You are on page 1of 10
ARTIGOS Paridade de género na magistratura: um imperativo da democracia Por Mariana Rezende Ferrera Yoshida Thaisa Maira Rodrigues Held Resumo: O presente estudo analisa, de forma critica, os dados sobre a paticipagio feminina no Poder Judiciéro brasile ‘etem como objetivo apontar possiveis medidas para a efetivagdo da paridade género na magistratura. O método dedutivo serviu como fio condutor da pesquisa e como procedimentos metodoldgicos o levantamente bibliogréfico e a anélise qualtativa dos dados secundatios. Concluiu-se que a magistratura brasileira reproduz o modelo patiarcale discriminatério da sociedade em geral, o que implica em supressio da perspectiva feminina e suas interseccSes dos julgamentos. Desse ‘modo, a existéncia da cldusula constitucional de paridade de género nas cipulas do Poder Judicisrio parece ser a medida mais efetiva a ser adotads, todavia, a questio sequer chegou aos debates internos do Poder Judicisio, tampouco as portas do Poder Legislative. PALAVRAS-CHAVE: Paridade de nero. Magistratura, Democracia partéria Abstract: This study critically analyzes the data on female participation in the Brazilian Judiciary and aims to point out possible measures for the implementation of gender parity in the judiciary. The deductive method served as the guiding thtead of the research and as methodological procedures the bibliographic survey and qualitative analysis of secondary data. It was concluded that the Brazilian Judiciary eproduces the patriarchal and digeriminatory model of society in general, Which implies the suppression of the female perspective and its intersections of judgments. Thus, the existence of the Constitutional gender party clause at the summits of the Judiciary seems to be the most effective measure to be adopted, 82 but the issue has not even reached the internal debates of the Judiciary, nor at the gates of the Legislative. KEYWORDS: Gender's parity. Magistrature, Par Tintrodugae ‘Ao longo da formagao da sociedade contemporanea, a mulher esteve alijada dos espacos decisérios de poder. Tal afirmativa encontra guarida quando se retrocede 4208 tempos das civilizagbes grega © romana - que si0 ‘consideradas 0 bergo da civilizagao moderna -e se verifica que as mulheres nao eram cidadas, destacanco-se, nesse contexte, relatos como aqueles encontrados no classico da literatura grega, Odisstia, de Homero, escrito ha quase 3 mil anos. Em uma das passagens do poema homérico,, Telémaco, filho do bravo © hercico Ulisses, determina ‘2 Penélope, cua mae, que “volte para seus aposentos e retome seu préprio trabalho, o tear ea reca...iscursos si coisas de homens, de todos os homens, e meu mais de que qualquer outro, pois meu & 0 poder nesta casa". (BEARD, 2018, p. 18). Eis a sintese da légica patrarcal, que relega & mulher atividades inerentes 2 esfera privada da vida (casa € familia) e, por forga de processos histéricos, dentre eles a Revolugdo Francesa, triunfa ae longo dos séculos,fazendo- se presente até os dias aluais, apesar de todos o¢ avangos civilzatérios que a humanidade tem experimentado, De ‘acordo com PATEMAN (2073, p. 57): [.] 2 maneira em que mulheres e homens sio siluadosde forma diferenciada dentrada vida privada € do mundo publica ¢ (..) uma questio complexa, ‘mas subjacente a uma realidade complicada, ha a renga de que as naturezas das mulheres séo tals que elas sdo devidamente submetidas aos homens @ seu lugar & na esfera doméstica e privads, Os democracy. homens corretamente habitam as duas esferas © tomam as decisées no ambito dela. Naligdo de SABADELL (2017, p. 281) [1 patriarcado indica © predominio de valores masculins, fundamentados em relagées de poder. 