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192 ARQUITETURA VIVENCIADA textural perfeitamente homogéneo, como no caso das colunas da fachada do arte de Faaborg, na Dinamarea. Mas a maior parte 10 de alvenaria ¢ uma combinagao de dois ‘materiais — alias, dois materiais muito dissemethantes ~ como ti- Jolo cozido e argamassa feita de cal misturada com areia e agua. ‘Como existem muitas espécies de tijolo e muitas espécies de ar- gamassa que podem ser combinadas, e como o resultado final também depende do ligamento e do padrio de juntura, compreen- de-se facil por tipos particulares de mas todos eles se ‘compoem dos mesmos elementos jolo ¢ argamassa, iderado o verdadeiro material de cons- trugo e a argamassa simplesmente um aglutinante. Portanto, 0 jolo nio s6 deve formar a maior percentagem da superficie da arede, mas 0 seu material e cor devem predominar, de\ lo fino e macio, a argamassa deve ser igual- mente fina. Os arquitetos do Ressurgimento Grego sabiam dis Embora preferissem paredes de pedra, sempre que usaram tijolo foi do tipo pequeno ¢ bem formado, macio mas no excessiva- mente duro, ¢ assente com juntas muito finas de argamassa. Isso to sepultados os da parede da uisburg Square, em Boston, por exemplo, so quase idénticas as paredes da capela de Fred Quando os custos de construgao permitem, os arquitetos pre~ ferem geralmente o tijolo feito a dentro dos li da técnica rebaixadas, para as paredes da Baker LT, até 0 tijolo macio e de cor clara que foi usado ‘0 dinamarqués Ame Jacobsen na grande maioria de ios mais recentes. 8. A LUZ DO DIA EM ARQUITETURA. nados. O arg pode estabelecer a orientago de seu edifici teriais ¢ 0 modo como estes serio tratado samente as quai antes de ser col dos e cavidades, speci pode descrever preci- idades ¢ qualidades que deseja em ‘um fator tio ido artisticamente? a8 variagdes na quantidade de luz podem ser ignoradas, uma vez que, embora possam ser medidas com a Em primeiro ajuda de instrumentos, dificilmente nos apercebemos delas. A adaptabilidade do olho humano é surpreendentemente grande. A fz bri ode ser 250.000 vezes mais intensa do que a 9, podemos ver as mesmas formas em pleno dia ou iluminadas apenas pelo luar. A lade de luz refletida superficie branca no inverno ¢ inferior refletida por uma ie preta de mesmo tamanho no verdo, mas, ainda assim, vemos 0 branco como branco € o preto como preto. E podemos distinguir claramente uma letra preta sobre um fundo branco. A luz é de importéncia decisiva para sentirmos a arquitetura. ‘A mesma sala pode ser onganizada para dar diferentes impresses TURA VIVENCIADA cdo em Cadi espaciais mediante o simples expediente de mudar as dimensées ea localizacao de suas aberturas. Transferir uma janela do centro para uma ponta de uma parede transformaré profundamente todo ocardter da sala, Para ni mos no grande niimero de possibilidades, ‘vamos nos limitar aqui a tréstipos: a sala aberta & claridade, a que recebe luz do alto e, a mais tipica de todas, a sala em que a luz pe~ netra por um lado. Podemos encontrar, em muitos periodos, exemplos de sala aberta uz vindo de todos 0s lados, especialmente em pai- ima quente. Esse tipo de cmodo consiste simplesmente im telhado sustentado por colunas para protecdo contra 0 sol inte. Para exemplo, escolhi um mercado coberto na cidade perto de Bordéus, na Franga meridional. Esse mer- {eto muito alto, muito mais alto do que as casas que ‘ALUZ DO DIA EM ARQUITETURA 195 circundam a praca onde ele se encontra. O recinto é acessivel pe- los quatro lados & muito luminoso, cheio de reflexos do calga- mento amarelo de fora. No entanto, a luz no interior do recinto € diferente da de fora. Quando os artigos estio expostos perto das arcadas, eles recebem considerivel soma de luz direta num lado, enquanto o outro fica na sombra, Mas o lado que est na sombra nunca é realmente escuro, pois 0 recinto é todo ele lu de- ‘mais para que isso ocorra. Em suma, a luz num dia nublado esta mais concentrada no interior do recinto do que fora e muito mais brilhante do que na maioria dos recintos fechados. Em varias épocas, arquitetos tentaram criar salas fechadas com esse tipo de iluminagao, Existem castelos medievais com amplas ja- nelas em ambas as paredes laterais e, em numerosas mansées, ha tum vasto saliio que atravessa toda a casa de uma parede externa ‘outra com janelas de ambos os lados. Saindo de um dos cémod menores que tem janelas apenas em uma parede, e entrando fio imenso inundado de tuz, tem-se uma sensagao de causada por toda essa luminosidade e aeragao. Hoje, quando dispomos de melhores recursos do que nunca para criar esse tipo de sala, raramente as vemos. Existe, porém, o excelente na casa que Philip C. Johnson constr para si mesmo em New Canaan, Connecticut. A casa co ‘numa ampla c fo retangular duas vezes mi rido do que largo, com paredes de vidro em todas as qual ees e um telhado sélido. © banheiro é composto por um ci de tijolo que vai do piso ao teto e situa-se no centro do recinto, a0 asso que a cozinha consiste simplesmente de v io, € dificil imaginar que uma sensago de interior possa ser criada em tal caixa transparente de vidro. Mas, do lado de dentro, o efei- to que se sente é muito diverso. Trata-se definitivamente de um intetior. O piso e o teto ajudam a criar uma sen: 08 produtos téxteis ¢ 0 agrupamento do mol atmosfera de intimidade. Do teto ao chao, nas paredes de vidro, hd cortinas ou persianas brancas que podem ser reguladas para controlar a entrada de luz ¢ impedir os olhares curiosos. Isso tam- bem ajuda a reforgar a sensaedo de interior. O sistema japonés de 196 ARQUITETURA VWENCIADA i para sa prop palo arto Pip C Johnson, New paredes corredicas foi transferido de uma casa de madeira e pa- pel para uma de ago e vidro. Do lado de fora, a luz filtra-se através da folhagem de Arvores espalhadas pelo terreno circundante. Sob suas ta e sente-se — tal como numa das villas de ha ai uma base firme, um plano cuidadosamente concebido, a par- tir do qual se pode observar toda a extensio dos campos em volta, vistos através dos retingulos da estrutura de ago. O principal gru- po de mobilirio, colocado sobre um grande tapete, est muito bem situado numa zona entre o centro da sala e a parede sul. Ai, ‘onde ha uma luz excelente, encontra-se também uma grande pega de escultura e um cavalete com uma pintura moderna. Antes de prosseguir, seria bom explicar 0 que entendo por “luz excelente”, Isso € necessirio porque para a maioria das pes ‘A1U2.0 01 EM ARQUITETURA 197 ‘uma boa luz significa apenas muita luz. E, com muita freqiiéncia, verificamos que tal nogao é inconseqiiente, jé que a quantidade de Juz est longe de ser to importante quanto a sua qualidade, Imaginemos estar olhando para um Angulo projetado pelo en- contro de dois planos brancos. Se os dois planos estiverem uni- formemente iluminados por fontes que podem ser controladas, a luz podera ser regulada de tal modo que os dois lados apresen- tem iluminacao igual. Quando isso acontece, nossos olhos jé no podem mais observar a aresta do Angulo. Talvez ainda a reconhe- gamos, em virtude do cariter estereoscépico de nossa visio ou Porque podemos ver onde os dois pl Mas teremos perdido um meio essencial de ver que hid uma ares- ta, De nada adianta aumentar a luz, se esta for aumentada igual- mente de ambos os lados. Porém, se a luz for reduzida em um dos lados para que haja uma diferenca nitida na iluminago dos dois planos, a aresta ira se destacar claramente, mesmo que a in- tensidade total da luz seja agora inferior. Podemos, entdo, depreender facilmente que a luz frontal &, de um modo geral, uma luz pobre. Quando a luz incide sobre um relevo quase em dngulo reto, hé um minimo de