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MINHA BISAVO MATOU UM CARA 4 possivel que vocé conheca esta histaria. Em 26 de dezembro de 1929 —um dia depois do Natal —, a sdrdida Sylvia Serafim invadiu a redacao do jornal Critica, da familia Rodrigues, ¢ assassinow a sangue-frio o genial ilustrador Roberto Rodrigues, no Rio de Janeiro. Ela estava enfurecida com o jornal que a mostrava como uma adultera infame, Homem profundamente honesto e no fulgor da idade, Roberto Rodrigues, atingido com um tiro na barriga, agonizou nos bracos de sua familia por trés dias enquanto a vila gargalhava. As maes brasileiras ficaram chocadas com © duplo crime de Serafim: além de assassina, era jornalista. Embora tenha sido presa em flagrante, a rameira foi absolvida pelo iri. Como? Certamente por ser uma vagabunda apadrinhada por amantes que se supdem poderosos e por ter comprado os jurados com ajuda daquele pirata libidinoso do Assis Chateaubriand, dono dos Difrias Associados. A Cadela das Pernas Felpudas, conhecida por ser a mocinha de todos em Petrépolis, mostrou seu verdadeiro carater de meretriz sanguinaria. O relate feito no pardgrafo acima foi baseado na versdo que o dramaturgo Nelson Rodrigues apresenton do assassinato de seu irmao, Roberto Rodrigues, em varios comentarios feitos ao longo da vida, mas principalmente nas crénicas reumidas no livro O Reactonario, de 1977. Os adjetivos e epitetos ‘vagabunda”, “cadela” foram extraidos com que Sylvia Serafim foi qualificada ~“aduiltera infame”, de diversos artigos publicados no jomal Critica entre 1929 e 1930, E compreensivel que Nelson Rodrigues faca core 4 histdria eriada por sua familia para demonizar Sylvia Serafim. Problema maior ¢ que as pessoas aceitaram essa narrativa demolidora como verdade absoluta durante quase cem anos, proliferando a mesma versio em pecas, filmes, ensaios, romances € até teses académicas. Ninguiém questionou se, além das relacdes familiares, o conservadorismo dos Rodrigues, que se expressava com clareza nas paginas de Critica, nao teria deturpado alguns pontos da historia daquele assassinato. Por quase um século todos ignoraram que Sylvia Serafim, ainda que tenha cometido o crime, nao era uma tresloucada. Em 1929, era uma mulher avancada para sua época, dedicada ao jornalismo e as artes, simpatizante do socialismo e do movimento feminista. Critica, por outro lado, era um joral conservador, que expOs em suas paginas, na forma de escindalo abominavel, a separacio matrimonial de Sylvia Serafim Thibau do médico Ernesto Zeferino da Costa Thibau fiinior, chegando a ponto de inventar que ela tinha cometido adultério — uma fake tews desmentida pelo proprio marido. Indignada com a exposicdo da sta vida intima, ela tomou a decisdo radical de ir até o jornal levando na bolsa um revélver, no fim daquele ano de 1929, um periodo de grande aflicdo para o mundo, em decorréncia da quebra da Bolsa de Nova York. Sete décadas depois, um homem perto dos 40 anos e um menino de 6 anos passeavam no Palacio do Catete, no Rio. O pai e o filho viram um grupo de teatro ensaiando uma peca e se aproximaram para observar a encenacéo. Uma das jovens atrizes notou 0 interesse do homem e da crianca e, apés 0 ensaio, os procurou para divulgar o espeticulo, Ela contou que a peca era sobre o assassinate do desenhista Roberto Rodrigues por uma mulher, no inicio do século xx. Depois de repassar toda a historia “oficial”, ela comentou: “Como pode, né? O que leva uma mulher dessas a tomar uma atitude to monstruosa? Dizem que ela nao era muito si e por isso se suicidou depois.” O homem sorriu e respondeu: “Pois é O que sera que levou minha avé a fazer isso?” A atriz olhou espantada e se afastou rapidamente © homem era meu pai. O menino de 6 anos era eu —e Sylvia Serafim era minha bisavd. amos voliar ao dia de Natal de 1929. Sylvia Serafim Thibau, filha da médico Augusto Serafim da Silva, tem 27 anos, é colunista de jornal, aspirante a escritora, simpatizante do feminismo e frequentadora da alta burguesia carioca, No dia 25 de dezembro, ela vai a tedacdo do jornal Créftea, lancado no ano anterior por Mario Rodrigues, para pedir que uma materia sobre sua vida particular nao seja publicada. Em vao. No dia 26 de dezembro, indiferente aos apelos de Serafim, Critica estampa na primeira pagina: Entra hoje ent judzo nesta capital um rumoroso pedtdo de desgutte, |...) Hd tana grande anstedade paibtica ent conhecet os motions da separagto do'casal Doutor Thibai Jiinior. [...] Serio conhecido radiologista Dy. Jodo de Abreu o causador direto da diseolugao do tar daquele ceu dfustre colega? [...