You are on page 1of 3
RED K a ‘ revista brasileira de estudos de populacao homens esquecidos: escravos e trabalhadores livres no brasil - séculos XVIII e XIX EISENBERG, Peter L.— 1989. Homens Esquecidos: escravos + trabathadores livres no Brasit = séeulos XVII e XIX. Campinas, Editora da UNICAMP, 394p., (Colegao Repettérias). Traci del Nero da Costa * Distribuidos em quatro partes rednem-se, em volume dedicado & meméria de Peter L- Eisenerg, quinze ensaios que sintetizam sua contribuigao a historiogratia brasicira. A p reira parte é voltada A economia ¢ a sociedade do Nordeste agucareiro. A transigéo do traba- Iho escravo para © livre & 0 tema comum aos estudos integrantes da parte subseqdente. Os “homens esquecidos” — teabalhadores livres, forres ¢ cativos ~ dominam os artigos que com- poem a terceira parte. Na dltima, por fin, vio estampadas eseritos concetnentes ao surgimento ‘eevolver da economia de exportacio de acfcar em So Paulo ¢ as conseqilentes mudangas s0- ciais dela decorrentes; tema este que ocupou vérios anos de pesquisa ¢ em fungd0 do qual © tutor chegou 20 pene amadnrecimento intelectual como historiador que se distinguia pela vi- ‘do global dos provessos socais, pllicos, demogrdficos e econmicos. Evidentemente, foge 20 escopo desta breve resenha estabelecer 0 balango dos int- ‘eros contributos devides a Peter Eisenberg: parccendo-nos Obvio, além disto, que s6 se po- der hauri-los com hase na leitura atenta de aa obea. Nao abstante,¢ sempre cingindo-n0s 30 ‘genérico, permitimo-nos algumas abservacées com as quais pretendemos tealyar alguns temas -nagcantes des ensaios ora agrupsdos. 0s teés primeiros estudos vinculam-se & sua tese de doutorado, publicada ern ingiés © posteriormente em portugues, intitulada Modernizardo sem mudanga: a indistria acucareira fom Pemambuco, 1840-1910. Como explicitado neste titulo, a preocupacao central presente em ais ensaios foi evidencia, com forte e original embasamento empiric, os limites da adogio de novas tdcnicas de producgo do acticar ¢ da aboligfo da escravatura ¢ introdueao eeneralizada do trabalho livre nv Nerdeste, Predomins, pois, a permanéacia, a qual, exemplarmente ex- © Profesor da FEA-USY, Rov. Bran. Est, Pop, SEo Paulo, v6 m2, p. 109-107, juicer, 1989 103 plorads por Cain Prado Hinior, muitos de nés estamos a redescobrir nos dias correntes, tanto no plano de alguns fendmenos demogréfices, como no que tange 2 vida coonémica © wo com= portamento dis classes dominante da sociedade brasileira ‘Vemo-nos, assim, remetidos & histéria das mentalidades, tratada nos trés ensaios subsccutives € dedicados 2 transigéo do trabalho escravo ap livre. Sua conchaséo maior aponta fo sentido da dormindneia das semedhangas entre as opinides posturas de distintos segmentos ‘da classe dos proprictérias de terrae vineulados 2s economias Je exportacio do agiicar e do até. {44 a9 nfvel do concreto, no sétimo estado, o autor chaima a atengio, com fespeito 40 caso brasifeio, para “a continuidade entre o regime de trabalho do escravo eo regime de tra- ‘balho de um homem livre - 0 proletério”. Assim operando, visou a enfrentar as restrighes classicamente levantadas contra © primeito quando estabelecido o confronto entre o trabalho tativo e 0 assalarindo, quis sejam: inferioridade do trabalho escravo por motivos psicolégicos, maior custo de supervisio, inibigio quanto a0 aperfeigoamento e melhor qualifieacio do (ra- bathador e conseqiiente impacto sobre emprego de téenicas avancadlas e, por fim, a Timitagio imposta ao desenvolvimento do mercado interno