção de inocência, sob a vertente
da regra probatória, de maneira que o juiz deverá absolver quando não tenha prova suficiente de
que o acusado cometeu o fato atribuído na exordial acusatória, bem como quando faltarem provas
suficientes para afastar as excludentes de ilicitude e de culpabilidade. 3. A regra do onus
probandi, prevista no art. 156 do Código de Processo Penal, serve apenas para permitir ao juiz
que, mantida a dúvida, depois de esgotadas as possibilidades de descobrimento da verdade real,
decida a causa de acordo com a orientação expressa na regra em apreço. 4. Embora o recorrido
tenha praticado o delito de tráfico de drogas na companhia de adolescente que, em tese, possuía
16 anos de idade na data dos fatos, tanto o Magistrado de primeiro grau quanto a Corte de origem
afirmaram que estavam em dúvidas acerca da prática do crime previsto no art. 244-B da Lei
8.069/90, de modo que, sem a firme certeza quanto à autoria e à materialidade do delito e sem a
ciência inequívoca do acusado acerca da menoridade da sua comparsa, impõe-se a sua absolvição,
em homenagem ao princípio do in dubio pro reo. 5. Uma vez que o Tribunal de origem, após a
análise do material fático-probatório amealhado aos autos, concluiu que não havia elementos
concretos que, efetivamente, demonstrassem a estabilidade e a permanência da associação
criminosa da qual o recorrido seria em tese integrante, qualquer outra solução que não a adotada
pela Corte estadual esbarra no enunciado na Súmula 7 do STJ. (...) Recurso especial não provido”
(REsp 1501842 – PR, 6.ª T., rel. Rogerio Schietti Cruz, 05.04.2016, v.u.).
217. Crime impossível: é importante ressaltar não cometer o crime previsto neste artigo
o agente que pratica crime ou contravenção na companhia do menor “incorruptível”, no sentido
material do termo. São hipóteses de objeto absolutamente impróprio, dentre outras: a) quando se
trata de criança, cujo entendimento do ato ilícito inexiste, servindo de instrumento ao maior (ex.:
o agente pede a uma criança que entre na loja e pegue o pacote esquecido no balcão; pensando
ajudar, o infante assim age, quando, na verdade, está servindo de instrumento para furtar alguém);
b) quando faltar ao menor condições físicas para entender o caráter ilícito do que faz (ex.: o
agente, acompanhado de um adolescente cego, pede que ele o acompanhe para se tornar mais fácil
subtrair objetos de uma loja); c) no cenário do erro de proibição, a ingenuidade do menor pode
ser suficiente para que ele nem perceba o caráter ilícito do que realiza (com o maior ou por indução
deste). Além disso, é preciso considerar situações em que o agente efetiva condutas, juntamente
com uma criança ou adolescente, por meio integralmente inócuo para produzir qualquer resultado.
São hipóteses de instrumento absolutamente ineficaz, dentre outros: a) maior e menor pensam
matar determinada vítima, que, no entanto, nada sofre, pois o objeto eleito é inútil – se o delito de
homicídio (ou tentativa) deixa de ser típico para o maior, por óbvio, também não pode se
consumar o tipo do art. 244-B; b) maior induz menor a subtrair um lápis usado do balcão de um
bar; considerando-se crime de bagatela, logo, fato atípico, o meio usado para “corromper” o jovem
é ineficiente. Em suma, embora aquiesçamos ser formal o delito de corrupção de menores, isso
não impede a eventual existência de crime impossível. Ainda assim, é preciso cautela em certas
hipóteses, como já havíamos usado de exemplo antes: o rapaz com 17 anos, chefe do
agrupamento, corrompe um moço de 18, que nunca cometeu crime antes. Praticam, juntos, um
roubo. O de 17 já cumula dez atos infracionais (roubos) e o maior inaugura o seu primeiro. Presos,
sob o ponto de vista formal, haveria corrupção de menor; entretanto, avaliando-se sob o prisma
material, inexistiu corrupção alguma, tendo em vista que ela se deu, na essência, do menor para
o maior. Quanto a outra ilustração que fizemos, noutro texto, o adolescente pode ser computado
para compor o número mínimo de uma associação criminosa, pois, embora naquele momento
tenha noção do ilícito, ao mesmo tempo está sendo impedido de se aprimorar para o lado correto,
motivo pelo qual surge a corrupção. Em outras palavras, o menor pode cometer o ilícito, ciente
disso – ainda que inimputável por força de lei –, permitindo a formação de associação criminosa
ou organização criminosa; isso não afasta a posição do maior que com ele atua, pois o mantém
no cenário do ilícito, degenerando a sua boa formação moral. Mantemos a nossa anterior posição,
no sentido de que se está no âmbito de política criminal do Estado, ao adotar o critério meramente
cronológico para distinguir, de maneira absoluta, menores (inimputáveis) de maiores
(imputáveis). Por isso, algumas cenas terminam por parecer estranhas – e efetivamente são –
quando dois rapazes, 17 e 18 anos, cometem um ilícito, seguindo cada qual para julgamento
em Vara diversa, sob diferente legislação. A diferença cronológica entre eles pode ser de
simplesmente um dia e, mesmo assim, seus caminhos serão completamente distintos. Não vemos
como acolher tal confronto no campo naturalístico, mas devemos nos conformar com ele no setor
normativo.
218. Benefícios penais: admite-se suspensão condicional do processo, pois a pena
mínima é de um ano (art. 89, Lei 9.099/95). Quanto à aplicação de penas alternativas, permite o
art. 44, I, do Código Penal, a referida substituição, quando a pena privativa de liberdade não for
superior a quatro anos, bem como quando o delito não for cometido com violência ou grave
ameaça à pessoa. Em tese, em singela leitura desse tipo penal, não haveria óbice à substituição,
ainda que o réu fosse apenado com quatro anos de reclusão (pena máxima) pela prática de
corrupção de menores. Entretanto, deve-se ter cautela nesse caso. O tipo do art. 244-B faz
referência à prática de infração penal pelo adulto juntamente com o menor ou à indução do menor
a praticá-la, motivo pelo qual se deve analisar qual foi a conduta realizada pela criança ou
adolescente. Se o adulto praticou um roubo com o menor, conseguindo, com isso, corrompê-lo,
vislumbra-se a inserção da violência ou grave ameaça (por intermédio do delito patrimonial) no
contexto do crime de corrupção de menores. Assim ocorrendo, parece-nos vedada a substituição
da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. O cenário foi, ainda que indiretamente,
tingido pela violência ou grave ameaça. Porém, se o menor pratica um furto com o maior, logo,
um delito sem violência ou grave ameaça, pode-se aplicar a substituição prevista no art. 44 do
Código Penal, desde que respeitadas as demais condições legais fixadas.
219. Meios eletrônicos: a modernidade trouxe a preocupação em ampliar o leque de
possibilidades de atuação do agente corruptor. Portanto, mesmo à distância, é viável encontrar-se
formas de aliciamento de menores de 18 anos para o cometimento de infrações penais. Cuidar-
se-ia de uma corrupção virtual, praticada, basicamente, pela internet.
220. Aumento de pena: prevê-se o aumento da pena em um terço, caso a corrupção
envolva a prática de crimes considerados hediondos. Sem dúvida, são delitos de maior potencial
ofensivo, motivo pelo qual a corrupção do menor é mais grave. Entretanto, houve uma falha:
dever-se-ia ter incluído, ao menos, o tráfico ilícito de drogas, equiparado a hediondo, que,
atualmente, envolve vários jovens.

Capítulo II
Das Infrações Administrativas221-227

221. Infrações administrativas: o campo do ilícito é vasto, dividindo-se entre infrações


penais, civis, tributárias, trabalhistas, processuais, ambientais, dentre outras. Nesse cenário, por
óbvio, encontram-se as infrações administrativas, cujo intento é assegurar a regularidade de algum
campo sob tutela do poder público, no interesse da sociedade ou do Estado. Ilustrando, uma das
mais frequentes e conhecidas infrações administrativas é a infração de trânsito. Para regular a
segurança viária, estabelecem-se várias condutas ilícitas, que não devem ser praticadas pelos
motoristas e também por pedestres. Os ilícitos dividem-se, no Código de Trânsito Brasileiro –
aliás, como se dá neste Estatuto –, entre administrativos e penais. Os ilícitos penais são os mais
graves, motivo pelo qual a punição é centrada na aplicação da pena, que pode ser privativa de
liberdade, restritiva de direitos ou multa. Demanda-se, ainda, o elemento subjetivo do agente,
calcado no dolo ou culpa. Os ilícitos administrativos são de menor gravidade, razão pela qual a
punição é centrada na simples aplicação de multa – por vezes, algo mais como a interdição de
uma atividade ou estabelecimento. Essa sanção jamais se torna prisão, mesmo que a multa não
seja paga. Por isso, os ilícitos administrativos independem de dolo ou culpa, bastando a
voluntariedade do agente, vale dizer, atuar livre de qualquer coação física ou moral. Além disso,
eles fazem parte do poder de polícia do Estado, buscando disciplinar, organizar e controlar a
sociedade por meio da coerção imposta pela aplicação da multa, como penalidade primária, mas
também mediante outras sanções, dependendo do contexto (ex.: fechamento ou interdição de
estabelecimento comercial).
222. Legitimidade para a ação: incumbe ao Ministério Público e, secundariamente, ao
Conselho Tutelar. Pode haver, ainda, autuação provocada por voluntário credenciado da Vara da
Infância e Juventude. “O procedimento será iniciado pelo Ministério Público, através de
representação; neste caso, o representante do MP atuará até o final do processo como parte. Se,
porventura, o procedimento for iniciado por conselheiro tutelar ou por agente de proteção, o
Ministério Público atuará como substituto processual, tendo em vista que aqueles agentes não
terão condições de prosseguir no processo. Como fiscal da lei e defensor dos interesses
infantojuvenis atuará como custos legis” (Wilson Donizeti Liberati, Comentários ao Estatuto da
Criança e do Adolescente, p. 223).
223. Prescrição: cuidando-se de infração administrativa, o prazo prescricional é de cinco
anos, à falta de norma específica a respeito neste Estatuto. Portanto, cinco anos para iniciar o
processo; depois, cinco anos para cobrar a multa imposta, após trânsito em julgado, valendo-se
do disposto pelo Decreto 20.910/32. No mesmo prisma: Rossato, Lépore e Sanches (Estatuto da
Criança e do Adolescente comentado, p. 593); Fuller, Dezem e Martins (Estatuto da Criança e
do Adolescente, p. 232). Na jurisprudência: TJMG: “É de cinco anos a prescrição das infrações
administrativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente” (Apelação
10481070662137001, 5.ª Câm. Cível, rel. Versiani Penna, 21.02.2013).
224. Competência: cabe o processamento, sob o crivo do contraditório e da ampla defesa,
e julgamento ao Juiz da Infância e Juventude do local da infração. TJSC: “As infrações
administrativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente não se enquadram no conceito
de infração de menor potencial ofensivo, pois não constituem crime ou contravenção penal (...)”
(Apelação 2003.005114-7, 2.ª Câm. Criminal, rel. Maurílio Moreira Leite, 15.04.2003, v.u.).
225. Tentativa: não se pune, à falta de previsão legal expressa para o campo das infrações
administrativas.
226. Sujeito passivo em geral: as infrações administrativas não possuem como parte
ofendida a sociedade, mas a Administração Pública. Aliás, até mesmo os crimes contra a
Administração têm como sujeito passivo o Estado e não a coletividade. Pode-se, por certo,
detectar um sujeito passivo secundário, prejudicado, de algum modo, pela conduta ilícita. No
entanto, acolher a viabilidade de ser a sociedade sujeito passivo de uma infração administrativa é
o mesmo que dizer que a sua prática não fere um bem jurídico definido, mas vago, o que não é
adequado. O Estado, por meio das infrações administrativas, visa ao controle de várias situações,
cuja responsabilidade lhe pertence. Por exemplo, uma infração de trânsito não fere diretamente
a sociedade, mas o poder público, responsável pela segurança viária, na seara administrativa.
Pode-se dizer, no entanto, que o crime de trânsito – de perigo –, violando a segurança viária, tem
por sujeito passivo a sociedade, tendo em vista que o bem jurídico a ninguém pertence com
exclusividade.
227. Responsabilidade objetiva: em matéria de infração administrativa, costuma-se
defender a prevalência da responsabilidade objetiva, isto é, sem dolo ou culpa. Porém, há uma
enorme diferença entre responsabilidade objetiva e voluntariedade da conduta. O mínimo que se
espera é ter o agente atuado com vontade. Atos involuntários – provocados por terceiros, por
motivo de força maior, enfim, completamente fora da alçada do agente – não são puníveis. Seria
o mesmo que punir o sonâmbulo, porque ligou um aparelho e passou um filme inadequado para
uma criança.
Art. 245. Deixar o médico, professor ou responsável
228 229-230
por estabelecimento de
atenção à saúde e de ensino fundamental, pré-escola ou creche, de comunicar à
autoridade competente231 os casos de que tenha conhecimento, envolvendo suspeita ou
confirmação232 de maus-tratos contra criança ou adolescente:233
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.234

Redação dada pelo legislador, mas vetada pela


Presidência da República:

“Art. 245. Deixar o profissional da saúde, da assistência


social ou da educação ou qualquer pessoa que exerça cargo,
emprego ou função pública de comunicar à autoridade
competente os casos de que tenha conhecimento envolvendo
suspeita ou confirmação de castigo físico, tratamento cruel ou
degradante ou maus-tratos contra criança ou adolescente:

