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MIS — Estudos Sobre Filosofia, Direito eRacismo Ext taba lcaloa sexperénia acon ‘mi Decmo-am mundoda va foipro- [Rado negativementse consequent cr frinaizado, a derptio dos proses de acit= mento, sbsorgio ¢ resigmifieago deste ‘mean iano da vide". Noss trea esse ‘Stoo wer ode stabsloce ma coda om ts polices di alenade oda airmasio th iteene tats da deride racial como instrumentoemanicateo 7 tradigo ocidenal accuse com 3 sfiemagio de que reforma protstars IrioesrevelogSo tances realizdasnocend: po miso, etbeleceram 0 newo mii de ompeeeate do sigacado da modemidade ‘Duel questions of arguments concunis don perenores moderne de que 8 culpa” & peu a covaria” ea “invohag le nna” Mo tibet 2 ats sk ‘one aca ‘soconfonta a tadigo carta em nic alr des mess Glipssme), Hus erlalinna ques circa ova osu pars Crfendere undo reveled sa props imi tae do oredr stera do sj, Hus erica o const de "mundo da vida" pate referirse ao mando historic, ence, ‘vido (Lebel) que €amtaor cna er taibém dering aim mista. No “tans xan metafise de Lvinasem favor Aout om matte ne pares com acento Imanentts «sents desnolvida pela co smovisioafobrasir. ‘Orctetizme urdcy ea formaio do estado ‘aso so etudados para xplicr 5s) asia de aneniciade © a presen ainda ‘marae cones autores propos resdedentidades sendazadoras, Oec70 Jnuetconal 6 9 mecniamo da ciminalicagio ‘cal promavida plo stad rasta pos [national dacnarialbarionocal. ade no imoginiio clr ¢ na concede ee datos ga inform 25 dacs da jst. {udder valores ctnohnekos.O "imperal= to neta das oie deXangbnormncods ‘ide, apse somo als para deter (Fo de compertateniose ates que comb {em un cate hegemonic ca cult jue quodelinioguescertoeomseGerado apa tre valocesmsentano "muro da vie’ XANGO E THEMIS ESTUDOS SOBRE FILOSOFIA, DIREITO E RACISMO, Séxgio $40 Bernardo XANGO E THEMIS, ‘Avrox Sérgio Sto Bernardo ‘Coonnmeagio Enron Tis Claudio ures Cara Teuerangas limando Bide Resto Maa arate Massa Marla Fomeanagao ‘Henigee Dusee ©2016 Sérgio Sdo Berman “ods diet reservados enon Sg don San cle So. Bomar Agu Ses Sinn ER. Bos entre tesa, aot eco’ Amu SETR dos Samos So Borards- Soda Arise, 218. 1p, 21 on. Is0h 972-858285-150-1 4. Fleece 2. Dies rast 9. Rio tianos 4 Xangbe Thémis Title Riguets Selec Sanos So Bomar MASI couse cS Caraga Cae Sictar CRS TRU Iheranssio Grificne tora J Andieade + itu Pedra de Rao * XGRAPH. + aliors ORI em TAO a ee A Maina, Gabriele Caut, ‘maroassingulares de noveos que frmatarn mina exist A Gabriele Batista Vieira, com- panherismo ¢ cumplicidade APRESENTACAD E AGRADECIMENTOS Estudei direito na Universidade Catéica do Salvador. LA também, antes, estudeifilosofia, que me influenciou, pelo menos, para uma com- preensio critica ¢ uma visio universal dos deuses/ceusas e des homens € mulheres, Talvez, por isso, estudei direito com desconfianga © ceti- cismo. Uma outra natureza do conhecimenta © um outro interesse, em que a capacidacle mnem@nica ¢ a rpprodusio literal eram e ainda sio as principais operagies eognitivas. Dai, minha resist@ncia ao “mundo do direito”, Achava que 0 direito, como o estudamos e praticamos, resulta rnuma ideologia, numa tecnologia de comando social e numa engrena- ‘gem formalizadara de status quo. O direito enquanto “lugar” de poder €. paraiso das elites e a histiria do pensamentojuridico se confunde de algum modo com a hiskéria do pensamento brasileiro. O.que faz consta- tar que a cutturajuridica da “let” ea cultura juridica da “permissividade da lei" fazem, ambas, parle