0 poder se exerce por meio de complexos mecanismos de controle social que oprimem e marginalizam as mutheres. A dominagae do género feminino pelo masculine costuma ser marcada (e garantida) pela violéncia fisica e/ou psiquica. As mulheres (e as criangas) encontram-se na posigo mais fraca sem meios de reagao efetva No Brasil, cuja génese foi forjada pela légica colonialista, escravagista e eurocéntrica, com tradigio forlemente crista, © patriarcado encontrou terreno férll, de sorte que fem plena século XXI todas as formas de violéncia contra mulher atingem indices alarmantes (VELASCO et al, 2019), vitimando em maior numero as mulheres negras (FBSP; IPEA, 2018), Por consequéncia, a voz das mulheres brasileiras, em regra, pouco tem repercutido nos lugares piblicos de deciséo, inclusive no Poder Judiciario, embora a populagéo seja {formada por 51,6% pessoas do sexo feminino (IBGE, 2018) quando se aprofunda no recorte de raga, os nimeros sao ainda mais clspares. Assim, 0 objetivo desse trabalho é explorar a temética da desigualdade de género € suas interseccionalidades na composigde do Poder Judiciario brasileire, com suas possiveis implicagdes na qualidade da democracia Essa andlise foi desenvolvida em ts momentos. 0 rimeiro trata das estatisticas existentes a respeito do assunto. 0 segundo aborda a importancia da participagao feminina como ferramenta de legitimidade da prestagao Jurisicional e, em altima andlise, da propria democracia, © terceiro compila as iniciativas administrativas para © enfrentamento da questo € menciona exemplos de tratamento constitucional da paridade de género no Poder Judiciiro em outros paises da América Latina, 2 Arealidade das mulheres na magistratura brasileira em niimeros e evidencias Recentemente, 0 Consetho Nacional de Justiga publicou © primeiro Diagnéstico da Participagao Feminina no Poder \Jucieirio, que foi realizado na esteira da Politica Nacional de Incentive a Participagao institucional Feminina no Poder Jusiciéri, Os resultados obtidoe em séries histéricas emonstram que o ndmero de magistradas tem aumentado desde a redemocratizagao de 1988, mas na atualidade totaliza somente o percentual 38,8% de todo © quadro em atividade, Em algumas carreiras (Tribunals Superiore, -Justiga Federal, Justiga Eleitoral e Justia Militar Estadual) 2 patticipacéo feminina encolheu nos utimes 10 anos. (end, 2079) Hoje, nos Tribunais Superiores as mulheres representam 19,05% da composiqéo © nos Tribunals de segunda instancia, 25.7%. Jana base da carreira, qual seja,no cargo de Juiza Substituta, © nimero de mulheres salta para 41.9%. A carreira com 0 maior nimero de magistradas 2 Justiga do Trabalho (com 50,5%), que ja se despontava com 33,8% de seu quadro feminino desde o primeiro levantamento dessa natureza, realizado pela Associagio os Magistrados do Brasil (AMB) em 1996, Na sequéncia, vem a Justiga Estadual, com 37,4% ea Justiga Federal, com 31.2%, Em 2019, a AMB tornou piblico o resultado da pesquisa denominada Quem Somos, a Magistratura que Queremos, segundo a qual: © periodo de maior entrada das mulheres na ‘magistratura se dé entre 1990 2 1999 e entre 2000 & 12009, confirmando atendéncia sugerida pela primeira pesquisa. Nesses dois intervalos de tempo, a& ‘mulheres chegaram a representar,respectivamente, [38% € 41% do total de juizes ingressantes no T° grav da carreira, Nos titimos anos, parém, entre 2010, 2018, 0 percentual de ingresso de mulheres caiu para cerca de 24%, evoluedo também percebida pela recente pesquisa do CNJ (2018). Portanto, no que se refere & tendéncia @ feminizagio, 0 movimento ‘ascensional em flecha que havia sido detectado ha vinte anos, vem perdendo sua forga desde 2010, com excecdo da Justiga do Trabalho, o ndmero de mmagistradas no Brasil est bem abaixo do ndmero de mulheres na populagdo em geral © nos dltimos anos houve decréscimo ou estagnagdo, chamando atencéo fs niimeros incipientes dos Tribunais Superiores © de segunda instancia, de sorte que a magistratura brasileira 6 predominante e verticalmente masculina ou seja, quanto maior © grau de ascendéncia, menor ¢ a participacio de mulheres, Quando se avanca para o recorte de raga, 0 primeiro enso do Poder Judicirio de 2013, levado a efeito pelo Revista CN4, Brasilia, DF, v. 3, n. 2, p. 82-91, jul ONY, demonstra que somente 15.6% dos magistrados magistradas sdo pardos(as) ou pretos(as) €0,1%indigenas. Nimeros semelhantes 80 apontados pela pesquisa da ‘AM (AMB, 2019), Conforme dados obtidos aelo IPEA, em pesquise intitulada Perf Sociodemagratico dos Magistrados Brasileiros, capitaneada também pelo CNJ em 2018, indica que somente 18,2% das magistradas so pardas ou pretas, lenquanto esse segmento na popillagdo em