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7 Trazendo 0 conceito de cidadania de volta: a propésito das desigualdades territoriais' Marta Arretche A renda ocupa espaco privilegiado nas analises sobre a desigualdade [A literatura comparada tende a se concentrar nos efeitos das politicas sociais sobre a desigualdade de rendimentos entre os individuos ¢, por consequéncia, 05 trabalhos que analisam politicas de transferéncia de renda (previdenciarias e assistenciais) tem grande centralidade nessa agenda de estudos. Esta ndo era, contudo, a nogao de reducao das desi gualdades sociais associada ao conceito de cidadania que se consolidow no século XX. Diferentemente, a cidadania havia sido concebida como 0 direito dos cidaddos a um minimo de bem-estar econdmico e seguran¢a, que Ihes permitisse viver como serescivilizados conforme os padroes Cor rentes na sociedade, de modo a ex mn suas liberdades reais. Além de estabelecer que 0 bem-estar deveria incluir 0 acesso a bens essencials oracle doe dados estatisticos, bem como a de Jost Donizete C na confecto dos tapas, Estaversio inal beneficiou-se dos coment Marques, dgard Fas Patrick Silva, bem coma dos participantes do tt Wor Cente de Estudos da Metrdpole, em marco de 2013 2 Professora do Departamento de Cien ia da essa concepgao de cidadania definiy também que o direito a tais serv cos deveria estar dissociado da renda dos individuos (Esping-Andersen, 1985b, 1990; Marshall, 1967; Sen, 1999) Desse modo, oacessoa servicos sociais é uma dimensio do bem-estar stinta e nao redutivel aos rendimentos. Assim, pessoas com mesmos ganhos podem ter padrées de vida muito diferentes cast am distintd SEGSOISEEVIEDS Alem disso, a renda real ¢ atetada pela desigualdad: poderdo ter padres de consumo diferentes depend: Jo gast com bens essenciais em s prgamentos parte da premissa de que essa associagao, ainda qui stficiente para explicar os fatores que afetam desigualda servicos. Diferentemente dos bens privados, 0 consumo ds os no depende apenas da «ecisdo de compra por parte dos ir Exemplificando, o consumo de energia elétrica, agua e esgoto, coleta de xo, atendimento em satide e educagao requer sua oferta a. uma distin acessivel a residéncia dos individuos, Assim, olugar onde moram importa para o acesso a esses servigos, ou seja, a distribuicdo espacial da ofe tem um efeito independente sobre as condigdes de acesso dos individuos. A distribuigdo territorial da provisao de sequéncias, m: (os prestadores tomam suas decis6es de oferta com base nas caracte que essa decisio de oferta pode set afetada pela riqueza das jurisdic Os dados aqui apresentados revelam que o Brasil mudou Liltimos quarenta anos no que diz respeito a oferta estatal ssenciais. Nos anos 1970, a auséncia de servicos bisico: energia elétrica ~ assim como baixos niveis de escolarid ralizados em quase todo 0 territorio nacional. Nenhum municipi leiro tinha pelo meno’ de sua populagio com mais de 15 anos ensino fundamental completo. Dos 3.952 municipios existentes 3 ép s6 um tinha pelo menos 80% de sua populagac cesso a rede dk Trazendo 0 conceito de cidedania de volta abastecimento de agua e somente 73 tinham essa cobertura para energia elétrica. Em 2010, em 91% dos municipios brasileiros, pelo menos 90% da populacdo tinham acesso a energia elétrica.’ Em 1.868 municipios - em um universo de 5.564 -, pelo menos 80% dos cidadaos dispunham de rede geral de agua. Em 2.190 municipios ~ 40% do total -, pelo menos 80% da populacdo contavam com servigos de coleta de lixo, Entre 1980 ¢ 2010, a taxa de mortalidade infantil no Brasil caiu de 69 \ca de vida passou de 62 para para 16 por mil nascidos vivos, e a esp 3 anos.‘ A populacao de mais de 18 anos que chegou ao ensino médio pulou de 6,2 milhdes para 39,7 milhdes; a que atingiu o ensino superior passou de 3,4 milhées para 21,5 milhées, Ambas aumentaram em mais de seis vezes no periodo. Embora tivesse havido expressiva expansiio das coberturas em diver: sas politicas essenciais, isso no implicou universalizagio do acesso a ser vigos (8 excegio do setor de energia elétrica, nica politica que eliminow as desigualdades de so). Expansao das coberturas e sobrevivéncia de desigualdades caracterizam a trajetoria do acesso a servigos essenciais no Brasil nos iltimos quarenta anos. A expansio das coberturas foi acompanhada de redugio global das desigualdades territoriais. Contudo, q) ando o ponto de partida sao taxas muito baixas ¢ inicia-se um processo de expansio das coberturas, pode mesmo ocorrer aumento das desigualdades se essa expansio for concen- tras forem deixadas para tras. Assim, trada em algumas jurisdi¢des ¢ altas taxas globais de cobertura podem a permanéncia de espacos territoriais com prestacdo muito baixa ou mesmos grupos de jutisdigoes com prestacio média. Logo, o problema a ser respondido nao € apenas se ocorreu redugo das desigualdades territoriais, mas qual a sua direcio, isto é, qual a associacdo entre essa expansao das coberturas ea riqueza das jurisdicdes ou das populagdes por ela beneficiadas gatas se, pois, de saber se as jurisdigbes favorecidas sio aquelas que tém mais 9 As diferencas em relagio as taxas de cobertura relatadas no capitulo de Eduar (022, neste volume) dizem respeito inclusio da populagio rural em minha $ Consular, neste volume, o capitulo "Suide e desigualdade no Brasil” (p.249), de Vera Schattan P Coetho ¢ Marcelo F Dias. Meta Arretche riqueza ~e, portanto, maior capacidade de implantacio dos servi aquelas que