de um repertério cosmolégico ¢ identitéria dessa mesma complexa sociedad, Isso explica porque a arte ce invent -las, subverté-las chacotedlas, no niecessarlamente nessa ordem ~ tem sido algo recorrente no Brasil Ser advogadlo sempre pareceu algo como se fosse um filésofo da corte © © direito, com suas solenidades,ritos¢ intréitos, garante a fantasia de uma vida de hipocrsia ¢ padrio social. Costume dizer que nfo gosto de advogados, ou melhor, de como normalmente se advoga, Incomoda-me a sensago de uma categoria profissonal monopolizar um poder da repti- bia. Oexercicio da profssio do advogado, principalmente aquele conta- rminado por uma roupagem liberal e individualista é recheado-de pompa cinismo, afinal, obom advogadio ¢ aquele que faz 0 que o cliente quer. cobom cliente é aquele que page mais. ‘A0os sete anos presencieio féretro de Cosme de Farias (“o advogado dos pobres”), na Baixa dos Sapateiros na Cidade da Bahia, Aquilo ficou tem minha memérla e agora recordo-o como algo que precisava desenvol- ‘ver como modelo seno como divida de um desejo que se apresenta com, Sai eel uma outra aspiragio, Ainda nie sabia das escolas criticas e altemativas do dlreito, Por iso, este trabalho tem enderego e sentido. Nao escrevo apenas ppara academia, escrevo da academia para o movimento social negro ©, ‘ai, de volta, para academia e depois para 9 movimento... numa sucess0 prniolégica 'Néo poderia prescindir da lembranga do passadoe, com ela, aneces- sidadede responder iminhahistria, Usareia pessoa de quem fala, porque 'a pestoa tem posigio de fala, Como dizem, de modos diferentes, Muniz Sodrée Zygmunt Bauman, aidentidade 9 se realiza em razao dos diferen- tes, ¢ ela tanto oprime quanto iberta. Newza Santos Souza nos fala que wma das formas de exercer atonomia é possuir um discurso sobre si mess. ‘Oestudo que fiz é um olhar de quem praticou o direto-no frum, na lata social e na agéo institucional e que postula a experiéneia de um mundo universal como unidades de experiénciassingulares. Desde a infancia ric. fe pobreno Mereado de Sdo Miguel, atéa adolescincia dill onde aprend parte do quo escrevo, desincumbi-me de certas amarras e conclusdes. Pasesi uma bea parte da infincia e da adolescéncia nas suas de Salvador vendendo objetos para sobreviver. $3 depois, j8 casado, aos dezenove anos e com uma filha, morando num velho sobrado do centro hhstdrico, dei-me conta da minha falta de horizontes e dos meus recorren- tes atos de desobediéncia civil em nome de uma justiga que nao aparecia ston ofhos de um jovem sem perspectivas Mais tarde, depois, é como pro- fessor de flesofia da rede publica de ensino, através dos ensinamentos dda religido africana, descobri que tinha produzido/praticado um saber. Quando passci a atuar como militante e advogado - de movimentos populares sindicatos e movimento negro ~entendi que 0 “espirito euro- eu’, etnocintrico e eugeneizante tinha influericiado nlo 36 os partidos Conservadores, como o8 partidos progressistas no Brasil Essas palavras Spenas localizam a pessoa que fala, porque a hermenéutica traduz a men- ‘pean sntomnassuts cago que 6 dit stave da sera da verdad tientifia, Tem um dito de Mosambique que diz: 0s fatos 36 s80 verda- ‘deizos depois de serem inventados, A ciéneia é uma verdade que pode ser atiada para varios lados ea idia de justia ¢ para ser exercitada, no Iembrada. Aprendi através de meus pais que a morte &algo que se resolve tem vida e para ela. Depois soube que esse é um dos ensinamentos mais sagrados sobre a morte nagé. ‘Como