Pena – multa de 3 (três) a 20 (vinte) salários mínimos,


aplicando-se o dobro em caso de reincidência.” (NR)235

228. Conduta ilícita: trata-se de omissão, consistente em deixar de comunicar (não


avisar, não alertar) maus-tratos detectados em criança ou adolescente dos quais o agente tem
conhecimento. Cuida-se de uma omissão administrativamente relevante, impondo o dever de
garante aos profissionais mencionados no artigo (vide sujeito ativo). Não se trata de situação de
fácil constatação, mas a lei indica ser viável a comunicação ainda que calcada em suspeita. Exige-
se, entretanto, fundada suspeita, para que não se processe levianamente qualquer pessoa. Não se
aplica ao profissional do ensino em caso de evasão escolar: TJMG: “A ausência de comunicação
ao Conselho Tutelar de falta injustificada de aluno, ou de sua evasão escolar, embora não observe
o previsto no art. 56, inciso II, do ECA, não autoriza a aplicação à Diretora de Escola Estadual de
multa prevista no art. 245 da legislação da criança e do adolescente, uma vez que ausente a
similaridade fática entre a conduta irregular e a sanção prevista em lei” (Apelação Cível
1.0317.10.003712-4/001, 6.ª Câm. Cível, rel. Edilson Fernandes, DJ 16.07.2013).
229. Sujeito ativo: cuida-se de infração própria, que somente pode ser cometida pelos
indivíduos apontados na norma; nesse caso, o médico (exclui-se o enfermeiro, auxiliar de
enfermagem, fisioterapeuta, dentre outros), o professor (exclui-se o auxiliar de sala, monitor,
coordenador pedagógico etc.) e o responsável por estabelecimento de saúde ou ensino
fundamental, pré-escola ou creche (diretor do local, excluindo-se funcionários subalternos). É
preciso assegurar o nexo de causalidade entre a atuação do profissional mencionado na norma e
a vítima de maus-tratos (criança ou adolescente). Noutros termos, ilustrando, somente pode ser
sujeito ativo desta infração o médico que atendeu a criança, suspeitando de maus-tratos – e não
todo médico do hospital, com o qual o infante tenha tido algum contato. Em suma, o liame entre
o profissional e a criança ou adolescente vitimado é essencial para permitir a configuração dessa
infração.
230. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, os próprios infantes e jovens vitimados pelos maus-tratos.
231. Autoridade competente: pode ser o Ministério Público da Infância e Juventude,
em atuação na área da infração, o Juízo da Infância e Juventude da região ou o Conselho Tutelar
do Município onde se deu o fato. A autoridade policial não tem atribuição para apurar essa espécie
de infração; entretanto, se o leigo procurar a delegacia para comunicar os maus-tratos contra
criança ou adolescente, não se configura a infração administrativa. Em primeiro lugar, pelo fato
de o delegado poder apurar crime daí advindo; em segundo, porque encaminhará o caso à
apreciação do Juizado da Infância e Juventude. De todo modo, o poder público toma
conhecimento. Nessa ótica, igualmente, Roberto João Elias (Comentários ao Estatuto da Criança
e do Adolescente, p. 329). Ver art. 194 desta Lei.
232. Suspeita ou confirmação: a suspeita é inspirada na dúvida, que, ao menos, deve
ser fundada; afinal, suspeitas levianas, sem qualquer base, devem ser rechaçadas pela autoridade.
A confirmação é a certeza – convicção íntima da verdade de algo – acerca do fato.
233. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de se omitir, ou seja, visualizar a
situação da criança ou adolescente maltratado e ficar silente. Muitos profissionais, tomando
contato com o menor, preferem não supor o pior e evitam invadir a privacidade da família,
temendo até represálias por isso. Desse modo, a conduta omissiva necessita ser evidente para que
haja punição.
234. Multa em salário de referência: ver a nota 235 à nova redação (vetada) do art.
245, bem como a nota 240 ao art. 246.
235. Razões do veto à nova redação do art. 245: são as seguintes: “a ampliação do
rol de profissionais sujeitos à obrigação de comunicar à autoridade competente os casos de castigo
físico, tratamento cruel ou degradante ou maus-tratos contra criança ou adolescente, inclusive
com imposição de multa, acabaria por obrigar profissionais sem habilitações específicas e cujas
atribuições não guardariam qualquer relação com a temática. Além disso, a alteração da multa de
salários de referência para salários mínimos, além de destoar em relação aos demais dispositivos
do Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, violaria o disposto no art. 7.º, inciso IV da
Constituição”. A primeira razão é razoável, pois envolveria muito mais conhecimento, em matéria
de abuso infantojuvenil, do que alguns profissionais teriam capacidade de ter. A segunda não tem
sentido algum. Em primeiro lugar, sabe-se que quase todas as infrações administrativas deste
Estatuto estão completamente desatualizadas, ainda baseadas no salário de referência, que foi
extinto em 1989. Portanto, era preciso corrigir essa distorção. Ao prever o salário mínimo, o
legislador nada mais fez do que seguir a tendência geral nos últimos tempos, em matéria punitiva,
de adotar o salário mínimo como base para o cálculo da penalidade pecuniária. Assim tem
acontecido, no cenário do Código Penal e legislação especial, desde 1984. O STF já validou esse
uso, demonstrando não afrontar o art. 7.º, IV, da CF, pois se cuida de sanção e não de índice
indexador, com reflexo na economia do País.
Art. 246. Impedir236 o responsável ou funcionário237-239 de entidade de atendimento o
exercício dos direitos constantes nos incisos II, III, VII, VIII e XI do art. 124 desta Lei:
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.240

236. Conduta ilícita: impedir significa obstar, colocar empecilho, não permitir. O objeto
da conduta comissiva é o exercício de alguns direitos de adolescentes infratores internados, pouco
importando a espécie de internação (se provisória ou sancionatória). Preceitua o art. 124 desta
Lei: “são direitos do adolescente privado de liberdade, entre outros, os seguintes: I – entrevistar-
se pessoalmente com o representante do Ministério Público; II – peticionar diretamente a
qualquer autoridade; III – avistar-se reservadamente com seu defensor; IV – ser informado de
sua situação processual, sempre que solicitada; V – ser tratado com respeito e dignidade; VI –
permanecer internado na mesma localidade ou naquela mais próxima ao domicílio de seus pais
ou responsável; VII – receber visitas, ao menos, semanalmente; VIII – corresponder-se com seus
familiares e amigos; IX – ter acesso aos objetos necessários à higiene e asseio pessoal; X – habitar
alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade; XI – receber escolarização e
profissionalização; XII – realizar atividades culturais, esportivas e de lazer: XIII – ter acesso aos
meios de comunicação social; XIV – receber assistência religiosa, segundo a sua crença, e desde
que assim o deseje; XV – manter a posse de seus objetos pessoais e dispor de local seguro para
guardá-los, recebendo comprovante daqueles porventura depositados em poder da entidade; XVI
– receber, quando de sua desinternação, os documentos pessoais indispensáveis à vida em
sociedade” (grifamos). De maneira inexplicável, somente os direitos previstos nos incisos II, III,
VII, VIII e XI constituem objeto de tutela deste artigo. Segundo nos parece, todos os direitos
supramencionados são relevantes e não podem ser obstados durante a internação do menor.
Entretanto, impedir o exercício de parcela deles configura a infração; outros, não. Ilustrando a
contradição: se o responsável pelo presídio impedir o adolescente de postar uma carta, comete a
infração, porém, se o impedir de ter acesso a objetos necessários à sua higiene e asseio pessoal,
não.
237. Sujeito ativo: constitui infração própria, cuja prática é adstrita ao responsável
(diretor ou coordenador) ou funcionário (empregado ou servidor na instituição), desde que algum
deles tenha o poder de permitir ou obstar o exercício dos direitos juvenis. Há funcionários que
não possuem autorização para permitir, por exemplo, visitas ou impe-di-las. Logo, não estão
sujeitos a essa infração.
238. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, os próprios jovens internados.
239. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de agir, colocando real obstáculo
ao exercício do direito. Não se trata de impedimento casual, acidental, tampouco por motivo de
força maior. Por vezes, o direito do adolescente não é fielmente seguido por sua própria culpa
(indisciplina, que o impede de receber visita na semana em que houve um motim, por exemplo).
240. Multa em salário de referência: outra preciosidade construída pelo legislador é a
edição deste Estatuto, contendo sanções administrativas cujos valores estão calcados em salários
de referência, quando essa modalidade de salário já tinha sido extinta no ano anterior. Entrou em
vigor desatualizado. Mas há um aspecto pior: após vários anos de vigência, não houve interesse
político em corrigir esse erro. Várias leis foram editadas nesse período, alterando inúmeros
dispositivos, mas a proteção efetiva à criança e ao adolescente, consistente na eficácia das sanções
administrativas, nem foi modificada. Por isso, para viabilizar a aplicação da multa, deve-se
converter o salário de referência, à época da sua extinção, em valor de moeda, atualizando-o.
Jamais se poderá simplesmente converter o salário de referência em salário mínimo, pois fere o
princípio da legalidade, afinal, ambos não eram idênticos à época em que o primeiro deixou de
existir. Entretanto, há posição aceitando a simples substituição do salário de referência pelo
salário mínimo: STJ: “3. A infração administrativa prevista no art. 253 do ECA é destinada aos
responsáveis pela apresentação de quaisquer espetáculos, assim como aos órgãos responsáveis
pela divulgação e publicidade, sem a expressa indicação dos limites de idade recomendáveis.
Precedentes do STJ. 4. Quanto ao valor da multa – inicialmente fixada em 60 salários mínimos e
reduzida para 20 salários mínimos pelo Tribunal local –, sua revisão somente é possível quando
o montante for exorbitante ou insignificante, em flagrante violação aos princípios da razoabilidade
e da proporcionalidade, o que não é o caso dos autos. A verificação da razoabilidade
do quantum esbarra no óbice da Súmula 7/STJ” (REsp 1.252.869/DF, 2.ª T., rel. Herman
Benjamin, 15.08.2013, v.u.). TJMG: “1. O salário de referência, mencionado na Lei 8.069/2009,
além de ter sido extinto pela Lei 7.789/89, não mais possui apreciação econômica, em virtude do
advento de planos econômicos e de alterações na moeda nacional 2. Admite-se a apuração das
penalidades previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente com base em salários mínimos,
por se tratar de conceito econômico atualizado. 3. Recurso provido” (Apelação Cível
1.0183.11.004306-8/001, 6.ª Câm. Cível, rel. Corrêa Junior, DJ 18.03.2014).
Art. 247. Divulgar,241-243 total ou parcialmente, sem autorização devida, por qualquer
meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo
ou judicial relativo a criança ou adolescente a que se atribua ato infracional: 244
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.245
§ 1.º Incorre na mesma pena quem exibe,246-248 total ou parcialmente, fotografia de
criança ou adolescente envolvido em ato infracional, ou qualquer ilustração que lhe diga
respeito ou se refira a atos que lhe sejam atribuídos, de forma a permitir sua
identificação, direta ou indiretamente.249
§ 2.º Se o fato for praticado por órgão de imprensa ou emissora de rádio ou
televisão, além da pena prevista neste artigo, a autoridade judiciária poderá determinar
a apreensão da publicação250 ou a suspensão da programação da emissora até por dois
dias, bem como da publicação do periódico até por dois números. (Expressão declarada
inconstitucional pela ADIN 869-2).251

241. Conduta ilícita: divulgar significa propagar, tornar público, difundir, tendo por
objeto o nome (trata-se da criança ou adolescente), ato (procedimental ou processual) ou
documento (qualquer base material apta a registrar fatos, como papel, filme, foto, DVD, CD etc.)
proveniente de procedimento policial (inquérito), administrativo (instaurado pelo Ministério
Público, Conselho Tutelar ou autoridade judiciária) ou judicial (tramitando em juízo) relativo a
criança ou adolescente a que se atribua a prática de ato infracional. É o sigilo imposto por lei para
todos os procedimentos, em sentido lato, envolvendo a apuração de ato infracional, a fim de não
comprometer a formação do menor, deixando-o exposto aos meios de comunicação ou à sua
comunidade. Configura-se a infração, mesmo que a divulgação seja parcial, vale dizer, mínima.
Há a expressão sem autorização devida, que, nos tipos penais, representa o elemento normativo,
referente à ilicitude. Nesse caso, não é diferente, pois, presente a licença legal para tornar público
qualquer nome, ato ou documento, por natural, inexiste infração. A conduta somente se torna
relevante, para efeito desse ilícito administrativo, quando se perfaz por meio de comunicação
(órgãos especializados em divulgar notícias, tais como TVs, rádio, jornal, revista, internet etc.).
Na jurisprudência: TJMT: “O artigo 247 do Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe que seja
divulgada, total ou parcialmente, sem autorização, por qualquer meio de comunicação, nome ou
imagem de criança ou de adolescente, a quem se atribua ato infracional. A empresa de televisão
que veicula matéria jornalística com menores, na qual seja possível a sua identificação, está sujeita
a multa administrativa. O valor da multa administrativa, por descumprimento do ECA, pode ser
reduzida se a empresa não é reincidente na infração de divulgação de imagem de menores” (Ap.
77372/2016-MT, 1ª Câmara de Direito Público e Coletivo, rel. Márcio Vidal, 29.08.2016, v.u.).
TJSP: “Apelação Cível – Indenização por danos morais – Veiculação de imagem de menor de
idade em programa televisivo – Apelado não foi coberto por tarja durante a exibição do programa
de modo a permitir sua identificação – Violação ao art. 247 do ECA – Uso indevido de imagem
caracterizado – Resguardo ao direito à imagem do menor (art. 17 do ECA) – Dano moral ‘in re
ipsa’ – Suficiência da prova dos transtornos causados ao apelado em decorrência da conduta ilícita
praticada pela apelante – Omissão quanto à apuração da qualificação das pessoas retratadas na
matéria jornalística – Possibilidade de aplicação de sanção administrativa prevista no ECA que
não inibe a busca por ressarcimento por danos morais no âmbito civil – Sentença mantida –
Recurso provido.” (Ap. 0007145-60.2012.8.26.0302 – SP, 2.ª Câm. de Direito Privado, rel. José
Joaquim dos Santos, 19.04.2016, v.u.); “Infração administrativa. Divulgação de iniciais de nome
de adolescentes acusados da prática de atos infracionais. Representação por infração aos arts. 247
e 143, parágrafo único, do ECA, julgada procedente. Pretensão de inversão do julgado para
absolver o recorrente. Impossibilidade. Liberdade de manifestação que deve ser adequada com as
regras constitucionais, principalmente com os direitos fundamentais da criança e do adolescente
instituídos pelo ECA. Sentença mantida. Recurso não provido” (Apel. 9000001-
37.2007.8.26.0404, Corte Especial, rel. Martins Pinto, DJ 30.01.2012).
242. Sujeito ativo: a infração é comum, podendo ser praticada por qualquer pessoa.
243. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, as crianças e adolescentes aos quais se atribua a prática de ato
infracional.
244. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de agir, tornando público o material
que deveria permanecer em sigilo. Não se configura o ilícito caso a conduta seja acidental ou
decorrente de força maior.
245. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
246. Conduta ilícita: exibir significa mostrar, apresentar, tendo por objeto fotografia
(inclua-se filme, pois também permite a identificação) de criança ou adolescente envolvido (de
alguma forma, acusado de ter cometido, em autoria ou participação) em ato infracional, bem como
qualquer ilustração (desenho, caricatura, montagem e similar) referente ao menor ou ao que ele
tenha feito. O objetivo dessa exibição é permitir a identificação da criança ou adolescente por
terceiros, de maneira direta ou indireta. Cuida-se, ainda, da mantença do devido sigilo dos
procedimentos envolvendo atos infracionais cometidos por menores de 18 anos. Observe-se que
a exibição precisa ser concretizada, para configurar a infração, mas independe da efetiva
identificação do menor. A descrição da infração menciona a exibição de forma a permitir, não se
demandando o resultado naturalístico relativo à eficiente identificação. Mesmo havendo
condenação a uma multa, pode-se debater, na esfera cível, indenização por dano moral, mas não
é automático: TJMG: “O art. 247, § 1.º, do ECA, tipifica como infração administrativa a
divulgação do nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo ou judicial
relativo a criança ou adolescente, ainda que tenham efetivamente praticado o ato infracional,
impondo pena de multa para o caso de descumprimento da norma, não ensejando, de forma
automática, a indenização por danos morais, porquanto é necessária a comprovação dos prejuízos
alegados” (Apelação Cível 1.0713.09.098875-7/001, 14.ª Câm. Cível, rel. Evangelina Castilho
Duarte, DJ 13.02.2014); “A divulgação do nome completo de menor, envolvido em ocorrência
policial de averiguação de crime, pode constituir infração administrativa prevista pelo art. 247, §
1.º do Estatuto da Criança e do Adolescente, a gerar multa a ser aplicada pelo Estado através do
órgão próprio. O dever de indenizar a título de dano moral surge mediante a demonstração
inequívoca da ofensa à honra e necessidade de proteção dos valores morais. Ausente referida
comprovação, na medida em que a matéria jornalística apenas publicou fatos narrados no boletim
de ocorrência pela própria parte autora, que demonstram conduta negligente por sua parte, bem
como a existência de averiguação acerca da autoria de crime de abandono de incapaz, sem
qualquer conteúdo sensacionalista, a improcedência do pleito indenizatório é medida que se
impõe” (Apelação Cível 1.0027.11.016905-2/001, 14.ª Câm. Cível, rel. Valdez Leite
Machado, DJ 03.10.2013).
247. Sujeito ativo: a infração é comum, podendo ser praticada por qualquer pessoa.
248. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, as crianças e adolescentes aos quais se atribua a prática de ato
infracional, que estiverem sujeitos à identificação por conta da exibição realizada.
249. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de agir, tornando pública a foto ou
ilustração que deveria permanecer em sigilo. Não se configura o ilícito caso a conduta seja
acidental ou decorrente de força maior.
250. Penalidade suplementar: além da multa, pode-se apreender a publicação em que
conste a exibição da foto ou ilustração permitindo a identificação do menor. Essa apreensão é
proporcional ao potencial dano à imagem da criança ou adolescente. Mesmo assim, o juiz deve
ter cautela. Ilustrando, a mera possibilidade de identificação justifica uma multa, mas não a
apreensão da publicação. Reserva-se esta medida para o caso de efetiva identificação do menor.
251. Declaração de inconstitucionalidade: a expressão apontada foi declarada
inconstitucional, nos termos da seguinte ementa: STF: “Ação Direta de Inconstitucionalidade. Lei
Federal 8.069/90. Liberdade de manifestação do pensamento, de criação, de expressão e de
informação. Impossibilidade de restrição. 1. Lei 8.069/90. Divulgação total ou parcial por
qualquer meio de comunicação, nome, ato ou documento de procedimento policial, administrativo
ou judicial relativo à criança ou adolescente a que se atribua ato infracional. Publicidade indevida.
Penalidade: suspensão da programação da emissora até por dois dias, bem como da publicação
do periódico até por dois números. Inconstitucionalidade. A Constituição de 1988 em seu art. 220
estabeleceu que a liberdade de manifestação do pensamento, de criação, de expressão e de
informação, sob qualquer forma, processo ou veículo, não sofrerá qualquer restrição, observado
o que nela estiver disposto. 2. Limitações à liberdade de manifestação do pensamento, pelas suas
variadas formas. Restrição que há de estar explícita ou implicitamente prevista na própria
Constituição. Ação direta de inconstitucionalidade julgada procedente” (ADI 869/DF, Pleno, rel.
Ilmar Galvão, 04.08.1999, v.u.). Com a devida vênia, não nos parece acertado o motivo levantado
para o referido julgamento, embora a conclusão tenha sido adequada. É certo que o art. 220, caput,
estabelece que “a manifestação do pensamento, a criação, a expressão e a informação, sob
qualquer forma, processo ou veículo não sofrerão qualquer restrição, observado o disposto nesta
Constituição” (grifamos). Na sequência, segue a restrição: “nenhuma lei conterá dispositivo que
possa constituir embaraço à plena liberdade de informação jornalística em qualquer veículo de
comunicação social, observado o disposto no art. 5.º, IV, V, X, XIII e XIV” (grifamos). Exatamente
no inciso X pode-se notar o direito à intimidade, à vida privada, à imagem, motivo pelo qual a lei
poderá, sem dúvida, restringir a atividade de informação quando afrontar tais direitos
fundamentais. Foi o que fez o art. 247, § 2.º, parte final. É verdade que houve um rigor exacerbado
na penalidade – e talvez esse tenha sido o motivo real da intervenção do STF –, pois a suspensão
da programação de uma emissora de televisão, por dois dias, implica o prejuízo de milhões de
reais, o que configura evidente desproporcionalidade. O mesmo se diga da suspensão de
publicação por até dois números. Portanto, ainda que pelo motivo inadequado, pois o certo seria
o princípio da proporcionalidade, a decisão do STF impediu males maiores. A bem da verdade,
se o direito à informação fosse absoluto, nem mesmo a multa prevista neste artigo poderia ser
aplicada à emissora ou à editora.
Art. 248. Revogado pela Lei 13.431/2017.252
252. Revogação: O art. 248 foi revogado pela Lei 13.431/2017, a partir de 4 de abril de
2018. A norma previa: “Art. 248. Deixar de apresentar à autoridade judiciária de seu domicílio,
no prazo de cinco dias, com o fim de regularizar a guarda, adolescente trazido de outra comarca
para a prestação de serviço doméstico, mesmo que autorizado pelos pais ou responsável: Pena –
multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência,
independentemente das despesas de retorno do adolescente, se for o caso.” A revogação desse
tipo penal demonstra não haver razão para que um empregado doméstico seja colocado sob guarda
do patrão, ou ainda, quem é guardião de um menor não deve submetê-lo a trabalhos domésticos
profissionais. Por isso, descabe a previsão de punição para a apresentação de alguém ao juiz a fim
de regularizar a guarda que tenha tal finalidade. Afinal, é preciso erradicar o trabalho
infantojuvenil, incentivando-se o estudo como primeira opção.
Art. 249. Descumprir,253-255 dolosa ou culposamente,256 os deveres inerentes ao
poder familiar ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação da
autoridade judiciária ou Conselho Tutelar:
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.257

