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Copyright © 2011 dos autores ‘Todos os direitos desta edigao reservados & Projeto grafico Daniel Pose Tradugio ‘Mayra Fonseca ¢ Barbara Atte Guidalii (cap. 2) Irene Emest Dias ¢ Marcionilio Cavalcanti de Paiva Normalizacao de referencias Clarissa Bravo e Amanda Gomes Basi Apoio académico-administrativo no Brasit Denise Barros eJanete Romeiro Catalogagéo na fonte 10 de Comunicagéo e Informagéo Cientifia e Tecnologia Biblioteca de Saide Pablica C164 Contreras, Jesis, ‘Alimentagéo, sociedade e cultura. /Jesis Contreras e Mabel Egitora Floenwz, 2011 496 p. iL; tab. ISBN: 978-85-7541-219-0 1. Alimentagéo. 2. Antropologia. 3. Seguranca Alimentar ¢ Nutricional tradugéo de Mayra Fonseca e Barbara Atie Guidall, ~ Rio de Janeiro : Centreros, Gore. Nemuritogas ecadecle Gadluno- Ris de Cpnans bax hoc sbi sp HF SF i 3 Os Condicionamentos Contextuais e a Variabilidade Cultural dos | Comportamentos Alimentares A alimentagéo vincula 0 natural ao social em um sentido amplo, e simultaneamente organismos bioldgicos ¢ entes sociais (Fieldhouse, 195 Marcott, 1998). Essa dupla natureza biossocial, que func vinculagio, deve ser sempre levada em consideracio, ¢ aqucles que, por meio de suas orientacies ¢ prescric6: intervir, para modificar, nas pautas alimentares ado grupo humano. Porque, de fato, uma das quest ‘aos olhos quando observamos a0 nosso redor é a ‘variaclo los sistemas alimentares. De fato, € extraordinariamente ampla 1a gama de substéncias que sao consumidas como alimentos, as formas de obté-las, conservé-las ou servi-las eas situagies nas quais estas ou aquelas so consideradas oportunas segundo as distintas culturas do mundo. ‘Ainda que um ntimero considerével dos padrdes alimentares consista em comer tanto produtos de origem animal como produtos de otigem vegetal, nem sempre 0 contexto permite que isso aconteca e hé varias sociedades que seguem uma dieta na qual um dos dois tipos prevalece, sem que por isso apresentem problemas de saiide. Um exemplo bbem conhecido é 0 dos Inuit ou esquimds, “comedores de carne crua”, antes de sua “ocidentalizacio” (Farb & Armelagos, 1985): quando a caga tinha éxito, um adulto poderia inges ito no capitulo anterior. Todos os es centre eles, 0 fato de que também colhiam plantas selvagens (rafzes, frutos carnosos © grios) na época do degelo, adicionando-os ao contetido fermentado do estémago dos herbivoros obtidos por meio da caga © nndo-os durante todo 0 ano em pequenas quantidades, 0 fato de sm grande parte dos animais que matavam, em particular seus ‘incrais. Isso significa que a cultura alimentar dos Inuit estava adaptada igdes definidas pelo ambiente. © da menor diversidade de sou ccossistema, esse povo também selecionava certas su comidas, enquanto rejeitavam outras por considerd-las impréprias para ‘© consumo, (0 dispares entre as sm termos de dietas ou regimes, ‘epenen dle um infindavel conjunto de fatores. Uns fazem referéncia a condigoes de ca icolégico. E 0 caso das experiéncias sensoriais proporcionadas pelos alimentos (sabor, aspecto, ‘aroma, cor, textura), que respondem a demandas tanto por determinddos nutrientes quanto por determinadas sensagoes, entre muitas outras possibilidades. Outros fazem referencia a determinantes de cardter leol6gico), como a ‘que pareca a aco, depende da articulacio de cada um desses fatores que interagem de modo complexo. Todos eles, estreitamente vinculados, constituem as principais condigdes das difereneas, assim como das, semelhangas, registradas entre os comportamentos alimentares. Assim, as perguntas que cabe formular agora so: ‘comemos? E como explicar a variagao inte alimentares? yr que comemos 0 que -al dos comportamentos Fatores Ecolégicos, Tecnolégicos e Econémico-] politicos As formas de armazenamento dependem, em boa medida, das ‘disp. ‘equipamentos teenolégicos’ de cada