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Neuropsicologia das fungées executivas e da atengao ‘As fungdes executivas cor- respondem a um conjunto de habilidades que, de forma integrada, permitem ao in- dividuo direcionar compor- tamentos a metas, avaliar a eficiéncia e a adequagao des- ses comportamentos, aban- donar estratégias ineficazes em prol de outras mais efi- cientes e, desse modo, resol- ver problemas imediatos, de ‘médio e de longo prazo. Essas funcbes si0 requisitadas sempre que se formulam pla- nos de aco e que uma sequéncia apropria- da de respostas deve ser selecionada e es- quematizada (Robbins, 1996). Para a realizagao bem-sucedida de di- versas tarefas cotidianas, o individuo de- ve identificar claramente seu objetivo f- nal e tragar um plano de metas dentro de ‘uma organizaga0 hierarquica que facilite sua consecucao. Em seguida, deve executar ‘ passos planejados, avaliando constante- ‘mente o sucesso de cada um deles, corrigin- do aqueles que nao foram bem-sucedidos e adotando novas estratégias quando ne- cessirio. Ao mesmo tempo, o sujeito deve ‘manter o foco da atengio na tarefa que es- 14 realizando, monitorar sua atencio e in- tegrar temporalmente os passos que jé fo- ram realizados, bem como aquele que esti sendo executado e os seguintes. Ele também rege erin reer Coen Po es oe) Prope e tes Cre es Cena ere ea Peas eee LEANDRO F MALLOY-DINIZ {JONAS JARDIN DE PAULA MANUEL SEDO DANIEL FUENTES WELLINGTON BORGES LEITE devers armazenar_tempo- rariamente em sua memé- tia as informagbes que sero ‘usadas durante toda a reali- zagio da tarefa, e esse arma- zenamento temporirio de- ve ficar “protegido” do efeito de distratores. Essa organiza- ‘40 de procedimentos garan- teque tenhamos um bom de- sempenho em atividades do dia a dia, sobretudo naque- las tarefas mais complexas, que necessitam da escolha de procedimentos, da hierarqui- zacio de passos e da administracio de in- formacdes. Atividades em que hi um maior nivel de ineditismo também demandam maior envolvimento das fungdes executi- vas, Mesmo em tarefas corriqueiras, falas nas fungées executivas tornam sua realiza- «sao verdadeitos desafios para pacientes com comprometimentos cerebrais adquiridos cou com desenvolvimento anormal do siste- Diversos sao os modelos tedricas que definem as fungoes executivas, Ees diferem entre siem relagio as seguintes hipoteses: 1 116 De acordo com Kluwe-Schiavon, Vio- Ja e Grassi-Oliveira (2012), varios mode- los te6ricos sustentam a proposta de que as fungoes executivas correspondem a/um construto tinico, Entre os exemplos de mo- elos te6ricos que sustentam essa afirma- lo, citamos as (a unidade 3, ou unidade executiva, corres- ponderia a base das funcdes executivas) ¢ 0 ‘Outros autores consi- deram que as fungées exe- cutivas compreendem, Eee ‘08 quais = teragem entre si em uma es- trutura hierdrquica ou sim- plesmente paralla (ver Seriam, dessa forma, uma espécie de (@acchuva que abarca diversos processos,co- ‘mo meméria operacional (ou meméria de trabalho), planejamento, solucio de pro- blemas, comada de decisio, controle ini {rio luencia, lexibilidade cognitiva e ca- tegorizacio, Ente os autores que propéem a exis- téncia de miltiplos processos executives operando de forma hierarquizada ¢ se- quencial, poderos citar Batkley 2001). © autor foca nos processos de controle bitoria, os quais poderiam ocorver em trés niveis dstintos (Os processos inibitérios contribuem para a atuago eficaz de outras fungbes exe- cutivas: ~ Meméria operacional: envolve a manu- tengao de representagoes mentais, re- trospecgio, prospecgao€ orientagao temporal — Fala internalizada: comportamento en- coberto envolvendo autoinstrugao, defi- nigto de regras, orientagao a partir das eae ee ees errs Ce ee Cen simplesmente paralela, Fuentes, Malloy-Dini, Camargo & Cosenza orgs) regfas definidas,raciocino moral erelle- xo sobre o comportamento em curso. (GORGE) sivago, motivaco, Controle sobre oafeto, atvidade levan- do em considerasio a perspectiva social e direcionamento& conguista de metas — (REGGESERGIERE, sintaxe comportamen- Tal envolvendo fluéncia (verbal ¢ ndo verbal}, criatividade, ensaios mentais, andliceesintese comportamenta Esses quatro _proces- ‘50s, quando otimizados, per- mitem a 3 qual é ca racterizada_ por comporta- mentos dirigidos a metas, de forma persistente e com a concomitante inibigao de comportamentos irelevantes Outros autores, como Lavak HOW sugerem a exis téncia de um processo composto por eta) Para eles, as fungGes executivas apresentam quatro ‘componentes principais:a volicio, o plane- damento, a acdo proposital ¢ 0 desempenho_ sfetivo. A voligdo esté relacionada 20 nosso comportamento intencional, envolvendo a formulagao de objetivos ¢ motivagio para iniciar um comportamento ditigido a rea- lizagao de metas, por mais simples que se- jam. O planejamento engloba a identifica- ao de etapas e elementos necessérios para se alcangar um determinado objetivo. En- volve a andlise de alternativas concorrentes ea escolha daquela que, a prinefpio, parece ‘mais apropriada para a consecugdo do obje- tivo em termos de custo e benelicio. A agdo propositada envolve atransigdo da intengdo € do plano para o comportamento em si, 0 ual, por sua vez, deve ser iniciado, susten- tado ou alterado (dependendo de sua eficé- cia), interrompido (quando necessério) ¢ integrado a outros no contexto da solugdo do problema atual Esse processo envolve a capacidade de avaliar se um comporta- ‘mento é apropriado para o alcance do ob- jetivo tragado, bem como a ‘A inflexibilidade cognitiva pode resultar em comportamentos perseverat vos ¢ estereotipados. Cabe salientar que, conforme sugerem Lezak e colaboradores (2012), aeficacia do desempenho esta rela cionada & capacidade do sujeito de s nitorar, autocorrigis, regular a magnitude de cada resposta ¢ considerar a dimensio temporal das acdes para a conclusio da ta- refa realizada, Outros autores, como. ‘e Happaney, Zelazo e Stuss (2004), com base em informagies de estudos de correlagio anatomioelinieas, propoem a se- paragio das fungdes executivas de acordo com circuits cerebrais a clas relacionados. [A partir dessas correlagées, alguns auto- res, como sugerem 17 Neuropsicologia ‘mais bem detalhada posteriormente neste capitulo. Por fim, cumpre mencionar a pro. posta de que have: ‘que atuariam, como base para o desempenho de fun- es executivas mais complexas — solu- {Ho de problemas, planejamento, racioct- nio abstrato (Diamond, 2013). Essa divisio foi proposta por Miyake ¢ colaboradores (2000), que se basearam em dados de na- tureza psigomiéttiea, Naquele estudo, aps a aplicacio de uma série de testes de fungées cexecutivas em uma amostra de estudantes niverstéris, o autor realizou a anise f3- torial dos resultados, encontrando o fracio- namento das fungdes executivas nesses trés fatores. AS FUNGGES EXECUTIVAS NO CICLO DAVIDA Em termos filogenéticos, as fungdes execu- tivas atingiram seu apice em nossa espécie. Conforme salientado por Barkley (2001), 0 desenvolvimento das fungoes executivas & um importante marco adaptativo na espé ie humana, estando relacionado a alguns componentes universais de nossa nature- za,como Enquanto as fungées execu- tivas quentes teriam maior relagio com 0 as frias teriam maior relacdo com 0 Essa separagao relaciona- da a circuitos cerebrais ser wee Peace res ny ec eo Seas eta Ped fa mente), efungdes execut- Peer eey ee mee Peo ea Pee i oi Considerando 0 desen- volvimento ontogenético, as fangdes executivas atingem sua’ maturidade mais tar- diamente se comparadas as demais fungdes cognitivas. 