| Mme. Sylvia Thibau, que subscreve as suas cronicas em jornais e revistas com o pseuddnimo de Petite Source esteve em nossa redagto. O desquite, por si's6, ji era motive de escAndalo. Pior ainda era a insinuacdo de que decorria de um -e cientista Manuel Dias de Abreu (1891-1962), supasto adultério cometido por Serafim com 0 mé& que criaria alguns anos depois a abreugrafia, um metodo de radiografia dos pulmdes, Para completar, 0 texto ainda era acompanhado de um desenho malicioso que mostrava Serafim, com a saia levemente levantada, sendo acariciada nas pernas por Abreu. Em 26 de dezembro, com a acusacao de adultério jé exposta nas bancas, Serafim retornow 4 redacdo de Criftea, na Rua do Carmo, n* 35, no Centro de Rio, carregando um revélver, Como Mario Rodrigues, 0 dono do jornal, nao estava na redacao, Serafim foi recebida pelo filho dele, Roberto Rodrigues, de 23 anos, que trabalhava como ilustrador no jornal e fizera o desenho ofensive da caricia nas pernas. Os dois se dirigiram a uma sala e, logo apés, ouviu-se um iro. Sefafim foi presa em flagrante. Nelson Rodrigues, que tinha 17 anos e estava na redacdo, disse tempos depois: “O meu teatro ndoseria como 6, nem eu seria como sou, se eu nao tivesse sofrido na carne ena alma, se nao tivesse chorado até a ultima lagrima de paindo o assassinato de Roberto.” No ha registro sobre o que Serafim e Roberto falatam naquela sala. Nelson Rodrigues sugere que a conversa foi irrelevante, uma vex que ela ja teria tomado a deciséo de mata-lo. E um argumento parecide com o que foi usado pela acusagio no julgamento. A defesa conteston divendo que a ré portava a.arma apenas para o caso de ter que se defender e que s6 atirou em Roberto apés ser ofendida verbalmente por ele. No dia seguinte ao crime, comecou a retérica da desumanizagao de Serafim. Em notas veiculadas diariamente no jornal Critica, ela passou a ser tratada como “meretriz assassina”, entre outras ofensas. Conservadora, publicagéo aproveitou caso para alertar seus leitores sobre os perigos de ter uma feminista por perto. Fazia tempos que Critica observava Serafim, tanto por causa do contettdo de seus escritos, excessivamente ousados aos olhos do diario, quanto por ela ser uma colaboradora dos jernais do empresario Assis Chateaubriand, rival dos Rodrigues. Segundo a professora Marialva Barbosa, da Escola de Comunicacao da Universidade Federal do Rio de Janeiro, provavelmente a escritora foi usada por Rodrigues para atingir o seu rival na imprensa. Em O Jortal, uma das publicacées de Chateaubriand, Serafim dirigia a secao “Para a Mulher no Lar”. A despeito do titulo, a seco trataya de temas como a mulher na literatura, o feminismoe a “maternidade consciente”. No artigo O Trabalho Intelectuat Feminino, publicado em A Gazeta, do jornalista Casper Libero, em 8 de maio de 1929, Serafim faz perguntas que ajudam a entender seu temperamento irrequieto ¢ avancado: Muitos espiritos femininos hd que para a existéncia monétona e caseira foram feitos. Porém, e os outros, aqueles cuja poténcia intelectual se debate no ctreulo estreito e mondtono dos afazeres domésticos, tal como o filho de uma guia na gaiole de urn candrio? Serd preciso que, para seguérent seu destivo, tenham de renunciar a feltcidade, @ que a satisfagto de sua personalidade intelectual seja incompativel com a realizagito de suas aspiragdes sentireeniais? Depois do crime, os jomnais cariocas se dividiram em blocos contra e a favor de Serafim. Os jornais de Chateaubriand defenderam abertamente o atentado, e o empresario auxiliou sua colaboradora financeira ¢ psicologicamente. A Noite, o jornal fundado por Irineu Marinho, alinhou-se com a visio dos Rodrigues e publicou um artigo (que Critica reproduziu na primeira pagina) dizendo que Serafim teria abandonado seu papel de mae para se dedicar as letras: “Como classificar uma mae que dest ancha seu lar para escrever contos nos jornais?” Roberto Marinho, filha de Irineu, foi uma das pessoas que compareceu & redacio de Critica para prestar solidariedade aos Rodrigues. No artigo de A Noite, a meni palavras como “lar”, “familia” e “mae” recebem destaque em todas as frases anteriores, io 0 assassinato aparece apenas no LI" pardgrafo, em fonte muito menor, enquanto 4 poucas informagdes sobre a vida de Sylvia Serafim. Mesmo a nossa familia desconhece grande parte da