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Hugo Filgueiras de Aratijo* As perspectivas onto-epistemolégica Arcumentos, | © ¢tico-antropoldgica da dualidade corpo/alma, no Fédon, de Platao Revista de Filosofia RESUMO. © presente artigo trata-se de uma anélise da relacho corpo/alma no didlogo Fédon, de Platdo, a partir de duas perspectivas: a onto-epistemologica e a ético-antropolégica. O sentido ético culpa o corpo em tendenciar o homem as paixées (66bss), em contrapartida com a alma que o leva a prética das virtues (68-69) e &atividade filosofica; a onto-epistemolégica parte da relacéo que Platéo estabelece, por um lado, entre corpo e a percepedo-sensivel (aisthésis)e, por outro, a alma e a aquisicéo do saber (epistéme), de forma mais minuciosa, entre o corpo e os sensiveis e a alma com as Formas inteligiveis. Dizer que Platéo despreza 0 corpo em detrimento da alma refletiria na afirmacdo de que ele despreza a senso-percepcdo em detrimento da aquisicéo do saber. Inimeros comentadores e diversos compéndios tam se inspirado no Fédon e na Repiiblica para defender esse desprezo, que Platao, segundo eles, manifesta pelas sensacées. Todavia, tal tese vem causar um grande problema no entendimento de toda a obra platénica, visto que no Teeteto (1524) Platéo identifica o corpo, na sua fungéo senso-perceptiva, com o saber, dando a esse, nesta busca, uma participagéo muito relevante. O sentido dualista radical, esse desprezo pelo corpo e pela sensacdo atribuido a Platéo, que pode ser entendido na leitura do Fédon é resolvido no préprio didlogo, a partir dos argumentos da reminiscéncia e da Teoria das Formas, que enlaca o sensivel ao inteligivel . Palavras-chave: Alma; Corpo; Dualidade; Anamnese. ABSTRACT This article deals with is an analysis of the body / soul in the dialogue Phaedo, Plato, from two perspectives: the onto-epistemological and ethical-anthropological. The ethical sense of the body trending fault the man to the passions (66bss), against the soul that leads to the practice of virtue (68-69) and the philosophical activity, the onto-epistemological part of the relationship that Plato establishes, for one hand, and the perception of body-sensitive (aisthesis) and, second, the soul and the acquisition of knowledge (episteme), more detail, between the body and soul with the sensitive and the intelligible forms. To say that Plato despised the body over the soul reflected in the statement that he despises the sense-perception at the expense of acquiring knowledge. Numerous commentators and several textbooks have been inspired in the Phaedo and the Republic to defend such contempt, that Plato, they say, manifested by feelings. However, this thesis has been causing a major problem in understanding all the work of Plato, as in the Theaetetus (152d) Plato identifies the body, in its sense-perceptual function, with knowledge, giving it a stake in this quest very relevant. The radical dualistic sense, this contempt for the body and the feeling attributed to Plato, which can be understood when reading the Phaedo is solved in the dialogue itself, as reminiscent of the arguments and the Theory of Forms, which connects the sensible to the intelligible. Key words: Soul; Body; Duality; Anamnesis. * Professor da Universidade Federal do Cearé e doutorando no Programa Integrado UFPB, UFPE UFRN, ue Iramance Bro 36-2017 Introdugao Entender que a alma é prisioneira do corpo sem levar em consideracao 0 contexto do Fédon € categoricamente causar um grande problema no entendimento da obra platénica, visto esse por vezes poder levar a crer que Platao, em sua obra, despreza radi- calmente o corpo, e conseqtientemente a sensacéo, vendo-a como fonte de instabili- dade e ilusao em contraposicao as Formas Inteligiveis, Sao incontaveis os comentado- res! e compéndios de filosofia que — a partir da leitura do Fédon e dos livros centrais da Repiiblica ~ insistem nessa leitura, de um Platéo mais que dualista, puritano.? Ora, isso é um grande equivoco, pois tal conclu- séo inviabiliza uma leitura unitéria da obra platénica, visto que em outros didlogos, como 0 Teeteto (152d), por exemplo, Platéo vé a sensacao como a base da cognicao. Nesse didlogo néo é mencionada de forma explicita a existéncia das Formas - como acontece no Fédon e na Reptiblica, em que o conhecimento se dé a partir delas.® A leitura do Teeteto, assim como no Fédon, também causa divergéncias entre al- guns comentadores, Se a partir do Fédon ha ‘quem considere a senso-percepcao despre- zada por Platao, a partir do Teetefo hé quem defenda que houve um abandono da Teoria das Formas por parte do filésofo.