118 Conforme salientado por Romine e Rey- nolds (2005), as: Entretanto, mesmo concluindo a ‘maturagio mais tardiamente, 0 desenvol mento dessas func: sivel identificar ct se progresso em bebes de 9 meses (Malloy- Diniz et al, 2004). Digno de nota, 0 ees etn Ce Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) (WalterMisehielavatiou criangas de com relagio a sua (Mischel, Shoda, & Rodri- suez, 1989). No teste a crianga recebe um ‘marshmallow ¢ um sino, Propée-se que, se cla esperar um tempo, ganha um segundo ‘marshmallow, ou, se prefer, pode comer 0 ‘marshmallow imediatamente e nao ganhar « segundo, Durante a espera, ela pode tocar o sino ahora que quiser,sinalizando sua de- sisténcia. As eriancas de Mis- chel tm sido acompanhadas por varios anos. As diversas publicagdes derivadas des- se estudo mostraram que as Cec sugere que as funges, executivas, embora nao tenham tanto valor do ponto de vista de diferenciar sindromes neuropsiquistricas entre si, sio cruciais pa- 1a determinar o isco de aparecimento de ios transtornos infantis, Por exemplo, de acordo com o autor, embora as disfun- ‘bes executivas nao sejam condigdes neces- sirias (ou suficientes) para o surgimento de psicopatologias como o transtorno de dé- ficit de atengio/hiperatividade (TDAH) ¢ © autismo, a presenga inicial de disfungio executiva aumentaria o risco para a confi- guragdo do transtorno (e até mesmo para aumento de sua gravidade) na medida em gue ela diminui Mesmo em estudos com populagdes no clinicas, 0 desenvolvimento inicial de algumas fungdes executivas parece estar di retamente relacionado ao sucesso em diver- sas éreas da vida. Em um estuclo classico da psicologia do desenvolvimento, o psicdlogo ‘Além disso, a postergacdo da gratificacao aos 4 anos foi capaz de Em um estudo mais recen. te com os mesmos sujeitos, agora com 40 anos, Casey e colaboradozes (2011) verifica- ram diferencas entre aqueles que posterga~ ram a gratificagdo aos 4 anos e aqueles que nao o fizeram, ‘Apés sua maturagdo ao final da ado- lescéncia, as fungGes executivas passam por Dessa forma, 0 desenvolvimento das Funsdes executivas 20 longo da vida apresenta o formato de.umi U) invertido, Diversos mecanismos neurobio- lgicos naturais parecem contribuir para esse processo de declinio das fungées exe- cutivas. Por exemplo,o: 119 Neuropsicologia 2005). Por volta dos 50 anos, jé pode ser ob. servado um declinio sutil no desempenho de fungées como categorizacao, organiza: ‘¢40, planejamento, solugio de problemas ¢ meméria de trabalho. Outras fungées exe ccutivas, como a tomada de decisao afetiva e a teoria da mente, obedecem padrao seme Ihante, porém seu declinio ocorre um pou. co mais tarde. NEUROBIOLOGIA DAS FUNCOES EXECUTIVAS De acordo com a metéfora frontal, ain- da corrente na literatura neuropsicol6gi- «a, as fungoes executivas seriam totalmen- te mediadas pelo lobo frontal. Por exemplo, Goldberg (2002) considera essas fungSes como resultado da atividade dos lobos frontais (especificamente da regio pré-frontal). Segun- do ele, as fangoes executivas (ou fungoes do lobo fron- tal) atuam como uma espé- ie de diretor executive do funcionamento da atividade mental hu- ‘mana, Goldberg (2002) propde que a com- preensio das fungoes executivas é facilita- da se concebermos os lobos pré-frontais como uma espécie de maestro ou general que coordena os outros sistemas e estrutu- ras neurais. A orquestra continua existindo sem 0 maestro, assim como 0 exército, sem © general, ¢ a atividade dos diversos siste- ‘mas neurais, sem a atuagio reguladora do cértex pré-frontal. No entanto, do mesmo modo como a coordenagio dos diferentes ‘membros da orquestra na produgio mu- sical ¢ das estratégias bélicas do exército é comprometida sema funcio de seus lideres, a atividade de diferentes sistemas neurais ¢ suas fungdes subjacentes torna-se menos eficiente nos casos de comprometimentos do cértex pré-frontal. ‘A associagao entre as regides frontais do cérebro e fungdes cognitivas complexas ‘As fungées execuivas (ou fun PO er Seed peer es 6 antiga, Em uma das primeiras descrigées presentes na literatura cientifica moderna sobre essa assaciacao, o relato do caso de Phineas Gage, feito por John Martyn Har- low, em 1948, apresenta as desastrosas con. sequéncias cognitivas e comportamentais decorrentes de uma lesio pré-frontal. O a 80 Gage, posteriormente revisitado por Da vid Ferrier, foi um dos pilares de uma das primeiras propostas sobre a relagio entre a regio frontal do cérebro e fungoes cogni tivas complexas na histéria da neurocién. cia moderna (Ferrier, 1878). No entanto, a despeito das associagdes entre o cértex pré frontal e as fungdes cognitivas complexas, € mais correto dlassificar tais fungoes co- ‘mo resultantes da atividade distribuida de diferentes regies e circuitos neurais. Mes ‘mo aquelas estruturas que antes eram vistas como predominantemente motoras (como as porcoes filogeneticamen- te mais recentes do cerebelo) tém sido relacionadas as fun Ges executivas (Riva, Cazza niga, Esposito, & Bulgheroni, 2013). Os complexos circuitos relacionados as fungées executivas envolvem diferen tes sistemas de neurotransmissio, de mo. do que alteragées nesses sistemas também esto relacionadas ao desempenho das fun. {bes executivas. Por exemplo, as vias dopa ‘minérgicas estdo relacionadas a meméria operacional, atengio, controle inibitério, planejamento, flexibilidade cognitiva ¢ to- ‘mada de decisao. Alteracoes na neurotrans ‘misao dopaminérgica afetam as funcoes supramencionadas, conforme podemos constatar em transtornos como a esquizo frenia ¢ o transtorno de déficit de atencao/ hiperatividade. Por sua vez, as vias seroto. nérgicas so. particularmente importan. tes para processos como o controle inibit6 rio e a tomada de decisio afetiva (Rogers et al,, 2003). A compreensao da relagao entre a atividade neuroquimica cerebral e as fun {gbes executivas tem sido importante para 0 120 Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) desenvolvimento de estratégias farmacolégi- cas capazes de remediar deficits nesses pro- parietal e da Area pré-motora e tem cone- xOes com as porgdes dorsolaterais do glo- essos mentais (Leite, Malloy. “Diniz, & Corea, 2007) B importante frisar que o cértex pré-frontal apresen- ta um nivel de especaliza- a0 funcional em que cada Sistema neural esté envolv- oo ocr Cree er nie rs tos cognitvese comportamen- bo pilido e substincia negra reticulada rostral. O circuito continua para a regiao par- vocelular dos niicleos tal micos dorsolateral ¢ ventral anterior. Do télamo, por sua tas especiios, do com aspectos cognitivos ¢ comportamentais especificos. Brandshaw (2001) descreve a existéncia de cinco cir- cuitos frontais subcorticais