geral éde 49.9% (PEA, 2011), ‘Ademais, a midia tem retratado a realidade do Judicirio “homem braneo tem 38 chances a mais de se tornar desembargador do que uma mulher negra" (FSP, 2019) quanto & historiografi, née foram encontrados dados oficiis sobre quem foi a primeira negra a vestir uma toga no Brasil, Nesse sentido, © caminho das mulheres pardas ce pretas deve ser examinado & luz da interseccionalidade’, pois estio vulneraveis 3s ciscriminagses de género ¢ também de raga’ Mesmo com a abolicio, as mulheres negras ‘continuam enfrentando dificuldades advindas. do legado historice de diseriminagéo © preconceito, situagio que tem reflexo até os dias atuais, em que $40 elas as maiores ocupantes de trabalhos precarizados, mais mal remunerados e sub- representadas. Se o trabalho das mulheres brancas, fra vislo como subsidiério as tarefas exigidas em ‘razi0 da ‘natureza feminina’, mulheres negras nunca puderam dele se distanciar, sem prejuzo também de ‘assumirem as demandas domésticas. (CHAKIAN, 2019, p65) Para SEVERI (2016, p. 86-87) Esses percentuais exprimem a persisténcia de barreiras, muitas delas invisiveis, na carrera da Magistraturs para a progressao das mulheres e para {que elas ocupem posigaes de prestigia ou poder o& ‘chamades tetos de video, com contornas especificos para cada um dos ramos do Poder Judiciéio. Em verdade, séo barreiras invisiveis e invisiblizadas, sendo que 08 niimeros jé apresentados falam por si. Para torné-los mais reais e ilustrativos, vale fazer um breve retrospecto sobre a trajetéria das primeiras mulheres no Poder Judictario brasileiro, que durante muito tempo foi um nicho ocupado exclusivamente por homens. Conforme explcita PINHO (2018, p. 160), Auri Moura Costa foi a primeira juiza e desembargadora do Brasil Ingressou nna magistratura do Estado do Ceara em 1939 e “diz-se que teria se forrado da barreira de género por conta de seu nome: acreditavam tratar-se de um homem", tendo chegado @ Presidéncia do Tribunal Regional Eleitoral do Ceara (TRE-CE). Tempos depois, foi a vez de Thereza Grisélia Tang, primeira aluna da Faculdade de Direto do Rio Grande do Sul e, em 1964, primeira Juiza Substituta no Estado de Santa Catarina, onde também fol pioneira no cargo de Desembargadora no ano de 1975, TDRSS TAI cv agrvad ue ¢ gue perce. tin, ‘ct a ete Baseada te mods conamtnte ens ou mas rs Sip na fe Come nwamenact acna «ta ‘oma eg: pes poles ul sora natn ong nota eel ave crit nano nr od ciel conn on eter gc acres dez. 2019 83 84 No Supreme Tribunal Federal, somente em 14 de dezembro «de 2000, mais de 120 apés sua criaglo, chegou a primeira Ministra, Ellen Gracie Northfieet, que também foia primeira presidente da Corte no biénio 2006/2008 ¢ se aposentou ‘em 2011, Desde entio, das 11 cadeiras, somente mais 2 mulheres ali ingressaram © permanecem em atividade, 4uais sejam, as Ministras Carmen Liicia (posse em 2006 € Presidéncia no biénio 2016/2018) e Rosa Weber (posse em 2011, na vaga deixada pela Ministra Ellen Gracie). So das Ministras Carmen Licia e Rosa Weber as primeiras| atitudes everbalizagdespublicas de epercussaovinculadas as dificuldades de género no ambiente da magistratura, Em 2007, Carmen Lucia foi a primeira magistrada a usar cealga no Supreme Tribunal Federal’ e também a primeira 8 falar sobre as interrupedes praticadas pelos Ministros durante as falas das Ministras nos julgamentos colegiados, prética conhecida mundialmente como maninterrupting, Na ocasido, em 10 de maio de 2017, durante a presidéncia dde uma sessio do Tribunal do Pleno, disse a Ministra Carmen Lica: nfo nos deixam falar, ent nés néo somos interrompidas”, frase que ganhou os noticsrios. or sua vez, a Ministra Rosa Weber, d época em que presidiu © Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi relatora da Consulta 11 0600262-18,2018.6.00,0000 e determinou que: A distribuigdo dos recursos do Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), previsto nos artigos 16-C e 16-D, da Lei das Eleigdes, © do tempo de propaganda eleitoral gratuita no radio ena {eleviséo, egulamentads nos ats. 47 e seguintes do ‘mesmo diploma legal, deve observar os percentuals, minimos de candidature por género, nos termos do art 10,§32 