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Capitulo 15 A Entrevista Familiar Diagnostica. Importancia da sua Inclusao no Psicodiagnostico de Criancas* Sintese Introdut6ria Neste trabalho propée-se a necessidade de incluir pelo menos uma entrevis: ta familiar no psicodiagndstico individwal Fundamenta-se teoricamente a conveniéncia dessa forma de trabalho ¢ su: gerem-se algumas regras técnicas para a sua realizacao. Destaca-se também a importancia da entrevista familiar diagndstica para possibilitar uma entrevista de devolugéo mais dinamica e convincente acerca das conclusies. Finalmente coloca-se a sua importéncia para decidir a indicagdo ou contra- indicagdo de terapia individual para 0 paciente e para decidir a estratégia que sera ‘sugerida como a mais adequada ao caso. A entrevista familiar tem sido um técnica ou método reservado, durante muito tempo, aos terapeutas formados para trabalhar com o grupo familiar como ponto de partida ow nivel de anlise na investigacdo dlagndstica e na psicoterapia Alguns psicélogos ¢ psieanalistas de criangas comegaram a usar posterior mente essa forma de abordagem. Outros, entre os quais inclui-se a autora, tém trabalhado por mais tempo com a metodologia cléssica: entrevista inicial com 0s pais, entrevista com a erianca que consulta ¢ entrevista final com o casal para a devolugao de informagao. As entrevistas com a crianga ineluem uma hora de jogo diagnéstica e a acministragao de testes projtivos. A medida que houve mais intercémbio ¢ contato entre as diferentes formas de trabalho ficou evidente a necessidade de incluir entrevistas familiares no proces- 0 psicodiagnéstico Este capitulo 6a ampliagae de um trabalivo apresentao pela autora na ocasio em que partilpe ‘como panelist a Prima Jornada Naclozal de Psicologia da Crianga c sua Fanilia,orgnizada ‘pela Universidad dl Salvador, Buenos Ares, 1979, Por ese mativoo trabalho est eenralizado na {eniien infant nas posse fazt-aextensivo ao caso do psleadingndstico de adelescentes. 166 PsicodiagnO6stico Clinico 167 Fundamentos para Sua Inclusao 1. sintoma da crianga é o emergente de um sistema intrapsiquico que esti, por sua vez, inserido no esquema familiar também doente, com a sua propria, economia ¢ dinamica. Este principio tem sido aceito por todos os setores das dife- rentes escolas psicanaliticas e outras. Aurora Pérez diz a esse respeito:! Aentrevista familiar € constitu por dois sistema em convivoestavel que modetam. entre uma relago contnente-conteto. Anns sistemas esto cm crescimentoedesenvov- ‘mento, O continent. est constcuo pela casl parental...) conteido estarepresentado ‘els fits.) Assim undo da eriaio ¢ uma situagaoassinétrica em rela de dependén- ‘a. (.) Quando a rama familiar nao abriga nio metaboliza, no transforma adequadamente, 9 atmostera familar torna-serarefita, intoicada ecamegaa aparece adcenca...um sina de larme de que algo est acontccende no ambit familiar |.) Assim oelima de said vai Sendo perturbaeoecomecam a insalar-se patterns de doen Uma crianga psicdtica & a depositaria da loucura de todo 0 grupo familiar, que permitiré que ela se recupere ou nao, dependendo de até que ponto cada um dos membros da familia estiver disposto a assumir o grau de doenga pelo quat & responsivel. PomSurge aqui a necessdade de adaptar os métodos de investiga dlagntstica aos avangos obtidos pela teoria: somente assim sera possivel um maior aprofundamento na realidade clinica e a obten¢ao de um diagndstico mais preciso. Raquel Soifer® colocou: ‘Vimos que podiamas trabatharde ts formas diferentes como grupo flat 2) como dans: 1) como infarmaco diagndstica ao aeabar oestudo: 6 como terapia fp. 196) Soifer indica a entrevista familiar quando “surgirem diividas no estudo diag- néstico da erianga”, Neste trabalho é focalizado o segundo aspecto exposto por ela, mas néo somente se surgirem dividas diagnésticas, e sim em todos 05 casos, a nao ser que exista alguma contra-indicacao, [No entanto, no é somente esta a razdo que justifica a sua inclusdo. 2. As hipdteses originadas nas entrevistas com o casal ¢ naquela com ofa) fiho(a) (ou seja, aquito que a sta hora de Jogo € os testes indicam) devem ser const deradas provisérias até serem comparadas com as que aparecerem na entrevista familiar. S6 entéo, aquelas poderdo ser validadas ou retificadas, enriquecidas ou modificadas. Por esse motivo, propomos aqui a realizagéo de pelo menos uma entrevista familiar mesmo em se tratando do diagnéstico individual de uma erianga ou de um adolescente. 3. Quanto menor a erianca, mais importante sera considerar esta recomen- dagao, pois ela esta em pleno processo de formacao e em estreita e direta dependén- cia emocional de seus pais. Neste aspecto s4o novamente importantes as recomendagées de Anna Freud’. 1, Pérez, Aurora. “Elna familia yl petra”. Revista del Hospital de Nis. V.XIX.n?76, outubro de 1977, 2. Solfr, Raquel. Para qu a fia?Buenos Ares: Kapetus, 1978, 8. Freud, Anna, Normale y pataogia ela nez Buenos Aires: Pid, 1975. 