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A ATIPICIDADE DA CONDUTA.

O artigo 19 do Decreto-Lei n.º 3.688/41 (Lei das Contravenções


Penais) tipifica a conduta de “trazer consigo arma fora de casa ou de dependência desta,
sem licença da autoridade” (porte de arma), sujeitando o infrator à pena de prisão
simples de quinze dias a seis meses, ou multa, ou ambas de forma cumulativa.
O dispositivo legal estava em vigor desde 1942, quando passou
a ter vigência a Lei das Contravenções Penais, sendo que na ocasião tinha incidência a
todo e qualquer tipo de arma (armas de fogo e armas brancas).
Todavia, no ano de 1997, com o advento da Lei n.º 9.437/97, a
Lei das Contravenções Penais deixou de ter aplicação. Nos dias atuais, com a revogação
da Lei n.º 9.437/97, o porte de arma de fogo está tipificado na Lei n.º 10.826/03.
Desta forma, consoante o que dispõe o artigo 19 da Lei de
Contravenções Penais, a conduta de portar arma branca é atípica.
Sobre o assunto, valiosos são os ensinamentos de Fernando de
Oliveira Domingues Ladeira:
“(...) o Princípio da Legalidade como norma-princípio que visa preservar a
esfera individual de interferências estatais indevidas estabelece que ninguém é obrigado a fazer ou deixar
de fazer alguma coisa senão em virtude de lei. Desta feita, não havendo legislação de qualquer natureza
que imponha ao indivíduo a obtenção de autorização para o transporte, posse ou porte de armas
impróprias, quais sejam, facões, canivetes, machados e tantos outros, não se perfaz a tipicidade se é o
agente encontrado munido destes instrumentos, pois a conduta mostra-se atípica lícita.” (LADEIRA,
Fernando de Oliveira Domingues. Análise à Luz das Garantias Individuais do Art. 19 da Lei de
Contravenções Penais [Decreto-Lei n. 3.688/41]. Publicado no Boletim IBCCrim, n. 169, de dezembro de
2006, p. 07).

Isso porque, não há qualquer regulamentação a respeito de como


se dá a obtenção de licença da autoridade para portar arma branca.
Nesse sentido, vale colacionar recente decisão do Tribunal de
Justiça do Estado de Minas Gerais, que, ao julgar um Habeas Corpus impetrado pela
Defensoria Pública, trancou ação penal em que o paciente foi denunciado e estava sendo
processado como incurso no artigo 19 da Lei das Contravenções Penais:

PORTE DE ARMA BRANCA – ART. 19 DA LEI DE


CONTRAVENÇÕES PENAIS (DECRETO-LEI 3.688/41) – PORTE DE
FACA DE COZINHA EM VIA PÚBLICA – ATIPICIDADE FORMAL
DA CONDUTA – AUSÊNCIA DE REGULAMENTAÇÃO
ESPECÍFICA PARA OBTENÇÃO DA LICENÇA EXIGIDA PELO
TIPO PENAL – NECESSIDADE DE TRANCAMENTO DA AÇÃO
PENAL – ORDEM CONCEDIDA. A ausência de lei que regulamente o
porte de arma branca inviabiliza a aplicação do art. 19 do Decreto-Lei
3.688/41. Não se pode deixar ao alvedrio do operador do direito determinar,
caso a caso, quais condutas considera típica e quais considera atípica, sob
pena de violação aos princípios da legalidade, da taxatividade e da segurança
jurídica. Se a denúncia não expõe o fato criminoso com todas as
circunstâncias, se olvidando de esclarecer qual licença da autoridade que o
agente não detinha, torna-se imperiosa a rejeição da exordial acusatória, nos
termos do art. 395, I, do CPP. Ordem concedida. (TJMG, Habeas Corpus
Criminal1.0000.14.090705-6/000, 1ª Câmara Criminal, Rel. Des. Flávio
Leite, julgado em 18/12/2014, extraído do site www.tjmg.jus.br) (grifo
nosso).

Desta forma, criar uma obrigação de não fazer com base em


uma ideologia manifestamente contrária ao interesse público, como é o caso em pauta,
além de inconstitucional é imoral e fere, com gravidade, o ordenamento jurídico e a
própria democracia pela qual todos têm a obrigação de zelar, e, por isto, deve a sentença
de primeiro grau ser mantida, no que se refere à absolvição quanto ao delito previsto no
artigo 19, da Lei 3.688/41.

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