sombra que tem, Portanto, efeito plistico, O efeito textural também é medi simplesmente porque a percepgao da textura depende de diferen- gas minisculas no relevo. Se 0 objeto for deslocado da luz fro tal para um lugar onde a luz Ihe incida lateralmente, ser possivel encontrar um ponto que propicie uma impressio excelente de relevo e textura. Um bom fotdgrafo experimenta varias poss dades até encontrar exatamente a luz correta para o seu model Se as partes iluminadas tiverem luz excessiva, a forma desse do ser morta e se as partes que estio na sombra forem escuras demais, nenhuma forma seré vista. Portanto, ele escolhe uma fuz que proporcione muitas variagdes, desde a luz intensa mais bri- Ihante até a sombra mais profunda, que revelam a verdadeita plas- ticidade de cada parte redonda. Ele dispde uma quantidade ad quada de luz refletida entre as sombras a fim de também ai ob- ter relevo. Quando finalmente ajustow a luz para conseguir uma imagem completamente plastica de seu modelo ¢ uma descri¢o acurada de sua textura, sem pontos indefinidos, diz que sua ima- ‘gem esté bem iluminada, 198 ARQUITETURA VIVENCIADA tentam—em vio — remediar esse problema, aumentan- do a intensidade da luz em vez-da qualidade. la de con foyer p todo 0 compr da parede lateral. O saléo esté pi cores claras, indicia de luz refletida das paredes e do teto, Numa extremidade, a parede esti inteiramente coberta por uma tapegaria colorida que recebe luz lateral proveniente da ja~ nela a esquerda. Essa local faz pleno jus ao desenho, tex- tura e cores da do estar uniformemente O fato de nao e ante, j4 que nao se pre~ ma obra de arte isolada, como parte integrante do sali. Se ela estivesse pendu- rada numa parede seria impossivel, de fato, ver m palco de teatro favoreciam o vestuario ¢ 0 cenério, ao passo que os efeitos luminosos mais ri- cos do palco moderno, freqtientemente, acabam com toda a bele- za. Antigamente, a luz que incidia sobre os atores vinha de bai- Xo, © que, de fato, nao era bom porque estamos habituados & luz ‘A LUZ DO DIA EM ARQUITETURA 199 vinda de cima, Era um mundo as avessas, com as partes que ust mente ficam na sombra, banhadas de luz, e as que so usualmen- de iluminago tornou-se uma convengao no teatro, e quando a: luzes da ribalta eram acesas, criavam imediatamente lade que é 0 proprio mundo do jente produziam sombras, de modo que os efeitos texturais nio fraudavam o piiblico. No teatro moderno, por outro lado, os atores princi geralmente, tio profusamente banhados pela luz de spotlights o pensar estar sendo r mado, com dois lados igu: dos de um ngulo saliente. Os rostos dos atores aparecem como ‘manchas de luz em que todas as feigdes, todos os tragos fisiond- foram apagados. Em sem ago até os mate~ is ricos parecem lisos e vulgares. A iluminagao do palco moderno prova de maneira conclusiva que a quantidade de luz no ¢ 0 que importa. O que é mais importante ¢ o modo como a luz incide. Apés essa longa digressio, deve ter ficado na casa de Philip Johnson lugares admirav para a exposi¢do de obras de arte —com uma igual quantidade de luz penetrando de dois lados ~ e outros que sio muito menos apropriados. Isso foi considerado na decoragao e dispo: ido, sentamo-nos mos as obras de arte sob as condigdes mais favoriveis. E, ao mes- mo tempo, podemos desfrutar da vista exterior de todos os lados, A antitese de tal casa, que é fechada no topo e aberta dos la- dos, € 0 recinto fechado de todos os lados e aberto no cimo. A primeira oferece uma variedade de efeitos luminosos em dife- rentes partes da sala, enquanto que o segundo pode ser planejado de modo que a luz seja igualmente boa em todas as suas partes. O mais belo exemplo de um interior completamente fechado e iluminado do alto é 0 Pantedo em Roma. Nenhuma reprodugéo pode fazer-Ihe justiga, imenso espaco arquit te fechado & nossa volta que causa a mais profund: te adequados 200 ARQUITETURA VIVENCIADA Reprod de Desgodete no qualquer vista parcial do monumento. Ao entrar no Pantedo, vindo da emaranhada teia de ruas e ruelas vizinhas, sentimos uma perfeita expresso de paz e harmonia. A escala normal das casas or que acabamos de passar faz. com que o peri rao, parega esmagadoramente alto, com suas gi nas desaparecendo na penumbra sob o telhado. Quando entra~ ‘mos na rotunda, apercebemo-nos imediatamente de uma luz mo- derada proveniente de uma fonte no topo, trés vezes mais alto A rotunda é to grande e espacosa quanto uma piazza romana. Em nenhum ponto as paredes se projetam para diante; a grande massa de alvenaria forma um circulo perfeito em tomo do enor- me recinto. A cipula é um hemisfério situado tdo alto que, se con- tinudssemos descrevendo a esfera inteira, sua parte inferior toca- ria o solo. Em outras palavras, a altura do cilindro da parede é altura do recinto igual a sua largura e ia de forma corresponde a algo grandioso ‘A200 018 EM ARQUITETURA 201 na execucio do edificio e, sobretud minagio. A abertura circular no pice constitui a Gnica conexdo com 0 ‘mundo exterior —ndo com o mundo ruidoso e displicente das ruas, ‘mas com a abobada celeste que se Ihe sobrepde. Quando 0 sol no penetra num cilindro o! porque provém de uma altura muito grande, Mas toda ela incide nna mesma direcdo, uma vez que provém de uma iinica fonte produz sombras reais. O piso, magnificamente pavimentado num padrio de quadrados e cfrculos de mérmore, recebe a maior qua- lidade da luz e boa parte dela é refletida, fazendo brilhar até os s escuros, de modo que niio existem real bras negras em parte alguma. A parede recua ¢ tabernaculos, com suas colunas © cornijas corintias, recebem luz suficiente para realgar as formas arquiteténicas em plena plasticidade. A ma; ficante rotunda do Pantedo foi copiada mensdes. Mas isso subverte todo 0 € cinto, especialmente se o tamanho da abertura para a luz também for alterado ou se aberturas adicionais forem paredes. Também € notivel ver como o efeito uminoso torna-se dife- rente quando a mesma segao é empregada num plano tal retangular, de modo que a ciipula converte-se num: cilindrica com uma abertura oblonga em vez de redonda. Isso pode ser observado na catedral de Copenhague construida du- rante ressurgimento grego. Essa catedral tem uma longa nave em abébada cilindrica com trés aberturas para a luz na abébada. A proporcao entre as dimensdes das aberturas para a luz e 0 piso € aproximadamente a mesma que no Pantedo, portanto, a luz nao & mais forte. Mas, por alguma razio, o efeito produzido pelas, trés aberturas é 0 de um extenso sulco luminoso atravessando toda a nave, em vez de trés pocas de luz concentrada. As estatuas de Thorvaldsen dos Diseipulos, alinhadas junto s paredes, rece- bem nao s6 luz direta mas também luz de ambos os lados © 0 resultado ¢ que todo o interior parece excessivamente iluminado e descaracterizado. coro € iluminado por uma quarta abertura no telhado que esti escondida dos olhos dos fiéis e, portanto, tem um efeito tea~ tral. Em muitas igrejas, especialmente as modernas, o arquiteto procurou criar um recrudescimento gradual de luz na diregao do 202 ARQUITETURA VIVENCIADA altar-mor. No Museu de Arte de Faaborg, na Dinamarca, um efei~ to muito rico foi produzido fazendo-se justamente o oposto. Um imax & criado mediante a alternagao de uma nuemente iluminada com uma outra maior e brilhantemente minada. No museu, a primeira sala, com sua vasta clara ‘to brilhante quanto a luz do dia. Vista a partir da primeira sal outra, octogonal e abobadada, ¢ como um santuério mistico. Uma luz ténue filtra-se através da pequena abertura na cdipula, sobre a estatua de pedra preta do fundador, Mads Rasmussen. A impres- sionante figura volta-se para o espectador e a luz é a suficiente ‘ALUZ DO DIA EM ARQUITETURA 203 para revelar a grande forma da qual o escultor, Kai Nielsen, con- servou apenas o essencial. A estitua é vista contra uma parede azul-cobalto, cuja cor é estranhamente intensificada na penum- bra da sala. Se esta fosse mais iluminada, 0 efeito seria muito ‘menos espetacular, Ha muitos exemplos de recintos em que 0 teto inteiro é uma Jarabdia. Esse livre influxo de luz natural propicia uma ausén- formas perdem sua plasticidade ¢ 0s efeitos texturais so geralmente mediocres, Isso pode ser visto io Municipal de Copenhague que tem dois patios ou sa- gues internos — um aberto e um coberto com telhado de vidro, 0 recinto principal do edificio. Embora se pudesse esperar que a luz fosse praticamente a mesma em ambos 0s locais, existe, 1 realidade, uma diferenga surpreendente. A sala é insipida, sem vida. Quando Ragnar Ostberg estava projetando o Palicio Mu- nicipal de Estocolmo, visitou 0 de Nyrop, em Copenhague, ¢ aprendeu algo sobre suas boas e mas qualidades. O seu edificio também tem um patio aberto e um outro coberto mas, em vez de dara este iltimo um teto de vidro, Ostberg construiu um teto s6- ido que, em trés lados, assenta em faixas de janelas. Desse mo- do, obteve uma alta iluminacao lateral logo abaixo do teto e, em- bora toda a sala seja mais escura do que a de Nyrop, a ilumina- ‘so € mais interessante, com menos auséncia de sombras e com mais vida. Em Gothenburg, encontramos novamente 0 Palicio Municipal com um patio coberto e um aberto. Mas, aqui, 0 ar= quiteto, Asplund, preferiu ligar os dois, dando ao primeiro uma parede de vidro orientada para o segundo. Assim, a luz do dia pe- netra lateralmente nessa sala, Mas como a parede de vidro s6 podia tera altura de dois andares, e a prépria sala corresponde a trés andares altos e muito fundos, Asplund achou necessério su- plementar a parede de vidro com uma abertura no telhado. Nao é uma clarabdia comum, parecendo mais uma segao de te dente de serra, de modo que a luz tee, é claro, do mesmo lado da luz. que entra pela parede de vi- dro, Esse arranjo propicia uma iluminagdo muito satisfatoria que faz jus a0 refinado material usado na construcao do edificio. Entre 0 método de iluminacdo empregado no Palicio Muni pal de Gothenburg e a sala iluminada unicamente por luz later da em empena. Os andares inferiores era bens, possibilitando uma con: trugdo poder comegar, numerosas estacas tinham de ser cravadas pequena. A fim de assegurar luz suficiente na érea residenci 206 ARQUITETURA VIVENCIADA s janelas da frente e dos fun ralmente, isso era ideal porque as paredes laterais sustentavam as vigas dos andares e do telhado, ao passo que as empenas sustenta- ‘yam apenas elas préprias. frente consistia numa parede de do havia bom tempo, os postigos podiam manter-se abertos para fora, de modo que os moradores pudessem ver a rua e a luz entrar Mas no mau tempo a luz que penetrava através dos pequenos pai- néis superiores tinha de bastar. Mais tarde, a metade inferior das 0s € as novas vidragas ajustadas em batent abriam para dentro. Por vezes, a parte superi no, agdo das janelas nas paredes da fren compreensivel que devesse e» espaco para as janelas, a o que os habitantes de qual- quer outro pais. Depois de terem aperfeicoado seu sistema de quatro postigos foram ainda adicionando cortinas e colgaduras. Pinturas a que pesadas AAWUZ.0 DIA EM ARQUITETURA 207 5 mercadores holandeses eram bons rias e materiais, ¢ rechearam suas casas ci tapetes Iuxuosos e porcelanas caras vindas do Oriente, adi ram maveis pesados ¢ bonitos, melhores tecidos. E, como j ses do sécul merosas possibilidades de iluminagao oferecidas pelo método especial de construgio holandesa. Os andares inferiores na maio- ria das casas tinham tetos muito altos. No andar térreo da casa de 208 ARQUITETURA VIVENCIADA [LUZ DO DIA EM ARQUITETURA 209 jéncia de todaa retratados. Apercebemo-nos da luz forte €05 reflexos das outras paredes dai nunca sa 210 ARQUITETUR mene us eM A ETURA 211 pérolas, a luz provém somente da metade superior da janela a0 fundo e ainda é mais atenuada pelas cortinas. O quadro na parede projeta uma sombra profunda — e apenas uma so quadros neer é a janela do fun podemos percorrer todas a obteve a luz certa para cada jo existem zonas ambiguas em sua pintura, jolanda de hoje, janelas com e 5 podemos observar a sma oferecia para regular a luz aberor que vio ao Hé alguns anos, na Escola de Arquitetura de Copenhague, re- con: gio holandés e estuda- s que permitia. Charlottenborg, onde a esco- la esté alojada, é uma tipica e vasta mansio holandesa do século XVII As janelas do segundo andar séo duas vezes mais altas do que largas e esto divididas em quatro painéis de igual tamanho. Equipando cada painel com persianas, pudemos regular a luz do dia tal como era feito nas antigas casas holandesas. Usamos as janelas numa das grandes salas quadradas para 0 nosso experi- ‘mento, com 0 qual aprendemos muito. Fechando apenas as meta- des inferiores, produzimos uma luz mais uniforme em toda a sala; fechando as metades superiores e deixando as inferiores sem per- sianas, a luz concentrava-se perto vamos aptos a criar o mais espetacular chiaroscuro rembrandtiano e a reprodu- zir 0s arranjos luminosos de Vermeer. Quando a classe de dese- nho livre trabalhou nessa sala, fizemos experimentos com as persianas até encontrarmos a luz que melhor destacava as quali- dades plasticas e texturais caracteristicas do modelo que estava sendo copiado pelos estudantes. Em suma, o velho sistema de postigos holandés ensinou-nos muito sobre os efeitos que o arqui- teto pode produzir mediante a u ALUZDO DIA Em aRQU mar Nas casas venezianas, como ja foi mencionado, nfo é incomum ter aposentos contendo duas janelas separadas, até onde é possi- vel, por um sélido pano de parede. Nos palicios antigos havia freqiientemente um profundo salfo central atrés de uma loggia aberta e, de cada lado dessa sala de verdo estavam as salas de it verno com as janelas muito separadas. Desse modo, cada sal nha uma luz caracteristica que era favoravel as pinturas ¢ escu turas. Fora de Veneza e das cidades holandesas, os arquitetos ra- ramente trabalharam com efeitos de luz desse género. Porém, alguns exemplos podem ser encontrados. Em 1910, 0 arquiteto sueco Flis Benckert (1881-1913) cons- truiu uma villa nos arredores de Estocolmo, na qual havia varias Janelas dispostas de forma incomum. Hoje, lamentavelmente, a maioria das idéias originais do projeto foram destruidas por re- formas subseqiientes. Benckert estudara a iluminagdo em anti- 24 ARQUITETURA vIVENCIADA Jjanelas contra as pa- terais e profundas faces laterais do vao de cada janela. Ele utilizou a experiéncia assim acumulada em seu projeto de uma sala de jantar onde o vao da janela chegava até a parede late~ so jogava uma luz fina sobre a grande tapecaria que estava mo era mais uma questio de slogans do que de solugdes definitivas para problemas de design e estru- tura, Palavras como livre, aberto e luz eram as ténicas do novo estilo. Muitas vezes, porém, o que se procurava era mais a quan- tidade do que a qualidad. er, que & pintor \kém de arquiteto, projetou desde 0 inicio aposentos em que a luz vem de um lado através de janelas que abrangem uma parede inteira. Isso podia dar uma luz to boa a sala quanto ‘numa antiga casa holandesa, mas as janelas de Le Corbusier, ge~ ralmente, nio oferecem meios para regular a luz. A sala grande ‘LUZ 00 DIA EM ARQUIETURA 215 dos apartamentos de seu bloco de Marselha lembra as salas da Joggia num palicio veneziano. O teto & muito alto ¢ a abertura da Jjanela abrange uma parede inteira. Onde as casas antigas tinham ‘uma massa de finos detalhes de pedra, como