Professional Documents
Culture Documents
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE. Cidades Do Amanhã. HALL, Peter. 2009.
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE. Cidades Do Amanhã. HALL, Peter. 2009.
- ciQAcoôG^G.
D a d o s Internacionais d e C a t a l o g a ç ã o na P u b l i c a ç ã o ( C I P )
( C â m a r a Brasileira do Livro, SP, Brasil)
Hall, Peter
Cidades do a m a n h ã : uma história intelecaial do
planejamento e do projeto urbanos no século X X / Peter Hall ;
[tradução Pérola de Carvalho], — São P a u l o : Perspectiva,
2009. — (Estudos ; 123 / dirigida por J. G u i n s b u r g )
05-3812 CDD-711.40904
L-eJ.
Para Berkeley
UFRN
2010066266
J
[...] as grandes cidades da terra... tornaram-se... centros asquerosos de fornicação
e cobiça — a fumaça que se exala de seus pecados penetra na face dos céus como
a fornalha de Sodoma; e sua poluição putrefaz e pulveriza os ossos e as almas da
gente do campo que vive ao redor delas, como se cada uma fosse um vulcão cujas
cinzas arrebentassem em pústulas sobre homens e animais.
J o h n R u s k i n
Letters to lhe Clergy on the Lord's Prayer and the Church (1880)
E m 1880, J a m e s T h o m s o n , p o e t a c u j a i n d u s t r i o s i d a d e v i t o r i a n a
j a m a i s f o i r e c o m p e n s a d a g r a ç a s à s u a m o n u m e n t a l falta d e talento,
p u b l i c a v a u m a v e r s a l h a d a insípida s o b u m título i n s p i r a d o na o f e -
r e n d a inicial: i n t e r m i n á v e l e s u b d a n t e s c a e x c u r s ã o p e l o s u b m u n d o .
O s v e r s o s f o r a m l o g o e s q u e c i d o s , m a s o título, The City of Dreadful
Night, n ã o . I s s o t a l v e z p o r q u e o horror da c i d a d e vitoriana, d e noite
o u d e dia, l o g o s e t o r n o u u m d o s m a i o r e s t e m a s da d é c a d a . A s linhas
de abertura do poema de Thomson
* " A Cidade pertence à Noite, quiçá à Morte, / Mas à Noite é certo, que o hálito
fragrante jamais / Ali, da lúcida manhã entra por sorte / Depois que da manhã o ar,
plúmbeo e frio, encharca-lhe os umbrais." (N. da T.)
18 CIDADES DO A M A N H Ã
O GRITO AMARGO
Poucos dos que lêem estas páginas sequer concebem o que são estes pestilentos
viveiros humanos, onde dezenas de milhares de pessoas se amontoam e m meio a
horrores que nos trazem à mente o que ouvimos sobre a travessia do Atlântico por
um navio negreiro. Para chegarmos até elas é preciso entrar por pátios que exalam
gases venenosos e fétidos, vindos das poças de esgoto e dejetos espalhadas por toda
a parte e que amiúde escorrem sob os nossos pés; pátios, müitos deles, onde o sol
jamais penetra, alguns sequer visitados por um sopro de ar fresco, e que raramente
conhecem as virtudes de uma gota d'água puríficante. É preciso subir por escadas
apodrecidas, que ameaçam ceder a cada degrau e, e m alguns casos, j á rufram de
todo, c o m buracos que põem em risco os membros e a vida do incauto. Acha-se o
caminho às apalpadelas, ao longo de passagens escuras e imundas, fervilhantes de
vermes. E então, se não forem rechaçados pelo fedor intolerável, poderão os senhores
2.1 A pequenina Rua Collingwood, Bethnel Green. c. 1900
Os "pobres respeitáveis" da é p o c a vitoriana, provavelmente pertencentes à classe
C de Booth, e m suas aviltantes moradias.
20 CIDADES DO A M A N H Ã
penetrar nos pardieiros onde esses milhares de seres, que pertencem, como todos nós,
à raça pela qual Cristo morreu, vivem amontoados como reses 5 .
Paredes e teto estão negros com as acreções da imundície que sobre eles se foi
acumulando ao longo dos anos de abandono. Imundície que transpira pelas fendas
do forro de tábuas, escorre pelas paredes, está em toda a parte. O que atende pelo
nome de janela é apenas metade disso, entuchada de farrapos ou tapada com tábuas
que impedem a entrada da chuva e do vento; o resto é tão encardido e escuro que
s ó a muito custo deixa a luz entrar e permite a quem está de fora enxergar alguma
coisa 6 .
O m o b i l i á r i o p o d e c o m p o r t a r " u m a c a d e i r a q u e b r a d a , os restos
vacilantes d e u m a a r m a ç ã o d e c a m a , ou u m s i m p l e s f r a g m e n t o d e
m e s a ; m a s será m a i s c o m u m e n c o n t r a r m o s r u d e s substitutos para
e s s a s coisas, tais c o m o t á b u a s d u r a s e m c i m a de tijolos, u m c e s t ã o
o u u m a caixa e m b o r c a d o s n o c h ã o , ou m a i s f r e q ü e n t e m e n t e a i n d a ,
nada além de cacos e farrapos"7.
E s t á m o n t a d o o c e n á r i o para os h o r r o r e s h u m a n o s q u e d e n t r o
d e l e se d e s e n c a d e i a m .
Cada quarto, nessas podres e fétidas moradias coletivas, aloja uma família,
muitas vezes duas. U m fiscal sanitário registra e m seu relatório haver encontrado,
num porão, o pai, a mãe, três crianças e quatro porcos! Noutro, um missionário
encontrou um homem com varíola, a mulher na convalescença de seu oitavo parto,
e as crianças zanzando de um lado para o outro, seminuas e cobertas de imundície.
Aqui estão sete pessoas morando numa cozinha no subsolo, e ali mesmo, morta, jaz
uma criancinha. Em outro local estão uma pobre viúva, seus três filhos e o cadáver
de uma criança morta há treze dias. Pouco antes, o marido, um cocheiro, se havia
suicidado".
N o u t r o q u a r t o v i v i a m u m a v i ú v a e s e u s seis filhos, e n t r e os
q u a i s u m a m o ç a d e 2 9 a n o s , outra de 2 1 , e u m r a p a z d e 2 7 . O u t r o
a l o j a v a pai, m ã e e seis f i l h o s , d o i s d e l e s c o m escarlatina. N o u t r o ,
n o v e i r m ã o s e irmãs, d e 2 9 a n o s para b a i x o , v i v i a m , c o m i a m e d o r -
m i a m j u n t o s . A i n d a noutro, h a v i a " u m a m ã e q u e m a n d a o s f i l h o s
p a r a a r u a a s s i m q u e c h e g a a noite, p o r q u e a l u g a o q u a r t o p a r a fins
i m o r a i s até m u i t o d e p o i s d a meia-noite, q u a n d o o s p o b r e c o i t a d i n h o s
v o l t a m e n g a t i n h a n d o , se n ã o e n c o n t r a r a m a l g u m a b r i g o m i s e r á v e l
e m qualquer parte".
