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212 _Direito Fiscal Angolano 12.2. O procedimento tributario 12.2.1. Objecto e ambito O procedimento administrativo tributério constitui um ramo do Pro- cedimento administrativo, tendo como principal objectivo estruturar e for. malizar a interaccio entre os particulares e a Administra¢o Tributéria de acordo com os principios conformadores de um Estado de Direito demo. cratico de direitos fundamentais. Assim sendo, as normas do procedimento administrativo tributérig devem ser interpretadas ¢ aplicadas tendo como pano de fundo o proce. dimento administrativo, juntamente com o préprio direito constitucional que lhe serve de fundamento e limite. Nos termos do art. 76.°, n.° 1 do CGT, “[o] procedimento tributario compreende toda a sucessio de actos dirigida 4 declaracio de direitos tributarios”, O procedimento tributario compreende, designadamente: + Asacgdes prévias ou complementares de informacao dos contribuin- tes ¢ outros obrigados tributérios; + A determinagio da matéria colectavel; + A liquidacao de tributos, quando efectuada pela Administragio ‘Tributaria; + A revisio da liquidacao, por iniciativa do contribuinte ou da Admi- nistragao Tributaria; + O reconhecimento ou revogacao dos beneficios fiscais; + As reclamacées e recursos hierarquicos; + A cobranga das obrigacées tributarias, salvo no que for regulada no Cédigo das Execucées Fiscais; + As accées de inspeccao tributdria; ‘Todos os demais actos dirigidos A declaragao dos direitos tributé- rios, Digitalizada com CamScanner — 2.2 Forma 9 procedimento tributério segue, em principio a forma escrita, gsactas orais quando sejam admitidos por lei, devem ser sempre reduzi- dasa escrito pelo Orgao instrutor (art. 77.9, n.° 1, do CGT). ‘A lei prevé que o procedimento, ou alguns dos seus actos, possa ser tramitado electronicamente, em termos a definir por diploma do Execu- fio, Esta possibilidade visa incrementar a simplicidade e a celeridade do procedimento, reduzindo assim os custos de funcionamento da Adminis- tragao. Todavia, a evolucio no sentido de um procedimento tributario com tramitacao eletrénica pressupée recursos técnicos humanos adequados. Nos termos da lei, os documentos emitidos e os actos praticados elec- tronicamente pela Administragao Tributdria e pelos contribuintes tém o mesmo valor probatério dos documentos auténticos emitidos e dos actos prticados em suporte de papel. Exige-se, ainda assim, que a respectiva certificagdo siga os termos legais e regulamentares aplicaveis. Ou seja, a promogio da celeridade e da simplicidade do procedimento nao pode comprometer a seguranga juridica. 12.2.3. Legitimidade e competéncia 0 procedimento administrativo tributdrio pretende estruturar a inte- Taccao da administracao tributaria com os contribuintes, de forma consti- lucionalmente adequada a tutelar um leque vasto de interesses. Assim, a lei prevé uma legitimidade procedimental ampla, a qual tem seu fundamento na existéncia de um interesse constitucional numa justa Ponderacio dos interesses piiblicos e privados em presenga. Ele significa que, para além da administracio tributdria, o impulso pcemental cabe a qualquer titular de direito ou interesse legitimo em tia tributaria (art. 81.° do CGT). 5 “— hos casos em que a lei determine como legalmente competente inteagie a maximo da Administragéo ‘Tributéria, a competéncia per a Valente, lo procedimento é da Reparticao Fiscal ou o servico local equi- M que o contribuinte se encontre inscrito, ou, no caso dos contri- Digitalizada com CamScanner 214 _Dircito Fiscal Angolano buintes nao residentes, onde se encontre inscrito 0 seu representante fiscal (art. 82.°, n° 1, do CGT). Nos casos dos impostos sobre o patriménio imobilidrio, a competéncia para instrugio e decisio do procedimento tributario é da reparticao fiscal ‘0u 0 servico local equivalente da localizacao desses bens (art. 82.°, n.° 2, do CGT). A lei admite a delegagao de poderes para a pratica de actos tributérios pelos drgios da Administracao Tributaria no seu imediato inferior hierdr- quico. O acto de delegagio deve especificar sempre os poderes delegados (art. 87.°, n.° 1, CGT). Os poderes delegados poderao, ainda, ser subdelegados, com a autori- zacao do delegante (art. 87.°, n.° 2, CGT). A eficdcia dos actos de delegacio e subdelegacao esté dependente da sua publicacao no Diario da Republica ou no sitio do Ministério das Finan- ¢as na internet (art. 87.