colunas, arcos ¢ rendilhados, a de Le Corbusier tem reixas de concreto, E ele pro- a luz para que uma quantidade comparativamente penetrasse até o fundo da sala. As parede estio bem iluminadas e tudo na sala apresenta aq a que ele tanto admira. Um dos problemas com que os arquitetos modernos freq temente se defrontam consiste em obter luz boa e uniforme para muitas partes diferentes de um vasto recinto. O uso de claraboias no é tio eficaz porque a luz. vinda dela é difusa demais duzir sombras necessérias que permitam ver cl forma ea textura. Tampouco somente a luz lateral é satisfatoria embora muito melhor — porque no penetra com profundidade suficiente. A solucao foi encontrada no telhado em forma de den- tes de serta, isto é, uma série de elevadas lucarnas laterais que produzem uma excelente luz em todas as partes do recinto. O ‘mesmo problema surge no projeto de salas de aula: como forne- cer iluminaco uniforme a todas as carteiras na sala? Nesse caso, é ida, geralmente, uma solugao errada, acrescentando-se a priméria de janelas numa parede, uma fileira se- ia colocada na parte mais alta da parede oposta. Esse mé- todo ¢ usado especialmente na Inglaterra, onde é dada muita Enfase a ventilago cruzada. Mas, sob o ponto de vista da ilumi- nagdo, isso ndo € bom. As janelas muito altas numa parede de fundo nao fornecem luz, direta para essa parede nem para a parte da sala mais proxima dela, que & a mais escura. Por outro lado, ceriam uma zona média mais a frente, a qual recebe um montante quase igual de luz. de ambos os lados, 0 que, evidentemente, 6 indesejavel. Pesquisas realizadas entre os alunos em tais salas de aula apuraram haver certas carteiras nas quais as criangas — sem serem capazes de explicar por que ~ niio gostam de trabalhar. Uma luz mais ou menos concentrada — isto é, luz de uma ou ido na mesma diregdo — é a melhor para se ve- ‘ma ¢ textura, Ao mesmo tempo, esse tipo de iluminagao © cariter fechado de uma sala. A luz pode, por si 86, criar 0 efeito de espago fechado. Uma fogueira de acampamento podemos empregar luz concentrada, No inicio de sua cari Frank Lloyd Wright reconheceu isso, Em suas casas construidas no sobem até 0 teto, mas deixam espago para aberturas no topo, Isso no s6 confere uma sensagdo de abertura ao aposento mas admite luz extra. De um modo geral, entretanto, os interiores tht sio, muitas vezes, predominantemente escu- irvores circundantes absorvem muito da luz direta. E, espe- cialmente, 03 materiais que ele usa aumentam a escuridio. Ele cemprega efeitos asperos e risticos, pedra rusticada e madeira tos- ‘ALUZDO DIA EM ARQUITETURA 217 ‘em Ronchamps, Haute Sane, ance ca, assim como paredes nuas e tapetes espessos. Com o passar do tempo todos eles tornam-se escuros. Para os cantos, que de outro ‘modo estariam completamente na sombra, escondendo interes- santes efeitos texturais, Wright obtém luz extra através de uma janela baixa e longa, uma vidraga triangular ou alguma outra no- Vidade, que aclara as sombras & semelhanga das limpadas extras usadas pelos fotdgrafos profissionais. E nessa luz lateral 0 pa- dro de veios da madeira eas talhas geométricas podem ser cla- ramente vistos. E uma arte superlativamente refinada, emprega- da com muita deliberagio e engenho; mas € perigoso imiti-la Hoje em dia, um excessivo mimero de casas so inundadas de tap. 218 numa composicao extraordi tico, criando apenas uma luminosidade ofuscante. te bem integrada Le Corbusier, que até entio tra com aposentos inun- ‘Ao entrarmos na igreja, o que primeiro impressiona é 0 am- io adequada para formas precisas ¢ cores biente estar muito escuro. Gradualmente, apercebemo-nos das terior de igreja em Ronchamps que possui o paredes e comecamos a not ies planas e regu! yasear na penumbra da iluminagao indire- dade nao serio mais encontradas no interior do que no exterior ta, na qual a forma s6 é obscuramente revelada. Trata-se de um do edificio. O proprio piso é como uma paisagem ondulada de 0 catdlico dedicado a uma imagem milagrosa da Virgem € 0 projeto de todo 0 edi sjes de pedra, num padrao irreg Ficio baseou-se em idéias € emo- cos sélidos para os figis forma i das que haviam determinado sua obra incia, as paredes ¢ a torre brancas da igreja po- dominando alto cume de uma paisagem pequeno grupo de ban- logramo a um lado do ies in até enti, A dem ser vist ide, muitas vezes, so uma parede espessa, per as aberturas de dimensdes desiguais. Do lado de ie plana; todoo fora, elas parecem minisculas vigias mas, no interior, elas abrem- dem umas atras das outras. O ritmo ondulante da paisagem pare- bbradas missas campais. A direit ce continuar no tragado da igreja, A medida que nos aproxima- rada por numer mos, descobrimos que nfo existe uma s6 super 222 ARQUTETURA VIVENCIADA se em vos amplos e brancos que projetam consideravel quanti- dade de luz refletida no recinto penumbroso. Algumas dessas aberturas foram fechadas com vidro em que foram pintados or- namentos ou inscrigdes. No angulo formado pela parede do lado sul e a parede do fundo, que contém a Virgem, existe uma fissura estreita do piso ao teto com um arranjo gigantesco de concreto, semelhante a uma tela ou cortina, que tem o objetivo evidente de impedir a entrada de luz direta, Mas a luz que penetra é tanta que cchega a atrapalhar os figis que tentam concentrar-se em su vogdes. A penumbra que jorra da fissura branco. O que do lado de fora parecem torres — duas voltadas para leste € uma para oeste — so vistas do interior como absides, am- pandrio so, na verdade, janelas que ndo podem ser vistas do in- terior, mas que, acima do telhado, espalham uma luz mi bre as paredes curvas da faindo a atengio dos altar e mais para o a Le Corbusier, contribuigio para a arquitetura e mostrou de maneira impressio- ante como a luz do dia e sua distribuicdo constituem um mara- vilhoso meio de expressdo para o artista, 9. COR EM ARQUITETURA E sabido que os antigos templos gregos eram originalmente policromos, mas 0 tempo despojou-s de todos os vestigios de cor, ¢ hoje encontram-se em pedra nua. Porém, apesar de tal pro- ainda os sentimos como deixa de cor é usada para enfatizar o c: sua forma e material, e para elucidar suas di Se entendemos por “cor” ndo s6 as cores prim ‘bém todos os tons neutros do branco ao preto, passando pelo cin- za ¢ todas as possiveis misturas, entio é claro que todo edificio tem cor. O que nos interessa aqui é 0 seu emprego numa acepcao puramente arq 7 Originalmente, a cor no era problema; ela surgia por si mes- ‘ma. O homem usava os materiais que a natureza Ihe fornecia e que a experiéncia Ihe ensinava serem fortes ¢ prestaveis. As paredes de sua habitagio podiam ser de lama endurecida e compacta, cavada no local da construgio, ou de pedras recolhidas por perto. A esses ‘materiais acrescentava galhos, palha e vime. O resultado era uma estrutura nas proprias cores da natureza, uma habitago humana que, como um ninho de pssaro, era parte integrante da paisagem. 