253. Conduta ilícita: a infração é omissiva, consistindo em descumprir (não se submeter


a determinação; deixar de seguir comando legal), tendo por objeto os deveres inerentes ao poder
familiar ou advindos da tutela ou guarda, além de ordens dadas pelo juiz ou pelo Conselho Tutelar.
Dispõe o art. 1.634 do Código Civil, quanto ao poder familiar: “compete a ambos os pais, qualquer
que seja a sua situação conjugal, o pleno exercício do poder familiar, que consiste em, quanto aos
filhos: I – dirigir-lhes a criação e a educação; II – exercer a guarda unilateral ou compartilhada
nos termos do art. 1.584; III – conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para casarem; IV –
conceder-lhes ou negar-lhes consentimento para viajarem ao exterior; V – conceder-lhes ou
negar-lhes consentimento para mudarem sua residência permanente para outro Município; VI –
nomear-lhes tutor por testamento ou documento autêntico, se o outro dos pais não lhe sobreviver,
ou o sobrevivo não puder exercer o poder familiar; VII – representá-los judicial e
extrajudicialmente até os 16 (dezesseis) anos, nos atos da vida civil, e assisti-los, após essa idade,
nos atos em que forem partes, suprindo-lhes o consentimento; VIII – reclamá-los de quem
ilegalmente os detenha; IX – exigir que lhes prestem obediência, respeito e os serviços próprios
de sua idade e condição”. No tocante à tutela e à guarda, os poderes são similares. Além disso,
existem os comandos dados aos pais ou responsável pela autoridade judiciária e pelo Conselho
Tutelar (art. 129 desta Lei). Esta é uma infração corriqueira, pois há muitos pais que descumprem
seus deveres inerentes ao poder e não são punidos de nenhuma maneira. Aliás, nem com base
neste artigo (infração administrativa), tampouco com lastro no Código Penal, como o caso do
delito de maus-tratos. Preferem os operadores do Direito, envolvidos na área da infância e
juventude, resolver o problema internamente, ou seja, parecem acreditar que a destituição do
poder familiar é o ápice da punição para um pai ou uma mãe desidiosa. Entretanto, vislumbramos
um equívoco nessa postura, devendo haver a punição administrativa e, eventualmente, penal, que
não se confundem com a medida tomada na órbita infantojuvenil. Na jurisprudência: STJ: “2. O
propósito recursal consiste em definir se é possível deixar de aplicar a multa por descumprimento
dos deveres inerentes ao poder familiar nas hipóteses de hipossuficiência financeira ou
vulnerabilidade econômica da família. 3. A sanção prevista no art. 249 do ECA, segundo a qual
quem descumprir os deveres inerentes ao poder familiar estará sujeito a multa, guarda
indissociável relação com o rol de medidas preventivas, pedagógicas, educativas e sancionadoras
previsto no art. 129 do mesmo Estatuto, de modo que o julgador está autorizado a sopesá-las no
momento em que impõe sanções aos pais, sempre em busca daquela que se revele potencialmente
mais adequada e eficaz na hipótese concreta. 4. A sanção pecuniária prevista no art. 249 do ECA
é medida que, a despeito de seu cunho essencialmente sancionatório, também possui caráter
preventivo, coercitivo e disciplinador, a fim de que as condutas censuradas não mais se repitam a
bem dos filhos. 5. Estabelecido que a conduta é suficientemente grave para justificar a aplicação
da multa, não é admissível que se exclua a sanção aos pais apenas ao fundamento de
hipossuficiência financeira ou vulnerabilidade econômica, circunstâncias que influenciam tão
somente a fixação do valor da penalidade. 6. Hipótese em que a multa deve ser reduzida, inclusive
para aquém do patamar legal, levando-se em consideração, de um lado, a gravidade das condutas
do genitor e, de outro lado, a incontestável hipossuficiência financeira ou a vulnerabilidade da
família. 7. Ausente o cotejo analítico entre o acórdão recorrido e o acórdão paradigma, não se
conhece do recurso especial. 8. Recurso especial conhecido em parte e, nessa extensão, provido
em menor extensão, apenas para reduzir o valor da multa, suspensa temporariamente a
exigibilidade, enquanto perdurar a situação de pandemia causada pela Covid-19” (REsp
1.780.008/MG, 3.ª Turma, rel. Nancy Andrighi, j. 02.06.2020, v.u.); “2. O art. 249 do ECA prevê
a aplicação de multa por descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar. 3. A medida
sancionadora é aquela que visa prevenir e sancionar a omissão parental potencializada quando
presente vulnerabilidade acentuada por natureza. 4. A negligência na estimulação precoce de
pessoa com deficiência, especialmente se o tratamento é fomentado e disponibilizado pelo Estado,
impõe a aplicação da medida sancionadora prevista no ordenamento jurídico pátrio. 5. A multa
fixada no patamar mínimo retrata a justiça do caso concreto em virtude da gravidade da situação”
(REsp 1.795.572/ MS, 3.ª Turma, rel. Ricardo Villas Bôas Cueva, 23.04.2019, v.u.). TJSP: “O
artigo 249 da Lei nº 8.069/1990 exige o elemento subjetivo do tipo, ou seja, a vontade livre e
consciente de descumprir os deveres decorrentes do poder familiar, tutela ou guarda, ou não agir,
no exercício dessas funções, dentro do cuidado objetivo necessário. Prova dos autos que não
permite aferir a negligência dos genitores na direção da criação da filha, adolescente de
comportamento rebelde, que, refratária às orientações dos pais, subtrai coisas, mente, agride os
irmãos, porta-se mal no ambiente escolar e não respeita regras e ordens. Sanção pecuniária que,
ademais, não produziria o efeito satisfatório ou desejado, e serviria apenas para comprometer
ainda mais o quadro de vulnerabilidade econômica da família. Recurso provido para decretar a
improcedência da representação, com extensão dos efeitos do julgado também ao corréu (artigo
580 do Código de Processo Penal, combinado com o artigo 152 da Lei nº 8.069/1990)” (Apelação
Cível 0000003-26.2019.8.26.0248, Câmara Especial, rel. Issa Ahmed, j. 03.08.2020; v.u.). TJSC:
“1. Inexistindo dúvidas quanto à falta de zelo ou descuido dos representados na educação do filho,
em descumprimento dos deveres inerentes ao poder familiar, está comprovada a infração do art.
249 da Lei n. 8.069/90. 2. Apesar da medida protetiva de inclusão em programa comunitário ou
oficial de auxílio à família atingir o objetivo principal da punição decorrente da prática da infração
administrativa, qual seja, a proteção integral à criança e ao adolescente, no caso dos autos tal se
mostra inviável, uma vez que os pais do menor já eram assistidos por órgãos da prefeitura e,
embora advertidos, descumpriram deveres inerentes ao poder familiar. Recurso não provido” (Ap.
Crim. 0001358-94.2013.8.24.0003-SC, 3ª Câmara Criminal, rel. Moacyr de Moraes Lima Filho,
08.08.2017, v.u.). TJMG: “1. O Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe expressamente a
venda de bebida alcoólica a menor, estabelecendo, ainda, que configura infração administrativa o
descumprimento, doloso, ou culposo, dos deveres inerentes ao poder familiar ou decorrente de
tutela ou guarda, bem assim determinação da autoridade judiciária ou Conselho Tutelar, pelo que
restando demonstrada a prática da infração administrativa prevista no art. 249 e 81, II, do ECA,
como imputada a empresa requerida, sendo a imposição da penalidade respectiva medida que se
impõe. 2. Recurso desprovido” (Ap. Cív. 1.0694.13.007208-5/001 – MG, 8.ª Câm. Cível, rel.
Teresa Cristina da Cunha Peixoto, 23.06.2016).
254. Sujeito ativo: a infração é própria, somente cometida pelos pais ou responsável em
relação aos menores de 18 anos. Aliás, reputa-se responsável quem for legal ou judicialmente
assim considerado. Ilustrando, não envolve o guardião de fato. O contexto é único, referente a
quem deve cuidar dos filhos, tutelados ou pupilos, e não o faz. Portanto, as determinações judiciais
ou do Conselho Tutelar se voltam a essas pessoas. Terceiros não têm absolutamente nada a ver
com essa infração administrativa. Conferir: TJGO: “Conforme jurisprudência sedimentada pelo
Superior Tribunal de Justiça, as infrações previstas no art. 249 do Estatuto da Criança e do
Adolescente não se aplicam a terceiros, mas somente aos pais ou aqueles responsáveis pela guarda
ou tutela, ou seja, aos detentores do poder familiar sobre a criança ou adolescente tutelado”
(Apelação Cível 223789-08.2013.8.09.0052, 6.ª Câm. Cível, rel. Marcus da Costa Ferreira,
28.04.2015).
255. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, a criança ou adolescente objeto do descuido.
256. Elemento subjetivo: excepcionalmente, no quadro das infrações administrativas,
exige-se o dolo ou a culpa. Aliás, se essa infração se configurasse apenas pela prática voluntária
do descumprimento de deveres ou determinações, seria uma aplicação contínua da penalidade.
Muitos pais ou responsáveis terminam por descumprir seus deveres de cuidado, proteção, sustento
e educação de crianças e adolescentes por motivos variados, mas sabem fazê-lo de maneira
voluntária; entretanto, essa voluntariedade nem sempre é reprovável. Fez bem o legislador ao
demandar dolo ou culpa. O dolo se consagra pela prática da conduta ciente de que se descumpre o
dever ou a ordem, não podendo fazê-lo, pois gerará prejuízo ao filho, tutelado ou pupilo. Não há
como dissociar, nessa hipótese, o dolo normativo, que inclui a consciência do ilícito, pois a
estrutura da infração administrativa, que não goza do juízo de culpabilidade, assim admite.
Quanto à culpa, cuida-se do comportamento descuidado, com infração do dever de cuidado
objetivo, tendo condições de prever a potencialidade lesiva da sua atitude, embora não deseje
qualquer resultado danoso. Ilustrando, os pais deixam de matricular o filho no ensino
fundamental. Pode figurar mero esquecimento ou ignorância, embora tenha sido uma omissão
voluntária. Para concretizar a infração administrativa, exige mais que isso. É preciso que os pais
tenham recebido ordem do juiz ou do Conselho Tutelar, por exemplo, e, bem cientes da ilicitude
da omissão, deixem de matricular o filho na escola. Ou, então, recebida a referida ordem, por
negligência nítida, não a cumpram. Na jurisprudência: TJMG: “A evasão escolar de adolescente
em estágio avançado de gravidez está justificada pela situação excepcional vivenciada pela
menor, porquanto a imposição pelos pais de frequentar a escola pode representar grave dano
psicológico, em razão do constrangimento a que estaria submetida a estudante. A demonstração
de que as faltas não decorreram diretamente da conduta dos representados afasta o elemento
subjetivo indispensável à configuração do ilícito administrativo” (Ap. Cível 0849623-
29.2008.8.13.0439, rel. Sandra Fonseca, 10.11.2009, grifamos). TJRS: “1. É viável o
oferecimento de representação buscando a imposição de multa quando os genitores revelam-se
negligentes e, mesmo depois de devidamente advertidos de que os filhos menores deveriam
frequentar regularmente a escola, não adotam as providências cabíveis. 2. No entanto, a ação
mostra-se improcedente quando não fica comprovado o dolo dos genitores e a família vive em
situação de pobreza. 3. Como o propósito não é punitivo, mas educativo, mostra-se mais
proveitoso incluir a família, juntamente com os filhos, em programas assistenciais e educativos,
assegurando também um acompanhamento psicológico aos menores, buscando mostrar-lhes a
necessidade de inserção na escola e a importância da adequada formação escolar. Recurso
desprovido” (AC 70057724304/RS, 7.ª Câm. Cível, rel. Sérgio Fernando de Vasconcellos
Chaves, DJ 29.01.2014, grifamos). TJRN: “Descumprimento de dever inerente ao poder familiar.
A imposição da penalidade prevista no art. 249 do ECA exige comprovação nos autos da
negligência dolosa ou culposa por parte dos genitores. Inexistente prova efetiva quanto a
ocorrência de qualquer dos elementos subjetivos do tipo (culpa ou dolo) indispensável à sua
caracterização” (Apelação 2013.014656-4, 3.ª Câm. Cível, rel. Amaury Moura
Sobrinho, DJ 22.04.2014, v.u.).
257. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
Art. 250. Hospedar258-261 criança ou adolescente desacompanhado dos pais ou
responsável, ou sem autorização escrita desses ou da autoridade judiciária, em hotel,
pensão, motel ou congênere:262
Pena – multa.263
§ 1.º Em caso de reincidência, sem prejuízo da pena de multa, a autoridade
judiciária poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até 15 (quinze)
dias.264
§ 2.º Se comprovada a reincidência em período inferior a 30 (trinta) dias, o
estabelecimento será definitivamente fechado e terá sua licença cassada.265