possuem uma poptilagio mais rica ~ e, consequentemente, maior capacidade de pagamento pelos servicos. Este capitulo examina atrajetériada desigualdade de acesso aservicos ‘essenciais no Brasil de 1970 a 2010, com base nos dados censitarios. O periodo analisado permite explorar a contribuigio de distintos periodos da historia brasileira para 0 i 0 dos cidadaos a servigos essenci: regime militar (cujo legado pode ser observado em 1980), a redemoera- ago ¢ o primeiro governo ciyit escottiido ainda sob as regras da tran sigio, 0 do presidente José Sartey (em 1991), ¢ 0 periodo democritico recente. Para este tiltimo, é possivel examinar a contribuigao dos gover nos Fernando Henrique Cardoso (1995-2002) ¢ Luiz Inicio Laila da Silva (2003-2012). Osanos 2000 ¢ 20}0, respectivamente, serio tomados como legados de cada um destes goyernos. Para essa finalidade, o presente estudo tomar os municipios brasileiros como unidade de anilise, por se cratar da unidade de observacig mais plausivel de tratamento estatistico desagregado nos dados censititios. O capitulo mostra que os quarenta anos compreendidos entre 1970€ 2010 apresentaram melhora generalizada em todasas cimens6es classicas de bem-estar nos municfpios sie renda, capital humano ¢ capital fisico, Entretanto (@GeguaaaeeUegaczAM edida pelo PIB per capita, @rimafieceutrigorosacescandalosamenteestivelsay passo que aumento a desigualdade territorial da cgncentracao de pobres. Por outro lado, as desigualdades em formagio educacional e infraestrutura fisica (crergia elétrica, dgua e esgoto e coleta/de lixo} dgctinaramysistematicamence. A excegio a essa trajetéria é a dajoferta de m édicos, cujos padroes de desi- gualdade permaneceram pratigamente estaveis FA menor unidade de anise dispopivel nos Censos de 2000 € 2O1D 6a area de p Gao as cla ako esd dsponivel of demuis Cenvos. Para agregar as iafornaséiesdoscinco finunes Censos Demogeiticos, dik procestimentes foram aotados, Fim primeiro nat © inamezo de municipios aumentoo {istematicamence ao longo do period Cram 3.991 em 1970, chegurso a 5.564 em 2010 Converter 9 universe de monicipios de cada Censo runtendovo miner de 1970 eu lrdcionandoa popula cos municipios derivatos de des trertramento aeada Censo ~implfaria diculdes metesloyicasiacontornavels, Assit crenmerso de cata Censo foi mangida, 0 que pressupse que resultados cbrisos para cada period nio sto ciscom 0% demas, Nio fo inclvido @ ano de 1960 rerailice porn a dadonsisponifeis re peenitm sta esagregags0 para OS MUNK 196 ndo 0 conceite de cidadanie de volte A despeito da trajetoria similar de expansio territorial, ain't © 2010 as taxas de a variavam bastante entre as politicas, e aquelas politicas que apresentam mais baixas taxas de coberturt também apre pemtam maior desigualdade territorial. Assim, a desigualdade territorial de acesso a servigas essenciais 66 & baixa quando este se torna unt ersal no territ6rio nacional, A trajetoria de expansto das coberturas & marcada por alta ass00 ao entre riqueza das jurisdigbes, renda da popula¢ io ¢ oferta de servigos sreenciais, Mesmo nio sendo possivel determinar a direcio da causal sede o aro & que a melhora dessas diferentes dimensdes do benvestt tendeu a ocorrer conjuntamente. © progresso na produgao Je riquez rende a ser acompanhado da redugdo no percentual de pobres ca cxPan sao na oferta de servicos essenciais. ssa trajetoria de melhora das condicdes do bem-estar segull 1D percurso espacial bastante claro: a regido Sudeste, em particular 0 estado vr Sao Paulo, era mais bem servida nos anos 1970 e caminhava Daft cuniversalizacao jé nos anos 1980; a expansio da cobertura ¢m diregdo + universalizacao ocorreu, em segundo ugar, nas regio“s Sul ¢ Centro Ceste; as regides Norte ¢ Nordeste s6 obtiverar patamares elevados de cabertura quando o servigo em questo ja estava praticamente Un versa Jo em todo o territério nacional A trajetoria das desigualdades territoriais Na década de 1970, 0 acesso a servigos essenciais nao era apenas muito baixo. As coberturas existentes estavam concentradas DO sul e Sadeste, como se veré mais adiante. Grande parte dapopulagio dev acima do paralelo 20° simplesmente nao contava com acesso a redes de Agua, esgoto e energia clétrica. Mesmo individuos de renda média (até) alta nfo contavam com a oferta piblica desses servico® Altas taxas avam o territério nacional. No que diz respeito & voncentragdo de pobres, tambem navia uma relativa igualdade ertiio% Contudo, tratava-se de uma igualdade na pobreza, j& que? esmagadora raaioria dos municipios era habitada por vasta camada de populass de riqueza, por s municipios localizad 1970 ¢ 201 1 concentragao d sturas nas politicas essenciais “com Je queda na desigualda 1 no Grafic coef Gini para as as selecionadas bertura da populagai Je PIB pe desigualdad 4 para 0.4 970, alguns F Nordeste ue nas regides Sul e Sudes' la altos valores de PI andiu-se o nume spacial de PIB px Centro-Oeste ¢ Norte tém ilhas de rig Tiozendo o conceito de cidadonio de quando comparados aos demais. Assim, ainda que os valores no PIB per capita tenham aumentado devido ao crescimento econdmico, a desigual dade permanece praticamente inalterada Grifico 1 ~ Coeficientes de Gini, PIB per capita c acesso a servigos essenciais ~ Municipios brasileiros, 1970-2010 0,800 0,600 0,400 0,200 0,000 1970 He Coleta de lixo “Rede de esgoto —#— Agua encanada ~-¥> PIB per capita a Médicos por mil habitantes. + Percentual de pobres, ==: Percentual de maiores de 15 anos com