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Colegao Educagiio Contempordnea Esta colegio abrange trabalhos que abordam 0 problema educa ino de uma perspectiva tica, A educagio € considerada de dependéncia. Divulga propostas de acio edagégica coerentes ¢ instrumentos teéricos e ago da sociedade brasileira, Conheca mais obras desta colegdo, € 0s mais relevantes autores da érea, no nosso site: wwwaautoresassociados.com.br 0 Legado Educacional do Século XX no Brasil Dermeval Saviani Jane Soares de Almeida Rosa Fatima de Souza Vera Teresa Valdemarin 3 Edigéo Campinas aurones associabos Copyright © 2014 by Editora Autores Associados Ltda. lest digo reservados Eitora Autres Asociados Luda, Dados Internacionas de Catalogaco na Publicasao (CIP) Sumario (Camara Brasileira do LivrSP, Brasil) Preficio d 3° edigd0.......6ccseeeseeeseeeees vii Dermeval Sa Preficio a 2* Dermeval Saviani ‘edigio. Preficio a Dermeval Saviani Apresentagio. . ae eee © Legado Educacional do Século XX Jane Soares de Almeida 9 scot 2. A escola piiblica brasil se 2t 3. Conclusio ae ee eM 55 6 2. A educacio feminina e a formagio profissional no século XX ... 65 3. De rainha do lar a educadora da infancia: missao, vocagio e destino a 4. A radigio e 0s perigos dos novos tempos... ee 5. Homens e mulheres: igualdade humana e desigualdade 50 Ae. 88 6, Consideragoes finais. 96 O Legado Educacional do “Longo Século XxX” Bras Dermeval Saviani \ ‘emérito da Unicawo, pesquisador emérito do CNPq, coordenador geral do Grupo Nacional de Estudos ¢ Pesquisas Histeosn € professor titular colaborador leno dda Pés-Graduacao em Educacaa da Unica curso A categoria “século” para datar e demarcar os acontecimen- ores, especialmente quando o objeto de estudo incide sobre as épocas moderna e contemporiea. Assim é, também, no campo da hist6ria da ceducagio. Sem aprofundar essa questo, apenas a guisa de ilustrago, mencio- no o livro de Luzuriaga (1959), Hist6ria da educagio piiblica, em que ele se refere a “educagdo publica rligiosa” que teria predominado nos séculos XVI ‘eXVI, sendo sucedida pela “educacio publica estatal” no século XVIII, que teria dado lugar a “educacio piblica nacional” no século XIX, culminando com a “educagdo piblica democratica” no século XX. Igualmente no Historia da educagdo e da pedagogia, © mesmo Luzuriaga (1973) distribu © conteiido em vinte capitulos tratando da educagio primitiva, oriental, ‘grega, romana, medieval, humanista e religiosa, mas, a partir dai, introduz a categoria “século” abordando a educagio ea pedagogia nos séculos XVII, XVIII, XIX e XX. O mesmo procedimento ¢ adotado por Manacorda (1989) no livro Histéria da educagdo: da Antiguidade aos nossos dias. Apés estudar ‘a educagio no antigo Egito, na Grécia, em Roma, na Alta e na Bai Média, passa a tratar da educacio no “trezentos e no quatrocentos” (séculos pas XIl e XIII), “no quinhentos e no seiscentos’, “no setecentos’, “no oitocen tos’, para chegar, finalmente, ao capitulo X, que versa sobre “o nosso século em diregio ao ano dois mi ‘Um iiltimo exemplo: Franco Cambi (1999), Historia da pedagogia. © livro esti dividido em quatro partes. A primeira trata da educagao no “mundo antigo” ea segunda versa sobre a edueagio na ‘época medieval” fina terceira parte, que trata da época moderna, apds © primeiro capitulo versando sobre “as caracteristicas da educagdo moderna’, O legado educacional da século XX no Brasil sucedem-se quatro capitulos que abordam, 7 » Fespectivamente, os séculos XV, ’ XVI e XVII. Finalmente quarta parte aborda os séculos XIX « X 08 séculos XIX e XX, O século XX, mesmo antes de seu término cronologi de andlises que procuravam apreendé. lor sptnemen secon tn Ambas foram publiadasna Inglaterra em 1954, 0 9% de efetuar um balango de sua trajetéria e resp to chamam a a fio duas obras ¢ cujos tradizem, Trata-se de Era dos extremos: o brev Eric Hobsbawm (1995), Hobsbawm toma como eixo de sua an: oe lise a questio politica a luz breve" em contraposicao ao “longo século lugdes (1789- 1875-1914). Por ‘sua vez, no “breve século XX” Nt : ronamento’, da instabilidade e d: init Diferentemente, ; wit “desmo- 7 Arrighi toma como eixo de sua anilise a problemé- Sua motivagao inicial era compreender a crise mundial da década de 1970. Os primeiros estudos levaram-no eae a situar essa crise ‘et capitalisme, Arrighi