* Entre- tanto, defender uma ou outra posicao “ex- tremista” inviabiliza a possibilidade de co- nhecimento na filosofia platénica, em que percepgao-sensivel (aisthesis) e aquisicao do saber (epistéme), mesmo que aparentem ser atividades opostas, se relacionam em vista da obtencéo da verdade (Fédon 72-76; Teeteto 184-186). Ainda considerando a reflexao sobre 0 desprezo ou nao da sensacao no Fédon, con- sideramos que, nao s6 para 0 entendimento do Teeteto, tal interpretacéo causa proble- mas, mas também na leitura do préprio Fé- don. Pois se em um momento Platéo opée corpo e alma ao considerar os sentidos um entrave para alcangar a sabedoria ~ princi- pio para viver uma vida virtuosa, em cinco momentos posteriores (74c, 75a, 75b, 75e € ' “Inimeros comentadores, bem como a generalidade dos compéndios, sem duvida inspirando-se no Fédlon © nos Livros centrais da Republica, insistem no desprezo que Platdo manifesta pelas sensagées, encarando-as como lonte de instablidade e usdo, em coniraposigao as Formas inteligiveis". (SANTOS, 2004, p. 1). Essa interpretagao é antiga, remonta-se & Idade Média, desde Agostinho que apreendeu a filosofia platGnica na ramilicagdo do neoplatonismo de Plotino. Em fil6sofos mais recentes como Nietzsche percebe-e também essa atribuigSo ao pensamento platnico de uma texacerbagéo da alma em detrimento do corpo (Além do bem e do Mal, 7), mesmo quando remonta-e ao Cristianismo Indiretamente ataca o platonismo, considerando.0 como ndo- original, por ser, segundo ele, um platonismo para o Povo. Contudo so nos manuais de fiosotia, como dissemos anteriormente, que esa letura se mostra mais explicta. * Odualsta considera que hé duas realidades opostes (o corpo e alma), mas que ndo se anulam, pois so complemen. tare, é 0 puritano nega-o, ové como algo que precisa ser desprendido da alma por influencié-a, pois de modo algum tem serventia. Aviso platénica, por mais que no Fédan por vezes demonstre que 0 corpo atrapalha a alma de chegar { sabedoria, ndo v8 0 corpo como um mal, pois no mesmo diélogo, come defenderemos em nosso trabalho, Platdo con. sidera que 6 com o auxtlio do corpo que se pode chegar ao saber. SE bem verdade que no Teeteto Plato deixa a detinigéo de conhecimento no téo bem resolvida, No passo 210a Sé: crates diz ser o conhecimento nem sensagdo, nem opinido verdadelra e nem explicagéo racional, acrescentada a ees opinido verdadeira *(G, Ryle, um conhecido intérprete de Platdo, defende essa tese do abandono das Formas Inteligivels no Teeteto por Platio nao abordis-las explicitamente como o faz no Fédon, por exemplo, sua tese se opée A de Conford na interpretagao do Teeteto. Ryle apresenta essa tose na publicagéo “Logical Atomiam In Plato's Theaetetus" Phérenesia 35, 1990, 2-16 Outros interpretes seqquem a defesa de Fiyle, como Sayre em “Why Plato never had a theory of Forms”, in Proceedings: of the Boston Area Colloquium in Ancient Philoshopy 9, 1995, 167-199; e F J. Gonzalez, “Perché non exise una “teoria platonica delle idee". in Platone e la tradizione platonica, M. Bonazzie F Trabattoni, Milano 2003, 31-68. Atese de Ryle fe sous continuadores pode ser relutada ao percebermos que no Teetoto, mais especilicamente no passo 184b-186e, Pla to, ao relacionar a sensibilidade com a atvidade sintética da alma, mostra que nao ha nenhuma potabllidade de haver fa interpretagéo dos senaiveis, e mals ainda de atingir o saber através da eenso-percepedo, Essa alirmagéo se remete, ‘mesmo que nao diretamente, ao condicionamento que hA da experiéncia cognitva atual A experiéncia cognitva ante Hor & senso-percepgio, que no caso seria o conhecimento das realidades em si (as Formas), que ordenam a percepcéo sensivel. Mais & frente no argumento da reminiscéncia voltaremos a esse tema Recnaaies, Ano 3,°.6- DIT u7 ‘75e-76a), no mesmo didlogo, os sentidos s80 apresentados como participes do processo de aquisicao da sabedoria, pois é através da sensibilidade que se pode recuperar o saber, enquanto experiéncia inteligivel. Frente a tais argumentos podemos questionar o porqué dessa dupla posicéo so- bre a sensagao no Fédon, Segundo Santos, hé duas vertentes que Platdo articula nesse didlogo, estabelecendo a necessidade da se- paracéo do corpo e da alma: a ético-antropo- légica e a onto-epistemolégica. (SANTOS, 2004 p. 2). As duas vertentes so como dois sentidos dados a dualidade, que vém justifi- car essa separacdo entre o corpo e a alma na vida de um filésofo, no exercicio da Filosofia. Na perspectiva ético-antropolégica, corpo e alma sao apresentados como duas realidades diferentes, contrapostas, sendo © corpo uma coisa mé (6b). Suas paixdes e concupiscéncias dao origem as guerras, dissensdes etc, (66c), dele somos escravos (66c), e que é semelhante ao mortal (80b-d), e seu fim é a corupgéo (78d-e) etc; en- quanto que a alma é senhora (80a), seme- Ihante ao divino (80b-d) e seu fim é a imor- talidade (80e). A perspectiva onto-epist: molégica comeca a ser articulada em 65ab, em que Sécrates afirma que 0 corpo é um entrave para a alma, quando na investiga ao se Ihe pede auxilio, Sendo