sociedade, em funcéo do seu tipo de habitat e de suas condigées particulares de existéncia. Por outro lado, 8 lgGes de existéncia variam em fungao do tempo e do espago. Em do século passado, por exemplo, nas cozi espanhidis eram poucos os eletrodomésticos de qualquer tipo, ¢ as tarefas de triturar, bater, cozinhar ou assar os alimentos pediam outras técnicas cutinfrias que demandavam mais tempo e esforgo. Por sua vez, a escassez ou 0 prego do combustivel pode explicar alguns habitos relacionados com as formas de preparar ¢ cozinhar os alimentos. Entre os grupos de marginalizados que vivem nas favelas brasileiras, por exemplo, os altos custos dessa matéria-prima tém um efeito defintivo sobre a escolha dos alimentos consumicos pelas familias, que optam com frequéncia pelos prodatos que nao dependem de cocgéo. ‘Vimos no capitulo 2 como determinadas preferéncias e aversdes alimentares s40 o resultado de caracteristicas biol6gicas particulares dos ‘0s modos de satisfazé-los. Esses diversos modos podem co constituir varios mecanismos adaptativos; uns so biol6gicos, ¢ jé falamos sobre eles, outros sto respostas culturais, ¢ delas falaremos em seguida. A variedade de substincies que so consumidas como alimentos, pelos diferentes povos do mundo ¢ extraordindria. Classificados segundo varia consideravelmente. Por exemplo, a dieta tra ‘era composta, fundamentalmente, por carne e peixe; outros paves, pelo pos de cereais. Em outras do Norte, além de diferentes tipos de carne procedentes ‘que cagavam, Por outro lado, ¢ em basico entre varios povos africanos, é r para pssaros” nos paises mais ricos. Os que: alguns tipos, mas nao outros. Os povos “ocident: diante da ideia de comer insetos. O leite provoc: carne comem apenas ‘mostram repugnincia referencias © aversées considerado, indistintamer século XIX, Bourdeau (1894: lizagao ¢ barbarie. No Desconhecido para os povos selvagens, 0 leite se converteu em um dos ‘mais preciosos recursos dos povos pastores, que transmitiram 0 gosto para us 1a maioria das nagfes agricolas (..). Em vastus regi6es, como a China € ‘outros paises da Asia Oriental, o leite € completamente inusitado. Longe de apreci-lo, esses povos manifestam sua aversio pelo que chamam de “sangue branco’. Os gregos dos tempos heroicos também néo consumiam © leite habitualmente. Homero fala dele como de um alimento préprio ‘para os povos bérbaros, chamados, como consequéncia, de“galact6fagos’ ‘ou ‘hipo-mulgos’. HerSdato caracteriza-o como um trago dos citas (para os gregaso povo “barbaro’ por antonomési constitula sua subsisténcia habitual. ‘A variagdo pode ser ilustrada, também, em outra perspectiva: os chineses da provineia de Hunan comem camardes quando eles ainda esto movendo as patas; da mesma forma que norte-americanos & europeus nao hesitam em degustar ostras vivas. Em contrapartida, também, encontramos algumas populagdes asiaticas que preferem consumir determinados alimentos em um estado tao avangado de putrefagio que 0 cheiro se espalha a dezenas de metros a0 seu redor. ‘Segundo os lugares e as épocas, foram considerados pratos deliciosos: os fetos dos roedores, as linguas de cotovias, os olhos de cordleiro, 0s o¥os de enguia, 0 contetido do estémago das baleias. Uma das esquisitices escocesas ~ 0 haggis ~ 6 uma mistura bizarra que provocaria néuseas er muitas pessoas. Consiste em cozinhar em conjunto 0 estémago de um cordeiro, pulmées de vaca com seus intestinos, seu pancreas, seu figado fe seu coragao, tudo isso condimentado com cebolas, gordura de rim de boi e papa de aveia. Definitivamente, nenhum grupo humano ou social classifica como alimento todo o potencial de recursos comestiveis que lhe sao acessiveis. ‘Ao mesmo tempo, isso nao exclui, salvo em situagdes de excepcional escassez, que sejam feitas escolhas alimentares entre 0s recursos a seu alcance. Isso pode parecer Sbvio quando se pensa nas modernas