concei ‘Om 0 ultimo de quatro séculos longos, estrutu- inte, do desenvolvimento do mod: © “longo século XX" *e rados de forma sem: cada qual constituindo uma etapa especitica lerno sistema capitalista mundial” (Arricri, (0 legado educacional do “longo século XX" brasileiro 8 1996, px). Com isto, chegou & conclusio que a anilise comparativa desses “séculos longos” traria “mais revelagdes sobre a dinamica e 0 provivel ¢ aprofundada do longo ddesfecho futuro da crise atual do que uma andl século XX como tal” (idem, ibidem). Os “quatro séculos longos” referidos abrangeriam seis séculos cronolégicos, cobrindo toda a evolugao do si tema capitalista, de suas origens ao momento atual, abarcando os ciclos de acumulagio genovés (do século XV a0 inicio do XVII), holandés (do fim do século XVI a quase todo o XVIII), inglés (da segunda metade do século XVIII até o inicio do XX) e norte-americano (dos anos de 1870 até os dias atuais). Vé-se, assim, que os quatro “séculos longos” se superpiem cronologicamente em suas fases iniciais efinais, Quando voltamos os olhos para a situagio brasileira, parece-me que a ideia de um “longo século XX” nao deixa de exercer uma certa atragao. Com feito, as transformagées mais decisivas do nosso pais nos planos econémico, cultural e educacional parecem situar-se nas duas décadas finais do século definido cronologicamente pelo nimero XIX e nio na vi- rada cronolégica para o século XX ou na Primeira Guerra Mundial. Assim, ‘se optissemos pela categoria “breve século”, teriamos de deslocar o inicio do século XX brasileiro para 1930, Mas a explicagio desse marco inaugural nos obrigaria a recuar aos anos de 1880, pois é nesse momento que foram. gestadlas as condigSes que desembocaram nas transformagées condensadas na expresso “Revolugdo de 1930": Sendo, vejamos. imo quartel do século XIX a cul- Do ponto de vista econdmico, no tura do café consolidou-se como, se nao o dinico (monocultura), o principal produto de exportagio: “a produgao brasileira, que havia aumentado de 3,7, jes de sacas (de 60kg) em 1880-1881 para 5,5 em 1890-1891, alcangaria em 1901-1902 16,3 milhes” (FURTADO, 1982, p. 177). Beneficiado pelos altos precos e pela situasio de quase monopélio de que usufruia o pais no mercado internacional, 0 café propiciou um alto grau de capitalizaio que, com a crise mundial do final dos anos de 1920, foi o fator bisico da indus- (© legado educacional do século XX no Brasil s40 do pais segundo o modelo de “substtuisao de importagdes” que ‘marca a nova fase inaugurada com a Revolugio de 1930, Peloaspecto social, as transformasdes mais significaivay também datam do final do século XIX: a Abolisio da escravatura em 1888, 0 incremento da iiisrasio que passou, apenas no estado de Sio Paulo, de 13 m, imigrantes AuroPeus nos anos de 1870 “para 184 mil no decénio seguinte e609 mil no ultimo decénio do século” (idem, p. 128) © 0 surgimento, também nas duas explor: ag, Sos ablicos” es “nascente grupos indusriais"(dem,p 172) No ambito politico assinala. se a queda da Monarquia ea instalacio do regime republican em 1889 Quanto 20 aspecto cultural, vale o registro, tantas vezes lembrado, do depoimento de Silvio Romero, para quem “em bando de ideias no- ‘as esvoagou sobre nés de todos os pontos do horiz evolucionismo, darwinismo, ¢ Positivismo, ica religiosa, nat 1, bossia.€ no romance, folclore, novos processos de critica de historia literdria, transformacio da intuigio do Dire 2002, p. 166). Foi esse 0 € da politica” (apud Bost, ral que marcou as trés tiltimas décadas © Problema da ingeréncia dos militares nos assuntos politicos; em termos Beruis, os temas comuns a todos os paises eram: “a ema ipacio da mulher, da riquera” (Precio, 1997, p, 303), #m suma, os anos de 1880 e 1890 marcaram uma “tomada de consciéncia ademocracia, o trabalho, a distribui (0 legado educacional do “Tongo século XX" brasileiro por uma pléiade de escritores que realista” (Idem, p. 251) protagonizada p pl mereceram de Alceu Amoroso Lima a seguinte observagio: Poucas vezes o Brasil teré na ribalta uma geragioliteréria co 1 com os nomes de Machado de Assis, Rui Barbosa, Mendonca, Capist ‘geragio que fundou a Academia, agado, a educagio sera fncia com o quadro anteriormente trag: es ‘cujo marco inicial mnsiderada, neste texto, no ambito do “longo século X) € dado pelo ano de 1890. 