168 Garcia Arzeno "No que se refere o papel dos pals na causa de doengas, 0 analista infantil deve ter nuitocuidado para queas aparencias superficais nda desorienteme principalmente pacando confines efeitos da anormaldade infil sobrea ne, com anf palogenicn da me sobre a crianga. O mélol mais seguro e trabalbeso para avaliar eslasinteragbes &aanslise ‘inulin dos pais com ses fils. Algamas mses ou ps do ertanga um papel dentro da ‘sun prpriapalologia, estaiclecendo a sttasrelagées sabre essa base eno sobre as neces des reais dacrianea. Muitas mies realmente ansferem seus sintosas para seus fills eh goes ‘encenan conjuntamente como sefose uma ole @ eu. 42) ‘No ratament, principalmente os menores revelam até que ponto esto donninados pelo mundo objet, ou sea, em que medida o anbiente eg a inftucetar para detern sua conduta ea sua patlogia(p 45) Os pais sio modelos que a crianca esta incorporando durante uma etapa decisiva. Detectar 0 modelo que os pais estdo apresentando € ajuda-los a retited-o 3€ necesstirio, pode constituir-se em ajuda para todo o grupo familiar, mais titi! que qualquer tratamento individual de um de seus filhos. 4, Quanto mais grave for a hipétese diagndstica, mais necessiria ser a ‘entrevista familiar, por exemplo, nos casos de psicose, quadros borderline, perver ‘io, psicopatias ou hipocondrias graves. Quando ha suspeita cle uma psicose simbiotica ov, pelo menos, de uma simbiose ndo resolvida & conveniente incluir também uma entrevista com o bindmio em questo. 5. Outro motivo importante para realizar uma entrevista familar € que ela propicia condutas observaveis para os pais. a criana ¢ o profissional que podem ser tomadas como ponto de referéncia na devolucao do diagnéstico. Em muitos casos 0 conflito € evidente somente para o profissional, sempre que houver confirmagao das ‘suas hip6teses no materia clinico. Mas isso nem sempre é suficiente para que os pais aceitem tanto o diagndstieo como a recomencagao terapéutica do psicélogo, is aqui um breve caso ilustrativo, Tratava-se de um casal joven com trés criangas: dois meninos de sete ¢ cinco anos ¢ uma menina de trés. Os pais preocu- pavam.se com o filho clo meio por suas birras intoleraveis e a repeticao de seus acidentes. A mae era quem relatava os problemas. O pal demonstrava que “nio acreditava nessas coisas” e que o menino cresceria ¢ fcaria como ele, na rua: que os problemas eram fabricados por sua mulher e a empregada. Ao explorar em profun: didade a sintomatologia e a historia do menino, foi assinalado que tudo aquilo por si $6 justifiaria recomendar psicoterapia para o menino, mas que 0 mais importante, e antes do tratamento, seria descobrir por que e como eram geradas essas sit ‘es. Foi proposto que toda a familia viesse & entrevista ¢ eles accitaram, Logo que chegaram 0 pai comegou a bocejar e a dizer que estava com fone e com sono; que se ddependesse dele, tiraria 0s sapatos. o casaco e deitaria para dormir no diva. A mae, que no inicio escutava e observava como se fosse uma irma mals velha, disse-lhe: “Aqui nao tem bebés. Voce € o bebe. O pai mucdou logo de atitude dirigindo-se a0 filho mais velho, que estava fazendo recortes em papel. para sugerir que 0 colasse na parede. 0 filo nao o abedeceu. Entio o pai propds que brincassem de labirinto {aquele mesmo papel recortaco) mas de uma forma que era impossivel superar os obstaculos que ele introduzia. O menino dizia: “Nao da. O pai insistia que sim. Realmente era impossivel © para no precisar reconhecé-l o pai inventou solugées rebuscadas, Contratransferencialmente essa situagio fazia surgir a vontade de di- zer-the: “Jogue comigo em ver. de exibir-se castrando 0 menino!. Este menino nio respondeu com raiva nem fez. comentario algum em defesa propria. Enquanto isso a ‘menina havia comegado a brincar com a mae € faziam trocas de objetos. O menino do melo, motivo das suas preocupagdes, ficava s6, agindo como mestre de ceriméni- as ao distribuir material para os outros; tentava chamar a atengio mostrando os Psicodiagnéstico Clinico 169 seus papéis recortadas, mas sem sucesso. © pai propés ao maior desenhar com tinta plastica € continuot com as suas eriticas. O do melo comerou @ fazer 0 mesmo que o seu irmao na tentativa de atrair a atengdo e aprovagao do pal, sem consegui Jo. A mae era um pouco mats bondosa com ele mas estava mais concentrada em brinear com pratinhos e xicaras com a menina, Em resumo, 0 pai desempenhava dots papéis, ou era o bebé maleriado & cexigente, ou 0 pai rigoroso, castrador, implacavel. Nao tomava nem conhecimento do fitho do meto, A mae sim, mas ndo conseguia dar atengo a ele porque era solic tada pela menina € pelo “bebé esfomeado". Assim, as impertinéncias do menino, ‘beim como os acidentes sempre repetidos eram provocadas por sua necessidade de receber atengao e gratificagao, ja nao como um protesto ativo mas como uma enire- auto-destrutiva ou suicida, causada pelo sentimento de nao ser importante para hinguém, Foi proposto um primeiro periodo de entrevistas familiares e de casal para modificar 08 paptis. Se o filho ndo melhorasse paralelamente a evolugdo dos pais, seria recomendavel comecar um tratamento individual paralelo. O pal, tdo resistente no inicio, aceitou a proposta ao sentir-se confrontando com o jogo do labirinto e suas outras atitudes e comentarios, que eriariam também problemas com 0 filho mais velho ¢ com a mulher. A mie conseguiu expressar que precisava dele para educar os filhos ¢ que sentia demats que ele fosse mais uma crianga, Além do mais, o pai foi advertido sobre as conseqiéncias que suas atitudes provocariam quando 0s meninos chegassem adotescéncia: ou se submeteriam ou 6 enfrentariam numa luta sem trégua. Esse quadra servin para fazé-lo reconsiderar que nao seguindo a recomendacdo estaria impedindo o tratamento, j& que era ele quem tomava as decisdes do casal. E que esse era 0 set futuro eo da sta familia no 0 do profissional. O pai decidiu pensar no assunto e depois de um tempo come- garam o {ratamento do menino. Neste caso a terapia familiar teve resultados excclentes e 9 menino apresen- tou uma grande melhora. Este é um exemplo que serve