fund. completo. —#— Energia elétrica Tabulacbes espeials do Centro de Estudos da Metropole (CEM) Esses dados confirmam os achados dos estudos de economia regional, que afirmam que as regides brasileiras tornaram-se proporcionalmente ais desiguais entre si e mais homogéneas internamente. Em petiodos de rapido crescimento econdmico, a desigualdade de renda per capita entre as regides tende a se acentuar, em favor do Sudeste (Azoni, 1997) Ha “‘clubes de convergéncia”: 0 Distrito Federal ¢ 0 estado de So Paulo lideram o grupo de renda mais alta (concentrado no Sudeste), a0 passo que os estados do Nordeste formam o clube de renda baixa (Magalhaes Hewing; Azzoni, 2005). Entre os municipios também ha “clubes de con vergencia” que tém carater regional, isto é, aqueles de baixa renda estdo g a 8 localizados nas regides Norte e Nordeste, enquanto os de renda mais elevada concentram-se nas regides Sudeste, Sul e Centro-Oeste (Araujo et al,, 2010; Chein; Lemos; Assuncdo, 2007; Coelho; Figueiredo, 2007; Laurini; Andrade; Pereira, 2003; Ribeiro; Almeida, 201 Mora Arretche sil, 1970-2010 Mapa 1 ~ PIB per capita (padronizado) ~ Brast w 1980 PIB per capita municipal (padronizado - 0a 100) _ oO 25 50 75 100 Fonte: IBGE, Censos Demogrificos 1970-2010, PNADs, Tabulagdes especiais do CEM. Trazendo 0 conceite de cidadania de vol Contudo, entre 1970 ¢ 201 0@GRRTERIRGaRaTaesigualdactes municipios brasileiros no que diz respeito & concentracdo da pobreza medida pelo percentual de individuos vivendo com renda inferior a meto salério minimo, em valores de 2010 (ver nota 6). 0 resultado parece paradoxal se se considerara queda consistente da desigualdade de renda centres individuos nas Ultimas décadas (Neri; Souza, 2012; Soares, 2010). 0 dado indica, porém, que a redugao da pobreza ¢ da desigualdade de renda teve desigual distribuigdo territorial, aumentando a distdncia entre reas com menor e maior concentracao de pobres. Os patamares médios de pobreza se reduziram muito, o que quer dizer que a grande maioria dos municipios brasileiros tem muito menores contingentes de popula cdo pobre. A desigualdade nesse indicador aumentou porque continuam existindo municipios com muita pobreza, cuja distribui¢ao territorial é concentrada. Essa trajetéria po wualizada no Mapa 2. Observe-se que a menor desigualdade na concentragao de pobres de 1970 ¢ expressao da sua massiva presenga em todo 0 territ6rio. A mais baixa taxa de desigual dade revela que a esmagadora maioria cos municipios hospedava amplas camadas de populagio pobre. J nosanos 1980, oaumentoda desigualdade territorial da concentracdo de pobres distingue as regides Sul, Sudeste e Centro-Oeste, de um lado, com menor concentragao de pobres, das regides Norte ¢ Nordeste, de outro, com maior concentragao. Em 1991 as taxas de pobreza eram mais elevadas em todas as regides ~ inclusive em reas das regides Sul e Sudeste -, como resultado dos baixos indices de crescimento econdmico da década de 1980. Mas a desigualdade terri torial permanecia, dado que as regides Norte ¢ Nordeste (¢ a parte norte da regido Sudeste) apresentavam as maiores taxas de concentracao de (Ipea e IBGE), com base no deflator implicito do PIB. ssa medida fot deixada em precos finos de 2000. Os dados da populacio utilizados foram os dos Censos Demografics. APSS 1 ciewlo do PIB per da a padronizacio dos valoes para uma escala de 0a 100, uilzando a fru IB per capt, IB per capita padronizado = a PB per cap ‘Objetivando controlar a variagio na padronizac Merto Avretche Pobres. Ainda que as taxas de pobreza tenham caido na regiéo Notte en 2000, a divisdo territorial entre parte da regigo Norte, a regio No! © 0 norte da regido Sudeste, de um lado, ¢ 0 Sul e Sudeste, de outro, manece uma constant. @Q3Riiiilen BSR aRaalee PODPena en Raine? atenuado nas regides Norte ¢ Nordeste em 2010, elas cafram ainda mais nas regides Sul e Sudeste Dado o conceito de concentracao de pobreza adotado neste trabalho (individuos vivendo com meio salario minimo),* o comportamento do indicador nao é afetado pela cobertura do Programa Bolsa Familia, cuja Populaco-alvo sao familias em condigao de indigéncia. Por outro lado © indicador capta o impacto dos dois outros fatores apontados pela lite ratura como principais responsaveis pela reducao da desigualdade entre individuos, quais sejam, o valor do salario minimo e dos rendimentos no mercado de trabalho (Soares, 2010) Oindicador “concentragao de pobres” capta a distribuigdo da rendano interior de cada municipio, Mantida constante a renda per capita, as taxas de pobreza podem variar bastante a depender da desigualdade na dist buigao da renda (Barros; Henriques; Mendonga, 2000). Nessa dimensi a trajetéria das regides também nao foi homogénea. A queda da desigua dade foi mais intensa na regido Sudeste, possivelmente devido ao fato de que 0s ganhos de produtividade dos pobres da regio Sudeste foram mais intensos do que os das regides Norte e Nordeste (Manso; Barreto; Franca, 2010a, 2010b; Pinto; Oliveira, 2010). Como resultado, a desigualdade de renda varia entre os estados e regides, sendo mais elevada na reg deste e nos estados de Rio de Janeiro, Espirito Santo e Minas Gerais e mais baixa em Sao Paulo e na regio Sul (Hoffmann, 2010). f pos devido a esse fato que a elevacio do coeficiente de Gini da concentragic de pobres é mais acentuada nas décadas de 1970 a 2000, nas quais ocorreu crescimento econémico. Portanto, dois fenémenos coexistem na trajetéria da distribuicio espacial dos pobres