paralelos e in- ter-relacionados (motor, oculomotor, dor- solateral, orbitofrontal e cingulo anterior) ligados a fungées distintas. Desses circuitos, trés estao particularmente relacionados a0 desempenho das fungdes executivas, Circuito dorsolateral 0 cireuito dorsolateral (Fig, 9.1) origina-se no cértex pré-frontal dorsolateral, projeta- -se para a parte dorsolateral do nticleo cau- dado, que também recebe sinais do cortex Cortex prétrontal dorsolateral ver, so emitidas projecdes de volta para o cértex pré- frontal dorsolateral, ‘A regio pré-frontal dorsolateral é uma area de convergéncia multimodal, es- tando interconectada com outras Areas de associacao cortical e relacionada a proces- 808 cognitivos de estabelecimento de me- tas, planejamento, solugio de problemas, fluéncia, categorizagio, meméria opera- ional, monitoragao da aprendizagem e da atengio, flexibilidade cognitiva, capacidade de abstracao, autorregula¢ao, julgamento, tomada de decisao, foco e sustentagao da atengao, ‘Conforme salientado por Mattos, Sa- boya e Araujo (2002), uma importante con- sequéncia de comprometimento do circuito utrasestruturas ' Substincla negra reticulada rostral ‘orteass Nicleo caudado dorsolateral Globo pilido orsalateral Nicleo subtalamico ——— Palio medial [Nacleos talmicos dorsolateral e ventral anterior __] FIGURA 9.1 Girt pré-frntal dorsolateral. dorsolateral é a dificuldade em secuperar i- vremente um determinado material apren ido, Os pacientes que softem desse proble. ma, a despeito de seu desempenho normal fem testes de meméria de reconhecimento, falham na recuperacao espontinea do ma: terial consolidado. Ainda segundo Mattos e colaboradores (2002), aspectos motivacio nais decortentes da sindrome disexecutiva também podem influenciar a recuperagao espontinea do material aprendido. O exame de pacientes idosos deprimidos,cujo princi pal comprometimento cognitivo é a disfun 0 executiva,ilustra tal fato: esses sujeitos apresentam déficits moderados na codifi cagio de contedido e expressivos na recupe: zagio espontinea de informagoes (aspectos mais relacionados aos circuitos dopaminér gicos), enquanto mostram preservagio da ‘meméria de curto prazoe do reconhecimen to (de Paula et al, 2013a). Linck, Sonka e Bauer (2008) relataram o caso de um pacien te com sindrome disexecutiva a partir da le 30 do micleo anterior do télamo. O sujeito, ‘embora nao tenha evidenciado alteracoes de sua personalidade e da atengio, apresentou Cértex orbitofrontal ‘ 121 Neuropsicologia prejuizos importantes relacionados a recu: peracio de material aprendido (evocagio), planejamento e categorizacao, Esse caso res salta a importancia de considerarmos o cir cuito pré-frontal integrado, e nao 0 cértex pré-frontal isolado, como sede das funcdes executivas Circuito orbitofrontal circuito orbitofrontal (Fig. 9.2) origina se no c6rtex pré-frontal lateral inferior e ventral anterior. Projeta-se para o nticleo caudado ventromedial, o qual também re cebe sinais de outras areas de associagio corticais ~ incluindo 0 giro temporal su: perior (auditivo} e 0 giro temporal inferior (visual) — e de regides do tronco encefili co (formagao reticular). O circuito conti ‘nua para o globo palido dorsomedial e para ‘a porgio rostromedial da substancia negra reticulada, Projeta-se para a regio magno celular dos micleos ventral anterior e dor somedial do tilamo e, entao, retorna para 0 cértex orbitofrontal. urrasestruturas cleo caudado ventromedial ' Substincia negra reliculada rostral cleo sustalamico coticais, Gobo palido dorsomedial —— > Patigo meciat FIGURA 9.2 Gireuto orienta 122 © cértex orbitofrontal é fortemente interconectado com éreas de processamen. to cognitivo e emocional. Sua parte mais posterior e medial é considerada uma das principais regioes corticais para mediaga0 autondmica e forma uma rede com outras reas limbicas, como a insula, a amigdala, © cértex polar temporal, o hipotélamo e 0 tronco cerebral Esse circuito tem sido associado a as pectos do comportamento social, como empatia, cumprimento de regras sociais, controle inibitério e automonitoragao, Seu comprometimento esté geralmente associa do a comportamentos de risco e alteragoes da personalidade caracterizadas por redu. 0 da sensibilidade as normas sociais, in fantilizacdo e dependéncia de reforso evi dente e baixa tolerincia a frustragao. Ha também prejuizo no julgamento social, no aprendizado baseado em emocées. Sinto mas de ecopraxia e ecolalia também sto frequentes. © paciente passa a apresen. tar dificuldades nos processos de toma- da de decisto por nao antecipar as futuras consequéncias de suas atitudes. Damasio (1996} classifica este dltimo componente da Cingulo anterior 1 { Substancia negra rostrodarsa!, Fuentes Malloy-Diniz, Camargo & Cosenza orgs) sindrome disexecutiva como “miopia para o futuro” e explica tas dificuldades a partir da hiip6tese dos marcadores somticos. Segun do essa hipétese, sensacées corporais atua riam como sinalizadores no proceso de to ‘mada de decisio. Por exemplo, em situacoes de incerteza nas quais uma decisio é reque rida, além da ativagdo de processos cogni tivos (evocagio de representagbes internas, planejamento, meméria operacional, julga mento moral, et.) sio ativadas sensagbes corporais (viscerais e musculoesqueléticas) ue sinalizam o risco eminente. Sensacoes desagradaveis, por exemplo, podem indicar as desvantagens de um determinado com portamento que esté prestes a ser assumido. Esses marcadores somaticos sto. sinaliza ores emocionais que atuam, muitas veres, sem que tenhamos consciéncia de sua pre senca e de sua importincia Circuito do cingulo anterior © cireuito do cingulo anterior (Fig. 9.3) origina-se no cingulo anterior e se projeta para o estriado ventral (nucleus acumbens e ures estruturas conics + Etriago vet obo pico venta Nice subaimicn ——® Pade media [cle talamico dersomecial FIGURA 9.3 iret pré-frontl media e ingle ante. —_ tubérculo olfatério) (Royal, etal, 2002), 0 qual recebe si nais adicionais do cértex de associaga0_paralimbico, in- luindo o polo temporal an- terior, a amigdala, o hipo- campo inferior e 0 cortex entorrinal. O circuito conti- rnua para o palido ventral e para a substancia negra ros- ‘rodorsal,e dai parao nticleo [7s taldmico dorsomedial, de on- (ie de retorna ao cingulo ante- rior Esse cizcuito ¢ importante para a moti- vaglo, a monitoracao de comportamentos, 0 controle executivo da atengio, a selecao ¢ ‘o controle de respostas. Comprometimentos nesse circuito podem evar a difculdades na realizagao de atividades que requerem manutengao de respostas e controle da atengio. Como con- sequencia do comprometimento dessa cir- cuitaria, o paciente pode apresentar apatia, dificuldades em controlar a atengio, identi- ficar e corrigi erros produaidos a partir de tendéncias automatizadas, desinibiga0 de respostasinstintivas e mutismo acinético. O componente de atencio seletiva, um aspec- to das redes atencionais executivas propos- to por Posner (2012) e passivel de avaliaga0 por meio do paradigma de Stroop (conllito atencional e interferéncia),é altamente de- pendente desse circuito. Um estudo experi- ‘mental proposto por