vida da escritora, que se encerrou aos 33 anos, em abril de 1936, quando ela cometeu suicidio, Seu pai, o médico Augusto Serafim da Silva, foi auxiliar técnico de Oswaldo Cruz na campanha contra a febre amarela no Pard. Uma matéria do Jornal Pequena, de 1910, informa que era membro da Diretoria de Satide Publica do Rio de Janeiro {cargo que Thibau finior, marido de Serafim, também octiparia}, o que sugere sua relevancia profissional, Morreu em 24 de marco de 1940, quase quatro anos depois da filha. Mauro e Cléudio Thibau, os dois primeiros filhos de Sylvia, compareceram 4 missa de sétimo dia do avé. O tinico irmao dela, Mario Serafim da Silva, foi engenheira da Central do Brasil e morreu em 1975. Em 21 de agosto de 1930, véspera do inicio do julgamento do caso Roberto Rodrigues, o jornal carioca A Batalla, que nao pertencia ao grupo de Chateaubriand, publicou um conjunto precioso de formacées ~ colhidas pela Seco de Sepuranca Pessoal da 4* Delegacia Auxiliar — que ajudam a esclarecer parte da tra jetéria de Sylvia Serafim. A Batalha era um jornal ligado ao Partido Comunista Brasileito e € provavel que seus editores conhecessem Serafim ou ao menos fossem simpaticos & escritora. O relatorio conta que ela nasceu na Rua General Severiano, em Botafogo, em 27 de julho de 1902, e foi batizada na Igreja de Sao Joao Batista, em 8 de dezembro. Fez 0 curso primario no Externato Pitanga, em Copacabana, e depois foi matriculada no Externato Sion, onde ficou apenas um ano. Entre 1914e 1916, continuau os estudos no internato do Colégia Sacré-Coeur de Marie, instituigio em Copacabana yoltada as meninas da classe alta. “Teve educagao 4 moda antiga, nunca andando sé ao tempo de solteir; diz o relatério. Serafim iniciou a Fscola Normal, mas abandonou o curso quande sua familia se mudou para Petropolis. Em 1919, ficou noiva. Casou-se em 14 de navembro de 1921. Sua primeira publicacso na imprensa foi no Correio da Manht, sob 0 pseudénimo de Ary Brasil. Mas sua principal atuacSo foi em O Jornal, como redatora da sec3o semanal “Para as Horas do Lazer Feminine’ |, que depois seria ampliada e rebatizada como “Para a Mulher no Lar”. Também colaborou em A Notte e na revista Fot-Foa. O relatorio publicado em A Batalta observa: Sua literatura nada tem de perniciosa, lfvre ou amoral. Nota-se na matoria dos seus escritos, sexe grande amor aos fithos, co lar e a farnitia. [...] Sews contos, escritas ene estilo ligetro, seus artigos sobre modas, sobre eugenia, sabre educagno, sobre problemas sociais, sto tirimeros e todos eles vazados numa linguagem limpa, escolmada de quaisquer inconvenioncias. Sua colaboragao, por isso mesmo, nas diversas didrios do Rio e até de S. Paulo fot aceita sem nenhuma relutancia. Apés o nascimento do segundo filho, Claudio, em 23 de dezembro de 1927, Serafim foi “atacada de uma psicose gravidica, que muito alterou seu comportamento, segundo afirma seu pai, dr. Augusto Serafim”. Depois de uma aplica Jo de raio x em um tratamento na perna esquerda, ela passou cerca de dez meses presa a cama, De acordo com o pai, esse problema tambem “Ihe agravou o sistema nervoso" devido ao constante uso de analpésicos ¢ estupefacientes, Nessa época, as relacdes entre Serafim e maride ja estavam abaladas, por “incompatibilidade de génios”, O relatério descreve o dr. Thibau fiinior como um homem “em demasia austero”, em contraste com a esposa, “que trazia um temperamento irrequieto, nervoso, com forte inclinagae para a literatura”, o que contrariou o desejo ea determinagéo de marido. Os dois optaram pelo desquite amigayel, que foi homologado pelo juiz em 19 de dezembro de 1929. Politicamente, Serafim se afirmava socialista e se aproximou da Alianga Liberal, que em 1929 apoiou as candidaturas de Gettilio Vargas ¢ Joao Pessoa as eleigies do ano seguinte, contra o candidato hilio Prestes, préximo das oligarquias ent4o dominantes. No artigo O Comtusismo atte a Consciéncia Humana, publicado em A Gazeta, de S4o Paulo, em 6 de novembro de 1929, ela afirmou: “Adoto, e corajosamente © proclama, em suas linhas gerais a teoria comunista.” Mas, em outro artigo no mesmo jornal, publicado no dia 26 de junho de 1930, ou seja, depois do assassinato e enquanto ela estava detida, comparou © bolchevismo ao fascismo, como doutrinas politicas que exigem, “em troca do bem-estar da maioria, a liberdade de todos”. Apés ser presa em flagrante, Serafim foi levada 4 Delegacia do 1" Distrito, na Praca Maud, Na mesma tarde a transferiram