para ilustrar a utilidade da entrevista familar para planejar uma devolugio de informagao bem-sucedida 6. Além do mais, oferece elementos muito valiosos para decidir qual a estra- tégia terapéutica que sera recomendada na entrevista de devolugdo cle informacio final 7. Em certos casos a entrevista familiar pode dar indicadores para contra- indicar 0 tratamento analitico individual, a saber: 4) Quando nao se vislumbra a possibilidade de modificago da patologia familiar e principalmente se esta for severa. Comegar um tratamento individual do filho seria fazé-to 0 Unico responsive pela doenca familar. Além disso, supse-se que o tratamento modificaria defesas que teria desenvolvido para sobreviver dentro desse meio patoldgico, deixando-o desprotegido ¢ vulnerivel, ou desestruturado. Por outro lado, sio escas- sas a possibilidades de que o tratamento tenha sucesso, e pode ocorrer, entdo, que continuem com ele porque é inécuo ou entao que o interrom pam alegando 0 fracasso que sera atribuido ao terapeuta, b) Quando a melhora do filho poderia trazer associada a descompensagao de outro membro do grupo familiar. No caso de que esse membro fosse ‘um dos pals a situagdo pexleria ser realmente séria, Surgindo uma crise do casal, todo o clima familiar sentria 05 efeitos, fieando sem continen- 170 Garcia Arzeno te. Nestes casos a recomendagdo de terapia individual do flho deve ser complementada com a terapla do casal. ©) Quando o filho atravessar uma crise evolutiva que obrigue os pais a revlverei essa etapa. Se para eles essa etapa foi confitiva nao consegut rio ser apoio para o filho enquanto tenta superé-la ou entio no permi- tirdo que ele o faga. Aurora Pérez refere-se nesses casos a crises paralelas: Raquel Soifer, a0 nivel de aprendizado € desenvolvimento de pais e fi- Thos, 4) Quando os pats mantém e reforcam inconscientemente a sintomatologia do fitho, porque isso Ihes proporciona uum importante beneficio secun- dario, e @ néo ser que se pretenda modificar esta “economia” familiar, 0 pedido de tratamento sera somente uma tentativa infrutifera No suposto caso de uma crianca adotiva que desconhece a verdad € 0s pais, nao aceitam conté-la e cujos sintomas sdo sérios transtornos de aprendizado com tum bom nivel intelectual e de maturagao, 0 psicodiagnéstico no nivel intelectual pode mostrar severas resistencias ao aprendizado devido a intensa angiistia que provoca nela o conhecimento da verdade. Esta oposigao estaria bloqueando os me- Canismos de introjegao, hasieos para 0 funcionamento do processo de aprencdizado, 0 resultado sera que a erianga pareca tola¢ talvez 0 aconselhamento sera no senti- do de trocé-la para um colégio especializado, Mas com um maior aprofundamento na historia aparecera 0 motivo subjacente da resistencia paterna em contar a ver- dade ao filho, aparecendo assim, por exemplo, que a adogao nao foi legalizada e teriam que confessar algo vivide como 0 roubo de uma crianga. Isto podera ser verdade ov no, mas sempre teré um resultado equivalente para o seu inconsciente, Dado o somatério de resistencia que se estabelcce em casos como este, o tratamento individual, além de infrutifero, funcionaria como um pacto encobridar, porque o terapeuta estaria aceitando dinheiro e trabalho em troca de nao tocar no assunto da verdade. Alguns desses casos chegam a ser realmente nao analisaveis ¢ acaba desfilando diante de uma multidao de outros especialistas (pediatras, neurologis- tas, psicopedagogos) que tampouco conseguem solucionar 0 problema de base Indicadores na Observagio da Entrevista Familiar Diagndstica Os mais importantes sao: 1. Se 0s paptis pais-filhos, continente-contido, pal-mae, feminino-mascull- no, ete. aparecem e esto bem discriminados ou se estao confusos ou inclusive invertidos. 2, Se esses papéis permanecem fixos ou se sio intercambiaveis, 3. Determinar quem exerce a lideranca executiva no cargo familiar. Se € um dos pais, é importante que o terapeuta possa discriminar o seu espirito de colabora- ao ou ver o grau de alianga terapéutica com a qual podera contar. 4. O nivel de desenvolvimento obtido por esse progenitor lider para permitir 20 filho que consiga um desenvolvimento completo ou refre-lo, se ele nao consegue crescer junto com os filhos. A esse respeito. Raquel Soifer' diz: Por outro lado chegamos a entender que havia un pono de xagto no desenvolvimento psicoldgeoiéntico na eranga ena sua faa que determinava que os pais io vessem cont pletado um aprendlizad , parisso tornava-se miposivel para cles ajudaracriangaa faze loe ‘laborar essa igo. ot passivel compreender que ncidénca da fama na doenga da evan tina suas rates nesse aprendiado no akeangado(p. 196), PsicodiagnOstico Clinico_171 5. As identiicagdes que predominam: 0 que é ser como o pai ou como a mae para essa familia: 0 que é ser bobo ou legal; 0 que significa ser inteligente, agressivo, estranho, bom, caprichoso ou no. 6, Tenlar extrair a fantasia de doenga ¢ cura no nivel do grupo familiar, assim como saber também se predomina o depésito da doenca em um dos seus membros ou a capacidade de assumir cada um a sua parte. Em relagio ao deposi taria € importante que se observe se ele opde resistencia ou presta-se passivamente a0 papel de *saco de pancadas” 7. Outro elemento importante & o que Raquel Soifer desereveu em seu livro Para qué a familia?