258. Inaplicabilidade da infração: tendo em vista a falha cometida pelo legislador, ao


editar a Lei 12.038/2009, que não previu valor algum para a multa, como explicamos na nota 269
abaixo, essa infração não tem aplicabilidade. Entretanto, ad cautelam, para os que defendem a
sua aplicação, caso seja o entendimento dos tribunais, comentaremos esta figura.
259. Conduta ilícita: a conduta é comissiva; hospedar significa dar abrigo, alojar, tendo
por objeto a criança ou adolescente, sem o acompanhamento dos pais ou responsável, ou sem
autorização escrita destes, ou, ainda, sem autorização judicial. Os lugares vedados são hotéis,
pensões, motéis ou similares (drive-in, abrigo ou alojamento estudantil, albergue etc.). O foco da
vedação é impedir a prática sexual indevida nesses lugares, bem como a fuga de casa. A
autorização escrita dos pais ou responsável deve ter a firma reconhecida, pois, cuidando-se de
menores, qualquer tipo de falsificação é possível (vide como se altera RG para ingresso em
danceterias e lugares de diversão pública pelos próprios adolescentes). Para haver autorização
judicial, em lugar dos pais ou responsável, é preciso uma situação anormal, pois não cabe, como
regra, ao juiz substituir-se aos genitores para tais medidas. Logo, pode haver um processo de
destituição do poder familiar e, nessa excepcional ocasião, o juiz autorize o adolescente, com 16
anos, a trabalhar noutra Comarca, hospedando-se em hotel até chegar ao seu destino. Sob outro
aspecto, se é para levar a sério essa infração, a hospedagem pode dar-se por qualquer período,
mesmo que tenha acontecido há poucos minutos; afinal, em motéis ou hotéis de grande
rotatividade o tempo de ocupação é de minutos ou horas, jamais dias. O verbo utilizado (hospedar)
foi correto, não havendo sentido algum em se utilizar o termo entrar ou permanecer, pois esses
lugares são específicos para repouso, onde há, necessariamente, cama. Ninguém entra e sai de um
hotel como se faz numa casa de diversão noturna. A meta desses locais é dar abrigo, como se casa
fosse. Na jurisprudência: STJ: “1. Infração tipificada no art. 250 do ECA, com lavratura de auto
contra a pessoa jurídica (hotel que recebeu uma adolescente desacompanhada dos pais e sem
autorização). 2. A responsabilização das pessoas jurídicas, tanto na esfera penal, como
administrativa, é perfeitamente compatível com o ordenamento jurídico vigente. 3. A redação
dada ao art. 250 do ECA demonstra ter o legislador colocado pessoa jurídica no polo passivo da
infração administrativa, ao prever como pena acessória à multa, no caso de reincidência na prática
de infração, o ‘fechamento do estabelecimento’. 4. É fundamental que os estabelecimentos
negligentes – que fazem pouco caso das leis que amparam o menor – também sejam
responsabilizados, sem prejuízo da responsabilização direta das pessoas físicas envolvidas em
cada caso, com o intuito de dar efetividade à norma de proteção integral à criança e ao adolescente.
5. Recurso especial provido” (REsp 622.707/SC, 2.ª T., rel. Eliana Calmon, DJ 02.02.2010).
TJMG: “O simples ingresso da menor no estabelecimento, desacompanhada de qualquer
responsável ou sem autorização expressa deste é, por si só, o bastante para caracterizar a infração
descrita nos arts. 82 e 250 do ECA (...)” (Apelação 1.0342.08.109535-4/001, 5.ª Câm. Cível,
Maria Elza, 02.07.2009, v.u.). TJDF: “1. Tendo havido efetiva comprovação de que o
estabelecimento hoteleiro concedeu hospedagem a adolescente desacompanhada de seus pais ou
responsáveis, sem a devida autorização destes, tendo em sua companhia homem sem nenhum laço
de parentesco, resta tipificada a conduta descrita no art. 250 do Estatuto da Criança e do
Adolescente, devendo, por isso, o hotel sofrer a imposição da respectiva pena. 2. Apelação
conhecida e desprovida” (Apelação 0000565-48.2007.807.0001, 3.ª Câm. Cível, rel. Mario Zam
Belmiro, 06.04.2009, v.u.). TJRO: “É proibido hospedar criança ou adolescente em hotel, motel
ou estabelecimento congênere, sem o acompanhamento dos pais ou responsáveis, ou sem
autorização destes, nos termos dos arts. 82 e 205 do Estatuto da Criança e do Adolescente.
Responde o motel pelos atos de seus funcionários no exercício de suas funções, restando certo
que lhe compete, por meio de seu proprietário, adotar medidas fiscalizatórias necessárias para
impedir a hospedagem de crianças ou adolescentes, sem o acompanhamento dos pais ou
responsáveis ou, ausente, autorização destes. Assim, descumpridas as normas legais, com a
constatação da presença de adolescente desacompanhado dos pais, por auto de infração válido, a
condenação na pena prevista no art. 250, parágrafo único, do ECA, no seu mínimo legal, deve ser
mantida” (Apelação 100.701.2008.000365-6, 2.ª Câm. Cível, rel. Miguel Monico Neto,
11.03.2009, v.u.). TJRR: “Apelação cível – Presença de menor em motel – Ofensa aos arts. 82 e
250 do ECA – Penas de multa e fechamento temporário – Recurso desprovido – Sentença
mantida” (0010.14.002193-1, Câm. Única, rel. Juíza Convocada Elaine Cristina Bianchi,
24.03.2015, v.u.). Considerando, para o efeito de aplicação deste artigo, como lugar de
hospedagem inadequado a casa de prostituição: TJSC: “Hospedagem de adolescente
desacompanhada dos pais e sem a autorização destes ou da autoridade judicial. Sentença
condenatória. Recurso da ré Jani. Autoria e materialidade demonstradas. Adolescente encontrada
dormindo no alojamento da casa de prostituição pelo comissário da infância e da juventude e pela
conselheira tutelar acompanhados da polícia militar. Confissão das acusadas. Absolvição
inviável. Pleito alternativo de mitigação da multa imposta. Impossibilidade. Sentença acertada e
bem fundamentada nesse particular. Recurso a que se nega provimento” (Apelação 2012.020317-
7, 4.ª Câm. Criminal, rel. Jorge Schaefer Martins, 19.09.2012, v.u.). Levando em conta a
presunção de veracidade do auto de infração: TJSE: “I – Segundo dispõem os arts. 28 e 250 do
ECA é defesa a hospedagem de adolescente em hotel sem autorização dos pais, responsável ou
autoridade judiciária. II – As afirmações constantes do auto de infração gozam de presunção de
veracidade porque firmadas por quem é detentora de fé pública. III – Apelo improvido” (Apelação
20044201370, 2.ª Câm. Cível, rel. Luiz Antônio Araújo Mendonça, 03.07.2006, v.u.).
260. Sujeito ativo: a infração é própria, somente cometida pelos responsáveis do
estabelecimento de hospedagem (pessoas físicas), quando identificada, mas também pela pessoa
jurídica, que, acima de tudo, deve orientar seus funcionários a vedar o abrigamento de menores
de 18 anos desacompanhados ou sem autorização. Conferir: TJMG: “Responde o estabelecimento
comercial pelos atos de seus funcionários no exercício de suas funções, restando certo que
compete àquele, através de seu proprietário, tomar as medidas fiscalizatórias necessárias para
impedir o ingresso ou permanência de menores em tais estabelecimentos” (Apelação
1.0342.07.091610-7/001, 4.ª Câm. Cível, rel. Célio César Paduani, 04.09.2008, v.u.). Não envolve
quem se hospeda junto com o menor: TJMG: “Aquele que se dirige a um motel acompanhado de
diversas mulheres, dentre elas algumas menores de idade, não viola o disposto no art. 250, ECA,
porquanto o ato de hospedar adolescente desacompanhado do responsável legal é direcionado ao
proprietário do estabelecimento, não a quem aluga a acomodação por tempo certo e determinado”
(Apelação 1.0431.07.033973-1/001, 1.ª Câm. Cível, rel. Alberto Vilas Boas, 16.11.2010, v.u.).
261. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos nessa
indevida hospedagem, além dos pais ou responsável, que ficam privados do convívio de seu filho,
tutelado ou pupilo, em caso de fuga.
262. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de receber o menor no
estabelecimento, permitindo o seu ingresso e estada. Não se configura o ilícito caso a omissão
seja acidental ou decorrente de força maior. Eventualmente, pode-se utilizar, também, o
argumento do erro de tipo, quando o menor apresenta documento falso. Aliás, se houver erro
escusável do funcionário, também não se pode punir o estabelecimento.
263. Multa sem valor: este artigo foi reformulado pela Lei 12.038/2009 e somente
comprova o que vimos reiterando ao longo dos comentários aos artigos deste Estatuto: a péssima
técnica legislativa. A pretexto de endurecer a sanção administrativa, neste caso, acrescendo o §
2.º, o legislador fez o desfavor de retirar qualquer valor de multa. O direito administrativo,
especialmente a sua face sancionatória, é regido pela legalidade. Não há espaço para invenção,
direito alternativo ou qualquer outra solução desejável, mas não legal. Por isso, inexiste qualquer
viabilidade para impor valor de multa criado pelo juiz. Com a devida vênia, surpreendem-nos
aqueles que defendem que, à falta do valor de multa, a solução é simples: aplica-se a
multa antes existente no art. 250 revogado pela referida Lei 12.038/2009, pois substituído por
outra redação. Dizem Lépore, Rossato e Sanches: “tal falha legislativa não pode ser óbice à
responsabilização do estabelecimento. Assim, deve ser aplicada a multa que antes era cominada”
(Estatuto da Criança e do Adolescente comentado, p. 602). No mesmo prisma: Fuller, Dezem e
Martins (Estatuto da Criança e do Adolescente, p. 242). Simples assim, sem maiores explicações,
baseado na doutrina de que é justo punir, mesmo não havendo previsão legal do quantum. Ora,
não há autorização alguma para repristinar a lei anterior, de modo a aplicar aqueles valores de
multa. Na jurisprudência: TJSP: “Pena de multa que, fixada em salário mínimo, deve ser
convertida em salário de referência. Recurso improvido, com observação” (Apelação 0024414-
82.2011.8.26.0000, Câm. Especial de Direito Privado, rel. Maria da Cunha, 21.06.2011, v.u.);
“Recurso do Ministério Público para que a multa seja fixada em salários de referência e não em
salários mínimos. Acolhimento. Expressa disposição do art. 250 da Lei 8.069/90. Recurso dos
requeridos não provido e recurso ministerial provido para fixar a penalidade em salários de
referência” (APL 35270320098260306/SP, Câm. Especial, rel. Martins Pinto, DJ 06.02.2012).
TJRS: “1. A ausência de previsão legal acerca do limite mínimo e máximo da multa cominada à
infração administrativa prevista no art. 250 do Estatuto da Criança e do Adolescente, bem como
de critérios para a dosimetria da pena, impõe a observância dos parâmetros previstos para as
demais infrações elencadas no ECA, por analogia” (AC 70057964157/ RS, 8.ª Câm. Cível, rel.
Luiz Felipe Brasil Santos, DJ 24.04.2014). Outras posições, ainda, singelamente, sem maior
explicação, afirmam que o salário de referência foi extinto e deve ser substituído pelo salário
mínimo – o único que restou: TJSC: “Pleito de fixação da multa em ‘salários de referência’.
Indexador extinto com a edição da Lei 7.789/89. Vigência tão somente do salário mínimo.
‘Quantum’ estabelecido acima do limite mínimo, sem a necessária justificativa. Redução ao limite
mínimo previsto no dispositivo, que se impõe. Recurso parcialmente provido” (Apelação
2009.006229-6, 2.ª Câm. Criminal, rel. Irineu João da Silva, 18.12.2009, v.u.). Com correção,
Jaques de Camargo Penteado afirma: “a chamada constitucionalização do direito administrativo
abrange a questão da tipicidade dos preceitos infracionais administrativos. Ora, essa tipicidade
implica preceito e sanção, aquele descrevendo a conduta administrativa proibida, e este
estipulando a pena aplicável. Essa tarefa é legislativa, constitui uma reserva legal e não pode ser
suprida pelo julgador. Seria recomendável que o legislador corrigisse essa falha que, por sua vez,
enfraquece o sistema estatutário” (Munir Cury [org.], Estatuto da Criança e do Adolescente
comentado, p. 1.184).
264. Penalidade inaplicável: em caso de reincidência, sem prejuízo da multa, pode-se
fechar o estabelecimento por 15 dias. Ora, se a sanção original, para a primeira prática infracional,
simplesmente inexiste, seria completamente incoerente determinar o fechamento do local, quando
o seu proprietário nem mesmo pagou multa alguma. Parece-nos impossível condenar alguém sem
aplicar qualquer sanção. Aliás, inexiste infração administrativa sem punição; seria uma mera
proibição, sem maiores consequências. Logo, não há reincidência para o que não existiu antes. A
lógica desse raciocínio consta também das palavras de Jaques de Camargo Penteado: “como se
construiu um sistema progressivo de repressão administrativa, na hipótese de reincidência,
aplicar-se-á o fechamento temporário, por até 15 dias. Vê-se que a ratio legis é a reiteração da
conduta proibida, a persistência na violação da regra legal, nada obstante o precedente
apenamento pecuniário. Ora, se não se pode aplicar a multa, por falta de previsão dos parâmetros
legais, não parece lógico impor-se o fechamento temporário ou definitivo, sem a observância
dessa gradação, que atende o critério da proporcionalidade” (Munir Cury [org.], Estatuto da
Criança e do Adolescente comentado, p. 1.184).
265. Penalidade inexistente: ver a nota ao parágrafo anterior.
Art. 251. Transportar266-268 criança ou adolescente, por qualquer meio, com
inobservância do disposto nos arts. 83, 84 e 85 desta Lei:269
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.270