sociedades industrializadas e na superabundancia, mas pode ser mais surpreendente se pensamos nas re os bosquimanos do deserto de Kal pelo fat amendoim, planta ta ‘muito mais protefnas, iva, a noz de mongongo contém vezes mais célcio, duas vezes mais potdssio © 150 _quase a mesma quantidade de ferro, sem contar as grandes quantidades de vitaminas e minerais. Assim, entio, pode-se afirmar que os bosquimanos praticam uma verdadeira “estratégia" de exploracio de seus recursos que lhes permite ‘escolher’, entre todos os recursos disponiveis, faqueles que Thes parecom os mais desejaveis em fungio de suas proferéncias de paladar, da distincia em que sao encontrados, de sua abundancia, de sa seguranga etc. Essa sclecéo alimentar, que é traduzida ‘em certa subutilizagdo do meio, d4 em maior ou em menor medida em todas as sociedades cagadoras-coletoras. Os pigmeus Mbuti, por exemplo, assim como os tasmanios, néo aproveitam um recurso 180 importa ‘como o peixe e nao cagam nem os passaras, nem os chimpanzés (Farb & ‘Armelagos, 1985; Testart, 1973), enquanto em determinadas resides do Brasil existem mercados nos quais esses animais sio adquiridos como produto alimenticio. Escas observagées relativas & subexploracio do meio ambiente por parte de muitas sociedades tribais permitem pensar que, contrariamente ‘populagées nao tenham vivido continuamente ides de um sistema, & beira da fome ou da portanto, de sociedades famintas, nem foi a nos limites das possi catistrofe, Nao se trat feseassez de alimentos o que determinou seu nomadismo. Além disso, 0 modo de vida cacador-coletor exige pouco trabalho ~menos de trés horas Gidrias no caso dos bosquimanas~, € com isso é assegurada uma relativa ‘boa no caso ‘abundancia. A quantidade de calorias absorvidas por di dos aborigines australianos ou dos bosquimanos, para osquai de calorias excede levemente o consumo, gerando a possi ‘excedente. Por outro lado, na medida em que a esperanga de vida se cacadores-coletores (levando-se em conta que as constituem, como regra geral, entre 70 ¢ 80% da protegidos que 0s agricultores contra a fome. De fato, diferentemente Jtores, que dependem de plantas cultivadas para sua a, os coletores esti duplamente protegidos das ameacas da ‘menor vulnerabilidade res &s calamidades naturais. Para citar apen: cabe destacar que os Kung exploram 85 jandara, 36 delas (Testatt, 1973). da variago das adaptacdes jimada em cerca de trinta milhées ‘espécies vegetais, os Walbi Vejamos outras manit alimentares. De uma populagio tribal asi de pessoas, na india, encontramos 250 espécies animais que sio rejeitadas por um ou outro grupo tribal, mas nao por todos. A maioria del exemplo, se abstém de comer o tigre ou qualquer espécie de ser cobra em particular. E evidente que extremamente perigosos e que seria insensato cagé-los com frequeé “Também se observa uma repugndncia gencralizada a comer as fémeas das espécies comestiveis. Isso se atribui a sua veneracio em funcio de seu papel de procriadoras. Em qualquer caso, essa aversio contribui para uma “politica econémica” orientada para facilitar a reprodugao das espécies consideradas comestiveis. Muitas tribos rejeitam, igualmente, ‘comer um animal morto por causa desconhecida, o que é uma atitude inteligente, pois o animal pode ter sido vitima de uma infeccéo que pode ser transmitida aos seres humanos. Também sao evitados os animais que se nutrem de d para evitar contato cor que 0s membros de uma determinada diferentes mas nao toquem no rato doméstico. Por sua vez, as concepgdes particulares dos europeus sobre 0 que ‘ram alimentos e sobre como esses deveriam ser cultivados pode explicar © fato de que, em suas empresas coloni privilegiaram os cereais, vinicas plantas a nobres a seus olhos. E preciso dizer que essas sociedades, ¢ a civ alimentagdo, nem civilizagio dignas de tais nomes sendo aquelas baseadas fesse que