toda critica revela interesse, deixo aqui minha explicita opio pelocaminho da. fenomenolagia como eixo introdutério do estudo, Ebmo critica da modernidade e do racionalismo e, depois, como critica & fenomenologia, A agéo comunicativa a ilosofia da Ubertago, 0 muaticul- turalismo ea casmovisio afticana aparecem para dislogar com texto alé © Seu final, que para mim, continua em aberto.. A ciéncia fragmentase em saberes essa epistemologia mitigada obriga-me a falar por eaminhos «que nfo podem esquecer 0 marco tedrico central ‘A revisio bibliogrifca, » postura especulativa, a andlise descr tiva visam a proporcionar o debate sobre © papel e a fungio do direito na modemidade. Vinculo-me 8 cortente que afirma o direito como ago cemancipatériae disletizadora de liberdades num terreno de confitos © consensos, A ruptura ¢ a busca. por direitos sio uma posigéo ideolégica aque sbragamos pars afirmagao de espagos que se encontram em completa transigéo na ablidade, portanto, nada com fim e nada tio fechado que no possamos desembaracar-nos-e modificarmos o valor ea validade da norma estatuida (© “mundo da vida” aparece para dialogar com o dielto modemo. ssa relidade vital pé-cienttica aparece como um sinfoma cético de que 08" sistemas juridicos" ainda néo encontrarama realidade, vem tampouco a diferenga que aparece no Brasil de-moda racializado, Sueli Carneiro, adianta-nos que a racialidade eo biopader provacaraen un epistemicidio 20 ecultarldesvalorizat/nepar 0 processo cviliztiro africano e a dis- pora. © que implica que f temos olhares os mais diversos para explicar 0 ‘muro artificial que nos separa de nossas prOprias riquezas. Hava um mendigo chamado Goiaba, lina run do Quebra-Bunda, préximo do Mercado de Sio Miguel, que sempre repetia uma fase: "pelo que sou, nio presto conta a ninguém”. Essa éa distanciaiproximidade dos que'nada tim para os que tudo tm. Jd. professor Jaime Sodiré— uma ‘oa: que nutriu o sentido desse trabalho ~ me ensina que é preciso esere- ver como oe fala e sentir toca a miisica, enquanto se cesta as notas;eJ6 44a Casa Branca f tha chamado minha atengio para falar das minhas origens, que dene de falar quando passe a fazer parte de organizacdes politicas, que materializam fegdes particulaes em nome dos “outros” *dubladeos’ nas “classes subaternizadas” Esse direto que surge como coicha de retalhos que sntetizamos em agBes cotidianas sem fim nurma leitura que favorece a garantia de direitos mediante a tensio-dialdgica, pode por enquanto, justifcar a luta identi- lariae emancipetéria no Brasil. Eniim, acredto na possibilidade pedagé- fica elibertadora de um direito¢ entero minhas Forgas nesse propos. "Todo trabalho iteririo & sempre realizado por muitas ¢ complexas influéncias que sintaticam a escolha do seu autor. Este texto foi tecido ee ———— a pa da experitnetaacadémien no Metrado em Diet da UNB da expeitncsriltante durante minha pasagem pela Avcessoria de elas Rails a Lideraga do PT e pla Aseria 20 Nucl de Pariamentares Negros e Negas na Cima dos Deputaos em Bras, entre os nose 204» 200, evomes que eveberam nested falam male so dss ives oxstencas do que a soas especies produes cetiias lou cultura Apradocer um node reontecimest, Reconhee& um sto de afemayio, Amer ¢ ur alo de existe Ext um sto de inter tie Intervie dum ato de mdaro mundo, Reconhego que o movimento ‘gto baatlevo todos aquees que dialogaram dietamente ou envi= Sadamentecontabuiram com sntesee 0 produto que pens o mando numa perspective de deren marl nu contento ce ute ola © tmanclpatrls para os