® como uma fungao fundamental dos pais: transmitir conheci ‘mentos € estabelecer limites, ajudando assim a delimitar a fantasia de realidade. Este é um fator decisivo para evitar a instalagéo de uma psicose. Diz 0 seguinte: fundamental que opaiou amie, dependendo do caso, se cloquem na dade que tem cho nesse momenta. Na psieanlise ese processo de deslocar-se para uma dade anterior € ‘chamado de regressso no cso a que nosrelerines ela parcial einconscientemente acl. OS pais enfrentando esse estado emocional da erianc, sentem reathvadasas suas recordaphes de situagées euivalentes experimentadas no momenta evlutivocorespondent. ‘Assim, o modo com os pls transite os diferentes ensinamentos 2s seus fos depend de: a) a possibildade de regredir parcial eineonscientemente, que sera malor ov menat conforma fxtilidade da sua personaldade ea rigdez ou permesbildade da regressao das suasvivencias infants.) ') apossbiidade de retorar da regresstovltandoa sua condi de adlos(. $1} ‘Acaracterstica da atitude do pal 6a sua (endéncia a observa a realidade ea usar a ‘bjetividade com umn menor componente emativo. or sua Ver, a maior capacidade para o pensamento lgio leva o pal a exercer coms maior rmezao principio da autoridade... Essa terveneao ajuda a mulher aliberar-se da sua Ades emocionl eam oflho, quem por sua ver vai aprendende a separa se graduatmente ela. A Tanga do pai nel seu papel como esposo e protetor da mulher (p. $5) Finalmente ésuafurigo seri eomo modelo masculinoadultpara seus flo homens {que se Identiiardo com ee, € ao mesmo tempo, pasar a imagem vrla suas fhas, que logo DDuscarincareteristeassemelhantesem seus companhites...A aor capacidadedeintuicioe ‘compreesopslolgea inerentes condigao fein fzem da mae a principal reguladora das ‘emogaes no la p87} 8. No mesmo livro Raquel Soifer descreve, como é visto no texto anterior, ulro aspecto importante do comportamento dos pais que deve ser observado du rante a entrevista familiar. Trata-se de algo que funciona também como requisito para ser um bom educador e um bor terapeuta de criancas: a capacidade de fazer Juma regressdo para compreender 0 filho e, ao mesmo tempo, retornar da regressao voltando a sua condigao de adulto, 9. Mitos familiares encobertos pela rotina do funcionamento familiar. Um renomado investigador e elinico em psicoterapia familiar do grupo de Palo Alto (California, E.U.A), Antonio Ferreira, assinala a importancla de descobrir os mitos familiares que sao crengas sistematizadas compartthadas por todos os membros da familia em relagdo aos seus papéis respectivos e sobre a natureza da relagio entre eles. Estes mitos possuem um valor econémico, promovem rituais e areas de 4. Soler, Raguel.“Pscoterapia del grupo aniiar con fis estizand juguett nc Abernsury, Armin (comp, Elpsicoanlisis denis y sus aplicaciones 3d, Buenos Ares: Paid, 1972, 3" parte, ap, 10. Soler Raquel. Para que fanitia?. bi Ferreira, Antoni. “Mites familiares" ne Bateson, G.€ outros. Intraccén familie Buenos Aires: ‘Trempo Contemporsneo. 1971 172 Garcia Arzeno acordo automitico. Para cada papel defnido existe um contra-papel oculto em ou: {co ou outros membros da familia, Os mitos ocorrem em todas as familias. ndo somente nas patolégicas. Significam para a familia 0 mesmo que as defesas para 0 individuo. Por exemplo, um pal impulsivo, alcodlico e uma mae absténia, severa € repressora, & umm mito énquanto esconde a parte oposta de cada um encenada pelo coutro menibro do casal. O mito promove a homeastase pois permite que a relagao se rmantenha inalterada, Segundo Ferreira, desvendar 0 mito familiar requer deicade- za € disrigao porque pode colocar toda a familia contra o terapeuta 10. Ouira paula importante é a capacidade de proceder espontaneamente durante essa entrevista e depois ter insight do ocorrido. Por isso a autora deste trabalho inicia a entrevista de devolugéo perguntando ao grupo familar sobre os [pensamentos provocadas pela entrevista familiar em relagio a si mesmos e ao grupo familiar. Logicamente 0 diagnéstico € a recomendagao terapeutica nao serdo basea ddos na presenga de alteragoes em alguns destes itens ¢ sim no somatério ou coexis tenia de varios € no sew peso sobre a patologia do fitho. Contra-indicagées Por todas estas razses recomenda-se realizar pelo menos uma entrevista familiar diagnéstica, mas cabe esclarecer que nem sempre isso é possivel e as vezes no é nem recomendavel a sua realzagdo, Por exemplo, quando os pais estao sepa: rados: quando resistem reileradamente; quando estima-se que Isso elevari 0 nivel de angistia da erianga até um lite extrema com 0 que podera ser desruido 0 bom rapport que conseguiria com 6 profssional, dixando-o com uma predisposicio ne- gativa para uma fatura terapia, Isto é life! de prover, mas as vezes é verbalizada pela propria erianga ou adolescente. Alguns Aspectos Técnicos da Entrevista Familiar Geralmente a consulta tem inicio com a ligagdo de um dos pais de uma crianga. O trabalho comega entao com uma entrevista com ambos. A primeira en- trevista diagndstica deve ter como finalidade chegar a un diagnéstico inicial, apés 0 qual sera decidido quando a crianga sera entrevistada individualmente, com 0s seus pais ou com toda a familia. Isso vai depender do nivel no qual se imagina que este- Jam as raizes da patologia principal. De qualquer forma deve-se advertir aos pais que provavelmente ceverdo comparecer uma vez tocos juntos e que a criana dever comparecer duas vezes sozinha para a aplicagdo de alguns testes. Isso geralmente é accito, Se surgirem resistencias fortes, se o casal estiver separado ou algum das filhos se recusar a comparecer ou ainda se o grupo estiver incompleto por alguma razao (viagens, ete) havera que prescindlir da entrevista fa nilfar. Os pais poderdo vir juntos ou alternadamente com a crianga