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HistOriA ANA RIA. taajelotia de ume doifiina PIRITISMO CHICO XAVIER O médium que psicografou mais de 400 livros e fez do Brasil a maior nacao espfrita do mundo HisTORIA “Ghosaears Dosa Kstamos neste mundo para aprender Confesso que nao sabia quase nada sobre espiritismo até entrarno projeto desta edicao especial, Acho queaté cultivava certo preconceito, Médiuns incorporando espfritos, recebendo mensagens doalém...Cok sas desse tipo sempremepareceram demasiadamente baixo-astral. A, comecei aestudar oassunto, Pesquisa daqui, conversa dali... Acabei me surpreendendo com aquilo que ful descobrindo. Ashist6riasportrés dos fatos que marcam atrajetéria da doutrina es- pitita sao fascinantes. Eos personagens dessas historias, maisfascinantes ainda, Refiro-mea gente como o sueco Emanuel Swedenborg, do qual ‘munca tinha ouvido falar—ele foi oprecursordo espiritismomodernona Europa, Sobre Allan Kardec, o fandadordomovimento,evatésabiaalgu- ‘ma coisa. Mesma coisa para Bezerra de Menezes, o homem que definiu acarado espiritismo brasileiro. Até sobre omédium Chico Xavier meu conhecimento era precéirio—justo sobre ele, queagoraesté em evidéncia por causa das comemoracGes de seu centendrio de nascimento. ‘Como pude ignorar por tanto tempo historias e personagens to bacanas? Se voeé esti se fazendo amesma pergunta, pode relaxar: 0 especial queagoraestéiem suasmiéosvaltesolver problema. Surpreenda- -se, assim como eu, comasinformacSes reunidas aqui. Afinal, todosnés estamosneste mundo para evoluir—e aprender sobre os mistérios da vida e da morte. Boa leitura, EDUARDO LNA, EDITOR 14 André Luiz i pests tatena do Flamengo na ditima encarnacao 24 Origem ‘Blementas da doutrina observados {j desde aldade da Pedra Lascada 22 Swedenborg ‘mortalmuto ania de Allan Kardee 34 Irmas Fox Os enmersmeninos ae ian 40 Allan Kardec (0 codificador da doutrina foi um pedagogo francés com pseudonimo de druida 48 Investigacgoes (Os cientistas que pesquisaram médiuns eaeabaram se convertendo 56 Conan Doyle ‘Ocriador do detetive Sherlock ‘Holmes; fel soldado do espiritisimo 7 . Harry Houdini 18 Respostas Havin eet arenas aebeae Faia rade 60 Brasil 74 Tomos % Quando desembareou por aqui, Os livros fundamentais, escritos pelos Sect ea nesses ease Soe oan 66 Bezerra de Menezes Ohomem que determinou qual seria Seatac anes 70 Desdobramentos ‘As euriosas ramifieagoes do espiritismo que proliferaram no Brasil = Ele foi o homem mais importante do espiritismo enquanto viveu; psicografou mais de 400 livros, ditados por almas desencarnadas; e transformou o Brasil na maior nacao espirita do mundo hico Xavier > PORCARLA SOARES MARTIN EEDUARDO LIMA DESIGN MICHELE KANASHIRO_ILUSTRAAO CAVANI ROSAS EMURILO MACIEL CALIGRAPIA ANDREA BRANCO uatrocentose doze livros. Quem, numa \inica vida, conse- guiria escrever tanto? O mineiro Francisco Candido Xavier, ou simplesmente Chico Xavier, con- seguiu, Ele afirmavater psicogra- fado — ou sefa, recebido e trans- crito mensagens enviadas por mais de 2mil espiritos. Napratica, passou a vida inteira conversando com os mortos. Escreveu um Livro atrdsdo outro, ou varios aomesmo tempo, néo para ganhar dinheiro — J que sempre doou os direitos autorais a associagdes espfritas ouinstitnigdes de earidade-, mas para provar uma maxima do espi- ritismo: nossa alma ¢ imortal. E acabou convencendo um néimero incaleulivel de pessoas ao longo de seus 92 anos. Se hoje o Brasil 6 considerado a maior nagio es- pirita do mundo, com quase 2,5 milhdes de adeptos e cerca de 30 milhdes de simpatizantes, isso se deve, em boa parte, ao trabalho de divulgagaio executado por Chi- ‘co—ohomem maisimportante da doutrina espirita mundial enquan- to viveu, até junho de 2002. Se ainda fosse vivo, Chico Xavier estaria completando 100 anos. Filho de pais analfabetos, nasceu no dia 2 de abril de 1910, na pequena cidade de Pedro Leo- poldo (MG), 35 quilémetros ao norte de Belo Horizonte. Foi cri do na fé catélica. E teve uma in- fancia, no ménimo, incomum: en- quanto as outras criangas brincavam, ele recebia mensagens, doalém. “Uma noite, seu pai (Jodo Céndido Xavier] conversavacom a mulher, Maria Joao de Deus, sobre 0 aborto sofrido por uma vizinha, e desancava a moga’, conta 0 jornalista Marcel Souto Maior, autorda biografia As Vidas de Chico Xavier Pianeta).“Ofilho interrompeu o julgamento e, do alto de seus 4 anos, proferiu a sentenga: Osenhor esti desinfor- 3+ Se Francisco Candido Xavier (1910-2002): ‘uma via itera conversando com os mortos } mado. © que houve foi um proble- made nidagio inadequada do ovo, de modo que a crianga adquiriu posigio ectépica.” Quando Maria Joao morreu, em 1915, Chico tinhaapenas5 anos —€ a suposta comunicagao com espfritos, que jéerainerivelmente precoce, tornou-se ainda mais intensa. Amadrinha, responsdvel pelo garoto na auséneia da mae, dava-lhe surras com vara de mar- melo, irritada com as visitas que aquele “menino esquisito” afirma- va receber. “Esse moleque tem 0 Diabono corpo!” ela berrava. Hoje, os espiritas nado tém diivida quan- toanatureza daqueles fenémenos: Chico Xavier era um médium nato, que iéveio ao mundo como poder damediunidade. E mais. Teria sido ‘umespirito evolufdo, daqueles que ico sicoyratando: leeseeia nem precisam reencarnar para ‘com uma ylocidade impressonamte__chegar A perfeigio, PARNASO DE ALEM-TOMULO Enmanuet a ovr da estreia de chico Xavier. arias dissertacbes de Emmanuel 7 Bibli ti ‘Trata-se de uma antologia com 259 sobre ciéncia e religido foram reunidas ] eas psiayalads de 6 autores, anu O guia esprit de Chico Xavier Z 0 eca tanto brasileiras (como Castro Alves: defende neste livro a comunhao de basica « Olao Bla) quanto portuueses Conhecimento entice relgiosa {snter de Queta ere outs) que ohomem, para chesarao Algumas obras de Chico ‘Nem todos os poemas entraram nas. -estagio de ser racional, passou por i A i ne ‘vrias edigBes que a obra vrios estagios “animais® a os ‘eve Oespiito Emmanuel ‘ase (@rgumento caramente ee tera otentad o medium = eoluconsta também Alan Kardee naescatha priotiando aman! veticado nas obras os de tematica espiritual de allan Karded) Proteins c1cho: 1922 f Prue eD1cko: 838, ‘ito que dow: Vs poetas ite qu dau: Emmanuel 4G; eezo mals recente: 2002 1 Feito als recone: 2008 Foi aos 17 anos, em 1927, que Chico comegouacolocar no papel as supostas mensagens espirituais. Quatro anos mais tarde, segundo o médium, uma alma desenear- nada veio & Terra especialmente para Ihe entregar uma missio: eserever livros e divulgar o espi- ritismo, Seu nome era Emmanuel — representante do Império Ro- mano numa de suas encaragoes anteriores, vida na qual teria até conhecido Jesus Cristo. Nas pa- Iavras do espfrito, as obras psico- grafadas por Chico Xavierseriam “a chuva que fertiliza lavouras imensas, alcangando milhares de almas’. Dali em diante, Emmanuel seria seu mentor espiritual. E di- taria dezenas de livros ao longo das décadas seguintes. Oprimeiro delessaiu em 1932: Parnaso de Além-Tiimulo (FEB), uma coletanea de poemas atri- ‘BRASIL, CORACAO DO MUNDO, PATRIA DO EVANGELHO. Enquanto Gilberto Freire publicava (Casa Grande eSenzala (1833) e Sérgio Buarque de Holanda langava Raizes do Basil (1941), Chico psicografava uma versio espiita da historia, 0 dominio de Portugal sobre o Brasil aléa independénca, emma por exemplo, 6 teria ‘corde gracasa uma ~ ntervencio divin. PRIMERA EDI: 1838 pit que Humber de campos PE aio mas rect: 2008 er unawoconpn omarion buidos a virios autores brasileiros € portugueses, todos mortos ~ entre eles, Augusto dos Anjos, Casimiro de Abreu, Castro Alves, Olavo Bilac e Antero de Quental. Chico Xavier psicografou os poe- tas, mas teria sido Emmanuel quem apontou quais poemas de- ‘veriam ser publicadosnasseguidas edigdes do livro. Dois.anos depois, em 1934, morreria o poeta Hum- berto de Campos, ocupante de uma cadeira na Academia Brasi- leira de Letras desde 1920. E de 14, do além, ele seria mais um famoso a entrar em contato com. Chico. De 1937 a 1969, 0 médium. psicografou 12 obras supostamen- te ditadas por Campos — entre as quais Brasil, Coragdo do Mundo, Patria do Evangetho (FEB), considerada uma das maisimpor- tantes de Chico Xavier (Leia mais no quadro abaicto), PAULO EESTEVAO ‘Um dos cinco romances historicos narrados por Emmanuel. Conta a historia do cristianismo desde 0 seus primOrdias ereconsttuia vida ‘do apéstolo Paulo deTarso—quese ‘converteu af rita quando teve uma visio de Jesus, Depois de desencarnar, Paulo feria ajudado a resgatar outs espiritos degrande inteigencia que haviam enveredado pelo camintio do mal Pence eDicko- 1902 a pit quedtou Emmanuel ce Edlpomatsrecame: 2008 Avitiva do poeta, Catharina de ‘Campos, néo gostou, ¢ entrou na Justiga em 1944. A agio movida contra o médium e a Federagaio Espfrita Brasileira, que publicava 0 livros, colocava ambos contra a parede. Se a antenticidade das psicografias fosse referendada Judicialmente, ela reivindicaria diretos autorais — afinal, era her- deira de Humberto. Caso amediu- nidade de Chico no fosse reco- nhecida, abriria mao dos direitos, mas exigiria punicao por uso in- devido do nome de seu falecido marido. O juiz responsivel consi- derou que a petigéio da vitiva, na verdade, era uma consulta —e a Justiga néio poderia atuar como 6rgio consultivo. Resultado: a pendenga deu em nada, Mas foi a primeira de muitas suspeitas que seriam langadassobre Chico Xavier ao longo detodaasuavida. NOSSO LAR Foia primeira de 16 obrasditadas por André Luiz O espfito conta seus primeiros anes de vida apds a morte ‘edescrevea comunidade espiritual ‘que acolhea alma dos brasileiros que ‘morrem, Nos 66 anos desdeasa primeira edigao, Nosso Lar acumula quase 2 mithies de Gpiasvendidas— 0 Livro espiita de maior ZI scossona historia da literatura brasileira PeuERA EDICko: 944 pio que lou Anta fe Faiao mals recat: 2008 ESPIRITOS VIPS Chico Xavier psicografou Noel Rosa e Marilyn Monroe Casimiro de Abreu, Castro Alves, Olavo. Bilace Antero de Quental, entre outros poetas, no foram os Gnicosespritos famos0s psicografados por Chico Xavier £m janeiro de 1963, 0 compositor Noel Rosa ~morto havia quase 28anos—teriatransmitide a0 médium ‘mineiro uma letra inédita, cujos versos enalteciam Deus ea cidade do Rio de Janeiro. Dizia asim: *O samba no & pecado, se nasce do coracao | Jesus nasceu festeiado, no meio ide uma cancao | Um Rio belo e risonho, Canto ainda a serenata / em tuas noites sdesonho, em tuas notes de prat ois anos depois, em 1965, seria a ver de ninguém menos que Marilyn ‘Monroe entracem contato, Chico estava ‘nos Estados Unidos, durante a primeira das duas visitas que fez aquele pats para divulgar o espiitismo (a segunda aconteceu em 1966). Marilyn tinha smorrido ja faza tres anos, mas ainda pairavam divides sobre sua morte, Aovisitara sepultura da atriz, num cemitétio de Hollywood, o medium teria recebido uma mensagem, Seu espititoinformou, segundo Chico Xaver, que ela nao havia sesuicidado com uma mistura de bebidas etranquilizantes, como se comentava na época, Sua morte, nna verdad, tera sido acidental "Inger, quase semi-inconsciente, sob profunda depeessa0, 0s elementos mortiferas que me expulsaram do compo, nna suposigao de que ‘omava uma simples dose de piulas ‘mensageiras do sono” ssa historia esta registrada num dos livros do médiu: 4 Btonte da Vida (FEB) Tmpressionava ver 0 médium. em transe, durante uma psicogra- fia. Chico se concentrava, fechava 08 olhos e aparentemente alcan- cava um estado alterado de cons- ciéneia. Bstabelecida a suposta ponte com o além, ele colocava a mio esquerda na testa ¢ deixava que o espirito eserevesse com a direita, Uma pessoa sempre fieava ao seu lado, para trocar lapis e papel —tamanha era avelocidade com que o médium escrevia. Outro grande parceiro de Chico Xavier ao longo de sua proficua carreira foi o espirito André Luiz, queteriasidomédico em suaencar nagdo anterior. Uma das 16 obras, itadas por ele foi Nosso Lar (FEB), de 1944—o livro espirita brasileiro mais bem-sucedido da histéria. sucesso acabaria conduzindo © médium mineiro a condigao de Ifder do movimento espfrita. Alguns o enxergavam quase como guru, um guia espiritual. Outros, como um homem santo, Os eéti- cos, como um trambiqueiro cara de pau. Mas todos, sem excegio, como um personagem misterioso e fascinante, \Nao 6 poracaso que os quatro- centos ¢ tantos livros psicografa- dos por Chico Xavier jéacumulam mais de 25 milhoes de exemplares vendidos—um recorde, superado apenas por Paulo Coelho entre os autores brasileiros. Durante dé- cadas, omédium foi um verdadei- ro pop star. Hoje, algumas dessas obras so consideradas as mais relevantes do espiritismo mundial, quase to importantes quanto os livros de Allan Kardec, o codifica- dor da doutrina espfrita. A linha que ele imprimiu ao espiritismo, de aproximagio com © catolicismo, foi mais um fator que impulsionou a expansio da doutrina por aqui. Seus livros popularizavam os e6digos espfri- tas, mas dentro dos preceitos cristéios, sem assustar os catdlicos. Na verdade, 0 que acontecia era exatamente 0 contrério. Ao transformar-se em exemplo de abnegaciio e amor ao proximo, fazer voto de pobreza e liderar agées filantrépicas, 0 médium conquistava.asimpatiaaté do ateu mais raivoso. “Seguiaariscauma instrugdo ditada por Emmanuel: fidelidade irrestrita a Jesus Cristo ea Kardec, 0 codificador da dou- trina’, diz Souto Maior. Histérias fantasti Chico Xavier fundou trés cen- tros espfritas ao longo da vida. Primeiro, o Centro Luiz Gonzaga (1927), em Pedro Leopoldo. Depois, ‘a Comunhaio Espirita Crista (1956) €0 Grupo Espfrita da Prece (1975), ambos em Uberaba (MG), para ‘onde o médium se mudou em 1959. Todos 0s sfbados, pelo menos enquanto teve saiide para isso, percorria os bairros mais pobres oferecendo orientagio espiritual gratuita e distribuindo alimentos. ‘Um dos casos mais famosos & amensagem enviada pelo espfrito do jovem Wady Abrahiio Neto. Em. 1973, quando tinha apenas 17 anos, © rapaz morreu, vitima de um enfarte, A familia ficou desorien- tada, com pai emiepensando até em suicfdio, Seis meses depois da tragédia, eles resolveram procurar ‘0 médium, Chico entrou em eon- tato com Wady e trouxe do além as palavras que finalmente recon- fortaram seus familiares, Num dos trechos psicografados, 0 ga- roto dizia: “Melhoro em espirito ‘quanto ao animo de que preciso para seguir adiante, mas ougo as ‘vozes de meus pais queridos ‘chamando-meem pranto”. A cada atendimento desse tipo, nem & preciso dizer, crescia 0 niimero de seguidores do espiritismo. Enquanto isso, os direitos autorais de seus varios best sellers susten- tavam_e continuam sustentando —uma variedade de instituicées. Assextas e também aos siba- dos, Chico realizava sessdes pit blicas de mediunidade, durante as quais recebia mensagens de ‘pessoas mortas eas entregava aos familiares (que, na maioria das ‘vezes, estavam ali em busea de consolo). A rotina era quase sem- preamesma: primeiro, o médium lia uma parte do Evangelho; em seguida, recolhia-se a uma sala e passava receitas homeopaticas ‘por seis ou oito horas; ¢ 86 entio comecavaareeeber as mensagens espirituais. Nessas ocasides, Chico Xavier jamais ineorporava espfritos apenas ouvia e trans- crevia tudo 0 que eles diziam. VISITANTES CHIQUES 0 rei gravou com o médium e Xuxa pediu uma béncao ‘Multa gente famosa foi visitar Chico Xavier em Uberaba, ards de aconselhamento espiritual. Roberto Carlos, que chiegou a gravar um disco, como médium em 1973, nae apenas esteve ld —acabou virando um dos bons amigos de Chico, Xuxa também foi ‘velo, quando ainda estava gravida de Sashahoje, uma menina de 1 anos. ‘Aapresentadora queria do méslum uma beng para o nascimento da filha. A cantora Vanusa, que voltou as paral recentemente com uma versio Wanderléa, estrela dajovem guarda, {fo motivada por um acontecimento bem mais irdgico:a morte de tum filho de apenas 2 anos. Fibio anior, outro amigo famoso, ravou uma Imisicaintitulada Chico 2avier—frequentemente tocada aos sabados, ‘quando o médium atendia multiddesno Grupo Espiita da Prece ‘esconcertante do Hino Nacional, ———$ <<) procurou Chico Xavier quandose separou _goherto Carlose chico do cantor Antonio Marcos. Ka vista de ‘eaters: baw aias 4 6 ermpucto2 a uNrRN PLOSAIOMO Osanos70seriam * decisivos tanto para j) a credibilidade de Chico Xavier quanto y. para o futuro da dou- trinaespfritano Brasil. Logo no infeio da déca- da, em 1971, 0 médium foi A TY, como convidado do programa Pinga-Fogo, © na extinta TV Tupi. Em duas. entrevistas, responden a pergun- tas sobre temas delicados, como sexo, € sobre os conceitos mais : polémicos do espiritismo (pelo menos segundo a dtica catélica), como reencarnacao. Por maior que tenha sido o empenho dos Jornalistas, claramente dispostos apegar o entrevistado emalguma contradigao, Chico fez o maior sucesso. Aparentemente, nfo havia 3: PINGA-FOGO ERA COM ELE As hist6ricas entrevistas na TV Tupi, que tentaram derrubé-lo, mas acabaram consagrando-o Nas noites de 28 dejulhoe 21 de ddezembro de 1971, 0 médium Chico Xavier fo a estrela do programa Pingo Fogo, naextinta TV Tupi Canal 4 de Sto Paulo. primeira entrevista, prevsta faa durat 69 minutos, se estendeu por quase trés horas. A segunda fol maior ainda: durou quatro. Nas duas ocasies, ‘oméaium respondeu a queima-oupa ‘perguntas afiadas de alguns das joralistas mais conceituados aqucla altura ~Saulo Gomes, Reali JGnior, Helle Alves, Herculano Pires, Freitas Nobre, Vicente Leporace e Durval Monteiro, além do intelectual catalico Jodo Scantimburgo edo Gentsta Harman Guimaraes. Temas polémicas para a {epoca — como sexo, pena de morte, abort, transplante de drgios, bebeés de proveta, homossexualidade, cremacao, 2 entre muitos outros foram abordados sem meias-palavras. A autenticdade das obras pscografadas por chico fo questionada mais de uma vez (O:médium acabou defendend as Forgas ‘Armada, embora o pals vivesse sufocado por uma ditadura miltar. Nao convenceu ‘os entrevistadores em muitos momentos das das entrevista, Mas acertou tem cheio 0 coracdo dos telespectadores, que adoraram suas performances. ‘Ao encerrar a participacio no segundo Pinga-Fogo, véspera de Natal, Chico psicografou uma mensagem ao vivo e diante das cameras (foto) Cerca de 75% dos televisores da cidade de Sio Paulo estavam sintonizados no programa — ‘© 0 médium saiu dos estidios da Tupi coma credibilidade reforcada, ‘efintivamente consazrado. 3 quem pudesse desacredité-lo, Re- sultado: ao longo daquela déeada edaseguinte, a doutrina daria seu primeiro salto significative em riimero de seguidores. ‘As visitas ao médium eram disputadissimas— inclusive entre ‘um ntimero cada vez maior de ce- lebridades. Roberto Carlos, Xuxa, Fabio Jtinior.. Foram muitos os famosos buscando aconselhamen- to com Chico Xavier. Surgiram, entio, acusagées de venda de ingressos para os dias de visita ou de atendimento privilegiado a artistas e politicos em detrimento das pessoas mais humildes. Es- taria.o médium se corrompendo moralmente? Pior ainda: estaria obtendo beneficios financeiros com a imensa popularidade que ele havia aleangado? As deniin- cias jamais foram comprovadas. E Chico afirmaria, até 0 fim da vida, que devia o sustento a sua ‘modesta aposentadoria, eonquis~ tada apéslongos anos deservigos prestados—como escriturdrio—ao Ministério da Agricultura. No inicio da década de 1990, Chico Xavier deixou de comandar esses espiritas. “Aos 81 anos fem 1991), atormentado por sucessivas, crises de angina, abatido por duas pneumonias gravese castigado por uma catarata erdnica, ele vivia em repouso e, por recomendagio mé- dica, jando participavadesessdes haviaquase nove meses’, escreve ‘Marcel Souto Maior em As Vidas a ae) de Chico Xavier. Mas as pere- gtinagdes até o Grupo Espirita da Prece, em Uberaba, duraram até sua morte, no dia 30 dejunho de2002—curiosamente, algumas horas depois deo Brasil conquistar opentana Copa do Japao. Chico tinha 92 anos. “As 48 horas de vel6rio foram suficientes para que as caravanas de 6nibuschegassem em paz. A Polfcia Militar fez as contas: 2.500 pessoas por hora, em média, se despediram de Chico ‘no Grupo Espfrita da Prece. Ao todo, 120 mil pessoas’, afirma o bidgrafo do médium. “A fila para ‘ver 0 corpo atingiu 4 quildmetros e chegou a exigir uma espera de aproximadamente trés horas.” Apés sua morte, varias men- sagens supostamente espirituais foram atribuidasa ele, Nenhuma, contudo, teve sua autenticidade ‘comprovada pelos préprios espi- ritas, Histérias fantasticas come- arama circular. A mais polémica de todas talver. seja a que envolve ‘omédium mineiro Carlos Baccelli, amigo de Chico. O espirito do ‘médico Indcio Ferreira teria dito a Baccelli que Chico Xavier fora areencarnacio de Allan Kardec. ‘Mas so poucos os que endossam essatese, principalmente entre os adeptos do espiritismo. Primeiro, porque o espfrito de nenhum dos dois jamais veio a Terra para confirmé-la. Depois, porque, segundo a maioria dos espfritas, Chico ¢ Kardee eram donos de personalidades absolutamente distintas. “Chico Xavier foi omaior fendmeno meditinico de todos os ‘tempos, o legitimo continuador de Allan Kardec’, afirmaria Baccelli numa entrevistad Revista Orista de Bspiritismo. Bu oniveloa Fran- cisco de Assis /o santo italiano], cuja vida ~ ¢ isso € uma opinio ‘quase undnime entre 05 cristaios —foi a que mais se aproximou da vivida por Jesus” Paraa Federagao Espfrita Bra- sileira (ou seja, a versao oficial), Chico Xavier est4 agora no plano spiritual, ainda trabalhando pela divulgagio epelo desenvolvimento da doutrina. O espiritismo prevé que, de tempos em tempos, um espfrito evolufdo reencarne para dar uma foreinha especial & hu- manidade. Qualquer hora dessas, podeseravezdo médium mineiro. ‘Quando e onde ele reencarnaré? ‘Ninguém sabe. “Verdade irrefu- tavel 6 que ele, o menino pobre e mulato do interior de Minas Ge- rrais, filho de pais analfabetos, se transformou em um mito”, afirma ‘Marcel Souto Maior. “Venerado, idolatrado, atacado, perseguido ‘como um fdolo popular.” -€ —T is vo ‘AS Vides de hen Kavi, Mare! Souto air, Planet, 2008, ‘Osepsidiosmaismaranes navidad mad, ddlnfandaem Pero Leopold more em Uberaba, Plaga Fogo com Chico Xavier, i Oceano Vier de eto, Versti, 2006, Edo discos a tea dasenevisas de 1971 ‘ns TV Tui So mas de others devilen, sie (abe Di a ncn, trad nds Mambers ‘ends por roche 200 N * ‘a André Luiz ye 0 tpirf Mamanete Ninguém sabe quem o médico foi em sua ultima encarnagao, mas hd trés hipéteses plausiveis: Carlos Chagas, Osvaldo Cruz ou um ex-presidente do Clube de Regatas do Flamengo PORTIAGO CORDEIRO_DESIGN MICHELE KANASHIRO ILUSTRAGAO CAVAN ROSAS E MURILO MACIEL m 1943, Chico Xa- Leopoldo (MG), sua cidade natal, quando foi conta- tado por um espfrito que havia desencarnado no Rio de Janeiro. A entidade — imaterial e cons- ciente de si, como todo espfrito deve ser segundo as leis do es- piritismo—disse ao médium que “ditaria” alguns livros. Chico perguntou quem ele era. Ea resposta veio com outrapergun- ta: “Como 6 0 nome do rapazinho que dorme af no quarto ao lado?” Era uma referéneia ao sobrinho do médium, que se chamava André Luiz. “Entio, doravante, serd esse meu nome.” "4 Comegava ali uma longa par- ceria entre Chico Xavier e André Luiz, No decorrer dos 24 anos seguintes, entre 1944 e 1968, 0 médium mineiro psicografaria 16 obras cujo contetido Ihe se- ria revelado por esse espirito. A primeira delas, Nosso Lar (FEB), hoje é um clissico ~ 0 livro espirita de maior sucesso no Brasil, com quase 2 milhées ‘de exemplares vendidos. De tio popular, aeabou virando até fonte de inspiracao para telenovelas (eia mais no quadro da pag. 17). Acaba de ser adaptado para © cinema (saiba mais na pag. 79). E.sera para sempre conside- rado uma referéncia na literatura espirita brasileira. Nosso Lar 6 um romance au- tobiogréfico em que André Luiz, narra seus primeiros anos de vida apés a morte. A histéria