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MAMA NEGRA (Canto de esperanga) Poema de Viriato da Cruz ‘Tua presenga, minha Mae ~ drama vivo duma Raca drama de carne e sangue que a Vida escreveu com a pena de séculos. Pela tua voz Voues vindas dos canaviais dos arrozais dos cafezais dos [seringais dos algodoais... Vozes das plantagdes da Virginia dos campos das Carolinas Alabama Cuba Brasil... Vozes dos engenhos dos bangués das tongas [dos eitos das pampas das usinas Vozes do Harlem District South vozes das sanzalas Vozes gemendo blues, subindo do Mississipi, ecoando dos vagées. Vores chorando na voz de Carrothers: Lord God, what will have we done Vozes de toda a América. Vozes de toda a Africa. Vozes de todas as vozes, na voz altiva da Langston na bela voz de Guillén... Pelo teu dorso Rebrilhantes dorsos aos s6is mais fortes do mundo Rebrilhantes dorsos, fecundando com sangue, com suor [amaciando as mais ricas terras do mundo Rebrilhantes dorsos (ai a cor desses dorsos...) Rebrilhantes dorsos torcidos no tronco, pendentes da forca ‘ {cafdos por Lynch. Rebrilhantes dorsos (ah, como brilham esses dorses), ressuscitados com Zumbi, em Toussaint alevantados, Rebrilhantes dorsos... brilhem, brilhem, batedores de jazz rebentem, rebentem, grilhetas da Alma evade-te, 6 Alma, nas asas da Musical % ..do brilho do Sol, do Sol fecundo imortal ebelo.. Pelo teu regaso, minha Mae Outras gentes embaladas & voz da ternura ninadas do teu leite alimentadas de bondade e poesia de miisica ritmo e graca... santos poetas e sdbios... Outras gentes... nao teus filhos, que estes nascendo alimarias semoventes, coisas varias mais sio filhos da desgraga aenxada é o seu bringuedo trabalho escravo ~ folguedo... Pelos teus olhos, minha Mae Vejo oceanos de dor claridades de sol posto, paisagens roxas paisagens dramas de Cam e Jafé.. Mas vejo também (oh, se vejo...) mas vejo também que a luz roubada aos teus olhos, ora esplende demoniacamente tentadora - como a Certeza... cintilantemente firme - como a Esperanca... em nés outros teus filhos, gerando, formando, anunciando ~ dia da humanidade O DIA DA HUMANIDADE... {fin “Poemas”, Edipito: Casa dos Estudantes do Impérto. Colecgéio de Autores Ultramarinos. Lisboa 1961] DIVISAO SILABICA Por Denyse Lage Fonseca Especialista em Planejamento, implementagéo 0 Gestéo da Educagéo @ Disténcie (UFF) Gracuagao em Letras (Fundagéo Comunitéria de Ensino Superior de ltabire, FUNCES)) A divisao silabica, como 0 proprio nome indica, 6 a separacdo das silabas que compdem uma palavra. Mas 0 que é uma silaba? E, segundo Cegalla (2008, p.36), “um fonema ou grupo de fonemes emitidos num s6 impulso da voz (impulso expiatério)". Em regra, 0 processo de divis&o silabica se dé por meio da soletracao. E valido acrescentar que cade silaba tem a presenga obrigatéria de uma vogal, que pode aparecer sozinha ou acompanhada de semivogais ou consoantes. O hifen é empregado para assinalar a separagao das silabas. No que se tange ao ntimero de silabas, as palavras so classificadas em: monossilabas (aquelas que apresentam apenas uma silaba); dissilabas (aquelas que epresentam duas silapas); trissilabas (aquelas que apresentam trés silabas) ¢ polissfiabas (aquelas que apresentam mais de trés silabas). Neste encantador posma de Roseana Murray, ha diferentes palavras que se classificam dessas formas. Observe MAQUINA DE COSTURA A avé tem uma maquina de costura que foi da mae da sua mae, da sua avo, A avo pedala a maquina @ costura rendas na barra dos vestidos, cosiura um sol e uma lua no bolso das camisas, costura uma hora na outra, um carinho no outro. E 0 chao fica cheio de fios e