assim, para um filésofo que busca conhecer as coisas na sua esséncia, a morte é vista como uma libertacdo (65c-66a), pois enquanto ele es- tiver no corpo, tal atividade corre o risco de ser desvirtuada. As duas perspectivas tém em comum © proceso de aquisicao do saber, pois é a atividade senso-perceptiva, competéncia do corpo, que esté como questo de fundo na relacdo entre corpo e alma. A sensacéo (aisthesis) ¢ abordada tanto no plano ético, associada ao prazer, sendo por isso é um entrave, quanto no epistemolégico, asso- ciada ao processo de recordagéo das For- mas, constituindo um auxilio no seu reco- nhecimento. Percebe-se que na primeira perspec- tiva Platao vai até as iltimas consequéncias opondo as duas entidades, considerando que a alma leva o homem a pratica da vir- tude enquanto o corpo, que pende as pai- 's € aos prazeres, a atrapalha nessa con- quista. A abordagem epistemolégica conse- gue enlacar corpo e alma a partir da oposi- 40 da triade corpo-aisthesis-sensivel 4 alma- epistémé-Forma. Analisaremos cada perspectiva da dualidade corpo e alma no Fédon, a partir dos argumentos que Platao apresenta para convencer seus discipulos de que a filosofia é um preparar-se para morrer. Sentido ético-antropolégico: virtude é sabedoria Mesmo nao tendo o Fédon um caré- ter puramente antropolégico, podemos considerar que hé nele uma nogdo de ho- mem, pois 0 discurso no diélogo ¢ sobre a alma e o corpo humanos, diferentemente do Timeu, cuja abordagem centra-se no corpo e na alma césmicos, tratando s6 posteriormente da relacao corpo/alma, nos humanos, Em Platéo, o homem é essa composi- ao de corpo e alma®, e o que esta em ques- t&o no didlogo é a relacéo que se estabe- lece entre essas entidades na pessoa que se dé ao prazer da filosofia. Sabemos que a filosofia socratica galgou novos caminhos de especulacao filoséfica, diferentemente do que até entao vinha sendo estudado pe- los filésofos chamados “pré-socraticos."* Sécrates comega a refletir sobre a pessoa 5 No Cdrmides (1 5€dss) hé uma discussdo sobre a sade. Diz-se ai que para obté-la é preciso cuidar tanto da alma como do corpo, o que mesira que a visio platénica do homem é a totalidade da composigo do corpo e da alma. No Fedro (270) Sécrates reconhece também as duas dimensées do homem corpo e alma, Sécrates néo se preocupa em estudar o Cesmos, como seus antecesscres, mas de refler sobre o homem. Cicero, em algumas de suas obras (Tusculanae V4; Académicoe | 4; Brutus 8, 31) , insiste em atribuir a Sécrates, em suas rellexdes fantinaturalista, a deciefo de “lazer descer a tiloecia dos céus 4 terra’. Nos pastoe 99e-10le do Fédon vé-2e uma critica considerdve as rellextes naturaliatas, em que Séci expe que 6 preferivel restigar at vés delas inquirr a verdade a persist em lixar os hos nas coisas (to onta) us Tran = Feo 3 62011 humana, dotada de razao, capaz de conhe- cere, por conseguinte, incapaz de nao agir em vista do bem.? O primeiro argumento usado por Pla- téo quando opée corpo e almana abordagem ética 6 sobre a virtude. Para ele a virtude 6 sabedoria sendo assim é conseguida somente por aquele que se da a busca do saber. A filosofia no pensamento socratico- platénico ¢ a atividade que garante ao ho- mem a possibilidade de ser virtuoso, pois na medida, que se aproxima da verdade ~ visando 0 bem ~ conseqiientemente viveré uma vida virtuosa. A vivéncia ética esté in- trinsecamente ligada a atividade filosética, logo tudo aquilo que impeca o homem de fazer filosofia é considerado um entrave e um empecilho na busca tanto de um, como do outro. E perante essa afirmacdo que Pla- to comeca a expor a oposicao entre corpo e alma, considerando o primeiro um entrave efou um cércere. Sua defesa de que, no am- bito ético, o corpo é um entrave é feita com duas argumentacées: 1. O corpo é entrave por causa dos prazeres; 2. E entrave quando o homem é aco- metido por doencas e paixées. Na analise do primeiro caso, primeira- mente destacamos 0 fato de Platao nao con- siderar compativel a condigéo do filésofo com a entrega a satisfacdo dos prazeres: [Sécrates] -Oravélé, meu caro, se ainda neste ponto a tua opinido coincide com ‘minha, pois sé assim, creio, poderemos ‘aprofundar 0 alvo das nossas indagacées, Parece-te compativel com a condigso de filésofo entregar-se todo & satislagao dos chamados prazeres, como sejaa comida, a bebida e outros tals? - Bem longe disso, Sécrates ~ exclamou Simias, ~E aos prazeres sensuais? -De modo nenhum! -Eoutras demasias concementes ao cor po, achas que o homem de que falamos thes daré grande aprego? Faré por exem: plo, questéo em possuir vestes e calgado sumptuoso, em embelezar a sua pessoa com toda a casta de adornos, ou relegé: los-4 pura esimplesmente, na medida em que puder dispensé-los? ‘Querocrer que os relegaré —respondeu-, se 6 que se trata de um verdadeirofilésoto. Crés, portanto, sem