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Pe CeliaT = Mere oll] c0) Monteiro | (Organizadora) ! | | Ligia Diniz | Lilian Chalub Pintura 2 Midia Capitulo 1 ARTE: LINGUAGEM DA ALMA Ligia Diniz “A alma é 0 ponto de partida de todas as experiéncias humanas, ¢ todos os conheci- mentos que adquirimos acabam por levar a cla. A alma é 0 comego ¢ o fim de qualquer conhecimento”, (JUNG, vol. VII/2 § 61) q": €a linguagem da alma. Jung revela um erso repleto de mitos, simbolos, sonhos, religiosidade, arte e alquimia. Compreende o homem na sua totalidade e traz uma percepgao de que a criagao esté dentro de nés e que, se quisermos conhecer 0 mundo, deveremos mergulhar mais em nds mesmos. Se 0 processo analitico visar a “escutar” a alma de ou- trem, a arte sera um veiculo que torna essa “escuta” possivel. Se visarmos a compreender o social, um grupo de pessoas, deve- remos estar abertos as suas musicas, aos poemas, as pinturas, as dangas e a outras manifestagdes da alma. Tudo que se faz com arte se faz com alma. Por meio de expressio artistica, realiza-se uma comunicagao que esta para além das fronteiras, que nao precisa estar baseada restritamente no codigo verbal. O verbal nao transmite todos os contetidos inter- nos. Muito antes de o homem escrever, desenhava. A arte sempre foi uma funcio estruturante da consciéncia. Ao desenhar os bisdes na caverna, por exemplo, o homem ja vivia a formagao de sua consciéncia. As maos que 1 as cavernas pré-historicas j4 podem ser compreen como uma vivéncia de identidade. A arte, portanto, | @ compreendemos, tem uma fundamental trajetoria humana, auxiliando o homem a “eu”, a lidar com seus medos, dividas e ps _ ante do desconhecido. / oe: [ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS ‘A arte possibilita tornar visivel o que é inyis{- vel, yalendo-se do simbélico. O numinoso pode ser expresso por meio dela porque, fesse postula Jung (Vol. VIII/2), © simbolo agrupa significados contras- tados, dai a possibilidade de transcender por meio da arte, atingindo aquilo que, a principio, figura Pifto tratingivel. A Arteterapia fornece suportes materiais adequados para que a energia psiquica torne vi- siveis simbolos em criagdes diversas. Esse proces- so colabora para a compreensao e a resolugao de estados objetivos conflitados, favorecendo a es- truturagao e a expansao da personalidade por meio da criacio. A Arteterapia, como um conjunto de técnicas e saberes, facilita este processo. Por Arteterapia, en- & tendemos qualquer tratamento psicoterapéutico que i utiliza como mediagées expressivas a musica, a dan- 0 ga, o teatro e as representacgdes plasticas (pintura, modelagem, desenho, gravura, mascaras etc.). { Portanto, a arte utilizada no espago terapéutico re- B vela a riqueza inconsciente das pessoas. E, por ser uma linguagem simbélica, torna-se um instrumento eficiente 5 4 Para acessar a alma humana. _ ___ Segundo Jung (Vol. VIII/2), a criatividade ¢ um ins- i tinto humano. Ao usar a arte no processo de individuagao e, A a ee i i assim, estimulando a criatividade, humaniza-se ainda mais } © proprio homem, colocando- com sua prépria alma, ‘© em contato mais estreito "Arte: Linguagem 0 Inconsciente Para Jung, a Psique (a personalidade total) dois niveis: consciéncia e inconsciente, A consciéncia aglomera pensamentos, palavras, lem- brangas, identidade, sensagdes, gestos, sentimentos, imagens, fantasias. Comum a todo ser humano, ela se refere ao estar desperto e atento, observando e registrando 0 que aconte- ce no mundo que nos rodeia e dentro de nds. Esta direta- mente ligada a historia do individuo (JUNG, 1962:226), e sua fungao primordial é situar 0 sujeito no tempo e no espa- ] ¢0, realizando as orientagoes e as adaptagdes necessarias para possibilitar a relagao de troca entre cada um e o meio fisico e humano ao seu redor. Além de abranger todos os contetidos nao conscien- tes, o inconsciente existe a priori e é a matriz pré-formado- ra da propria consciéncia. Jung afirma que “o inconsciente nao é apenas um produto da repressio, mas 0 solo materno e criador da consciéncia” (JUNG, vol. XVIII/I, §1156), cu- jos contetdos “...ndo consistem apenas de desejos incom- pativeis mas, principalmente, de partes da personalidade até agora pouco desenvolvidas e inconscientes que lutam por uma integra¢ao no todo do individuo” (JUNG, vol. XVII/I, §1156). Presente nas fungdes instintivas mais importantes, fonte legitima das potencialidades do ser, origem da ativida- de criativa e artistica, ele é nossa esséncia que nos irmana. Nascemos inconscientes e trazemos muitos contetidos her- dados dos ancestrais. -.