O r e s u l t a d o inevitável foi o q u e c h o c o u o p ú b l i c o d e M e a r n s ,
t a n t o q u a n t o o h o r r o r físico:
Perguntem se os homens e mulheres, que vivem juntos nesses antros, são ca-
sados, e a simploriedade da pergunta provocará um sorriso. Ninguém sabe. Ninguém
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE 21
P a r a a c l a s s e m é d i a vitoriana, talvez t e n h a s i d o e s s e o r e t r a t o
mais chocante de todos.
A v e r d a d e era que, a r g u m e n t o u M e a r n s , para g e n t e t ã o literal-
mente carente, o crime compensava. Rondando Leicester Square,
havia ' 'vários membros conhecidíssimos do famoso bando dos 'qua-
renta ladrões' que, freqüentemente mancomunados c o m mulheres d e
r u a , s a e m d e p o i s d o e s c u r e c e r para assaltar o s t r a n s e u n t e s e m O x f o r d
S t r e e t , R e g e n t Street e o u t r o s l o g r a d o u r o s " . A aritmética d o c r i m e
e r a i n e x o r á v e l : " U m a c r i a n ç a d e sete anos, c o m o é fácil v e r i f i c a r ,
f a z 10 x e l i n s e 6 pence p o r s e m a n a r o u b a n d o , m a s o q u e p o d e r i a
e l a g a n h a r f a z e n d o c a i x a s d e f ó s f o r o s p a g a s a 2 pence e 1/4 a g r o -
s a „ . ? P a r a g a n h a r t a n t o q u a n t o o l a d r ã o z i n h o , teria q u e f a z e r 5 6
g r o s a s d e c a i x a s d e f ó s f o r o s p o r s e m a n a , ou 1 2 9 6 c a i x a s p o r d i a .
Inútil d i z e r q u e isso é i m p o s s í v e l . . . " 1 0
N a raiz d o p r o b l e m a e s t a v a o f a t o d e q u e a g e n t e d o c o r t i ç o
e r a i n e l u t á v e l e o p r e s s i v a m e n t e p o b r e . R e m a t a d e i r a s de c a l ç a s tra-
b a l h a v a m d e z e s s e t e h o r a s , d a s 5 : 0 0 d a m a n h ã às 1 0 : 0 0 da noite, p o r
u m x e l i m ; s e r e m a t a s s e m c a m i s a s , o p a g a m e n t o caía para a m e t a d e
disso. D o e n ç a e bebida c o m p u n h a m sua condição:
Para Mearns,
Esses coitados precisam viver em algum lugar. Não podem dar-se ao luxo de
ir de trem ou de bonde para os subúrbios, c como, com seus pobres e famintos corpos
emaciados, podemos deles esperar — além de trabalharem doze horas ou mais, por
um xelim ou menos — que caminhem três ou quatro milhas na ida e depois outras
tantas na volta? 1 4
A C O M I S S Ã O R E A L B R I T Â N I C A D E 1885
A s p a l a v r a s d e M e a r n s t o c a r a m e m c o r d a sensível. E m b o r a al-
g u n s c o m e n t a r i s t a s , c o m o o M a r q u ê s d e Salisbury, p e n s a s s e m e m
t e r m o s d e e n c a r g o s caritativos, e o u t r o s , c o m o J o s e p h C h a m b e r l a i n ,
e m t e r m o s d e a ç ã o d a a u t o r i d a d e local, v e r i f i c o u - s e u m a d i s p o s i ç ã o
geral p a r a c h e g a r e m todos a u m a i n t e r v e n ç ã o conjunta 1 5 . A t é o Ti-
mes, a o e x t e r n a r s u a d e s a p r o v a ç ã o , o b s e r v a v a q u e " n ã o há d ú v i d a
p o s s í v e l , pois, s e e x a m i n a r m o s as t e n d ê n c i a s d a é p o c a , v e r e m o s q u e
o laissez-faire está p r a t i c a m e n t e p o s t o d e l a d o e q u e a g o r a c a d a p e ç a
d a i n t e r f e r ê n c i a estatal irá abrir c a m i n h o p a r a outra, e a s s i m s u c e s -
s i v a m e n t e " ' 6 . E foi o p r ó p r i o Salisbury q u e m , n u m d i s c u r s o crucial-
m e n t e i m p o r t a n t e d e n o v e m b r o d e 1884, l e v a n t o u a q u e s t ã o d a in-
t e r v e n ç ã o estatal 1 7 . L o g o a p ó s , a c o n t e c i a a n o m e a ç ã o d e u m a C o -
m i s s ã o Real d e peso, presidida p o r Sir C h a r l e s W e n t w o r t h D i l k e , e
q u e incluía entre s e u s m e m b r o s o P r í n c i p e d e Gales, L o r d e Salisbury
e o c a r d e a l M a n n i n g . M a s e m b o r a o relatório d a C o m i s s ã o d e 1885
confirmasse, à saciedade, a natureza d o problema, não obteve una-
n i m i d a d e p a r a o r e m é d i o . C o n c l u í a ele, e x p l i c i t a m e n t e :
Primeiro: ainda que tivesse havido muitos progressos... na condição das mora-
dias para o pobre, em comparação com o que ocorrera trinta anos atrás, os males da
superlotação, especialmente e m Londres, continuavam sendo um escândalo público
s ã
, - "o
I .s
-§ K
I I
§ -8
O s
- l SD
« S
Ü Sá
<1 o O
o C3
C Ê
« g fe
gí C 00
-s & 0
I« I» £I
£ co o
g. K E
(V d3 rtn
-s 3 «
-a ^
£ C/3 âi-
C5 3 |
H £
c- '-3 o
-'3
§
s> gc -s
a
S O
Z «n
24 CIDADES DO AMANHÃ
F i c o u p l e n a m e n t e e v i d e n c i a d o q u e o n o r m a l , e m L o n d r e s , era
u m a f a m í l i a o c u p a r u m quarto, e q u e e s s a f a m í l i a p o d i a ser até m e s -
m o d e oito p e s s o a s . O p r o b l e m a fazia-se mais a g u d o visto q u e o
c o s t u m e , na capital, era d i v i d i r e m - s e as casas e m c ô m o d o s a l u g a d o s
d e u m s ó quarto, t e n d o t o d o s q u e partilhar u m a ú n i c a b i c a d ' á g u a
e u m a ú n i c a latrina. E c o m o a porta da f r e n t e r a r a m e n t e era f e c h a d a ,
à noite as e s c a d a s e os c o r r e d o r e s p o v o a v a m - s e d o q u e a gíria bri-
tânica c h a m a v a i r o n i c a m e n t e de appy dossers*: o u sem-teto 1 9 . D e n -
tro d o s q u a r t o s , a prática a b e r t a m e n t e d i f u n d i d a d a indústria caseira
— f r e q ü e n t e m e n t e insalubre, c o m o coleta d e trapos, f a b r i c o d e s a c o s
o u d e c a i x a s d e f ó s f o r o s , e s c o r c h a m e n t o d e c o e l h o s — t o r n a v a piores
a s c o n d i ç õ e s j á ruins 2 0 . N a s c i d a d e s d o interior, g u a r d a d a s as d i f e -
r e n ç a s , p o r t o d a a parte s e repetia o p r o b l e m a d a s u p e r l o t a ç ã o , s ó
q u e n ã o tão g r a v e q u a n t o e m Londres 2 1 .
