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A Monstruosidade e o Mal em A Pequena Sereia e A Sua Versão Contemporânea - Geórgia Linhares
A Monstruosidade e o Mal em A Pequena Sereia e A Sua Versão Contemporânea - Geórgia Linhares
Segundo filósofos como Ricoeur e Adorno, o mal não pode ser representado
devido a sua tamanha complexidade, porém, como Simone Weil afirma, ele pode sim
ser representável, mas por meio do mundo ficcional. E é aí que entre a importância da
literatura, por intermédio da narrativa ela é capaz de representar o mal, ou ao menos
uma de suas fases diante tamanha imensurabilidade, e é justamente devido a essa
complexidade que há diversas formas da literatura representá-lo, como será visto aqui,
inicialmente, através do clássico de A Pequena Sereia.
Assim, a Bruxa do Mar é uma forma metafórica de simbolizar o que uma mulher
não deve ser para abrigar o mal, o monstruoso. O reino estético dessa personagem então
se dá tanto pelo seu poder, por ir contra as leis naturais, como também pelo seu aspecto
físico, sendo vista fora de um padrão de beleza convencional. Fato muito perpetuado
nos arquétipos dos contos de fadas, pois, geralmente, os personagens que representam o
mal nessas narrativas são monstruosos, não seguindo convenções de beleza, enquanto os
heróis são belos, seguindo uma visão de que o exterior representa o interior.
Assim, é visto que tanto Mauricio como seus amigos exemplificam exatamente
essa definição, pois além da monstruosidade vista em Mauricio ao tentar violar Ariella,
também são vistas diversas atitudes em seus amigos que colaboram para que tal
violência aconteça, pois eles são negligentes e banalizam as ações do amigo, o que
acaba incentivando-o a cometer tão ato criminoso. Portanto, aqui o mal e a
monstruosidade não aparecem apenas de forma de maldade escrachada, mas também
por meio de detalhes mais sutis.
Concluindo, ambos os contos trazem uma narrativa que visa, por meio dos
planos imaginários da arte e da literatura, criar temas, situações, personagens que se
convertem, alegoricamente, em paradigmas do mal. Contudo, apesar de ambos usarem
uma estetização do Mal e até mesmo da monstruosidade, eles trazem formas divergentes
de simbolizar o mal, com figuras metafóricas diferentes, uma mais próxima do
fantasioso e figurativo, outra já mais próxima do real e da complexidade do próprio ser
humano. Porém, é inegável que ambas usam recursos narrativos, artísticos e literários
para conseguir representar o irrepresentável, cada uma seguindo um dos embasamentos
vistos aqui, mas cada uma é importante e eficaz a sua maneira.
REFERÊNCIAS
FRANÇA, Júlio; ARAUJO, Ana Paula. As artes e os atributos do Mal. In: ____
(Orgs.). As artes do Mal: textos seminais. 2ª ed. Rio de Janeiro: Bonecker, 2019. pp. 13-
21.
JEHA, Julio. Monstros como metáfora do mal. In: _____ (Org.). Monstros e
monstruosidades na literatura. Belo Horizonte: Ed. UFMG, 2007. p. 9-31.