-embora uma crianga ndo nasga consciente, sua ment tabula rasa; ela vem ao mundo com uma interior da... O cérebro nasce com uma estrutura acal ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS de maneira a inserir-se no mundo de hoje, tendo sua historia, Foi elaborado ao longo de milhdes de anos ¢ re- presenta a histéria da qual é 0 resultado. Naturalmente tragos de tal histéria estio presentes como em todo 0 corpo, e se mergulhamos em diregao A estrutura basica da mente, por certo encontraremos tragos de uma mente arcaica, (JUNG, vol. XVIII/I § 84) Embora os produtos da mente inconsciente sejam ignorados, ela é bem maior que a psique consciente, que se restringe a percepgao de poucos dados de cada vez — © resto é inacessivel 4 percepgao, como se observasse- mos por meio de uma fenda e sd vissemos momentos isolados. O inconsciente é imenso e sempre continuo, enquanto a consciéncia é um campo restrito de visao momentanea (JUNG, vol. XVIII/I). Jung (SILVEIRA, 1984: 71) compara a Psique a “um vasto oceano (incons- ciente) no qual emerge pequena ilha (consciente)”. O inconsciente ¢ dinamico, produz varios contetidos, rea- grupa outros ja existentes e trabalha em uma relagio com- pensatoria e complementar com a consciéncia. Jung (Vol. XVIII/1) subdivide o inconsciente em dois niveis: um, 0 inconsciente pessoal ou psique subjetiva, refe- re-se aos contetidos adquiridos durante a vida da pessoa; 0 outro, 0 inconsciente coletivo ou psique objetiva, aos que estao presentes desde a concepgio. O inconsciente pessoal corresponde a “..uma camada mais ‘ou menos superficial” (JUNG, vol. XVIII/2 §1159), sem um marco divisorio muito rigido com o consciente € composto pelos con- telidos esquecidos ou reprimidos pelo individuo, deliberada ou involuntariamente, relacionados as experiéncias vividas; refere-se comportamentos civilizados ou passiveis de aprendizado. Arte: Linguagem da alma J 0 inconsciente coletivo seria a camada mais funda da psique, constituida pelos materiais herdados da humanidade, cuja existéncia nao depende de experiéncias individuais. Ai estariam os tragos funcionais comuns a todos os seres humanos, prontos para serem concretizados por meio das experiéncias reais. No nivel do inconsciente coletivo, encontram-se os instintos e os arquétipos — formas estruturantes ‘comuns a toda espécie humana, padrdes de comportamentos coleti- vos, que se manifestam em motivos mitolégicos nas mais diversas culturas e sio 0 resultado do depésito de impres- sdes deixadas por certas vivéncias fundamentals, repetidas incontavelmente por meio de milénios: registros de emo- g6es e fantasias suscitadas por fenémenos da natureza; ex- periéncias intrauterinas e as relagdes iniciais que se estabelecem entre mie e filho; vivéncias da imposigao do poder do mais forte sobre o mais fraco; vivencias da relagdo de irmandade; encontros com 0 sexo oposto e relagdes es- tabelecidas entre ambos; vivéncias de situagdes-limite em que 0 risco de vida é iminente; situagdes de aborto, onde algo se inicia, mas nao chega ao fim; percepgGes da tempo- ralidade e das transformagdes corpéreas vividas em cada momento da vida; entre muitas outras. Os arquétipos também sao compreendidos como dis- PosigSes inerentes 4 estrutura do sistema nervoso, que ge- Tam representagGes sempre analogas ou similares, assim como 0s instintos — as pulsdes herdadas. Compreendidos desta forma, so “padrdes hereditarios de comportamento psiqui- co”, revestidos de qualidades dinamicas, tais como: autono- ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS Por serem estruturas vazias, os arquétipos mas que ganham formas por meio da imagem ar e do simbolo que, ao contrario do arquétipo, é acess{vel 4 consciéncia. Os arquétipos em si, porém, sao apenas possi- bilidades de imagem: “(...) uma imagem primordial s6 pode ser determinada quanto ao seu contetido, no caso de tor- nar-se consciente e, portanto, preenchida com o material da experiéncia consciente” (JUNG, vol. IX/I § 155). Tais