manifestaram pelo arroz bém, o desprezo fempo mostraram pelos tubérculos ex6ticos, interessando-se apenas por aqueles que, com mais ou menos fundamento, evocavam 0 pao, como @ fruta-pao, por exemplo;"" ou por aqueles que, de acordo com suas utilizagdes tradicionais, permitiam, por meio da extragio de seu amido, a preparacio de papas ou de biscoitos, como a mandioca americana. Vale refletir, por exemplo, sobre a resisténcia que houve na Europa a se adotar a batata procedente do Novo Mundo. Em 152 um primeiro momento, ela foi considerada um produto adequado para alimentar os porcos, 0s} os camponeses pobres. Logo acabaria se impondo, a par TIL, primeiro entre os camponeses e depois em geral, dadas suas miltiplas vantagens a ‘um campo de 0,40 hectares de batatas poderia alimentar uma fa cinco ou seis pessoas durante todo um ano, acrescentando-se um poreo. A batata se adapta a uma grande variedade de solos, seu cultivo néo exige mais que uma enxeda ¢ um ancinho, e amadurece em trés ou quatro meses, enquanto os cereais tradicionais necessitavam de mais de seis. E, além disso, tem alto valor nutritivo.” A esses preconceitos alimentares foram actescentadas outras oposigdes decorrentes das caracteristicas fisiolégicas das plantas alimentares domésticas ¢ de sua cultura. Os oereais, tio queridos pelas sociedades e civilizagbes ocidentas, fo frutos no ano seguinte a0 seu tubérculos tropicais,em contrapartida, sto vegetais reach que posemver durante ‘am pelo que se chama “via vegetativa”, isto é, por brotos ou po outro lado, semeado com antecedéncia e colhido em massa, 0 dp ceri das oiedades cians originadas da “revolucao ne 1a pradaria na qual os coletores fagens para sc alimentar. Por sua plantados individualmente, teve como primeiro modelo a continua sendo a forma vegetal dominante, e na qual os col i Bm meados do séeulo XVIII, 06 livros de cozinhia curopeus ainda néo precocemente pelos irlandeses, considers Znhos, os inglesee. Mas seu cultivo e consumo humano foram generalizados © am transformagbes profundas na diets, na agccultura e na sazonalidade 153 de planta em planta para colher frutos, folhas ou tubéreulos. Em cada tum desses casos, finalmente, os contatos entre os homens e as plantas séo muito diferentes, e & muito diferente também a repercusséo que cesses tém nas relagdes entre os homens (Barrau, 1983), Nesse sentido, & pertinente perguntar-se, por exemplo, se as diferentes formas de tri de dizimo pelo uso dos cereais, tio desenvolvidas na Europa medi que os europeus tentaram levar para o Novo Continente, teriam possiveis se tivesse predominado um cultivo do tipo ‘hortas’ tropicais. ‘Assim se comprecnde também o interesse que 0s senhores.¢ os monastérios medievais tiveram na ampliagio do cultivo do trigo, em detrimento dos camponeses. No caso da regio andina, por exemplo, a enorme diversidade das formas de consumo de produtos andinos assim como as, ‘numerosas variedades de tubérculos e de milho eram um problema para 08 arrecadadores dos tributos. Os diferentes cultivos ¢ as diversas ‘modalidades de consumo obrigavam os dizimistas a buscar para cada povo, ‘também para cada produto, formas de cobrancas diferentes, “tao diversas como as populagdes” (Hiinefeldt, 1982). De fato, os poderiam aproveitar 0 milho até dois ou trés meses antes da colheita, para fazer chochoca, chicha etc.