restricdes, que os Intereaees de um homem desta témpera nada tém a ver com o corpo e que, pelo contrério, a ele renuncia até onde for possivel, para se concentrar sobrea alma [1 (Fédon 66de). Como percebemos, 0 corpo nesse asso do Fédon aparece relacionado ao pra- zer quando o "homem se dedica todo"® tanto as necessidades proprias da comida e da bebida, como também aos prazeres sensu- ais, é distraido do desejo de encontrar a sa- bedoria, Sécrates apresenta a busca da sa- bedoria como a verdadeira fonte de satisfa- géo no homem, e esta nao pode perder seu lugar para outro tipo de atividade, mesmo que seja necessério ao filésofo renunciar - “até onde lhe for possivel” - aos prazeres e ‘ao corpo, que por vezes o dispersam, para se concentrar na alma. 2 Podemos nos referir ao intelectualismo socrético que relaciona a capacidade de conhecer a verdade (alethéia) com a vivénela da virtude (areté), "Robinson (CI. 1998, p. 4) comentaa expressdo “o homem todo", quando te relere ao Cérmides, Essa expresso usada por Platdo, segundo ele, significa corpo e alma combinados. Poderlamos assumi-la também para o Fédon, visto que quando o homem tado ae da ace prazeres, ele ocupa as duas entidades em seu empenho ®"Tanto no Fedro, quanto no Timeu, a sensa¢So também ¢ abordada nesse &mbito ético. No primeiro,o simples fato de a alma estar no corpo constitul uma queda de sua condicéo em que vivia na contemplagéo do Ser verdadeiro e que vindo ‘20 mundo se prendeu a um corpo ~ considerado um sepulcro -, como uma osira se prende a uma concha (250). Na vida terrena quanto mais o homem se prende ace prazeres, ele se torna impuro, ese se dedicar as virtudes,alcancard tum feliz destino apés se desprencler novamente do corpo. Sendo assim, a alma que na vida terrena tenha buscado a Sabedoria como um amante busca o amado, teré sua integridade recuperada. O Amor & Sabedoria, traduzido como a dedicagio a uma vida filosética, que consiste em viver uma vida virtuosa, alastada dos prazeres, 6 0 que garante & alma de novamente ter seu estado de flicidade de volta, No Timeu a sensagéo é vista como aquilo que suscita 0 temor, a cé Recnaaies, Ano 3,°.6- DIT ug Além dos prazeres que apresentamos — ditos por Platao de necessidade de subsis. téncia - hé outros empecilhos pelos quais 0 corpo é responsvel: Indimeros s80, de facto, os entraves que © corpo nos pée, e néo apenas pela natural necessidade de subsisténcia, ppois também doencas que sobrevenham podem ser outros tantos impeditivos da nossa caga ao real. Paixdes, desejos, temores futlidades e fantasias de toda fordem - com tudo isso ele nos agam- barca, de tal sorte que néo seré exagero dizer-se como se diz, que, sujeitos a ele, jamais teremos disponibilidades para pensar. E sendo vejamos: as guerras, as Jutas, as discérdias. quem as fomenta a no ser 0 corpo. ele e os seus apetites? E de fato © desejo de possuir riquezas que esté na base de todas as guerras: © {as riquezas, somos por sua vez levados a adquiri-las em proveito desse corpo que seguimos como escravos...Daf, por todas {as razdes apontadas, esta nossa falta de disponibilidade para a filosotia. Mas no 6 tudo: se algum momento ocomponos dé {réguas e nos viramos para qualquer tipo de indagagao, logo veremos os nosso es- forgos de todo em todo baladados por um ssibito temor, pela conlusao em que nos Janga e nos toma inaptos para discemnir averdade. (Fédon 66bss) Nesse passo, Platao apresenta outros tantos iniimeros entraves que impedem o homem na “sua caca ao real’. Empenhado em buscar a verdade, o homem muitas ve- zes é atrapalhado pelas doencas, ou empur- rado pelo corpo, através das paixdes e am- bicées, a praticas que o impedem de conhe- cer, tais paixdes tiram a disponibilidade para a filosofia (66c). Sécrates define que o filésofo 6 aquele que em vista da vivéncia da virtude no troca “prazeres por prazeres” (69a), buscando a sabedoria (69ab). ica e todas as emogGes que podem lever o homem au Percebemos que o argumento nesse momento opée alma e corpo, pondo-a numa situacdo de necessidade de afastamento deste, por ser ele uma fonte de dispersio que a leva a néo cumprir sua competéncia: co alcance do saber. Percebe-se que Sécrates 6 radical em defender que todo tipo de en- trega ao prazer pode desvirtuar no homem aquilo que realmente é salutar & sua vida: conhecer a verdade. O corpo tem necessi- dades e nesse desejo de supri-las entrega- se ao prazer. Contudo o prazer nao tem me- didas e seu excesso se constitui em vicio, sendoo vicio um excesso de prazer descome- dido. O excesso de prazer, por sua vez gera perda de percepgao e desequilibrio e por conseguinte causa danos ao préprio corpo. Ea alma também padece, pois perde a li- berdade e a consciéncia e com essa perda ela se encontra impossibilitada de alcancar a sabedoria. Sendo assim, se por um lado 0 corpo é entrave, por outro a alma assume, no