266. Conduta ilícita: a infração é comissiva, consistente em transportar (levar algo ou


alguém de um lugar a outro), cujo objeto é a criança ou adolescente, por qualquer meio (carro,
trem, ônibus, avião etc.), sem observar as regras dos arts. 83, 84 e 85. São os seguintes preceitos:
“Art. 83. Nenhuma criança ou adolescente menor de 16 (dezesseis) anos poderá viajar para fora
da comarca onde reside desacompanhado dos pais ou dos responsáveis sem expressa autorização
judicial. § 1.º A autorização não será exigida quando: a) tratar-se de comarca contígua à da
residência da criança ou do adolescente menor de 16 (dezesseis) anos, se na mesma unidade da
Federação, ou incluída na mesma região metropolitana; b) a criança estiver acompanhada: 1) de
ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado documentalmente o parentesco;
2) de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou responsável. § 2.º A autoridade
judiciária poderá, a pedido dos pais ou responsável, conceder autorização válida por dois anos.
Art. 84. Quando se tratar de viagem ao exterior, a autorização é dispensável, se a criança ou
adolescente: I – estiver acompanhado de ambos os pais ou responsável; II – viajar na companhia
de um dos pais, autorizado expressamente pelo outro através de documento com firma
reconhecida. Art. 85. Sem prévia e expressa autorização judicial, nenhuma criança ou adolescente
nascido em território nacional poderá sair do País em companhia de estrangeiro residente ou
domiciliado no exterior”. Na jurisprudência: STJ: “Diferentemente do sistema penal, a
responsabilização nas sanções administrativas não busca reprimir o indivíduo em sua
subjetividade, mas liga-se, no Estatuto da Criança e do Adolescente, à responsabilidade social
que advém do Princípio da Proteção Integral. A infração administrativa constante no art. 251 do
ECA prescinde de certidões de nascimento ou documentos equivalentes. Com base no conteúdo
fático inscrito aos autos pelo Tribunal a quo, forçoso concluir que a permissão do ingresso de ‘R.
da S. B. e D. da S. B., sem autorização judicial, e sem documentação que comprovasse o
parentesco com as pessoas que as acompanhavam’ é suficiente para a aplicação de multa
sancionatória” (REsp 1.163.663/SC, 2.ª T., rel. Humberto Martins, 05.08.2010, v.u.); “A empresa
de ônibus que transporta criança acompanhada de ascendente sem a prova documental do
parentesco, valendo-se apenas de comprovante de vacinação – documento não elencado na norma
especial –, comete o ilícito administrativo previsto no art. 251 do ECA, porque consumada a
infração com o transporte da criança, por qualquer meio, sem observância das prescrições dos
arts. 83, 84 e 85 do ECA” (REsp 969.976/RJ, 2.ª T., rel. Castro Meira, 23.10.2007, v.u.); “1. A
viagem de criança para fora da comarca onde reside depende, em regra, de autorização judicial.
A intervenção do Judiciário somente não é exigida quando: a) o deslocamento for para comarca
contígua, desde que na mesma unidade da Federação ou na mesma região metropolitana; b) a
criança esteja acompanhada de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau, comprovado
documentalmente o parentesco, ou de pessoa maior, expressamente autorizada pelo pai, mãe ou
responsável. Inteligência do art. 83 do ECA. 2. A empresa de ônibus que transporta criança
acompanhada de ascendente sem a prova documental do parentesco – ainda que comprovado o
vínculo materno após o desembarque ou na instrução do processo –, comete o ilícito
administrativo previsto no art. 251 do ECA. 3. O fato típico aí descrito consuma-se no momento
do transporte da criança, por qualquer meio, sem observar as prescrições dos arts. 83, 84 e 85 do
ECA. É irrelevante se, em momento posterior ao transporte, se verifica que o menor de 12 anos
estava realmente acompanhado de ascendente ou colateral maior, até o terceiro grau. 4. As normas
encartadas nos arts. 83, 84, 85 e 251 da Lei 8.069/90 têm finalidade muito mais pedagógica do
que repressiva. Não encerram um fim em si mesmas. Objetivam, sobretudo, evitar o transporte
irregular de crianças e, assim, conter o tráfico, sequestro e outros crimes perpetrados em desfavor
desses menores. Daí porque, na espécie, a comprovação posterior da maternidade não elide o
descumprimento das normas protetivas. 5. O montante da multa administrativa não resultou de
reincidência – que, se comprovada, autorizaria a aplicação em dobro da sanção –, e sim da
dosagem da pena, dentro dos lindes legais, considerando outras imputações por fatos análogos à
empresa de transporte” (REsp 568.807/RJ, 2.ª T., rel. Castro Meira, 04.05.2006, v.u.); “É correta
a aplicação da multa prevista nos arts. 83 e 251 do ECA, para a empresa que efetua o transporte
de menor sem exigir, no momento do embarque, a documentação que comprove o parentesco com
a pessoa que lhe acompanha, sendo irrelevante a produção de qualquer prova posterior, com o
intuito de ilidir a infração” (REsp 786.150/RJ, 1.ª T., rel. Francisco Falcão, 21.03.2006, v.u.).
TJPA: “3. Configura infração administrativa prevista no art. 251 do ECA, com imposição de
multa, a conduta da apelante consistente em permitir a viagem de criança acompanhada de
ascendente sem a prova documental do parentesco, ainda que comprovado o vínculo materno após
o desembarque ou na instrução do processo. 4. O valor da condenação arbitrado se encontra em
observância aos parâmetros estabelecidos no art. 251 do ECA, bem como em conformidade com
os princípios da proporcionalidade e razoabilidade. 5. Recurso conhecido e improvido” (Ap.
2017.02873844-33-PA, 1ª Turma de Direito Público, rel. Roberto Goncalves de Moura,
26.06.2017, v.u.).
267. Sujeito ativo: a infração é comum, podendo ser cometida por qualquer pessoa. Como
regra, será praticada pelos encarregados de empresas de transporte e também pela pessoa jurídica
transportadora. Pode, também, ser agente o estranho que leve o menor em seu próprio carro. A
infração não é dirigida aos próprios pais ou responsável, que, se o fizerem, infringem os seus
deveres (art. 249), mas se exige dolo ou culpa.
268. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido transporte, além dos pais ou responsável, que ficam privados do convívio de seu filho,
tutelado ou pupilo, em caso de fuga.
269. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de levar o menor de um local a
outro. Não se configura o ilícito caso o transporte aconteça de forma acidental ou decorrente de
força maior (exemplo disso seria o menor se esconder num ônibus, sem que o motorista perceba).
Eventualmente, pode-se utilizar, também, o argumento do erro de tipo, quando o menor apresenta
documento falso. Aliás, se houver erro escusável do funcionário, também não se pode punir o
estabelecimento.
270. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
Art. 252. Deixar271-273 o responsável por diversão ou espetáculo público de afixar,
em lugar visível e de fácil acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada
sobre a natureza da diversão ou espetáculo e a faixa etária especificada no certificado
de classificação:274
Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso
de reincidência.275

271. Conduta ilícita: trata-se de infração omissiva, referente ao não fazer. O agente deixa
de afixar (não colocar na parede ou lugar visível alguma coisa) informação sobre a natureza da
diversão (lazer) ou espetáculo (show), bem como a faixa etária adequada (impróprio para menores
de ___ anos). Configura-se a infração se o aviso não for colocado em lugar visível, de fácil acesso,
mas também se for afixado em lugar não acessível ou desprovido de visibilidade pelo público em
geral. Dispõe o art. 74 desta Lei: “o poder público, através do órgão competente, regulará as
diversões e espetáculos públicos, informando sobre a natureza deles, as faixas etárias a que não
se recomendem, locais e horários em que sua apresentação se mostre inadequada. Parágrafo único.
Os responsáveis pelas diversões e espetáculos públicos deverão afixar, em lugar visível e de fácil
acesso, à entrada do local de exibição, informação destacada sobre a natureza do espetáculo e a
faixa etária especificada no certificado de classificação”. Na jurisprudência: STJ: “1. Cinge-se a
controvérsia à questão da responsabilização por multa decorrente de prática da infração
consistente na ausência de indicação da faixa etária permitida no local de eventos, em ofensa ao
art. 252 do ECA. 2. A norma prevista no art. 252 do ECA alcança tanto o organizador do evento
quanto o responsável pelo estabelecimento, para efeito de responsabilização pela infração
consistente na ausência de indicação da faixa etária permitida no local” (AgRg no AREsp
305.822/RJ, 2.ª T., rel. Humberto Martins, DJ 11.06.2013). TJDF: “1. Os promotores do evento,
cujo conceito também alcança o responsável pelo estabelecimento comercial, respondem
solidariamente pela inobservância às normas protetivas da criança e do adolescente. 2. A
aplicação cumulativa das penas cominadas no ECA 252 e 258 não traduz bis in idem, porquanto
diversas as hipóteses de incidência” (APC 20060130003735/DF 0000455-47.2006.8.07.0013, 4.ª
T. Cível, rel. Fernando Habibe, DJ 10.07.2013). TJRJ: “Responsabilidade do organizador do
evento, denotando negligência quanto à observância das condições mínimas de segurança
necessárias para a promoção do evento, deixando de afixar aviso na entrada do evento indicando
a classificação por faixa etária especificada no alvará expedido pelo juízo. 4. Incidência do
disposto no art. 252 do ECA, com aplicação de multa acima do mínimo legal, diante da prática
reiterada de infração administrativa” (APL 18989820098190011/RJ, 17.ª Câm. Cível, rel. Elton
Leme, DJ 08.02.2012).
272. Sujeito ativo: a infração é própria, podendo ser cometida apenas pelo responsável
pela diversão ou espetáculo público, abrangendo tanto a pessoa física como a jurídica.
273. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido espetáculo ou diversão vivenciado, em desarmonia à sua faixa de idade.
274. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de omitir o aviso, vale dizer, não
se configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou motivo de força maior. Exemplo de força
maior é o gerente mandar colocar o aviso e seu funcionário relapso deixar de fazer, não havendo
tempo para a verificação. Eventualmente, pode-se utilizar, também, o argumento do erro de
proibição, quando o responsável confunde as portarias regentes da matéria. Entretanto, é preciso
comprovar a escusabilidade do engano.
275. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
Art. 253. Anunciar276-278 peças teatrais, filmes ou quaisquer representações ou
espetáculos, sem indicar os limites de idade a que não se recomendem: 279
Pena – multa de três a vinte salários de referência,280 duplicada em caso de
reincidência, aplicável, separadamente, à casa de espetáculo e aos órgãos de
divulgação ou publicidade.281

276. Conduta ilícita: a infração é comissiva, consistente em anunciar (fazer propaganda


de algo) peças teatrais (histórias encenadas em palcos de locais apropriados), filmes (quando
passados em lugar público ou de acesso público) ou outras representações ou espetáculos (como
circo, teatro de rua, evento musical etc.) omitindo os limites recomendáveis de idade (impróprio
para menores de ___ anos). Para a sua configuração, dispensa-se o efetivo ingresso do menor em
local inadequado à sua faixa etária. Conferir: STJ: “A infração administrativa prevista no art. 253
do ECA é destinada aos responsáveis pela apresentação de quaisquer espetáculos, assim como
aos órgãos responsáveis pela divulgação e publicidade, sem a expressa indicação dos limites de
idade recomendáveis. Precedentes do STJ” (REsp 1.252.869/DF, 2.ª T., rel. Herman
Benjamin, DJ 15.08.2013). TJDF: “A intenção do legislador ao editar o art. 253 do ECA ‘...é
preservar a inviolabilidade da integridade psíquica e moral do menor, elementos constantes do
direito ao respeito, tratado no art. 17 do Estatuto’. Depois, o conteúdo subjetivo da infração
sancionada pela referida norma está in re ipsa, ou seja, ‘basta que não se indiquem os limites de
idade recomendáveis para que se configure a infração administrativa. Não é necessário que a falta
de informação faça com que crianças ou adolescentes ingressem ou pretendam ingressar no local
onde é exibido o espetáculo (...)’, não se cogitando, pois, de dolo ou culpa” (Embargos de
Declaração 0001969-03.2008.807.0001, 6.ª T. Cível, rel. José Divino de Oliveira, 20.05.2009,
v.u.). TJMG: “Eis que responsável a autuada pela organização, produção, consultoria e
infraestrutura do evento, e em não havendo tomado medidas quando da divulgação do espetáculo,
no sentido de indicar os limites de idade recomendáveis, há de ser mantida a sentença que impôs
à apelante o pagamento de multa pela infração administrativa perpetrada, ex vi do disposto no art.
253, do ECA” (Apelação Cível 1.0056.10.235478-6/001, 6.ª Câm. Cível, rel. Corrêa
Júnior, DJ 07.01.2014, v.u.).
277. Sujeito ativo: a infração é comum, podendo ser cometida por qualquer pessoa que
promova o anúncio, independentemente de ser o produtor, diretor ou responsável direto pelo
evento. Envolve, certamente, a pessoa jurídica também. Porém, é preciso cautela. Se o anunciante
for ligado à pessoa jurídica patrocinadora da peça, filme, representação, espetáculo ou similar,
devem ser sancionados tanto quem fez a propaganda (pessoa física e/ou jurídica) como a pessoa
física e/ou jurídica produtora do evento. Caso o anunciante não se ligue à pessoa jurídica
produtora do evento, deve ser punido somente aquele.
278. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido evento que assista, em desarmonia à sua faixa de idade.
279. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de anunciar algum evento, sem a
indicação da faixa etária. Não se configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou motivo de força
maior. Eventualmente, pode-se utilizar, também, o argumento do erro de proibição, quando o
responsável confunde as portarias regentes da matéria. Entretanto, é preciso comprovar a
escusabilidade do engano.
280. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
281. Aplicação separada: como mencionamos na nota supra, acerca da conduta ilícita,
a punição pode ser separada ou conjunta, dependendo do caso concreto, ou seja, de quem tem
ciência – ou não – a respeito da falta de indicador dos limites de idade.
Art. 254. Transmitir, através de rádio ou televisão, espetáculo em horário diverso
282

do autorizad283 o ou sem aviso de sua classificação:284-286


Pena – multa de vinte a cem salários de referência; 287 duplicada em caso de
reincidência a autoridade judiciária poderá determinar a suspensão da programação da
emissora por até dois dias.288