linha colorida enquanto a avé vai costurando amor. Veja alguns exempios das referidas palavras: + Monossflabas: me, sol, cho +» Dissilabas: -v6, fi-cs, a-mor. + Trissilabas: mé-qui-na, pe-de-la, ca-mi-sas. > Polissilabas: co-lo-tida, cos-tu-ran-do. Regras de separacio silébica Q que podemos separar? * As vogais que representam hiatos: ci-tr-me, du-eo, lu-a, ru-i-do, vied-va + As letras que indicam os digrafos ("*, “ss”, “so”, “sg” e *xc’) bar-ri-ga, tra-ves-sa, dis-ci-pli-na, nas-go, ex-ce-len-te + Os encontros consonentais que so "separdveis", levando-se em consideragao a regra da soletragao. Eles aparecem no interior dos vocébulos: ab-sur-do, ad-vér-bio, af-to-so, cor-rup-¢4o, téc-ni-ca © que ndo podemos separar? Letras que formam ditongos e tritongos: 4-gua, di-nhei-ro, i-del-a, joi-a, jau-l a-ve-ti-guou, extor-quiu, quais, sa-guaio, Urugui + As letras que representam os digrafos (‘ch’, “Ih”, “nh’, “gu” e “qu’) sha-ve, mi-tho, ni-nho, gui-a, que-ti-do... + Os encontros consonantais que sdo “inseparaveis’, tendo em vista a regra da soletragao Normaimente, esse tipo de encontrado consonantal é composto de uma consoante mais ou" cla-re-za, Bra-sil, em-pre-sa, pa-les-tra, psi-c6-lo-g0... Separagao de palavras no fim de uma linha Vooé deve seguir algumas regras em relacdo a separagao de silabas, quando for translinear, ou seja, passar de uma linha para outra na construgéio de um texto. Confira-as: + N&o separe dissilabos (de extens4o menor) para no ocorrer 0 isolamento de uma letra: Ja era bem tarde... Por isso, no me encontrei com ninguém na ru- a. rrado) J& era bem tarde... Por isso, néo me encontrel com ninguém na tua. (Certo) + Nao separe a silaba formada por vogal em palavras que tém mais de duas silabas: Sempre quando ia & casa dos avés, ele saboreava a- meixas. (Errado) Sempre quando ia & casa dos avés, ele saboreava amei- xas. (Certo) + Use o hifen na linha seguinte quando a palavra, que encerra a linha anterior, apresenta esse recurso. Isso significa que voc8 deve repetir o hifen: Fui ao zool6gico e fiquei encantada com a arara- azull (Errado) Ful ao zoolégico e fiquei encantada com a arara- -azull (Certo) Para concluir A diviséo sildbica a separagdo de uma palavra por silabas, No geral, esse processo ocorre por meio da soletrago. Mas, ha regras que regem a separacao de vocabulos que apresentam encontros vocalicos e/ou consonantais; além daqueles que apresentam digrafos. Quanto ao ntimero de silabas, as palavras classificamn-se em monossilabas, dissilabas, trissflabas e polissilabas. Referénclas: BECHARA, Evanildo. Moderna gramética portuguesa. 38.ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira. 2017. 7 CEGALLA, Domingos Paschoal. Stlaba tonicidade. in: _ Novissima gramética da lingua portuguesa. 48.ed. S40 Paulo: Companhia Editora Nacional, 2008. p.36-38. MURRAY, Roseana. Maquina de costura. Disponivel em: . Acesso em: 13 de novembro de 2019. : COMO FAZER UM RESUMO Um resumo nada mais é do que um texto reduzido aos seus t6picos principais, sem a presenga de comentarios ou julgamentos. Um resumo nao é uma critica, assim como a resenha 0 é; 0 objective do resumo é informar sobre o que é mais importante em determinado texto. Para Plato e Fiorin (1995), resumir um texto significa condensé-o na sua estrutura essencial sem perder de vista trés elementos: 1. as partes essenciais do texto; 2. a progressdio em que elas aparecem no texto; 3. a correlacao entre cada uma das partes. Se 0 texto que estamos resumindo for do tipo narrativo, devemos prestar aten¢ao aos elementos de causa e sequéncias de tempo; se for descritivo, nos aspectos visuais e espaciais; caso 