no Brasil de 1970 a 2010. A pobreza foi expressiva mente reduzida, porque caiu sistematicamente o percentual de pobres em todas as regides. Entretanto, de um ponto de partida caracterizado Trazer zendo 0 conceito de cidadania de volta Mapa 2 ~ Percentual de pobres ~ Brasil, 1970-2010 1970 3 “ 1980 2000 Individuos em situagao de pobreza 2010 e Fonte: IBGE, Censos Demogriticos 1970-2010. Tabulagdes especiais do CEM. 18 pela baixa desigualdade territorial na pobreza em 1970, chega-se em 2OIO alumna situacao de Alta MeSIUAIGAMOTEHAROHADD2s mais altas taxis de pobreza esto concentradas na regio Nordeste e em parte das re jorte ¢ Sudeste. Por fim, 0 Grafico 1 mostra que a desigualdade territorial de coberturad servigos essenciais apresenitou trajet6ria bastante distinta daquela observada na produgdo de riqueza entre os municipios e suas respectivas taxas de concentracao de pobreza. Em primeiro lugar, a desigualdade de coberturas ai sistematicamente a partir de 1970 para a energia elétrica, agua nada, populagao com mais de 15 anos com ensino fundamental comple coleta de lixo (observada pelo Censo a partir de 1991) ¢ acesso a rede de esgoto. Em 2010, os coeficientes de Gini para essas politicas (excetc esgotamento sanitério) cram os mais baixos da historia brasileira: inf riores a 0,200. Por outro lado, a desigualdade territorial da oferta de médicos (cujs dados no DataSUS estio disponiveis apenas a partir de 1991) é razoavel mente estavel: passa de 0,446 em 1991 para 0,390 em 2010. Ademais, a trajet6ria da desigualdade territorial nao é a mesma en «ty politicas. Cai mais fortemente para alguns tipos de servigos essenciais tais como energia elétrica, escolaridade no nivel fundamental de ensino, GIERAMENIROITSRURERERMy. Por sua vez, a desigualdade territorial n oferta de médicos e de ligacio a rede de esgotos ¢ comparativamente bes tante elevada em 2010, pois seus respectivos coeficientes de Gini esti bastante préximos ao do PIB per capita: 0,390 e 0,427, respectivamente. Aassociagéo entre riqueza e acesso a servicos essenciais As evidéncias apresentadas até aqui sugerem que a trajetéria das politicas dissociou-se da trajetoria da renda das jurisdigdes nos tiltimos quarenta anos, posto que o coeficiente de Gini do PIB per capita perman ceu bastante estavel, o coeficiente de Gini para a concentragdo de pobres aumentou, ao passo que os coeficientes para as diferentes politicas cairan Ainda que a oferta de médicos seja uma exce¢do e a trajetdria de queda Trazendo o conceito de cidadania de volt seja bastante variavel entre as politicas, a trajetéria global é de reduga0 das desigualdades territoriais de acesso a servigos essenciais. Essa con. clusdo é, contudo, falsa, Nao decorre das evidéncias apresentadas. A razio € simples: 05 dados apresentados referem-se a desigualdade nas taxas de cobertura em cada uma das dimensdes observadas e em cada um dos anos censitérios. Nunca se referem a possivel associagdo entre clas. Para medir a existéncia (ou nao) de relacao entre todos os indica dores analisados simultaneamente, foi empregada uma anilise fatorial Para todas as variaveis cujos dados estio disponiveis para o periodo 1970-2010. As variaveis “coleta de lixo” e “médicos por mil habitantes” foram, portanto, excluidas. Além disso, para fins de interpretacio, todas as variaveis foram opcracionalizadas de forma a expressar a melhor si © de cada uma, fazendo que no indicador sintético os maiores valores correspondam as posicdes mais privilegiadas.* Assim, na dimensio rel de pobreza, a varidvel utilizada foi o “percentual de individuos vivendo com mais de meio salirio minimo’ Os procedimentos metodoligicos foram os seguintes. Foi uma andlise fatorial para os dados de 1970. A seguir, replicou-se a estru tura de pesos obtida a partir dessa modelagem para os dados dos demais censos demograficos do estudo, de forma a observar como o indicador sintético se comportou em cada ano censitdrio. Na modelagem foi extraido um tinico fator, cuja explicagdo da variabilidade total foi de 80,4%."' Esse resultado indica, portanto, que hé uma associago entre expansao da cobertura 9 Agradeco a Edgard Fusaro esta solucio metodoldgica, em particular por suas implicagdes paraa anilise que segue 10 Na dimensio de riqueza econdmics, eetuow-se uma transformasio matemitica, deforma que a varidvel que fez parte da modelagem foo “logaritmo neperiano do PIB per capita do municipio 1 Os coefcientes dos scores fatoriis, na sua forma original, si0085¢ percentual de individuos vivendo em domicilos com esgotamento sanitirio: 0,193; (i) pereentual individuos vivendo em domicilios com abastecimento de Sgua (rede geral) 0.188, (i percentual de individuos vivendo em domicios com energaeltrica-0, 194; (i) peree de individuos com 15 anos de idade ou mais, ue possuem ensino fundamental (0.187; (») percentual de individuos vivendo com mais de meio sari min de 2010: 0,190; (vi) logaritmo neperiano do PID per capita do municipio (en ano de 2000): 0,165 nos servigos essenciais, PIB per capitae desigualdade de renda nos municipios bra “Associagio, contudo, nao quer dizer causalidade. Nao é possivel afi mar se 6 a melhora na renda que explica a expansio do acesso a servigos ‘ou ocontrario, O fato é que a methora (ou sua auséncia) tendeu a ocorrer em todas as dimens6es simultaneamente. Municfpios e regides que experi mentaram melhora na riqueza gerada em suas jurisdigdes também presen: ciaram redugao nas taxas de pobreza e na cobertura de servicos essenciais Em outras palavras, riqueza, redugao da pobreza e acesso a servigos tive ram trajetoria territorial semelhante no Brasil nos iltimos quarenta anos A partir dos resultados obtidos pela anilise fatorial, foi gerado ur indicador sintético que consiste em uma reparametrizagao dos “escores fatoriais” para cada umdos anos censitérios."