P a r a a l g u n s , c o m o o v e t e r a n o r e f o r m a d o r social L o r d e S h a f t e s -
bury, o sistema de quarto único estava "física e moralmente além
d e q u a l q u e r descrição:
Estava eu dizendo que nós não ousamos contar tudo o que sabemos e, de minha
parte, ficaria muito constrangido s e tivesse que entrar e m pormenores sobre coisas
que desconheço; mas darei um e x e m p l o das péssimas conseqüências do sistema de
quarto único, e e x e m p l o que não é dos piores. Este caso aconteceu no ano passado,
mas casos desses acontecem c o m freqüência. U m amigo meu, diretor de um grande
estabelecimento escolar, descendo a um dos pátios do fundo, viu, no corredor, duas
crianças de tenra idade, d e z ou o n z e anos, e m pleno ato sexual. Ele correu, agarrou
o menino e o arrastou para fora, e a única observação do garoto foi esta: "Por que
é a m i m que o senhor está pegando? Lá embaixo há uns d o z e fazendo o m e s m o " .
Está claro que isso não provém de tendências sexuais e deve ter sido provocado por
imitação do que viram 2 2 .
í n d i c e s d e m o r t a l i d a d e — s o b r e t u d o d e c r i a n ç a s — p e r m a n e c i a m alar-
m a n t e m e n t e altos. A s que sobreviviam, segundo cálculos d a C o m i s -
s ã o , p e r d i a m e m m é d i a vinte d i a s d e t r a b a l h o n o a n o , ' 'por d e p r e s s ã o
e f a d i g a " . A g r e g u e - s e a t u d o isso o f a t o d e q u e " o m a i s f e r v o r o s o
a p o l o g i s t a d a s c l a s s e s m a i s p o b r e s n ã o a f i r m a r i a q u e nesse m e i o , d e
m o d o geral, p r e v a l e c e s s e m h á b i t o s d e l i m p e z a " 2 4 .
A s c a u s a s básicas, e x a t a m e n t e c o m o m o s t r a r a M e a r n s , e s t a v a m
n a p o b r e z a total e c o n s e q ü e n t e i n c a p a c i d a d e d e m u d a n ç a p a r a o u t r o
local. T r a b a l h a d o r e s l o n d r i n o s n ã o - q u a l i f í c a d o s , c o m o os a m b u l a n t e s
e o s m a s c a t e s , g a n h a v a m q u a n d o m u i t o d e 10 a 12 xelins p o r se-
m a n a ; d o q u e i r o s c o n s e g u i a m e m m é d i a a p e n a s de 8 a 9 xelins. Q u a s e
a metade das famílias londrinas, 4 6 % , precisavam dispender mais
d e u m q u a r t o d e s s e s m a g r o s p r o v e n t o s e m aluguel; e e n q u a n t o o s
aluguéis subiam, os ordenados continuavam os mesmos25. E à po-
b r e z a a g r e g a v a - s e a n a t u r e z a o c a s i o n a l d e s s e t r a b a l h o tão m a l p a g o ,
c o m o m a l p a g o e o c a s i o n a l e r a o trabalho q u e s u a s m u l h e r e s e x e -
c u t a v a m p o r e n c o m e n d a d e n t r o de c a s a ; d a í p o r q u e " u m a p r o p o r ç ã o
e n o r m e d o s m o r a d o r e s d e q u a r t e i r õ e s s u p e r p o v o a d o s era a i s s o c o m -
p e l i d a p a r a v i v e r p e r t o d o local d e trabalho, n ã o i m p o r t a n d o o p r e ç o
q u e tivesse q u e pagar pelo alojamento que ocupava nem quais fos-
s e m as c o n d i ç õ e s d e s s e a l o j a m e n t o " 2 6 . I n t e r m e d i á r i o s p r a t i c a v a m
u m a l o c a ç ã o e x t o r s i v a , a d m i n i s t r a v a m casas n u m s i s t e m a d e c o n t r a -
tos d e c u r t o p r a z o e e x p l o r a v a m e s c a n d a l o s a m e n t e a e s c a s s e z d e
m o r a d i a , s e m levar e m c o n t a s e u valor real. E as d e m o l i ç õ e s — p a r a
a a b e r t u r a d e n o v a s ruas, c o m o a C n a r i n g C r o s s R o a d ou a S h a f -
t e s b u r y A v e n u e , visto q u e L o n d r e s , p o r volta d e 1880, p a s s a v a p o r
u m a m i n i - h a u s s m a n n i z a ç ã o , o u para a c o n s t r u ç ã o d e n o v o s interna-
tos, e m d e c o r r ê n c i a d a L e i s o b r e E d u c a ç ã o d e 1870 — h a v i a m p i o r a d o
o problema27.
P o r b a i x o d i s s o t u d o , u m s i s t e m a d e g o v e r n o local i n c o m p e t e n t e
e a m i ú d e c o r r u p t o , i n e p t o n o m a n e j o d o s p o d e r e s d e que d i s p u n h a
ou simplesmente recusando-se a exercê-los. N o s arrabaldes de Lon-
d r e s , a histórica L e i d a S a ú d e P ú b l i c a , d e 1875, h a v i a f o r n e c i d o a
b a s e p a r a u m s i s t e m a d e g o v e r n o local m a i s efetivo 2 8 ; m a s n a capital
a i n d a v i g o r a v a u m m o d e l o a r c a i c o e caótico. A p e n a s dois c o n s e l h o s
p a r o q u i a i s ou j u n t a s distritais, d e n t r e o s 3 8 e x i s t e n t e s e m t o d a L o n -
d r e s , h a v i a m t o m a d o u m a o u outra p r o v i d ê n c i a m a i s e n é r g i c a . E r a m
p o u q u í s s i m o s o s inspetores: M i l e E n d , u m a á r e a p o b r e , p o s s u í a u m
p a r a 105 0 0 0 p e s s o a s . E o s q u e h a v i a e r a m d e p o u q u í s s i m a c o m p e -
tência: n u m a p a r ó q u i a l o n d r i n a , o auxiliar d o i n s p e t o r f o r a ' ' o u t r o r a
a l g u m a c o i s a n o c o m é r c i o d e j ó i a s " , d i s s e o sacristão, e a c r e s c e n t o u :
" N ã o c r e i o q u e s e j a n e c e s s á r i o q u a l q u e r t r e i n a m e n t o especial. S e
u m h o m e m f o r d o t a d o d e b o m s e n s o , a c h o q u e isso seria, p a r a ele,
o melhor treinamento que poderia ter"29.