Hayward, Goodwin ¢ Harmer (2004) cancelow o efeito de confit atencional (efeito Stroop) por estimulagao ‘magnética transcraniana da regido do cin- gulo anterior, sugerindo que tal regiao seja cssencial para a resolucao do conilito aten- cional caracteristico da tarefa Uma vez Peeters Pe eer pemeeen Bree ee rs AVALIACKO NEUROPSICOLOGICA DAS FUNGOES EXECUTIVAS ‘Uma vez queas fungoes executivas sio com- plexas e apresentam varios subdominios, reas eu eee eee ena oe Terence es 123 Neuropsicologia sua avaliagdo neuropsicolé gica envolve varios procedi mentos, os quais podem estar agrupados em baterias for- mais especificamente desen- volvidas para medi-las ou em baterias flexiveis nas quais os instrumentos sio agrupados a partir de critérios definidos pelo examinador, Baterias especificas para avaliagao das fungGes executivas Existem baterias especificas para aavaliag3o dias fungbes executivas, como a Behavioral ‘Assessment of the Dysexecutive Syndrome (BADS) e o Dellis-Kaplan Executive Func- tions System (D-KEFS). A BADS (Willson, Alderman, Burgess, Emslie, & Evans, 1996) € uma bateria que avalia diferentes aspec- tos das fungdes executivas (p. ex., planeja- ‘mento, solugio de problemas, controle ini- Ditorio e flexibilidade cognitiva) por meio de tarefas que se assemelham aquelas do co- tidiano do probando. A bateria é compos- ta por seis tarefas neuropsicologicas e por uma escala de avaliagao de sintomas disexe- cutivos (Dysexecutive Questionary ~ DEX) que € preenchida pelo paciente e por uma pessoa de sua convivéncia proxima. A BADS pode ser aplicada em sujeitos com idade en- tre 16 e 87 anos. Existe uma versio do tes- te para aplicagdo em criangas e adolescentes (BADS-C) com idade entre 8 e 18 anos. Essa versio mantém as mesmas caracteristicas € ‘0s mesmos objetivos da versio original de- senvolvida para avaliagio de adultos e ido- sos. No Brasil, existem estudos psicomeétri- cos da BADS na populagao geridtrica, como 9 de Canali, Brucki, Bertolucci, & Bueno (2011). Os estudos evidenciaram que a ver- sio brasileira adaptada da BADS apresenta boas propriedades psicométricas, sendo um 124 instrumento util na separagio entre idosos normais e aqueles com quadros como com- prometimento cognitive leve e deméncia de Alzheimer. Jaa D-KEES (Delis, Kaplan, & Kra- ‘mer, 2001) é composta por nove testes neu- ropsicol6gicos clissicos (teste das trilhas, fTuéncia verbal, fuéncia de desenhos, tes- te de interferéncia cores/palavras, teste de classifcagao, teste das 20 perguntas, tes- te contextual de palavras, teste da torre ¢ interpretagao de provérbios). A D-KEFS apresenta tanto uma pontuagao global co- ‘moa pontuacio de cada subteste, formecen- do uma visio geral sobre o funcionamento executivo e uma avaliagao de aspectos espe- cificos desses processos mentais. A bateria pode ser aplicada em sujeitos com idade en- te 8 e 89 anos. Outros instrumentos de avaliagao das fungées executivas ‘Nas avaliagdes neuropsicol6gicas, & comum © uso de varios instrumentos que avaliam fungoes executivas agrupa- dos em baterias flexiveis. E importante salientar que a avaliagio_neuropsicologica das fungdes executivas en- volve a aplicagao de diversos testes e escalas, os quais for- necem informagdes sobre di- ferentes componentes desse grupo de pro- cessos cognitivos. Planejamento planejamento consiste na capacidade de, a partir de um objetivo definido, estabele- cer a melhor mancira de aleangé-lo, levan- do em consideragio a hicrarquizagao de passos € a utilizagdo de instrumentos ne- cessérios para a conquista da meta, Existem ers Sener t errs ris Pou ee er pe as Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) ‘ériosinstrumentos destinados & avaliacio das habilidades de planejamento, como os testes das torres (p. ex, Torte de Londres e ‘Torre de Hanci) ¢0 teste dos abiintos. ‘No teste da Torre de Londres, utiliza- -se uma base de madeira, com trés hastes de tamanhos diferentes, em que estio trés bolas de cores diferentes (vermelho, verde e azul) (Fig. 9.4). Na versio original desen- volvida por Shalice (1982) ¢ adaptada pos- teriormente por Krikorian, Bartok e Gay (1994), s80 apresentados 20 sujeito 12 pro- blemas em otdem crescente de dificuldade, um de cada vez, que devem ser resolvidos movimentando as bolas nas hastes,Os pro- blemas si apresentados por meio de car- toes que apresentam diferentes configura- ¢8es envolvendo a disposicao das esferas has hastes. O sujeito deve realizar a tarefa com a menor quantidade possivel de mo- vimentos. Cada problema apresenta um namero minimo de movimentos, que po- de variar de dois a cinco. Para cada proble- 'ma, osujeito tem tes chances de resolvé-lo com a quantidade minima de movimentos. Se obtver éxito logo na primeira vez, ganha trés pontos; na segunda tenativa dois pon- ‘os; ¢ na terceira, um pont, Caso nao consiga resolver em nenhuma tenativa, seu esco- reno item é zero. A pontua- ‘gio maxima obtida nesse tes- fede 36 pontos Existem estudos brasi- leiros com criangas ¢ adultos, normais que utilizaram essa versio do teste Souza, lgndcio, Cunha, Oli- veira, & Moll (2001), em uma amostra de 61 brasleicos com idade entre 19 e 70 anos, encontraram um desempenho médio. de 31 (44-3) para homens e de 28 (4-3) pa- ra mulheres, Recentemente, foram publi- cados estudos normativos (de Paula eta, 2012a) e de validade (de Paula et al., 2012b, 20126) da versio Krikorian da ‘Torre de Londres para idosos brasileiro, incluindo notas de corte para a detecgio de deméncia 125 Neuropsicologia 24. Al FIGURA 9.4 Pasig nical da tae de Londres. Legend VW: vrs; VO verde; Aa de Alzheimer e comprometimento cogniti- vo leve. Em se tratando da populagio infan- til, Malloy-Diniz e colaboradores (2007), em um estudo envolvendo 356 criangas de escolas puiblicas (n = 178) e privadas (n = 169), com idade entre 5 e 8 anos, néo ob- servaram diferengas entre meninos e me- nninas nessa faixa etdria. As criangas de es- cola particular tiveram desempenho médio de 28,7 pontos (+/-4),€ as de escola pibli- ca, de 26,5 (+/-4). Esse resultado aponta ‘um desempenho semelhante entre criangas € adultos no teste, 0 que pode indicar um possivel efeito de teto para a tarefa. Outros estudos de validade e normatizacao da Tor- re de Londres podem ser encontrados em Seabra e Dias (2010). No teste da Torre de Hanéi, utiliza-se ‘uma base com trés hastes de mesmo tama- iho em que estio dispostas pecas de madei- ra de tamanhos diferentes (Fig. 9.5). A tare- fa consiste em mover as pesas de um pino a outro observando as seguintes regras: 0 su- jeito s6 pode movimentar uma pega de ca- da vez; as pegas nio podem ficar abaixo de ‘uma que seja maior que a primeira; as pe- «as s6 podem se mover de um pino a ou- tro (p. ex, nao podem ficar na mio do su- jeito enquanto ele movimenta outra pega). Existem diferentes modelos de aplicasio do teste, nos quais variam a quantidade de problemas e a quantidade de pecas na tor- re, Gonsales, Rocca, Malloy-Diniz, Fuentes FIGURA 9.5 Exempla de base para teste da tore de Hani ¢ Rodrigues (2010) apresentam dados nor- ‘mativos preliminares para o teste em uma amostra de criangas ¢ adolescentes brasi- Ieiros. s testes de labirintos so provas de lapis e papel em que o sujeito deve tragar ‘um caminho para sair de uma série de la- birintos (Fig. 9.6), geralmente em ordem crescente de dificuldade, sem trespassar as paredes do desenho. Vérias medidas po- dem ser utilizadas na avaliacio desse tipo de teste, como o tempo gasto para resolver © problema ou a quantidade de tentativas necessérias para resolvé-lo de forma corre- ta, Entre os principais testes de labirintos aplicados em neuropsicologia estio os da (cs FIGURA 9.5 Exempla de teste de labites. 