*O indicador resultante varia ‘em uma escala de 0 a 100, sendo que o valor O representa a pior situagio ¢ 100, a melhor.!3 O Grafico 2 mostra 0 boxplot da trajetéria do indica dor sintético obtido para os municipios brasileiros, segundo as grandes regides geograficas. Assim, os dados ai apresentados podem ser lidos com: expressando a desigualdade em todas as dimensdes tomadas de maneirs conjunta, isto é, PIB per capita, presenga de populagio no pobre e acess a servicos essenciais (energia elétrica, agua, esgoto e populagao acima de 15 anos com ensino fundamental completo) 0 Grafico 2 revela que em 1970 a desigualdade intrarregional et dominante. 0 Sul ¢ 0 Sudeste abrigavam os municipios que apresent de uma maneira geral, os melhores indicadores sintéticos, com marcadades gualdade no seu interior ~ a mediana e o tamanho do box (diferenca en 03° eo 1° quartis) do fator sintético nessas regioes eram superiores demais. Entretanto, a mediana variava pouco entre as regides, isto €, ert 2 Matematicamente y EF gat mii “onde éoindicador sintéticona exala 0 100 F cotresponde a0 “escorefatoral” rig Seid desracar que, apesar de ser possivelordenar os municipios segundo os indian aan anes omesmonio acorre coma quantiicaio desses indicadores er vermos a dc valores grandes” ou “pequengs”, somente rlativamente Trazendo 0 conceite de cidadanie de volta igualmente baixa, com valores inferiores a 30. Embora a desigualdade no ‘erior do Norte ¢ Nordeste fosse menor, esta expressava dade de privacées, posto que o valor das medianas ¢ > tamanho do box eram igualmente baixos. De fato, em 1970, a oferta de servicos essenciis no Rrasil era sim. PIESMEREEPESSIAN. Municipios em que mais da metade da populacao tinha acesso a rede elétrica eram raros e concentravam-se em Sao Paulo € nos estados do Sul. Mesmo nas regides mais ricas, mais bem dotadas de servicos, a regra era que menos da metade da populacio contasse com servicos de energia elétrica. No {HOB NORestene uelplevalcen era quase completa auséncia de acesso a rede de enersia, 3 excecdo de algu mas poucas cidades na costa litorines (\!4pa 3) A escassez de servigos era ainda mais acentuada na cobertura de agua Cesgoto. Fortemente concentrada na regido Sudeste e em algumas poucas cidades do Sul, a oferta ndo excedia mais da metade da populacéo, mesmo naquelas cidades que contavam com alguma cobertura de servicos. Nas Grifico 2 ~ Boxplot dos indicadores sintéticos Grandes regides geograficas, 1970-2010 1970 300,00 Nordeste Sudeste Sul Centro-Oeste Grande Regiio Geogritica Morte Avretche Nordeste Sudeste sul Grande Regito Geogrifica 100,00 { Norte Nordeste _Sudeste Grande Regito Geografica Trarendo © conceito de cidadania de volta Sudeste su Grande Regito Geogritfica Font: IBGE, Centos Demogrtfics 1970-2010. TabulacBes expec a 4 ju Marta Arretche Mapa 3 ~ Populagio com acesso a rede geral de energia elétrica Brasil, 1970-2010 1991 Populacdo com acesso a rede geral de energia elétrica % _ 0 25 So i75 108 Fonte: IBGE, Censos Demogrificos 1970-2010, Tabulagées especiais do CEM. © conceito de cidedania de volte tegides Norte, Nordeste ¢ Centro-Oeste, contudo, era quase absoluta a auséncia de acesso a redes domiciliares de abastecimento de agua.e coleta de esgoto (mapas 4 ¢ 5). As politicas do regime militar beneficiaram principalmente as regides Sul Sudeste, ainda que estas apresentassem razoavel desigualdade intrarregional. Observe-se no grafico 2 que o valor da mediana dessas regides se eleva, bem como aumenta a extensio de seus boxes em 1980, comparativamente a 1970. 1sso significa que alguns municipios no interior dessas regides melhoraram bastante seus indicadores sintéticos, a0 passo que os demais e aqueles das regides Norte, Nordeste ¢ Centro-Oeste nfo experimentaram taxas similares de melhora, embora tenha se elevado a desigualdade interna nessas tiltimas regides. Em 1980, foi bastante expandidoo abastecimento de agua e a ligagao rede de energia elétrica, quando comparados a 1970. Mas essa expansio foi concentrada nas dreas em que jé havia alguma cobertura de abastecimento de agua em 1970 (Mapa 4). A oferta de energia elétrica, por sua vez, se expandiu para quase todo o territério (Mapa 3). Em ambas as politicas, na década de 1980, ha marcada desigualdade territorial de cobertura As cidades do Sul e Sudeste caminham em diregao universalizaca0, a0 asso que nas regiGes Norte, Nordeste e Centro-Oeste sao muito raros (0s municipios em que essa taxa excede metade da populacio. A oferta de esgoto, por fim, apresentou ampliacao de cobertura ape: nas nas regides Sul ¢ Sudeste. De modo geral, essa expansio basicamente diz respeito ao percentual de domicilios atendidos por servigos naquel cidades que ja contavam com alguma cobertura em 1970 (Mapa 5) Portanto, as grandes realizagdes do regime militar ~o Plano Nacional de Saneamento (Planasa), para os servicos de agua ¢ esgoto, bem como a criagdo da Eletrosul (em 1968), da Eletronorte (em 1973) e da Itaipu binacional, para os servicos de energia elétrica - de fato permitiram a expansdo das coberturas. Entretanto, esta varia entre as politicas, sendo as da QUEERS MBASEEMEMOMEREDD muito mais