se passa numaespécie de col6nia espiritual, lugar onde os espfritosse reinem para aprender e trabalhar entre uma encarnagao e outra, A obra discute questées cruciais para a doutrina espirita, como o sentido dignificante do trabalho e a Lei de Causa e Efeito, a que todos, segundo o espiritismo, estariam submetidos. André Luiz, quenunca existiu com esse nome, conta a experiéncia de se pereeber fora do corpo, sentir-se preso auma > —_ (0 sanitaista Carlos Chagas (1879-1834): tuma das posses identidades de André Luiz ae ay, SEG = perfil ‘} regifio de dor e escuridio ~ 0 chamado umbral e entender, Ienta e progressivamente, que a alma desencarnada tem fungoes importantes a cumprir. Paraos espiritas, a obraéuma revelagao: uma das mensagens de consolacao prometidas por Jesus & humanidade. “Essas mensagens divinas, que de tempos em tempos descem do céu para a Terra, modificando amplamente 0 cenério social e moral do mundo, sao verdades aguardadas ansiosamente pelo coragio humano”, diz. Lori Marli dos Santos, coordenadora do Instituto de Divulgagao Espfrita André Luiz, em Curitiba (PR). Foi sé depois de oito anos no umbral que André Luiz, encon- trou a comunidade descrita em Nosso Lar (leia mais no quadro abato). Ali, descobrin que sua mie e uma de suas irmas esta- vam num plano mais elevado, enquanto o pai e as outras duas irmas permaneciam em ciclos in- feriores. Ficou sabendo também. que sua esposa havia se casado CIDADE DAS ALMAS Um lugar onde os espiritos trabalhiam e recebem salario Mais do que titulo da primeira obra de Ande Luiz, NosoLaré 0 nome de uma comunidade de almas Osespirtos que ase encontram, segundo o autor, ja passaram pelo “umbral (uma espécie de purgatério), ‘masainda precsam alcanargtaus superiores de eleva¢ao. No livro, —€adescrico do lugae é supreendente: *Yastasavenidas, enfitadas de vores rondosas. Ar puro, almostera de profunda tanauilidade tal relat Ande Lz. “Nao havia, porém, qualquer sinal de inécia ou de ocisidade, Borque as vias piblicasestavam repleas. Etidades numerosas a jam e vinham” ‘comunidad, de cordo com o que est regisirado em Noss Lar, ican cu, mais ou menos sobre a cidade do Rio de janeiro, Tea sido fundada por almas de portugueses do século 16. Tem hospitais, escolas, _administracao e muita burocracia. O -governo é dividido em seis mir ‘0 da Regeneragao, 0 do Auxil ‘Comunicacio, o do Esclarecimento, ‘0 da Elevacao € 0 da Unido Divina. Um governador espiritual - que no ‘momento da narracao ja estava no ‘cargo havia 114 anos ~gerencia a ‘comunidade de 3 mil funcionarios ‘e organiza expedigoes para resgatar almas do umbral. Todos trabalham e recebem, ssalérios, ou melhor, “bonus-hora”. Com a emuneracao, compram até casas (uma por familia, ao prego de 30 mil bonus- hora). Quando 0 espirito desencarna, todos os seus bens sao deixados como hheranca para os familiares. sido médico em sua tiltima encarnagio, reaprendeu a exercer 0 antigo oficio. E tornou-se um espfrito luminoso, eapaz de atuar como doutor espiritual. Especulacées Mas, afinal, quem teria sido ‘André Luiz.em vidas passadas? O espirito no fornece informagées sobre encarnagdes anteriores, ex- cegiio feitatiltima. Sobre essa, ele revela apenas alguns detalhes em Nosso Lar. Os motivos para tanto mistério teriam sido dois: poupar seus herdeiros da exposicio e evitar que essa discussaio sobre- pujasse a mensagem espiritual ‘que ele tinha a apresentar. Descontadas especulagdessem ‘qualquer fundamento, admite-se ‘que André Luiz.tenha sido um mé- dico sanitarista, que viveu no Rio de Janeiro entre o final do século 19.0 comego do século20. Teria morrido jovem, provavelmente nas décadas de 1920 ou 1930, com idade na faixa dos 40 anos. “Filho de pais talvez excessi- vamente generosos, conquistara meus tftulos universitérios sem maiorsacrificio, compartilhara os vicios da mocidade do meu tempo, organizara.olar, conseguira filhos, perseguira situagies estveis que ‘garantissem a tranquilidade eco- ‘er emoouco onetcasov 1880 nOmica do meu grupo familiar”, descreve 0 espirito na obra psicografada por Chico Xavier. “Mas, examinando atenta- mente amim mesmo, algo me 2 faziaexperimentaranogiio do "tempo perdido, com asilenciosa acusacio da consciéneia.” Alma rubro-negra ‘Com base nessas informagoes, trés hip6teses sio as mais cogi- tadas. A primeira delas sugere que André Luiz pode ter sido em sua titima encarnagio omédico sanitarista Carlos Chagas (1879- 1934), famoso por ter descoberto © protozoario Trypanosoma cruzi — agente causador da doenga de Chagas. Para alguns especialistas no assunto, entre- tanto, apersonalidade de um néio combina com a do outro. Chagas era um sujeito ocupado demais com suas pesquisas, que vivia alheio aos problemas da vida cotidiana, André Luiz, por outro lado, parece ter sido um homem essencialmente pritico. A segunda hipétese aponta para outro sanitarista hist6rico: Osvaldo Cruz (1872-1917), pioneiro no estudo de doengas tropicais. Mas, de novo, os estudiosos iden- tifieam diserepfneias de personalidade. Embora fosse um homem da ciéneia, Cruz era reli- ioso, enquanto André Luiz admite em Nosso Lar que tratava reli promisso social. Para muitos espiritas, atercei- rahipétese é a mais plausivel de todas: André Luiz teria sido 0 neurologista Faustino Esposel EFEITO A VIAGEM Novela inspirada em Nosso Lar ajudou a divulgar 0 espiritismo (1888-1931, ilustragdo abaizo). Oriundo de uma tradicional famé- = lia carioca, ele deu aulas de neu- rologia epsiquiatriana Faculdade de Medicina do Rio de Janeiro. Presidiu 0 Clube de Regatas do Flamengo trés vezes, entre 1920 1928. Eseutemperamento, dizem ‘08 defensores da tese, coincidia como do médico cujo espfrito foi parceiro de Chico Xavier, “A con- duta vibrante, a jovialidade, a inteligéncia, aperspicécia... Fans- tino Esposel e André Luiz.tinham todas essas caracterfsticas em comum’, afirma Lori. Acoordenadora do instituto espirita acredita que dificilmen- te saberemos quem realmente foi André Lmiz, Mas as compa- rages com 0 ex-presidente do Flamengo, pelo menos, rendem hist6rias bem-humoradas entre 0s seguidores do espiritismo. “Bm nosso mural de reeados na internet, certa vez nos deparamos com uma mensagem posta por ‘um jovem que dizia assim: se André Luiz fosse vascaino, nao teria passado tantos anos no umbral” -€ - e To i coe papas ae arr ieee pec sci area Olivo Noss Larinspirou a autora Wan Ribeiro na ciacao da telenovela A Viagem, que fez um estrondoso sucesso em 1975, Levada ao at em hordrio nobre (20 horas) pela extinta “Tupi, ela durou 141 capitulo, com ‘média de 67 pontos de audiencia, £m 1994, a Rede Globo tornou a sravé-laeexibi-la, desta vezem 167 ‘apitulos eno hordro das 19 horas. Novo sucesso, com média de 60 pontos, segundo o Ibope. Nas duas ocasibes, ‘conceitos fundamentais do espittsma como reencarnacao, mediunidade, ‘arma e evolugao espiritual— rechearama trama, Resultado: a vend de livros espiita dsparou, Nao por acaso, muitos seguidores da doutrina ‘editam 3 novela um papel importante ra expansdo do ndmero deadeptos. vetifcada nas dtimas décadas, vo ‘Noss ar, chico Kavita Ll, FEB, 208 ‘sic da eratra espa, aoa ara rmeirosanos de Andre uzaposta mare. 7 respostas POREDUARDO SZKLARZ ILISTRAGKO HEITOR VIDA Con Uma radiografia da crenca Saiba quais sio os conceitos basicos que orientam o movimento espirita desde a sua fundaciio, em meados do século 19 que | \ 2 , osconceitos — ~ fundamentais? = DEUS Os espiritas acreditam em Deus, » ‘mas nao em um Deus antropomérfico ou seja, nao atribuem a Ele uma representagdo humana, como a tradicional imagem de um velhinho de barba que fica no céu, cuidando O que é de todos nds. “Deus é a inteligéncia 1 Suprema, a causa primara de todas as «ae 9 coisas, definiy Allan Kardecem Olivo espiritismo? dos Espo (FEB), primeira das cinco bras undamentas do espns £ uma doutrina filos6fica, cienti- _ No mais, Seus atributos s0 os mesmos flea e religiosa que acredita na etlitados em todas as grandes eet " religdes monotestas:€ eterno (sem existéncia de espfritos e na Comego nem fim), imutavel, material, — possibilidade de comunicacao —_infinito, nico, soberanamente justo ‘ comeles. Seusprincipiosforam © invariavelmente bom. 0 Diabo, de Saatchi re \\ \ zados pelo pedagogofran- Sita guc oe mau prasanpe || cas Allan Kardee, em cinco Tivos pubicados entre os anos de 1857 e 1868 (leia ‘mais na reportagem das pags. 76677). Segundo o espiritismo,o homer 6 formado por um corpo, um espirto eum perispirito, 0 corpo no passa de umn inv6lucto material. 0 espiito— ua alma, quando nos referimos 2 entidade espiritual ainda encarnada ~ €0 principio inteligente no qual residem 0 pensamento, 2 vontade © osenso moral.|4 0 persprito & ‘uma espécie de “capa’ eve e ludica, que envolveo esptto e tem como {ungdo estabelecer um elo entre ele ce ocorpo. Quando morremos, segundo a doutrina espa, o que ocorreé apenas destrugao do envoltGrio corporal. Espirit perispiito permanecem. Mas o que os médiuns ‘enxergam, quando estdo em transe, ‘do € 0 espiito —que éenergia pura €imvsivel por dfinicao, \ | Oqueeles veem é o perspirito, t f REENCARNACAO \-. ‘Na doutrina espa, ndo existem (0 concetas de Jutzo Finale inferno Osespirtossobrevivem a morte do compo fisico ese purificam em_ liferentes vida. Ou sea: medida {que reencarnam, vio se educando. “Fas [as rencamagde sio como cursos necesaris para a evolugdo ds espirtos nas diferentes escolas, {que si os miitiplos mundos habitad ‘excreve Gerson Simies Monteiro no live 0 Que EnsinaoEspirtismo (Mavad) “Quando o esprit, pelo seu livre-arbtvio, se aasta das leis de Deus ‘entra pelo camino do ma, sofre as consequéncias de seu erro em outras. reenicamacdes.” Adar eo sofimento ‘io insirumentos da evolugao espritual iy ~ ( SALVAGAO PELA CARIDADE Espirita que é fel a doutrina nunca deixa de ajudar quem precisa Para o espiritismo, no basta ora, 67 6 preciso colocar em pratica 0 principio moral do amor ao préximo. "Estamos falando de amor no sentido de doacao, reniinda esacrificio em > funcao dos outros’, dizo pesquisador espirita Luis Sérgio Marotta, Isso explica por que os espiritas praticam tanta caridade. Eles aceditam que ser ‘aridoso € sindnimo de lavar 0 carma « se aperfeicoar espiritualmente. Seus centros federacies mantém asilos, orfanatos ¢ casas para mes soltciras. - eae ety om yy me 925 978 1,2 1,5 2,2 2,3 mil mil mihi thas 1,3% da. populacio nacional MUNDO ESPiRITA Estima-se em 10 milhdes 0 total cspiritas representada no Conselho 1t@m federagio, apenas grupos de kardecistas ao redor do planeta Espirita Internacional (CE!) espiritas independentes) © vases com federagio de associages _ @ Observadores (patses que nio 21 Fras aeusossr noms respostas POREDUARDO SZKLARZ Duvidas elementares A doutrina espirita mistura fé e metodologia cientifica ESPIRITISMO E RELIGIAO? ‘Muitos espiritas consideram a doutrina uma religido. Afinal, ela esti fundamentada em prineipios cristos no deixa de ser uma ponte entre os homens e Deus. “Mas, quando se fala em religiio, pensa-se logo em sacerdécio, lero, hierarquia... E nada disso existe no espiritismo’, diz 0 pes- quisador Luis Sérgio Marotta. De fato, a doutrina nao tem rituais ‘denenhumaespécie (como missas ‘ow outras formas de cult), nem padres e bispos ou qualquer tipo de lider espiritual. Também nao adotasimbolos, como a.eruz, nem admite adoragao de imagens. Centro espiita: a doutrina nao tem rituals nem admiteadoracio de imagens 2 Segundo 0 codificador da doutrina, Allan Kardec, e quase todos os sens seguidores, espiri- tismo 6 uma filosofia com conse- quéncias morais, baseada desde origem nos prinefpios do cris- tianismo e que promove a religio- sidade das pessoas — sejam elas cat6licas, protestantes ou adeptas de qualquer outra crenga. ESPIRITISMO E CIENCIA? De acordo com os espiritas, a doutrina é uma ciéncia - com métodos, porém, que nao podem ser comparados aos do cientifi- cismo cléssico, baseado no co- nhecimento empfrico. Seus ins- trumentos de investigacao se