para a Casa de Detencao, na Rua Frei Caneca. Por causa de uma cirurgia de varizes, dias depois foi levada a Casa de Satide Santo Antonio, na Rua Riachuelo, onde ficou até o julgamento. Ali, recebew a visita de Almerinda Farias Gama, que se sensibilizou com a campanha difamatéria movida contra Serafim, cujos artigos nos jornais admirava. “Eu sabendo que ela estava presa Id, por questo de solidariedade, resolvi fazer-Ihe uma visita, Visitei Sylvia, gostei dela, ela tinha ‘um trato muito fino", escreveut Gama, que viria a ser uma das pioneiras do feminismo brasileiro e uma das primeiras negras a atuar na politica — foi uma das duas mulheres que participaram da Assembleia Nacional Constituinte de 1933, que consagrow 0 voto femi a Cibele da Silva Tenorio conta, em A Vida na Ponta dos Dedos (dissertacio de mestrado em historia na Universidade de Brasilia), que as duas mulheres travaram amizade, e Serafim 0 conquistado no ano anterior, por meio de decreto. Patri convidou Gama a colaborar com a pagina que editava em © Jornal, dando projecdo nacional 4 feminista. julgamento de Sylvia Serafim, em 22 de agosto de 1930, foi o primeiro do pais a ser transmitido por radio, que havia sido implantado no Brasil sete anos antes e comegava a operar como 0 grande meio de commmicagao de massa que logo se tornaria, A transmissio ficou sob os cuidados da Sociedade Radio Educadora Paulista e da Radio Sociedade do Rio de Janeiro (hoje conhecida come Radio MEC). Além disso, 0 acesso ao tribunal foi liberado para qualquer cidadao pelo juiz do caso, Anténio Eugénio Magarinos Torres, mudando um costume que limitava a entrada a convidados. Segundo os Rodrigues, a medida teria sido uma manobra juridice de um desafeto da familia para incluir no tribunal um publice majoritariamente a favor de Serafim, Quem nao consegui entrar, pode ouvir os debates pelos alto-falantes instalados em frente ao tribunal. Como desereveu a manchete de A Batata do dia 21 de agosto, tratou-se de “um julgamento sensacional”. O tribunal que julgou Serafim foi também palco de um enfrentamento politico. Grupos conservadores diziam que a ré ofendera as nvulheres e as familias. Grupos feministas argumentavam que ela tivera a sua vida privada exposta pelo jornal e agira em defesa da honra. Na equipe inicial de advogados de Serafim, esteve uma importante feminista, Natércia da Cunha Silveira, primeira advogada do Rio Grande do Sul, que lutava pela emancipacao e pelo direito de voto da mulher. Critica descreveu “os amigos da assassina Sylvia Serafim” como um “ultraje @ familia brasileira”: “Tentam equiparé-la as virtuosas damas de nossa sociedade! [...] A familia brasileira paira muito acima de todas essas indignidades.” O advogado de acusacao, Max Gomes de Paiva, reforcou essa ideia, a0 afirmar que a ré havia trocado “sua condigao de anjo do lar pela profissao de jornalista, para satisfacio de sua vaidade”, A acusacdo insistiu na tese de que o assassinato fora premeditado, o que no surpreendia em se tratando de uma mulher que havia trocado o matrimonio e a maternidade para tornar-se intelectual, jornalista e adtiltera. Mas o proprio marido, Thibau hinior, negou que o desquite se dera em razdo de adultério, repetindo que o tinico motive fora incompatibilidade de génios do casal. A defesa, comandada por Clovis Dunshee de Abranches — irmae da futtura condessa Pereira Carneiro e diretora-presidente do Jornal do Brasif — argumentou que Serafim tivera a honra ofendida pelo jornal, o que provocou nela, no dia do crime, um rompante emocional. Em 23 de agosto, segundo dia do julgamento, Cy#tica trouxe uma descricao detalhada da sessio no tribunal, ainda que nada imparcial. Descreveu inclusive a roupa que Serafim usava, “um elegante vestido de seda azul-marinho”, com um chapéu de feltro negro, “tipo clocke, colocado caprichosamente na cabeca, deixando ver madeixas de sua cabeleira loura”, Q jornal tampouco deixa de sexualizé-la, para reforcar a imagem de mulher perversa Logo que se sentou, Sylvia Serafim recostou-se a tribune de defesa e vagow o othar pelo auditério, O decote triangular do traje deixava descoberto 0 colo, cintilando no vértice unt rico pendentif [pingente]. Por vezes sorria, revelando uma insensibilidade nunen vista O advogado Evandro Lins e Sil a, que mais tarde foi ministro de Supremo Tribunal Federal (STF), acompanhou o julgamento quando era jovem jornalista no Rio de Janeiro, Em © Salo dos Passos Perdidos: Depoimento a0 CPDOC, uma longa