imagens variam conforme a época, a etnia € os individuos, mas tém sua estrutura preservada, como no caso dos arqué- tipos do Heréi, da Grande Mae, do Pai, da Crianga Divina, do Orfao, dos Irmaos Inimigos, entre tantos outros. Assim, toda a heranga espiritual da evolugao da hu- manidade, concentrada no inconsciente coletivo, renasce na estrutura do cérebro de cada individuo. Os padrées ar- quetipicos esperam 0 momento de se realizarem na perso- nalidade; so capazes de uma variagao infinita e dependente da expressio individual, mas exercem uma fascinagao re- forgada pela expectativa tradicional ou cultural. As percepsées subliminares, os contetidos da memé- ria que nao precisam estar sempre presentes na consciéncia e as lembrangas reprimidas por nos trazerem evocages dolorosas fazem parte do inconsciente pessoal. Tais contet- dos podem surgir na consciéncia a qualquer momento, nao tendo emergido anteriormente “...devido a falta de intensi- dade e de contetdos amadurecidos o suficiente para torna- rem-se conscientes” (JUNG, Vol. VII/I §103). Af também estio localizados os complexos. Portadores de uma carga energética substancial, 08 complexos sao feixes de contetidos afetivos — s 3 tos, lembrangas, imagens, padrdes de compo arquetipico que funciona como - ( do, cada vez mais, contetdos refere! \ ele. xo é dotado de energia propria e tende a pequena personalidade, com uma espécie de cor fisiologia particular. (JUNG, vol, XVIII/I §149) | Ao se deparar com o conteido complexado, a con ciéncia fica obscurecida, com sua orientagao no mundo ex- terior e sua percepsao do tempo e do espago reduzidas. Isso se deve 4 autonomia de acio e desenvolvimento do nucleo complexado, que pode tomar a consciéncia, subor- dinando 0 ego; nesse momento, o individuo perde sua li- berdade de agao e de pensar, pois passa a viver em fungao do complexo tende a perceber o mundo a partir do uni- verso complexado, constituindo uma espécie de possessio psiquica. Portanto, embora 0 complexo nao seja negativo em si, seus efeitos podem ser, A superagao do complexo ocorre a partir da intensi- dade com que ele é vivido e da compreensio de seu papel nos padrdes de comportamento e reagdes emocionais. As- sim, a energia complexada pode ser liberada, possibilitando a integracao de novos contetidos 4 consciéncia, ampliando- a. Isso se da quando alcancamos g --.0 centro (do complexo) diretamente, de qualquer ponto de uma circunferéncia, seja a partir de um sonho, do ; cirflico, das meditagdes sobre uma bola de cristal, d inho de oragdes lamaisticas, de um quadro de pintor ou, até mesmo, de um bate-papo ocasional. (JUNG Desse modo, o complexo, se gia, possibilita a movimentagao di nando-se um grande aliado ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS- seu desenvolvimento psiquico. Os compli portanto, verdadeiros motores da psique, que a pelem e vitalizam. O inconsciente, para Jung, nao é apenas reatiyo: ele também age, prediz, alerta, abre horizontes e eluci- da, sobretudo por meio de imagens. Contém tanto os | residuos ativos do passado quanto as sementes do futu- ro — e possui, portanto, uma fungao prospectiva, que Jung exemplifica referindo-se 4 sua propria histéria: “Minha vida é a historia de um inconsciente que se rea- lizou. Tudo o que nele repousa aspira a tornar-se acon- tecimento e a personalidade, por seu lado, quer evoluir a partir de suas condigdes inconscientes e experimen- tar-se como totalidade”. (JUNG, 1962:19) A produgio inconsciente antecipa uma nova fase do desenvolvimento da psique. Quando os sonhos e 0 fazer ar- tisticos, por exemplo, apontam o rumo seguido pela ener- gi psiquica, anunciam para o consciente 0 que esta por vir; embora a conscigncia esteja alheia aos fatos, as situagdes jé se encontram em incubac3o (JUNG, vol. XVII/1 § 472). Esse aspecto progndstico demonstra que o conhecimento do Inconsciente é anterior 4 Consciéncia. A fungao prospectiva nos leva a transcender 0 mo- mento presente e vai criando condigdes para que se de- senvolyam no consciente contetidos existentes no inconsciente, mas ainda desconhecidos da consciéncia. Eis ai a base do método de amplificagdo criado por Jung, que, por meio de associagées a partir dos contetdos Smergentes nos sonhos, em fantasias espontaneas ou rigidas e no fazer artistico, possibilita novas