aproximam bem mais dos utiliza- dos pelas ciéncias sociais. “E impossfvel reproduzir fe- némenos espirituais em labora- t6rio, pois os espfritos nao sio servos dos médiuns nem dos pesquisadores’, afirma Marco Paulo Denueei, um estudioso da doutrina. “Nota-se que um fend- ‘meno espiritual nao 6 aleatério quando ele apresenta padroes ou podeser checado” Exemplo: um espirito revela informagées como endereco e RG de uma pessoa e esses daddos sio verificados. Se forem todos verdadeiros, provam. aautenticidade do fendmeno. QUAL E A DIFERENGA ENTRE ESPIRITISMO E ESPIRITUALISMO? Espiritualista é aquele se ope a0 materialismo — ou seja, que acredita na existéneia de algo além da matéria. Acontece que nem todos os espiritualistas cre- em em espiritos, na preservagdo de sua individualidade e na pos- sibilidade de comunicagao com eles. Para evitar confusio, Allan Kardec inventou um jeito novo de sereferira doutrina e seus segui- dores. “Se adotei os termos esp rita e espiritismo, 6 porque eles exprimem, sem equivoco, asideias relativas aos espiritos’, escreveu © codificador no livro O Que Eo Espiritismo (FEB). Questao de crenga Saiba como 0 espiritismo e as cinco grandes religioes do planeta entender o que acontece depois da morte. , COM 0$ MORTOS oO ba? ESPIRITISMO = CRISTIANISMO- ‘ISLAMISMO- JUDAIsMO- ‘HINDUISMO_ BUDISMO , 4 ‘ ‘Aalma passa Para catlicos ‘Aalma espera Todos As pessoas esto Até alcancarem: Re ean cree re eee alee el een ee eel ee Scare Peet ees eee) eee F. aperfeicao iferno até aTerrapara ——_corpodeanimais._retornar sempre el ot rl oh rt AWORTE ) ——— ————— So caer ake | Oleserete era foteatt cao cerned eteed ef esr cee ee ee es a) a ceserel eee ae ‘novo corpo. asalmasdocéu comportamento para aguardar —_aapésa morte. avida e também Ear miman ee ate edad pee cp eee DESTINO eye eee ae = | s | | ‘Acontece varias Nao acredita em Osistimicos n3o Algunsramos = Aalma nao | Acontece aa ag) eda] Khelil) Pid Rela cre oespirito atinja mas na - Feencarnacao, acham possivel corpo, mas. | a pessoa fe eee cee ee oe ee 4 Pal aN Pest nibee lunciatnind [Polio |g eae fe acres al cos sone |e (a oe t + 4 Epossivel para Nao acredita | Nao acredita ‘Nao esta Nao acredita Nao acredita qualquer um, na doutrina erie nel Pi) desernatver fas algunas ‘mais essa interpretagies omic hiside = origem Raizes. ancestrals A doutrina nao nasceu com os cédigos formulados por Allan Kardec, ha pouco mais de 150 anos; para muitos espiritas, ela acompanha a humanidade desde 0 seu passado mais remoto espiritismo 6 re- cente, tem pouco ‘mais de 150 anos de histéria, Seré, ‘mesmo? A afirma- Ho 6 verdadeira apenas quando nos referimos ao espiritismo mo- derno, fundado por Allan Kardec em meados do séeulo 19. Para muitos espiritas, porém, nao foiat queadoutrinanasceu. Sua origem deve ser procurada num passado muito mais remoto. ‘A tese que eles defendem & simples: hé mais de 70 mil anos, na Africa, fenémenos meditinicos — como evocaciio de espfritos e curas supostamente espirituais ~ jf eram recorrentes. De fato, so abundantes os indicios ar- queolégicos que corroboram essa teoria. Assim como sto concretas as evidéncias de que muitas eivi- a POR EDUARDO SZKLARZ_ DESIGN MONKEY lizagGes antigas, em diferentes perfodos histéricos, elaboraram seus prdprios conceitos de plano cespiritual, reencarnagao e comu- nicagaio com os mortos. “Aqueles individuosque podiam manter interc€mbio com o mundo invisfvel eram considerados privi- legiados’, escreve o pesquisador espirita Edvaldo Kuleheski em Médiuns na Antiguidade, um artigo publicado pela Revista Crista de Espiritismo. Cada cultura da hist6ria antiga batizou esses privilegiados com um nome diferente —sacerdotes, feticeiros, adivinhos, videntes, ordculos, profetas... Muitos deles aparecem. nos livros sagtados de varias re- ligides, inclusive na Béblia. Reencarnagaoe multiplicidade de mundos habitados tampouco siio nogées exclusivas do espiri- tismo moderno, “A lei das vidas sucessivas ¢ uma crenga muito antiga’, afirma Wilson Czerski no livro Espiritismo: Uma Viséo Panordmica (O Clarim). “Basta pesquisar as raizes do hinduismo, obudismo, areligiosidade dos an- Deus, na imortalidade da alma e no retorno dela a vida carnal.” Conclusiio inevitvel: elemen- tos fundamentais do espiritismo codificado por Allan Kardec no século 19 acompanham a huma- nidade desde o seu passado mais longfnquo. Descubra como alguns deles se manifestaram em dife- rentes momentos histéricos ~ do Paleolitico & Idade Média. + —_———_. Jesus conversa com as espitas de Moisése His: mediunidade na blo origem. Pré-Histéria Mediunidade nos tempos da pedra lascada 3% — Tragos do espiritismo moder- no, segundo pesquisadores da doutrina, podem ser identificados no Perfodo Paleolitico — também conhecido como Idade da Pedra Laseada. Ha cerea de 70 milanos, nossos antepassados sairam da Africa e iniciaram uma longa Jornada de colonizaciio até che- garem As Américas. Enquanto se espalharam lentamente pela Terra, desenvolveram o que antropélogos chamam de culturas xamanicas, Xam aieano evocando achuva rena nas “foreas magias da naturera —_—— “Reunidos ao redor do fogo, es- seshomens primitives realizavam, ritmais de conexiio coma Mae Terra ecomomundo espiritual’, escreve © etnobidlogo Rogério Favilla no artigo Cultura Xaménica e Sabe- A comunicagéo com os mortos ficava.a cargo de homens sabios rTespeitados que hoje conhecemos ‘como xamiis—uma transcrigéo da palavra russa saman, atribufda por povos ancestrais da Sibéria as pessoas capazes de “viajar no mundo dos espiritos” Segundo Favilla, as poucas ao tempo ainda conservam uma visio animista do mundo. Ouseja: ‘em todo lugar ~nos elementos do Cosmos (0 Sol, aLua, asestrelas), nos elementos da natureza (rios, ‘oceanos, montanhas, florestas), ‘em todos os seres vivos (animais, ‘on vegetais) e nos fendmenos da natureza (chuva, raiose trovoadas, ventania, terremotos). Todas as coisas tém alma e tudo que acon- tece tem um espfrito por tras (que pode ser amigo ou adversario, curar ou provocar uma doenca, ajudar ou atrapalhax). Os sonhos siio a porta de entrada para esse mundo sagrado. Por meio deles, € possivel falar com os mortos, obter curas e dominar as “forgas mégicas’ da natureza. Hindus Aperfeigoamento da alma Segundo os espiritas, ha varios elementos da doutrina nos Vedas 0s textos sagrados mais antigos dahistéria, que formam a base do hinduismo. Compiladosapartirde 1500, eles dizem, por exemplo, ‘que “os espfritos de antepassados, no estado invisivel, acompanham. certos bramanes /sacerdotes] convidados para cerimOnias em comemoragéio aos mortos". Apesar do sistema de castas, ‘que até hoje condena milhdes & imobilidade social em pafsescomo a india, os hindus acreditam no aperfeigoamento da alma. Consi- deram que o homem empreende um ciclo de morte erenascimento chamado samsara. A vida atual dependeria dos atos praticados na anterior. E as consequéncias da conduta humana formariam uma energia metafisica conhecida como earma — que adquirin dife- rentes nuanees no budismo e no espiritismo moderno. __wx~ Vishnu: o deus da manutengo do Universo Egipcios renga na vida eterna io dos Mots: rena na alma mortal — Ha. 5 mil anos, os egipcios ja acreditavam em vidaapés.amorte. Provas disso sio 0s textos religio- sos ~em hieréglifos~que adorna- ‘vam as tumbas, tanto de faraés quanto de pessoas comuns. Eo Livro dos Mortos, que reunia pre- ceitos eorientagdessobre aviagem a0 outro mundo (evidéncia da renga na imortalidade da alma). “O conceito de vida eterna é uma earacterfstica daquela civili- zacho”, afirma 0 egiptélogo Jilio Gralha, professor de historia an- tigana Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj). Segundo Gralha, percebe-se, pela traduciio dessas inserigdes, que havia uma liturgia de preparagao do morto ‘para sua viagem espiritual. “Ei, em outro plano, todos viveriam numa espécie de paraiso — desde que se limpassem dos atos ruins pratieados na vida terrena.” Gregos Filosofia e comunicacao com os mortos ‘Mediunidade eraalgo trivialna cultura religiosa da Grécia antiga. Soberanos ¢ cidadios comuns costumavam consultar 0s or- culos — portais de comunicagaio ‘com os deuses, por meio dos quais, se obtinham conselhos, ajuda e previsées do futuro. O oréculo mais famoso ficava no templo de Delfos, dedicado ao deus Apolo. 14, adivinhas conhecidas como pitonisas atendiam a populacao. “Antes da consulta, apitonisae seu cliente tomavam banho numa fonte sulfurosa’, conta 0 pesqui- sador Edvaldo Kulcheski. “Em seguida, sentada numa trfpode [cadeirade trés pés}, entre vapores de enxofre e mascando folhas de louro fa drvore sagrada de Apolo}, la entrava em transe e transmitia as palavras do deus” ‘No poema Odisseéa, Homero relata conversas entre Ulises ea almade Tirésias, ordculodeTebas. Jao fildsofo Sécrates acreditavana imortalidade da alma. E 0 tirano Periandro, de Corinto, dava como certa a possibilidade de comu- nicagio com os mortos. “Certa vez, ele consultou a alma de sua mulher’, diz Palhano Jtinior, autor de varios livros sobre espiritismo. “O curioso 6 que o proprio tirano havia mandado degolla” * —_—— ‘Uma pitonisa(aivinha da conselhos '& populacao: em contato com os deuses origem Romanos Mensagens enviadas de um plano superior 3 — Roma sofreu forte influéncia religiosa da Grécia antiga. Na- tural, portanto, que a erenga em espiritos e na possibilidade de comunicagao comeles fosse algo comum também entre os stiditos do imperador. Os romanos acre- ditavam que mensagens enviadas pelos deuses de um plano superior podiam ser recebidas por certas pessoas - os artispices, que tra- duziam esses “recados de outro mundo” examinando as viseeras de um animal sacrificado ou in terpretando fenémenos naturais como raios ¢ eclipses. 28 (0 consul romano Publius Decius Mus em vista a um arispice: cas de outro mundo Havia uma versio romana das pitonisas gregas: as sibilas, que ‘entravam em transe para consultar espfritos sobre as inquietudes da populacao. Até generais procura- vam essas sacerdotisas, atrés de orientacio para suas estratégias militares. Na obra Tusculanae, © politico Cicero afirma que seu Seven han Conver eres temente com espiritos. E que, no ago Avernus, sombras dos mortos apareciam na eseuridio, Celtas Druidas entre o céue a Terra A Glia era uma provincia do Tmpério Romano que abrangia 0 atual territério da Franga e par- tes da Bélgica, da Alemanhae da Itélia, Ali floresceu a civilizagaio celta, cuja religiio se aproximava do espiritismo em pelo menos trés pontos: a crenganaphuralidade de ‘mundos habitados, naimortalidade daalmaeno seu aprimoramento a0 longo de vidas sucessivas. Os celtas cultuavam um pan- teio de divindades. A principal delas, chamada Deusa Mae, se manifestava por intermédio da natureza. Entre ela e as pessoas comuns havia os druidas, que mediavam arelagao entre o plano terreno e a morada dos deuses. ‘Um dos princfpios apregoados por esses sacerdotes dizia que 0 homem constréi sen destino com sages praticadas neste mundo. As lendas envolvendo druidas estiio repletas de “espfritos pro- tetores’, Numa delas, o guerreiro Vercingéstorix conversacom aalma de heréis mortos em combate. Cerin celta em louvora um druida Velho Testamento Fendmenos medidinicos registrados na Biblia Em varias partes da Biblia hebraicahé passagens que aludem afendmenos meditinicos, princi. palmente nos livros Niimeros e Deuterondmio. Numa delas, Moi- sés profbe pitonisas e feiticeiras de falar com espiritos uma pro- ‘va, segundo os espfritas, de que a comnicagao com os mortos era recorrente nos tempos bfblicos. Aproibigao, contudo, ndo teria, sido total. "Moisés proibiu no Velho Testamento apenas a pratica co- mercial da mediunidade’, escreve © pesquisador espirita Gerson ‘Sim@es Monteiro no livro 0 Que Ensina o Espiritismo. “Tanto que ele aprovou as atividades meditinicas de Eldad e Medad, pois o propésito delas era orientar moralmente as pessoas.” As Escriturasjudaicas também mostram que Saul, primeiro