126 Escala Wechsler de Inteligéncia (para adul- tos e criangas) e 0 teste de labirintos de Por- teous (Porteous, 1965). Controle inibitério © controle inibitério consiste na capaci- dade de inibir respostas prepotentes (pa- 12 as quais 0 individuo apresenta uma forte tendéncia) ou reagdes a estimulos distrato- ses que interrompam 0 curso eficaz de uma aco, bem como interromper respostas que estejam em curso (Barkley, 2001). Dificuldades relacio- nadas ao controle inibitério slo geralmente associadas & impulsividade. Existem diversas provas neuropsicologicas que ava- liam 0 controle inibitério, como 0s paradigmas que uti- lizam o efeito Stroop. Nele se observa a dificuldade de pro- cessar informacées simultaneas com sig- nificado conflitante, mesmo quando uma dessas informacées nao é relevante para a tarefa (Stroop, 1935). Varios testes foram desenvolvidos pa- 12 avaliar esse efeito, como, por exemplo, 0 teste Stroop de cores e palavras (versio Vie- tria ~ ver descricao em Strauss, Sheerman, & Spreen, 2006). Nesse teste s40 apresenta- dos ao sujeito diversos cartées, um de ca- da ver, os quais contém diferentes padres de estimulos cuja cor de impressio ele de- veri: nomear. O primeiro cartdo apresen- ta pequenos retangulos coloridos (as cores originais sio verde, vermelho, azul ¢ ama- relo). O segundo, palavras comuns colori- as com as cores anteriormente menciona- das. No terceiro, em que é medio o efeito Stroop, ha nomes de cores impressos com cores diferentes (p. ex, vermelho escrito com a tinta azul, verde com a tinta amare- Jae assim por diante). 0 efeito Stroop po- de aparecer com a lemtificacao significativa es eae pastas prepotentes (para as eee ere Pern eis cee eros Ce OC es es eae Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) das respostas nessa tiltima parte do teste ou com respostas erradas (leitura da palavra no lugar da nomeasao da cor com a qual ela foi impressa) Recentemente, foi publicado um estu- do brasileiro de normatizacao para adoles- centes com idade entre 12 € 14 anos (Dun can, 2006) no qual as cores utilizadas nao foram as tradicionais, e sim azul, verde, ‘marrom e rosa. Essas cores tém sido utili zadas por alguns grupos brasileiros com a alegacao de que, com a traducio do origi- nal em inglés, pode haver disparidade re- lacionada ao tamanho das palavras —_(especificamen- te “yellow” [amarelo] e “red” [vermelho] em _compara- ‘0 a “green” [verde] e “blue” [aml]). O teste de Stroop, além de ser uma importan- te medida de controle inibi- t6rio, também é uma medida de atengio seletiva. Diamond (2013) considera que os pro- cessos de atengdo seletiva compoem parte do mecanismo de controle inibitério, que envolve também outros aspectos do funcio- namento executivo. Para criancas pré-escolares, existe uma versio do Stroop que nao se relacio- nna a habilidades de leitura e escrita. Nes- sa versio, a crianga se depara com cartes que apresentam figuras com o desenho de tum sol (representando o dia) ou de uma lua com estrelas (representando a noite). crianga devers responder“noite” quando vé © cartao com o sol e “dia” quando vé o car- ‘Go em que estd desenhada a lua (Gerstadt, Hong, & Diamond, 1994). ‘Ainda com relagio a0 controle ini- bitorio, existem paradigmas de emissio ¢ supressio de respostas, como os paradig- mas “Go/No go’, nos quais, diante de um determinado grupo de estimulos, o sujito deve emitir a resposta e, diante de outros, suprimi-la. Um exemplo de tarefa baseada nesse paradigma é a Tarefa de Performance Continua (CPT), que existe em diver sas verses. Em uma delas, desenvolvida por Epstein e colaboradores (2003) (CPT 1), 0 sujeito € exposto a uma série de le tras apresentadas rapidamente, uma de ca da ver, em intervalos curtos e nos quais ele deve pressionar um botao cada vez que apa- rece uma letra. No entanto, essa regra s6va- lera se a letra nao for X. Caso apareca es sa letra, 0 sujeito devera inibir a resposta de apertar a barra de espago do computa- dor. Essa tarefa fornece medidas sobre er ros de comissao (0 sujeito pressiona a barra ‘mediante a letra x), omissio (o sujeito nao pressiona a barra quando vé uma determi nada letra) e tempo de reacio. Enquanto a ‘medida de erro por comissao ests relacio nada ao controle inibitério, a medida de ‘omissio est relacionada a atengao. O tes te avalia sujeitos a partir de 6 anos, incluin do adultos e idosos. AAs tarefas que medem tempo de rea- «0 com interrupgao sinalizada (stop signal reaction time) também so provas que ava liam 0 controle inibit6rio Nelas, 0 sujito deve responder a um determinado estimulo toda ver que ele aparece, a nao ser quando outro estimulo determinado, sinalizando que 0 probando nao deve emitir a respos ta em questio, é apresentado, Na atualidade, os profissionais da sati- de em todo 0 mundo tém sido inquiridos a avaliar uma populagio cada ver mais di versificada de pacientes: imigrantes, refu- giados, segundas e terceiras geragées ainda influenciadas pela cultura prévia ou (sim- plesmente) individuos com niveis educa- Cionais dos mais variados graus. Durante os séculos XX e XXI, essa diversificada popu- lagao tem inclufdo um niimero crescente de individuos provenientes de ambientes nao industrializados, a qual busca novas opor- tunidades de trabalho em diferentes partes do mundo. Avalis-los em termos cognitivos torna-se um desafio cada ver mais urgen- te. Para uso em individuos de baixa escola- ridade, uma versio alternativa do teste de 127 Neuropsicologia ‘Stroop foi desenvolvida por Sedé (2007). 0 Teste dos 5 Digitos envolve figuras e digi- tos agrupados em pequenos quadros e que sto apresentados em quatro situagdes su 1. Contagem de ntimeros (situagao con- gruente). Nessa fase do teste, 0 sujeito se depara com 50 quadros contendo nntimeros. A tarefa consiste em contar quantos niimeros ha em cada quadra- do. Nessa etapa, hd congruéncia entre fo ntimero e a quantidade de niimeros representados no quadrado (p.ex., um. nntimero 15 trés ndimeros 3). 2. Contagem de figuras. Novamente © sujeito se depara com 50 quadros contendo, agora, pequenas figuras (co- mo um asterisco). A tarefa consiste em contar quantas figuras ha em cada quadro, 3. Contagem de nimeros (situagio in- congruente): nessa fase étestado o efei- to Stroop. A tarefa consiste em contar quantos niimeros ha em cada quadra- do. No entanto, nessa etapa hé incon- gruéncia entre o niimero representado hho quadro ¢ a sua quantidade (p. ex., lum niimero 35 trés ntimeros 5). 