que 0s preocu- pa. Sobre a necessidacle de comparecimento cle todas, Virginia Satir coloca o seguinte” Enecessiriocomparecimentode todos porque sn parte da homeostase ania nes mo que no apresentem sintonas..artindo do pessupostode que quandoetsteum mak estar ra Fnlia,todos 0s membres o sentem de alguma forma e mesmo que nesse momento no aparegantos sintomas, eles poderio surgir mais tarde...) Aereditoqueo terapeuta de familia pdera realizar muito trabalho prevenivo ncluindo todas eriancas no proceso teraptute. (Cl Aswezeseu reeebo um easl quandoaserangasestioeom quatroanas ou menes. Mas ainda 7. Sali, Virgina. Conjoint Family Therapy. Palo Alto Calf: Setenee and Behavior Books, 1967, Psicodiagnéstico Clinico 173 Insist em tae todos os fos paraa rapa, pelo menos para duas sesss de frma que eu passa observar por mim mesma com a fami funciona como um todo.) Quando as erangas ‘So menores de quatre anos ene 0sterapia peo menos nas duas sessiesinicias(Tradu- oda autora (0 niimero de entrevistas vai depender da clareza com que seja possivel ex- trair material significative, Porém nao é aconselhavel estender demais o niimero de entrevistas diagnésticas, pois as pacientes nao suportam uma interagio prolongada sem interpretagdes. Quando a familia chegar sera repetida a orientagao apds ter curmprimentado ‘cada um pelo sew proprio nome: "Nesta calxa tém coisas para que Joguem, conver ‘sem ou trabalhem, fagam de conta que eu no estou presente, Eu observarel 0 que acontece quando estao juntos” No que se refere ao registro do material é aconselhavel limitar-se a0 minimo possivel. Ha familias que se sentem muito perseguidas pela presenca do profissional € ainda mais se este estiver escrevendo tudo 0 que eles fazer. E entao preferivel observar ¢ anotar alguma coisa que sirva de chave para reconstruir a s€38a0 com- pleta mais tarde. Ha outros casos em que as pessoas sentem-se perseguidas pelo lhar, entio nao se sentem perturbados se o profissional estiver concentrado ma tarefa de eserever. Iss0 até os alivi. COutras familias insistem em engolfar 0 observador para diminuir a angistia persecutria impedindo-o de ser um observador nao partcipante. & primordial des- cobrir a intengao que essa atitude esconde e nao aceité-la se tiver raizes psicopaticas ¢ visar impedir que o profissional observe e pense. Se o pedido funcionar como forma de distracao deve ser rejeitado. No entanto, se a intengdo for buscar no profissional um ego-auxiliar que ‘ocupe um papel que esta vazio no grupo familiar, podera aecitar-se 0 pedido dentro das normas recomendavels, usando 0 mesmo critério usado quando se aceita ou rao fazer algo proposto pelo paciente durante a terapia infantil ou de adultos psicéticos. Em outros casos a intenio ¢ eliminar a dicotomia persecutéria observator observado e, entéo, aceitar certas intervengées inécuas podera baixar o nivel de persecugao e “aliviar” o clima emocional Pode ocorver que um ou alguns dos membros do grupo tentem estabelecer ‘uma alianga com o profissional deixando outro ou outros excludes. Isso pode acor- rer quando se dirigitem a ele iniciando uma tentativa de dlalogo através de comen- taos, perguntas, relatos, etc. Nessas ocasiées ¢ aconselhavel responder somente 0 indispensavel (dentro daquilo que se entende como cortesia e boa educagio) para rio provocar uma quantidade excessiva de agressao (com o siléncio frustrante) e 0 desconcerto familiar diante da reagdo do profissional que nao é tila como a habitu- al. Pode ser oportuno repetir a orientagdo inicial no sentido de que o papel do psicé- logo ¢ 0 de um observador nao participante. Logicamente, essa seqiéncia niio devera ser omitida no registro da entrevis- ta, dado que dela poderdo ser extraidas conclusses diagnésticas e prognésticas im: portantes. ‘Nao deve ser esquecido que a entrevista familiar diagndstiea é um meio, ndo tum fim em si mesma. Seria um fim na etapa subseqiiente se a terapia familiar hhouvesse sido recomenada, Assim, as recomendagoes técnicas so semelhantes a da primeira hora de jogo diagnéstica. No que se refere ao estabelecimento de limites diante de situagées de muita violencia e destruicéo, Sati* coloca: 8. Sali. Vinginia. Ob. ct 174 Garcia Arzeno 0 patoua mie sioos que devem responder eestabelece limites na conduta de seus flhos. Por outro lado, se eu assumisse esse papel perderia a oportunidade qu estou procura do: aoportunidade de observar como pai ea mae lidam coma sua funiga patental Ela da @ familia uma série de regras multo precisas sobre 0 que é ou nao é permitida fazer no consultério. No que se refere ao lugar é conveniente realizar a entrevista familiar num melo apropriado. Para isso deve-se levar em conta a niimero e a idade dos integran- tes do grupo familiar. O lugar deve permitir 0 deslocamento confortivel da familia para que possa haver interagao lidica e nao somente verbal, especialmente se as criangas forem pequenas. A idade dos membros do grupo deve ser levada em consi deragio para selecionar o tipo de jogo ou material que supostamente preferirao usar. Se forem incluidos materiais que possam provocar sujeira & aconselhavel rea- lizar a entrevista num local apropriado evitando assim que 0 prolissional fique pen dente das conseqiéncias. Quanto aos materiais devem ser variados conforme a idade € 0 sexo dos Iintegrantes do grupo para que cada um encontre alguma coisa atraente. Materiais para montar, cortar, enganchar, construir, eosturar, colar, modelar, pintar, dese- nhar, ete. feqdentemente atraem também a atengao do pai e da mae. A orlentagio {4 havia advertido que