rei de Israel, costumava consultar uma médium da cidade de En-Dor para evocar o espfrito do profeta Samuel Antes de lutar contra os filisteus, orei teria pedido ajuda a pitonisa para vencer as batalhas. CO espfrito de Samuel aparecendo para Saul: ‘mediunidade nas Escriturasjudaias Idade Média ‘Vozes ouvidas por Joana @’Are ‘ arcanjo Miguel conversa com Joana dArc ‘A guerreira Joana dare talvez sejaamais famosa médium medie- val. Nascidaem 412, ela comegou a ouvir “vozes sagradas” ainda mocinha, Seriam mensagens deséio Miguel, santa Margarida e santa Catarina, que incentivavam a lutar contra o dominio dos ingleses. Perseguida pela Inquisicso, Joanaacaboucondenadaamorrer na fogueira. E nao foi s6 ela! A Igreja Catdlica assassinoumilhares de pessoas nesse period, sempre sob aacusagao de bruxaria. Entre as vitimas, muitas reivindicavam poderes meditinicos. No livro It Candelaio, de 1582, 6 renascentista Giordano Bruno deixou registrada sua conviceao de que era possivel conversar com. osmortos. E Joana d’Are, ironica- mente, acabou sendo canonizada em 1920 — quase 500 anos depois de ter sido queimada viva. “€ — hs vo (Que EmsinaoEpirtismo, Gerson snes Montero Mavad x, 2007 ‘Ua cleo de arts ue enim iad ‘lementoindanenta da dutinn eit. 20 Emanuel Swedenborg ~ 0 Pouca gente conhece a historia desse talentoso cientista sueco, que dissecava corpos humanos em busca da alma e jd falava de “mundo invisivel” no século 18, muito antes de Kardec POR EDUARDO SZKLARZ DESIGN MICHELE KANASHIRO ILUSTRACRO CAVANI ROSAS EMURILO MACIEL CALIGRAFIA ANDREA BRANCO. ngana-se quem acredita que 0 es- piritismo moderno comega com ospri- meiro livros publica- dos pelo franeés Allan Kardee, codificador da doutrina. Mais de 130 anos antes dele, na Suécia, um sujeito chamado Emanuel Swedenborg ja falavae eserevia sobre alma, mundo invisfvel comunicagao com os mortos. E mais: teorizava sobre tudo isso ‘com base em seus conhecimentos cientfficos, numa época em que © conceito de ciéneia espirita ainda nem existia. —————_ ‘0 cientsta com um de seus “manuscritos ‘splits’: Leonardo da Vinci do sécul 18 Swedenborg foi uma espécie de Leonardo da Vinci do século 18. Entendia de dtica, mate- mética, economia e mecénica. Dissecou corpos, escreveu tratados filoséficos e elaborou uma teoria sobre a formagdo do sistema solar. 'Também co- lecionou invengées, entre elas uma “maquina voadora’. Era um cientista brilhante. E ainda encontrou tempo para ser 0 precursor do espiritismo como © conhecemos hoje. Infancia iluminada Emanuel foi o terceiro dos nove filhos de Jesper Swedberg, um clérigo luterano, Nasceu em 1688 € niio demorou para desenvolver ‘0 que um de seus bi6grafos, o bri- ‘tanico George Trobridge, chama de “sensibilidade diferente”. No livro Swedenborg: Vida e En- sinamentos (Nova Jerusalém), ‘Trobridge reproduzuma carta do cientista, enviada au amigo em 1769, na qual ele escreve: “Dos 4 aos 10 anos, eu meditava sobre Deus, asalvacio eas experiéncias espirituais do homem. As vezes, fazia revelagdes que levavam meus pais a dizer que os anjos estavam falando através de mim’ Muito cedo, aos 11 anos, Ema- nuel foi estudar na Universidade de Uppsala, especializando-se alguns anos mais tarde numa diseiplina ‘parecida com o que haje chamamos de engenharia. Seus avés eram 3 3 -Derfil 4B 1 3, donos dealgumas minasnaSu- Swedberg para Swedenborg). A __Por que estudar anatomia? eZ écia,eeleacabou virandouma —_comendaabriuasportasparaaalta Muito simples: se 0 corpo é 0 autoridade em metalurgia. sociedade. Mas o jovem cientista _reino da alma, estudar as earae- ‘Depoisdesairdauniversidade, aparentemente no ligava para _ terfsticas anatémicas do homem. Emanuel viajou por Inglaterra, _honrarias. Seu vinico interesse _ seria o caminho mais curto para Holanda e Franga, para apurar —eraampliarosconhecimentosem —_provar sua existéncia. Sweden- seus conhecimentos, Aovollarpara todas as areas possiveis. borg passava horas dissecando ‘ casa, 0 tei Carlos XII escalou-o _—_Abaladopelamorte dopai,em —_cadaveres e lendo trabalhos de paraserpupilo do inventor Chris- 1735, 0 cientista passou a usar outros anatomistas. ‘ topher Polhem —umadas figuras todo o tempo livre para provar mais importantes no processo de a existéncia da alma. Era uma Transformacgao industrializagiodaSuécia. Apartir busca, em suas palavras, pelo _Derepente, numanoite de 1743, dali, sua carreiradeslanchou. _—“prinefpio essencial e vital que _ tudo mudow na vida do cientista. preside nossos atos’. “Em vez Ele estava jantando, em Londres, A busca da alma de teorizar, preferiu fazer um quando um espfrito apareceu e Em 1716,a0828anos, Emanuel estudo de anatomia’, afirma 0 Ihe disse: “Nao coma demais’. Dé foinomeadoassessordeminasdo — tedlogo George F. Dole, autor de para desconfiar, néo é verdade? governosueco. Trésanosdepois,a A Thoughéfud Soul: Reflections Com tantos mistérios entre 0 céu rainha Ulrica Eleonoraconcedeu from Swedenborg (“Uma Alma ea Terra, por que o espfrito daria ; asuafamfliaum titulodenobreza Contemplativa: Reflexes sobre _ um recado tao prosaico? Mais (Gaiseusobrenometermudadode — Swedenborg’, inédito no Brasil). _ tarde, porém, a mesma entidade BRIGA DE GENTE GRANDE Pees CMe ter RUC My rie PLO ORT Marc uN Coro) ‘A comunicacao de Emanuel Swedento A principio, io encontrou nada de Mendelsohn, Kant reconhece que estava Berney Cota une) Cir scone LOR es Persermre sureteet artnet Pena tenner arctan? Pesan se ee ks ene Man recone a Grae rot Sr er Tad neat aden = e n Len nec ee Sect! See oo Docc ce sea EC oe nr OSU ng ae ee ge fone et Pouatatere ant nk iter) renee cc ‘Mas Kant mudou radicalmente de TMU OMe crocs Besar Deiter esi ceunycan Poneto] eri sene See ae ged morreu na segunda feiraefalou comiga rear) fone nies iene ty (ert Roster Oe er on eTocs SOS Berens eat ecnicr lo re CTC ren ect) Roemer etd eee eet? Tantei oa errant) Peete ED unSo os nterrado, fi queestava vivo” voltariaa semanifestar. Dessaver, ‘Swedenborg estavadormindo. Ao acordélo, o espfrito se identificou: era Jesus Cristo e estava ali para informar que o cientista inhasido escolhido pararevelar ao mundoo significado espiritual da Biblia, “Omundo dos espfritosse abriu para mim’, relatou Swedenborg, assegurando que podia “conversar com anjos” em visées quase dis- rias, Chegou adescrever osuposto “mundo invisivel”, detalhando casas, templos ¢ auditérios. B 6b- ‘vio que essas revelagies geraram controvérsia. Alguns o tacharam de charlatiio. Outros, no entanto, ‘passaram a veneri-lo e se organi- zaram em sociedades espalhadas por toda a Buropa. “Emanuel Swedenborg renun- cious ocupagdesmundanas para realizar a tarefa que havia recebi- do”, esereve Allan Kardee no livro Definigoes Espiritas (Lachatre). De fato, o cientista sueco publicou varios livros sobre a Biblia, 0 ‘mundo espiritual eo caminho da salvagao—comoas obras Arcana Caelestiae Apocalypsis Revelata. ‘Também fazia jejunse orava para se livrar dos pecados e seguir a vontade de Deus. “Pertengo a Ele, niio a mim’, costumava dizer. ~~ Legado y ‘A obra de Swedenborg fez a cabega de muita gente gravida, ‘como o poeta inglés William Blake, © escritor argentino Jorge Luis Borges, © poeta francés Charles ‘escapucho wma conmans Representac3o de “consciencia"no século 17: ‘mistura do plano material como espirtual Baudelaire, 0 escritor escocés Arthur Conan Doyle ¢ o filésofo alemao Immanuel Kant (leia ‘mais no quadro a esquerda). Os conceitos espirituais elaborados por ele siio abstratos, de dificil compreensiio. Mesmo assim, exereeram forte influéneia sobre. o espiritismo moderno. ‘Um desses conceitos é 0 da existéneia de um “mundo invistvel” ea possibilidade de comunicagao com ele. “Um dos fundamentos da doutrina de Swedenborg é 0 que em diferentes estfigios de evolucio. : E mais: enfatizou a necessidade de uma vida terrena ativa como ele chama de correspondéncias’, —_ condigio para uma vida religiosa escreve Kardec. “Ouseja:omundo —_saudével—outro conceito seguido ‘materiale omundoespiritualestio pelos kardecistas. ligados como o interior ao exterior. Suamaisimportante contribui- Portanto, ascoisasespirituaiseas — ¢o, no entanto, talveztenha sido naturaissdoumas6” Swedenborg 0 Jastro racional que ele garantiu também falavadaexisténciadeum A doutrina espfrita antes mesmo nico Deus. Ediziaqueohomem — deelaexistir. Swedenborg morreu foicriado livre, masabusoudesua em 172, aos 84 anos, deixando liberdade. Por isso, passa porum um terreno sélido sobre o qual ‘proceso de reabilitag&o,massem Allan Kardec ergueria as bases perder o livre-arbitrio. do espiritismo modemo. *Gragas Outranogio do cientistasueco — aele, asnogdessobre o outro mun- abragada pelos espiritas é a de ‘quenao existe um tinico céu nem um tinico inferno, mas uma série de esferas pelas quais 0 espirito ‘progride. Cada esfera representa do evolutram’, afirma Trobridge, “diferenciando-se das crendices populares do séeulo 18” -€ — Ti um grau de luminosidade e felici- Livros dade—cabendo acadaumdends Siow teas hreerton, 19 quemelhorseadaplaaniossa Aven do atin donne aor, (sm dedicaao conical quested, ‘A thoufl sou: Reflection fom Swednbore. (Geng ale Suedenbog Funda, 1095. mings ofr arava 2 or de Sweden cambasnasin dewroaDewseacenca. condigao espiritual. Swedenborg, dizia ainda que ndo h4 anjos e deménios, apenas seres humanos 33 fenémeno Irmas Fox COPE eem OL Cees Hii uOm ited ou ey SC nc PEZEMBRO DE 1847. A FAMILIA FOX — COMPOSTA DE PAL, eee eee a en ollie Plates ae cock’ Se Mey es eats et et ahem ac eRe eeer Re eee Comer acetates Te ia sateRech eee Nasi aot aoe Pee ten ar ees Fe aC teeta Na ee 62 ANOS MATS TARDE, A FUNDAGRO DE LIRA NOVA CRENGA: rere merce! ie sale Ue ata ee ae ican van NY Eire RUIDOS DE ORTEEM DESCONHECIDA COMECAN, MARGARET, A WBE, ICA APAVOR PERCEBER GUE ALGIEM RESPONDE Da ETNA —e Tamaém Faz um SE SOIS ESPIRITO, ‘DIZEL A IDADE DE TODOS OS MEMS FELHOS, Tesremu FENOMENO, EFICAM IMPRESSTONADOS. ANOTICTA SE ESPALHA. TES SEGUENTES, 5 DE TODA AREDONDEZA FAZEM FILADIANTE DA CASA 0S FOX. ALEUNS, PRINCIPALMENTE OS DEMATS METODTSTAS De HYDESVILLE, PARA PROTESTAR E HOSTILTZAR A FAmiL KATE E MARGARET! CRIANDO CODIGOS PARA sm, Lm AMBULANTE QUE TEREA ASSINADO CINCO AN ANTES, Ef 1B. SEU CORPO ENTERRADO Ni ‘0 MEDICO DA EamiLta € cuamAoo) PARA ANALTSAR OS FRAGMENTOS. E-CONauT que LES PODEREAM SER PROWS DE Lm ASSASSENATO. SAO. 08505 HUMANOS, O TENKO (DE REPENTE, NAO SE FALAVADE OLTRA COTSA DA A RETRO. ESPECULACOES CORREM SOLTAS ERAPIDAMENTE, NA RASE.DO ROCA A ROCA, PARA "NAO", DOTS ESTALOS PARA "SIM", ‘JOHN DECIDE MANDAR SUAS FILHAS PARA ROCHESTER. KATE VAT MORAR COM LEAH, UMA NATS VELUA. MARGARETH FICA NA CASA DE DAVID, OUTRO TRIO. MAS O ESPIRT YAE JUNTO COM ELAS. & PIOR: AGO' TAMBEM 012 QUE CONVERSA COM "1550 VAI CONTRA (05 PRINCIPIOS CRISTAOS! 5 QUANTIAS UNIDAD N OTANTE, KATE PER ROLE SOBRE A BEBTDA e 8 PARA OS ESTADOS unazos SENAIS DE GUE TA NAO Sue ESO DA FAIA, ELAS SE DESENTEN A TRMA MALS VELMA, LEAH, POR MOTIVOS ATE HOTE DESCONMECIDOS. (OF MUSIC. MARGARETH DF GUE 05 RUIDOS arataui DE ESTALOS FEITOS C UMA PLATEZA SISTING A pemonstRacdo. NESES MATS TARDE, APARENTEMENTE OTSPOSTAS A ATAZANAR ATE E MARGARETH ACELTAM UMA OFERTA DE USS 1500, Lin SORNALESTA K ~ PARA REVELAREM, AO FINAL DOS QUATRO ANOS OF INVESTIGACKO, “ONVENCIDO DE QUE NAO WAVEA 5 FENOMENOS OAS TRIAS, FRequenes sessOes meortinces, a GUASE SEMPRE ANTZADAS NA poe vagros [CrENTISTAS. um I vies € 0 auimtco BRITANECO WILL TAM ICROOKES, GUE lestupagta 2 AFTAMAR, éum espigtro UTOR DOS SEU SUPOSTO PODER DE CONVERSAR com 5 moRTOs, ReTOMANDO com (OR SUA ANTIGA Fé CRISTR. EMBO? ATE, TEN MARGARETH PREMET ESPERETESI RERAIN DESACREDTADAS, SDA DECADA DE 1890. ESPIRTTO DE CHARLES B. ROSA? Way NA MANA SEEUINTE, O JORNAL MEW YORK WORLD REVELA DETALHES: OS RUIDOS SERTAM RESLLTADO. PO DOMINTO QUE MARGARETH E KATE TINHAM DESENVOLVIDO SOBRE A MUSCULATURA DOS PES. (05 ESTALOS FEITOS COM OS DEDOS ERAM TRO ALTOS (QUE SERTAM CAPAZES DE ACORDAR LIMA PESSOA. y alae ny Allan Karde 0 cedefu Yr Curioso e inteligente como os grandes pensadores de seu tempo, o pedagogo francés fundou no século 19 uma doutrina que mistura ciéncia, filosofia e religiao POR MICHELLE VERONESE DESIGN MICHELE KANASHIRO ILUSTRAGHO CAVANI ROSAS EMURILO MACIEL CALIGRAFIA ANDREA BRANCO oi preciso muita | insisténcia do ami- gochamado Fortier | para que Rivail assistisse a uma demonstragiio de mesas girantes — um fendmeno misterioso, que provoeava frisson na Paris de meados do século 19. 