26 CIDADES DO AMANHÃ
H . M . H y n d m a n , líder d a Social D e m o c r a t i c F o u n d a t i o n , e s c r e -
via, n o m e s m o ano, q u e " m e s m o entre h o m e n s e m u l h e r e s inúteis,
q u e a si p r ó p r i o s se a p e l i d a m d e ' s o c i e d a d e ' , c o r r e n t e s internas d e
m a l - e s t a r p o d e m ser detectadas. ' R e v o l u ç ã o ' , a p a l a v r a temível, é
às v e z e s dita e m v o z alta p o r brincadeira, e m a i s a m i ú d e c o c h i c h a d a
c o m t o d a a s e r i e d a d e " 4 " . Para H y n d m a n , o f e r m e n t o n ã o se restringia
à classe m é d i a , p o i s
[...] livros, panfletos e volantes metem-se por oficinas e sótãos, que discutem o proble-
ma e m toda a sua extensão e profundidade. Teorias extraídas da grande obra sobre o
Capital, do Dr. Karl Marx, ou do programa dos socialdemocratas da Alemanha e dos
coletivistas da França, estão sendo difundidas de forma barata e legível 4 '.
f a l g a r S q u a r e para o u v i r o s d i s c u r s o s . R e p e t e m - s e o s c h o q u e s c o m
a polícia. The Times, e m s u a s c o s t u m e i r a s r e f e r ê n c i a s a o s " c h a m a -
dos d e s e m p r e g a d o s " , clamava por u m a ação enérgica:
O p a l c o estava, p o r t a n t o , m o n t a d o . N o d o m i n g o , 2 3 d e o u t u b r o ,
u m a e n o r m e m u l t i d ã o reuniu-se n a praça, b a n d e i r a v e r m e l h a e r g u i d a ,
p a r a o u v i r d i s c u r s o s q u e p e d i a m a e x o n e r a ç ã o d e Sir C h a r l e s . P o u c o
a n t e s d a s 3 : 0 0 da tarde, e n c a b e ç a d o p e l a b a n d e i r a v e r m e l h a , o p o -
v a r é u r e p e n t i n a m e n t e d e s c e u para W h i t e h a l l e invadiu a A b a d i a d e
W e s t m i n s t e r d u r a n t e o o f í c i o religioso. A s c e n a s q u e se s e g u i r a m
a s s e m e l h a m - s e ao ato Final d a Dreigroschenoper (A Ópera dos Três
Vinténs) d e Brecht, a q u e m p o s s i v e l m e n t e i n s p i r a r a m . S e g u n d o The
Times, ' ' g r a n d e n ú m e r o d e m e n i n o s , r a p a z e s e h o m e n s , m u i t o s d e l e s
d e a p a r ê n c i a m u i t o s u j a " , entrou q u a n d o o ó r g ã o e x e c u t a v a u m solo.
M i s t u r a r a m - s e à c o n g r e g a ç ã o " c u j o s m e m b r o s m a i s v a l o r o s o s silen-
c i o s a m e n t e f a z i a m v a l e r s u a i n f l u ê n c i a n o s e n t i d o d e coibir o s m a i s
impudentes... Os brutamontes berravam palavras pesadas contra os
'capitalistas*, s u p o n d o , ao q u e parece, q u e t o d o s o s q u e e s t a v a m n a
A b a d i a , d u r a n t e o culto, f o s s e m ' c a p i t a l i s t a s ' . O c ô n e g o R o s w e l l
t e n t o u a r g u m e n t a r c o m eles. O p o p u l a c h o e s c u t o u , m u i t o q u i e t o " .
J á f o r a , H y n d m a n t o m o u a palavra: " A n t e v i a o t e m p o e m q u e a
b a n d e i r a e o l e m a socialista d e ' u m p o r t o d o s e todos p o r u m ' s e r i a m
c o l o c a d o s n o t o p o d a A b a d i a , e eles e s t a r i a m lá dentro, p r e g a n d o a
doutrina da r e v o l u ç ã o " " .
E m s e g u i d a , o s m a n i f e s t a n t e s voltaram à praça, o n d e " e m t o r n o
d a c o l u n a d e N e l s o n , m u l t i p l i c a v a m - s e os c o m í c i o s " , c o m u m a e n o r -
m e m u l t i d ã o a e s p a r r a m a r - s e pela p r a ç a , i n v a d i n d o r u a s vizinhas. A
p o l í c i a e n t r o u e m p â n i c o e teve q u e r e c o r r e r a o e x é r c i t o p a r a c o n -
trolar a m u l t i d ã o ; na mêlée, m a i s d e c e m p e s s o a s f o r a m feridas; m a i s
tarde, d u a s m o r r e r a m . S e g u i r a m - s e r e c r i m i n a ç õ e s m a c i ç a s e m ú t u a s .
U m missivista i n d i g n a d o e s c r e v e u ao Times q u e o s c o m í c i o s e r a m
" u m a v i s o para q u e t o d o s o s anarquistas, d a q u i e d e toda a parte,
a c o r r e s s e m e m m a s s a p a r a a ú n i c a g r a n d e capital d o m u n d o o n d e
iriam ser t o l e r a d o s " 3 2 . J á H y n d m a n e s c r e v i a d e n t r o d e o u t r a p e r s -
pectiva: " H o m e n s e mulheres não mais passarão fome. Disso estou
certo. A a g i t a ç ã o d o s d i a s d e h o j e é t o t a l m e n t e e s p o n t â n e a e n ã o
o r g a n i z a d a " . O e n f o q u e editorial era previsível: " E s t a m e s m a c a -
pital v e m s e n d o a m e a ç a d a p e l a p l e b e a m o t i n a d a q u e s e d e c l a r a aber-
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE 31
O s r e s u l t a d o s e r a m previsíveis: e n q u a n t o a m é d i a de i d a d e p a r a
m o r r e r e r a d e 5 5 a n o s entre o s nobres, os a b o n a d o s e o s p r o f i s s i o n a i s
d a I n g l a t e r r a e d e G a l e s , e n t r e o s artesãos d o L a m b e t h b a i x a v a p a r a
2 9 ; a m o r t a l i d a d e infantil, e m B e t h n a l G r e e n , era o d o b r o d a r e g i s -
trada e m B e l g r a v i a 6 4 .