°, n.° 3, CGT). 12.2.4. Principios do procedimento tributdrio 12.2.4.1. Principio da gratuitidade O procedimento tributario é, em principio gratuito. Ainda assim, a lei pode prever alguns encargos a suportar pelos interessados no procedi- mento. Neste caso, devem constar de regulamento os actos e formalidades do procedimento tributério sujeitos a taxas ou emolumentos, bem como respectivos valores (art. 78.° do CGT). 12.2.4.2. Principio da prossecugio do interesse publico A administragao tributaria encontra-se exclusivamente ao servigo 40 interesse publico, tal como definido pelo legislador democratico, e nio a0 servico de quaisquer interesses particulares, Esta remissio para 0 legislador democritico justifica-se tendo em conta a dificuldade de avangar com uma definicao essencialista do interesse publico. Digitalizada com CamScanner Procedimento e processo tributario 215 zm todo 0 caso, 0 interesse piiblico nao se confunde com o prinefpio da iegatidade, nn medida em que neste prevalecem consideragées de natureza institucional ¢ formal, relativas aos érgios competentes e a forma da actua- cio dos poderes piiblicos, a0 passo que o interesse piiblico tem uma rele- yancia teleoldgica, concernente aos fins e propésitos da actividade estadual. Dai que a legitimidade destes fins deva ser aferida, em diltima instancia, a sua conformidade constitucional, Deve ainda acentuar-se que a prossecucio do interesse ptiblico de forma alguma prejudica a devida consideragio aos direitos e interesses dos particulares que sejam objecto de tutela constitucional e legal. pel Com efeito, uma justa consideragio destes direitos e interesses e um adequado equilibrio entre eles e o interesse piblico é, em si mesmo, um objectivo de relevo piiblico constitucional. 12.2.4.3. Principio da decisao Os érgdos administrativos tém o dever de se pronunciar sobre todos os assuntos da sua competéncia, que lhes sejam apresentados pelos par- ticulares. Sendo o procedimento tributdrio uma espécie de procedimento administrative, compreende-se que 0 mesmo principio também ai seja relevante, com as devidas adaptacées. No ambito do procedimento tributario, o principio da decisdo traduz- -se numa obrigagio de proniincia da administracao sobre assuntos da sua competéncia, que lhe sejam apresentados (reclamagées, recursos, peti¢oes, Tepresentacdes ou queixas) pelo contribuinte, pelo seu representante ou Pelo titular de interesse legitimo (art. 80.°, n.° 1, do CGT). S6 nao haverd obrigatoriedade de decisio se a Administragéo Tribu- Uiria se tiver pronunciado ha menos de dois anos sobre pedido do mesmo Aulor com idéntico objecto e fundamentos, bem como na eventualidade de © acto a que o pedido respeita jé nao for administrativa ou judicialmente Susceptivel de modificagao ou revogaciio (art. 80.°, n.° 2, do CGT). Digitalizada com CamScanner 216 direito Fiscal Angolano 12.2.4.4, Principio do inquisitério ‘Um outro principio positivamente conformador do procedimento tri. butirio é 0 principio do inquisitério (art. 83.° do CGT). O seu fundamento substantivo reside na subordinagio da administragao tributaria aos prin- cipios juridicos da prossecucao do interesse puiblico e da obtengao da ver. dade material. De acordo com estes principios, a realizacao das finalidades tributérias nao pode estar dependente de um sistema de confissdo voluntaria por parte do contribuinte, antes tendo como corolérios concretizadores, o reconhe- cimento, 4 Administracio Tributaria, dos direitos de informacio, investi- gacao e inspeccio. O principio do inquisitério manifesta-se, com especial acuidade, no apuramento da situagao tributaria dos contribuintes, na medida em que a Administracao Tributaria néo tem que se bastar com as respectivas declara- es. A mesma pode determinar a realizacao de avaliagées directas, orien- tadas a afericao do valor real de rendimentos ou bens com base em critérios e factores objectivos e fundamentados, e avaliagées indirectas (art. 1062 do CGT). Estas podem ter como critérios materiais certos indicios, como margens médias de lucro liquido de terceiros, coeficientes técnicos e custos directos, a localizagao e dimensio da actividade exercida, o valor de mer- cado dos bens e servigos ou a congruéncia entre factos apurados e situa- 0 real. Do mesmo modo, as mesmas podem apoiar-se em presungoes (vg., custos presumidos relativamente a actividade) ou outros elementos a disposicao da Administracao Tributéria (vg. declaragées relativamente a outros impostos ou declaragées sobre empresas relacionadas). 