0 texto for dissertativo, é bom cuidar da organizaco e construcdo das ideias. Existem, segundo van Dijk & Kintsch (apud FONTANA, 1995, p.89), basicamente 3 técnicas que podem ser fiteis 20 escrevermos uma sintese. Sao elas: © apagamento, a generalizacde e a construcao. ‘Apagamento Como no nome ja diz, o apagamento consiste em apagar, em cortar as partes que so desnecessérias, Geralmente essas partes so os adjectivos ¢ os advérbios, ou frases equivalentes a eles. Vamos ver um exemplo: Ovelho jardineiro trabalhava muito bem. Ele arrumaya muitos jardins diariamente. Sendo essa a frase a ser resumida através do apagamento, poderia ficar assim: O jardineiro trabathava bem. Cortamos os adjectivo “velho” e o advérbio “muito” na primeira frase e eliminamos a segunda, Ora, se o jardineiro trabalhava bem, 6 porque arrumava jardins; a segunda informagao redundante. Generalizacao A generalizacdo é uma estratégia que consiste em reduzir os elementos da frase através do critério semAntico, ou seja, do significado. Exemplo: Pedro comeu picanha, costela, alcatra e coragéo no almoco. As palavras em destaque sio carnes. Ento, o resumo da frase fica: Pediro comeu carne no almogo. Construgaio i A técnica da construgao consiste em substituir uma sequéncia de factos ou proposicSes por uma tinica, que possa ser presumida a partir delas, também baseando-se no significado. Exemplo: Maria comprou farinha, ovos ¢ leite. Foi para casa, ligou a batedeira, misturou os ingredientes colocou-os no forno. ‘ Todas essas acg6es praticadas por Maria nos remetem a uma sintese: Maria fez um bolo. Além dessas trés, ainda existe uma quarta dica que pode ajudar muito a resumir um texto. £ a técnica de sublinhar. Enquanto voc estiver iendo o texto, sublinhe as palavras ou frases que fazem mais sentido, que expressam ideias que tenham mais importancia. Depois, junte seus sublinhados, formando wm texto a partir deles e aplique as trés primeiras técnicas. EXERCICIO PRATICO Ler nao 6 apenas passar os olhos no texto. £ preciso saber tirar dele o que é mais importante, facilitando o trabalho da meméria, Saber resumir as ideias expressas em um texto nao é dificil. Resumir um texto 6 reproduzir com poucas palavras aquilo que o autor disse. Para se realizar um bom resumo, séo necessérias algumas recomendagies: 1. Ler todo 0 texto para descobrir do que se trata. 2, Reler uma ou mais vezes, sublinhando frases ou palavras importantes. Isto ajuda a identificar. 3. Distinguir os exemplos ou detalhes das ideias principais. 4, Observar as palavras que fazem a ligagao entré as diferentes ideias do texto, também chamadas de conectivos: "por causa de", "assim sendo", "além do mais", "pois", "em decorréncia de", "por outro lado", 5. Fazer o resumo de cada pardgrafo, porque cada um encerra uma ideia diferente. 6, Ler os parégrafos resumidos e observar se hd uma estrutura coerente, isto 6, se todas as partes estéo bem encadeadas e se formam um todo. 7. Num resumo, nao se devem comentar as ideias do autor. Deve-se registar apenas 0 que ele escreveu, sem usar expressées como "segundo o autor", “o autor afirmou que”. 8, 0 tamanho do resumo pode variar conforme o tipo de assunto abordado. E recomendavel que nunca ultrapasse vinte por cento da extensao do texto original. 