0 professor aceitou, masa contragosto. Homem. da ciéneia, linguista, instrutor de aritmética, quimica e fisiea, ele LSE Hippolyte Rival, mais conhecido como ‘Allan Kardec: defenso da f racionalizada toreia o nariz para tudo que de- safiasse a raziio, “No vejo nisso mais do que um conto da caro- chinha’, costumava dizer. Numa noite de maio de 1855, contudo, ele deixou 0 ceticismo de lado e foi até ontimero 18 da rua Grange Bataliere. LA, viu e ouviu os pés ‘de uma mesa batendo insistente- mente no chao, como se obede- cessem a um comando invisvel. Rivail, que mais tarde adotaria o pseudénimo Allan Kardec, quis entender a razio daquilo tudo. Dicidiu, naquele mesmo instante, iniciar uma longa ¢ minuciosa investigagio sobre eventos apa- rentemente sobrenaturais—espe- cialmente sobre a possibilidade de comunicacao com o além. A tarefa duraria o restante de sua vida. E 0 transformaria no codi- ficador do espiritismo. Muita gente insistia que as ‘mesas girantes erammovidaspela alma de pessoas mortas, ansiosas por estabelecer algum contato ‘com os vivos. O mesmo se dizia arespeito dos médiuns que, em- punhando lépis e papel, entravam > a1 emestado de transe e escreviam mensagens sobre temas que nem, sequer conheciam, Parar tirar a hisi6riaalimpo, Kardee recorreu a0 método cientffico: coletar evi- déncias, mensurétas, compari- las e analisé-las de acordo com a logica. A investigacdo, porém, nao seria nada facil. Exigiria muito rigore diseiplina, algo que eleaprendera com seus primeiros mestres, ainda na infancia. 42. Hippolyte Léon Denizard Rivail—ou melhor, Allan Kardec = nasceu no dia 8 de outubro de 1804 em Lyon, entao uma pacata cidade francesa, entre Marselha Paris. Filho deum juizedeuma donade casa, ambos catélicos, aos 10 anos foi enviado para estudar no Instituto Pestalozai, em Yver- don, na Suiga. Ali, recebeu uma educacao de primeira qualidade, segundo os métodos de Johann Heinrich Pestalozzi—-pedagogo de fama internacional que defendia uum ensino baseado no amor eno respeito aos alunos. Passou nove anos naquela escola. E saiu del4 absolutamente decidido: também queria ser educador, instruindo criangas e jovens segundo os prinefpios de seu mestre. Da Suiga, Allan Kardec se mudou para Paris, em 1823. Foi 14 que ele se casou e comegou a construir sua earreira no ma- gistério. Fundou, em 1825, uma escola inspirada nas ideias de Pestalozzi. No ano seguinte, ela seria transformada em colégio t6cnico: a Instituigao Rivail. Co- ordenar um estabelecimento de ensino, no entanto, signifieava encarar desafios com os quais ele nao estavaacostumado—eomaior deles foi denatureza financeira. A md administragio de seu tio ea concorréncia das escolas mantidas por ordens religiosas acabaram levando 0 negécio a faléncia. Para garantir o sustento, Kar dec teve de se virar com trabalhos auténomos, como 0 de guarda- livros (contador) em algumas empresas. 0 amor pelo ensino, contudo, nao esmoreceu. Quando tinha.algum tempo livre, escrevia livrospedagégicos, fazia tradugbes — jé que ele falava fluentemente francés, inglés, alem#o, espanhol e holandés ~ e ainda dava aulas gratuitas em sua casa, localizada na rua de Sdvres, ntimero 35. Aquelaaltura, omédicoalemio Franz Mesmer jéchamavaa.aten- do com suas experiéncias sobre magnetismo animal — também chamado fluido vital. Mesmer alegava que essa energia estava presente tanto nosseres humanos como em todo 0 Universo. Mani- pulando-a, seria possfvel curar doencas. Kardec quis conhecer os detalhes dessas pesquisas passou a frequentar os encontros da Sociedade de Magnetismo de Paris. Numa dessas reunides conheceu Fortier, 0 amigo que 0 apresentaria As mesas girantes. Entrevistas ‘Até entiio, mesas que se mo- vimentavam sozinhas e médiuns ‘que psicografavam mensagens niio passavam de entretenimento, ‘Mas Kardec, ao testemunhar esses fenémenos, propés uma aborda- gem diferente do assunto. “Ele reagiu como cientista e pensador de sua época, sugerindo uma observaciio criteriosa daquelas manifestagdes’, afirma Ceres Medina, professora de antropo- logia da Pontificia Universidade Cat6lica (PUC) de Sao Paulo. Com aajuda de colegas e ami. 08, 0 pedagogo passou a organi- zar sesses meditinicas nas quais fazia longas entrevistas com es- pfritos. Enderecava aos supostos informantes invisfveis questes do tipo: “de onde viemos?”; “para onde vamos?”; ‘qual ¢ 0 sentido da vida?” “Kardec solicitou que 08 coordenadores de sessies organizadas em outros lugares fizessem as mesmas perguntas’, diz. Ceres. “Assim, conseguiria comparar as respostas ¢ avaliar se existiam semelhangas ou divergéncias entre elas.” Ao final desse proceso, Allan Kardec tinha mais de50 cadernos abarrotados de dados. Noto que seus “entrevistados" ndo eram capazes de responder a tudo. “Cada espfrito, em virtude de sua posigao e de seus conheci- ‘mentos, revela uma face daquele mundo’, esereveu. Da andlise e da organizacio desse material cemergiu o que opedagogo francés chamou de “doutrina espfrita’, um conjunto de ideias sobre as relagdes entre o plano material 0 mundo espiritual. A doutrina foi apresentada ao piiblico na forma de livro- 0 Livro dos Espéritos -, abril de 1857, Nessa obra, Kardee explica que o mundo material é visfvel e habitado pelos vivos, enquantoo mundo dos espiritos é invisfvel O principio de tudo Fatos que marcaram 0 inicio do espiritismo moderno e eterno, destino da alma de tos dos os que morrem. Os espiritos encarnam sucessivas vezes, em busca de aperfeicoamento moral. Nomundo material, seu objetivo 6 evoluir rumo a perfeicéio. Em 0 Livro dos Esptritos, nota-se que Kardec sofria forte influéncia de outros pensadores do seu tempo. “Percebe-se, por exemplo, um claro pendor evo- lucionista, especialmente na afirmagao de que os espfritos esto em constante evolucao, aperfeigoando-se a cada etapa’, observa 0 socidlogo Flavio Pie- uci, professor da Universidade de Sio Paulo (USP) eespecialista em religiao. 0 codificador do espiritismo propunha uma “fé racionalizada’, em oposicao ao que chamava de “fé cega”. “Com 1804 1830 1848 11850 Neccrine mana, — | Cnepacraigl ‘slerdmenosdastens Fx, | Ospudersmaionics Mippote tio Deniard” | pmol iol states | do acs Dale uu avemedaae [demesne hos dotstemnhaies | Home concern a tomo Aare ‘lee ce reso porcatteasdepeoms. | mentite Rert Orrin inde steno sts erie Mereeese | perience procs oansind | Net ie shames | Folecetane Teebdana se, | cnoateaies crecear” | |eeheten pede batemloseerecedepos, ednor de eadeoase | Masipeude diate talgeeacamiboe” Pekka eats | serene bce Septet) Sinan fs onmeoouga ou cOMNONS 43 das praticas cristas, catélicas especialmente’, afirma a antrop6- Joga Sandra Stoll, professora da Universidade Federal do Parand (UFPR). “Esse foi um dos fato- res que levaram elites e classes médias da época a se sentirem atrafdas pela nova doutrina.” ‘Nao por acaso, gente famo- sa, como 0 astrénomo Camille Flammarion eos escritotes Victor Hugo e Arthur Conan Doyle, se interessaram pelo trabalho de Kardec. “Sua casa passou a ser frequentada por intelectuais de varios pafses, que queriam conhecer suas pesquisas”, conta Matheus Laureano, presidente da Associagao de Estudos e Pesquisas Espfritas (Assempe), 4 em Jodo Pessoa (PB). Grupos de . estudo pipocaram em todas as rie a partes. 0 codificador batizou os novos adeptos de “espfritas” Para facilitara comunicagao com eles promovera divulgacdo da dou- trina, lancoua Revista Espérita, ‘em 1858. Nomesmo ano, fundoua Sociedade Espfrita de Paris, que presidiria até sua morte. Blasfémias Em 1861, Kardec publicou ou- tro pilar do espiritismo moderno: 0 Livro dos Médiuns, um con- Junto de instrugées para aqueles que queriam se comunicar com 08 espfritos. Trés anos depois, velo 0 Evangelho Segundo o Espiritismo, uma andlise dos ensinamentos de Jesus sob a 6tica espfrita. A Igreja Catélica nao gostou. Suas obras foram consideradas blasfémicas, en- traram para a lista dos livros proibidos ~ 0 Index Librorum 1854 Prohibitorum —e chegaram a ser queimadas em praga piiblica (leia mais no quadro ao lado). “Os cédigos espiritas de Kardec preconizavam comunicagio com os mortos, evolugaio ereencarna- dio, ideias que se chocavam com. as teses correntes no imaginsrio cristo”, diz Sandra Stoll. Atéaquele momento, 0 codifi- cador se referia doutrina como um misto de filosofia e ciéncia. Ele préprio nao seguia uma reli- ido —filho de pafs catélicos, mas educado num pats protestante, desde muito jovem optou por ser um livre-pensador. “Com 0 tempo e as sucessivas persegui- (Ges, no entanto, Kardec acabou admitindo que o espiritismo era também religioso-cristao”, diz Ceres Medina. A preocupagao com aevolugio moral, diziao co- dificador, est4 presente em todas Osimaos Davenport, dois magioos americanes, ganham dinheiro com “emamenos eps Anes epi, 1852 1853 catwiusbnst ary Has pevaia = (1855 Ergaioopineo | Na Fama ojomal See cere ——’ femimenodeine tec: | Metis aca eee uns‘ estitar, —“omindotndo tem emyatose ple soaerehee, ‘aie trrfomacs Pome ee Reon aaeogere “rama eet oe Seat oes meragens mee ciam |e eer wens stodonea an mmo Noare sega Fine euetleprateos Abn Kr onal Geeciscdore’ | Iemipenre eae «como instrumentos musica. 44 {ipo de fendmeno, cespirituasconfiemariam ‘questa miso nese plano da vida seria formar ‘os ciigos de uma nova doutrina: 0 espirtsmo. as religides; portanto, no havia, nada de errado em considerar sua doutrina uma religiao. “Foi um jogo de cintura, para evitar que 0s espfritas continuassem a ser perseguidos.” Essa decisio, contudo, ndo alterou a insisténcia de Kardec em um ponto: ele nao queriaser considerado 0 fundador do espi- ritismo, menos ainda o criador de umanovareligido. “Allan Kardec se dizia apenas seu iniciador, ow melhor, 0 codificador’, afirma Matheus Laureano. Como tal, 0 pedagogo morreu a3 de marco de 1869, vitima da ruptura de um aneurisma, Quase um século meio depois, é impossfvel des- vineular sua personalidade da doutrina que ele apresentou ao mundo. Em seus dez livros dedi- cados ao espiritismo, esto todas as suas facetas: um pensador, 1857 ‘oLApoROU EDUARDO SZKLARZ. LITERATURA HEREGE Como na Inquisisao, livros de Kardec foram parar na fogueira ‘Um dos fundamentos do espriismo. eafeniope Mankardee 6 atolerancia religiosa, Mas nao oi esse tratamento que a doutrina recebeu da Igreja Catolica no século 19, Ao contrario: a Santa Sé levou 2 cabo uma perseguicao contra os cespiritas que lembrou a Inquisicao medieval —quando judeus, cdtaros, protestantes, bruxase outros *hereges” foram queimados na fogueira. Em 186, no episodio que fcaria conhecido ‘como Auto de Fé de Barcelona, a lgreia mandou queimar em praca pablica ‘cerca de 300 livias enviados por Kardecao livreito Maurice Lachatre. Tudo porque Antonio Palay y Termens, um cientista e, acima de tudo, um educador. Ou, como disse 0 astronomo Camille Flammarion ao discursar em seu funeral: “Acima de tudo, Kardec era 0 bom senso encarnado’. 