sc s vencias gray no: indgmasia See e Es + OP ae Os Simbolos e a Arteterapia Para a Psicologia Analitica, todo e qualquer ol pode se revestir de valor simbélico, seja ele natural/con- creto ou abstrato. Diferente de um sinal (que encerra em si um significado dado) ou de uma alegoria (uma figuragao que pode tomar a forma humana, de um animal, de um ve- getal, ou mesmo de um feito herdico, de uma virtude tens simbol 6 traduz algo que nenhuma palavra pode exprimir. Jung define o simbolo como o “termo que melhor traduz um fato complexo e ainda nao foi daramente apreendido pela conscién- ca” (JUNG, vol. VII/2 § 148). Ea chave de um mistério, 0 tnico modo de se dizer aquilo que nao pode ser apreendido de outra forma; ele jamais é explicado de modo definitivo e deve sempre ser decifiado de novo, (CHEVALIER E GHEERBRANT, 1988: XVI) O simbolo traz para a consciéncia que o contempla o meras percepgdes até entao desconhecidas, alcangando di- mensdes que o racional nao pode atingir. Por isso mesmo, apresenta diferentes facetas, com intmeros significados, que vao muito além da sua representacao imediata. © simbolo nasce da propria alma e surge do conflito psiquico inerente a esta. Conjuga, de um lado, o arquétipo, fonte de sua numinosidade e em si mesmo irrepresentavel; de outro, apresenta uma imagem concreta, retirada de seu contexto e que, ao revestir e dar forma ao arquétipo, de cer- to modo, também lhe da existéncia, diferenciando-o do caos do inconsciente de onde se origina, como que Proprio ato cosmoldgico da criagao. Por fundar-se da alma humana, o simbolo adquire a ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS E 0 simbolo que media a relagao entre Consciéncig e inconsciente, Estes, para a psicologia analitica, Taramen- te estao de acordo no que se refere a seus contetidos tendéncias. O homem tende a polarizar seu funcionamen- to psiquico em um dos extremos, acarretando uma unila- teralidade que pode ser desvantajosa Para © processo psiquico, na medida em que a nao-integragdo do oposto exclui justamente o aspecto criativo e as perspectivas de transformacio e maior amplitude psicolégica. Juntas, po- rém, as tendéncias do inconsciente e da consciéncia cons- tituem a fungao transcendente — assim chamada porque torna possivel a passagem de uma atitude para outra, sem perda do inconsciente. A fungao transcendente aparece como uma das proprieda- des caracteristicas dos opostos aproximados. Enquanto es- tes sio mantidos afastados um do outro — evidentemente para evitar conflitos — eles nao funcionam e continuam iner- tes. (JUNG, vol. VIII/2 § 189) Com sua capacidade de sintese, o simbolo permite, portanto, que consciéncia e inconsciente realizem a uniao dos opostos e formem uma totalidade. A construgao de pontes entre os opostos dinamiza e mantém a vida psiquica em constante movimento, redistribuindo a libido e canali- zando-a para a atividade util. (JACOBI, 1995: 92) Vimos que a linguagem prenhe de sentido do sim- bolo grita para nds que significa mais do que diz; yee também que podemos indicar o simbolo de imediato, muito embora nao sejamos capazes de desvendar plenamente set significado, de modo que ele permanece um desafio pe™ pétuo para nossos pensamentos e¢ sentimentos. Provavel- ‘Arte: Linguagem da alma mente, por isso, um trabalho simbdlico é tio « domina-nos com tanta intensidade e, raramente, nos um prazer apenas estético, (JUNG, vol. x) Segundo Jung, (Vol. VIII/2 §171) ha pessoas “...que nada veem ou escutam dentro de si, mas suas maos s40 capa- zes de dar expresso concreta aos contetdos inconscien- tes”. O trabalho com canais, como as express6es plastica e corporal, a misica, a literatura e as artes cénicas, transfor- ma a arte em um meio facilitador, que confere uma mani- festagao visivel ao afeto, Nao cabe af um olhar técnico ou estético; apenas se concede livre espago a fantasia, para que tudo se faca da melhor maneira possivel. No trabalho com técnicas expressivas, a linguagem simbélica pela qual o inconsciente se expressa emerge por meio das diferentes técnicas, dando acesso 4 mente incons- ciente do cliente. O processo arteterapéutico, assim como 0 processo simbolico, acontecem na “.,. vivéncia na ima- gem e da imagem”. (JUNG, vol. IX/I § 82) As artes, os mitos, as religides ea literatura sempre expressaram as