9, Nos resumos de livros, naio devem aparecer didlogos, descrigdes detalhadas, cenas ou personagens secundarias. Somente as personagens, os ambientes e as acpes mais importantes devem ser registados. Vamos resumir um pequeno texto narrativo: Robinson Crusoé Meu nome é Robinson Crusoé, Nasci na velha cidade de lorque, onde navios entram e saem de um rio muito largo. Quando crianga, passava a maior parte do meu tempo a olhar aquele rio de aguas téo quietas, caminhando sem pressa para o mar lé Jonge. Como gostava de ver os navios em movimento, com velas branquinhas enfunadas pelas brisas! Isso me fazia sonhar as terras estranhas donde eles vinham e as maravilhosas aventuras acontecidas em mar alto. Eu queria ser marinheiro. Nenhuma vida me parecia melhor que a vida do marinheiro, sempre navegando, sempre vendo terras novas, sempre lidando com tempestades e monstros marinhos. O meu pai ndo concordava com isso. Queria que eu tivesse um offcio qualquer na cidade, ideia que eu ndo podia suportar. Trabalhar o dia inteiro em oficinas cheias de pé era coisa que nao ia comigo. ‘Também no suportava a ideia ‘de viver toda vida naquela cidade de lorque. 0 mundo me chamava. Eu queria ver o mundo. : Minha mée ficou muito triste quando deciaret que, ou seria marinheiro, ou ndo seria nada. ~ Avida do marinheiro - disse ela - 6 uma vida bem dura. Ha tantos perigos no mar, tanta tempestade, que muitos de navios acabam naufragando. Disse também que havia no mar terriveis peixes de dentes de serra, que me comeriam vivo se eu cafsse na agua. Depois me deu um bolo e me beijou: 2 ~ £ muito mais feliz quem fica na sua casa. Mas nao ouvi os seus conselhos. Estava resolvicio a ser marinheiro e havia de ser. — JA fiz dezoito anos ~ disse um dia a mim mesmo ~ é tempo de comegar. E engajei-me num navio. Daniel Defoe, Robinson Crusoé, Tradugiio: Monteire Lobato, Ed. Brasiliense. A- Faca um questiondrio sobre o texto e responda com respostas completas. 1- Quem é o protagonista, ou seja, a personagem principal da hist6ria? A personagem principal se chama Robinson Crusée. 2- Onde ele nasceu? Ble nasceu na cidade de lorque. 3-Com o que ele sonhiava? Ele sonhava com terras estranhas e maravilhosas aventuras. 4- Como Robinson queria realizar esse sonho? Robinson queria ser marinheiro para estar sempre navegando... : 4-Seu pai concordava com isso? 0 pai de Robinson nao concordava com a ideia do filho ser marinheiro, queria que o filho tivesse um offcio qualquer. 5+ Eo que Robinson pensava disso? Ele ndo suportava a ideia de trabalhar numa oficina, pois o mundo o chamava e ele queria ver o mundo. 6- Ea opinido da mae de Robinson? Amie dele ficou triste quando ele disse que partiria, disse que a vida de marinheiro é bem dura e muitos acabam naufragando. 7-E qual foi a reaceaio de Robinson? Ele nao ouviu os conselhos da mde e quando fez dezoito anos, engajou-se num navio. A-Copie somente as respostas e veja o resultado: A personagem principal da histéria chama-se Robinson Crusée. Ele nasceu na cidade de lorque, Ele sonhava com terras estranhas ¢ maravilhosas aventuras. Robinson queria ser marinheiro para estar sempre navegando... 0 pai de Robinson nao concordava com a ideia do filho ser marinheiro, queria que o filho tivesse um offcio qualquer. Ele nao suportava a ideia de trabalhar em oficina, pois o mundo o chamava e ele queria ver 0 mundo. Arnie dele ficou triste quando ele disse que partiria, disse que a vida de marinheiro é bem durae muitos acabam naufragando. Ele nao ouviu os conselhos da mae e quando fez dezoito anos, engajou-se num navio. C- Depois de ler os pardgrafos resumidos, observe se hé uma estrutura coerente, isto é, se todas as partes estdo bem encadeadas.e se formam um todo, Se nao estiver, corrija-o. . PS. Essa téenica pode ser utilizada em quaisquer tipes de textos e de quaisquer tamanhos. Se voc# néo der respostas completas para as questées a técnica ndo dd certo. Sair da cepa torta Edgar Correia FPUBLICO, 15 de Outubro de 2002 Na passada