1. PARA UMA HISTORIA DA ESCOLA PUBLICA NO BRASIL, Pa ides com que nos defrontamos se refere A periodizagac bans i : uma exigéncia inerente a investigacao historica, é um lexos ¢ controvertidos da historiografia, ja que no eee tedrica que o historia. 10 fendmeno pet ‘ Soe Ot od pied en reer opin prmien r fi ui em presidir a periodizagao? Esses ado Qua os reris que deer ote ternos ou externos ao objeto investigado? critérios devem se Na historia da educagio brasi ‘guiava-se pelo parametro te adotada, em consonincia com satel abordando-se, em consequéncia, a educagao no periodo c pol : PBs aicisueta er m, num primeiro momen- As criticas a essa forma de periodizar levaram, = a 10, a0 critério da determinagao econdmica, considerando, g' legado educacional do século XX no Brasil Perlodos “sgririo exportador dependente’, “nacional desenvolvimentista de isio de importagdes” e “internaciona- Naso do mercado interno" como os marcos a partic dos industrializagio com base na subs quais se deveria compreender ahistéria da educagao brasileira, Exemplo dessa tentativa é 0 'Wwro de Maria Luisa Santos Ribeiro (1996), Historia da educagdobrasleins 4 organizagao escolar. Também Otaiza de Oliveira Romaneli (1978), em Hist6ria da educagao no Brasil (1930/1973), incorpora essa preocupacio ao {rabalhar com o conceito de “educacio para o desenvolvimento" em queas 'cessidades do desenvolvimento” sparecem determinadas pela “expansio Sconémica (p. 26). Embora se tenha passado do ambito politico ao émbito Sconémico,continuava a prevalecer 0 critério externo a0 abjetoestudado, Num segundo momento, que ainda esta em curso, desenvolve-se uma tendéncia a se buscar uma periodizacao centrada nio os aspectos externas, ‘mas naqueles internos ao processo educativo, S¢ nos guiarmos peto critério interno, poderlamos considerar como Mateo inicial da histéria da educacio brasileira a chegada dos jesuitas em 1549. Tem inicio ai o primeiro periodo, ue se estende até 1759, quando + esultas foram expulsos por Pombal. O ensino esuitaentéo implantado, Jf que contava com incentivo e subsidio da Coroa portuguesa, nossa versio da “educagio pablica Entretanto, se 0 e1 igiosa’ 10 entdo ministrado pelos je Considerado como pablico por ser mantido com recursos pi seu carater de ensino coletivo, 8 podia ser \licos € pelo ele ndo preenchia os demais crtérios, jé ‘ue as condigdes tanto materiais como pedagégicas, isto é 08 prédios assim como sua infraestrutura, sgentes, as diretrizes pedagégicas, os Somponentes curriculares, as normas disciplinares e 08 mecanismos de avaliasao se encontravam sob controle da ordem dos jesuitas, portanto, sob dominio privado, ( legado educacional do Tongo século XX" brasileiro Por sua ver, o periodo seguinte (pedagogia pombalina: 1759-1827) yond primeiros ensaios para se instituir uma escola piblica corresponderia aos prim oil estatal, Pelo Alvard de 28 de junho de 1759, determinou-se o fech “ ” a serem mantidas dos colégios jesuitas, introduzindo-se as “Aulas Régias! anti pela Coroa, para o que foi instituido em 1772 0 “subsidi a ' eae ‘io do professor ¢ as diretrizes jo sal jo Estado se limitava ao pagamento d ae indo a cargo do proprio professor inada, dei iriculares da matéria a ser ensinada, ou a ao local, geralmente sua propria io das condigdes materiais r an redagégicos a serem casa, € 8 sua infraestrutura, assim como aos recursos pedagég izados no desenvolvimento do ensino. Apos a Proclamagao da Independéncia em 1822, uma escola piblica poderia ter decorrido da aprovagao da Lei das Eset i 10 Adicional de ras Letras, de 1827, mas isso acabou no acontecendo. O Ato A 6 de Primei 834 is escolas primarias e secundirias sob a responsabilidade das c marias e secundarias 1834 colocou as escolas pr enh |. a um projeto de escola pil ncias, renunciando, ass ia i tizando, ee jonamento de escolas que, por via legal, os ‘mecanismos de criaglo, organizagao ¢ f esse aspecto, adquiriam 0 cariter de instrugao publica. Mas, de fato, essas saber, as proprias escolas continuavam funcionando em espacos privados, a saber, as prop 1s dos professores, ; Hee ainda que sob a égide dos Wento da Repal Foi somente com 0 advent a tados federados, que a escola publica, entendida em sentido proprio, fers ra, Com efeito, ¢ a partir dai que 0 presente na historia da educagao