sen- tido ético, o papel contrario, ela é a entidade que leva o homem A pratica das virtudes (68-69) ea atividade filosética (69ab). Voltar- se para a alma é uma condicao indispensé- vel para um filésofo, pois tanto a aquisicao do saber como a vida virtuosa somente se tommam possiveis quando ela renuncia ao corpo e a tudo o que lhe é afim, para se con- sagrar a investigacao das Formas (65d-66a). A razéo constitui-se a fonte da verdade e da virtude, e tal atividade é prépria da alma. Talvez, que pelo contréri, haja uma Ginica moeda adequada, capaz de assegurar a validade de todas as trocas ~ a razdo. Sim, talvez s6 por ela fe com ela] se possa de verdade [comprar e vender] coragem, temperanga, usiga, numa palavra, a au: t€ntica viride, que & a que vem acompa- vida justa ou injusta (42ab). Sua vida ética, dedicada ou ndo & filosolia, ¢0 que garante se val er conduzido ou nao a ter novamente uma vida feliz. Novamente é a atvidade filoestica que garante a vivéncia da viride e que fundamenta a necessidade de ee apartar daquilo que pode impedir a alma de raciocinar. Contudo, mesmo sendo a sensagéo, por vezes, motivo de recelo, tem grande relev8ncia na arguigo, como podemos ver no passo 51-52 em que é apresentado um género que é sensoriével e é semelhante a um outo (Formas), tendo o seu mesmo nome. Sao pelos sensoriavels, que parecem com o que ¢ imutdvel e imperecivel, que se pode argu até ele chegar 120 Feamanes Bro 36-2077 hada de razao [.. Ea verdade consiste talvez em que temperanga, justiga © co ragem constituam uma purificagéo e todo ces tipo de emogées, e a propria raz8o,0 meio de nes purificarmos. (Fédon 69ab) Em vista de reforgar mais ainda seu argumento, Sécrates langa mao das virtudes da coragem e da temperanca, que acabam por ser identificadas com a atividade filosé- fica, relacionadas com a entrega & sabedo- ria eo desprezo pela morte (68c-e). Ele con- sidera que 0s filésofos so portadores da virtude da coragem, pois um verdadeiro amante do saber se vé tranqitilo frente ao fim da vida corpérea, em vista da plenitude da verdade que poderé obter quando purifi car sua alma da influéncia do corpo, e da temperanga porque, mesmo estando enla- gado ao corpo, vive como se jé tivesse mor- ido -dele separado -, na tentativa de afas- tarse tanto quanto possivel do que possa dispersé-lo na busca pela sabedoria!®, A busca pelo saber, constitui-se como a razéo do cuidado que o homem precisa ter em seguir e alimentar as necessidades cor- péreas. O argumento se constitui no como um desprezo pelo corpo, mas como um alerta de que o corpo tendencia a alma ao dese- quilibrio, quando essa se deixa levar pelo excesso dos prazeres, que gera vicio que é 0 oposto das virtudes. Deixa-se o prazer por causa das virtu- des e essas se conquistam a partir da ativi dade filosética, que se configura como a busca pela sabedoria, Mas essa busca se toma perfeita somente quando houver a de- finitiva separago alma/corpo, pois ela, a alma, estaré em si e por si livre de toda e qualquer possibilidade de ser desvirtuada de exercer a atividade racional. Até esse ponto do didlogo os argumen- tos séo apresentados numa abordagem ética, e esses para os interlocutores de Sécrates, sobretudo para Cebes, néo sao suficientes para suscitar a adesao (70a). Insatisfeito, 0 discipulo adverte que hé um problema na ® No pamio 68c Sécrates considera que aqueles que amam as riquezas e paixtea nAo eo amantes do saber phos - mas amantes do corpo, philosématce. Inewan questao apresentada, Mesmo que o argu- mento seja bom, nada garante que, apés a morte do corpo, a alma nao se dissipe, exis- tindo para além da morte e permanecendo com 0 uso de suas faculdades e do entendi- mento (70b). Nesse momento Platéo comega a re- correr ao argumento que fora o primeiro a introduzir 0 diélogo o dos contrérios. Entre- tanto, se antes o filésofo tratara do prazer e da dor, agora vem relacionar a vida e a morte, que é 0 tema que se segue a partir do passo 70cd. O sentido onto-epistemolégico: vida/morte - “é dos contrarios que nascem os contrarios” A primeira vista, as nogées de vida e morte j4 estao implicitas desde o inicio do didlogo, pelo simples fato de que no plano dramatico se encontram os tiltimos momen- tos de vida do Mestre. Contudo, no plano argumentativo tais nogées comecam a ser abordadas no argumento que as relaciona aos processos de geracao e corrupgao. Sécrates quer provar que a alma, apés a morte, nao se dissipa, e para isto co- meca por recorrer ao argumento dos contré- rios. argumento apresentado parte da tese de que dos contrarios é que nascem os con- trérios. Ele estende sua tese a totalidade dos seres que so sujeitos 4 geracdo, como tam- bém se propée a analisar se essa relagdo de ‘oposicao se aplica a tudo o que existe (70¢). © filésofo analisa 0 argumento citando exemplos que comprovem sua tese: J quando um objeto se