entrevista sobre sua trajetoria profissional e politica, ele rememorou 0 cas Ia era uma muiher que teaha se separado do marido, e isso era uma coisa incomum no Rio de Janeiro daquele tempo. A ntulher ficaba sempre suspeita de no sev uti pessoa correta pelo fata de se ter separado. E ela era fornalista, assinava uma coluna com 0 pseudininto de Petite Source, Pequena Fonte, Lima mulher que escrevia em jornal... Lima mulher que conversava com as pessoas, que levava os seus trabaihos para a redagito... Isso tudo ‘fez com qui ela fosse vftinna da reportage da Critica, que a apontaca como uma wither Hore, uma mulher que no devia praticar certas agtes que eram censurdweis diante da sociedade muito rigorosa e machista da época Oargumento de que Serafim agit em defesa da honra e devido a “perturbacio dos sentidos eda inteligencia” foi acatado —e 0 juri popular a absolven por 5 votos a 2. E um destecho curioso, pois o mesmo argumento de defesa da honra era na época aplicado principalmente a homens que matavam mulheres. O resultado foi um baque para os Rodrigues, que ndo tinham duividas de que a ré seria condenada. Havia meses, o jornal vinha publicando uma contagem regressiva, que consistia numa foto de Serafim, sobreposta pelas palavras “Meretriz Assassina!” e um texto invaridvel, sé modificado na data. Em 20 de agosto, por exemple, a contagem dizia O resultado foi um baque para os Rodrigues, que nao tinham diividas de que a ré seria condenada. Havia meses, 0 jornal vinha publicando uma contagem regressiva, que consistia numa foto de Serafim, sobreposta pelas palavras “Meretriz Assassina!” ¢ um texto invaridvel, sé modificado na data, Em 20 de agosto, por exemplo, a contagem dizia: faz hoje duzentos e trinta e seis dias que Sylvia Serafin, ex-Thibau, esposa additera, mae infame, cuejos vicios fnspiraram uma escandaiosa aclo de divdrcio, para maior liberdade de cadela de rua, fertu de morte Roberto Rodrigues, artista de vinte e trés anos de idade, chefe de famttia, profurdamente honesto, cont o fulgor de unt grande talento ede virtudes inexcedtueis. A meretriz assassina serd castigada. Critica continuow a campanha contra Serafim mesmo depois do veredicta, estendendo os ataques aa ad vogado (chamaram Abranches de “charlatao cinico e ladravaz”), ao jliri e ao magistrado (que acusaram de ter transformado o julgamento “numa farsa”), Mas isso no durou muito: o jornal foi empastelado quando estourou a Revolucao de 1930, no final de outubro. Uma das reacties mais violentas ao veredicto foi publicada na Bahia, na revista ETC, de ftilio de ‘Carvalho, em 1# de setembro de 1930, Foi escrita por Jorge Amado, entio um aspirante a escritor de 18 anos que havia pouco se estabelecera na capital federal (poucos meses depois, lancaria seu primeiro livro, © Pats do Carnaval), de onde assinava a coluna Cousas do Rio de Janeiro. Amado = que anos depois se ligaria ao Partido Comunista— nao somente atacou rudemente Sylvia Serafim no artigo, como aproveitou para vilipendiar as feministas. No texto Lins Jiri Sensacional, ele escreveu: A assassina Sytvia Serafin, ex-Thtbat, que hd tempos abateu na redacao de Critica, a tires, 0 fovem desenhista Roberto Rodrigues, acaba de ser absolvida, Sentenga profundamente injusia, filha de um sentincentalismo tolo que dorme estuptdamente na alma de todos os ‘brasileiros e que s6 acorda para absotver assassinos ¢ aplaudir retGricos oradores anatfabetos, Sylvia Serafim é uma mulher profundamertte medfacre. Destas a quem a literatura seduze que para ter nome sto capazes de tudo. Sytvia Serafim é uma mulher profundamente mediocre. Destas a quem a literatura seduz e que para ter nome sto capazes de tudo, Mate de filtos ainda criangas, ia abandond-los e abandonar o marido para dedicar-se inteiramente a imprensa... (Que pats infeliz o Brasil) {...] A assassina conseguiu o que pretendia, Ficou no cartaz. Protegida por jornalistas que enriqueciam na campanha liberal, na pristo e depois no hospicio para onde foi transportada recebia diariamente visitas e mais visitas de hnistericas mogas feias, dvidas de ler seu nome nas gazetas, Foi interessante. Todas as mocinhas suburbanas e quarentonas, que jd haviam perdido todas as esperancas de casamento, doentes de histerismo escreveram a assassina de ume howrado pai de famlia[...1. [Serafin] iré agora atulhar os jornais de mud colaboragto (sé pelo que escreve ela merecia cadeia para o resto da vida), fazer contos, dar conselhos, e consequentemente