4. Contagem de niimeros (situagao in- congruente—comalternancia). Por dl timo, o sujeito se depara com uma si- tuagio semelhante a anterior, na qual deve contar quantos mimeros hé em. cada quadrado com incongruéncias entre o ntimero representado no qua- dro ea sua quantidade (p. ex., um ni mero 3; tr@s ntimeros 5). No entan- to, em alguns quadrados ha uma mol- dura escura, Neles, 0 sujeito deve falar qual ntimero esta representado, ¢ nao quantosniimeros hi no quadrado. Nes- sactapa, além do efeito Stroop, ha tam- éma medida da flexibilidade cogniti- va, visto que 0 sujeito deverd alternar entreas duas estratégias ao longo da ta- refi 128 Estudos brasileiros avaliando a po- pulagao geriatrica demonstram que o teste apresenta excelentes propriedades psicomi tuicas para identificar déficits em funcdes executivas em pacientes acometidos por doenca de Alzheimer (de Paula et a.,2011), depressio maior (de Paula et al., 2011) ¢ comprometimento cognitivo leve amnés- tico (de Paula et al, 20115 de Paula et al, 20124). Um trabalho mais recente sugere que no teste é possivel dissociar medidas re- lacionadas a velocidade de processamento ¢ fungdes executivas (de Paula etal, 2013). Tomadas de decisdo A tomada de decisio € um processo que envolve a escolha de uma entte varias alter- nativas em situages que in- cluam algum nivel de incer- teza (risco). Nesse processo, 0 sujeito deve analisar as alter- nativas considerando diver- sos elementos, como anslise custo/beneficio (considerado as repercus- sées da decisio em curto, médio e longo prazo), aspectos sociais e morais (reper- cussdo da decisio para sie para outras pes- soas) e autoconsciéncia (possibilidades pessoais para arcar com a escolha). Duran- teo processo de tomada de decisio, outros processos cognitivos s30 envolvidos, co- ‘mo memoria de trabalho, flexibilidade cog- nitiva, controle inibitério e planejamento. ‘Um dos mais conhecidos testes para avaliacao do processo de tomada de deci- so é 6 Iowa Gambling Task (IGT) (Becha- 1a, Damasio, Damasio, & Anderson, 1994), due simula situacoes da vida real. Diante de quatro montes de cartas, 0 probando rece- be um empréstimo simbélico de 2 mil déla- res para que comece a jogar. 0 sujeito deve- rdescolher as carta, tirando-as uma a uma, com 0 objetivo de acumular 0 maximo de inheiro possivel. Todas as cartas apre- sentam uma premiagio em dinheiro, No areas Cet es or Perea) Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) entanto, de maneira imprevisivel, algumas implicam perdas que variam em magnitu- de. Os baralhos A e B trazem ganhos gran- des e imediatos, mas as cartas que levam a perdas sio mais frequentes ou as perdas s20 ‘ais vultosas. A escolha dos baralhos A e B conduzem a um prejuizo global. J as cartas dos montes Ce D levam a ganhos peque- znos em curto prazo, mas as perdas s30 me- znos frequentes e de menor magnitude. A es- colha dos baralhos Ce D leva a um ganho global. Os sujeitos nao sio informados des- sa regra, devendo descobri-la na medida em que jogam. A tarefa termina quando 0 su- jeito escolhe a centésima carta. Diversas patologias neurol6gicas e psi quidtricas tém sido estudadas a partir des- se paradigma (Dunn, Dalgleish, & Laurence, 2006). Um padrao de escolhas desvantajosas (que leva a ganhos imediatos « perdas expressivas de longo prazo) tem sido associado a ‘um padrao especifco de im- pulsividade, referido por Be- chara como “impulsividade cognitiva” ou por nao planejamento, que re- flete inabilidade em planejar as agoes tendo como referéncia suas consequéncias de cur- to, médio e longo prazo. Existem duas ver- bes brasileiras adaptadas por grupos distin- tos (Rutz, Hamdam, & Lamar, 2013). ‘Outta tarefa que também vem sendo usada para avaliagdo da tomada de decisio 6. tarefa dos dados, na qual o sujeito deve fazer apostas em um jogo de dados, esco- Ihendo entre apostar em um tinico niime- 10 ou em combinagoes de niimeros (dois, trés e quatro niimeros combinados). Cada tipo de aposta vale uma quantidade especi- fica de dinheiro, que é proporcional a risco (—.ex.,aposta em um tinico ntimero vale RS 500 e, em uma combinagio de quatro né- ‘meros, vale RS 100). diferenga em relacao ao IGT € que, nessa tarefa, 0 risco é expli- citamente apresentado de antemao, de mo- do que o sujeito pode calcular suas chances de ganhar ou perder em cada aposta. Existe ‘uma versio brasileira da tarefa adaptada por Rzezak, Antunes, Tufike Mello, (2012), Flexibilidade cognitiva A flexibilidade cognitiva im- plica a capacidade de mudar {alternar) 0 curso de ages! pensamentos de acordo com as exigéncias_ do. ambien- te. O ‘Teste das ‘Tras (Rei tan, 1958) e 0 Teste de Selecao de cartas de ‘Winsconsin (Heaton, Chelune, Talley, Kay ‘& Curtiss, 2004) sao exemplos de testes ut lizados para avaliacao dessa habilidade cog- nitiva. No Teste das ‘rilhas, 0 sujeito deve inicialmente (parte A) unir niimeros em se- quéncia crescente. Posteriormente (parte B), ele deve alternar entre niimeros e letras em sequencia crescente. ‘Tanto a parte A como a parte B es- ‘Ho relacionadas as habilidades cognitivas de percepcio, atencio e rastreamento vi- sual, velocidade ¢ rastreamento visuomo- tor, atengo sustentada e velocidade de pro- cessamento. J4 a parte B incorpora mai complexidade a0 teste, avaliando também a flexibilidade cognitiva. Em ambas as par- tes, o sujeito deve desempenhar 0 mais ré- pido que conseguir. A principal medida que o teste fornece & a do tempo gasto pa- ra completar cada uma das partes. Alguns autores, como Mitrushina, Boone, Razani e D’Blia (2005), sugerem que sea feita a com- paracdo entre o tempo gasto na parte Be na parte A (dividindo o tempo gasto em B pe- lo tempo gasto em A). Nesse tipo de anslise, tanto proporgoes altas como baixas podem indicar um desempenho ruim, Por exem- pio, os autores sugerem que 0 escore ideal seria o equivalente & proporsio 2 ‘matic bran injury behavioural sequelae: The man ‘who lost his charm. Arquivos de Newro-Psiguiatria, (602-4), 319-523, ‘Misehel, W, Shoda, V, & Rodrigues, M. L (1989) ela of ratification in children. Science, 24414907), 933-938, Mitrushina, M.N., Boone, K.B. Razani, |, Dl, LF (2008). Handbook ofrrmative data for neurop- _syhological assessment, New Yorks Oxford University, ‘Miyake, A Friedman, NP, Emerson, M.J, Witz, A\H.& Howercer,A.&eWager TD. (2000). The unity and diversity of executive functions and their con= tributions to complex “frontal lobe” tasks latent variable analysis. Cognitive Pycholgy, 41(1), 49-100. assos,V. M.A. Git L, Barto, SM. iguciredo, RC, Caramel, P, Bensenor, 1, ... Nunes, M.A. (2011). 