FRANCISCO MANUEL DA SILVA
E
SEU TEMPO
Capa do STUDIO GRAFA reproduzindo
parte de uma gravura de J. Arnout, onde
se vé, no primeiro plano, a Capela Imperial
(campanario e igreja) e, no segundo, a
Igreja do Carmo.
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1967CAPITULO XV
De 1831 a 1865. — Os concertos. — Descentralizagio
da vida musical. — Fogem os artistas do ambiente perigeso
em que se havia transformado o teatro. — Academias musi-
cais em salas improvisadas. — Pela primeira vez uma aber-
tura sinfénica de Beethoven. — Violinistas estrangeiros. —
O violinista que tirava as cordas do instrumento diante do
ptblico. — O Pao de Aciicar inspira uma valsa. — Camillo
Sivori. — O aluno de Paganini imita no violino o vAssaro
cubano. — Incidente em seu concérto de despedida. — En-
teada de Francisco Manuel, de seu camarote, entrega-lhe me-
dalha apesar de proibico da policia. — Outros violinistas
estrangeiros.e nacionais. — Os pianistas. — Quando pela
primeira vez o Rio de Janeiro ouviu uma pega de Liszt. —
Thalberg. — A chegada do grande pianista e 0 cronista bem
humorado. — Importancia cultural da visita de Thalberg,
— Seus concertos. — Um passeio As margens do Paraiba.
— José de Alencar e o terceto cémico do padre Martini. —
Outros instrumentistas. — Machado de Assis e 0 violonce-
lista alemio. — Movimento associativo. — A Casa de Buile
do Catete e a Assembléia Estrangeira. — Um concérto sin-
fénico em 1839. — Abolida a separacéio entre senhoras e
cavalheiros nas salas de concertos. — Pela primeira vez exe-
cutada no Rio de Janeiro uma sinfonia de Beethoven. — A
Sociedade Musical Campesina. — O comércio de miisicas e
instrumentos. — Os primeiros livros diddticos de Francisco
Manuel. — Publicagiio de misicas em série. — Ganha vulto
— Relagio das publicacdes de tal natureza entre
iginalidade de um epitafio: 0 Album de
Armia. — Importacio de pianos. — O primeiro piano fabri-
cado no Rio de Janeiro. — Instrumentos exéticos: o piano-
toucador e o piano divisivel. — Fundada a primeira biblio-
teca musical de aluguel. — Sucesso da iniciativa.A partir de 1831 observa-se na vida musical da cidade
como que uma tendéncia para a descentralizagio. Jé nao é
86 nos teatros, nos intervalos das representagées, que agora
se exibem os cantores e instrumentistas, como faziam até
ent&o, mas um pouco por téda parte, onde quer que encon-
trem espaco suficiente para reunir um auditério.
Teré influido nisso o ambiente de agitagdo que se esta-
belecera na cidade em seguida & abdicacio de D. Pedro I,
transformando a sala do S. Pedro de Alcantara em arena
para onde convergiam, nas noites de espetaculo, as hostes be-
licosas das facgées politicas, afugentando aquéles que 14 iam
em busca apenas de divertimento?
# possivel. Mas o que é certo é que os concertos — as
academias como ent&éo eram chamados — comecam a reali-
zar-se em locais onde jamais se pensara poder reunir gente
para fazé-la ouvir misica.
Em 1832 houve uma Grande Academia de Misica Ins-
trumental na casa n° 6 da Praca da Constituigao, promovida
pelos franceses Barré, pianista, e Courtin, violinista, cujo
programa comportava, além do Quinteto de Kalkbrenner, pe-
¢as de Herz para piano e de Lafont para violino, tudo novo
para o Rio de Janeiro.
No mesmo ano, a casa n? 82 da rua da Quitanda foi es-
colhida por outro francés, o flautista Pierre Laforge para
uma Academia, em que éle se exibiu com outros artistas. La-
forge ja estava no Rio de Janeiro desde 1816. Era um vete-
rano da vida musical da cidade.
Por vézes, désses deslocamentos dos artistas participava
a misica sinfénica. Mas cra raro. Esta habitualmente nao
saia do teatro. Musica sinfénica, naquele tempo, limitava-se
a existir téo sdmente na abertura e nos intervalos das repre-
sentacées dramiaticas. Era mais uma adverténcia ao ptblico
para que viesse ocupar na sala os seus lugares, do que misi-
ca destinada a ser ouvida.
227Passando aos violoncelistas estrangeiros que vieram ao
Rio de Janeiro no perfodo 1830-1865, s6 em 1851 € que sur-
giram os primeiros; Domenico Labocetta e Giuseppe Martini.
Na verdade, nem um, nem outro, faziam do violoncelo
profissio. O primeiro era tenor e o segundo contrabaixista.
Vieram ambos contratados para o Teatro Provisério. Mas
eram, tanto um, como o outro, excelentes violoncelistas, a jul-
gar pela freqiiéncia com que os convidavam para tomar parte
em concertos com os seus violoncelos.
Em 1860 chegou o alemio Max Bohrer. Outro alemio,
Carl Werner, despertava grandes entusiasmos em 1864. Ma-
chado de Assis, pelas colunas do Didério do Rio de Janeiro,
joga-lhe flores: Um dos principis asswntos é, sem contesta-
, 0 concérto do violoncelista Carl Werner, que se efe-
tuou sexta-feira, no Gindsio, diante de um. publico escothido,
A imprensa do risco para cima jé féz plena justiga ao talento
do Sr. Werner. 1 realmente um artista de primeira ordem e
honra o nome do artista de quem é discipulo. Parece ineriveb
que de wm instrumento como o violoncelo se possa tirar sons
tao delicados e¢ téo limpidos, cantar com tanto sentimento e
tanta melodia... Nas méos de um artista como aquéle 0 vio-
loncelo é um milagre.
Poucos foram também os violoncelistas nacionais que no
mesmo perfodo se fizeram ouvir em concertos.
Cabe apontar, em primeiro lugar, José Policarpo de Fa-
ria Beltraio, um remanescente dos tempos em que chegava 20
Brasil a cérte portuguésa.
Francisco Duarte Bracarense era outro cujo nome cons-
tantemente aparecia nos jornais. Um artista a quem José de
Alencar, certa vez, féz rasgados elogios em um de seus folhe-
tins, foi o baiano Casimiro Liicio de Souza Pitanga.
Os flautistas, éstes, existiam em relativa abundancia. A
flauta, desde logo, gozou de franca predilecio no Brasil. Ge-
neralizada foi a sua aceitacio. Seu prestigio tanto se fazia
sentir nas ruas como nos salées.
Ja no tempo de D, Joao VI havia no Rio de Janeiro um
flautista de renome, embora fésse éle amador, de nome Silva
Conde, que Balbi cita (ver cap. III) e que era médico de
profissio.
Depois, j4 em meados do século, representantes de esco-
las estrangeiras vieram engrossar a equipe dos flautistas, en-
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