segmentos excudos, Aos proestres Miro Mloviee Jae Sods, onertadoresdesas excolha, que no posbiit Fam nes pequena refexao junta oof, drt, aio eemancipa (ao. A Eduardo Oliveira, pela soliddriadisposigo de conversa sobre 0 Ssunto.Aos colegas do Mestado, pesqusadors poltcay,miltantes do mrovimerto negro amigos epacitan homens emlberes ue iletiza tamed ib AGRADECIMENTOS ESPECIAIS: Ana Flauzina, Eneids Rollo Daltra, Iracema Paixdo, Cassia Biasini, Luiza Bairrs, Mario Nelson Carvalho, Algjandra Pascual, Sandra Silveira, José Luls Bemardo, Samia Jamile, Hércules Azevedo, Daniela Luciana, Me Georgina, Dulce Barbosa, Mariana Veras, Joao Forge. ‘Atenciosamente Sérgio $0 Bernardo prricio ‘Agradego a escolha para apresentar este excelente livre, Sua atuali- dade e urgéncia estimulam uma confrontagio e um didlogo, como pede uma visio mais contemporinea do pensamento social, Existem diversas contradigSes no pensamento que tentam buscar emancipages humarias ‘em diversas partes do mundo. Nesse caso, pensar um projeto de eman- cipacéo a partir das experiéncias brasileira e africana nas Américas € 0 sentido basilar dessa obra que Sérgio Sie Bernardo nos apresenta, Os temas da alteridade © da afirmagao da diferena so apresenta- dos na peespectivafiloséfiea do dreito, eo autor liliza refertnciase valo- res da civilizagio africana para estabelecer uma ponte do conhecimento cientifco e apontar as contradigbes das Futas socais pelo reconhecimento 8 diferenga e garantie de direitos de igualdade racial. Aprofundando o debate, a critica 40 persamento ocidental o a tsjetiia da formacao do ypensamento juridico brasileiro aparece no contexto de compreensio {de como se criminaliza um “mundo da vida" da populagio negra, cuja constataglo ¢ de que tem a sua cidadania restringida pelo aparato estatal brasileiro, ‘A importincia desse estudo exibe uma necesséria andlise sobre © papel do debate da superagio de uma metafisica da identidade e do universal que crstalzou 0 pensamento. Paradoxalmente, nos exibe uma ppotencialidade de uma metafisica da diferena tradurida nas expresses religiosas da mitologia africana, como um suporte operative poderoso para agio politica de direitos humanos, que nos salva dos limites da filo- sofia monoligica e egooéntrica, que fragilmente tematiza assuntos que sagas, etnias © grupos vulnerdves estéo reivindicando nessa quadra do tempo, Adiferenga metafisca ¢ um assunto que faltou aos modemos. Como _menciona o autorem seu estudo citando Lévinas: a sentido paaa Lésnas tem origem na relagoumana, no desvelamento do outro ¢ de seu resto, Iso, para tle 6 constderado como oii ca los, atitude de amar é una atitude de Er responsabilidad pl utr, pelo meu our, Ios desma wa segudnca ee traligi ue precisa sr nceperads, Esta perspectiva nos propara para ago politica Fazer plea no Brasil significa reconhece a diferenese afirmar 2 diferenga significa institu uma nova éticae, por consequénia, uma nova juridcidade. ‘Alta por igualdade radiclizao programa formal dos Segads hu- minstasedesveladisposigies equitaivas com fortes nuances de um vita- lismo que aproveita 9 dscurso de identidade, preservada em suas aspi- ragiesancestralizadas vessencnlizadas e impe um cenério novo para Coperaionalidade nas lita sciais de cidadania ¢ emancipagao intersub- jotvas Este debate da diferoneaontogeaafirmado nas ftas cotdianas ecentes deoafiam os limites de um essencialismo identtrio que pode ‘nose jusificar nas ngendas para uma democraia entre povos,nagBes, tras e etnias. Por enguanto,¢ isso que o ator