ripidas do que a do abastecimento de esgoto. @IGHMGISSO Nessa eR paNSAOINCeREL as desigualdades regionais, jé que as regides Sul e Sudeste caminham na lurecao da universalizagao, enquanto o Norte e o Nordeste apresentam laxas de cobertura muito baixas. Marta Arretche Mapa 4 ~ Populagao com acesso rede de agua ~ Brasil, 1970-2019 Populacao com acesso a rede de agua 0 | 25 50 75 100 Fonte: IBGE, Censos Demogrificos 1970-; ‘abulacSes especiais do isos De ficos 1970-2010, Tabulacé a ci CEM indo 0 conceito de cidadonia de volte Em 1991, muitos municipios apresentaram expressiva melhora no indicador sintético. Entretanto, esse avanco apresentou marcada dis- {ingao territorial. A mediana do indicador sintético era eminentemente mais elevada nas regides Sul, Sudeste e Centro-Oeste, acompanhada de reservacio das desigualdades no interior das areas. Nas regides Norte Nordeste, por sua vez, tanto a posigdo mediana quanto a extensao do box permaneceram bastante similares as da década de 1980. Também em 1991, a divergéncia de trajetérias das politicas ficou ainda mais evidente. O acesso a energia elétrica era praticamente uni versal no Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Entretanto, restavam com menos da metade da populacdo coberta o interior da regido Nordeste e parte da regido Norte (Mapa 3). Essa expansio pode ser creditada a conclusao de obras de grande porte iniciadas sob o regime militar: Itaipu, a maior hidrelétrica do mundo a época, que abasteceu a regido Sudeste a partir de 1986, bem como a primeira parte do sistema de transmissdo do Norte. Nordeste, que permitiu que a energia gerada na Bacia Amaz6nica pudesse ser distribuida na regido Nordeste As politicas de agua e esgoto, por sua vez, seguiram trajetoria bastante diversa, ainda que implementadas e financiadas no ambito de um mesmo Sistema Nacional inaugurado pelo regime militar ~ 0 Planasa, instituido em 1969 e implementado a partir de 1971. Para o esgoto, o paralelo 20° continuou sendo uma fronteira geografica importante (Mapa 5); a oferta de égua foi praticamente universalizada na regiao Sudeste ~ pois grande parte dos municipios alcangou taxas de cobertura superiores a 75% da populagao -, assim como se expandiu bastante nas regides Norte e Nordeste, mas ali as taxas de cobertura eram de modo geral inferiores a metade da populagdo (Mapa 4). Para 1991, contamos também com dados sobre a coleta de lixo domi- ciliar e 0 numero de médicos por mil habitantes (mapas 6 e 7). Embora esses dados nao facam parte da construgao do indicador sintético, nota-se que suas distribuigdes a época (exceto no que tange aos patamares) cram muito semelhantes as da cobertura de égua e energia: concentragao nas cidades do Sul e Sudeste e taxas muito baixas nas regides Norte ¢ Nordeste. Nos anos 1980, combinou-se a transigao politica para o prim presidente civil, José Sarney, com elevada inflagao e continuada c Marta Arretche Mapa 5 ~ Populacao com acesso a rede geral de esgoto ~ Brasil, 1970-2019 Populacao com acesso a rede de esgotamento sanitario % 0-25 So 75 «(100 Fonte: IBGE, Censos Demogrificos 1970-2010. Tabulagdes especiais do CEM. econémica. Aquela foi considerada uma “década perdida décadaperdida para aofertade s scorrido expressiva expansio d ava que a retomada de eleigde que os governos ampliassem sua cobertura. Suas princ cram, contudo, aumentos nos valores percentuais da cobe os domiciliares em escala na A desagregacio espacial do a década de 1980 foi, sim, uma década perdid: Nordeste. A virtual universal revela, porém, qué populagdes das regides Norte coberturas foi um fendmeno concentradc pouco menos acentuada, na regiao Sul desiguald: municipios Nadécada de 1990, manteve-se a s Sul, Sudeste e Centro-Oeste, de ur .gides Norte ¢ Nordeste, de outro, Er le FHC ediana do indicador si as pri Uiltimas. Isso significa que durante o mandat particular os municipios da regido Centro-Oeste, ex prosperidade, em termos de riqueza, redugao ¢ aumento das taxas de cobertura dos servigos es: adas através do indicador sintétic Em 2000, o acesso a energia clétrica era praticamente universal ‘egides Sul, Sudeste € Centro-Oeste. Entretanto, em Jeste e Norte nao atingia metade da populacao, aind tenha ocorrido expansio da cobertura em relagao a 1990 (M desigualdade territorial da expansio da cobertura também occ versalizagao da cobertura é um fendmeno concent Jo Sul, Sudeste ¢ Centro-Oeste. Essa expansac coberturas das regides Nordeste ¢ Norte (Maj Na década de 1990, a expansio do abaste Nordeste pouco alteraram sua situagac ‘i > da cob nna coleta d ambém alguma expansio da cobertura na coleta de mente apenas nas regides Sul e Centro-Qeste (Mapa Marta Aivere © ano de 2000 pode ser interpretado como o legado da presidén, de Fernando Henrique Cardoso para adistribui¢ao terri rortal dos SerViggg de infraestrutura, Nao ha duvida de que ocorreu expansao do abastegj. mento de agua, dacoleta de esgotos, ira as regides Centro-Oeste e Sul. Aing, 40 na cober. da energia elétricae da coletade lig porém beneficiando sobremane e Nordeste tenham tido alguma expar que as regides Norte tura, esta é mais evidente no que diz respeito ao acesso a energia elétrica, Nas demais politicas, a diferenca de cobertura em relagao a situagao no ano de 1991 é bem menos evidente. Por fim, 0s municipios do Norte e Nordeste experimentaram aumento em suas taxas de bem-estar ~ envolvendo renda e servicos ~ durante 9 governo Lula. Em 2010, sao essas regies que apresentam boa elevacdo do Mapa 6 ~ Populacio com servico de coleta de lixo ~ Brasil, 1991-2010 Populacao com acesso a0 servic de coleta de lixo a 2 so 75 Fonte: IBGE, Censos Demogréficos 1970-2010 m-.