mais profundas emogées humanas. Sao mei- os de comunicagao comuns a toda espécie humana, que per- mitem que nos expressemos “...por meio da palavra, da mimica e das reagdes psicomotoras, da realizagao de atos, das varias modalidades de expressio plastica” (SILVEI- RA,1981: 114). A fungao simbdlica da arte reside na possi- bilidade dessa expresso e nos miltiplos significados das obras de arte, ambos inerentes ao fazer artistico. ai A Arteterapia, embora originada dessa ativi lenar, é de aparecimento recente como consciente de cada um. F a liberdade de exp sibilidade, criatividade, é vida” (CHIESA, 2004: ele, as imagens eram uma simbolizagao do incoelt - a criatividade, uma atividade humana natural que a iuarern que pode estruturar 0 pensamento, port ae fungao em si mesma. ee E podendo até mesmo ser d autocurativa), pois possibilita ao individuo expressar seus contetdos conflitivos e/ou traumiticos por meio de suas | | produgoes artisticas, ajudando na revelagio do inconscien- te (DINIZ, 1998). Quando utilizada com fins terapéuticos, os aspectos estéticos deixam de ser privilegiados. | \ A pratica da Arteterapia facilita a decifragao do mun- do interno, o confronto com as imagens € a energia psiqui- figuram. A compreensao destas formas lita o confronto com 0 in de seus conteudos, tas nao estao sepa- intransponiveis. Ambos permeiam-se e manifesto nas obras ca que ai se con simbélicas possibi consciente € 4 pois 0 mundo | tomada de consciéncia SS das emogoes ) rados por fronteiras | no dia-a-dia, \ de artes pl: © o mundo das coisas concre’ o que & particularment sticas ¢ literarias, € @ Arteterapia pode aperfei- “goar estes intercambios. &, portanto, um processo terapéutico paseado na criagao e na andlise de séries de produgdes artisticas (que isoladas, poderiam ser de dificil decodificagao) 44¥& per- mitirao acompanhar com bastante clareza © desdobra- mento de processos intrapsiquicos € identificar tee ae ossuam relagao significativa com os casos olin q estudo. Tais produces, tal qual os sonhos, indicam ™° miti téncia de uma ¢ Z exist Arte: Linguagem da alma Disse Jung (Vol, VIII/I §168): Pode-se expressar um distirbio emocional, nio mente, mas conferindo-lhe uma forma vistvel. Os pacer que tenham talento para a pintura ou o desenho podem ex- Pressar seus afetos por meio de i imagens. Importa menos uma descricao tecnicamente ou esteticamente satisfatoria, do que deixar © campo livre a fantasia, e que tudo se faga do melhor modo possfvel. Jung percebeu a relevancia do uso de técnicas ex- pressivas como meio de acesso ao inconsciente te, integran- do a expressio artistica a linguagem verbal. As duas ocorriam juntas no setting terapéutico, “...uma auxiliando, esclarecendo e enriquecendo a outra” (CARVALHO, 1995: 31), permitindo que os analisandos se expressassem “...de conformidade com o gosto ou os dotes pessoais” (JUNG, vol. VIII/II § 400): de forma dramitica, dialética, visual, acustica, ou na forma de danga, pintura, desenho ou mo- delagem. O resultado era uma série de producées artisti- cas complicadas, cuja multiplicidade me deixou confuso durante anos, até que eu estivesse em condigées de: nhecer que este método era a manifestagio espontan um processo em si desconhecido, sustentado uni pela habilidade técnica do paciente, e ao qual, dei o nome de “processo de individuagao”. Ao perceber o efeito terapéutico de t bre o individuo, Jung abriu uma nova Processo psicoterapéutico, aSins. Sesion sina ase)aulaloe ARTETERAPA - ARQUETIOS E sIMBOLos decide, em Ultima andlise, quanto & configuragao que surgir; € um a priori inconsciente que nos leva a Criar for. mas (...) A imagem e a significago sao idénticas, ¢ Amati que a primeira assume contornos definidos, a Segunda se torna mais clara. (ibid: 141) Sobre este aspecto, diz Silveira | meio deste método, onde se conj descobriu o desdobramento de — 0 proceso de individuagio, Psicologia”. iWveira (19813102); «poy jugam imagem e ago, Jung um Processo inconsciente que € 0 préprio eixo de sua Seu trabalho com pacientes psicéticos nos Mos- tra o éxito do uso terapéutico das técnicas expressivas, ten- do a Psicologia Analitica como base. O processo psiquico desenvolve seu dinamismo por meio de imagens simbélicas. O simbolo (fruto da energia Psiquica, objetivada em imagens) traz a possibilidade