afrma, @assimetra da ineroubjetvidade fundada no dscurso da diferenga pode ser um camt- rho par as conquistas que se fazem necessirias para este momento, "Aagenda de uma nova ética pressupde a reletura da Hosta e seu panorama ontoldgice.Esin tien pode orientar ma aova juridicidade Em nogies de curio e rrado referenciada nos valores cvilizatdrios que formam a sociodade brasileira, A sensiblidade pode ser chamada para teste programa de assimetria intersubjetiva, no qual 0 “eu” kantiano se Sleomorana frnte a esta ungéncin, como nos asegura dvinne de que Pre Cisamos de uma fenomenologia da sodalidade. Esta pode ser uma nova possibilade comunicativa para confronto pragmético do racismo © da {niolerincae da avez por biopolitcas hegemonizadas por um monistmo epistemoldgico. Esta tem sido uma das nossa titimas preocupagses Sobre o aparecimento de novos sistemas de essenclaismo reifeadores de tuma tolalidade. Enfim, pergunto se ¢ possvel pensar adiferenga sem a rnetaisica, “ates eotudos de relagSes raciis contribuem para uum panorama multineferencal que precisamosinscrever na sociedade ena academia. Prezo que este esforgo do autor alimente a possiblidade de inaugurar cadeiras novas na academia para a prétcainterdiscipinar do dirt, da Fists, da police eda filosofia, ‘Miroslav Milovic fe Td de Crested ds ner eats SANGO DEL, SANGO DE! KAWGO KABIVESH (Bang esti chegandol ‘Xango esi chegando! Venha ver E admirer o Rei!) O Dr. Sérgio S80 Bernardo é um Miniciado" de alta graduagio, nos aspectos do dominio juridieo. e dos ritos sagrados de matriz africans, presenta aqui sua capacidade reflexiva indispensavel no polimento dos debates sobre as “questdes negrase uricticas”, stoseu trabalho contra-sona trajotdria africanano Brat recortando ‘mundo da vida", projetado negativmente, agravado por uma laterite ‘riminalizagio, A sua larefa é estabelecer uma evidente conexio com as ppossibilidades de alteridade e afirmagio da diferenga “através da iden- tidade racial como instrumento emancipatério”. Recorrendo a Husserl, ‘questiona “os argumentos conceituais dos pensadores modemnos”, que afirma que a “involugio civilizatéria” S30 atributos “inatos aos latinos, asiiticose africanos” Deste autor, o De Sérgio observa 0 conceto de “mundo da vida", selativo ao mundo histérieo,conereto e vivido (Lebenswelf),conceito ante- sor & cigncia € culpa o racismo instituctonal como mecanismo potencial dda criminalizagio racial, patrocinada pelo Estado brasileiro que resulta na “institucionalizagio da marginalizagio social”. Em relagfo as “leis” de Thémis, esta tem lugar réservado no imagi- nro cultural e “na concretude dos dados que informam as decisbes da justiga fundada em valores etnocéntricos”. Em contrapartida, “os impera- ‘vos categéricos” das leis do orixd iorubano Xengj, atuante “no mundo sda vida", transformam-se em elementos vitais para a “determinasio de Ste aie comportamentos € atitudes que combatem um certo hegemonisme da cultura juridica que delimita 0 que é certo e o que é erraco a partir dos valores sustentados no “mundo ai ‘O Dr Sérgio Sao Bernardo toma como tarefa, a possbilidade de esta- ‘pelecer conexao coma alteridade que teria como proposta algo importante para a oblengio de igualdade levando em conta as diterenas, Para iss, seria primotdial o debate contemporineo do direitoa uma identidade racial edo dieltoa diferenga, realizado e amparaco & luz da nossa realidade. ‘Aficmanda que a tradigio filosfica ou 0 pensamento alricano mio est sustentado ra separagio entre politica, religido e natureza, esta atua em semelharga com os fisicos gregos que influenciaram. 