— Narzendo 0 ¢ Sonceito de cidadania de volta valor da mediana do indicador sintétieg i antido simil pelo aumento do tamanho do box. n Em 2010, 0 acesso a ene, ainda que a desigualdade interna ar 4 observada em 2000 (expressa © Grafico 2) "gia elétrica era de independentemente da renda pe sssas areas tenha se m; fato universal no Brasil, "capita da jurisdi¢ao (Mapa 3), como resultado do Programa Nacional de Universalizacio e Uso de Energia Elétrica, langado em 2003. A coleta de lixo era municipios da regiao Sudeste e Centro-Oeste, cobertura na regido Sul. E embora tenha se Praticamente universal nos com pequena expansio da expandido nas regides Norte e Nordeste, persiste razoaivel variagao nas taxas de cobertura (Mapa 6). No que diz respeito ao abastecimento de agua, acobertura nos municipios das regides Norte ¢ Nordeste foi aumentada, atingindo taxas proximasa 75% Mapa 7 ~ Numero de médicos Por mil habitantes ~ Brasil, 1991-2010 1991 Numero de médicos por mil habitantes aig +0,75 AF +050 is +025 A D xe 0.25 Fonte: IBGE; Censos 1970-2010, PNADs; DataSUS. Tabulagses espect M. 01 ; Js. sspeciais do CE! ‘ Demogrificos t 27 Marta Arretche «io ‘entro-Oeste. Nos municipios dessas regiées cujas coberturas cram bastante variaveis em 2000, as taxas também ati giram patamares superiores a 75% (Mapa 4) Acoletade esgoto, entretanto, permaneceu praticamente inalterada,i excegao de um incremento marginal nas taxas de cobertura nos municipios jaatendidos pelo servigo. Universalizagiono Sudeste e virtual inexisténca de coleta de esgoto no Norte e Nordeste continuam caracterizando ess politica (Mapa 5), © ano de 2010 pode ser cohsiderado como o legado do governo Li no combate a desigualdade territorial de acesso a servigos essenciais. Em termos territoriais, CCAS ies SEER Ciaeal aye das taxas de cobertura: dmpliou Seus servigos de abastecimento de dpi coleta de lixo, bem como universalizou oacesso a rede de energia elétr Em suma, nos dltimos quarenta anos, a prosperidade ~ entendid como renda e acesso a servigos ~ teve considerivel expansio, mas sentou clara desigualdade territorial. No regime militar e nos conturba dos anos 1980, que coincidiram com 0 processo de redemocratizacio, 0 municipios das regides Sul e Sudeste experimentaram taxas de melhor superiores as demais regides. Durante o governo GEMM écada de 1990, foram os municipios da regia GGA SLO RseRUCMpResen a7 CQLEES RISER SrESENO IME RCHUMSNEESSOISERYIC os. Por fim,» 20verno(SIARESEREaTEIEIZOGO, foram os municipios dagitegigesINan Nordeste que experimentaram incrementos mais expressivos em sua: condigdes de renda e taxas de cobertura de servicos essenciais Em qualquer dos casos, cantudo, a reducio das desigualdades ente as regides se fez acompanhar de aumento ou preservacao das desigual dades no interior das regides. Acesso a servicos e percentual de pobres Observou-se que hd uma associagao entre riqu ides, taxas de pobreza e cobertura de servigos essenciais na trajetéria das desi gualdades territoriais no Brasil. GQREGASISARAS eaRaSCCROBETTUAY Trozendo 0 conceito de cidadonivo de voto servigos essenciais esto combinadas a municipios com menor capacidade de geragao de riqueza, bem como maiores taxas de pobres. A desigual dade de acesso a servicos no territério nacional esta, portanto, associacta maior concentragao de pobres. Essa associacdo, contudo, foi declinante nos tiltimos quarenta anos. E o que mostram os dados da Tabela 1, que apresenta a correlacdo entre as taxas de cobertura dos servigos ¢ o percentual de pobres nos munici pios brasileiros, Como esperado, ha uma associa¢ao negativa sisternitica entre taxas de pobreza e taxas de cobertura dos servicos essenciais. Em outras pala ‘ras, taxas elevadas de pobreza esto associadas as mais arxas taxas de cobertura nos servicos. Tabela 1 - Correlacao entre 0 acesso a servigos essenciais ¢ o percentual de pobres ~ Municipios brasileiros, 1970-2010 “Servigos estercais __1970_ 19801991 2000 Acesso a rede geal de espora® n 0583 Acesso a rede de energia elétrica” Acesso a rede geral de égua* Fercentual da populago com + de 1 2n0s com ensino fundamental" cera de lixo Médicos por mil habitantes 0.425 Fonte: IBGE, Censos Demogydlicos 1970-2010, DitaSUS,Tabulagtenespecaisdo CEM, * Varidveis que eram mensuradas em percenual fram tansformadas em Logi Entretanto, paraa maior parte das politicas examinadas, a associaga0 entre pobreza ¢ baixas taxas de cobertura cai sistematicamente. Em 2010, ‘associagao negativa entre pobreza ¢ taxas de cobertura é a mais baixa da historia do Brasil. Sem diivida, isso é explicado, como se observou. pela elevagao das taxas de cobertura nos municipios da regio Nordeste eNorte. Isto é, a progressiva expansdo da cobertura nos municipios mais pobres operou crescentemente, no sentido de diminuir o grau de associa 40 entre pobreza na renda e oferta de servicos. Por outro lado, hd excecdes notaveis a essa trajetéria global. A associa: gioentre pobreza e adistribuicao territorial de médicos por mil habitantes, indo que a variagio nos valores seja marginal. A relagao entre ac nivel de escolaridade da populago com mais de 15 anos aum 1 sistematicamente entre 1 ©2000. Na verdade, atinge seu ponto mais alto em 2000 ¢ s6 cal de fato ‘a0 longo da década de 2000. Somentecm 2010. apieseDis valores inte res aos de 