22a asi TURA VIVENCIADA © homem primitive decorava sua cabana de madeira ou chou- pana de adobe, guarnecendo-a com grinaldas de flores ou reves- tindo as paredes cinzentas com tecidos coloridos. Assim, ele pro- curava melhorar a rusticidade da natureza, tal como pendurava ornamentos coloridos em seu corpo tostado pelo sol. arde, © homem descobriu como fazer materiais mais duradouros do que os oferecidos pela natureza, e novas cores co- megaram a aparecer. Ao cozer o barro, obtemos tijolos verme- hos e amarelos, em lugar da variedade cinzenta que se seca a0 sol. Ao revestir a madeira com uma camada de piche, consegui- 10. Gragas a tais processos, dis gama de virias cores, jolos, por restrita, E, mesmo que 08 mi de construgao sejam protegidos por uma tinta que oferecem re E ébvio que exi poucas sio as cores de lade. na conexao inexplicdvel entre materiais cor independentemente mas apenas como uma das muitas caracteristicas de um determinado material. Do por exemplo, um cetim ecidos com a mesma sed: leve, 0 segundo tera profundidade e fal A partir do momento em que a cor dos materiais de constru- ‘eo passou a ser controlada pelo homem, em vez de ser produzi- da pela natureza, ipo pe- provavel & qi : essa pedra, E, se ha paredes rebocadas, € mais do que certo que seri reboco amarelo derivado da areia amarela lo- cal. As molduras das janelas, entretanto, podem ser pintadas em verde ou azul contras ages, as cores bri- Ihantes usadas so freqiientemente separadas por uma orla bran- a cada cor destacar-se com toda a sua pujanga, cones feTURA 225 Quando escolhemos uma cor que nao é determinada pelo pro- prio material de construgdo, a nossa selegao recai usualmente em uma que é natural em material com que estamos familiarizados. Em contraste com seu ambiente verde, as casas is da Noruega ¢ Suécia sio ge- ralmente pintadas em vermelho escuro. Hoje, isso que ja nao se nota, Mas como se originou tal O historiador de arte sueco Erik Lundberg propés a teoria de que esse costume teve inicio na imitagaio das mansées senhoriais de lo vermelho que eram grandiosas ¢ duradouras, de onde sur- idéia de que uma casa de verdade tinha de ser vermelha. Geragdes subseqiientes imitaram as casas de ¢: cores. Numa fazenda norueguesa, onde todas as cot ‘aantiquada pintura vermetha, somos capazes de en do proprietirio em estilo Ressurgimento Classico. Ela sera de madeira mas com um acabamento muito mais requinta- do: tabuas macias e meticulosamente aparelhadas, pintadas em tons de cinza e branco ou com delicados matizes de amarelo ou rosa, numa reminiscéncia das casas de estuque do periodo. Mas, com freqiiéncia, o estuque e as cores aguadas também sio imita- ‘Ges. Nas cidades italianas, as casas sio geralmente da cor da ra local, como em Siena, onde a cor das casas de estuque & terre di Siena, Mas em outros lugares podemos encontrar paredes caia- ‘das com molduras de reboco amarelo que pretendem assemelhar- se, ou melhor, simbol tal emprego da cor. Nao se trata de uma tentativa de iludir as pes- i$ como simbolos. De um modo ‘cor, para a maioria das pessoas, sempre foi eminentemente Em Pequim, as cores brithantes eram reservadas para s. As residéncias co- e ladrilho eram tem- de cozimento que os 226 ARQUTETURA VIVENCADA A cor ainda ¢ usada simbolicamente de muitas maneiras. Exis- tem cores para sinais e avisos especiais; cores nacionais, acadé- micas ¢ para uniformes; e cores para toda espécie de clubes e sociedades. Mas independentemente de tais usos, existem cores que se revestem de um significado especial ou que sdo reserva- das para fins e ocasides definidos. Nao s6 os charutos so mar- rons, mas seus recipientes sao feitos de madeira marrom, cedro (ou mogno, que preservam melhor o charuto e seu perfume. Essas ’ixas de charutos, lembram as casas acima mencionadas, com paredes de cor natural acentuada pelo remate branco. Geralmente a caixa de charutos é ornamentada com decoragdes em outros materiais e cores — ouro e tons vivos impressos em papel lustroso, Mas, independentemente de como 0s charutos so embalados, no podemos imagind-los em caixas cor-de-rosa ou verde-malva. Associamos essas cores mais com sabonetes e perfumes, além de elas lembrarem aromas que sio inimigos do tabaco. Também associamos cores a atributos mas- culinos ou femininos. Assim, as cores “tabaco” sio adequadas para o gabinete de trabalho, as “perfumadas” para o boudoir. De um modo geral, é dificil averiguar a fundo como chega- certas cores ¢ certas coisas. Produtos alimentares, por exemplo, devem ter todos suas cores reais. Se os vemos sob uma luz. que os falseia, que Ihes altera a cor, tornam-se repug- nantes. Certas cores tém efeitos psicolégicos geralmente reco- nhecidos. O verm« cor veemente, excitan- te; 0 verde ¢ apaziguador, ealmante. Ma convengdes de cor diferem em civilizagdes distintas. Corretamente usada, a cor pode expressar 0 cariter de um edificio ¢ o espirito que pretende transmitir. Enquanto 0 aspecto de um edificio pode ser claro e alegre, indicando festividade e re- im outro pode ter um ar austero e eficiente, sugerindo trabalho e concentracio. Para ambos os tipos existem cores que parecem inteiramente corretas ¢ outras que sio completamente inadequadas, destoantes. .__Pelo uso de uma sé cor, ou de um esquema definido de cores, € possivel sugerir a principal fungo de um edificio. Mas, num mesmo edificio, varias cores podem ser utilizadas para acentuar a forma, as divisdes e outros elementos arquitetdnicos, Certas co- cre (COR Em AnQUTETURA 227, res podem fazer um objeto parecer mais leve, outras mais pesado do que ele realmente €. Podem fazer com que parega grande ou pequeno, proximo ou distante, frio ou quente, tudo de acordo com a cor que Ihe & dada. Existem imimeras regras e instrugdes para o emprego de cor a fim de esconder imperfeigdes ¢ defeitos Partes estruturais feias podem ser “apagadas” com pintura ou tornar-se menos dbvias recorrendo-se a cor. Uma sala pequena poder parecer maior se Ihe for dada uma cor palida. Ou se é uma sala fria, com uma exposicao ao norte ou leste, & possivel dar-the uma luz do sol artificial se for pintada em tons quentes, como marfim, creme ou péssego. Mas ha algo de insatisfatério a respeito de tal camuflagem. F irritante descobrir que a coisa no 60 que esperavamos. Na arquitetura conscientemente projetada, a sala pequena parece pequena, a sala grande parece grande ¢, em vez de disfargar essas caracteristicas, elas devem ser enfati- zadas pelo uso judicioso da cor. O quarto pequeno deve ser pin- tado em tons profundos, saturados, para que sintamos realmente a intimidade de quatro paredes préximas & nossa volta. Eo ‘esquema cromatico do quarto ou sala grande deve ser leve e are- Jado, para ficarmos duplamente conscientes da amplidao de es- ‘pago de parede a parede. “Um teérico alemao descreveu em detalhe como a cor pode ser uusada para enfatizar nao s6 0 que é grande e o que é pequeno, mas também o que esti em cima e 0 que esta embaixo. O piso, diz ele, como a terra em que caminhamos, deve propiciar uma impressio de gravidade. Portanto, deve ter os tons cinzentos ou castanhos do barro ou do solo rochoso. As paredes, por outro lado, devem ter mais cor, como arbustos ¢ arvores em flor e tudo 0 que se eleva ima da superficie da terra s6lida. E, finalmente, 0 teto deve ser levee incorpéreo, em tons de branco ou delicados matizes de rosa € azul, como o céu acima de nossas cabecas. Geraria um senti- ‘mento de inseguranga, afirma ele, caminhar sobre pisos rosados ou azuis, e sentiriamos o teto como uma pesada carga empurran- do-nos para baixo se o pintdssemos numa cor escura. Enquanto estou sentado a ler essa explicacao teérica, ergo os olhos do livro e passeio-os pela sala. O piso esté coberto com um tapete chinés em encantador azul-anil, sobre o qual caminho to- dos 0s dias sem o mais leve sentimento de inseguranca. 