influir na educagto daquelas que a ler. E de que modo pode wma mulher que assassinou um pai de faneftia e que abandonou a sua propria faneitia influir na educagao de wma moga? Somente de um modo nocivo. [...] E tudo isso, 0 que ¢ pior, em péssimo portugues de lavadeira feita jornatista, sem o mtnimo respeito e gramAtica e em particular aos pronomes. Mas & assim gue se faz justiga no Brasil. re, Sylvia Serafim continuow a escrever nos jornais de Chateaubriand, Apaixonou-se por um tenente da Aerondutica, Armando Serra de Menezes, e teve um filho com ele, Ronald. Como a legislacdo brasileira nao permitia 0 casamento de pessoas desquitadas, os dois planejaram se casar no Uruguai, onde isso era possivel, desde que morassem um tempo no pais: Quando Menezes fez parte de uma comitiva de Getillio Vargas ao pais vizinho, em torno de 1935, Serafim o acompanhou. A comitiva regressou ao Brasil, o tenente também, ¢ ela permaneceu em Montevideu, com o filho. Aguardou que Menezes voltasse para 0 casamento, mas isso nunca ocorreu= Menezes preferiu se casar com uma mulher rica, Serafim e o filho retornaram ao Rio de Janeiro em 1936. Algum tempo depois, ela foi presa, acusada de falsil car documentos para se matricular na Faculdade de Direito de Niteréi, Partiu para Curitiba, em busca da ajuda de Menezes, que tinha'se mudado para la Mas ele a rejeitou novamente. No hotel em que estava hospedada, Serafim tentou suicidio, cortando os pulsos. Sobreviveu e foi presa, denunciada por Menezes. Foi levada a Casa de Detengao de Nitersi. Em 27 de abril de 1936, na prisio, ela ingeriu um vidro inteiro de sonifero—e nao acordou mais. Quando se suicidou, seu filhe com tenente, entie com 4 anos, dormia ao seu lado no cubiculo com banheiro onde a instalaram no presidio. E meu avi Ele nunca falou sobre a mae, que mal chegou a conhecer, Claudio, um dos dois filhos que Serafim teve no primeiro casamento, com o médico Emesto Thibau Jinior, tornou-se piloto militar e morreu em um acidente de aviacdo. Mauro, o segundo filho, foi engenheiro e chegou a ministre de Minas e Energia, no governo Humberto Castelo Branco. Morren em 1005. Em Mauro Thibau: A Trajetoria de um Ministro (lancado em 1997 pelo Centre da Memoria da Eletricidade no Brasil), ele relembrou sua relagdo com a mie, mas ndo mencionou o assassinato nem o que se passou com ela entre 1929 e 1936, Também disse ter apenas um irmao, ignorando seu meio- irmio nascido apés o crime. As duas familias — os Thibau e os Menezes —munca foram muito proximas, mas tinham algum contato se encontravam em datas festivas. Distanciaram-se, conforme as geragdes foram se sucedendo, Cada uma delas lida com a hist6ria ao seu modo. Membros da familia Thibau deram depoimentos ao programa Litha Direta Justiga, da Rede Globo, que reconstituiu © caso em 2007. Ao-contrario desses descendentes, os da familia Menezes preferiram nunca falar sobre essas histérias do passado. Sou o- primeiro a fazé-lo e tentar promover um resgate dessa mulher, que considero pioneira. ylvia Serafim publicou trés livros: Fios de Prata (Sinfonia da Dor), de 1930, Ramos de Coral (Poemas eum Coracto de Mie), de 1931, e Manual de Civilidade, de 1935. Todos sio dificeis de encontrar. S6 consegui a primeira obra depois de dois anos de busca, em um sebo em Brasilia. Uma edicio de Ramos de Coral foi vendida em 2020 em um lei lo, mas nunca encontrei indicio de Manual de Civilidade. Uma reportagem publicada perto do final de sua vida diz que Serafim deixou um quarto livro inacabado, cujo protagonista seria seu ultimo filho. Mas o manuscrito nao foi encontrado até hoje. Fios de Prata, lancado depois do assassinate, pela Officinas Graphicas Alba, tem duzentas paginas ¢ trax quarenta crnicas e textos poéticos em tom confessional, divididos em trés partes, conforme os anos de 1928, 1929 ¢ 1930, O livro abre com uma foto de Serafim, que traz impressa embaixo duas assinaturas: uma com seu proprio nome, outra com seu principal pseudénimo, Petite Source. Duas Paginas depois, uma dedicatéria: “A todos aqueles que me fizeram sofrer.” O estilo literario de Serafim € datado e meloso, bem diferente da sobriedade que ela imprimia aos artigos jornalisticos, com sua militanci 0 feminina e ctitica ¢ editorial sobre temas como a emancipaca vs direitos dos trabalhadores. A secdo “Para a Mulher no Lar”, em O Jornal, mesclava tematicas espinhosas 4 época com poemas, crdnicas e assuntos de moda ¢ beleza. Ocupava duas paginas, contando sempre com