a caixa nao era para uso exclusiva das crianeas, No que se refere & interpretagdo dessas construgies, modelagens, monta- gens, elc., podem ser utilizados os critérios habituais da psicandlise de eriangas ¢ também de alguns testes lidicos. tais como os de Lowenfeld*, Arthus'®, Rambert!, Aberastury®, etc. Assim, por exemplo, Aberastury® diz: Cada paciente possuieexpressa una determinada confguragda espacial esta deno- ‘ndnagio elada por Hamburger significa relagao espacial dinamiea das formas, lamankes © distincias decada pessoa p20 Eteada coniguagao espacial determinada osuetocxpressa:a)a sua experiznca no cespago:b) a sua stuacio atual dante da espago edo seu propria corpo (p.22) Seria aconsethavel dispor de uma mesa de altura padrao, outra mais baixa, algum lugar onde sentar da altura padréo para um adulto ¢ almofadas no piso € tapete para os pequenos. E importante registrar onde se localiza cada um € qual 0 lugar que tenta escolher. £ muito significativo que a mée sente diretamente no chao sua filha mals velha numa cadeira. Também ¢ significativo que 0 pai nao abando: ne a sua cadeira mesmo que o seu filho mais mogo the pega ajuda de longe. Isso tem relacio com a possibilidade de fazer uma regresséo iit para compreender as crian- as mas, também, de recuperar o nivel de adulto que deve funcionar como continen- te detes, E impossivel eagotar (odas as varidvels que possam aparecer durante uma entrevista familiar, mais ainda dentro das dimensoes limitadas impostas por este tipo de publicagao, Por isso, consideramos impossivel evitar a sensacdo de que ainda restam rmuitas interrogagdes sem resposta € que serdo, em todo caso, objeto de um futuro trabalho. 9, Lowenfed, Jane Margaret Teste do mundo). Play in childhood, Landon Gallanca, 1935, 10. Arthus, Henry Teste do povoadol Levllage: Test tit creative Paris: Paul Harman, 1949, 11. Rambet, Madeleine, “Une nouvelle technique en psychanclyse infantile: Le jeux ds gulgnols Revue Prancaise de PsyehanalyseX. 1938, 12 Aberastury. Armida. Buego de eonstrireasas,3.ed, Buenos Aires Pals. 1976 18. Mem PsicodiagnOstico Clinico 175 Outros Exemplos de Entrevista Familiar Diagnostica Caso N°1 ‘Trata-se de um menino dle 26 meses que tem um irmaozinho de um ano. Na entrevista com os pais a mae diz que ele sempre foi um problema, desde a epoca da gravidez, porque dava pontapés. Depois do niascimento do irmaozinho fou muito chordo. O pai confirma que a partir desse momento 0 menino nao se satisfaz com nada. A mae acrescenta que o problema agora ¢ nia ereche, No inicio chorava mas ficava, Agora no quer mais far. Nos poueos dias em que ficou permanecia gruda- do na professora chamando seus pais e seu irmao. Mesmo quando o deixam com ‘uma av chora pensando que a mae iré embora € nao voltara ‘Quando ele era pequeninho o pai viajava com freqiiéncia por motivos de trabalho, e a mae ia para a casa da sua propria mae. O menino no comia até que a situagio comecasse a se normalizar, Bastava que visse a mae na calgada da frente para que comegasse a chorar desesperadamente, Agora o pai parou de viajar. Per- gunto a ela como se sentia quando 0 marido ficava ausente ¢ responde que ficava de rau humor, com medo de que the acontecesse alguma coisa e que por isso ia para ‘a casa da mée para que o menino néo ficasse s6. Finalmente diz: “Me enche que me sobrecarregue com tanta responsabilidade —- referindo-se ao marido — fisicamente rndo posso”. Comeca entéo a contar que ela néo queria engravidar. Que preferia adotar eriangas abandonadas em vez de trazer eriangas ao mundo. (2) “Porque nas: cem para morrer”. Comega a contar que seus pais a proibiam de sair com rapazes porque isso era coisa de putas, que no principio teve problemas de vaginismo, que 0 marido & muito inseguro. Bla também fem uma irma que nasceu logo depois dela ¢ sofreu bastante or isso. Passava a impressio de uma mulher saturada pelo seu papel maternal ¢ que desejava retomar o seu trabalho e delegar a outra o papel de mae. Ache! que 0 ‘menino devia perceber que “queriam ver-se livres dele". Chamou a minha atengéo tum tique no rosto dela enquanto falava e ria, parecia como se estivesse com nojo ov cheirasse algo ruim. Ela € quase profissional e ele tem uma fruteira e agougue, Davam a impres: so de ser um casal com poucas afinidades, como se ela se sentisse muito superior a ele, Ele parece mais sensivel e mais simples: abviamente deve sentir-se inseguro a0 lado dessa mulher e sofre muito, Ela nao luta junto a ele; ou pede dependencia ou se sente superior. Dentro de todo o quadro ele parece um homem mais simples e direto, Ela & ais complicada, ha momentos em que o seu pensamento perde coeréncia ¢ a sua atitude é de demanda constante. Essa idéia de adotar porque ter filhos € para que morram € muito séria, possui um traco delirante e implica desejos lilcidas inconscientes. motivo desencadeante da consulta ¢ que o marido ficou assustado pelas rapidas mudangas no seu estado de animo, que variava desde 0 desejo de beijar 0 filho até gritar que a deixasse em paz Na entrevista familiar chegaram com 15 minutos de atraso sem dar nenhu- ‘ma explicagao. O pai permaneceu a mangem € participou muito pouco, O menino ‘mais moco brincava de enfiar tudo em qualquer orifcio que encontrasse. A. Aberastury diria que ele esta perfeitamente localizado na sua idade ja que isto equivale a elapa ou fase genital prévia. Por exemplo, introduz um lépis dentro de um carretel de linha ou do rolo de Durex € o faz girar, ou dentro de uma panelinha, a faz girar sorri contente, 176 Garcia Arzeno © mais velho, que chamaremos