28 ARQUITETURA VIVENCIADA, Penso em aposentos que vi em antigas mansdes com marmo- res rosa e cinza, paredes caiadas de os com vigas pre~ tas, to pesadas ¢ escuras que realmente sentimos o seu peso. ‘Apesar de todas as teorias, podemos dizer a respeito da cor, como a respeito de todos os outros elementos de arquitetura, que no existem regras definitivas nem diretrizes que, se forem estri- tamente obedecidas, garantam uma boa arquitetura. A cor pode ser um poderoso meio de expresso para o ai ue tem al- outro, que dey Quando o homem © estigio em que usa a cor no sé para preservar os materiais de construgao e enfatizar a estrutura € 0s efeitos texturais, mas também para criar uma grande composi- ao arquitetural mais clara, para articular inter-relagdes entre uma , entdo um novo e grande campo se abriu diante dele. No Palacio ipal de Copenhague, que data de aprox; madamente 1900, 0 arquiteto estava tdo interessado em todos os jente para realcar os los integrados, mas apenas como uma série de interessantes de- talhes. A geracdo seguinte de arquitetos rel déncia e, no Museu de Faaborg (1912-14), Carl Petersen mostrou como 0 efeito exatamente oposto podia ser obtido mediante 0 uso namos antes, p. 202) formado em dador, Mads Rasmussen, obra do esc des da estatua negra do fun- tor Kai Nielsen. As pare- do rebocadas, pintadas a fresco e polidas, de modo que sua ra esta completamente escondida. A alvenaria ndo desvia a atengao que deve estar voltada para a sala em si mesma. O ar- t0 pintou as paredes em puro azul-cobalto, 0 que di coesio a0 octégono. Carl Petersen cresceu na segunda metade do século XIX, quando cores atenuadas e quebradas as cores brilhante: ‘onsideradas inat Ele freqiientou um colégio em que certa das a maneira de Pompéia e um de seus professores, um velho pin- (COR Ex ARQUTETURA 229, tor de uma geragdo anterior, tinha em sua casa uma sala com pa- redes azul-cobalto, Essas cores causaram uma impresstio indelé- vel no jovem aluno. No Museu de Faaborg observa-se um feliz jogo entre a ilu- minagdo baga e a cor intensa do saldo abobadado. As cores ras tornam-se mais ricas e mais saturadas quando vistas luz, Quem tiver visto mosaicos na luz solene de igrejas terd sentido isso. O azul-cobalto no salto do museu no teria nem metade de sua eficdcia sob a luz brilhante do sol. Mas ai, onde o arquiteto empregou conscientemente efeitos luminosos trastantes, a cor cria um fascinante fundo para a estitua de pedra negra. Acredita-se geralmen feias, e que isso & v isso fosse verdade, o feliz res lo por Carl Petersen teria de ser creditado ao fato de ele ter tido a sorte de encontrar ‘um certo niimero de belas cores e de poder usé-las no muscu. Mas no € assim tio simples. Os artistas sabem que entre os de tonalidades cromaticas que 0 olho humano pode di ai ie haverd uma que nao seja considerada bela quando usada na combinagao certa ¢ do modo correto. E, inversamente, niio ha uma s6 cor que, em certas combinagdes, niio se torne su- perlativamente feia. ‘Acontece muitas vezes que, quando uma cor atraente, vista nas paredes de uma determinada sala, ¢ copiada em uma outra sala, perde seu atrativo no novo ambiente. Com efeito, a mesma cor na mesma superficie pode parecer muito diferente quando ‘vista em conjunto com diversas cores. Um cinza neutro contra ‘uma superficie vermelha tera um mat tra uma superficie verde parecerd decididamente avermelhado. E numa sala com uma janela voltada para o sul e outra para o norte, a mesma parede cinza teré um tom quente perto da janela meri- dional e um tom frio perto da setentrional. Cores quentes ¢ frias desempenham um papel importante em nossas vidas e expressam estado de dnimo e emogdes muito dife- rentes. Sentimo-las nas variagdes da luz diurma da manhii para entardecer. E verdade que 0 olho ajusta-se 4 mudanga gradu: 230 ARQUITETURA VIVENCIADA durante o di iro. Mas se observarmos o todo como uma uni- dade — uma paisagem ou uma cena de rua ~ adquirimos cons- ao longo da margem do rio Charles, em Boston, Massachusetts, de manha cedinho, nao sé sentimos que o ar é fresco, mas imagi- ramos poder vé-lo. Os velhos edificios em Boston parecem bri- Ihantes © novos, com sombras frias nitidamente gravadas, e os reflexos cintilantes dos barcos a vela na agua fazem-nos piscar Mas se voltarmos ao mesmo local ao entardecer, pouco por-do-sol, encontraremos as cores ofuscantes da ma- nha agora saturadas e quentes. O Hancock Building, que se apre- zento-esbranquicado © bem definido contra 0 céu & agora dourado € 10. A cipula dourada da As- iva Estadual é vista flutuando na atmosfera tipo ysse um segundo sol. Sentimos a tepidez. do sol vespertino e vemos a luz quente. Se imaginamos uma grande mansio com muitos cémodos, rimero de aposentos frios com ‘0S que seriam quentes, harmo- podemos concluir a partir disso que determinados aposentos seriam melhores do que outros, do ponto de vista estético. No clima nérdico, os quartos mais tépi- dos seriam os preferidos, 1as mais quentes a escolha seria favoravi ra fresca e os tons claros dos aposentos setentrionais seriam os mais favord~ veis para 3$ nossos bens. Disporiamos nessas salas os ‘nossos mi roveito dessa diferenca no de seus aposentos. Monticello, projetada por Jefferson ‘como uma maison de plaisance francesa, constitui um bom exem- 9, que lembra fria arqui- salas de estar da casa que so ‘mais aconchegantes ¢ estio de frente para oeste. A tradi¢ao da Virginia requeria um salio que atravessasse toda a casa de leste a ‘CORN ARQUTETURA 231 ‘este, com entradas em ambos os extremos a fim de propiciar uma brisa agradavel em dias quentes. George Washington enri- queceu esse plano simples em sua residéncia de Mount Vernon a0 adicionar uma piazza de colunas al criou uma sala fresca, aberta, sobranceira que se desenrola até 0 Potomac, em cont frente oeste, a qual, com o anexo das cozinhas ¢ a casa do jardi- neiro, envolve todo 0 patio onde o sol preguigosamente. Também no interior da casa, ele se serviu, com grande habilidade e proficiéncia, das qualidades da luz do dia. 0 ele trabalhava é uma cinto majestoso e arejado com uma enorme janela pal voltada para o norte. de tal edificio como uma composigdo de nu- ‘merosos aposentos de cardter diferente, em que a luz do dia e suas cores desempenham um papel decisivo, Em vez de tentar fazer com que os aposentos frios se tornem quentes, fez-se justamente clusivamente um reflexo do céu. O azul e outras cores frias mos~ tram grande brilho nos aposentos setentrionais, ao passo que as cores quentes se revelam sofriveis, como se observa sob um aba~ ie derrame luz azulada. Portanto, se nos aposentos seten- Essas condigdes podem ser ilustradas com a ajuda de pinturas de dois famosos artistas holandeses, Jan Vermeer ¢ Pieter de ‘Ambos trabalharam em Delft ¢ ambos pintaram a mesma espécie de interiores, com pessoas trajando as mesmas roupas. Foram contempordneos e viveram muito perto um do outro. Nao obstante, suas telas sio tio diferentes quanto a manha e a tarde. Vermeer representa a manha. Seu atelier tinha uma exposigio sobre o Voldergracht, onde o sol s6 aparecia tardia- ‘mente, nas tardes de verdo —e nesse periodo, segundo parece, ele 252 ARQUITETURA VVENCIADA, nunca pintow, pois niio existe um tinico raio de sol em suas telas, Pieter de Hooch fez seus quadros numa casa em Oude Delft, on- tados para oeste, envolvido pelo canto da luz e das cores quentes. C cobrimos que ha ta limo contra um piso de ladrilho preto branco — quanto no bom humor cordial dos marrons e vermelhos- cinabrio de Pieter de Hooch. 10. OUVINDO ARQUITETURA ‘A arquitetura pode ser ouvida? A maioria das pessoas dria provavelmente que, como a arquitetura no produz sons, nfio ida. Mas ela tampouco irradia luz:e, no entanto, po- que ela reflete e dese modo adquiri- ‘mos uma impresstio da forma e do material. Reci tos e materiais diferentes reverberam de modo diverso, Raramente nos apercebemos do quanto podemos ouvi-la. Re- cebemos uma impressao total da coisa para a qual estamos olhan- do e no prestamos atengio aos varios sentidos que contribuiram para essa impressio. Por exemplo, quando afirmamos que uma isso que a tem- peratura é muito baixa. A reagao, provavelmente, decorre de uma ia natural pelas formas e materiais que se encontram nes- sala — em outras palavras, essa afirmagao é decorrente de algo 10s. Ou talvez as cores sejam frias, e, nesse caso, a im- ivém de algo que vemos. Ou, finalmente, pode ser que cistica seja aspera, de modo qui tons altos ~ reverbera nele; portat impressdo & proveniente de algo que ouvimos. Se a mesma sala fosse dotada de cores quen- tes ou decorada com tapetes e cortinados para atenuar a aciistica, ia provavelmente nos parecer tépida e acolhedora, muito embo- aa temperatura fosse a mesma de antes. 