da Lein®9,504/97, nalinha da orientacao firmada na Suprema Corte a0 exame da ADI 5617. No caso de percentual superior de candidaturas,impée. se 0 acréscimo de recursos do FEFC e do tempo de propaganda na mesma proporeso. Tal decisio garantiu, 20 impulsionamento das candidaturas femininas a cargos cletivos menos fermalmente, 0 or outro lado, hi pouco tempo em um tribunal de pequeno porte tomou posse no cargo de Desembargadora uma Juiza de Diteto e o convite de posse emit a respectiva Corte anunciava a solenidade de sua investidura no cargo dde Desembargador. A partir desse curioso fato, foi feita uma rapida pesquisa nos sites das Cortes Superiores ¢ de alguns Tribunals de grande porte’, sendo que das 21 paginas eletronicas oficiais consultadas, com excegdo do Superior Tribunal Militar (STM) e Tribunal Regional do Trabalho da 15* ins rnasclecoraascaoctesheeso Freipoaeretnie na seers face tc degre PESeieeein iene teraaa Sarees ied ee aera sana ES ces hn th pone a fs See eres eee rt ersten Gre tiesto ee chemin tateermntiones mare tesere ts aera pated Shae corte Regido (TRT-15), todas as demais apresentam seu quadro com a designagio de homens © mulheres pelo cargo flexionado unicamente no sexo masculin, ou seja, uizes, Magisirados, Desembargadores ou Ministros. Aliés, pensando na linguagem utilizada pela Constituiggo Federal, no capitulo que ispée sobre o Poder Judicirio, sé constam ai as cargos de Ministro, Desembargador ¢ Juiz. Portanto, na literalidade dos textos normatives e nas pidoriae rotinas adminictrativas empregadas pelo Poder Jludicirio nde costumam exist na magistraturabrasileia cargos coma flexdo feminina e, embora sso possa parecer um detalhe pouco importante e irrelevante na prtica, raz consige um simbolismo eloquente. Expostas tals realidades, importante voltar aos dados ja coletados e sistematizados por érgis oficiais, agora com viés mais qualitativo, Do primeira Censo do Poder Judicirio do CNJ, em 2013, destacam-seos seguintes recortes para fins desse trabalho’ 302% das magistradas responderam ter identificado Feagdes negativas por parte de outros profissionais do sistema de justiga por ser mulher, 86,6% disseram que os concursos da magistratura sdo imparciais com relago as candidatas mulheres; 136% verbalizaram ter mais diffculdades do que os colegas juizes nos processos de promogdo € remogdo na carrera; e 64.5% alegaram ser afetadas em maior medida na vida pessoal que os colegas jules. (CAN, 2013) Por seu turno, a Associaglo dos Juizes Federais do Brasil (AJUFD), via Comissdo AJUFE Mulheres, também realizou estudos e um deles reeultou na Nota Técnica n, 1/2017. No apanhado dessa investigagao, ao responderem sobre os principais motives para a baixa representatividade feminina na Justiga Federal, 99,66% das magistradas disseram ser 8 dupla jornada, 83.88% apontaram a dificuldade em serem acompanhadas por esposos/companhelros quando tém que se mudar em razdo do trabalho e 81,08% trouxeram a maior afetagio da vida pessoal da mulher no exercicio da magistratura quando comparada & dos colegas homens. No tocante 8s promogées na carrera, 81,87% das entrevistadas “entenderam que passam por maiores dificuldaces sobretudo pelos dois fatores de destaque ‘ruptura da_unidade familiar’ e ‘distancia da familia” (AJUFE, 2017, p. 8), Nessa mesma pesquisa, quando o assunto foi a ascensiéo aos Tribunais de segunda instancia: 74,71% das respondentes consideraram que as julzas possuem mais dificuldades (..). As razées mais citadas, dentre as opgdes do. questiondro, foram as de que ‘menos mulheres se candidatam" (6351%), “Desembargadores se identificam com candidates do sexo masculino” (62,97%) e “Juizes ddo sexo masculino costumam ter mentores que faciltam 0 seu acesso 20 Tribunal” (41,08%). Essa percepeio que foi validada quanto & “idenificagao" dos Desembargadores para com julzes homens correspande 0s ssludos internacionals que tunem a perspectiva de género a0 desenho das instituigdes também no aspecto informal das interagdes desenvolvidas. Salientou-se, ainda, que ‘a disparidade nos TAFs evidencia a difculdade de ‘pramoeao na carrera’. Uma calega apinou também (que Tevela-se ainda uma resistencia 8s promosses por