1970} ‘Oacesso A energia elétrica em J980 também apresenis valores superiores a 1970, indicando que o inicio Ub processo de expan: sho da cobertura pode aumentar, ¢m vez.de diminuir, a associagao entre pobreza e acesso a servicos ‘Observe-se que as politicas em que esse correlagio apresenta valores ais baixos (inferiores ou iguais a0,5) so aquelas emque os municipios est2o inseridos em um sistema nacional. Napoliticade satide, a vinculagao eae itueional das rceitas muinicipais, as transferencias federais vincula- das ‘¢-0s mecanismos de indugao para integracio ao SUS tem um efeito impor ante na distribuigaa territorial dos médicos, ainda que esta tenha permanecido estavel desdga impl iodo SUS_Nas polities ue energia elétrica, agua ¢ esgoto, flor stta vee: 3 desiqualdade de renda per capita foi enddgena a montagemidos sistemas nacionais instituidos pelo ne militar. No Planasa c no sistema integrado de ener eletrica, a oferta dos servigos deveria ser feita por companhias est aduais, que ope variam com base em subsidios cruzados, isto & a secelta dos municini9® of com maior rend: compensaria oleventual deficit da oferta de servigos nos municipios mais pobres. Nas politicas em que esta associagao negativa permancee 212 fem tomo de -0,7) ~ quais sejam, exjsino fundamental ¢ coleca de lixo - dots fatores distintos podem estar operando. No caso da colera de lixo, esta é provavelmente explicada pelo fato de que esse servis foi desde a sua ori igem organizado em bases exchisivamente runicipals ‘A impossibilidade de substdios eruzados ¢ a austneia de regulacio federa seja induzindo 3 aniversalizacio do acesso, seja vinculando recursos a Servigos, PO estar na origem da elevada cofrelagdo negativa entre Taxas de pobreza ¢ taxas de cobertura do servigo: oy alta correlacio negatiya entre nivel de escolaridads casas de pobreza é mais facilmente expticavel. AiiSeiSs cevidencias das rela~ cées entre escolaridade e repda, de modo que.esses dois fendmenos 220 Trozendo 0 conceita de cidedanie de volo | ESTEEMED. Municipios cuja popu lacio apresenta mais baixos niveis de escolaridade - mesmo que estes Sejam resultado da migracao de individuos mais escolarizados para éreas com maior nivel de atividade ~ apresentam também mais altas taxas de concentragio de pobres Conclusées Na década d@]18%, o Brasil néo era apenas um pais pobre. AGHIBE Parte dos seus municipios era habitada por elevada concentracio de Pobres, ¢ a caréncia de servicos essenciais era generalizada, Nos tiltimos REIN ocorrcu sensivel melhora nas condigdes de vida das cida des brasileiras. A renda per capita aumentou, a concentracio de pobres diminuiu ¢ a cobertura de servigos de infraestrutura fisica, bem como a oferta de médicos e os niveis de escolaridade melhoraram sensivelmente Entretanto. a desigualdade de riqueza entre os municipios brasileiros Permaneceu rigorosamente estivel, a desigualdade territorial da concen tragdo da pobreza aumentou e diminuiram as desigualdades no aes. a servigos basicos de energia elétrica, agua e esgoto, éoleta de lixo e niveis de escolaridad- A prosperidade ocorreu em estreita associagao com a expansao da renda per capita ea redu¢ao do percentual de pobres, sem que seja possivel determinar a dire¢o da causalidade. O fato é que a melhora na riqueza das jurisdigdes foi acompanhada, de modo geral, pela reducao na con- centracao de pobres e ampliacdo das taxas de cobertura dos servicos Em outras palavras, quando um municipio experimenta methoras em wma dimensio, tem grandes chances de progredir nas demais dimensoes de bem-estar examinadas Por essa razdo, individuos com renda similar podem ter acesso desi gual a servicos piiblicos, a depender de sua oferta na jurisdicio em que residem. Essa oferta esteve estreitamente associada com a riquesa doe municipios e suas respectivas taxas de pobreza. A trajetoria da melhora teve, contudo, marcada expressio regional Nos iltimos quarenta anos, ela se iniciou nos municipios mais ricos, nos che aquais a universalizagio dos servigos anfecede ~ em multo =a expansio da cobertura aos demais. A melhioradas egberturasnas regides Sul e Sudeste constitui o primeiro ciclo de expansi para todas as potiticas, ainda que com ritmos diferentes para cada politica setorial. Pode-se dizer que os politicas do regime militar © mesmo da redemocratizacio beneficiaram mais fortemente as regides Sul e Sudeste. vt década de 1980 nao foi de fato ima dada perdida na dea social como afirmou Vilmar Faria (1992). Eperetanto, os avangas na cobertura dos servigos sociaisnesse perfodo ben¢ficiaram principalmente os pobres ddos municipios mais ricos, nos quai 0 acesso a Agua ¢ energia eléirica estava praticamente universalizado ng inicio da déeada de 1980. “Amelhorada cobertura paraas regides Sule Centro-Oeste constitul o seguuido ciclo de expansio para todaspts politics, ainda que em periodos diferentes para cada politica setorial. Por fim, aRSGiGUSINOHEIe|Noneste sio a Gltima dea de expanséo daoferta de servigos. Seja para Sgua, sea para encrgia ~ ambas de acesso cinversal na regido Sucleste desde 1980 -(@ISeERREISS NeNEnOUURers BHAAOID. De fato, as populagSes rurais e os pobres dos muntcipios ATs necessitados, em particular na drca{do(@aligamoraasisesss. <6 t'verarm neesso a gua e energia clétrica, pela universalizacio dos semvisos, SD tir do século XX1.(Noentanto, @ coléta de lixo ¢ de esgoto: permanecem? promessas nio cumpridas para essas populaydes

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