282. Conduta ilícita: a infração é comissiva, exigindo a prática


da transmissão (passagem por cabos ou ondas) de espetáculo (em sentido amplo, abrange filme,
show, peça etc.) em horário inadequado para a faixa de idade ou transmiti-lo sem o aviso da
classificação etária. Hoje, a tecnologia faz incluir nesta figura a transmissão via internet,
utilizando-se de interpretação extensiva, tendo em vista a facilidade de se assistir um simples
filme pelo computador. Não se exige qualquer resultado lesivo para crianças ou adolescentes para
configurar essa infração; basta a prática da conduta. Na jurisprudência: TJSP: “Caracterização da
infração pela simples inobservância da classificação do Ministério da Justiça. Irrelevância de
ausência de resultado lesivo. Legitimidade do Ministério Público prevista nos arts. 127 e 129 da
Constituição Federal e 201 e 210 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Não cabimento de
suspensão do processo. Objeto diverso da ação direta de inconstitucionalidade. Classificação do
Ministério da Justiça que integra norma constitucional (art. 220, § 3.º) e normas do Estatuto da
Criança e do Adolescente (arts. 76 e 254). Livre manifestação da criação, expressa e informação
que se sujeita à observância de outros direitos fundamentais assegurados à pessoa também por
normas constitucionais. Prova suficiente de transmissão de programas inadequados as crianças,
em horários destinados a esse público. Violação das disposições constantes nos arts. 71, 75, 76 e
254 do Estatuto da Criança e do Adolescente. Multa proporcional à gravidade do fato e às
condições pessoais do recorrente. Rejeição das preliminares. Não provimento do recurso”
(Apelação 124.939-0/0-00, Câm. Especial, rel. Maria Olivia Alves, 07.08.2006); “Infração
administrativa. Art. 254 do ECA. Exibição de filme em horário incompatível com a classificação
indicativa. Portaria 1.220/2007 do Ministério da Justiça que estabelece a classificação indicativa
de programas e obras audiovisuais, assim como o horário adequado para sua exibição.
Classificação que não importa em censura. Recurso improvido” (APL 298164120118260002/SP,
Câm. Especial, rel. Presidente Seção de Direito Privado, DJ 07.05.2012).
283. Sobre a expressão “em horário diverso do autorizado”: verificar o
julgamento de inconstitucionalidade proferido pelo STF: “1. A própria Constituição da República
delineou as regras de sopesamento entre os valores da liberdade de expressão dos meios de
comunicação e da proteção da criança e do adolescente. Apesar da garantia constitucional da
liberdade de expressão, livre de censura ou licença, a própria Carta de 1988 conferiu à União,
com exclusividade, no art. 21, inciso XVI, o desempenho da atividade material de ‘exercer a
classificação, para efeito indicativo, de diversões públicas e de programas de rádio e televisão’.
A Constituição Federal estabeleceu mecanismo apto a oferecer aos telespectadores das diversões
públicas e de programas de rádio e televisão as indicações, as informações e as recomendações
necessárias acerca do conteúdo veiculado. É o sistema de classificação indicativa esse ponto de
equilíbrio tênue, e ao mesmo tempo tenso, adotado pela Carta da República para compatibilizar
esses dois axiomas, velando pela integridade das crianças e dos adolescentes sem deixar de lado
a preocupação com a garantia da liberdade de expressão. 2. A classificação dos produtos
audiovisuais busca esclarecer, informar, indicar aos pais a existência de conteúdo inadequado
para as crianças e os adolescentes. O exercício da liberdade de programação pelas emissoras
impede que a exibição de determinado espetáculo dependa de ação estatal prévia. A submissão
ao Ministério da Justiça ocorre, exclusivamente, para que a União exerça sua competência
administrativa prevista no inciso XVI do art. 21 da Constituição, qual seja, classificar, para efeito
indicativo, as diversões públicas e os programas de rádio e televisão, o que não se confunde com
autorização. Entretanto, essa atividade não pode ser confundida com um ato de licença, nem
confere poder à União para determinar que a exibição da programação somente se dê nos horários
determinados pelo Ministério da Justiça, de forma a caracterizar uma imposição, e não uma
recomendação. Não há horário autorizado, mas horário recomendado. Esse caráter autorizativo,
vinculativo e compulsório conferido pela norma questionada ao sistema de classificação, data
venia, não se harmoniza com os arts. 5º, IX; 21, inciso XVI; e 220, § 3º, I, da Constituição da
República. 3. Permanece o dever das emissoras de rádio e de televisão de exibir ao público o aviso
de classificação etária, antes e no decorrer da veiculação do conteúdo, regra essa prevista no
parágrafo único do art. 76 do ECA, sendo seu descumprimento tipificado como infração
administrativa pelo art. 254, ora questionado (não sendo essa parte objeto de impugnação). Essa,
sim, é uma importante área de atuação do Estado. É importante que se faça, portanto, um apelo
aos órgãos competentes para que reforcem a necessidade de exibição destacada da informação
sobre a faixa etária especificada, no início e durante a exibição da programação, e em intervalos
de tempo não muito distantes (a cada quinze minutos, por exemplo), inclusive quanto às chamadas
da programação, de forma que as crianças e os adolescentes não sejam estimulados a assistir
programas inadequados para sua faixa etária. Deve o Estado, ainda, conferir maior publicidade
aos avisos de classificação, bem como desenvolver programas educativos acerca do sistema de
classificação indicativa, divulgando, para toda a sociedade, a importância de se fazer uma escolha
refletida acerca da programação ofertada ao público infantojuvenil. 4. Sempre será possível a
responsabilização judicial das emissoras de radiodifusão por abusos ou eventuais danos à
integridade das crianças e dos adolescentes, levando-se em conta, inclusive, a recomendação do
Ministério da Justiça quanto aos horários em que a referida programação se mostre inadequada.
Afinal, a Constituição Federal também atribuiu à lei federal a competência para ‘estabelecer
meios legais que garantam à pessoa e à família a possibilidade de se defenderem de programas
ou programações de rádio e televisão que contrariem o disposto no art. 221’ (art. 220, § 3º, II,
CF/88). 5. Ação direta julgada procedente, com a declaração de inconstitucionalidade da
expressão ‘em horário diverso do autorizado’ contida no art. 254 da Lei nº 8.069/90” (ADI 2404-
DF, 31.08.2016, m.v.).
284. Sujeito ativo: a infração é própria, podendo ser cometida apenas por pessoa que
tenha condições de realizar a transmissão, abrangendo a pessoa física responsável e a emissora.
285. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido espetáculo que assista, em desarmonia à sua faixa de idade.
286. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples. Antes, prevalecia o disposto na expressão “em horário diverso do autorizado”, hoje
julgada inconstitucional pelo STF (Adin 2.404, Pleno, rel. Dias Toffoli, 31.08.2016, m. v.),
evitando-se censura prévia. O que não quer dizer estar liberada a transmissão de qualquer
programa em qualquer horário, mas a responsabilidade é, diretamente, das emissoras. Não se
configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou motivo de força maior. Eventualmente, pode-se
utilizar, também, o argumento do erro de proibição, quando o responsável confunde as portarias
regentes da matéria. Entretanto, é preciso comprovar a escusabilidade do engano.
287. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
288. Suspensão da programação por até dois dias: em nosso entendimento, cuida-
se de penalidade inconstitucional por ferir o princípio da proporcionalidade. Enquanto a multa,
para a primeira infração, é constituída de valores de pouca monta, em caso de reincidência, se o
magistrado utilizar a possibilidade máxima de suspender a programação da emissora por dois
dias, certamente provocará milhões de prejuízo. Enfim, totalmente incompatível com a espécie
de dano provocado.
Art. 255. Exibir289-291 filme, trailer, peça, amostra ou congênere classificado pelo
órgão competente como inadequado às crianças ou adolescentes admitidos ao
espetáculo:292
Pena – multa de vinte a cem salários de referência;293 na reincidência, a autoridade
poderá determinar a suspensão do espetáculo ou o fechamento do estabelecimento por
até quinze dias.294

289. Conduta ilícita: a infração é comissiva, consistente em exibir (expor algo para que
terceiros tomem conhecimento) filme (história gravada em processo digital com a duração de
algumas horas), trailer (peça de apresentação do filme, em curta duração, para atrair interessados
para a película), peça (história redigida para ser representada por atores em teatro), amostra
(exposição artística de peças ou sequência de filmes) ou similar inadequados à faixa de idade das
crianças ou adolescentes, que foram admitidos no local. Sobre eventual erro de interpretação do
empresário, vedando a entrada de menor, acompanhado do responsável: STJ: “Os pais, no
exercício do poder familiar, têm liberdade, ressalvados os limites legais, para conduzir a educação
de seus filhos, segundo os preceitos morais, religiosos, científicos e sociais que considerem
adequados. O ECA, como a maior parte da legislação contemporânea, não se satisfaz com a
simples tarefa de indicar os meios legais para que se reparem os danos causados a este ou aquele
bem jurídico. O legislador, antes de tudo, quer prevenir a ocorrência de lesão aos direitos que
assegurou. Foi com intuito de criar especial prevenção à criança e ao adolescente que o legislador
impôs ao poder público o dever de regular as diversões e espetáculos públicos, classificando-os
por faixas etárias (art. 74, ECA). Na data dos fatos, 15.02.03, vigia a Portaria 796, de 08.09.2000,
do Ministério da Justiça, regulamentando, de forma genérica e vaga, a classificação indicativa
para filmes. Do texto dessa norma, não se extrai qualquer regra que expressamente autorizasse a
entrada de menores, em sessão de cinema imprópria para sua idade, desde que acompanhados dos
pais e/ou responsáveis. Era razoável que o empresário, ao explorar a cinematografia, vedasse a
entrada de menor em espetáculo classificado como impróprio, ainda que acompanhado de seus
pais. Havia motivos para crer que a classificação era impositiva, pois o art. 255 do ECA
estabelecia sanções administrativas severas a quem exibisse ‘filme, trailer, peça, amostra ou
congênere classificado pelo órgão competente como inadequado às crianças ou adolescentes
admitidos ao espetáculo’. A sanção poderia variar de 20 a 100 salários mínimos e, na reincidência,
poderia resultar na suspensão do espetáculo ou no fechamento do estabelecimento por até quinze
dias. Não se afigura razoável exigir que o recorrente, à época, interpretasse o art. 255 do ECA,
sopesando os princípios próprios desse microssistema jurídico, para concluir que poderia eximir-
se de sanção administrativa sempre que crianças e adolescentes estivessem em exibições
impróprias, mas acompanhados de seus pais ou responsáveis. Com isso, tem-se que eventual erro
do recorrente sobre o dever que lhe era imposto por lei é absolutamente escusável. Recurso
especial provido” (STJ, REsp 1.072.035/RJ, 3.ª T., rel. Nancy Andrighi, 28.04.2009).
290. Sujeito ativo: a infração é própria, podendo ser cometida apenas por pessoa que
tenha condições de efetuar a exibição, abrangendo a pessoa física responsável e a pessoa jurídica
produtora do evento. Tratando-se de peça ou amostra, o artista, como regra, não deve ser
sancionado, pois quem deve zelar pelo acesso de menores à sala de espetáculo é outra pessoa,
salvo se o próprio ator ou autor for também produtor e souber do que se passa quanto ao ingresso
no local.
291. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido filme, peça, trailer, amostra ou similar que assista, em desarmonia à sua faixa de idade.
292. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de exibir o filme, trailer, peça,
amostra e similar em desacordo com a faixa de idade. Não se configura o ilícito caso ocorra algum
acidente ou motivo de força maior. Eventualmente, pode-se utilizar, também, o argumento do erro
de proibição quando o responsável confunde as portarias regentes da matéria. Entretanto, é preciso
comprovar a escusabilidade do engano.
293. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
294. Suspensão do espetáculo ou fechamento do estabelecimento por até
quinze dias: em nosso entendimento, cuida-se de penalidade inconstitucional por ferir o
princípio da proporcionalidade. Enquanto a multa, para a primeira infração, é constituída de
valores de pouca monta, em caso de reincidência, se o magistrado utilizar a possibilidade máxima,
certamente provocará milhares de reais de prejuízo. Enfim, totalmente incompatível com a
espécie de dano provocado.
Art. 256. Vender ou locar 295-297
a criança ou adolescente fita de programação em
vídeo, em desacordo com a classificação atribuída pelo órgão competente:298
Pena – multa de três a vinte salários de referência;299 em caso de reincidência, a
autoridade judiciária poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até quinze
dias.300

295. Conduta punível: a infração é comissiva alternativa, consistente


em vender (entregar por um certo preço) ou locar (emprestar por certo período mediante
remuneração) fita de programação em vídeo (hoje, merece ampliação para gravações feitas em
DVD, CD e até mesmo transmitidas on-line, via internet). Lembremos que essa ampliação não
equivale a analogia, mas a uma interpretação extensiva. Aliás, exatamente como se faz em
processo penal, no tocante a documento, que não mais se cuida de papel, mas também de outras
bases materiais, como DVD, CD, disco rígido etc. Sob outro aspecto, a analogia somente é
vedada, claramente, em Direito Penal, que respeita a legalidade estrita. Ainda que fosse analogia,
somente para argumentar, não seria proibido o seu emprego em matéria administrativa. A conduta
é alternativa, de modo que o cometimento das duas, sucessivamente, gera uma só multa, desde
que no mesmo contexto. Essa penalidade pecuniária pode, no entanto, ter maior valor. Por outro
lado, é evidente que, ao cuidar de fita de programação, refere-se a lei ao conteúdo, que pode ser
filme, desenho, espetáculo ou similar. O ponto fulcral é o desatendimento da classificação etária.
296. Sujeito ativo: a infração é comum, pois qualquer pessoa pode vender uma fita, DVD
ou similar a uma criança ou adolescente, sabendo ser inadequado à sua faixa etária. A locação
pode ser mais específica, condizente com o comércio. De todo modo, não há sujeito especial para
essa infração. É certo que o art. 77 desta Lei estabelece que “os proprietários, diretores, gerentes
e funcionários de empresas que explorem a venda ou aluguel de fitas de programação em vídeo
cuidarão para que não haja venda ou locação em desacordo com a classificação atribuída pelo
órgão competente”. São os principais autores dessa espécie de infração, mas não os únicos, pois
a norma não fez ligação expressa a essa atividade.
297. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face do
indevido filme ou peça similar que assista, em desarmonia à sua faixa de idade.
298. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de vender ou locar o material
contendo filme, trailer e similar em desacordo com a faixa de idade. Não se configura o ilícito
caso ocorra algum acidente ou motivo de força maior. Eventualmente, pode-se utilizar, também,
o argumento do erro de proibição, quando o responsável confunde as portarias regentes da
matéria. Entretanto, é preciso comprovar a escusabilidade do engano.
299. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
300. Fechamento do estabelecimento por até quinze dias: em nosso
entendimento, cuida-se de penalidade inconstitucional por ferir o princípio da proporcionalidade.
Enquanto a multa, para a primeira infração, é constituída de valores de pouca monta, em caso de
reincidência, se o magistrado utilizar a possibilidade máxima, certamente provocará milhares de
reais de prejuízo. Enfim, totalmente incompatível com a espécie de dano provocado.
Art. 257. Descumprir301-303 obrigação constante dos arts. 78 e 79 desta Lei:304
Pena – multa de três a vinte salários de referência,305 duplicando-se a pena em caso
de reincidência, sem prejuízo de apreensão da revista ou publicação.306