trabalhos de Serafim, com uma coluna sobre estética chamada A Ciéncia da Beleza, assinada pelo dr. Pires Rebello, cartas (e, por vezes, poemas ¢ crdnicas) dos leitores, além de antincios. Ela assinava os textos com seu nome e com pseudénimos: além de Petite Source, Borboleta Azul, Maripoza Doirada ou Cinderella, este tiltimo utilizado na coluna No Império da Moda, Em um dos artigos, de 18 de outubro de 1931, a pretexto de falar sobre vestidos de noiva, Serafim resolveu atacar uma ex-feminista chamada Jeanne Galzy, que teria dito que a felicidade da mulher reside tao somente no matriménio. A jornalista no nega a importancia do casamento e da maternidade, mas rejeita que uma coisa ¢ outra sejam motivos para impedir a atividade intelectual da mulher. Defende que é possivel aliar o casamento e os filhos com esportes, hobbies e trabalhos intelectuais, como fazem os homens. Ela também rebate o argumento de Galzy de que toda mulher “emancipada’ ¢ frustrada dora dos trabalhos caseiros”. Serafim porque, no fundo, deseja “a grande monotonia tranquili responde: “Se tudo isso, em ver de ser um ideal, fosse uma realidade, o feminismo nao existiria.” a0 No artigo Feminista, publicado em 25 de maio de 1929, em A Gazeid (SP), ela escreve quase que geral, a feminista é, né entanto, a mulher mais verdadeira e nobremente mulher.” Também “Sob a reprovaci rechaca uma ideia difundida na época de que “a feminista é a mulher feia que nao podendo conqnistar o homem, quer ser a rival do homem”™. Em A Mulher na Literatura, publicado em A Gazeta, em 29 de novembro de 1929 (pouco menos de um més antes do crime), defende que no ha arte mais intimista que a literatura e que essa seria uma das razdes de ser praticada principalmente por homens (até aquela época), pois “o incessante constrangimento exercido sobre a vida da mulher pelo receio da opinido alheia” promove nelas um violento autossilenciamento. A mulher estaria acorrentada, incapaz de expressar literariamente as profundezas do psicoldgico pela mesmia razdo que o seu intimo era controlado e podado: “Ao escrever para o piiblico, um pudor obscuro e invencivel a contém, obrigando-a a descobrir apenas o resto, as maos... Os bragos... Isto é, suas impresses € julgamentos mais superficiais cuja externac3o no compromete.” A escassex da producso literaria feminina, diz Serafim, ocorre, portanto, no por causa da “inteligéncia menor” ou da incapacidade das mulheres, mas devido as mesmas pressdes sociais que impediam, por éxemplo, as Pa P que imps Pe Pl mulheres de votar, os anos 1930, depois do crime, da absolvigae ¢ de ter tido um filho do homem com e qual nao se casou, Serafim foi demonizada por conservadores e sacralizada por progressistas, Para estes liltimos, ela encarnava o espirito de uma mulher independente, o futuro —visio que foi sendo apagada 4 medida que Serafim sofria um processo gradual de desumanizacio ¢ era empurrada pata a lata de lixo da historia. No lugar da feminista pioneira, consolidou-se a imagem de uma louca assassina, que inclu: Mario Rodrigues Filho, em Critica, de 24 de agosto de 1930. e debocha dos mortos, tal como na ilustragao que acompanha um artigo de No texto, o jornalista trata da morte de seu pai, Mario Rodrigues, o fundador do jernal, ocorrida naquele mesmo ano, em 15.de marco (antes, portanto, do julgamento), O desenho mostra Serafim rindo ao lado do caixdo de Roberto Rodrigues, como se ela tivesse cometido um duplo assassinato: 0 do filho e © do pai, O escritor Ruy Castro diz, em O Anjo Portografico, biografia de Nelson Rodrigues, que teriam culpado Serafim até mesmo pela morte de Joffre Rodrigues, outro irmio de Nelson, que faleceu em 16 de dezembro de 1936, aos 21 anos, de tuberculose. “Era como se, mesmo morta, Sylvia ainda tivesse em suas mios o destino de Joffre endo quisesse poupa-lo”, escreve Castro Para pensar a construcio dessa imagem de Serafim vale recorrer ao livro The Madwoman in the Attic: The Woman Writer and the Nineteenth-Century Literary Imagination (A louca do sétio: a escritora ea imaginacao literaria do século XIX), das critieas norte-americanas Sandra M. Gilbert e Susan Gubar. Partindo da figura de Bertha Mason — personagem do romance Jane Eyre, de Charlotte Bronté-, internada em um sotdo por ser considerada insana, as autoras refletem a respeito do processo de desumanizacio e da interpretagio maniqueista da mulher como anjo ou como monstro no cénone rario: A maioria dessas historias tende a perpetuar imagens