de“... conhecer, compreender, refazer, recuperar, rememorar, re- parar estruturas e transcender”. (PHILIPPINI, 2000: 19) Nas produgoes artisticas, pode-se promover a trans- feréncia de energia de um nivel para outro. Por meio do Processo criativo, estabelece-se uma ponte entre extrapsi- quico € 0 intrapsiquico, que pode vir a curar a dissociagao entre as revelagdes internas e externas. Ao criar uma obra, estabelego uma relacdo extrapsiquica com esse chistes simultaneamente, uma relagao intrapsiquica com o contel- | do que a originou; a imagem passa a ser viva, atuante € po deré ter eficdcia criativa. A Arteterapia, sob a otica joe eae a . ae tendéncia y Parte do principio que a vida psiquica tem a ae | inata a organizacao e que o processo terapéutico, Poy ee, da arte, podera dinamizar esta tendéncia. As ae materiais escolhidos fundem-se a“... energia psiquica soa e 0 material (.,.) que ela escolher, criando, express? 34 "se deseja” (FUSSI, in Vi 0004. rencial junguiano, os simbolos sio parte do p toconhecimento e transformagao, “... atuam Alcangam dimensdes que o conhecimento racional nao atingir. Transmitem intuigdes altamente estimulantes, pre- nunciadoras de fendmenos ainda desconhecidos” (SILVEI- RA, 1994: 85). Conectam a esséncia de cada ser, atuando diretamente no eixo Ego-Self e apontando o rumo que a_ energia psiquica segue. Sao, assim, os norteadores do cami-_ nho que o arteterapeuta deve seguir. d Por facilitar a expressio das emogdes por meio de produgées artisticas, a Arteterapia é uma excelente forma de confrontar imagens sombrias. Proporciona oportunida- des de a imaginagio desenvolver-se livremente e permite ao individuo participar concretamente do produto imagi- nado. O exorcismo das imagens aterradoras reduz seu im- pacto, tornando-as mais familiares. A arte despotencializa a carga emocional dessas imagens e facilita tanto sua decodifi- cagao quanto a reorganiza¢ao interna e a reconstrugao da realidade, Expressando por meio da arte os fragmentos de um ego cindido, ou de um conflito vivenciado desordenada e dolorosamente, o individuo conseguir libertar-se dessas | imagens aprisionadas e aprisionantes. O arteterapeuta lida diretamente com a capacida- de simbélica da comunicagao naoverbal. Uma vez que a Arteterapia leva “...4 materializagao de simbolos” (PHI- — LIPPINI, 1998: 5), torna-se um instrumento “interme- diario”, que possibilita agrupar processos inconscientes € 0s situar, aos poucos, discriminadamente no ciente. As técnicas utilizadas possibilitam los sejam expressos livremente. ARTETERAPIA - ARQUETIPOS E SIMBOLOS Tais criagdes simbélicas ..expressam e representam niveis profundos e inconscien- tes da psique, configurando um documentério que permite © confronto, no nivel da consciéncia, destas informagées, propiciando insights e posterior transformagao e expansao da estrutura psiquica. (ibid: 6) A analise simbdlica (a interpretagao do simbolo) se da tanto no nivel objetivo quanto no subjetivo. No pri- meiro, busca-se relacionar os conteldos emergentes com a realidade da pessoa, vinculando-os a fatos, pessoas, situ- agGes reais € ao que possa ter provocado tal emersao. No segundo, os contetidos emergentes sao vistos como aspec- tos e possibilidades do individuo, visando a tornar mani- festo um conteido latente. Para tanto, o arteterapeuta pode utilizar a interagao entre técnicas artisticas e o verbal, langando mao de dese- nhos, pinturas, colagem de papéis ou outros materiais, mo- delagem, esculturas, expressdes corporais, psicodrama, ritmos, canto; ou ainda armar um brinquedo, explorar con- teiidos emergentes na vivéncia de fantasias dirigidas, na montagem de uma caixa de areia, na criag3o e na interpre- tacao de personagens, no movimento, na postura ou na ex- pressio corporea, entre tantas outras variagdes de técnicas criativas, que podem ser plasticas, artesanais, corporais, dra- maticas, literdrias, musicais, ‘Tais recursos s4o utilizados de forma integrada ou isolada, conforme a necessidade de cada paciente e 0 objets cum-ambulagio (os mace . novos recursos para a exploracao de outras rey trazendo um novo sentido ao contetido expresso), Por facilitar a visualizagao dos simbolos, 0 proces arteterapéutico acarreta um grande volume de imagens, po meio das quais 0 terapeuta tem acesso ao universo