N a v i s ã o d o s c o n t e m p o r â n e o s , era a m o r a d i a o CÊme_dja_prex=--
b l e m â i ^ A q u e s t ã o habitacional era o p r o b l e m a central de L o n d r e s
n o s a n o s 8 0 d o s é c u l o X I X " ; " d e 1 8 8 3 e m diante, os j o r n a i s tri-
m e s t r a i s e a i m p r e n s a e m geral e n c h e r a m - s e d e a d v e r t ê n c i a s s o b r e
a n e c e s s i d a d e d e r e f o r m a i m e d i a t a p a r a a f a s t a r - s e a a m e a ç a de r e -
v o l u ç ã o " 6 5 . S e g u n d o o s f a b i a n o s , s ó h a v i a u m a saída: " O r e a l o j a -
m e n t o d o s p o b r e s d e L o n d r e s s ó p o d e ser a d e q u a d a m e n t e t r a t a d o
pelo poder público de Londres"66. Entre a primeira e a segunda
e d i ç ã o d o p a n f l e t o Facts, e s s a assertiva tornara-se m u i t o m a i s r e a -
lista e p r a t i c á v e l , visto que, o b e d e c e n d o à r e c o m e n d a ç ã o d a C o m i s -
s ã o R e a l para a M o r a d i a , a lei d o g o v e r n o local d e 1888 t r a n s f e r i r a
as r e s p o n s a b i l i d a d e s d a J u n t a M e t r o p o l i t a n a d e T r a b a l h o p a r a u m
n o v o g r u p o d e m o c r a t i c a m e n t e eleito, o L o n d o n C o u n t y C o u n c i l
( C o n s e l h o d o C o n d a d o d e L o n d r e s ) . E , e m 1890, outra L e i para a
M o r a d i a d a s C l a s s e s T r a b a l h a d o r a s f e z o q u e a L e i de 1885 n ã o
c o n s e g u i r a realizar: dispôs, na Parte III, q u e se r e u r b a n i z a s s e m g r a n -
d e s áreas, c o m a q u i s i ç ã o c o m p u l s ó r i a se necessário, para a c o n s t r u -
ção de casas de c ô m o d o s para a classe trabalhadora, abrangendo
e s s a d e f i n i ç ã o " c a s a s isoladas o u c h a l é s p a r a as c l a s s e s t r a b a l h a d o -
ras, q u e r c o n t i v e s s e m u m ou vários c ô m o d o s a l u g a d o s " 6 7 . E m b o r a
a Lei f o s s e na v e r d a d e c o n t r a d i t ó r i a e m s u a atitude p a r a c o m a a u -
t o r i d a d e local n o tocante à p r o p r i e d a d e e a d m i n i s t r a ç ã o da h a b i t a ç ã o
p o p u l a r — q u e a Parte I d e s e n c o r a j a v a , e a P a r t e III, s e n ã o e n c o r a -
j a v a , p e r m i t i a — o n o v o L C C a p r o v e i t o u a o p o r t u n i d a d e q u e ela l h e
oferecia, estabelecendo de imediato u m Comitê para a Habitação
d a s C l a s s e s T r a b a l h a d o r a s 6 8 . E m 1894, p o d e r e s p a r a obter e m p r é s -
t i m o s f o r a m e s t e n d i d o s a e s s e i m p o r t a n t e p a r á g r a f o d a Lei; e m 1900,
34 CIDADES DO AMANHÃ
L o n d r e s , m a i s d o q u e q u a l q u e r o u t r a c i d a d e britânica d a p r o -
víncia, f o i o p a l c o o n d e s e r e p r e s e n t o u a m a i o r parte d e s s e d r a m a
até a e x a u s t ã o . M a s isso p o r q u e — c o n f o r m e r e c o n h e c i a a C o m i s s ã o
R e a l e m 1885 — ali o p r o b l e m a habitacional e r a m u i t o pior; o q u e ,
por extensão, dava bem a medida do tamanho de Londres. C o m seus
5 , 6 m i l h õ e s d e habitantes n o início d e 1890, n ã o h a v i a outra área
u r b a n a britânica q u e lhe fizesse f r e n t e ; d e n s i d a d e s habitacionais, ar-
r e n d a m e n t o s d e solo, p r o b l e m a s de transporte, c o m p e t i ç ã o p e l o es-
p a ç o , c o m c e r t e z a h a v e r i a m d e ser, ali, m u i t o m a i s a g u d o s .
M e s m o e m escala internacional, c o n t r a os 4 , 1 m i l h õ e s da r e g i ã o
d e Paris e o 1,6 m i l h ã o d a G r a n d e B e r l i m , L o n d r e s era i n c o n -
t e s t a v e l m e n t e a m a i o r c i d a d e d a E u r o p a , e até m e s m o d o m u n d o 7 0 .
M a s justamente por serem relativamente menores e mais densas,
e s s a s outras c i d a d e s c o m p e t i a m c o m s u a s p r ó p r i a s histórias d e terror.
E m Paris, 2 , 4 5 m i l h õ e s d e p e s s o a s que h a b i t a v a m a c i d a d e h i s t ó r i c a ,
e m 1891, m o r a v a m n u m a á r e a d u a s v e z e s m a i s d e n s a q u e a d o L C C .
N e s s a d a t a , Bertillon c o n c l u í a q u e 14% da Paris pobre, ou seja, 3 3 0
0 0 0 pessoas, viviam e m moradias superlotadas; os pobres estavam
a l o j a d o s até p i o r d o q u e e m L o n d r e s . Sellier calculava, e m 1911,
q u e o total a i n d a era d e 2 1 6 0 0 0 , m a i s o u t r o s 85 0 0 0 n o s s u b ú r b i o s ,
m o r a n d o d u a s o u m a i s p e s s o a s e m c a d a quarto 7 1 . L á t a m b é m a le-
g i s l a ç ã o — e m 1894, 1906 e 1912 — permitira a c o n s t r u ç ã o d e h a b i -
tações d e b a i x o c u s t o p a r a as classes t r a b a l h a d o r a s , t e n d o a m a i s
r e c e n t e c o n s e g u i d o q u e as autoridades locais instalassem escritórios
i n c u m b i d o s d e construir e administrar tais h a b i t a ç õ e s c o m s u b v e n ç ã o
estatal. N o entanto, d a í até 1914, a p e n a s 10 0 0 0 d e s s a s m o r a d i a s
h a v i a m s i d o c o n s t r u í d a s e m toda a r e g i ã o d e Paris, total i n e x p r e s s i v o
se comparado ao resultado atingido pelo LCC72. A dura verdade era
que nem a cidade nem o Estado tinham o dinheiro necessário para
d e r r u b a r o cortiço: d e u - s e e n t ã o p r i o r i d a d e a outras o b r a s p ú b l i c a s
d e g r a n d e porte — c o n s t r u í r a m - s e e s c o l a s e a S o r b o n n e e m 1 8 8 0 e
1890, c o n s t r u i u - s e o m e t r ô , e n t r e 1 9 0 0 e 1910 7 3 .
Berlim, onde a população estava crescendo a u m a velocidade
q u a s e igual à n o r t e - a m e r i c a n a — q u a s e d o b r a n d o e m vinte a n o s , d e
1,9 m i l h ã o e m 1 8 9 0 p a r a 3,7 m i l h õ e s e m 1 9 1 0 —, era, c o m o Paris,
2 . 3 Charles Booth
O amador-que-virou-sociólogo
p r o v a v e l m e n t e o u v e , atento, o s
resultados de sua pesquisa;
t a l v e z a relatora f o s s e a j o v e m
B e a t r i c e Potter.
u m a c i d a d e e x t r a o r d i n a r i a m e n t e c o m p a c t a e, portanto, p o p u l a c i o n a l -
m e n t e saturada; s e u c r e s c i m e n t o foi a c o m o d a d o e m " c a s e r n a s d e
a l u g u e l " d e c i n c o p a v i m e n t o s , a b a r r o t a d a s de gente, e d i s p o s t a s e m
t o r n o d e quintais d e q u a n d o m u i t o 15 p é s d e largura, ou seja, o
m í n i m o n e c e s s á r i o para permitir a e n t r a d a d e u m e q u i p a m e n t o c o n t r a
i n c ê n d i o . E s s e tipo de u r b a n i z a ç ã o , iniciado, ao q u e parece, p o r F r e -
d e r i c o , o G r a n d e , para alojar f a m í l i a s d e s o l d a d o s , g e n e r a l i z o u - s e
e m decorrência d o plano urbano d o burgomestre Jakob Hobrecht,
e m 1858; a p a r e n t e m e n t e p r o j e t a d o p a r a p r o m o v e r a integração s o -
cial, c o m ricos e p o b r e s instalados n o m e s m o b l o c o d e e d i f í c i o s , ele
s i m p l e s m e n t e p r o d u z i u u m a s a t u r a ç ã o p o p u l a c i o n a l lastimável, e o
m o d e l o e s t e n d e u - s e até m e s m o a o n o v o d e s e n v o l v i m e n t o s u b u r b a n o ,
d e p o i s q u e este teve m u d a d o s o s s e u s r e g u l a m e n t o s , e m 1890 7 4 ; a
especulação, guiada pelo plano e alimentada por um sistema hipo-
tecário q u e lhe era e x t r e m a m e n t e f a v o r á v e l , f e z o resto 7 3 .