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Journal of Experimental Child Psychology, 81(4), 458-465 Transtornos especificos © termo transtornos especificos de apren- dizagem (TEAs) refere-se a um grupo de condigdes nas quais existe uma discrepin. cia entre 0 desempenho escolar em um ou mais dominios académicos e a habilidade cognitiva geral do individuo, excluindo co ‘mo causas primérias outros fatores de ris. co, como deficiéncia neurossensorial, po- breza e falta de estimulacao, experiéncias pedagégicas inadequadas, etc. Diversos dominios académicos sio potencialmente afetados em diferentes combinacoes, tais como reconhecimento visual de palavras, ortografia, compreensdo, expressio escrita, processamento numérico, calculo ¢ racio cinio aritmético. Pressupde-se, ainda, que as dificuldades sa0 de origem intrinseca, resultando de disfungdes neurogenéticas fem interagio com fatores ambientais de risco. O estatuto nosolégico dos TEAS foi objeto de consideravel polémica (Tannock, 2013) por ocasiao da preparagio da quinta edigao do Manual diagndstico e estatistico de transtornos mentais (DSM-5), da Ame rican Psychiatric Association (APA, 2013) Este capitulo se concentra nos TEAs mais pesquisados: dislexia e discalculia. A ques: ‘io da definigao sera enfatizada em fungio das controvérsias geradas. A epidemiolo gia clinica seré descrita em uma tabela e, fem seguida, serdo discutidos os mecanis. ‘mos cognitivos, a avaliagio neuropsicol6. gica e as intervensoes. de aprendizagem: dislexia e discalculia VITOR GERALD! HAASE FLAVIA HELOISA DOS SANTOS DEFINIGAO Os critérios diagndsticos tradicionalmen- te empregados para TEAS requerem uma li- mitacao especifica (p. ex, na leitura ou no cflculo) que nao poderia ser determinada por déficits intelectuais, sensoriais e emo- ionais ou escolarizagio inadequada; além disso, as dificuldades devem estar presen- tes em mais de um contexto, isto 6, pertur- bar tanto o desempenho académico como a vida digria (APA, 2002; Organizagio Mun- dial da Satide [OMS], 1993). Inclui-se a ca- tegoria sem outras especificagbes (SOE) pa- 1 individuos que preenchem critérios para mais de um TEA. Os dominios afetados de- vem ser aferidos por meio de testes psico- miétricos padronizados para a habilidade specifica em questio, evidenciando pon- tuagdo substancialmente inferior em rela- «G0 a0 nivel esperado para idade, educaga0 ¢ inteligéncia (APA, 2002). Essa discrepin- cia pode ser operacionalizada por um atra- so académico correspondente a dois anos letivos (Shalev, Manor, Auerbach, & Gross- ~Tsur, 1998) ou desempenho 1,5 a 2 des- vios-padrio da média em medidas padro- nizadas (Silva & Santos, 2011). Quanto ao nivel intelectual, 0 DSM- -IV-TR (APA, 2002) considera necesséria uma discrepancia entre o quociente de in- teligéncia (Ql) e 0 desempenho em um tes- te de leitura ou de aritmética para critério 140 Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) diagnéstico dos referidos teanstornos, Iso cexclui os casos de deficiéncia intelectual, em que as dificuldades escolares dessas criangas seriam assumidas como decorrentes de sua limitagao intelectual global. £ importante dizer que a exclusio diagnéstica desse gru- po de criancas nao inviabiliza o reconheci- mento clinico de tas dificuldades escolares nem diminui a necessidade de intervencées especializadas para sua reabilitacao. En- tretanto, alguns estudos demonstram que criangas com transtornos de aprendizagem podem apresentar niveis intelectuais leve- ‘mente mais baixos (médio inferior ou imi- Luofe), pois o proprio prejuizo espectfico em Ieitura ou em célculo pode produzir um re- baixamento na pontuagao em medidas de QI (van Bergen etal, 2013), sendo este fa- tor um dos determinantes da persisténcia dos deficits em anos subsequentes (Shalev etal, 1998) 'A revisio da literatura conduzida pe- lo grupo de trabalho do DSM-5 indicou diversas inadequag6es nas definigoes tra- dicionais de TEAS (Tannock, 2013). Foi constatado também que os resultados da li- teratura s20 muito contraditérios, dificul- tando a extragao de conclusoes mais defi- nitivas. A especificidade dos transtornos foi um dos principais pontos questionados. Cerca de dois tergos das criancas com TEA apresentam a0 menos uma comorbidade (Dirks, Spyer, van Lieshout, & de Sonnevil- Je, 2008; Landerl & Moll, 2010; Rubinsten & Henik, 2008), e também hé evidéncias de que a dislexiae a discalculia possam ser causadas por influéacias genéticas comuns, os chamadis genes generalistas, implicados em diversas manifestacoes, de transtornos do neurode- senvolvimento (Kovas et al, 2007; Willcut et al., 2010). ‘Ontras evidéncias favo- recem a especificidade. Die versos. estudos caracteriza- ram uma dupla dissociagao neuropsicologica. De modo ere Seer Peet Pree ces ale ro Eee Pe ue ecu geral, a dislexia se associa a déficits no pro- cessamento fonolégico, enquanto a dis- calculia pode ser explicada por déficts no processamento de magnitudes numéricas (Landerl, Fussenegger, Moll, & Willbur- ger, 2009; Rubinsten & Henik, 2006; ‘Tres- soldi, Rosati, & Lucangeli, 2007). Compton, Fuchs, Fuchs, Lambert ¢ Hamlett (2012) utilizaram técnicas de estatistica multiva- riada em uma grande amostra de criangas com TEAs, mostrando que é possivel iden- tificar ao menos quatro tipos de TEAS e que cada tipo se associa a um perfil cognitivo es- pecifico, com déficits no reconhecimento visual de palavras, compreensio de leitura, flea e raciocinio aritmi Estudos de intervengao também su- gerem relagoes especificas entre os tipos de transtorno e de intervengio e os resultados obtidos (Lovett, Steinback, & Frijters, 2000; Morris etal, 2010; Solis et al,, 2012; Wilson, Revkin, Cohen, Cohen, & Dehaene, 2006} Finalmente, ha estudos de recorréncia fami- liar constatando segregasao independente entre dislexia e discalculia (Landerl & Moll, 2010), bem como entre discalculia e trans- torno de deficit de atencaofhiperativida- de (TDAH) (Monuteaux, Faraone, Herzig, Navsaria, & Biederman, 2005). A revisio da literatura indica, portanto, que a questao da especificidade diagndstica e etiol6gica dos ‘TEAS é, no minimo, contenciosa. (0 segundo ponto considerado inade- quado nas definigoes prévias dos TEAs € 0 critério psicométrico de discrepancia (Tan- rock, 2013). 0 fato de a inteligéncia e o de- sempenho escolar serem correlacionados conduz.a distorgdes estatisticas, incorrendo no isco de diagnésticos fal- s0-positivos em criangas com inteligéncia mais ata efalso- negatives em criangas com teligéncia mais baixa (Den- nis et al, 2009; Hale et al. 2010). Entretanto, o critério cexclusivo de inteligén mal nao pode ser eliminado, sob pena de descaracteriaar 0 transtorno como sendo especfico, ou seja, indepen- dente de deficits cognitivos mais gerais. ‘As inadequagdes do critério psicomé- trico de discrepancia motivaram a busca de alternativas. Uma proposta se baseia na res- posta A intervencio (RII, do inglés respon- 5 10 intervention) (Fuchs, Fuchs, & Comp- ton, 2012; Hale etal, 2010). abordagem de RII pressupse que os TEAS se caracterizam por dificuldades mais graves e persstentes, resistentes a intervengoes apropriadas. Es. sa abordagem é atraente por aliar diagnds- tico, prevencio e intervenca0, podendo ser aplicada na escola, sem neces- sariamente requerer avalia- .6es individuais das criangas por especialistas. A proposta da RIT consiste em identifi car na pré-escola criangas sob isco de desenvolver algum. ‘TEA, seja por exbirem defi cits no. processamento fono- lgico,seja por apresentarem, Aéficts no processamento de ‘magnitudes numéricas. Uma ver identifcadas, elas s30 alo- cadas a programas sucessvos de interven « avaliagdo, Serio qualifcados para o diag- néstico de TEA aqueles individuos que apre- sentarem difculdades persistentes, ou sea «que nao tenham respondido as melhores in- tervencoes disponives ‘A abordagem de RTI pode, entretan- to, ser