0 muindo ocidentalizado. Neste contexto, o individwo é simultaneamente “sum ser social e natural, sendo que a natureza sera “uma parte dotodo do qual oindivi- duo 6 também uma parte. A implementagio dessa observagio impée uma leitura “dialetizada’ ‘Depois de um proveitoso percurs diloganda com pensamentos, conceitos e posturas intelectuais, o Dr. Sérgio Sio Bemardo penetra no ‘essendal do seu trabalho que é ambiente jutidico nacional, onde aborda © pensamento brasileiro, do Estado e da justiga, aliado ac tema da iden- tidade nacional, como elementos que ajuela a entender a jusifcagso da construgio do presente aparaio juridico. ‘Analisa, em boa hora, “a genealogia do pensamento jurdico” a par~ tir dos estudos de Antonia Carlos Wotkmer ea construcio do Estado bra- sileio, com seus componentes que v3o do autoritarisme, patrimonialismo seus tbridismas. "Ainda afunilando a abservagio sobre a sociedade brasileira, 0 Dr. Sérgio Sto Bernardo recorte h anilise do racismo institucional brasileiro, abordando 0s mecanismos da criminalizagéo racial promovida pelo Estado, para a “institucionalizagSo da estratificagio racial com vistas & rmarginalizagio social € aqui que 0 autor trata do conceito de raga, esta- belecidos & luz dos estudos académicos © propasicdes dos movimentos sociais negros no Brasil”. (Os conceitos de “violencia simblica” (Bourdieu), ¢ o racismo ist tucional (Carmichael) ganham relevo, na verificasao da violénciaestrutu- zal associados aos mecanismos de exclisio, sustentadas por les oriundas do aparetho estatal, ou praticas sociais de apoio & estratificagso, segrega- ‘0 ¢ exclusio da populagéo.negea na vida brasileira, A guisa de concla- fo, trazemos XANGO e THEMIS, “Os imperatives categéricos das leis de Xang® no mundo da vida, sum pais ecltico eautortério aparecem como vitis para adeterminasio de comportamentos e aitudes que combatem um certo hegemonismo da cultura juridice". Jéas lis de Thémis, segundo 0 autor, encontram lugar Privilegiado no “imaginirio cultural e na concretade dos dados que infor- sam as decisdes da justca,fundadas em valores emacéntrcos’ Jaime Santana Sodré Pereira SUMARIO Insaco: PERCORRENDO UM CAMINHO:, 21 (Com I MODERNIDADE, EUROCENTRICA EOQUTRO DESIMESMO 31 Ocarrenormcwemioscs 33 Alinco commoo peraa no ware 38 Bom Fo ero meaico nn seCUi NCE AB ‘Anicessnan oa Cuma ga ATNDA DOSER Civil © OUTRO DESIMESMOEAS AVENTURAS DIFERENGA 49) ‘Guha aur cgca crore —anRBETIDADE 5 Aseassineacortrcovceaio $2 *Difantsins que row romano eu RENO" ‘Adve dodecusa aeneridideneaedaea imerpetssoc ore SS ‘7 (Germ: ESTADO, IDENTIDADEE POLITICAS DA DIFERENGA 71 Foemenottantaoace 7 Qraemunsnime n0Ku0oE AeA WAnENAL 7B Vertacasmaoucn Emciaia smo 1 ‘Aven sABCIEAE HISAEL OD MEO NECN CAS ATCAS ICN Oremmowiuraroracn 88 "Dswcnac emnncnt mia anrem” 90 Cott ME XANGO E THEMES 95 -ASCRSGATADRS HOS URES AS DESHALENCRS DOSS 9S Quinco kncrun RCA HAO MADODAUTA 107 ‘Capman DALOGOS MULTICULTURAIS EPOSSIBLIDADES COMUNICATIVAS, 145. "Osseo GING 1 BRE A Nossa MAEM Apossbidede do Eso edo gar foradoetnocertima 120 ‘Cvsaunig"EUTENHO OUTROS SONHOS:. 