imagina- rio de seu cliente e observa os mais diversos registros, car- regados de imagens arquetipicas. Ao arteterapeuta, cabe «a sensibilidade para acolher as imagens simbélicas que re- presentam a transformagao dessa energia (psiquica), criando condigSes para que as imagens do inconsciente encontrem | formas de expressio. Essas imagens proprias da percepgao do mundo (interno) trazem recursos importantes para am- pliarmos o aprendizado do outro © aprendermos a partir dessa relagao. (PHILIPPINI 2000, in Fussi, 2000: 144) Trata-se, portanto, de “...um trajeto, marcado por sim- bolos, que assinalam e informam sobre estagios da jornada da individuaggo de cada um” (PHILIPPINI, 1998: 7) e se mani- festam por meio de analogias, das associagées e das varias des- cobertas que ocorrem no enfrentamento do sujeito durante a criagio de sua obra ou com ela. Sendo assim, 0 percurso arteterapéutico em uma abordagem junguiana busca forne- cer “.,.suportes materiais adequados para que a energia pst- quica plasme simbolos em criagGes diversas. Estas produgdes simbélicas retratam miltiplos estagios da psique, ativando e realizando a comunicagio entre inconsciente e conscient (PHILIPPINI, 2000: 17). Podem, entao, inconscientes. Todos os processos ¢ efeitos de psiquica, representados pictoricamente sao, + representagao objetiva ou consciente, simbélicos, quer d ver, indicam da melhor maneira possivel, e de forma aproxi- mada, um sentido que, por enquanto ainda é desconhecido. (JUNG, vol. XV § 207) Nessa experiéncia, 0 individuo pode viver o simbolo — isto é, permitir-se ser tocado emocionalmente por ele — © conectar-se com as lembrangas de sua historia de vida na perspectiva do simbolo vivificado, com as memorias dos antepassados por meio dos contetidos miticos vinculados aquele simbolo e com as possibilidades presentes no signifi- cado arquetipico da imagem simbolica. No pensamento de Jung, a criatividade reves- te-se de uma extrema importancia. De fato, ele afir- ma que, “... do ponto de vista psicolégico, é possivel distinguir cinco grupos principais de fatores instin- tivos, a saber: a fome, a sexualidade, a atividade, a reflexao e a criatividade” (JUNG, vol. VIII/II § 55). Nem tudo que € criativo é artistico, mas tudo que é artistico é criativo. Ao usar a arte no processo de individuacdo, ajudamos a abrir o canal da criativi- dade, o canal de fazer cultura como forma de so- brevivéncia, nao so fisica como psiquica. Para o ser humano, nao basta sé a nutrigdo organica, viver para procriar e se alimentar; ele precisa de um sentido na vida, busca a conexao com sua alma. A criativi- dade &@ um potencial inerente ao homem, e a su: realizagao € uma necessidade. tadora do encontro com © numinoso, O numinoso, do Jung é ++ uma instancia ou efeito dinamico nao causado por um ato arbitrario da vontade. Pelo contrario, ele arrebata e controla © sujeito humano, que é sempre antes sua vitima que seu criador. O numinoso é tanto uma qualidade pertinente a um objeto visivel, como a influéncia de uma presenga invistvel, que produzem uma modificagao especial na consciéncia. (Vol. VIII/II § 216) Esse contato com o numinoso foge inteiramente 4 nossa vontade, embora algumas pessoas 0 busquem por meio de drogas, praticas religiosas ¢ outros caminhos. © numino- so no pode ser conquistado, o individuo pode somente abrir-se para ele. Quando nos deparamos com o numinoso, essa emogao é impossivel de ser descrita. Nao ha explica- so, mas traz sempre uma mensagem misteriosa, enigmatica e profundamente impressionante. Desde épocas arcaicas, a arte funciona como um meio de apreensao e reconhecimento das coisas significativas do homem, tanto nas suas experiéncias externas quanto inter- nas. Escrevendo uma poesia, tocando uma musica, pintan- do ou dangando, somos capazes de trabalhar com for ibando, ao contrario, “nds o novo referencial”. ( Por tras do impulso criativo profundo de compromisso, um esta Z t com um todo que esta além de nés. Quando esse ele- mento de uniao é injetado em nossas formas de expres- sao, atingimos algo que ultrapassa a mera criatividade, o simples propésito ou a mera dedicagao; “atingimos um estado em que agimos por forga do amor. O Amor est4 relacionado 4 perpetuagao da vida e, portanto, ir- revogavelmente ligado a nossos valores mais