O resultado, c o n f o r m e c á l c u l o s d o p i o n e i r o d o p l a n e j a m e n t o bri-
t â n i c o T . C . Horsfall e m 1903, foi que, e n q u a n t o e m L o n d r e s a
m é d i a d e habitantes p o r e d i f í c i o era d e 7 , 6 , e m B e r l i m c h e g a v a a
52,6 7 6 ; e e m b o r a j á e s t i v é s s e m o s e m 1916, nada m e n o s q u e 7 9 % d e
t o d a s a s m o r a d i a s s ó d i s p u n h a m d e u m ou dois quartos aquecíveis 7 7 .
E os aluffuéis^e_jipartarngntos em Berlim eram m u i t o mais caros
q u e o s d e H a m b u r g o ou M u n i q u e — s e n d o , j r o n i c a m e n t e , j o s j n q u i -
linos p o b r e s os q u c t i n h a m a p a r t e m a i o r d e s e u s s a l á r i o s c o m p r o -
m e t i d a c o m o p a g a m e n t o d o aluguel 7 8 . M a i s : e m b o r a a A l e m a n h a
realizasse m a i s r a p i d a m e n t e d o q u e a Inglaterra a eletrificação d e
s u a s linhas d e b o n d e , e m B e r l i m , as c o m p a n h i a s d e b o n d e p a r t i c u -
lares, à s e m e l h a n ç a d o q u e a c o n t e c e r a c o m o L C C , n ã o s a t i s f i z e r a m
p l e n a m e n t e c o m o m e i o d e l o c o m o ç ã o externa, e as linhas d e trens
s u b t e r r â n e o s t i v e r a m s u a i m p l a n t a ç ã o r e t a r d a d a p o r disputas legais 7 9 .
P a t r i c k A b e r c r o m b i e , o p l a n e j a d o r britânico, ao visitar B e r l i m p o u c o
a n t e s "tia P r i m e i r a G r a n d e G u e r r a , f i c o u intrigado c o m o c o n t r a s t e
que essa cidade oferecia e m relação a Londres: " B e r l i m é a mais
compacta cidade da Europa; ao crescer, não avança a esmo, c o m
e s t r a d a s p e q u e n a s e casas s u b u r b a n a s insignificantes, m a s vai, len-
t a m e n t e , e m p u r r a n d o suas a m p l a s ruas citadinas e seus colossais b l o -
c o s d e a p a r t a m e n t o s r u m o ao c a m p o , t r a n s f o r m a n d o - o , d e c h o f r e ,
e m cidade florescente"80.
V e r i f i c o u - s e , p o r é m , n a s capitais e u r o p é i a s , u m a interessante
reação ao crescimento e à superlotação: tanto e m Londres c o m o e m
Berlim, aumentava o temor de que a população urbana fosse, de
c e r t o m o d o , b i o l o g i c a m e n t e i n c a p a z . P o r volta d e 1900, o r e c r u t a -
mento para a guerra sul-africana tornou patente o fato de que dos
11 0 0 0 j o v e n s c o n v o c a d o s e m M a n c h e s t e r , 8 0 0 0 h a v i a m s i d o rejei-
t a d o s e a p e n a s 1 0 0 0 e s t a v a m a p t o s p a r a o s e r v i ç o militar. M a i s
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE 37
tarde, na P r i m e i r a G r a n d e G u e r r a , a C o m i s s ã o V e r n e y r e a f i r m a v a
q u e a c o m p l e i ç ã o física d o s e g m e n t o u r b a n o d a G r ã - B r e t a n h a t e n d i a
a deteriorar-se, m a n t e n d o - s e u n i c a m e n t e g r a ç a s ao r e c r u t a m e n t o f e i t o
n o interior® 1 . A s s i m t a m b é m e m B e r l i m , s ó 4 2 % d o s b e r l i n e n s e s
f o r a m c o n s i d e r a d o s a p t o s para o exército e m 1913, c o n t r a 6 6 % d o s
a l e m ã e s p r o v e n i e n t e s d e á r e a s rurais 8 2 .
D a í logo se deduziu que a população urbana — e eventualmente
a p o p u l a ç ã o c o m o u m t o d o — iria f a l h a r e m s u a a u t o - r e p r o d u ç ã o ,
a r g u m e n t o u t i l i z a d o p r i m e i r a m e n t e p o r G e o r g H a n s e n e m seu l i v r o
Die drei Bevõlkerungsstufen (Aí Três Etapas do Crescimento Popu-
lacional), d e 1890, e d e s e n v o l v i d o p o r O s w a l d S p e n g l e r n o c l á s s i c o
The Decline of the West (A Decadência do Ocidente), d e 1918:
"Agora___a c i d a d e g r a n d e s u g a o c a m p o até o osso, insaciável e in-
c e s s a n t e m e n t e r e c l a m a n d o e d e v o r a n d o n o v o s f l u x o s h u m a n o s , até
e x a u r i r - s e e m o r r e r e m m e i o a u m d e s p e r d í c i o d e território q u a s e
i n a b i t a d o " 8 3 . M a s e m a m b o s o s países, t e m o r e s m a i o r e s f a z i a m - s e
p r e s e n t e s . C h a r l e s M a s t e r m a n , p a r l a m e n t a r liberal, m o s t r o u e m s e u
livro, The Heart of the Empire ( 1 9 0 1 ) , q u e o l o n d r i n o era u m t i p o
instável:
U m imenso mar de gente, mantida sob cortantes grilhões, move-se com difi-
culdade nos prédios de habitação coletiva. Já e m outros tempos, nossa cidade, obri-
gada a enfrentar os deveres e responsabilidades de sua dimensão de metrópole antes
que lhe fosse possível avaliar com justeza a própria tarefa, sentiu o crescendo daquela
maré inexorável. Se esta, uma vez mais, se levantar, não haverá poder humano capaz
de reprimi-la 96 .
entupindo todos os bairros mais baixos, onde quer que o comércio deixe alguns
centímetros de terreno sem dono; amarrados em fileira ao longo dos dois rios, qual
bola e corrente presas ao pé de cada rua, e abarrotando o Harlem com SUEIS multidões
inquietas, reprimidas, eles mantinham e m suas garras a riqueza e o mundo dos ne-
gócios nova-iorquinos, inantinham-nos à sua mercê nos dias de linchamento e de
fúria. Os abrigos à prova de bala, as pilhas de granadas de mão e os canhões Gatling
do Tesouro municipal são admissões tácitas do fato e da qualidade de clemência
esperada. Hoje, as habitações coletivas são Nova York, abrigando três quintos de sua
população 9 7 .