** ¥4 com relagdo 3s batatas, “la misma chacra les sirve diariamente de despensa” (“a mesma chécara é usada diariamente ‘como despensa”), segundo se queixava um arrecadador. © que foi dito até agora pode dar uma nogéo, por um lado, da enorme variedade de recursos que podem ser considerados comestiveis pela espécie humana e, por outro, da diversidade entre 08 povos no momento de catalogar estes ou aqueles recursos como comestiveis ou rejeitados, levando-se em conta os diversos graus de aceitagao ou de rejeigo que cada uma dessas sociedades pode apresentar, tal como ilustrado na Figura 2 (cap. 2) amore antropol6gioos proporcionaram abundantes exemplos racionalidade das culturas nos processos evolutivos de ‘ouculinarias corresponderiam (Harris, 1985a; Harris & Ross, 1987; Piddocke, 1981; Rapapport, 1968; Ross, 1980) pretendiam explicar determinados aspectos das préticas alimentares considerando-28 como ajustes &s restrigbes do ecossistema, Chochoca: termo andino que si mastigagio de sementes de milho por caldeirgo com Agua fervente onde era 154 por meio de estratégias (conscientes) ou processos (inconscientes) de adaptagio (cf. capftulo 1). A cultura é considerada como uma espécie de superestrutura, estando a infraestrutura constitufda pela “maximizagio” da relagio custo-beneficio, econdmica ou ecoldgica, que implicam as praticas e as representagoes culturais. A esse resp 108 antropdlogos interessados no prot preferéncias alimentares no podem deixar de considerar as limitagSes infraestruturais. que determinam os custos ¢ os beneticios de cada dieta em particular. Assim, por exemplo, a presenga de tabus contra o sacrificio ou 0 consumo de diversas espécies de animais selvagens comestiveis ocultou durante muito tempo a importancia das protefnas como fator limitador para agricultores que produzem para sua subsisténcia. Muitos desses tabus so, em si ‘mesmos, uma prova da necessidade de priticas de conservacio, jé que afotam a espécies que estiveram ou esto em perigo de extingio. Consequentemente, os tabus que pesam sobre espécies como o bicho- ga, a anta ou 0 veado refletem, talvez, situacdes de custo-beneticio advertindo sabiamente os cagadores contra a perda de tempo que supde perseguir animais escondidos ou espécies solitérias que fogem antanosas ou lugares isolados (Ross, 1980). Para os adeptos, miuitas razées para se pensar que as principais stares, tanto animais como humanas, si0 variagbes nas est governadas por principios adaptativos andlogos. Curiosamente, um mito dos Baranda da Australia Central, descrito por Leroy (1925), pode nos oferecet um exemplo de até que ponto as explicagdes dadas por esses antropélogos podem ser de todo pertinentes em relagéo 2 origem de jentares sobre determinadas espécies de animais, 0 mito tc, tal como transcreve Leroy: rei Kinton, os Baganda viviam unicamente da aca e se ntamente de todo tipo de caga. Como acaga diminuia, fo rei Kinton decreton que certas espécies de animais jé nao podiam ser consumidas por quaisquer famfias. Esse foram osanimais que, em seguida, se converteram em seus totens. Nos tempos ‘Trata-se, pois, de um mito que se refer cestabelecimento dos tabus alimentares ¢ que ‘uns ¢ de outros foi o que hoje chamariamos de u de conservacdo da natureza para evitar que em fome amanha”, Tdeias, as de totem e tabu, a servico da “reproducao” social, econdmica e ecol6gica. O totem propriamente dito néo pode ser comido nao porque deva ser respeitado, amado ¢ temido, mas porque é jgem dos totens € a0 ica” que a “razao” de medida “ecol6gica” de hoje se-converta ss preciso reservé-lo para os outros cis da tribo. A idea fundamental, comum & muitas outras tribos, € que os homens de cada grupo totémico io esponsaveis pela manutengio da oferta de animais e plantas que dao ome ao grupo e que a tinica razio pera aumentar o miimero das plantas ou dos animais totémicos é, simplesmente, a incrementagao da oferta de alimentos (Spencer & Gillen, 1968). Independentemente de o rei Kinton ter ou néo enistido, independentemente de 0 mito set pura invengéo ou Tesponder realmente a sua propria meméria histérica, pode-se pensar, pelo menos pensar, que na origem das restrig6es derivadas da instituicao totémica ha uma clara razio “adaptativa”. B obvio que uma primeira condicéo para o consumo de came 6 ter cesso a cla, assim como poder assegurar tal acesso no futuro. Por essa azo, para compreender que animais so comidos