merecimento. Para 9 homem muitas vezes basta apresentar um currculo apresentando seu lamplo POTENCIAL. A mulher tem que provar seu DESEMPENIHO excelente, Por sua vez, a Escola Nacional da Magistratura do Trabalho (ENAMAT), por intermédio da Comissio de Estudos para Incentivo a ParticipagioInstitucional Feminina,publicouem mmaio de 2019 0 levantamento denominado Dificuldades na Carreira da Magistrada, que trouxe dados surpreendentes, Dentre eles, mais da metade disse ja ter sido discriminada rho ambiente de trabalho em tazdo de ger mulher, as mais ovas em maior numero, tendo come arincipais agentes causadores advogados (quase 80%),partes ou testemunhas homens (47.6%) e colegas magistrados (47.6%), esses Uikimos em maior propercionalidade nas respostas de Desembargadoras e Ministras, Das magistradas agredidas no exercicio do cargo, 43% ndo tomaram atitude alguma. No tocante & movimentagdo na carreira, 30% acreditam haver desigualdade nas oportunidaces em comparagio 408 colegas homens e 1/3 declarou ja ter sido vitima de Violéncia fisica ou sexual em algum momento da vida Esses dados, em grande parte, validam a hipstese de que ‘2 maneira encontrada pelas magistradas para conciliarem as demandas de ordem pessoal e profissional ocorre em prejuizo da ascensao na carrera, a qual, como sabido, implica geralmente em mudangas periédicas de domictio © atividades que extrapolam a fun¢éo jurisdicional, como, por ‘exemple, partcipago em cursos e bom transite na cipula, © que provavelmente acaba por estabelecer a barteira invsivel ou “teto de vidro” ja falado anteriormente. Portanto, no caso das magistradas, épossivel cogitar que 2 transposigio da vida doméstica para a esfera publica também encontra séros limites na perversa divisdo sexual do trabalho vigente em sociedades patriarcais como a brasileira Acerca do assunto, pesquisa do Instituto de Pesquisas Econémicas Aplicadas (IPEA) de 2018 revelou que as mulheres dedicam em média 18h @ mais pot semana nas lides domésticas em comparagao aos homens, concluindo também que “para as mulheres, aestrutura familiarimpacta negativamente nas suas horas decicadas a0 trabalho remunerado, enquanto que, para os homens, esse impacto € positivo", jé que no universo feminino © casamento representa 2h a menos de trabalho remunerado por dia © a existéncia de fihos, 6h, © por dbvio as magistradas brasileiras parecem nao escapar dessa realidade. (IPEA, 2018), Em 2011, em Retratos das Desigualdades de Genero de Raga, foi constatado que 0 conjunto de dados sobre 0 uso do tempe indica que a atribuigao permanente do trabalho domestico ‘3s mulheres, além de reservar a elas 0 reina da case, representa uma sobrecarga de trabalho que elas terdo de considerar se escolherem, ou necessitarem, twabathar fora de suas casas. Trata-se, assim, de uma atribuigéo determinante no destino da vida social de homens e mulheres, ((PEA, 2011) ‘Como bem adverte PORTO (2019, p. 6-9} Embora as mulheres na perspectiva quantitativa,ndo sejam minora, porque, afinal de contas,representam Revista CN4, Brasilia, DF, v. 3, n. 2, p. 82-91, jul ‘metade da populacio, assim podem serconsideradas porque a configuragéo dicotémica entre publice- ‘masculino-visivel e privado-feminino-visivel ainda ‘representa bloqueios para 0 estabelecimento profissional" e “mesmo mulheres em posigses de poder sentem os reflexas de uma desigualdade ‘que vem colocada em termes de uma diferenciagao ‘Social e de papéis de érdua reformulagdo. Nesse aspecto, na sociedade brasileira de hoje, a forma como a carreira da magistratura se inicia, movimenta ascende parece ser 0 maior empecitho pata as mulheres. 3A participago feminina como pressuposto de legitimidade da prestagio jurisdicional Palavras coma a de Telémaco em Odisséia - no sentido de ue 0 discurse pablico é um menepélio masculine ~jé vem sendo desconstruidas ha algum tempo, apesar da forca ue tiveram para sustentar 0 patriarcado nesses mais de 3 mil anos. Ccontudo, éimportante lembrar que, na esteira do defendido por PINHO (2018, p.152),aausénc'a da mulher nos espagos; piblicos de poder faz com ela fique: Aprisionada a uma circularidade de causas € ‘efeitos e submetida a_um sistema normativo

You might also like