brasil pasiealian poder piblico assume a tarefa de organizar e manter integralm tendo como objetivo a difusdo do ensino a toda a populagio. Essa tarefa 8 ( legado educacional do século XX no Brasil De fato, no ambito dos estados.a tentat ‘mais avangada em diregao a um sistema orginico de educagdo no inicio do regime republicano foi aguela que ‘se deu no estado de Sio Paulo. Ali se procurou preencher os requisites bisicos mplicados na organizagao dos servigos educacionais na forma de sistema: 4) organizagio administrativa e pedagégica do sistema como um todo, o que implicava a criagdo de rgios centrais e de formulacao das diretrizes e normas pedagSgicas bem como de inspegio, controle e coordenagao das at idadles educativas; b) construcio ou aquisigio de prédios espe. como escolas; icos para funcionar ©) dotacio ¢ manutengio nesses prédios de toda a infraestrutura necesséria para o adequado funcionamento do igdo de um corpo de agentes, com destaque para os pro- fessores, definindo-se as exigéncias de formacao, os itérios de -agdo das fungoes a serem desempenhadas; ©) definigio das diretrizes pedagogicas, dos compon res, das normas discip! ’s curricula. ares e dos mecanismos de avaliagao das tunidades e do sistema de ensino em seu conjunto; £) organizasio das escolas na forma de grupos escolares, superando, Por esse meio, a fase das cadeiras e classes isoladas, 0 que im- Plicava a dosagem ¢ graduasio dos conteidos distribuidos por séries anuais e trabalhados por um corpo relativamente amplo de professores que se encarregavam do ensino de grande niimero de alunos, emergindo, assim, a questio da coordenacio dessas atividades também no ambito das unidades escolares. Ora, a reforma da instrusao piblica paul rentada entre 1890 € 1896, pioneira na organizagio io na forma de grupos (© legado educacional do “longo século XX’ brasileiro 19 escolares, procurou preencher os requisitos apontados. Tratava-se de uma reforma geral que instituiu o Conselho Superior da Instrugio Publ Diretoria Geral e os inspetores de distrito, abrangendo os ensinos primétio, normal, secundério e superior (Rets Fito, 1995, p. 90-202). Embora essa reforma paulista nao tenha chegado a se consolidar, a tendéncia que ela representava acabou por se impor, tornando-se referéncia para os demais estados ao longo da Primeira Repiiblica. io da Logo apés a vitéria da Revolugio de 1930, foi criado o Mi Educagio e Satide Publica, A educacio comecava a ser reconhecida, inclusive como uma questo nacional. Na sequénci no plano inst ivemos uma série de medidas relativas educagio, de alcance nacional: em 1931, as, reformas do ministro Francisco Campos; em 1932, 0 Manifesto dos Pioneiros da Educagio Nova, dirigido ao povo e ao governo, que apontava na diregio igdo de 1934, da construgdo de um sistema nacional de educagio; a Cons que colocava a exigéncia de fixagao das diretrizes da educagio nacional e claboragio de um plano nacional de educacio; as “leis orginicas do ensi ade um conjunto de reformas promulgadas entre 1942 ¢ 1946 por ini Gustavo Capanema, ministro da Educagio do Estado Novo, Em consequéncia da Constituigao de 1946, que determinou 4 Uniao |, formulou-se, a tarefa de fixar as diretrizes e bases da educaga des, veio a converter-se ‘em 1947, um projeto que, apés diversas vicissi na Lei de Diretrizes e Bases da Fducagao Nacional, promulgada em 20 de jue sofreu modificagdes substantivas em 1968 de 1996. Aluz dosel da histéria da escola pablica no B das investigagdes a ser, portanto, corti como hipétese de trabalho orientadora ida e aperfeicoada por sages. Nessa proposta de periodizagdo, que antecipet em trabalho AVIAN, 2003), distingui duas grandes etapas. A primeira seria 20 (© legado educacional da século Xx no Bras definida como “os antecedentes” e a segunda como a “histéria da escola publica propriamente dita’ A primeira etapa compreenderia trés periodos: o primeiro (1549. 1759) corresponderia i pedagogia jesuitica, isto é a escola pila religiosa entendida em sentido amplo; o segundo (1759-1827) estaria representado pelas “Aulas Régi instituidas pela reforma pombalina, enquanto uma primeira tent de se instaurar uma escola publica estatal inspirada nas ideias iluministas, segundo a estratégia do despotismo esclarecido; ¢ 0 ter-

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