U m a C o m i s s ã o p a r a P r é d i o s d e H a b i t a ç ã o Coletiva, d e 1894, e s -
t i m a v a q u e p e r t o d e três e m c i n c o d o s h a b i t a n t e s d a c i d a d e m o r a v a m
n e s s e s c o n j u n t o s , c o n s t r u í d o s e m tão brutal d e n s i d a d e , que, e m m é d i a ,
q u a t r o q u i n t o s d o s o l o e s t a v a m c o b e r t o s d e edifícios 9 8 . N o s distritos
p o r eles d o m i n a d o s , d o i s fatores se a l i a v a m p a r a criar u m a c e r b o p r o -
b l e m a h u m a n o . E m p r i m e i r o lugar, as p e s s o a s q u e ali c h e g a v a m e r a m
d e s e s p e r a d o r a m e n t e p o b r e s e — e m virtude d a s barreiras d e língua e
cultura — inapelavelmente votadas à imobilidade. O planejador norte-
a m e r i c a n o , perito e m h a b i t a ç ã o , C h a r l e s A b r a m s , a u t o r i d a d e no a s -
s u n t o v i s t o q u e c r e s c e r a n u m d e s s e s c o n j u n t o s , e x p l i c a v a m a i s tarde:
" A c u l p a n ã o é d o proprietário; a c u l p a n ã o é d o construtor. E l e s c o n s -
t r o e m p a r a s a t i s f a z e r a u m m e r c a d o . O m e r c a d o era r e g i d o p e l a s p o s -
s i b i l i d a d e s d e p a g a m e n t o d o inquilino. A s p o s s i b i l i d a d e s d e p a g a m e n -
to d o i n q u i l i n o e r a m d e t e r m i n a d a s p e l o s salários q u e ele r e c e b i a " 9 9 .
S e o c o i t a d o d o i m i g r a n t e n ã o tivesse a c e s s o a u m d e s s e s a p a r -
t a m e n t o s , n ã o teria a c e s s o a n a d a . E f a m í l i a s p o b r e s a m o n t o a v a m - s e
d e n t r o d e l e s p o r q u e , ali f i c a n d o , p o d e r i a m ir a p é p a r a o e m p r e g o .
Q u a s e 7 5 % d o s j u d e u s r u s s o s a c h a v a m - s e a r r e b a n h a d o s e m três d i s -
tritos d a c i d a d e e s o b r e t u d o n u m deles, o 10°, o n d e a m a i o r i a p r o -
v i n h a ( o u s e u s p a i s ) d a R ú s s i a e d a P o l ô n i a r u s s a . P o r volta d e 1893,
c o m m a i s d e s e t e c e n t a s p e s s o a s p o r acre, e s s e distrito tinha u m a
população quase 3 0 % maior que a da mais superpovoada região de
2.5 e 2.6 Os Dumbbells de Nova York (conjuntos de habitação coletiva construídos
segundo a antiga legislação)
C o m o e m Berlim, também e m N o v a York, outro " a v a n ç a d o " projeto habitacio-
Os distritos de Nova York ocupados por prédios de habitação coletiva são lu-
gares onde milhares de pessoas estão vivendo no mais ínfimo dos espaços onde é
possível a seres humanos subsistirem — amontoados e m quartos escuros e mal ven-
tilados, e m muitos dos quais a luz do sol nunca entra, e que, na sua maioria, não
conhecem o ar fresco. São focos de doença, pobreza, vício e crime, onde o que
surpreende não é que algumas crianças cresçam para serem ladrões, bêbados ou pros-
titutas, mas que tantas consigam tornar-se adultos decentes e responsáveis 1 1 0 .
O p r o b l e m a , p o r t a n t o , e r a e n o r m e ; q u a n t o a isso, a C o m i s s ã o
e s t a v a d e p l e n o a c o r d o c o m a C o m i s s ã o R e a l Britânica d e 1885.
M§& n o t o c a n t e à s s o l u ç õ e s . Veiller..e..seus c o m p a n h e i r o s d i v e r g i r a m
v e e m e n t e m e n t e ^ d p s c a m i n h o s t o m a d o s p e l o s ingleses e, p o r c o n s e -
guinte, d o s e u r o p e u s . E x a m i n a r a m o m o d e l o l o n d r i n o da h a b i t a ç ã o
p o p u l a r e o r e j e i t a r a m c o m firmeza. " N ã o serviria p a r a n a d a d e
b o m " , f o i o q u e c o n c l u í r a m : q u a n d o j m u i t o , a s o l u ç ã o via m u n i c í p i o
iria " m e l h o r a r as c o n d i ç õ e s d e vida d e u n s p o u c o s f a v o r e c i d o s " e
" n ã o c o n s e g u i r i a realizar n a d a m e l h o r d o q u e a q u i l o q u e a b e n e -
m e r ê n c i a p a r t i c u l a r j á realizara n o p a s s a d o e, s e g u r a m e n t e , realizaria
n o futuro* ' ; n ã o h a v e r i a c õ m õ ~ d ê í e r m i n a r " o n d e traçar a linha s a -
larial q u e s e p a r a s s e o s q u e d e v e m d o s q u e n ã o d e v e m s e r b e n e f i -
c i a d o s " " 1 . A l é m d o rnais^ s e n t i a m eles q u e a m o r a d i a f o r n e c i d a p e l o
municípto^ po-
lítico, a o d e s e n c o r a j a m e n t o d o capital p r i v a d o . D a í a resistência: c o u -
be à regra física do empreendedor privado encontrar a resposta. A
L e i d e 1901, m e t i c u l o s a m e n t e d i v i d i d a e m m a i s d e c e m p o r m e n o -
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE 45
I
A CIDADE DA NOITE APAVORANTE 47
s e a n t e a e v i d e n t e inexistência d e q u a l q u e r i n t e r v e n ç ã o m u n i c i p a l :
o e s t a d o d a s m o r a d i a s , o n d e o s i m i g r a n t e s s e g u i a m os p a d r õ e s d a
v i d a rural e m p l e n a u r b e — a b a t e n d o c a r n e i r o s e a s s a n d o p ã o n o s
p o r õ e s —, tê-las-ia t o r n a d o t o t a l m e n t e ilegais e m L o n d r e s , e x c l a m a -
v a m 1 2 2 . M a s o p r o g r a m a d e Hull H o u s e era a p e n a s u m a variante,
p a r t i c u l a r m e n t e idealista e e x c e p c i o n a l m e n t e b e m d i v u l g a d a , d o q u e
e s t a v a a c o n t e c e n d o e m c a d a c i d a d e n o r t e - a m e r i c a n a antes d a P r i -
m e i r a G r a n d e G u e r r a . H a v i a seis d e s s e s c e n t r o s n o s E s t a d o s U n i d o s
e m 1891, m a i s d e c e m p o r volta d e 1900, m a i s de q u a t r o c e n t o s p e r t o
d e 1910 1 2 3 . O o b j e t i v o era integrar o i m i g r a n t e na cidade, p r i m e i r o
a t r a v é s d o e x e m p l o m o r a l individual, e s e g u n d o — c a s o este f a l h a s s e
—, a t r a v é s d a c o e r ç ã o m o r a l , e até m e s m o , c o n f o r m e a c r e d i t a v a m
alguns d e seus defensores, da segregação e repatriação " d o vaga-
b u n d o , d o b e b e r r ã o , d o m e n d i g o , d o i m b e c i l " 1 2 4 . M a s , terceiro, e s s a s
medidas deveriam ser acompanhadas de u m a melhoria sistemática
d o a m b i e n t e u r b a n o , m e d i a n t e a i n s t a l a ç ã o d e p a r q u e s e áreas d e
r e c r e i o e, e v e n t u a l m e n t e , m e d i a n t e u m s i s t e m a m a i s a m p l o de p a r -
q u e s m u n i c i p a i s , q u e — n a o p i n i ã o d o pai d a arquitetura p a i s a g í s t i c a
norte-americana, Frederick L a w Olmsted — exerceria uma "influên-
cia h a r m o n i z a d o r a e r e f i n a d o r a . . . f a v o r á v e l à cortesia, a o a u t o c o n -
trole e à t e m p e r a n ç a " 1 2 5 . A l g u n s d e f e n s o r e s f o r a m a l é m , d e c l a r a n -
d o - s e p e l a r e v i t a l i z a ç ã o d o bairro c o m o u m m o d o de restaurar a
qualidade d a vida urbana, embora a própria Jane A d d a m s não de-
m o n s t r a s s e q u a l q u e r t e n d ê n c i a para e s s a " s a l v a ç ã o g e o g r á f i c a " 1 2 6 .