extremas e debilitantes de mulheres como anjos o% monstros |... Afinal, Macbeth é nobre; Lady Macteth é um monstro, Da mesma forma, Edipo & uma figura heroica, enquanto Medeia é apenas uma bruxa, €a loucura de Lear é gloriosa, enquanto a de Oftia é€ sinplesmente patética. Nos anos seguintes ao julgamento, a polémica em torno de Sylvia Serafim foi enfraquecendo, enquanto els prépria se transformava num adendo da biografia de Nelson Rodrigues. © proprio dramaturgo a transformou em uma personagem caracteristica de sua prosa: uma personagem ridicula, patetica, infantil, mimada e viciada, As abordagens posteriores no diferem muito disso, Na romance Syfvia Naa Sabe Dartcar (2008), a escritora Cristiane Lisbéa eria um relacionamento anacrénico entre Serafim e Nelson Rodrigues, pintando-a como louca e incestuosa. A “relacdo” entre os dois, ali, Eassunto de ao menos duas pecas, Amor e Morte de Nelson Rodrigues, de Clovis Levi, de 1995, eA Somtbra do Anjo: Teatro Desagradavel emt Cittco Atos, Lim Roteira Performativa a Doze Mites, de Bya Braga e outros, publicada em Caderno de Encenagta, em 2010. se tornou lugar comum no teatro A tevé den uma visio mais imparcial e completa do caso. No episddio A Primeira Tragédia de Nelson Rodrigues, do extinto programa Linha Diveta Justiga, da Globo, ela é tratada para além do cliché de assassina, O programa esta disponivel no YouTube, e nos comentarios dos espectadores vé-se que 0 caso ainda mobiliza paixdes e polariza as pessoas, tal como em 1930. Outro trabalho sem maniqueismo é o ensaio O Corpo e as Subjetividades de Sylvia Serafim: Violéncia de Genero, Inprensa e Pratagonismo Feminino no Rio de Janeiro (1920-1930), de Karla Carloni (no livro Mutheres Tecendo o Tempo, organizado por ela e Carolina Coelho Fortes). Publicado em 2020, 0 texto talver o primeiro de cunho acadéi 0 a fazer um resgate de outras facetas de Serafim. Também Marcus de Moura Barros, doutorando em literatura na Sorbonne, dedicou-se 4 escritora em Por que Falar Delas?: Sylvia Serafiet Thibau e 0 Apagamento Discurstvo das Mfutheres Controversas, trabalho de cerca de cem paginas, ainda nao publicado. Pouco a pouco, as pessoas comecam a notar que a trajetoria de Serafim ndo pode ser sintetizada num crime, E minha impressdo é que esse movimento tende a crescer. Nunca Ou i Me recordo da primeira vex que ouw talar de Sylvia Serahim, mas tot so quando cheguer a ato de Roberto Rodrigues, cheia de teticéncias, A historia era um tabu familiar. “Meu pai, filho dela, ndo toca adolescéncia que me contaram uma espécie de versio preliminar do assas: nesse assuntoe ndo quer que ninguém toque’, disse certa vez um dos netos de Serafim. De acordo ° com outro, “meu avo s6 tocou no assunto uma Vez, e porque estava num momento especi: silencio sobre © passado foi regra entre os filhos e os netos Serafim era uma grande sombra pairande sobre todos. Qu um grande yazio, pois ndo havia fotos dela nos albuns da familia, repletos de imagens do meu bisavd, o general Armando Serra de Menezes. O tinico material que encontrei nos arquivos familiares foi um album bem conservado, e aparentemente montado pela propria escritora, com os textos que ela publicou, As vezes, o assunto pipocava nas conversas em familia, mas sempre de forma reticente, Era uma ferida que ninguém tinha coragem de cutucar. Mas a curiosidade comecou a crescer dentro de mim e me levou a ler 0s escritos de Serafim, sobre os quais agora faco uma tese no deutorado de literatura brasileira na Universidade de Sao Paulo. Eu gostaria de ter Serafiny no sobrenome, mas nao tenho. Tenho o de meu bisavé, Menezes, embora utilize mais o sobrenome materno por questées pragmaticas. Na verdade, 0 sobrenome Serafim morreu com Sylvia, pois seus filhos herdaram os de seus pais. Acho um sobrenome bonito, imponente, © € uma pena que nao tenha sido transmitido as geracdes seguintes. Foi outra maneira de apagé-lada nossa histdria, como nos Albuns de fotografia. As familias envolvidas na tragédia — as de Sylvia S rafim e Roberto Rodrigues —se encontraram por algumas vezes. Um dos netos dela me contou ter tido contato com um dos filhos de Nelson Rodrigues, mas nao se identificou como descendente de Serafim, para evitar embaracos. Eu mesmo tive contato com alguns membros da familia Rodrigues. Algumas vezes me identifiquei, outras vezes nio. Quando me identificava, logo emergia certo constrangimento, mesmo depois de cem anos.

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