1861 entao bispo da cidade expantola, considerou as obras “imorais econtrariasaf6 catolica’, Sua decisio, contudo, atigou ainda mais a curiosidade das pessoas em rela¢io ao espirtsmo, Conta-se ue, depois que os livros arderam 1a fogucira, varios barceloneses| disputaram as paginas fue, embora chamuscadas, ainda podiam ser lias, veo ‘Allan Kardee-0Etwcndr eo Cdcaor, Zeus Want eFrancso These, FEB, 2006, ‘Emdaseresasvlumes esa uma ds ‘mas dtadas eabrangents bogs Settarder, completa caress ‘mabimporantes sista do espirtsmo 0 fot6grafo-americano Wiliam ‘Murer causa arog 2 diular ‘oma pubicagio 2 princi oto esprit da de Olivo dos Expires, 1558. ‘um autorrerato em que pode 1869 eure ‘Allan Kardec funda Kardeclangaa Revit ‘eis um fantasma. Anos mais Kardec morre em Paris DESESPRITS | Gespitsmocomo Expt Idcsexpostas tarde Sra acsado de rude, 2ov64anes Ofundador Ca ‘9 conhecemos hoje. ali seriam compiladas mais ‘mas nunca foi condenado. ‘da doutrina espirita deixa ‘obra reine os Tarde em obras dss tnacabada ume obra sobre Pincpisdadoutrina, _ doespitsmo: Oto sstelagbesenteo Codifcada com baseno dos eduns (86, tmagnetismo eo expirismo. fStudode endmence,” 0 Bango Segundo Ese tml pode er iia ocordos 0 spntsmo (664), fem ances: “Nascer, mower, fosanosanterioes. Oca lnfemo 1865) renascer progreirsem | (leia mais na pa. 48) eA Genes (1868). ‘essay tal ale” Ree mae RTT Pune seer) tinha virado modana Europa: De a Ae Peace ec espiritos, que respondiam mo- Se Ronen een ta Pree CL eMac ermt aC eS mC ene OOS Pec Cm Roan Cec ete Peer eaten an Perec ee eee eet mec acc eany pa aceon Per eer DOCU cre cm eerie Come e toons Cree ces) Pere ete ee Con enon Ren cud Preeti a: Ao oe Poo teary Cece ray Pere et ers eee eed ee Ses cay aati) Pe ety Ce ey Ca Sete Seer crn eee cr) TT) ree y ered Cent ry eee) ees ei) Pe entry Cero eee es Peete Fo raros 0 relatos de mesas que Ceres Ceca SONS E LUZES oom celuzes sem origem aparente, Cees Pe Pernt ere y Saori eres ar cee ene corte et eas a mesa, jd que é através do movel ern ees ee ers Set nd See) Ce etd PRO Ver para Varios cientistas famosos — entre eles um vencedor de Prémio Nobel — fizeram. experiéncias com médiuns; e safram dizendo que era tudo verdade POR EDUARDO SZKLARZ. DESIGN MONKEY ILUSTRACAO DANIEL ROSSINI ais ou menos como bambolé nos anos 50-60 € cubo mégico nos 80, comu- nicagdo com os mortos virou uma febre na segunda metade do séeulo 19. Tudo comegou com os estranhos acontecimentos envol- vendo as irmas Fox, a partir de 1848, Numa pequena cidade dos Estados Unidos, as meninas Katee Margareth convenceramatodos de que eram capazes de “conversar” com espiritos (Leia mais napdg. 34). Anotfcia correuo mundo. E tentativas de manter contato com © além se tornaram frequentes, tanto em territério americano quanto na Europa. “Proliferavam as reunides em torno dos médiuns, pessoas que reivindicavam o poder de interme- diar a transmissio de mensagens eepirituais’, diz a pesquisadora >- ——w~ Médiuns divertom as pessoas numa reuni da alta sociedade parisiense 48 investigacées SL — ey 3+ Juliana Hidalgo Ferreira, autora EUSAPIA PALLADINO Testada e aprovada por um criminologista A italiana Eusapia Palladino foi primeira médium de efeitos {sicos (materializagdes, ‘movimentacao de objetos, distancia etc) aser ‘estudada por centista, ‘Nascida em 1854, na Cidade de Népoles, ela perdeu a mieapds 0 parto foi entregue pelo paia um casal de amigos. “Tao pouco Ineresse eles tinham pela ianga que, antes de completar ‘ano, ela cal lesionou seriamente a cabeca’, escreveo pesquisador Palhano Junior no live Eusapia, «a feitceira (Léon Denis) “Da fenda craniana, os cientistas abservariam, anos depois, a saida de um sopro rio ‘quando a médium entrava em transe.” ‘os 8 anos, a menina foi abandonada na rua, mas acabou sendo resgatada or uma familia que se divertia bastante com ela. que mesas e ‘adeiras rodopiavam sozinhas quando usapia estava por perto, As 23 anos, em 187, 01 descoberta pelo conde spa Ercole Ciaia, que convidou. ‘ criminologista também italiano Cesare Lombroso para estudsa, Lombroso recusou a empreitada por tr anos, mas finalmente topou. ~ desde queareunio fosse a luz do dia, sem a presenga de pablico eno quarto do hotel onde se hospedava em Napoles. 1, testemunhou a levitacdo de varios objetos. Eatestou que os fendmenos ‘ram verdadeiros Foi inicio de uma maratona de experiencias a que a médium se submetera —S = ——r 50 do livro Estudando 0 Invisével (Educ). As manifestagdes me- ditinicas observadas naquelas ocasides variavam bastante: iam. desde as “inteligentes” (textos psicografados, por exemplo) até as de “efeito fisico” (ocorréncia de sons e luzes e objetos que se ‘mexiam sozinhos). Curiosidade, mais que qualquer outra coisa, alimentava aqueles encontros. A ‘maioria dosmédiunsera vista como entertainers sobrenaturais, Bsuas apresentagdes atrafam plateias cada vez mais numerosas. Houve, no entanto, quem entendesse os fenémenos como algo bem mais profundo que um espeticulo fantasmagérico. Com base nas demonstragdes suposta- mentemedifinicas, alguns curiosos passaram a elaborar teorias € formular conceitos, até que todo esse esforco intelectual dese origem a uma doutrina filoséfico- cientifica. Para essa corrente de espiritualistas, néio era magia 0 ‘que estava por trés da habilidade dos médiuns. As manifestagoes ‘que eles protagonizavam tinham. fundamento cientifico. Abacaxis ‘Antes de avangar na histéria do cientificismo espfrita, 6preciso entender a concep¢ao de ciéneia que vigoravana época~mareada pelo empirismo e pelo positivo. Isso quer dizer que, para os aca- démicos que ditavam as regras da produgsio cientifica, a tiniea fonte vilidade conhecimento era ‘a experiéneia. Ou seja: a autenti- cidade de qualquer fendmeno s6 poderia ser confirmada por meio darepeticao, devidamente aferida pelos sentidos humanos. “Os cientistas trabalhavam com regularidades. Precisavam de fendmenos que se repetissem para estabelecer as leis da fisiea, da termodinamica, da heredita- riedade, da evolueao das espécies, e.assim por diante’, diz, o quimico Gilmar Trivelato, que investiga textos psicografados pelomédium Chico Xavier (leia mais no qua- dro da pag. 55). *O positivismo néio admitia nada fora desse mé- todo.” Déparaimaginar, portanto, © tamanho do abacaxi que os ientistas daquela época teriam de descascar caso se metessem a estudar fendmenos espirituais. Afinal, como levar os espiritos para dentro de um laboratério? Foi nesse contexto que Allan Kardec, o fundador do espiritismo moderno, apareceu, criando a maior polémica. “Nao é possfvel experimentar com espfritos como se faz com uma pilhavoltaica’, ele escreveu. A doutrina espirita, que Kardee havia codificado em * _———ccquwWwW Villiam ¢rookes, a médium Florence ‘crook (no chdo) © 0 espirito Katie King investigacées Ela materializava o espirito de um sacerdote hindu ‘Afrancesa Marthe Berdud, mais conhecida pelo pseudénimo Eva Carriére, deu inicio a sua carrera {de médium apos a morte do nnoivo, Maurice Noel. Em reunides familiares, passou a materializar lum espirito que dizi ser Bien Boa — sacerdote hindu que vivera 300 anos antes, “Numa dessas sess0es, 0 espiito soprou em um ‘tubo com agua de barita fusada para identficar gas carbonico] © fez a dgua embranquecer’ afirma © pesquisador espiita Palhano ‘inior, “Era como se respirasse tal qual um ser vivo.” Eva foi estudada pelo francés Charles Richet, Prémio Nobel de Fisiologia e Medicina em 1913, econvenceu-o de que as ‘materializagbes eram auténticas. — 40 Livro dos Espiritos, de 1857, tinha nascido justamente para ampliar os domfnios da ciéncia. Eppropor um jeitonovo deenxergar ‘omundo—segundo o qual acomu- nicagio com os mortos seria algo ‘4io comum e natural quanto qual- ‘quer fenémeno da natureza, Acordeaio (Oabacaxi era grande, mas no impediu que cientistas de renome investigassem médiuns e seus fendmenos espirituais. O inglés William Crookes foi um desses investigadores. Membro da pres- tigiosa Royal Society, de Londres, o sujeito tinha um currfeulo inve- Jével. Foi ele, por exemplo, quem descobriu 0 télio ~ um dos 112 elementos quimicos que aparecem natabelaperiédica—edesenvolveu. 0s primeiros equipamentos para Provas e contraprovas Alguns médiuns foram parar na cadeia; outros passaram ilesos pela avaliago de ciontistas 1872 1873 » 1874 ‘ingest Moses revereno | Mnfestagesespis | O mtu Franc rd Siiiagonasmenes | emacepeetimges | Monctar denanstpss tetana‘Gmomeii, | Witomesoao tad, | demas ns ecneeett [ineeceas | ueemia cere; sstewnene dedsty | Uden cmc ieee ooo Setieecebe | Sereeetipes Ser piss 183) | Cesprommen vires | Unpremta oreo a, jeer || at ecu sspeoedebla | fc Nenhuna Sopsrods te fraud &comprovada, Ninguém consegu © estudo da radioatividade, Era um cético empedernido, mas co- megou a amolecer apés a morte do irmiio cagula, em 1867. “Crookes detectou fraudes em varios mé- diuns’, afirma Juliana, “mas aca bouse convencendo daexisténcia de fendmenos auténticos, supos- tamente comandados por alguma forma de inteligéncia” Dois médiuns atrafram sua atengao em especial: 0 escocés Daniel Home e ainglesa Florence Cook. O primeiro, além de movi- mentar objetos a distancia, era capaz de uma proeza, noménimo, original: fazia um acordedo tocar segurando-o com apenas uma mio, pela extremidade oposta a do teclado. Entre 1870 ¢ 1871, foi submetido pelo cientista a um teste, em ambiente controlado e diante de testemunhas. Para es- 1875 instaurase na Franga.o Process dos Espiitas— uma aco motivada por ad fraud comprovada em “fotogafasespiriuas” de Edouard Buguet Alem do autor das fotos, foram condenados a malts e prisao outros dois supostos médiuns. in panto de todos os deserentes que presenciaramacena, o instrumen- to tocou. E Crookes decidiu se converter ao espiritismo, Florence Cook, por sua vez, materializava um espfrito que atendia pelo nome de Katie King. Durante as sess6es meditinicas quea tornaram famosa, ela ficava isolada do pitblico, sempre atris de uma cortina. De repente, surgia Katie, que circulava em meio & plateia enquanto Florence perma- necia oculta, Cheiro depicaretagem no ar, nao 6 verdade? William Crookes, no entanto, garantia: a materializagao era real. O cientista teria visto médium © espftito lado a lado algumas -veres, Embora parecidas, ele dizia, Katie era mais alta e bonita. Flo- rence usava brincos, enquanto as, orelhas de Katie nem eram furadas, 1876 | american Henry | Sade aa inher | com demonstrates de leila e materiizaro, | fits em pena uz dda Ese mero | aisameso,espios dksavamn meneageas te faces interna de as tous colds una uta Crookes chegou a fotografar 0 espfrito, mas nunca explicou di- reito por que a médium niio apa rece ao lado dele em nenhuma foto. “Existe apenas um retrato em que as duas aparecem juntas’, diz Juliana. “Mas Katie encobre 0 rosto de Florence Cook.” Ectoplasma Quem também viveu cercada por cientistas — e desde muito Jovem ~ foi a médium britdinica Elizabeth Hope. Mais conhecida como Madame d'Esperance, ela demonstrava um notével conhe- cimento quando entrava em tran- se. O pesquisador '-P. Barkas, respeitado intelectual da cidade de New Castle, preparava pergun- tas sobre diversos ramos da cién- cia, ela respondia escrevendo em inglés, alemio e até latim, — MICHAEL FARADAY 0 cabeca da turma que desancava o espiritismo Se existiu um cientista que nao arredou pé do ceticismo em relagao aos médiuns, esse cientista foi o britanico Michael Faraday. Famoso por seus estudos de ondas eletromagnéticas, costumava dizer que a ciencia nao deveria “perder tempo com crendices e supersticies" Para reunir argumentos que sustentassem essa retérica, Faraday estudou varios ‘médiuns. Demonstrou especial interesse pelos fendmenos de mesas gitantes. “E concluiu que os movimentos eram pprovocados por acbes musculares inconscientes das pessoas presentes’, diz pesquisadora espirita Juliana Ferreira —S wr 71880 71882 1889 FEmdiscusonaAssociagao | fundadanainglaterraa_—_Aconteceem Piso Drtanica de Espitstas, Sociedade para Pesquisas Congreso Fspritae ‘omédium Vila Moses Piqua, primeira Espirivalsta Internacional ‘dara: “Precsamos insted dedicada 20 (© prmeio ocorera um de dsciplina eeducacio’ {estudo de fend menos ‘anoantes, em Barcelona, Era uma referencia spiriuas. Nosanos na Espana) Paes aoscharlatbes que Scqints, ntdades dos nea continenes Sedeclaravam médiuns semethantes surgiram ‘enviaram representantes — Cecobravam porfenémenos | também na Franga entre mediuns,segudores Supostamenteespiitua. nos Estados Unidos. da doutrina eestudioses, Coches 53 Na opiniao de Barkas, era preciso admitir que ninguém po- deria, “por um esforgo normal” e sem ter familiaridade com os te- mas, responder com detalhes a perguntas tio dificeis. Maso maior dom de Madame d'Esperance era amaterializagao, jé que ela forne- ciao que os espfritas chamam de ectoplasma —um fluido que ema- 54 na do corpo do médium, permi- tindo que formas se materializem. diante dele. Era assim que @ Esperance materializava 0 es- pirito de Yolanda, uma moga que foi para ela.o que Katie Kingtinha sido para Florence Cook. Nesses momentos, dizia a médium, era como se uma teia de aranha se formasse em torno dela. Os poderes meditinicos de Madamed’ Esperance foram pre- senciados varias vezes pelo diplo- mata russo Alexandr Aksakov e pelo editor britdinieo William Oxley entre 1880 ¢ 1890, No livro Angelic Revelation (Revelagio Angelica”, sem tradugao para o portugués), Oxley desereve a materializagio de27 rosas eum Iirio dourado, que teriam durado trés meses antes de desaparecerem. Aindanessa obra, © editor garante ter bejjado uma crianga materializada a poucos pasos da médium. Namesma época, o americano Henry Slade também deu o que falar. Ele ficou famoso em suas andangas pela Europa ao mate- rializar palavras em ardésias, Ciemtistastestemunham a materializacso dem espirito: cena tipica do século 19 ——_—————— fazer mesas girar e promover le- vitacdes. Impressionou virios cientistas, entre eles o astronomo francés Camille Flammarion. Ganhou um bom dinheiro com cessas demonstragdes, Masacabou evado aos tribunais pelo bidlogo inglés Ray Lankaster, queoacusou de fraude. 