301. Conduta punível: a infração é omissiva, consistente em descumprir (não obedecer


a regra; não seguir exigência) obrigação constante dos arts. 78 e 79 desta Lei. Dispõem os
referidos artigos: “Art. 78. As revistas e publicações contendo material impróprio ou inadequado
a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas em embalagem lacrada, com a advertência
de seu conteúdo. Parágrafo único. As editoras cuidarão para que as capas que contenham
mensagens pornográficas ou obscenas sejam protegidas com embalagem opaca. Art. 79. As
revistas e publicações destinadas ao público infantojuvenil não poderão conter ilustrações,
fotografias, legendas, crônicas ou anúncios de bebidas alcoólicas, tabaco, armas e munições, e
deverão respeitar os valores éticos e sociais da pessoa e da família”. Na jurisprudência: TJRJ:
“Exposição à venda de revista com conteúdo pornográfico ou obsceno, sem embalagem opaca.
Desobediência à norma contida no parágrafo único do art. 78 do ECA caracterizada. Restrição
legal que tem por escopo prevenir a ocorrência de ameaça ou violação dos direitos da criança e
do adolescente, garantindo-lhe o acesso somente às revistas que respeitem sua condição peculiar
de pessoa em desenvolvimento. Imposição de multa por infringência ao disposto no art. 257 do
ECA. Cabimento. Sanção pecuniária fixada em três salários mínimos que não merece reforma”
(APL 02465606220108190001/RJ, 7.ª Câm. Cível, rel. Luciano Saboia Rinaldi de
Carvalho, DJ 03.12.2013). TJSC: “Representação deduzida por conselho tutelar. Infração
administrativa prevista no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA). Veiculação, em outdoor,
de anúncio de revista masculina protagonizado por modelo despida e em pose sensual.
Aplicabilidade do disposto nos arts. 78 e 257 do ECA. Proteção dos infantes em razão da condição
especial de pessoas em processo de formação da personalidade e do caráter. Responsabilidade da
empresa mantenedora dos engenhos publicitários caracterizada. Sentença mantida. Recurso
desprovido. Em razão da tutela constitucional assegurada à criança e ao adolescente, pessoas em
pleno processo de formação de sua personalidade e caráter, o Estatuto que lhes é próprio (ECA –
Lei 8.069/90), em seu art. 257, traz previsão expressa de aplicação de multa no caso de
descumprimento do disposto no art. 78, ao estatuir que ‘as revistas e publicações contendo
material impróprio ou inadequado a crianças e adolescentes deverão ser comercializadas em
embalagem lacrada, com a advertência de seu conteúdo’. No caso vertente, não restam dúvidas
de que a representada, empresa responsável pela veiculação, em outdoor, de anúncio de revista
masculina que estampa modelo despida em pose sensual, praticou a conduta ilícita descrita na
representação, não se divisando causa eximente de sua responsabilidade, ademais do que não
restou demonstrado que a publicidade invectivada contasse com autorização do Conselho
Nacional de Autorregulamentação Publicitária – Conar” (Apelação/Estatuto da Criança e do
Adolescente 2008.020993-2, 2.ª Câm. de Dir. Público, rel. João Henrique Blasi, DJ 06.09.2011).
302. Sujeito ativo: a infração é própria, pois as obrigações apontadas nos arts. 78 e 79
ligam-se apenas a quem comercializa revistas e publicações com material impróprio ou
inadequado a menores de 18 anos.
303. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em face da
leitura indevida à sua faixa de idade.
304. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de comercializar publicações em
desacordo com as precauções legais. Não se configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou
motivo de força maior.
305. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
306. Apreensão da revista ou publicação: cuida-se de providência razoável para a
conduta praticada, que não representa um prejuízo desproporcional, a ponto de provocar a quebra
da empresa.
Art. 258. Deixar 307-309
o responsável pelo estabelecimento ou o empresário de
observar o que dispõe esta Lei sobre o acesso de criança ou adolescente aos locais de
diversão, ou sobre sua participação no espetáculo:310
Pena – multa de três a vinte salários de referência;311 em caso de reincidência, a
autoridade judiciária poderá determinar o fechamento do estabelecimento por até quinze
dias.312

307. Conduta punível: trata-se de infração omissiva, consistente em deixar de


observar (não seguir regra ou imposição) o disposto nesta Lei (seria mais fácil se tivessem sido
indicados os artigos deste Estatuto, como foi feito no art. 257) no tocante ao acesso de menores
de 18 anos a lugares de diversão pública ou em relação à sua participação em espetáculo (teatro,
circo etc.). Esses locais de diversão, atualmente, abrangem as denominadas lan houses (lugares
que disponibilizam acesso à internet). Conferir: TJDF: “Tem legitimidade para responder à
infração prevista no art. 258 da Lei 8.069/90 quem permite o ingresso de menores
desacompanhados dos responsáveis legais em estabelecimento com acesso à rede mundial de
computadores, inclusive com acesso a site pornográfico” (Apelação 315.489, 6.ª T. Cível, rel.
José Divino de Oliveira, DJ 23.07.2008, v.u.). Vejam-se os seguintes artigos: “Art. 75. Toda
criança ou adolescente terá acesso às diversões e espetáculos públicos classificados como
adequados à sua faixa etária. Parágrafo único. As crianças menores de dez anos somente poderão
ingressar e permanecer nos locais de apresentação ou exibição quando acompanhadas dos pais
ou responsável. (...) Art. 80. Os responsáveis por estabelecimentos que explorem comercialmente
bilhar, sinuca ou congênere ou por casas de jogos, assim entendidas as que realizem apostas, ainda
que eventualmente, cuidarão para que não seja permitida a entrada e a permanência de crianças
e adolescentes no local, afixando aviso para orientação do público” (grifamos). E também: “Art.
149. Compete à autoridade judiciária disciplinar, através de portaria, ou autorizar, mediante
alvará: I – a entrada e permanência de criança ou adolescente, desacompanhado dos pais ou
responsável, em: a) estádio, ginásio e campo desportivo; b) bailes ou promoções dançantes; c)
boate ou congêneres; d) casa que explore comercialmente diversões eletrônicas; e) estúdios
cinematográficos, de teatro, rádio e televisão. II – a participação de criança e adolescente em: a)
espetáculos públicos e seus ensaios; b) certames de beleza”. Se essas regras não forem seguidas,
configura-se a infração. Note-se haver lugares proibidos a crianças e jovens; locais em que os
menores podem ir com seus pais ou responsável; estabelecimentos que podem frequentar desde
que haja alvará judicial; participação em certames com autorização do juiz. Na jurisprudência,
observando um erro às avessas, ou seja, o empresário vedou a entrada, quando podia permitir:
STJ: “4. O ECA, como a maior parte da legislação contemporânea, não se satisfaz com a simples
tarefa de indicar os meios legais para que se reparem os danos causados a este ou aquele bem
jurídico. O legislador, antes de tudo, quer prevenir a ocorrência de lesão aos direitos que
assegurou. Foi com intuito de criar especial prevenção à criança e ao adolescente que o legislador
impôs ao poder público o dever de regular as diversões e espetáculos públicos, classificando-os
por faixas etárias (art. 74, ECA). 5. Na data dos fatos, 02.02.2006, vigia a Portaria 796, de
08.09.2000, do Ministério da Justiça, regulamentando, de forma genérica e vaga, a classificação
indicativa para espetáculos teatrais. Do texto dessa norma, não se extrai qualquer regra que
expressamente autorizasse a entrada de menores, em espetáculos teatrais impróprios para sua
idade, desde que acompanhados dos pais e/ou responsáveis. 6. Era razoável que o empresário
vedasse a entrada de menor em espetáculo classificado como impróprio, ainda que acompanhado
de seus pais. Havia motivos para crer que a classificação era impositiva, pois o art. 258 do ECA
estabelecia sanções administrativas severas ao responsável por estabelecimento ou o empresário
que deixasse de observar as disposições desse mesmo diploma legal ‘sobre o acesso de criança
ou adolescente aos locais de diversão, ou sobre sua participação no espetáculo’. A sanção poderia
variar de 3 a 20 salários mínimos e, na reincidência, poderia resultar no fechamento do
estabelecimento por até quinze dias. 7. Não se afigura razoável exigir que o recorrente, à época,
interpretasse o art. 258 do ECA, sopesando os princípios próprios desse microssistema jurídico,
para concluir que poderia eximir-se de sanção administrativa sempre que crianças e adolescentes
estivessem em exibições impróprias, mas acompanhados de seus pais ou responsáveis. Com isso,
eventual erro do recorrente sobre o dever que lhe era imposto por lei é absolutamente escusável.
8. Recurso especial provido” (STJ, REsp 1.209.792/RJ, 3.ª T., rel. Nancy Andrighi, 08.11.2011).
Outras decisões: STJ: “1. Cuida-se de auto de infração lavrado contra o Clube R. B., por
infringência ao art. 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente, por ter sido permitida a entrada
e permanência de adolescentes em evento dançante, sem a apresentação de alvará judicial. O
recorrente alega sua ilegitimidade, uma vez que apenas é proprietário do imóvel onde foi realizado
o evento. 2. O art. 258 do ECA dispõe que a responsabilidade por decorrência de infração
administrativa se faz ao responsável pelo estabelecimento ou ao empresário que deixa de observar
disposição legal acerca da entrada e permanência de infantes e adolescentes em eventos. Portanto,
não cabe a tese pelo agravante apresentada em razão da clareza do dispositivo, não havendo que
se alegar irresponsabilidade do proprietário, já que no próprio Estatuto vige a responsabilidade
solidária. 3. Conforme consignado pelo Ministério Público, repousa sobre o art. 258 do ECA uma
regra de solidariedade, de modo que não pode o proprietário do imóvel locado (‘responsável pelo
estabelecimento’) eximir-se dos deveres que lhe são impostos por lei, sob a alegação de ter a
organização do evento recaído unicamente sobre a figura do locatário (‘empresário’). 4. Agravo
regimental não provido” (AgRg no REsp 1.384.707/RJ, 2.ª T., rel. Mauro Campbell
Marques, DJ 26.11.2013). TJMT: “Constatado o fornecimento de bebida alcoólica a adolescente
em evento promocional, e restando configurada a responsabilização mediante assinatura em Auto
de Infração, o qual não foi a tempo algum impugnado, impõe-se a aplicação de multa, nos termos
do artigo 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente, observando-se os princípios da
razoabilidade e proporcionalidade. A falta de assinatura de um dos Conselheiros Tutelares não
acarreta a nulidade do Relatório apresentado ao Ministério Público que efetuou a representação,
eis que o documento assinado pelos demais Conselheiros possui fé pública. Recurso provido
parcialmente” (Ap. 142267/2016-MT, 1ª Câmara de Direito Privado, rel. Sebastião Barbosa
Farias, 28.03.2017, v.u.). TJPR: “Ainda que o menor/adolescente esteja no estabelecimento que
explora jogo de bilhar para fins diversos do jogo em si ou de consumir bebidas alcoólicas, tal
circunstância não detém o condão de ilidir normas do Estatuto da Criança e do Adolescente, a que
todos, sem exceção, têm o dever jurídico de observar e respeitar, sob pena de sanções previstas
no mesmo diploma, sendo suficiente que o responsável por tal estabelecimento comercial permita
o ingresso e a permanência de menores no local, posto que a norma possui caráter preventivo e
visa inibir prática de atividades nocivas ou que possam comprometer a integridade moral e/ou
psicológica dos mesmos” (AC 7214073/PR, 12.ª Câm. Cível, rel. Rafael Augusto
Cassetari, DJ 02.02.2011). TJSP: “Infração administrativa capitulada no art. 258 do ECA.
Sentença de procedência. Ingresso e permanência de adolescentes em evento ‘open bar’ realizado
sem alvará judicial. Configuração da infração contida no art. 258 do ECA. Autoria comprovada.
Multa fixada adequada e proporcional à infração. Retificação da base de cálculo da multa para
salário de referência, atualizado monetariamente. Recurso parcialmente provido” (Apel.
0000735-44.2013.8.26.0627, Corte Especial, rel. Marcelo Gordo, DJ 31.03.2014). TJRN: “1. A
entrada e permanência de menores em bailes ou promoções dançantes, sem a companhia dos pais
ou responsáveis, ou sem a necessária autorização judiciária concedida ao estabelecimento, são
vedadas pelo Estatuto da Criança e do Adolescente, impondo-se aos responsáveis pelo evento o
pagamento da multa prevista no art. 258. 2. Recurso conhecido e desprovido” (Apelação
2013.017267-9, 1.ª Câm. Cível, rel. Amaury Moura Sobrinho, DJ 27.03.2014, v.u.). TJAP: “1) A
presença de menores, sem exigência de apresentação de documento comprobatório da idade,
desacompanhados dos pais ou responsáveis legais na boate/danceteria desprovida de alvará e
ainda ingerindo bebida alcoólica, constitui violação administrativa às normas de proteção da
criança e do adolescente e são elementos suficientes para configurar a responsabilidade objetiva
do agente que promoveu a festa, não havendo que se falar em dolo ou culpa. 2) Há presunção de
veracidade e legalidade no Auto de Infração lavrado pelo Comissariado da Infância e Juventude
em ato de fiscalização, cujo conteúdo deve prevalecer na ausência de prova em contrário,
especialmente porque o apelante deixou de apresentar defesa no prazo legal, devendo suportar os
efeitos da revelia. 3) A multa pecuniária pelo descumprimento da norma prevista nos arts. 258 e
252 do ECA deve ser mantida sem nenhum redutor quando se verifica que foi fixada em
conformidade com os critérios da razoabilidade e proporcionalidade, atendendo à finalidade
pedagógica. 4) Apelo desprovido. Sentença mantida” (Ap. 0051472-23.2016.8.03.0001-AP,
Câmara Única, rel. Sueli Pereira Pini, 15.08.2017, v.u.). TJMG: “1 – Comprovada a entrada e
permanência de menores de dezesseis anos em evento organizado pelo recorrente, em
desatendimento ao previsto nos art. 149 do Estatuto da Criança e do Adolescente, resta
configurada a infração administrativa prevista no art. 258 do mesmo texto normativo, a autorizar
a aplicação de penalidade pecuniária. 2 – O responsável pelo evento deve se resguardar, tomando
as medidas necessárias para evitar a entrada de menores de dezesseis anos no estabelecimento
desacompanhados dos pais, sob pena de pagamento de multa por infração. 3 – Fixada a multa em
valor permitido pela lei, deve ela ser confirmada, uma vez que condizente com as circunstâncias
de fato evidenciadas na espécie, e com o postulado da proporcionalidade” (Ap. Cív.
1.0352.14.003622-4/001 – MG, 6.ª Câm. Cível, rel. Sandra Fonseca, 07.06.2016); “A multa pela
prática de infrações administrativas previstas no Estatuto da Criança e do Adolescente tem
natureza administrativa e não penal. Portanto, não se lhes aplica o prazo prescricional de 2 anos
previsto no Código Penal, mas sim o prazo de 5 anos relativo ao direito administrativo. Deve ser
julgado procedente o pedido formulado contra proprietário de estabelecimento comercial que
explora comercialmente sem alvará bar com som mecânico e venda de bebidas, em que há a
presença de adolescentes desacompanhados de seus pais, na forma prevista nos arts. 149 e 258,
ECA. A ausência do alvará torna proibida a mera entrada da criança e do adolescente no local
onde se realiza evento dançante, ainda que não tenha se comprovado o consumo de bebida
alcoólica” (Ap. Cív. 1.0080.15.001780-6/001 – MG, 1.ª Câm. Cível, rel. Alberto Vilas Boas,
26.04.2016). TJPA: “1 – Para configuração da infração prevista no art. 258 da Lei 8.069/1990,
basta que o menor entre e permaneça em local não apropriado, prescindindo, para a condenação,
da ocorrência de culpa ou dolo; 2 – Os depoimentos colhidos em audiência foram no sentido de
que o menor em questão se encontrava no estabelecimento comercial, ora apelante,
desacompanhado de pais ou responsável legal, corroborando com a autuação administrativa; 3 –
Mantida a multa de três salários mínimos, por ser o patamar mínimo previsto no artigo 258 do
ECA. 4 – Recurso conhecido e desprovido” (Ap. 2017.01663602-49-PA, 1ª Turma de Direito
Público, rel. Celia Regina de Lima Pinheiro, 24.04.2017, v.u.); “1. Proprietário de
estabelecimento comercial ‘B. lanches e conveniência’ que permitiu a entrada de menor sem
verificação da idade e autorização dos pais ou genitores. Aplicação de multa, a qual, contudo, será
reduzida, devendo ser fixada em seu grau mínimo. 2. O auto de infração emitido por comissários
de menor tem fé pública e, portanto, goza de presunção de validade e legalidade juris tantum, só
podendo ser desconstituída mediante prova robusta e inequívoca em contrário do que nele consta.
3. Existe dever genérico de vigilância e fiscalização na formação da criança e adolescente,
gerando a responsabilidade do comerciante de impedir a entrada no interior do seu
estabelecimento de criança ou adolescente desacompanhada de seus pais ou responsáveis legais
depois das 22 horas. 4. Ausência de constrangimento ilegal. Recurso conhecido e improvido”
(Ap. 2016.02175654-34 – PA, 3.ª Câm. Cível Isolada, rel. Nadja Nara Cobra Meda, 02.06.2016,
v.u.).
308. Sujeito ativo: a infração é própria, pois o artigo aponta o responsável pelo
estabelecimento (gerente, chefe ou similar) ou o empresário (proprietário do lugar). As normas
contendo essas infrações administrativas não primam pela clareza. Portanto, deve-se captar o seu
sentido, motivo pelo qual é viável punir também a pessoa jurídica, como se faz noutros casos.
Conferir: STJ: “1. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou pela possibilidade de a pessoa
jurídica responder pela infração administrativa prevista no art. 258 do Estatuto da Criança e do
Adolescente (Lei 8.069/90), de modo que se reconhece tanto a legitimidade passiva do empresário
ou do responsável pelo estabelecimento onde foi constatada a transgressão, quanto a da respectiva
pessoa jurídica. Precedentes: REsp 937.748/SC, 1.ª T., rel. Min. Francisco Falcão, DJ 02.08.2007,
p. 434; REsp 679.912/SC, rel. min. Luiz Fux, 1.ª T., DJ 28.09.2006, p. 198). 2. A ratio da norma
do art. 258 do ECA, em harmonia com a doutrina da proteção integral (art. 1.º), que inspira esse
importantíssimo diploma especializado, é a da mais ampla tutela aos interesses da infância e da
adolescência, inclusive no que respeita ao seu acesso às diversões públicas, por isso se revelando
legítima, em tese, a autuação do estabelecimento ora recorrido, em cujo ambiente menores de
dezoito anos, jogando sinuca, foram surpreendidos pelo Comissariado da Infância e da Juventude
de Joinville/SC. 3. Consoante o magistério de Guilherme de Souza Nucci, na hipótese da infração
prevista no art. 258 do ECA, ‘é viável punir também a pessoa jurídica’” (Estatuto da Criança e
do Adolescente comentado. Rio de Janeiro: Forense, 2014, p. 766-767). 4. Compreensão do
Tribunal de origem que diverge da orientação do STJ e de outras Cortes pátrias, com a
consequente configuração do dissídio jurisprudencial alegado pela parte recorrente. 5. Recurso
especial do Ministério Público de Santa Catarina provido” (REsp 601141/SC, 1.ª T., rel. Sérgio
Kukina, 19.05.2016, v.u.); “1. O Superior Tribunal de Justiça já se manifestou pela possibilidade
de a pessoa jurídica responder pela infração administrativa prevista no art. 258 do Estatuto da
Criança e do Adolescente (Lei 8.069/1990), de modo que se reconhece tanto a legitimidade
passiva do empresário ou do responsável pelo estabelecimento onde foi constatada a
transgressão, quanto a da respectiva pessoa jurídica. 2. Tratando-se de hipótese em que o
representado, responsável pelo camarote empresarial, permitiu o acesso e a permanência de
adolescentes em evento festivo, tendo deixado de fiscalizar o ingresso e permanência de menores
de 18 anos no espaço, bem como o fornecimento de bebidas alcoólicas, está caracterizada a
infração administrativa prevista no artigo 258 do Estatuto da Criança e do Adolescente. 3.
A ratio da norma do art. 258 do ECA, em harmonia com a doutrina da proteção integral (art. 1.º),
que inspira esse importantíssimo diploma especializado, é a da mais ampla tutela aos interesses
da infância e da adolescência, inclusive no que respeita ao seu acesso às diversões públicas, por
isso se revelando legítima, em tese, a autuação do estabelecimento ora recorrido, em cujo
ambiente menores de dezoito anos, jogando sinuca, foram surpreendidos pelo Comissariado da
Infância e da Juventude de Joinville-SC. 4. Rever o entendimento do Tribunal a quo demanda,
necessariamente, o revolvimento do acervo fático-probatório dos autos, procedimento esse
vedado em sede de Recurso Especial, conforme óbice previsto no enunciado n. 7 da Súmula do
STJ” (REsp 1.727.270/MG, 2ª Turma, rel. Herman Benjamin, 24.04.2018, v.u.). TJSP:
“Representação. Infração administrativa. Auto de infração. Ausência de alvará. Prescindibilidade
de dolo ou culpa. Súmula 87 do TJSP. Pretensa festa de aniversário não comprovada. Ingresso no
evento mediante pagamento. Divulgação na internet. Presença de bebidas alcóolicas. Violação às
normas contidas no art. 149, I, ‘b’, do Estatuto da Criança e do Adolescente. Infração prevista no
art. 258 da Lei nº 8.069/90 configurada. Responsabilidade solidária entre locador do espaço e
organizador do evento. Fixação da multa que deve ser efetuada com base em salários de
referência, não em salários mínimos. Recursos parcialmente providos apenas para o fim de alterar
o valor da multa para 03 (três) salários de referência, em prestígio aos princípios da razoabilidade
e proporcionalidade” (Apelação Cível 1000612-53.2019.8.26.0648, Câmara Especial, rel.
Daniela Maria Cilento Morsello, 30.04.2020, v.u.).
309. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em
frequentar lugar inadequado à sua idade.
310. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de se omitir, permitindo o acesso
indevido. Não se configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou motivo de força maior.
311. Multa em salário de referência: ver a nota 240 ao art. 246.
312. Fechamento do estabelecimento por até quinze dias: em nosso
entendimento, cuida-se de penalidade inconstitucional por ferir o princípio da proporcionalidade.
Enquanto a multa, para a primeira infração, é constituída de valores de pouca monta, em caso de
reincidência, se o magistrado utilizar a possibilidade máxima, certamente provocará milhares de
reais de prejuízo. Enfim, totalmente incompatível com a espécie de dano provocado.
Art. 258-A. Deixar313-315 a autoridade competente de providenciar a instalação e
operacionalização dos cadastros previstos no art. 50 e no § 11 do art. 101 desta Lei: 316
Pena – multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais).317
Parágrafo único. Incorre nas mesmas penas318 a autoridade que deixa de efetuar o
cadastramento de crianças e de adolescentes em condições de serem adotadas, de
pessoas ou casais habilitados à adoção e de crianças e adolescentes em regime de
acolhimento institucional ou familiar.