torna maior, nao serd lorgosamente a partir de um estado anterior de pequenez que depois passa Sim. ‘Admilamos que se torna menor: no seré ainda a partir de um anterior estado de grandeza que se torna menor? Exacto ~ respondeu. philosd ‘no 36-2011 1a E nao é também do mais forte que se origina © mais fraco, tal como © mais répido, do mais lento? Decerto Que tal? Quando uma coisa se torna pior, no é porque antes era melhor, 0 quando se tora mais justa, porque antes, era mais injusta? Que diividal Bastam, portanto, estes exemplos para cconcluizmos que todo e qualquer acto de {geragdo se procesta dos contrarios para (8 contrarios [.] (Fédon 71a). Maior/menor, grandeza / pequenez, forte / fraco, répido/lento, mais justa/mais injusta etc. Apés a explicitacdo desses ca- sos, conclui que a geracéo se enquadra como um processo. Ao aplicé-lo & geracao/ oposigao vida e morte, Sécrates resolve al- gumas dificuldades que 0 argumento com- porta, © processo de geragao deve ser ci- clico, ndo de um sé dos contrérios ao outro, mas também desse outro ao seu contrério: menor/maior, pequeno/grande, fraco/forte etc. Se a geracao se processasse em um 56 sentido, um dos opostos se anularia. Logo, se viver e morrer nao estivessem nesse pro- cesso ciclico, nada mais viveria, pois as coi- sas mortas se fixariam nesse estado “morte”, ou seja, a vida se anularia ao morrer. E por isso que a morte também deve ser geradora da vida, constituindo um dado pontual, den- tro de um processo de geragao (72 cd). Do estar vivo se gera 0 estar morto, ¢ do estar morto se gera o estar vivo: que ou- tra origem haveré para a vida? O proceso por que passam as almas tanto compreende © que chamamos “morrer”, como também 0 “reviver”, sendo esse uiltimo 0 seu anteposto (72a). Sendo assim, por este argumento se Prova que a geracao é um processo, dentro de um ciclo de geracées e corrupgdes que perpassam a vida em seu duplo sentido: quando a alma est unida ao corpo e quan- do dele esta separada. Cebes corrobora a concluséo de Sé- crates, que diz ser a mais pura verdade, le- vantando uma outra questao que desenca- dearé longas refutacdes ~ sobretudo feitas por Simias: a Reminiscéncia, Mas, antes de entrarmos na anélise dessa questao, quere- 122 ie mos comentar alguns pontos relevantes do argumento dos contrarios. Comentando o argumento dos contrarios © argumento dos “opostos sensiveis’, como também é conhecido, no Fédon, en- contra-se sem uma solugdo clara, ou até mesmo sem solugao no diélogo. Contudo, trata-se de um argumento transitério, que demarca o término, por assim dizer, de um complexo discurso moralista sobre a defici- éncia do corpo, para 0 inicio de um racioci- nio complexo sobre a alma. E nele que & questionado 0 processo ciclico de geracéo na totalidade dos seres vivos. Podemos destacar dois pontos de rele- vancia para anélise desse argumento: 1) A alma persiste apés a morte: 2) O questionamento da possibilidade de apés a morte nela permanecer 0 uso das faculdades e do entendimento. Essas duas questées sio permeadas pelos dois senti- dos de vida, conotados por Platéo no Fédon: uma em que corpo e alma estao unidos e ‘outra em que alma se vé sozinha, dele sepa- rada. O argumento dos contrarios demarca a fronteira que separa esses dois momentos da alma. Mas é aqui que se percebe que a alma é considerada imortal. Sabe-se que essa discusséo é susci- tada pela dualidade vida/morte. Nela fica claro que ¢ a vida que se identifica com a alma, sendo a morte apenas um dos varios episédios sofrides pelo corpo (SANTOS, 1998, p. 58). Para se entender tal afirmacéo pode-se considerar que a priori, no argu- mento, Sécrates havia sustentado que a ge- racao de um determinado oposto se proces- sa a partir do outro, com ele relacionado, ou seja, do crescer se origina o decrescer, como também do mais justo/o menos justo, do arrefecer/ 0 aquecer etc; entretanto tam- bém aplica essa relaco a estados contré- ios, os quais considera se tratarem de au- ténticos opostos: estar vivolestar morto, vi- gilia/sono. Com esse argumento Sécrates quer provar que esse processo morrer/viver nao se aplica apenas ao corpo, pois, se so- mente ele é passivel de corrupcéo, nele a ance Ano 3, W.6- 2011 alma sobrevive e persiste, enquanto 0 corpo se corrompe e se esvai. A crenca na persisténcia da alma j& era bem comum entre os gregos, tanto na narrativa mitolégica"’ como nas religides mistéricas, Porém, mesmo nesse argumento Sécrates, tendo feito mengéo a tradicéo, dela ndo se serve para comprovar sua tese, mas da nocéo que ele mesmo inaugura em sua filosofia, ao propor uma visdo epistemo- légica da alma sendo assim, a sua persis- téncia apés a morte deve ser provada. Para tal, entao focada como forma de garantir a possibilidade de conhecer, no desenvolvi- mento da concepcao da filosofia socrético- platénica de como se pode adquirir o conhe- cimento - Anamnese - e de qual é a natu- reza do saber, enquanto Bem. A anamnese no Fédon: “Aprender nao sendo recordar [...]" Nos argumentos relacionados & pers- pectiva ético-antropolégica da dualidade corpo/alma, percebemos que Platéo opée essas duas entidades ao considerar que a sensacéo ¢ um entrave na aquisicao do sa- ber. Passado o argumento dos contrarios, essa consideracao ¢ mitigada na perspect va onto-epistemolégica, pelo argumento da anamnese. No passo que se seguiu apés 0 fecha- mento do argumento dos contrarios, vemos Cebes relembrar a Sécrates a doutrina da Reminiscéncia. E também quanto a mim, Cebes - repli cou -, 0 que podemos ter de mais certol Nac estamos, ef de erro a0 concordar neste ponto; pelo contrério, tudo isso 80 realidades mais clivamente, a ser vilimas que evidentes: orenascer, a geragio dos vivos a partir dos mortos, a sobrevivéncia das almas dos que morreram [- e, sem diivida, um destino melhor para as almas dos bons e pior para as dos maus! - O que alids, Sécrates ~ atalhou Cebes-. cesté bem de acordo com essa conhecida teoria ~ se 6 de facto verdadeira ~ que trazes constantemente a baila, ou seja. gue o aprender no ¢ sendo um recor dar; segundo ela, ¢ indispensdvel que tenhamos adquirido, em tempo anterior ‘20 nosso nascimento, os conhecimentos que actualmente recordamos. Ora tal no seria possivel se a nossa alma no existisse jé algures, antes de incamar nesta forma humana. De modo que, até sob este prisma, dé idéla que a alma é algo de imortal. (Fécion 72d-73e). Ele o cita porque a “recordacao”, cons- tituida como aprendizado, pressupde que, para haver rememoragao de algo, é neces- sario que 0 conhecimento desse algo tenha sido adquirido em um momento anterior a essa mesma recordacao. Nesse passo, Ce- bes ja traz como ocorrendo esse momento um tempo anterior ao nascimento. O disci- pulo ainda atenta para o fato de que isto nao seria possivel se a nossa alma nao tivesse existido antes de encarnar. Logo em segui- da, apés tais afirmacées de Cebes, Simias 0 interpela, querendo que lhe recorde as pro- vas do que apresentou. No passo que se segue a interpela- go de Simias, vé-se Cebes apontando uma prova considerada bem elucidativa: 0 fato de uma pessoa interrogada ser capaz de ex- plicar corretamente tudo o que se Ihe peca, se Ihe configura como uma prova de que, se nela nao houvesse um conhecimento ante- ior e uma visao correta das coisas sobre as Dentro da argumentacéo dos contrérios, no passo 70c, Platéo faz mengio & permanéncia da alma no Hades antes de renascer doa mortos, conlorme uma velha doutrina, que segundo ele, no dilogo j fora lembrado. No dicionaio de Ferrater Mora (1994, p. 110-112), a0 trata sobre a concepgio de alma no orfismo e pitagorismo, nsta que a alma para essas doutrinas, era uma entidade que podia entrar e sair do corpo sem nunca se identiicar completamente com ele, esse corpo podia ser concebido como uma espécie de c&rcere e sepulcro da alma, cabendo ao homem liberté-la, do corpo, purilicando-a por melo da contemplagao. Contudo Mora apresenta que, mesmo tendo Plato se congratulado com essa concepgao, ele a tefinou consideravelmente, na verdade o filéeofo em ua ilesoia viveu um grande exforgo para resolver as dificuldades existentes na dualidade corpo/alma, que no s8o pouces. seja no &mbito epistemolégico ou moral, Recnaaies, Ano 3,°.6- DIT 123 quais responde/recorda, de modo algum te- ria condicao de fazé-lo.!? Apés a explicacdo dada por Cebes, Sécrates toma a conducao da discussao, ¢ debatendo com Simias busca reforgar e ex- plicar as consequéncias da tese de que o aprender é reminiscéncia (73b) e que para havé-la é preciso ter tido contato com 0 ob- jeto que se recorda (73c). A Teoria da Reminiscéncia Ateoria da anamnese no Fédon é apre- sentada de forma minuciosa. E necessario se ater aos seus pequenos detalhes ¢ a for- ma como Platdo vai desenvolvendo no dia- logo entre Sécrates, Simias e Cebes,'? os pontos que vao construindo a tese. Como vimos, o pressuposto do argu- mento é que para haver recordagao é neces- sério um contato anterior com 0 algo recor- dado. Adiante se veré que é necessério mais do que contato, que se tenha o conhecimento prévio do mesmo (73c). © argumento, em um primeiro mo- mento, se apresenta perante duas exigé cias essenciais: 1) que haja uma experiéncia cognitiva ante- rior & experiéncia cognitiva atual; 2) que a experiéncia cognitiva anterior se telacione com a experiéncia cognitiva atual. Para corroborar sua afirmacéo, Sécra- tes apresenta algumas analogias para exem- Plificar o que dissera: Ora sabes qual a reagdo que experi- menta um amante quando avista uma lira, um manto ou qualquer objeto com que 0 seu amado habitualmente anda: ‘a0 mesmo tempo que apreende a lira, © seu espitito capta por igual a imagem do amado a quem a lita pertence; e ai temos, pois, uma reminiseéncia. O mes mo