sexta-feira, derradeiro dia da visita oficial & Finlandia, o Presidente da Reptiblica omentou que "ou Portugal muda o seu modelo de desenvolvimento, apostando na inovacao, a ciéncia e nas tecnologias do futuro, ou nunca saira da cepa torta", que "mesmo os sectores acionais com exportagées tradicionais tm de comegar a incorporar outras mais-valias" e ue "o modelo da exploragao da mao-de-obra barata e nao qualificada esta acabado" evidente que esta questdo de Portugal nao sair da ‘cepa torta”, que Jorge Sampaio imspiradamente evocou, ou, por outras palavras, o problema do atraso do pais e da distancia cle décadas que nos separa dos paises mais evoluidos do ponto de vista econémico e social, raomeadamente os pertencentes a Uniao Europeia, constitui um velho problema nacional nao resolvido. Para o salazarismo, durante muito anos, essa aproximagao nem foi considerada possivel - "Portugal 6 um pais pobre" - nem muito menos desejada, pelos riscos de evolugao democratica e das mentalidades que envolvia. Foi o tempo do "reino cadaveroso", esse meio s culo conservador e retrégrado que, apesar de ter visto 0 fim através de um profundo proceso revolucionario, ainda reaparece na ideologia classista de velhas formas de dominio © de exploracao. A\p6s 0 25 de Abril, as diferengas nao se t8m situado tanto ao nivel dos objectivos do nosso desenvolvimento, como das vias e do "modelo" para serem atingidos. A crenga em que o Processo de integragao haveria de assegurar de forma automatica a convergéncia real para 8 niveis médios da Uniéo Europeia revelou ser completamente ilusOria. E 0 pensamento neoliberal que atribui ao mercado a capacidade de atingir espontaneamente os resultados mais eficazes e que afasta a possibilidade de o Estado intervir sobre © mercado, para (como afirma Joseph Stiglitz) "guiar 0 crescimento econémico e melhorar a sorte de todos", mostrou ser uma completa e bem pouco desinteressada falacia Portugal néo conseguira, de facto, sair da cepa torta, para usar a preocupada afirmacao de Jorge Sampaio, se nao se registarem progressos na compreenséo politica das causas das nossas dificuldades e se no for desenvolvido, a partir dai, um caminho para a sua superagao. E esse caminho so poderd ser verdadeiramente percorride quando 0 debate politico-partidario deixar de estar dominado pela demagogia e pelo eleitoralismo, que, além do descrédito das instituicdes demoeraticas, desfocam a compreensao dos velhos € novos problemas e dos verdadeiros desafios com que Portugal esta confrontado, bem como das variantes politicas que democraticamente se devem oferecer para a ua superagao. Nao se trata de andar a procura de uma “politica nacional’ de sentido nacionalista, como durante muito tempo foi entendida e hoje esta (felizmente) ultrapassada. Mas da necessidade da formulagao € da afirmagao - aos varios niveis - dos interesses do pais e dos portugueses, num contexto de acrescidas interdependéncias a escala internacional e de mudangas profundas. Da manutengdo e reforgo da capacidade de decisdo estratégica residente no pais. Da valorizagao do factor humano e de todos os nossos recursos. Da mobilizagéo do dinamismo social e democratico da sociedade portuguesa e da potenciacdo da sua capacidade cultural e da sua adaptabilidade as mudanges. As palavras proferidas pelo Presidente da Reptiblica levantam, porém, um outro e mais imediato problema, que é 0 de saber como pode Portugal sair da cepa torta quando o Governo actual caminha em sentido exactamente oposto ao proclamado, na Finlandia, como indispensavel. E isso que esté a acontecer com a auténtica declaracao de guerra social contra os