125 Inamnoce como nai 125 ” Posehn sO ESTADO DA ARTEE ONILISMO NEGRO 135 Posh Ik AREMTO, EPISTEMOLOGIAE RACISMO 441 Periticns 146 intRODUGAO Percorrendo um caminho... (Os estudos tematizados neste livro localizam uma experiéncia aft cana no Brasil, de como um "mundo da vida" fot projetado negativa mente c, consequentemente, criminalizado, a despeito dos processos de acutturamento, absorgio e ressignificagdo deste mesmo “mundo da vida" Nossa tarefa seraa de estabefecer uma conexo com as possiblidades da alteridade e da afirmagao da diferenca através da identidade racial como insteumento emancipatori. ‘Atradigioocidental acastumou-se com aafiemasSo de quea reforma protestante, a iustragio e a revolugo francesa, realizadas no cendrio ceuropeu, estabeleceram 0 nexo maximo de compreensio do significado dda modernidade. Husserl questiona os argumentos conceituais das pen- sadores modemos de que a “culpa”, “preguiga”, a "covardia” ea “invo- lugho eivilizatéria”sio atributos inatos 20s latinos, assticose africanos. ‘Ao confrontar a tradiclo cartesiana, em que a t6nica é falar de si mesmo (solipsismo), Husserl firma que a cigncia sera o suficiente para ‘entender 9 mundo; revelando sua propria limitagio de entender a estru- tura do sujeito. Husserl desenvalve o conceito de “mundo da vida" para referir.se a0 mundo histérico, concreto, vivido (Labensvlt) que anterior ‘éncia e que também determina sua existéncia. No entanto,asaida meta- fisica de Lévinas em favor do outro em muito se parece com a construgo imanentistae sensitiva desenvolvida pela cosmovisio afro-brasilira (Ocecletismo juridico ea formacio do Estado brasileiro slo estudados para explicar nossa auséncia de autenticidade e a presenca ainda mar- cante de conteidas autoritiries e propositores de identidades essencialt Zadoras, O racismo institucional é 0 mecanismo da criminalizacio racial promovida pelo Estado brasileiro para a insitucionalizagao da margin Tizagao social. ; “As "leis" de Thémis ou urna cosmovisio juridica hegeménica encon eam jugar privilogiado no imaginério caltural ena concretude dos dadios fue informam as decisdes da justga fundada em valores etnocéntrces ‘Os “imperatives categéricos” das “leis” de Xang6 ou uma cosmovisio africana no “mundo da vida” aparecem como vitais para a confrontago {de comportamentos e atitudes que combatem um certo hegemonismo da cultura juridica - ‘Nossa tarefa aqui seré a de estabelecer tuma conexio com as possi- bilidades da alteridade que proponka algo satsfatério para a obtengic ie igualdade e que sirva aos propdsitos da diferenga. Para isso, o debate contemporineo do direito a uma identidade racial edo direto diferenga seni feito & ur da realidade brasileira. Essa construsio aproxima-se ce uma perspectiva da alteridade e das consirugies dialégieas modernas, em que a ontologia mais wna vez se precipita & metafisica e uma orientagio de oariter moral-religioso incide obre uma dimensdo politica e socal. Talver seja esse 0 dilema deste livrezo de fazer convergit experigneias metatiscas e exsenclalizadoram Jo ‘mundo e do sujeito nas trajetrias possiveis da modernidade -como é 0 ‘caso di narrativa miticae religiosa de matrizes africana no Brasil-, sem {que esses imperativos renunciem & sua pretensio dialégica e promotora dde acontecimentos ético-juridicos emandipatérios na vida politica brasi~ Ieita, Par em confronto os pressu postos do fendmeno racial, da cultura jriica no Brasil e do absolutismo de um pensamente filosfico fundado na identidade & um esforgo metodoldgico que esta obra se props. "A tradigao da filosofia ou do pensamento africano, para aqueles que ‘entender que a filosofia é um acontecimento europeu, nao est susten- tava na separagio entre politica, rligido enatureza, 0 que conforma uma semelhanga com os fsicos gregos que influenciaram o mundo ocident Tizado. Aqui aparecem explicitamente as categorias da resttuiio, integra