dala a ausencia de demand derivade da re= ‘muneracdo em espécie do trabalhador direto, Embora endossemas as conclusdes do artigy no {que diz respeito & impertinéncia, para o easo do Brasil, dos pontos acim arrolados, nio pode~ mes deixar Je Ihe apor duas qualificagées. Im primeiro, deve-se reconhecer que as similitues cencontradas pelo altior ao cotejar trabalhadores livres € escravos cacm por terra se tivermos presente a citagio extrafda do primeira volume de O Capital que ele mesmo teve 0 euidado de incluir na quarta nota de seu trabalho: “The essential difference between the various economic forms of society, between, for instance, a society based on slave Isbour, and one based on wa- ge-fabour, lies only in the mode in which this surplus-labour is in each case extracted from the actual producer, the labourer” (MARX, 1967). Ademais, parece-nos que a maneira correts de responder Aquelas restrigSes estd em revelar as diferenras entre o escravismo moderno ("una ‘esclavitud puramente industrial”, como assevera Marx no primelro volume dos Grurrisse) ¢ 0 ‘antiga, isto Peter nao fez A preoeupasto com eativos ¢ trablhadores livres nos conduz aos ts etudos reuni- dos na terceira parte do livro, nos quais, como avangado, tratou-se de lives, libertos © eseri- Yor, estes verdadeiros homens exquecidos que sparecem no titulo do volume, Tal filo, profi- lentemente garimpado polo sitor, revelou-se dos mais cos ¢ tem insprado grande némero de issertagbese tesos na drea da histOria scondnica, socal ¢ demogréfica desenvovidas nos l= timos lusros: Resgalar o¢ que se definiam como éxules em suas préprias plagas repressntou para Peter Eisenberg uma definitva aproximacia da demografia historia a qual, acrescentc~ fe, 0 mesmo entendeu, desde loge, em toda sux dimensio interdisipliar. Ejustamense esta ‘ompreensio plobalizente que inforina os ditimas quatro ensais dados a pblico. Nels so t= portados resultados parciais de uma peaguisa de longo folego com a quul o autor se compro- Inetera hé muito e que, infeiamente, restou inacabals. AO debrugar-se sobre a evalugio de Campinas (SP), desde sou surgimento convo pequeno baitro rural cor apenas quarenta fami até sua afirmagao como importante nucleo regional produtor de agicar, nio eaqueceu os ne~ ‘essérios condicionamentos internacionais derivados da desoxganizacao do mercado mundial co Droduto (guerras de independéneis das col6aias inglesas porte-americanas ¢ da colnia fran- 104 revista. brasileira de estudos de populacao cesa de So Domingos), ber: come no deixou de lado as inter-relagbes colocadas no plano in- tere, Adomais, a comunidade e seu evolver foram vistas como tim todo intogrado no qual coniugavan-se varidveis com cardter ecoudmico, sociolégico © demogratico, Esta perspectiva, apenas denunciada nos escrites em tela, fica patente no projeto initutalade Da agricultura de subsisténcia para a agricvitra de exportacdo: Campinas, Sao Paulo, 1767-1829, subxuetido & FAPESP em outubro de 1982. Esta pece riqufssima ¢ de grande valia para os quo protendam perllhar as hodiemas linhas Ue pesquisa do campo da hist6ria demografica e econémica, em- bora disponivel em cépins esparsas, nfo foi juntudaa Homens Esquecidos. is, pois, arrolados alguns clementos definidores da superior qualidade da obra de Peter Eisenberg, indelevelmente inscrita om nossa historiografia. REFERENCIA BIBLIOGRAFICA MARX, Karl. ~ 1967. © Capital ~3 vols., Frederick Engels, The german ideology, C.J. Artbur (ed, New York, Internation! Publishers, s/d, v.3, pp- 791-2, 105

You might also like