0 médium tinha pres- tigio junto a alguns cientistas importantes, Entre suas testemu- nhas de defesa, por exemplo, estava.onaturalista inglés Alfred Russel Wallace ~coautor da Teo- ria da Evolugao, ao lado de Char- Jes Darwin. Nao adiantou: em 1876, Slade foi condenado a trés meses de prisio com trabalhos forgados. Senadvogado apelou, eeleacabou solto mediante fianca. ‘Aodeixaracadeta, Slade passou a organizar sessdes na casa do astronomo alemio Johann Zoliner. Nelas, o cientista verifieava que n6s cegos surgiam em cordas de pontas atadas. E que palavras apareciam nas faces internas de duas lousas coladas umaa outra. Em 1887, cinco anos apésamorte de Zollner, omédium tornouacair em desgraga. Foi considerado impostor pela Comissao Seybert, formada por pesquisadores ligados A Universidade da Pensilvania, nos Estados Unidos. E terminou seu périplo num sanatério— onde morreu solitério, em 1905. “€ i CHICO XAVIER NA MIRA Quimico brasileiro quer descobrir se ha fraude em livro psicografado 0 quimico brasileiro Gilmar Tivetato lidera uma pesquisa que pretend descobri ses fatos narradas por Chico Xavier no livro Rentini (FEB) so verdadeiros. A autora da obra, psicografada em 1942, éatribuida a0 espiito Emmanuel. Trata-se de ‘um romance hist6rico supostamente baseado em fatos reais, cotridas durante o século 17 em vatios pases. 0 que Trivelato esua equipe estio fazendo € desconstruir a historia, identfcando fatose personagens passives de verficacao. Exemplo: «em dado momento dolivro, Emmanuel afirma que a Catedral de Notre-Dame, em Paris, tinha escadas durante oreinado de Luis XIV, Quem id esteverna igeeja sabe que, hoje, no hé escada nenhuma por. Masa equipe a constatou que ela exitiram. “Temos evidéncias de que boa parte dos fatos descrtos no livro € verdadeira’,afirma Tivelato. *Omédium psicografou essa obra {em apenas seis meses. Isso indica {queas informagies realmente podem ter vindo de uma fonte externa” [=e —T! uvros ‘Estadando nivel: Wiliam Cooke a Nora Fara lan idaigo Ferret, Eu, 2004 Um estudo sobreas experiencia qu gs {ezcom dvrsos mins nfl do sco 1% Exsapin a Fete, Palhao iio, 1D, 2008, Ute reve elt da via eds pderes ‘medidica da alana Caapia alli. 55 4 quem niio reco- nhega 0 escritor escocés Arthur Conan Doyle pelo nome, mas é bem dificil encontrar alguém que jamais tenha ouvido falardo personagem mais famoso inventado por ele: Sherlock Holmes. Os romances policiais estrelados pelo detetive garantiram ao sen criadorum lugar de destaque na historia da litera- tura, O que pouea gente sabe, no entanto, é que Conan Doyle, além. de brilhante romancista, também foi um dos mais aguerridos divul- gadores do espiritismo. Oriundo de uma familia catoli- cae educado por jesuitas, Conan Doyle nada tinha de espfrita até 0828 anos de idade. Ao contrat Depois de se formar médico, em 1882, revelou-se um tremendo materialista, Renunciou no ape- nas ao catolicismo mas a toda e qualquer religiio, passando ase autodenominar agnéstico—aquele que se julga incapaz de afirmar se Deus existe ou nao. Tudo mudou em 1887. Depoi de visitar o amigo Alfred Wilkes Drayson, um importante astr nomo convertido ao kardecismo, Doyle voltou para casa quase’ convencido de que a existéncia de Vida apés a morte era um fato, “Ble nfo era homem de aceitar facilmente as coisas”, afirma a pesquisadora Maria Aparecida Romano, em artigo publicado na Revista Crista de Bspiritismo. 4 ‘Doyle em meio a sua colegS0 de fotos espiitas », €Obetossupestamente materializados “Mas, diante dos seguros argu- mentos apresentados por Drayson, foi levadoameditare leralgumas obras espfritas. Em pouco tempo, estava familiarizado com as ver- dades da nova doutrina.” Semeador Espiritismo, Aquela altura, j4 nao era novidade. 0 Livro dos Espiritos, no qual Allan Kardec estabelece os principios da dou- trina, j4 circulava havia 30 anos. Mas demonstragdes de mediuni- dade, como as famosas sessoes de mesas girantes, continuavam mobilizando coracdes e mentes. Doyle passou a frequenté-las. Numa dessas reunides, ainda desconfiado de que tudo nao passava de trambique, perguntou as entidades que ali se manifes- tavam: “Quantas moedas tenho no bolso?” Ouviu como resposta uma desconcertante reprimenda: “Estamos aqui para instruir e elevar as almas, nao para fazer adivinhagées”. Dali em diante, Doyle se entregaria ao estudo de fendmenos supostamente espirituais. E nao apenas se converteria ao espiritismo. Ele se transformaria numa espécie de soldado da doutrina, Nas décadas seguintes, 0 es- critor alcanearia fama mundial com as aventuras de Sherlock Holmes. E colocaria todo 0 prestfgio amealhado com elas a servico de sua nova crenca. Doyle atrait multidées a dezenas de palestras doutrinérias. De 1915 em diante, praticamente abandonou a fie¢Zo — passou a escrever apenas obras espfritas. Atais conhecida, Histéria do Espiritismo (Pensamento), um classico ~ até hoje considerada um dos mais completos relatos sobrea origemeo desenvolvimen- to da doutrina. “Dada a projecao de seu nome’, diza pesquisadora Maria Aparecida, “deve-se a Arthur Conan Doyle parte da penetracao do espiritismo em muitos paises, notadamente aqueles de lingua inglesa.” ‘€ ‘A Nova Revelpae, Arthur Coran Doyle, 8, 1996. Nessepequee lio (35 wisn), publiado originale em 118, «estar descreve fom se deu sa conversio ao espe. ELEMENTAR, MEU CARO DOYLE een tart CO envolvimento de Arthur Conan Doyle como espiitismo rendeu problemas para Pree r eter arts eee ee Ce eed Port tear eae Oe et eee ez anos de revolucao comurista, Peer nwa) 0 ocultismo, escritor foi cer Meuron Ce DN ae OL ery Brera tea int ere toi tt ec eae eee og tt acusado por Stalin de Farer Coe nie occu Ru eerie Sener ae Houdini |.«0 cacador de médiuns -. Além de ser um dos magicos mais engenhosos. que o mundo ja viu, ele também entrou para PY ns Cose Meena tuttomitrintoxw Ec oRes ate trtonte) Mee Coca aes om ent Onc) eens eaters Numa épocaem que Poe enemy rete nro ee Reet Me Cre oe ne Sener ec ucy Houdini (1874-1926), 0 mestre reece re Emer cs Nee eee eee Cee ree een populares quanto ele. Um de seus Pee a eer Poecer toe tl cece Umer cs ean cone ums Tras Oe OU Re nie Res NRE est one cet precocemente. E que Houdini, além de ser considerado um dos Peer encod 0 mundo ja viu, entraria para a Ire Coreen een a nimero I do espiritismo. Pent curt Ree eraser nne Pee cee eee So eee Reo CCR atte ree Eee artes! eee Re Cte COR eC aT eee terete ete Cemireenre tenes met nas guas geladas do rio Hudson, Oe ence Cesena eset rentty Ce eta eee ee a ee eee Ea aye Mee ee eas Dre Re TEC Uae Perera tet etern ni See ne nat ee eat Ceres Pe Ou mom ore eee eee ree Con Tne eS ae Preineeeierreeaery Sea en eon et Pee eRe ee Pree eRe eer ec ema Oar ee ne cn Beene men Cee mercer oan Sere ORR Reece eee ecg Cree arenes Piet eee Cena Ree RR te err rere nRe ne) SU emcee! ce ee oo ts Peace CCM ncn Been ee REN nc specifica: 0 autor da proeza deveria Dee ee Steed eae cay Perry ences et em seu leito de morte. Muitos se A SAGA CONTINUA Prémio pa fendmeno e (0 desafio feito por Harry Houdini em 1826 ontmua de pé:leva uma grana pet rovaraautenticdade de um fendmeno prt, $6 que 0 valor do pre auumentou em vez de 10 mil, 1 milhao de délares. Quem oferece a bolada, agora €o canadense James inspirador, ele também foi md ni. Como seu escapist candidataram ao prémio. Mas a ere nace Recon Cerrar i Corrects Tae Sete On Meee Te eee cc Pe tues rs Peer ese eeTary cece cae ee as gico, na verdade, era ele proprio Pe eo SRL St A oC Ic ee cate enn eee Geer etenc eee eee eee Coors rere Miers ere een seen eer ete ne of the Unknown (40 Limite do Deas Ope me ed para o portugues). Por mais que Oren eetece eer ieee nee eee ee Eassim os dois permaneceriam, Se Cae een RC Bad} owe rr ON ee ae ed es en ec) Peer eeranee tae ees iritual agora é de US$ 1 milhao s Fstadas Unidos um finslucrativos quel pleitearodinheir, bas de sua funda nena ido desde 196, a uae ee ee a es hoje se dedica a desmas detentores de pode de Houdini, ninguée foi paz de levaropréi 60 Amor e Odio a primeira vista Quando comegou a conquistar adeptos também. por aqui, a doutrina foi condenada pela Igreja Catélica e perseguida pela policia do Império POR MICHELLE VERONESE. DESIGN MICHELE KANASHIRO_ILUSTRACAO LICIUS BOSSOLAN mundo estavabas- tante agitado em 1860. Enquanto ‘tropas do Exéreito britinieo invadiam Pequim, no final da Guerra do pio, © revolucionério Giuseppe Gari- baldi ocupavaa cidade de Palermo, em mais um capitulo sangrento da Iuta pela unificagao da Italia, Nos Estados Unidos, 0 advogado e magom Abraham Lincoln virava presidente—oprimeiro eleito pelo Partido Republicano. Aqui no Brasil, entretanto, nenhum desses assuntos era mais discutido que ‘uma novidade recém-chegada da Franga: a possibilidade de comu- nicag#io com os mortos. — ‘Sessio medica no Brasil de meados do século 19: dscrigao era palavra de ordem As noticias davam conta de que 0 pedagogo ¢ pesquisador Hippolyte Léon Denizard Rivail, mais conhecido como Allan Kar- dec, mergulhara numa profunda investigagdo sobre vida apés a morte. E chegara 8 conclusao de ‘que, sim, 0 espirito de uma pessoa morta poderia entrar em contato conosco. A reagio de quase todo mundo que ouvia falar dessa his- Loria pela primeira vez misturava desconfianga, medo ¢ fascinagao, Compreenstvel, portanto, que 0 tema estivesse na boca de todos. ‘Nastodinhas deintelectuais, ounas festas que movimentavam acorte do Brasil Império, s6 se ouviam perguntas do tipo: O que Kardee descobrira exatamente? Como os espiritos poderiam se manifestar? O que eles teriam a dizer? Obom senso, porém, mandava falar baixo sobre 0 assunto, Na- quela época, asociedade viviasob ‘duas batutas—ado imperador dom. Pedro Il ¢ a da Igreja Catolica. 0 catolicismo era a religido oficial e condenava qualquer credo que fosse contrérioaosseus principios. (Ou seja: 0 espiritismo tinha tudo para desagradar ao clero. “Anova doutrina reunia filosofia, ciéneiae religiio, propondo a reinterpreta- io de varios conceitos cristaos’, diz Ceres Medina, professora do departamento de antropologiada Pontificia Universidade Catética (PUC) de Sao Paulo. Kardec afit- ‘mava, por exemplo, que, “em vez de uma tinica vida, podemos ter inimeras existéncias’, Nametade doséeulo 19, teses como essa eram potencialmente incendifrias. 6

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