dirlamoe de alguém que, ao avistar Simias, se lembrasse de Cebes e, como este, milhares de exemplos poderiam apontar-se. (Fédon 73d). Perante tais exemplos, hé a concluséo que todos esses casos tratam de reminis- céncias, ¢ eles acontecem devido a uma ex- periéncia de associacéo. O amante sé se tecorda do amado ao ver a lira, porque em um outro momento o havia visto com a mes- ma. S6 ha reminiscéncia perante essa con- digéo. E assim acontece com os “outros mi- Ihares de exemplos que se poderiam apon- tar". Contudo, 0 argumento que partira de casos de reminiscéncias entre desseme- Ihantes, parte depois para casos entre coi- sas semelhantes, sendo o primeiro um pres- suposto para o segundo: assim como acon- tece com os dessemelhantes, acontece com ‘0s semelhantes.'* O tinico caso de reminis- céncia entre semelhantes apresentado nesse primeiro momento ¢ o da retrato de Simias que faz recordar a sua pessoa. Percebe-se ‘entao que so apenas os semelhantes que interessam para o desenrolar da tese. Esse primeiro momento do argumento apenas constata que todos esse casos, de dessemelhantes e de semelhantes, podem ser considerados reminiscéncias, pois cor- respondem as duas exigéncias apresenta- das no inicio do argumento: a existéncia de "2 Ease passo remete-se & explicagdo da doutrina da reminiscéncia abordada no Ménan (82-85) em que Sécrates Interroga 0 escravo, mostrando que ele & capaz de responder & pergunta que lhe fol feltatirando-a de dentro de st femitindo opiniées que recorda, Porém, a corespondéncia da reminiscéncia do Ménon com a do Fédon se encontra, somente nesse momento, pois nesse timo nao hé uma preccupago com a emisséo de opinides como hé no primelro. ‘as sim a centralidade na questao do saber. '3£ importante atentar para o fato de que tanto Simiaa como Cebes eram tebanos (BURNET, 2008, p. 2936s), e por isso ccomungavam da dowirina pitagérica que em Tebas era forte. Podemos assim pensar que nao foi por acaso que no Fécdan Platio pés exset dot discipulcs frente a toda discussdo com Sécrates, vielo que, como alizma Robinson, a concepgéo Gtica da Hosaka socrético-platénica auperaa ética érico-pitagérica, eno didlogo oSlésolo através dos seus argumenios vence e supera .alguns tracos dessas religibes mistéricas, como o foi com a tese da alma harmonia, que mais & frente cculdaremos em analisat Ora, de todos esses casos no decorre justamente que, nuns casos, a reminiscéncia se produz a partir de objectos semelhantes, e noutros, a partir de objecios dissemelhantes?” (Fédon, 74a 124 Feamanes Bro 36-2077 uma experiéncia cognitiva anterior 4 per- cepcdo e 0 condicionamento de um ao ou- tro. Tal constatacéo introduz o segundo mo- mento do argumento que trata de comparar 0 objeto percepcionado ao objeto recordado, fazendo perceber a “diferenca” que ha na semelhanca entre eles. Ve 1a entdo se esté certo ~ prosseguiu. Alirmames, creio, a existéncia de algo <> [...] ndo quero dizer um tronco de madeira igual a outro tronco ou uma pedra iguala outra pedra nem nada desse género, mas uma realidade distinta, de todas estas e que esié para além delas, co Igual em si mesmo. Alirmaremos que existe ou nao? (Fécion 74a) Socrates comeca por apresentar a idéia de um Igual, que segundo ele nao é a mesma igualdade que ha entre dois troncos ou duas pedras iguais, mas um Igual em si mesmo (74b). Ele conclui que 0 Igual em si mesmo é uma realidade distinta do iguais referidos nos outros casos (dos troncos e pe- dras). Partindo desse ponto surge o seguinte problema, que desencadeia outras pergun- tas: se se tem o conhecimento desse Igual em si mesmo, onde ele é adquirido? Terd sido da visdo dos iguais? O Igual nao é dif rente dos iguais? Sem deixar Simias responder as per- guntas, Sécrates, comparando os dois tipos de iguais, constata que ha uma superio: dade do Igual aos iguais. Isso ele justifica por haver uma diferenca entre a igualdade dos iguais, que por vezes para uns parece e para outros nao, e a igualdade do Igual, so- bre o qual a discordancia 6 impossivel (74b-e). Sendo assim, o mestre constata que ha uma caréncia dos iguais em relaco ao Igual, o que prova terminantemente que se trata de realidades de planos diferentes. (Ora bem, estamos de acordo: quando uma pessoa olha para um dado objecto e reflete de si para si: <. Acesso em: 30 nov. 2007. Timeu. Tradugéo de Maria José Figueiredo. Lisboa: Insituto Piaget, 2004. RYLE, G. Plato's Theaetetus Logical Atomism In: Plato's Thaetetus. Phronesis 35, London/New York, 1990. SANTOS, José Trindade. Fédon de Plato. Queluz: Alda, 1998. A fungdo da alma na percep¢do, nos didlogos platénicos. Hypnos 13, Séo Paulo 2004. p. 27-38, . Para ler Platéo: 0 problema do saber nos didlogos sobre a teoria das Formas. ‘Tomo II. Sao Paulo: Loyola, 2008. SAYRE. Why Platé never had a theory of Forms. In: . 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