e se deseja comer em uma dada cultura € necessario saber que animais formam parte de seu io. E importante, também, conhecer qual é a percepedo que cada tem da cadeia fagica em tal meio e da relagio custo-beneficio de suas escothas alimentares em termos de incluso ou exclusio. E tudo isso nao somente a curto prazo, mas, também, a médio e longo prazos. De acordo com essas consideracées, Harris (1985a) afirma {que as preferéncias eas aversées alimentares das diferentes culturas teria, historicamente, respondido a uma relaglo custo-beneficio energeticamente favordvel. Assim se explicaria, para cada cultura, a aceitacao ou a rej dos insetos, do porco, da vaca, do cavalo, do cachorro ete. Ou, inclusive, dentro de uma mesma cultura, a norte-amerieana por exemplo, em que se Drefere a came de porco & carne de vaca Por outro lado, de acordo com Fiddes (1991), acarne foi um simbolo or meio do qual a sociedade ocidental, assim como outras sociedades, expressou sua rela¢io com 0 mundo no qual habita. No decorrer da maior parte de sua historia, a humanidade parece ter sentido necessidade de controlar seu entor iental para diminuir as ameacas provenientes os clementos e dos animais selvagens, assim como para assegurar cert estabilidade na administracio da comida e de outras necessidades vi A importancia do poder sobre a natureza fundamentou 0 prestigio da carne. A mesma nogéo de “controle ambiental” proporciona 6 contexto para as razGes que justificam tanto o gosto quanto o desgosto pela carne ~ por exemplo, crengas, reforcadas pelos especialistas médicos, relatives n para nosso corpo € nossa mente comer mul 0u principios éticos relativos ao trato apropri incluindo consideragdes sobre a agéo de consumi-los como slimento. Anda assim, mais recentemente, aflorou o debate em torno das ameacas 155 ecolbgicas que pesam sobre o futuro de nossas espécies e daquelas em que 0 consumo de carne esta i De acordo com os prinefpios anteriores, poderiam ser considerados varios exemplos de costumes alimentares, apatentemente estranhos ou irracionais, mas que, na realidade, constituem ou cnstituiram respostas -m particular (por exemplo, se alguns alimentos perdem valor is se so transformados por meio da cocgéo) ¢, também, os recipientes e 0s métodos utilizados para cozinhas. Neste ponto convém citar Barrau (1983) quando se refere & *revolugao tecnol6gica do fogo dda coogi" e indica que talvez tenha havido um exagero na importincia atribuida & revolucéo neolitica ow & domesticagéo das plantas ¢ animais, esquecendo-se uma revolugio mais antiga, de ordem culinéria e que, pot sua engenhosidade tecnolégica, permite tornar comestiveis coisas ape norm nocesaviamerd, Ein evleg, cae Haren, cone fog0 pela invencio da cocci. De fato, de acor Condo Ziamiliardade des hominideos como fogoo que estabelecent as condigSes objetivas para o descobrimento da cozinha, Para Cordén (1980: 85-86), 4 cozinha é um fato capital na evolu, pois marca a frontsira ene © animal heterétrofo (0 comum dos animais) e o singular animal autétrofo, ue prepara seu alimento, Provavelmente foi preciso que transcorressem auto milénis ~talvezcentenas de milbares de anos desde que comeyou © fogoa ser aplicado como defesa e, em seguida, como fonte de calor, até que foi deseoberta sua aplicacdo realmente fundamental, a transformagao calindria Até certo ponto, humanizagio, por um lado, ¢ efetividade no controle por outro, so processes paralelos ¢ que marcaram a quando so discatidos os fatores que intervieramt no ie40 dos primeiros Australopithecus até as formas 10 Homo, sempre sio utilizadas diferentes varidveis: obipedismo, a fabricagio de utensilios, a evolugio da mao ou do eérebro, as relagdes sociais através de atos comunitirios como a caca, a influencia do habita... Mas sempre, em um momento ou outro da discusséo, aparece 1st

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