si, complementaiedadee ancestalidade como orientadora de certaseiviliza~ {SBesalricanas nas Américas (OLIVEIRA, 2003}.O individua nessa otica fo mesmo tempo, um ser social e natural. A natureza ¢ uma parte do todo ddo qual oindividuo ¢ também outra parte. A afirmacio de Oliveira (2003) que ha isso tudo uma sabedoria profunda. A forga sagrada é imanente {4 natureza, Os elementos (0 biorritmo) séo determinados por ese conju- ‘acto, inexistindo, portanto, a dualidade homem-natureza, ‘A cesmacisao africana de David Eduardo de Oliveira send wtilizada para explicar a diferenga ontoligica a partir do esgotamento da racionali- dade instaurada pela modernidade industrial-capitalista, perpettada por diversas crises de legitimidade normativa, expressa na perda de identi- dade cultural, no individualismo e no iracionalismo. Isto impde uma leitura dialeizada, que ainda se encontra presi a wm universo miticosustentado na essencialidade do ser. Aforga vital a acdo primordial de que tudo emana. A isso também converge, ainda, 0 s0 da linguagem oral como organizadora e tradutora desse mundo, Muniz Sociné (1998) traduiz muito bem essa experiéncia humana comparando-a ao universe mitica dos gregos (oar) no qual “os deuses existem porque existe 0s homens” (SODRE,1999, p. 174). Preocupamo-nos em realizar uma sintética critica da tradicho do pensamento ocidental. Por isso, iniciamos o livre fazendo uma Viagem no interior da fenomenologia, que, como diz Arendt (1993, p:1), corres- pponde a uma tentativa de reconstruir 0 mundo, Uma nova possiblidade de unit pensamento e ser, numa perspectiva modem, sem a metalisica. Esse sistema de pensamento serd utilizado, entio, para analisar a moder- nidede es heranga racionaliat. Nio Go eal quece 8, mas o objeto real do nossa conseigncia que, reduaida, projeta imagens da réalidade que conhe- cemos. Essa construgio retoma tuma estrada da flosofia modem, mas ‘Arendt (1993) nos alerta que isso pode levar, e acaba levando, a exemplo de Sartre, Marcel etc, a um discarso humanista, Husserl (1996), a0 confrontar a tradigio cartesian, em que a tonica falar de si mesmo (solipsismo), faz alusio & metifora do espelho, que texplica 0 mundo e as coisas, Dessa perspectiva, a ciénca seria suficiente para entender o mundo; revelando, somente depois, sua propria limitar ‘0 enquanto instrument capaz. de compreender a estrutura do sujeito. ‘A citnela & o autoesquecimento do sujet, disse Foucault. Por iss, nos propomos a fazer essa viagem a partir de Musser, Utilizando a expresso que ele desenvolve para referir-se ao mundo histérico, concreto, vivido = 0 “mundo da vida" (Lebenswe!}, 6 possivel colocar 0 sujet em sime- ttia com a vida real, construida no mundo da consciéncia, afastando-se, assim, mesmo que apazentemente, da metafisca ‘Como aparvce 0 outro para Hussel? O filosio acaba constatando que o encontro com os “outros cus" se dé na medida de um encontro com outto ego, que nada mais $ que o reflew de min priprio, on 0 mew “wage ena card ad cats don sn. oe ae lia pando semen pte Es depres dock Ae um rue prege can peas acl Se cepa ido pls nung excvoneie dat 2 i elas do spt. Seu am reso ca da comer por, evo pra un rent ait se meadede expat mr ners pe sem sr enrtoem a mee ° yr me nae em tomo da cost do ee ee as enulopn ont juste pr Sees mde oan engi do eo do 6 etme eon pea ho mda oer 8 eta Cate ate como projet pars futur, Heidegger entencia 0 nada foro auséncia de sentido em que a tinica certeza € a temporalidade do

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