trabalhadores declarada pela coligagao governamental (anteprojecto de Cédigo de Trabalho ¢ redugao salatial) em nome das pretensas vantagens competitivas de uma politica de exploragao de mao-de-obra barata. Como esta a acontecer com a desvalorizagao da contribuig&o da organizagao € gestao das empresas, do progresso tecnolégico, da formagao e valorizagao profissionais, para o aumento da produtividade. Do mesmo modo que sucede com a retoma de uma politica abertamente economicista em relagdo ao financiamento do ensino superior ¢ da I&DE (Investigacao e Desenvolvimento Experimental). E com o desprezo de margens de manobra em matéria orcamental e a ope40, num contexto de sério abrandamento econémico, pela reducao do investimento ptiblico ou a sua manutencdo em projectos (como os dez estadios do Euro 2004) de efeito reprodutivo mais que problematico. Mas n&o é apenas na esfera econdmica e na degradagao da situacao social que os efeitos de politicas como as que o Governo portugués esta a empreender devem ser avaliados. E hoje uma evidéncia que o crescimento das desigualdades esta também a fragilizar a propria democracia. Quando se comparam as respostas da ultima vaga do "Inquérito Europeu sobre os Valores" realizado em 1999 e envolvendo 34 paises, com os dados apurados em 1981 e em 1990 - que a revista "Futuribles" acaba de publicar e o jomal "Le Monde" do titimo domingo de fazer eco -, a evolucao dos valores politicos deixa perceber tendéncias de fundo que n&o podem ser ignoradas.£ um facto que 86 por cento dos cidaddos da Unido Europeia consideram a democracia um sistema politico muito bom. Mas, ao mesmo tempo, 20 por cento defendem um govern conduzido por um homem forte que nao tenha que se preocupar com o parlamento e com eleigdes, enquanto 44 por cento nao escondem a sua preferéncia por uma solugao em que o poder seja confiado a especialistas. Em vivo contraste com a ligagao as instituigoes do Estado-providéncia, a confianga no parlamento continua a reduzir-se © pouco ultrapassa um tergo dos inquiridos. O facto de se ser de esquerda ou de direita nao se reflecte de modo muito diferente na confianga em relagao ao pariamento (43 por cento contra 42 por cento) e entre aqueles que se manifestam contra o sistema demooratico, é revelador que 13 por cento se situem a esquerda e 19 por cento a direita. Nao deixa além disso de ser inquietante que os dados relativos a Portugal situem o nosso pais entre aqueles onde os valores democraticos so mais frageis (26 por cento de pessoas consideradas como nao democratas) e que os dados do inquérito sustentem igualmente a existéncia de possibilidades de aparecimento, em todos os paises europeus e sob uma forma ou outra, de um nacional-populismo. Quando a direita, a mais de trés anos do seu termo, jé esta a proceder a contagem decrescente do mandato do Presidente da Repiiblica e a preparar-se para a conquista desse érgaio de soberania, 20 mesmo tempo que procura condicionar e desvalorizar 0 exercicio dos poderes presidenciais pelo actual titular, nao é legitimo que muitos cidadaos portugueses se manifestem Politicamente em sentido contrario? E nao é igualmente legitimo que reforcem a sua propria intervengao politica e a fagam acompanhar do seu voto no sentido de que Jorge Sampaio, no quadro das suas competéncias constitucionais, mas também num contexto de uma grave crise internacional e de uma generalizada inquietacao nacional, exerga diariamente, com a serenidade, mas igualmente com a pertinacia que todos Ihe reconhecem, todos os poderes democraticos que os portugueses Ihe confiarar? <

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