2a MTETURA VIVENCIADA Se meditarmos sobre isso, descobriremos a exis certo niimero de estruturas que sentimos acust do, dos meus tempos de inffincia, a passagem abobadada que 4 antiga cidadela de Copenhague. Quando os soldados marcha- m pifaros ¢ tambores, o efeito era terrifican- te. Uma carroga que passasse por ela soava como o ribombar de uma tremenda e fas- ela ndo estava a vista, meme & mente os ruidos de ti- 1 O terceiro homem. Conquanto a maior parte desse ime se componha de uma espécie de colagem de cenas cinema- icas e musica de citara que nao tém relagao alguma com a agdo, as cenas finais, que mostram um bandido sendo cagado através dos interminaveis tineis do sistema de esgotos de Viena, inteiramente sem miisica e provocam uma impressio visual ¢ oral muito realista. Os sons caracteristicos que os tineis produ- zem sio claramente ouvidos no chapinhar da agua e nos ecos dos ‘OuvINDO ARQUITETURA 235 homens que perseguem o ter tamente ouvida. O nosso ou iro homem. Ai, a arquitetura & cer- ido recebe 0 impacto do compri- openhague, tem um efeito ante ao de tiineis e passagens cobertas. Em 1834, 0 rei dinamarqués doou uma antiga coch adada para abrigar as obras do famoso escultor. O edificio foi converti- do num belo museu com uma estitua em cada galeria abobadada, onde os longos ecos da cocheira ainda parecem prolongar-se. E ‘uma casa para efigies de pedra e nao tem nenhum dos confortos de casas construidas para seres humanos. Os pisos so de peda, as paredes de pdr, 0s tetos de eda, até mesmo os residents de som s, longos e reverberantes. Quando entramos nesse lar de esttuas, estamos num mundo que € muito diferente do da pequena capital provinciana do século XIX que 0 construiu. Ele assemelha-se mais a Roma, grande ¢ digno como dos grandiosos vigoroso diretor do museu emprega muitos métodos para atrair visitantes, incluindo recit centre as obras de ar- te. O vestibulo é um dos recintos mais nobres de Copenhague, para esses eventos musicais, © piso com tapetes e pendurando panejamentos nas paredes. En- tio, se o piblico é suficientemente numeroso para compensar a falta de estofados e tapecarias na austera galeria, a sala tem suas ‘maneiras alteradas, renunciando & sua voz. estentérica e tornan- do-se tio civilizada que ¢ possivel distinguir cada som de cada instrumento. Isso pode levar a pensar que a actistica do Museu Thorvald- sen é ruim, a menos que sejam tomadas medidas para melhoré-la —o que é verdade, sem diivida, quando ele ¢ usado para miisic de cmara, Mas também poderia perfeitamente ser dito que tem uma excelente aciistica, desde que seja executado 0 género certo de miisica. E tal miisica existe, As salmodias que foram criadas, para a igreja crist® primitiva em Roma soariam magnificamente na galeria de pedra do Museu Thorvaldsen. As antigas 236 ARQUIETURA VIVENCIADA do atual edificio rena: truco de cinco naves eraa basilica de S. Pe 238 ARQUITETURA VIVENCIADA ‘anti ea nov bases dS. Peo, Roms, Reprodiido de Alpharan ‘OuvINDO ARQUITETURA 239 podiam ser entoados num ritmo lento e solene, dadosamente ajustado ao tempo de reverberagao. sacerdote comegava pela nota recitativa e depois deixava sua voz declinar numa cadéncia ondulante a fim de que as prin- cipais silabas fossem distintamente ouvidas e depois esmoreces- sem para que outras se seguissem como modulacdes. Desse mo- do era eliminada a confusdo causada pela sobreposigao. O texto converteu-se num céntico que vivia na igreja e, de uma maneira fervorosa, fazia do grande edificio uma experiéncia musical, sim so, por exemplo, os cantos gregorianos que foram especial- mente compost a unissona é ouvida num disco reverberagio comparativamen- ois, embora 0 excesso de so- breposigio cause confusio, é necessiria uma certa quantidade dela para obter um bom som L, especialmente, parece morta, Mas quando o mesmo disco ¢ toca~ do num recinto com extensas reverberagées, 0 som torna-se mui- to mais opulento. A ténica é ouvida quase o tempo todo, disten- dendo-se gradualmente ¢ depois retirando-se; e, junto com ela, as outras notas sao ouvidas a intervalos de uma terga ou de uma quinta, de modo que a coincidéncia de notas produz uma harmo- nia como no canto a varias vozes. Portanto, nas velhas igrejas, as paredes eram, de fato, poderosos instru que os antigos aprenderam a tocar. Quando se descobriu que 0 efeito tonal unificador da igreja como instrumento era tio grande que mais de um som podia ser ouvido ao mesmo tempo com resultados agradaveis, as harmonias produzidas pela coincidéncia de notas comegaram a ser regula mentadas usadas. A partir dai, desenvolveu-se 0 canto a varias vozes. “A miisica polifonica, tal como é ouvida hoje na catedral de Westminster”, foi diretamente produzida por uma forma de edificio e pelas vogais abertas da lingua latina...” ‘Abobadas, especialmente as abdbadas de ciipula, so muito efi- cazes do ponto de vista acistico. Uma cpula pode ser um forte 2240 ARQUITETURA VIVENCIADA reverberador e criar centros sonoros especiais. A igreja bizantina de S. Marcos, em Veneza, esti construida sobre um plano de cruz grega e tem cinco cipulas, uma no centro uma em cada uum dos quatro bragos da cruz. Essa combinago produz condi- ges actsticas bastante incomuns, O organista e compositor Gio- vvanni Gabrieli, que viveu por volta de 1600, extraiu toda a vanta- gem que pode dessas circunstincias na miisica que compos para -omo as Sacrae Symphoniae. A igreja de S. Marcos s galerias musicais, uma A direita ¢ outra a esquerda, uma o mais longe po cada qual com sua ctipula como poderoso ressonador. A miisica era ouvida de ambos os lados, um respondendo ao outro numa Sonata Pian e Forte. A congregacdo nao s6 ouvia duas orquestras; ela ouvia também dois recintos com abébada de cépula, um falando em sons argén- te0s, 0 outro respondendo em metais ressoantes. Embora esse seja um exemplo impar, todo interior de uma grande igreja possui sua voz prdpria, suas possibilidades espe- ciais. Hope Bagenal demonstrou convincentemente a influéncia dos tipos historicos de igreja sobre escolas de musica e declama- gio. Depois da Reforma, mudangas que afetaram a aciistica de ‘grejas tiveram de ser introduzidas a fim de adaptar os edificios & nova religido, na qual a pregagio na lingua vernacula desempe- nhava papel importante. A andlise de Bagenal da igreja de S. ‘Tomas, em Leipzig, onde Johann Sebastian Bach foi organista, & particularmente interessante. Grande parte da miisica de Bach foi ‘composta especialmente para essa igreja. E um vasto edificio gético de trés naves, com abdbadas abatidas. Apds a Reforma, vastas reas de madeira ressoante foram adicionadas & pedra nua. A madeira absorveu considerivel quantidade de som e redu- iu bastante o periodo de reverberagdo. As paredes laterais foram revestidas com filas sobrepostas de galerias de madeira e nume- 19305 camarotes privados ou “ninhos de andorinha”, como eram chamados. A inclusio de tantos camarotes e galerias era devida ao sistema luterano de administracao eclesiéstica que colocava a igreja sob a direcdo do conselho municipal. Cada vereador tinha seu préprio camarote familiar, tal como poderia ter na pera. Os novos aditamentos eram de estilo barroco, com molduras ¢ pai- néis ricamente esculpidos, ¢ havia cortinas nas aberturas. Hoje, ‘QUVINDO ARQUITETURA 241 es ejtuinal do pico tao de camarotes do século XU quando as filas de cadeiras fixas no pavimento térteo, os bancos das galerias e os camarotes estio repletos, como sempre aconte- ce quando se realizam concertos de Bach, 0 publico chega a atingir 1.800 pessoas. Toda essa madeira ajudou a criar a actisti vel o desenvolvimento seiscentista da Can- tata e da Paixdo. Hope Bagenal calculou a atual reverberacao em 2 12 segundos, em comparagdo com os 6 a 8 segundos na igreja medieval. A auséncia de uma “nota” ou regio de resposta na igreja possibilitou a Bach escrever suas obras numa varieda- de de tons. Essas novas condigdes tornaram possivel uma miisica muito mais complexa do que a que poderia ter sido apreciada na igreja primitiva. As Fugas de Bach, com suas muitas harmonias contra puderam ser executadas com éxito em S. Toms, assim como as vozes pu- ras do famoso coro de meninos da escola de S. Tomas eram ali ouvidas com total fidelidade. A igreja de S. Tomis, sob o ponto de vista aciistico, situa-se centre a igreja cristd primitiva e 0 teatro do século XVIII. Nesse tltimo, onde as ordens sobrepostas de camarotes cobriam as pa- . Nicola Ete lj de Christian, Chstansham, Oinamarca Seco e planta, exala 1400. ‘OUVINDO ARQUTETURA 243 redes do chiio ao teto, havia ainda mais absorgdo de som. As fa- chadas dos camarotes eram ricamente esculpidas e os préprios camarotes recebiam estofados e cortinas. Em cada espetaculo, 0 recinto ficava congestionado de um piblico em trajes de gala. O teto era plano e relativamente baixo, de modo que atuava como ‘uma caixa de ressonancia, desviando os sons para os camarotes, onde eram absorvidos pelo madeiramento € estofamento. Em conseqiiéncia, a reverberagio era muito curta ¢ todas as notas ~ mesmo em tais ornamentos musicais floreados, como coloratu- ras e pizzicatos — podiam ser nitidamente ouvi Em 1748, Nicolai Eigtved construiu, em Copenhague, a“Ca- sa Dinamarquesa de Comé ferradura e trés ordens de camarotes. Em 1754, ele projetou uma igreja de telhado plano para Christianshavn, do outro lado do porto de Copenhague, em que as galerias em trés lados estavam formadas quase como camarotes no teatro. Todo o interior era uito diferente do que era tradicional na concepgdo de uma igre- ja. Em vez de ficarem sentados numa nave semi-obscura, de onde ‘a congregacdo de figis acompanhava a ceriménia celebrada no altar distante como algo mistico e remoto, 0s figis estavam agora delas. Era uma igreja em que 0 importincia. Ai, o pregador podia real bros da congregagdo achavam que a pi simplesmente fechavam as janelas de seus camarotes, isolando-se de todo o som vindo de fora, Esse tipo de igreja nao era incomum, em absoluto, nessa época, Sé em goat igrejas ements foram edificadas duran- igreja para satisfazer as exigéncias de uma nova era, também pro- ais confor- Os aposentos nas novas casas variavam nfo s6 em dimensdes e formatos, mas também no efeito actistico. Da entrada coberta para carruagens, ‘244 ARQUITETURA VIVENCIADA timos e musicais ~ uma espagosa sala de jantar acus- ticamente adaptada para miisica de cma saffio com pare- des revestidas de painéis de seda ou damasco que absorviam 0 som e as reverberagdes encurtadas, e lambris de madeira que vam a ressondincia certa para esse género de musica. Se~ ma sala menor em que se podia desfrutar os sons fré- e comegos do XIX levaram inevi ura, em que o projeto cr res das novas igrejas eram cépias cortetas de protitipos ou géticos, mas os interiores ndo eram tracados para tipos defini- quais produziam condigdes acts no podiam controlar. A indiferenga aos efeitos tex- indiferenga & absorgdo de sons. Até mesmo as salas de concerto eram projet jicentemente, po- rém, como os programas ofereci todos os géneros de miisica, sem levar em conta 0s requisitos acisticos {sso era menos importante do que poderia ter sido, Entretan ingido com os modernos 10 ver € ouvir o estrondear de cas- cos de \s pradarias po, escutar uma orquestra sinfoniea tocando ‘ouvINDO ARO TUR 245 Ia Tschaikowsky ~ todos os e! dos no mesmo filme. "A transmissio radiofonica criou um novo interesse pelos pro- smas aciisticos. Os arquitetos comecaram a estudar as leis da aciistica e aprenderam como a ressondncia de uma sala podia ser mudada — especialmente como absorver 0 som ¢ encurtar © pe iodo de reverberagio. Foi dedicado grande interesse a esses efeitos facilmente alcangados. O interior favorito de hoje parece sala com uma parede in- teiramente de vidro e as outras trés uras eb mesmo tempo, com uma ressondncia tio artificialmente mode- rada que, sob o ponto de vista acistico, néo se distingue muito de um inte ido de peliicia do periodo vitoriano. Deixou de hhaver qualquer interesse em produzir salas com efeitos aciisticos diferengados — todas ek o ser humano ‘comum ainda aprecia a variedad Por exemplo, um homem tende a assobiar ou cantar quando entra no banheiro pela manha. Embora esse recinto seja pequeno em termos de volume, seu piso e paredes ladrilhadas, aparelhos de porcelana e banheira cheia de gua refletem 0 som e reforcam determinados sons musicais, de modo que ele se sente estimula- do pela ressondincia de sua vor imagina-se um novo Caruso. Que ssensagio deprimente resulta quando se entra num banheiro que istico favorito que tem o objeti- ‘vo unilateral de abafar todos esses ruidos joviais! O Clube dos Docentes do M.LT. tem um dos banheiros mais perfeitamente equipados do mundo. Entramos nele alegremente para uma toal te refrescante antes do almogo. Um benfeitor doou tanto marmore esplendoroso que todo o recinto rebrilha com dura elegincia, ¢ smos para nos mesmos: “Aqui a minha voz vai ressoar marav ‘amente.” Mas a primeira e alegre nota sai de nossos labios tio insipida e sem relevo como se estivéssemos numa sala de pesadamente forrada. Para dar um toque nheiro de marmore, 0 arqui ‘mais absorvente de som que Ihe Espero ter sido capaz de convencer & possivel falarmos d& arquitetura, Embora se possa objetar que, de qualquer modo, nao podemos ouvir se € boa arquitetura ou niio, tos banais possiveis apresenta- 246 ARQUITETURA VIVENCIADA, posso apenas dizer que tampouco é certo que se possa ver se ela € ou nao boa. E possivel ver e ouvir se um edificio tem carater, ‘ou aquilo a que gosto de chamar porte. Mas ainda nao foi encon- trado 0 homem que possa emitir um julgamento, substanciado, sobre 0 valor arquitetural de um edit O tinico resultado da tentativa de julgar arquitetura como se julgaria uma prova de exame escolar — nota 10 para tal edificio, nota 5 para aquele outro etc, — éestragar 9 prazer que a arquitetu- ra proporciona, E algo muito arriscado. E inteiramente im vel fixar regras ¢ critérios absolutos para avaliagao da arquitetu- ta porque todo edificio dotado de méritos — como toda obra de arte ~ possui seus padres proprios. Se 0 contemplarmos com to acerbamente critico, com uma atitude de quem sabe ird se fechar e nada terd a nos dizer. Mas se estivermos dessa variedade particular. Dev mesma maneira. AGRADECIMENTOS © autor agradece & Sra. Imogen Cunningham, de Sao Fran- cisco, que fez a fotografia para a capa da edigdo 0 Andreas Feininger o frontispi Mogens Amsnaes, de Copenhague; as das pp. 17, por Jonals Co., Copenhague; p. 20, por Eric de Mat Novico, Copenhague; p. 100, pelo Prof. Nils Ahrbom, Estocol- ikens Presse Foto, Copenhague; p. 134, por Corporation; p. 186, por’ pot F. Hendriksen, Copenhague. sio de origem incerta e 0 autor ndo foi capaz de identi ‘Testemunhamos aqui nosso aprego aos fotdgrafos anénimos. A ‘maioria das fotos sao do proprio autor.

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