de Pecro, me diz: “Olhe os sapatos de Juan (o mais moco) olhe 0s meus (no séo novos nem brancos como os do irmao); olhe faponta um carro bordaco em sua camiseta). E continua insistind para que eu olhe para ele. Entrou de mao com o pai e no inicio ficou encostado nele. A mae estava com Juan no colo, © primeiro a ir para a mesa de bringuedos é Juan, entio Pedro val aié a sia mae e se encosta nea. Banca o mimaso. Juan comeca a jogar coisas. E jutro jogo habitual para a sua idade. Pedro diz: “Olha, Jogou o lapis, jogou tudo" No inicio Pedro limitou-se a juntar tudo 0 que o irméo jogava ¢ a entregar- ime. Juntava coisas até que nao eablam mais em suas mios ¢ nao podia brincar. A mae fez. um boneco com massa de modelar e 0 entregou a Pedro; foi quebrando, Fez outro para Juan. Pedro o pediu ¢ a mie o entregou a Juan, Pedro estava com as maos cheias com tudo 0 que Juian fa jogando soltava tudo sobre o diva. Brincou com um barbante que se enredava rio botdo superior ditetto do seu macacdo. A mae ensinava-o a desenredé-lo mas ele puxava: “Quero tiré-lo™, mas se a mae 0 tirava ele 0 colocava do mesmo jeito novamente. ‘A mie insistiu durante toda a sessio com a higiene e a ordem. “O nariz sujo, est com 0 nariz suyjo. Cuidado com isso. Pegue o lapis". Pedro nao pediu nada e no entanto ela esteve atenta a ele o tempo todo. mais mogo estava com 0 nariz correndo, 0 pai notou mas como o menino se afastava dele nesse momento pediu & mae que o limpara, $6 entéo a mae o fez. Quase no fim da consulta Pedro se aproximou de mim e disse: “Olhe como 0 Juan joga tudo", ¢ & a mae que responde como se ele tivesse falado com ela, Sinto que a mae 0 absorve. pat permanecia & margem e Juan comeca a fazer barulho. Bate com as coisas efinalmiente é ele que bate a poria e chora dizendo que quer ir embora ja que © irmao (que est brineando) tira tudo dele € a mae mo Ihe da muita atencéo. Nos iltimos minutos Pedro consegue concentrar-se na brincadeira com dais carrinhos, fazendo-os bater. ‘A mae diz: “Vamos recolher tudo”. Pedro continua brincando. A mae diz: “Vou limpar 0 seu nariz", se aproxima mas ele a afasta com um gesto, A mae diz: “Nao risque a mesa” (€ de Formica). Entao 0 pai, que por um instante brincou com os dois de acender um fésforo para que eles 0 apagassem ¢ que quando Pedro pediu que acendesse um disse que nao, que s6 quando fosse para acender um cigarro, acende umn ¢ o oferece como forma de distrai-lo e para ajudar naquilo que a mae esti se propondo, que é que ele pare de riscar (2] a mesa. Pensei que essa insisténcia injustifcada da mae seria devido a que na realidade quando Pedro se concentra em. qualquer brincadeira a exclui afastando-se dela e ela sente-se relegada, Finalmente vao embora. Comentéri: fiea claro que Pedro é um menino sadio, preso pela mae, mas que tenta soltar-se dela. A mae intensifica seu vinculo com ele, tira importancia das demandas do marido € do mais moro qué no final mostra 0 que sente: que o mais velho absorve tudo da mae, nao sobrando quase nada para ele. O jogo com o bar- bante mostra que para ele nao ¢ tao facil “desenredar-se do vinculo que tem com a re. Quer mas nao consegue e precisa de ajuda. O pat mantém a sua atitude pres- cindivel, mas quando organiza um jogo 0 mesmo consiste em “brincar com fogo". ou seja, a sua aparente passividade encobre a possibilidade de reagées “fogosas” ja que se sente como Juan, deixado de lado, desvalorizado e com o seu lugar ustrpado por Pedro, Seria necessario trabalhar com toda a familia para localizar cada um no papel que the cabe. Além do mais, seria necessério ver 0 menino sozinho uma vez Por semana para explicar-lhe como & que ele chora pensando que seus pais vio abandoné-lo porque € um menino mau que ocupa o lugar do papai: além do mais chora porque ainda é pequeno, mesmo sendo o mais velho ¢ tendo um irmao tio Préximo, Isso provoca uma grande ambivaléncia, gosta dele mas ao mesmo tempo ¢ Caso Psicodiagnéstico Clinico_177 ‘odeia porque precisa compartilhar a mae com ele. A mae precisara compreender que em parte esse choro & provocado e induzido por ela que também sente cada vez que precisa separar-se de sua mae, para quem corre cada vez que seu. marido vai ‘embora, coisa que a desagrada enormemente. O pai devera ter consciéncia da raiva ‘que essa situagio provoca nele, pois da mesma forma que no jogo do barbante no ‘qual a mae desenreda ¢ o menino volta a ficar enredado, a mulher pede a ele que se aproxime mas quando ele o faz ela mostra s6 ter olhos para Pedro. O pai mostrou ter renunciado ao poder sobre Pedro, Precisara intervir, tanto para recuperar 0 seu filo como para ajuda-lo a cortar esse cordao umbilical (barbante} que ainda o man- tém preso a mae. Partindo de uma perspectiva sistémica poderiamos dizer que neste sistema familiar existem dots subsistemas claramente diferenciados: mae-Pedro e, por bai- xo, paiduan. A tarefa terapéutica consistiria em resgatar o sistema parental e diferencia-lo do filial Do ponto de vista da pstcandlise essa mae deve tomar consciéncia de que trata Pedro como se fosse um prolongamento nareisistico de si mesma, como um substituto materno, Ela ainda esta, de forma muito ambivalente, ligada a sua mae. 0 fato de nao querer ter filhos porque nascem para morrer & uma estranha filasofia, Jogo atenuiada quanclo afirma que se preocupa com a possibilidade de que eles (pais) ‘morram ¢ os filhos fiquem ss. Isso € uma indicagao de que o verdadeiro sentimento dla em relagao a mie inclui fortes desejos de morte unidos a uma grande idealizagdo (sem a mae a pessoa morre). E provavel que ela precise de uma terapia individual para aprofundar-se nesse aspect. © pai nio faz nada para modificar essa situagdo porque em sua histéria infantil devem existir também razies que 0 impedem de ter uma maior seguranca ‘como homem e pai. 2 Trata-se de um casal de aproximadamente cingflenta anos que consulta com uma filha de quinze anos. £ nica filha. Ha: um ano esta namorando um rapaz, da sua fdade, Os pais esto alterados porque a menina passa quase todos os dias na casa do namorado, Nao gostam nem um pouco dele, nem como fala, veste, nem do que faz. ou detxa de fazer ‘Ambos sao pessoas muito educadas, cultas e elegantes. A filha também 6 mas destacam-se principalmente a sua beleza e elegincia. 