12.2.4.5, Principio da colaboracio Um outro principio estruturante do procedimento administrativo tri- butdrio é 0 principio da colaboragio (art, 84.° do CGT). O mesmo deve 8¢ entendido, desde logo, num contexto de reciprocidade, impendendo tanto sobre a Administragio como sobre o contribuinte no quadro da boa-fé q¥e deve existir nas relagdes entre ambos, Com efeito, o principio da colabo- Digitalizada com CamScanner Procedi ENtO ¢ processo tributdrio 217 ragio surge NO onaiow: mais alargado da conformagio do Procedimento administrativo tributdrio por referéncia aos valores da Seguranga juridica, da estabilidade, da previsibilidade, da proteccéo da confianca e de bos, _{é, tendo como ponto de partida a presungio de boa-fé, tanto do lado da Administragao Tributaria como do lado do contribuinte, De acordo com este princfpio, a Administracao ‘Tributéria ndo deve poder retirar vantagens das omissdes ou erros manifestos dos contribuin- tes, Este ultimo aspecto deve ser salientado, na medida em que ele preclude, por exemplo, que da ignorancia, incompeténcia ou inépcia do contribuinte se possa presumir, sem mais, uma conduta fraudulenta. A Administracao Tributaria deve aplicar a lei oficiosamente, devendo considerar-se que viola o princ{pio da boa-fé e da colaboracao a omissio da administragao em detrimento de um contribuinte ignorante, distraido ou incompetente. No ambito do principio da colaboragao, a lei prevé, inclusi- vamente, a possibilidade de a Administragao Tributéria, no caso de o grau de incapacidade do interessado o justificar, nomear-lhe curador especial com vista ao exercicio, no procedimento tributario, dos direitos previstos no CGT. O princfpio da colaboracao traduz-se, ainda, num conjunto de deveres aque a Administracao Tributaria se encontra vinculada, a saber: * Dever de prestar informagao publica, regular e sistematica, quando necessdrio ou conveniente, através dos meios de comunicagao social, sobre os seus direitos e obrigagées; + Dever de publicacao, via internet, dos codigos tributarios, devida e Permanentemente actualizados; Z * Dever de publicagio via internet e em drgios de comunicagao s €M prazo nao superior a 30 dias posteriormente Asuaem Acter genético ‘cial, , das Circulares ¢ outras orientagdes administrativas de ¢mitidas pela Administragao Tributarias once * Dever de esclarecimento regular ¢ em devido tempo de quant dividas fundadas sobre a interpretagio ¢ aplicagio das norma tributarias; e demais interessados para * Dev a. “its arnatvo fer de ago do sujeito passiv pore aoe ee resus declaragBes e documentos *sclarecimento de diividas sobre as suas Digitalizada com CamScanner 218 _Direito Fiscal Angolano + Dever de dar a conhecer aos contribuintes a identidade dos funcio. narios responsiveis pela direccio dos procedimentos que lhes digam respeitos + Dever de emitir certidées sobre os actos e termos do procedimento que digam respeito aos contribuintes e sobre a sua concreta situacio tributdria no prazo de 10 dias, ou em prazo inferior mediante o paga- mento de uma taxa de urgéncia a definir por regulamento (art. 84, n° 2, do CGT). Estes deveres alicercam-se nos principios constitucionais da segu- ranca juridica e da proteccao da confianca dos cidadios, nas suas diversas dimensées, com os quais o principio da colaboragio esta intimamente ligado. Por outro lado, do principio da colaboragao resulta para o contribuinte o dever de cumprir com as obrigacées fiscais acessérias impostas por leieo dever de prestar os esclarecimentos que lhes forem solicitados, nos termos da lei, no ambito de qualquer procedimento inspectivo, interno ou externo, independentemente da fase em que se encontre. Ainda assim deve reconhecer-se a existéncia de limites ao principio da colaboragao. Por exemplo, 0 contribuinte tem o direito de recusar a cola- boragao com a administracao tributaria no contexto da inspecgao dirigida ao apuramento da situa¢ao tributaria do contribuinte quando esta pretenda 0 acesso a habitagdo do contribuinte, a consulta de elementos abrangidos pelo direito ao sigilo, 0 acesso a factos da vida intima dos cidadaos, ou a vio- lagao de direitos de personalidade ou outros direitos, liberdades e garantias dos contribuintes. Nestas matérias, e em caso de oposigao do contribuinte, a diligéncia em causa sé devera poder ser realizada mediante autorizaga° judicial. O