profundos.” (NACHMANOVITCH, 1993:166) Ao nos conectarmos com esse Amor, nosso estado de consciéncia se transforma. Diante da su- prema Alteridade e do eterno Amor, © ser humano entra em um estado mistico. Tudo fica numinoso € carregado de energia divina. (BOFF, 2002) No sul do México, 0 povo Nautle chama os artis- tas de Tehuani, que significa “aquele que se conecta com Deus”. Pois, por meio da arte, conectamo-nos com a Totalidade. Como diz Jung, por meio da arte, “se toca as regides profundas da alma, salutares e libertadoras, onde o individuo nao se segregou ainda na solidao da nsciéncia, seguindo um caminho falso e doloroso. col s vibram Tocou as regides profundas, onde todos os sere: em unissono...”. (Vol. XV § 161) Nesse momento, experimentamos um poder supe- rior dentro de nés, um fator desconhecido em si, © Numi- noso. Nao podemos defini-lo, ou entendé-lo, mas, por meio da arte, podemos pratica-lo. uma pratica terapéutica que se utiliza de diferentes recur- sos expressivos, como as artes plasticas e cénicas, a a misica, a expressao corporal e a literatura, como aliadas em uma leitura simbélica do fazer artistico, Afinal, pintar, desenhar, cantar e representar constitui formas contundentes ¢ instigantes de manifestagao do “eu”. As expressdes artisticas, portanto, vém se tornando uma im- portante ferramenta terapéutica. Proporcionam um espago para revelacao de sentimentos, uma abertura para a vida e todas as possi dades desta. Por meio do proceso criativo, estabelece-se uma ponte entre o extrapsiquico € o intrapsi- quico, que pode vir a curar a dissociaggo entre as revelagbes internas e externas. Pois, ao criar uma obra, estabelego uma relagdo extrapsiquica com esse objeto e, simultaneamente, 4 uma relasio intrapsiquica com 0 contetdo que a originow, A arte traz em si uma possibilidade de tradugao de imagens e representagdes mentais em expresso, trazendo © mundo interno para o concreto e possibilitando ao sujei- to visualizar concretamente sua transformagao. Percebemos que a linguagem do inconsciente ¢ uma linguagem simbélica ¢ que a arte, assim como os sonhos, seria uma forma de comunicagao desse inconsciente. A Arteterapia favorece esse processo, estruturando ome nao s6 reage; ele age, ele prediz, ele alerta, ela abre horizon- tes, ele elucida. Sendo a escrita do inconsciente See mente imagética, a Arteterapia ¢ o meio eficaz para captar e expressar essas imagens, trazendo-as para sua expresso ma- terial, abrindo-se para a integragao 4 consciéncia. Trabalhando com processos pré-verbais, a Artetera- pia, além de interiorizar esse mergulho no inconsciente, aju-- da na expressao desses contetidos, trazendo imagens de uma meméria ancestral. E nesse processo de inteireza de ser, a gente realiza no individuo a historia do homem, a coletivi- dade, a totalidade. REFERENCIAS BOFF, L. A Aguia e a Galinha. Petropolis: editora Vozes, 2002. CARVALHO, M. M. J. Ed. 4 Arte Cura? Sao Paulo: Editorial Psy Il, 1995. CHEVALIER e GHEERBRANT. Diciondrio de Simbolos. Rio de Janeiro: Editora José Olympio, 1988. CHIESA, R. F. 0 Didlogo com 0 Barro: 0 Encontro com o Criativo. S30 Paulo: Casa do Psicdlogo, 2004. DINIZ, L. A Gnose Através da Arte. In: Imagens da Transformagao, 5, 63 - 68. Rio de Janeiro: Pomar, 1998. FUSSI, F. E. C. (2004), Satide Mental: uma Vivéncia de Arte ¢ Criativi- dade. In VALLADARES, A. C. Arteterapia no Novo Paradigma de Atengio em Satide Mental. Si Paulo: Vetor, 2004. a2 JACOBI, J. Complexo, Arquétipo e Simbolos. Si0 Paulo: IG, C. G. Memérias, Sonhos e | Arte: Linguagem da alma JUNG, C. G. 0 Homem ¢ seus Simbolos. Rio de Janeiro: Edito Fronteira, 1964. OC.Vol. 8/2.A Natureza da Psique. Petrdpolis; EditoraVozes. OC. Vol.15. O Espirito na Arte e na Ciéncia. Petrépolis: Editora Vozes. OC. Vol. 11. Psicologia e Religido. Petrépolis: Editora Vozes. OC. Vol. 10 e 11. Escritos diversos. Petrépolis: Editora Vozes. OC. Vol. 18. Vida Simbélica. Petrépolis: Editora Vozes. OC. Vol.9/1. Os Arquétipos e 0 Inconsciente Coletivo. Pe- tropolis: Editora Vozes. NACHMANOVITCH S. (1993). Ser Criativo, Sao Paulo: editora Summus. PHILIPPINI, A. Mas 0 que é mesmo Arteterapia? Imagens da Transfor- macio, 5, 4 - 9. Rio de Janeiro: Pomar, 1998. PHILIPPINI, A. Cartografias da Coragem: Rotas em Arteterapia. 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