0 pai comporta-se muito formalmente o tempo inteiro e por tris disso perce- be-se muita violencia. Quando a filha resolve convidar 0 namorado para ir a sua casa “niio conseguem ver-se lives dele”. Queixam-se de que acaba com a sua inti midade, Comentam que a familia do namorado é muito diferente da deles, que sio descendentes de centro-europeus. Aqueles, no entanto, séo italianos e tem uma familia grande no melhor estilo da fatia unita, Ali a filha, a quem chamarei de Maria, sente-se muito acompanhada ¢ mimada. Queixa-se de que em sua casa esta muito 86 ja que seus pais sao profissionais ¢ trabalham o dia todo. Quando voltam ela & 0 centro das atencées, perguntas, queixas, etc. Maria diz que esta farta de ‘ouvir que toda a desordem é culpa sua, que tudo 0 que falta € devido ao seu descaso assim sucessivamente, Explica aos seus que € por isso que fica tantas horas na casa de seu namorado. E mais divert e ali ela € homenageada. Maria sabe perfei- tamente que sendo solteira sua mie fez um aborto e sempre lamenta néo haver tido tum irmao, Conta que quando era pequena fantasiava que ele existia e falava com ele. 178_Garcia Arzeno Observo entdo que a mde fica muito nervosa € muda de assunto, pai também parece ficar tenso ¢ ajeita o né da gravata [esse momento tenho a sensacao de ter captada 0 essencial do caso. £ inegavel que a familia com um tinico filho se organiza de uma maneira especial, que ofilho carrega com tudo sobre as suas costas, que custa muito admitir fa Sua propria saida exogimica porque o casal fica s6 e que para um pai bastante severo € dill deixar de ser o “senor” ¢ admitir outro homem em casa Mas além de tudo isto que poderiamos denominar de uma crise vital existe tum problema muito sério: um luto nao elaborado. Maria faz empenho em trazer esse assunto quando traz o namorado, Lembro que tive um lapso e ao querer referir-me a ele o chamei “Mario” em vez de Ricardo. Todos notaram e compreendi que a unio simbidtiea de Maria com seu namorado foi 0 motivo de meu lapso entao aproveltel para mostrar-Ihes que quanto mais eles insistissem em separa-los mais acirrado ficaria 0 vinculo, ressabio do estreito amor que Maria sempre sentiu por seus pals. Mas além disso achei que Maria trazia Mario-seu-iemio-morto, A mae men- cionou isso durante a primeira entrevista mas agora esse “dado” adquiria um tom ‘emocional dramatico. Partindo dos pais o “nao tragas esse traste para nossa casa” significava “Nao nos facas relembrar 0 menino que poderiamos ter tido". ‘Assim fieavam melhor explicadas as criticas implacaveis feitas ao rapaz. No fundo 0 que ocorria poderia ser assim verbalizado: “Nao é este o que nds queremes. Em seu lugar deveria estar o teu irmdo centro-europeu € nao esse italiano’. les elogiavam a vida que Maria havia levado nos dois anos anteriores quan: do sata com um grupo ce meninas e rapazes. Ou sefa, quando Maria era uma pabere nao uma adolescente apaixonada por “um” rapaz. No fundo o que eles me pediam era que eu desse marcha-ré no tempo € os ajudasse a recuperar uma Maria-pibere, Durante outra entrevista, quando Maria sentou-se diante deles € os olhou firmemente, eles perguntaram 0 que ela estava pensando, Ela comecou a chorar angustiadamente ao mesmo tempo que gritava: “O que voces querem de mim, me digam 0 que querem de mim?" O psicadiagnéstico individual de Maria tinha dado resultados étimas © apa- reciam enfatizados logicamente os medos do crescimento adolescente. Tudo parecia muito simples mas agora manifestava-se uma situagao dramatica. Os pais esperam que ela pule a etapa problematica da adolescéncia, que thes apresente um namora- do a imagem e semelhanga do que eles querem ¢ que se adapte ao modelo que eles Ihe impdem, no qual um dos ingredientes mais importantes é: “Nao nos facas relembrar esse aborto pois 0 personagem de quem estamos falando & para nds um orto e para ti um vivo". mats sadio que Maria poderia ter feito seria essa oposictio a se “encaixar” no programa familiar, que excluia toda possibilidade de reviver 0 luto, Essa era a verdacleira desordem da qual a culpavam e por isso era objeto de um controle estrito ¢ obsessive. Mas a menina, muito sadia, ao final rebelava-se. Maria colocou: “E aqui ‘eu no venho mais. Venham vocés.” : A consulta terminou com algumas entrevistas com 0s pals, deixando claro ‘que Maria no estava fugindo mas que uma vez cumprida a sua miss4o deixava-me (0s seus pais (que na realidade ela havia trazido) para falar sobre essas intimidades nas quais algum estranho devia se infitrar para ajudé-los. Nao era Ricardo precisa- mente, mas eu. E a essa tarefa nos dedicames. Passados quatro ou cinco anos encontrel Maria na rua. Cumprimentow-me muito sorridente e carinhosa. Contou-me que havia trocado de namorado, que era muito feliz e que estava muito contente na Faculdade.

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