V e i o d a í a idéia d e q u e a p r ó p r i a c i d a d e p u d e s s e e n g e n d r a r l e a l d a d e
cívica, e a s s i m a s s e g u r a r u m a o r d e m m o r a l h a r m o n i o s a ; a a p a r ê n c i a
física d a c i d a d e s i m b o l i z a r i a s u a p u r e z a m o r a l . E s s e p a s s o u a ser o
d o g m a b á s i c o d o M o v i m e n t o C i t y Beautiful 1 2 7 . S e c o n s t i t u i u ou n ã o
u m substituto a d e q u a d o para a moradia popular planejada, isso, ao q u e
parece, n i n g u é m teve a idéia d e perguntar aos mais diretamente afeta-
dos. E m t e r m o s práticos, J a n e A d d a m s s e g u i u a receita L a w r e n c e
Veiller: d e s e m p e n h o u u m p a p e l - c h a v e na a b e r t u r a d o i n q u é r i t o d e
R o b e r t H u n t e r sobre o problema da moradia dentro d o s conjuntos d e
habitações coletivas de Chicago, o equivalente exato d o relatório d e
N o v a Y o r k , q u e r e v e l o u c o n d i ç õ e s i g u a l m e n t e horripilantes e resul-
tou n u m d e c r e t o m u n i c i p a l d e 1902 p a r a c o n j u n t o s d e h a b i t a ç õ e s
coletivas 1 2 8 .
UM PROBLEMA INTERNACIONAL
c o m o f o n t e d e m ú l t i p l o s m a l e s sociais, possível d e c l í n i o b i o l ó g i c o e
i n s u r r e i ç ã o política e m potencial. D e 1 8 8 0 a 1900, talvez a 1914, a
s o c i e d a d e d e classe m é d i a — os q u e t o m a v a m as decisões, os editoria-
listas, o s panfletistas, o s ativistas — e s t a v a f u g i n d o , a p a v o r a d a . M u i t o
d e s s e m e d o foi g r o t e s c a m e n t e e x a g e r a d o , d e certa f o r m a até delibera-
d a m e n t e , p o r publicistas e x p e r i m e n t a d o s e m s e a u t o p r o m o v e r e m .
M a s a realidade subjacente era suficientemente horripilante e deri-
v a v a d a p o b r e z a . C o m a r e v o l u ç ã o , os ricos p o d e r i a m ter d a d o o q u e
t i n h a m a o s p o b r e s , o q u e n ã o teria f e i t o g r a n d e b e m a n i n g u é m , v i s t o
q u e p o u c o duraria. E s s a p o b r e z a f o r a e n d ê m i c a d e s d e o s p r i m ó r d i o s
d a s o c i e d a d e m a s , no c a m p o , p u d e r a p e r m a n e c e r m a i s ou m e n o s o c u l -
ta; u m a v e z , p o r é m , c o n c e n t r a d a na c i d a d e , r e v e l o u - s e p o r i n t e i r o .
O s p o b r e s q u e se a m o n t o a v a m e m L o n d r e s , v i n d o s d o W e s s e x o u d e
East A n g l i a , o u e m N o v a Y o r k , v i n d o s d a Itália e d a P o l ô n i a , e s t a -
v a m v e r d a d e i r a m e n t e m e l h o r f o r a de s u a s terras d o q u e nelas; ou p e l o
m e n o s e r a a s s i m q u e p e n s a v a m , e n i n g u é m m e l h o r d o q u e eles p a r a
sabê-lo.
A d i f e r e n ç a , portanto, reside n a c o n c e n t r a ç ã o , e m virtude d a
qual a l g u n s m i l h a r e s d e ricos e a l g u n s m i l h õ e s de i n d i v í d u o s d a
classe m é d i a f o r a m l e v a d o s a u m estreito c o n t a t o c o m m i l h õ e s d e
p o b r e s e i n d i g e n t e s . N e s s e sentido, a industrialização e a u r b a n i z a -
ç ã o * , c o m o s ó e m dizer os marxistas, c r i a r a m u m a n o v a série d e r e -
lações sociais e u m a n o v a série d e p e r c e p ç õ e s sociais. O q u e , aliás,
c o m o escrevi n o C a p í t u l o 1, a f i r m a a p e n a s o ó b v i o . A t é 1 8 8 3 - 1 8 8 5
e m L o n d r e s e L i v e r p o o l , e até 1 9 0 0 - 1 9 0 1 e m N o v a Y o r k e C h i c a g o ,
a burguesia urbana manteve-se deslumbradamente despercebida d o
terrível d e s t i n o d e s u a s contrapartes proletárias q u e m o r a v a m a o
lado. Q u a n t o a isso, n ã o p o d i a haver d ú v i d a . Veiller e H u n t e r d e s -
c r e v e r a m e s s e d e s t i n o d e m a n e i r a m u i t o p a l p á v e l . A q u i está Veiller,
e n t r e v i s t a n d o u m a d o n a d e c a s a v i n d a d o s c o n j u n t o s coletivos:
E a q u i H u n t e r , d e s c r e v e n d o a v i d a nos b a r r a c o s d e C h i c a g o :
Cozinhar e lavar roupa para sete, embalar um bebê chorão num calor de arre-
bentar, cuidar de u m marido delirante, arrumar um lugar onde sete possam dormir,
e fazer tudo i s s o e m dois quartos c o m saída para uma ruela cheirando azedo e en-
xameada de moscas vindas dos detritos e latrinas, era coisa para arrasar c o m a pa-
ciência e a força de um T i t ã 1 3 0 .
NOTAS DO CAPÍTULO 2