criticada por diversos motivos (Ha- le etal, 2010). Sua implementagao é mui- to complexa, requerendo pessoal altamente qualificado, o qual ado esté disponivel na ‘maioria das vezes. O processo todo de diag- néstico torna-se vulnersvel & qualidade da intervengio oferecida ea adesio da clientela a0 programa, Preocupante também é 0 fato de que uma abordagem fundamentada pu- ramente em RII implica uma postergacs0 do diagnéstico e dos beneficios dele decor- rentes.Por fim, como a RIT nao requer uma avaliago. especializada e individualizada oe Ce la criangas sob risco de de Sseavolveralgum TEA seja por ee er samento fonoégic, seja por errs oars ea ee Dr Once ae ret ar avaliago, 141 Neuropsicologia das criangas, priva-Ihes do acesso a servigos diagnésticos que poderiam contribuir pa- ra a identificacao das vulnerabilidades indi- vviduais frequentemente associadas aos TEAS (Shalev & Gross-Isur, 1993).A revisao sobre ‘os critérios diagndsticos também é inconcla- siva, uma vez que tanto o critério psicomé- trico de discrepancia como a RI slo inade- quados efou de dificil implementacao. Considerando a indefinigio do estado tual do conhecimento quanto a especifici- dade e aos critérios diagnésticos, bem como ‘o estatuto nosoldgico de suas diversas mani festagoes, o grupo de trabalho do DSM-S in- dlinou-se a abolir a distingao ‘entre formas de TEAs como ‘entidades nosoldgicas; descre- vendo, entretanto, os domi- nos comprometidos em cada individuo por meio de qua- lificadores (Tannock, 2013). Foi também deliberado que o ‘ritério psicométrico de dis- ‘crepancia deveria ser proscri- ‘to e que, a0 mesmo tempo, os ios diagnésticos deve- iam ser compativeis com a abordagem de RTI. A proposta de abolir as istingoes entre discalculiae dislexia foi, en- ‘retanto, muito mal recebida na comunida- de, tanto por pesquisadores como por advo- gados que defendem os direitos das pessoas com transtornos de aprendizagem, ¢ a co- missio reconsiderou diversos pontos (APA, 2013). Basicamente, foi mantida uma cate- goria tinica de ‘TEAS, sendo adotados cédi- 0s especificos, conforme o dominio acadé- ‘ico afetado. Os termos discalculia e dislexia io admissiveis como rotulos alternativos. A ‘Tabela 10.1 resume os critérios diagndsticos para TEAS adotados no DSM-5, EPIDEMIOLOGIA CLINICA ‘A Tabela 10.2 apresenta uma anilise com- parativa dos perfis clinico-epidemiolégicos 142 Fuentes, Mlly-Dini, Camargo & Cosenza (orgs) TABELA 10.1 Critérios diagnésticos para transtorno especifico de aprendizagem canforme o DSM-S coitios | A Prasenga da pelo manas um des seguntessintomas par ela menos ses meses iagnésticos 1 | Reconhecimento visual de palavas impreciso, eto ou trabalhoss, 2 | Difeudades de comprensdo tetul, 3 | Dieuldades com a atozraia 4 | Diteudades com a redagao. 5 | Dieuldades com senso numéro ftosaritéticas ou cékeula, 6 | Diteudades com a rasoeno arti. 8 Defic sustancal psicometriamente quanifcsvel nos cominosaetadas, sendo| canstatada seu impact sore odesempenka escolar eu ocupacioal ea vida catiiana, por meio de uma avaiagao clinica abrengete c ‘As difculdades Ge desempenho dever se iniciar nos anos esoltes, aida que possam se manifestaraperas a pari do mamento em que a Gemands académica irapasse a capacidades do individu, D ‘As eifculdades Ge aprendzagem no podem ser explicadas por deine inte- letua, deficits visvas ov auditvas rao coriidas, utes tensors mentas ou eurolgions aversidade psicasova, altace paficincia na ngua de instupSo cu instrupdo escolar inedequada Cédigos | OMS | cWD-10 315.00 | F810. | Défcitde tetra: acuréci,futncae campree 3152 81.81 | Dé na expresso escitaortografi,eramaticae pontuago,carera organiza 351 F812 | Déficit na matemétice: senso numdtic, fates arimétics, cleuloe racic arte, Cravdade | Leve, maderado ou grave Fone PA 213. dos dois principais transtornos de aprendi zagem, a dislexia e a discalculia (ver tam- bem Haase, Moura, Pinheiro-Chagas, & Wood, 2011). Posteriormente, serao discu- tidos os mecanismos cognitivos, a avaliago neuropsicolégica baseada nos instrumen- tos diagnésticos dispontveis no Brasil al- gumas abordagens 3 intervencao. As dificuldades enfientadas por oca- sido da reformulagio dos critérios diagnés- ticos dos TEAs no DSM-S tefletem o estado atual do conhecimento, Os principais tpi cos de controvérsia dizem respeito A especifi- cidade e aos critérios diagndsticos, traduzin- do a falta de conhecimento sobre a validade interna dessasentidades, ou sea, sobre a ho- ‘mogeneidade, a consisténcia interna e a co- bertura dos sintomas. Esta disponivel mui to mais informacao sobre a validade externa dios TEAs, compreendendo etiologia, meca- nismos, progndstico, intervencies, et. ‘A inspecio da Tabela 10.2 revela mais semelhancas do que diferencas do ponto de vista clinico-epidemiologico entre dislexiae discalculia (ver também Haase etal, 2011). Isso decorre diretamente do modo como os TEAs sio definidos. As grandes difecengas dizem respeito aos dominios académicos comprometidos e, portanto, aos mecanis- ‘mos subjacentes. 143 Neuropsicologia “aquenyeunye 9 auenyewiu eiopyedoisg (002) 200K 9 suaseg epuatsovau 2 apepiigefaidua auen) —oansgufolg (ssa) -seperogeao oes sop eye me wa epenvaye ——eansqubep Due SYALAD Sop eIURTSS0g ——_SPBpUTCEN val jezsp woo wewjedauue ‘seueedu) —sepepiqoueg ‘o02) senpenceene sg a ena Tptgogu waque opbuaNeque ysodsoy ‘ " (oa sampenqaanssjey —p-owuaduasep eaupcaisip ap eusiug _—stopewogeao a ajeH send p-oyueduasap eoupdarsip ap aug ——_eagspulang “pune jesneo 102} owoa ouput anpuseul wa eyuacuesp ap opequNpEd a “eumja| ua awuaduasap ap ope2uaped (e102) yay 381 u8 opjauoidin auaujerueysns mas} (eto) wa aise ue opuosduea ayewyetouesors 21233 oetiyea Cro ry wionguaaa ynje0s s1p ep oanereduoo o21Bojo1wepide Zor VaavL, tes, Malloy-inz, Camargo & Cosenza (orgs) 144 terug) "seoiqpies cabo aseal ap ied © (tea) 20m) ayy Tene) wos 9 sono suo yeong 9 sousueoea eves ou "apes ua 0 2019 99 Pak (era se spepaseun ers ap 3 YOEN 2 POH saoipganas Seaypjowseeiemy ela RUNNY ‘USE (soz yng fugusaey (556 yous 2 foe “to 04 (oe61)voseay nee -opengeea#uosenoer 102 sanpeiogeooa uno“ wrongs fo wionguasa ep onpesedwo2 oaiB9iolwapyde-2oquo Wed Zor Viaavl, 145 Neuropsicologia ‘pepnaetioeune 9 ap 9p oUNUEA = HAO uny weBewauney 2p rao e202 pau a sepewawepuny (o0e)_sopmsa wos an weayyog 9599529 9 sonido ay 9 vodpBepetoxscoinau oebuans ‘yw YsopEY-UeueD jaded o opyncipsjusivaayns 0, oFU epuy "ngnoaraopbunsip 2 02uguNU (ete) see «0a 5 opeoge0 8 ZeUAKASY opeioqeoo 9 zevayusy Con ry Ce (oeSenuquoa) einayeast segbuansiu optus a swoaid vayspudeig SIP €p oanereduoo o21Zojo1wepide-o314 9 1yI0g Zor Viaavi 146 MECANISMOS COGNITIVOS Os mecanismos cognitivos subjacentes aos TEAs podem ser categorizados em gerais © especificos. Os mecanismos gerais com- preendem a inteligencia e a meméria ope- racional, sobretudo 0 componente execu- tivo central. Jé os mecanismos especificos diferem de uma entidade para a outra. Muito provavelmente, os transtor- nos do neurodesenvolvimento se originam da interagio entre fatores cognitivos ge- ais ¢ especificos (Johnson, 2012). Os det

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