principio da colabora as quais, salvo sigilo profis ‘Jo vincula, ainda, toda entidades publicas, ional ou outro dever legal de segredo legalmente regulado, esto obrigadas a prestar A Administragio ‘Tributiria a colabo- ragao solicitada que recaia no Ambito das suas atribuigées e competéncias (art. 842, ne 4, do CGT), Digitalizada com CamScanner Procedimento e processo tributario_219 12,2.4.6. Principio da audigao De acordo com o principio da audigio, a Administracdo Tributaria esta obrigada a ouvir o contribuinte, previamente a conclusao do procedimento, sempre que houver instrugio e a decisio que pée fim ao proceso seja pre- visivelmente desfavoravel ao contribuinte ou respectivo representante legal. Este principio assume relevancia, designadamente, em matéria de liquidagao, declaracao dos pressupostos da responsabilidade solidaria ou subsididria ou concessio ou revogacao de beneficios fiscais (art. 85.°, n° 1, do CGT). O direito A audicao € exercido numa tnica vez, no prazo de 15 dias contado a partir da data da notificagdo para o efeito™, pela entidade res- ponsavel pelo procedimento, e incide sobre os factos objecto da instrugao cuja prova interesse a decisao. O direito de audigao pode ser exercido por carta ou presencialmente na Reparticao Fiscal ou outro érgio em que corra o procedimento. Neste caso, em que o direito de audicio é exercido oralmente, as declaragées do contri- buinte ou responsavel so obrigatoriamente reduzidas a termos, conforme dispée o art. 77.%, n.° 1 do CGT. Os factos relevantes que forem apresenta- dos devem ser tidos em conta na decisdo final do procedimento tributario, em ordem a conferir efeito titil ao exercicio do direito de audicao. ‘Tratando-se de um procedimento externo de inspecgéo tributdria, o direito de audigao é exercido sobre as conclusdes do relatorio da inspec¢ao, das quais o contribuinte é obrigatoriamente notificado nos termos legal- mente previstos. 12.2.4.7. Principio da confidencialidade e sigilo O procedimento tributdrio obedece ao principio da confidencialidade esigilo, Deste principio resulta para todos os funciondrios e agentes da Admi- nistra¢ao Tributaria, independentemente da natureza do vinculo juridico ™ A nolificacio é feita por carta registada, ex do seu destinatirio, conforme os elementos const do mesmo, pedida para a 0 domicilio ou residéncia fiscal antes do cartio de identificagio fiscal Digitalizada com CamScanner 220__ Di olay para com esta, a sujeigio a um dever de confidencialidade ¢ sigilo sob, todos os dados de natureza pessoal (mesmo que nao tenham natureza trie butiria) recolhidos relativamente a situagéo tributaria dos contribuintes 0s a que tiverem acesso em virtude das suiag ou demais obrigados tribu fungoes, Este dever mantém-se mesmo apés a cessagao de funcées do fun. ciondrio ou agente. O dever de confidencialidade e sigilo cessa no caso de o contribuinte oy outro titular dos dados pessoais em causa autorizar a sua revelacao. Em principio, o dever de confidencialidade e sigilo nao prevalece sobre deveres especiais de colaboracao ¢ informagio da Administracao Tributa- ria para com outras entidades puiblicas, desde que, atendendo s atribui- bes destas, os elementos em causa sejam relevantes e desde que nio haja disposicio legal especial que preveja a prevaléncia do principio da conf- dencialidade. Nos casos em que, por forca dos deveres de colaboracao e informagio,a Administragio Tributaria tenha facultado dados pessoais dos contribuintes ou responsiveis a outras entidades publicas, os funcionarios e agentes des- tas ficam vinculados ao dever de sigilo nos mesmos termos de quem presta servico na Administragao Tributaria. 12.3. O processo tributario 12.3.1. Objecto e ambito Através do processo tributdrio visa ‘se, em primeiro lugar, a realizagio do principio da tutela jurisdicional efectiva em matéria tributaria, Neste sentido, 0 processo tributario tem por objecto a “tutela judicial plena, efec- tiva ¢ em tempo titil dos direitos ¢ interesses legitimos dos particulares e™ matéria tributaria” fart. 1.9, n¢ 2,al.a), do CPT), processo tributdri : - O proceso tributario contempla, igualmente, a possibilidade de impus: fem também uma finalidade garantistica clivo da relagio juridica tributiria, por 4 ft Administragio ‘Tributaria, $0 tributdi da posigio juridica do sujeito a da tutela cautelar dos direitos d, Digitalizada com CamScanner

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