313. Conduta ilícita: a infração é omissiva, consistente em deixar de providenciar (não


tomar atitude para implementar algo) no tocante à instalação (criação) e operacionalização
(funcionamento) dos cadastros de adoção (cadastro de crianças e adolescentes disponíveis;
cadastro de candidatos à adoção) e de institucionalização de menores. Confiram-se os seguintes
artigos: “Art. 50. A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um registro
de crianças e adolescentes em condições de serem adotados e outro de pessoas interessadas na
adoção”; Art. 101, § 11. “A autoridade judiciária manterá, em cada comarca ou foro regional, um
cadastro contendo informações atualizadas sobre as crianças e adolescentes em regime de
acolhimento familiar e institucional sob sua responsabilidade, com informações pormenorizadas
sobre a situação jurídica de cada um, bem como as providências tomadas para sua reintegração
familiar ou colocação em família substituta, em qualquer das modalidades previstas no art. 28
desta Lei”. A autoridade responsável por tais cadastros é o juiz da Vara da Infância e Juventude.
314. Sujeito ativo: a infração é própria, pois o artigo aponta a autoridade competente, que
é o juiz, conforme se vê nos arts. 50 e 101. Portanto, essa infração deve ser julgada pelo Tribunal
de Justiça, foro competente para processar e julgar magistrados por crimes comuns e infrações
funcionais. No caso presente, não adianta o juiz buscar fugir à sua responsabilidade de manter
todos os cadastros criados e funcionando adequadamente, transmitindo o dever a terceiros
(funcionários do cartório, por exemplo), pois a lei é clara ao indicar a sua obrigação.
315. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes; em segundo plano, é a criança ou adolescente que pode sofrer prejuízos em deixar
de ser adotado, por falha nos cadastros, ou permanecer institucionalizado por período excessivo.
316. Elemento subjetivo: basta a voluntariedade, significando a ação ou omissão
exercida livremente, sem a influência de coação física ou moral. Entretanto, a prova da infração
não é simples, pois há que se demonstrar, ao menos, a vontade de se omitir na criação e
operacionalização dos cadastros. Não se configura o ilícito caso ocorra algum acidente ou motivo
de força maior, como, por exemplo, a inexistência de material adequado, fornecido pelo Tribunal
(computador, software, funcionário etc.).
317. Multa: diversamente do disposto nos outros artigos, foge-se à regra do salário de
referência ou do salário mínimo, o que é incompreensível, pois valores em moeda acabam
defasados com o tempo – e não há fórmula de atualização monetária nesta Lei.
318. Infração correlata: na realidade, valendo-se de puro bom senso, este parágrafo seria
desnecessário; porém, o bom senso nem sempre está presente nas interpretações. O caput deste
artigo determina que a autoridade judiciária deve manter todos os cadastros criados e
funcionando. Ora, operacionalizar um cadastro, mais do que nunca, significa alimentá-lo, do
contrário, é inútil. Entretanto, evitando qualquer dúvida, deixa-se bem claro que também é
responsabilidade direta e pessoal do juiz providenciar a inserção de dados nesses cadastros. Está
faltando a infração administrativa, para dizer o mínimo, relativa ao andamento célere dos
procedimentos das Varas da Infância e Juventude. De nada adiante ter cadastro, alimentá-lo, se
não há movimentação efetiva, providenciada pelo magistrado. Portanto, é preciso, ilustrando, um
cadastro de crianças aptas à adoção, outro, formado de pessoas aptas a adotar, mas, acima de tudo,
a concretização do liame entre criança ou jovem e adotante.
Art. 258-B. Deixar319-321 o médico, enfermeiro ou dirigente de estabelecimento de
atenção à saúde de gestante de efetuar imediato encaminhamento à autoridade
judiciária de caso de que tenha conhecimento de mãe ou gestante interessada em
entregar seu filho para adoção:
Pena – multa de R$ 1.000,00 (mil reais) a R$ 3.000,00 (três mil reais).322
Parágrafo único. Incorre na mesma pena323 o funcionário de programa oficial ou
comunitário destinado à garantia do direito à convivência familiar que deixa de efetuar
a comunicação referida no caput deste artigo.

319. Conduta ilícita: a infração é omissiva, consistente em deixar de encaminhar (não


conduzir algo ou alguém a algum lugar) o caso de seu conhecimento, ao juiz, relativo a gestante
ou mãe que deseje entregar seu filho para adoção. Essa infração foi introduzida pela Lei
12.010/2009, que vedou a adoção dirigida (entrega do filho pelos pais diretamente a uma pessoa
de sua confiança, para adoção), pretendendo que o Estado interfira nessa situação com duas
finalidades: a) evitar a qualquer custo a adoção, convencendo a mãe a permanecer com o filho,
mesmo que ela não queira; essa é a política instituída pela referida Lei; b) se não conseguir evitar
a entrega do filho, quer-se manter o critério obtuso da fila da adoção, ou seja, consumar o direito
do adotante de ter um filho – e não o contrário, que é o correto. Por esses motivos, quer-se que o
médico, enfermeiro ou dirigente de hospital, clínica, posto de saúde ou similar denuncie essa mãe
ao juízo, evitando-se que ela possa entregar a criança a quem ela deseja. Uma típica delação legal.
320. Sujeito ativo: a infração é própria, pois o artigo aponta, claramente, o médico, o
enfermeiro ou o dirigente de estabelecimento de atenção à saúde de gestante.
321. Sujeito passivo: cuidando-se de infrações administrativas, a primeira afetada é a
Administração Pública, cujos interesses, nesse caso, são o bem-estar e a segurança de crianças e
adolescentes. Não vislumbramos, nesse caso, a criança ou o adolescente como vítima, pois se
quer garantir a política estatal de convívio familiar ou adoção segundo a fila. Isso não garante o
bem-estar infantojuvenil.
322. Multa: diversamente do disposto nos outros artigos, foge-se à regra do salário de
referência ou do salário mínimo, o que é incompreensível, pois valores em moeda acabam
defasados com o tempo – e não há fórmula de atualização monetária nesta Lei.
323. Infração correlata: responde também pela infração o funcionário de programa
oficial ou comunitário, cuja função é garantir o direito à convivência familiar, vale dizer, o
encarregado de insistir nos lanços de sangue. Logo, se ele notar o desejo da mãe em não
permanecer com seu filho – contrariando a política instituída pela Lei 12.010/2009 –, deve
dedurá-la ao juiz. No mínimo, parte-se para o outro lado da moeda: entregar uma criança ao
primeiro da fila do cadastro.
Art. 258-C. Descumprir324-325 a proibição estabelecida no inciso II do art. 81:
Pena – multa de R$ 3.000,00 (três mil reais) a R$ 10.000,00 (dez mil reais);326
Medida Administrativa – interdição do estabelecimento comercial até o recolhimento
da multa aplicada.327

324. Conduta ilícita: além da expressa configuração de crime (art. 243 desta lei), cuida-
se esta infração administrativa de vender bebida alcoólica a criança ou adolescente (art. 81, II,
desta lei). Portanto, este artigo é completado pelo próprio Estatuto, não significando norma penal
em branco. A infração é insuficiente, pois deveria ter seguido os mesmos critérios do art. 243:
“vender, fornecer, servir, ministrar ou entregar”. Vê-se uma contradição: pode ser crime servir
bebida alcoólica a uma criança ou jovem, mas não uma infração administrativa. O mais (crime)
tem mais condutas puníveis do que o menos (infração administrativa).
325. Sujeitos ativo e passivo: o sujeito ativo pode ser qualquer pessoa;
afinal, vender bebida alcoólica não é monopólio de comerciantes. Sabe-se, no entanto, que a
maior parte situa-se dentre os que comercializam tal substância. O sujeito passivo é a
Administração Pública, que almeja impedir a venda desse tipo de bebida aos menores de 18 anos.
Estes configuram o sujeito passivo secundário.
326. Multa: diversamente do disposto nos outros artigos, foge-se à regra do salário de
referência ou do salário mínimo, o que é incompreensível, pois valores em moeda acabam
defasados com o tempo – e não há fórmula de atualização monetária nesta Lei.
327. Medida inconstitucional: não se pode condicionar o pagamento da multa a
qualquer situação mais gravosa, pois se está ferindo, de pronto, o princípio da proporcionalidade,
resvalando na razoabilidade. Se o estabelecimento deve ser interditado, assim se fará. Porém, não
há cabimento algum em condicionar o pagamento da multa a uma penalidade mais gravosa. Não
há essa medida em Direito Penal, tampouco em outras áreas.

You might also like