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Coles Concesto grea § Depésite Leal Tieagem Universidade Cates Batra ACOPIA Jorge Miranda/Rui Medeiros Com a colaboragio de Araujo / migato Mat uel Fontaine io Rocka Marques Constituigao Portuguesa Anotada Volume II 2. edicdo revista, atualizada ¢ ampliada Universidade Catélica Editora 2018 ConsiticoPortuguess Anotads « insttuto do dominio pablico que encontra em Franga 0 seu ergo geogrfico ~ hi praticamente dois séculos assume nesse ordenamento juridico. O Direto Comparado, Portanto, no jogaria qualquer papel decisivo nesta questi. Enfim, salientarse que {2 comstitucionalizaggo de um conceito pré-constitaconal como 0 dominio pablico fscarretao rico de leituras pouco abertas da Lei Fundamental e até numa inversio ‘metodoldgca a vros ttulos reprovavel~ em “conformidade” com o dieto ordind- {A posite exposta pode oporse, desde logo, a tradigto consttucional portuguesa desde 1933, 0 que, als, foi referido nos trabalhos preparatrios da revisdo constitu- ional de 1988. Depois, nla se pode obliterar que 0 dominio pablico é "um aspeto fundamental no que diz respeito & estruturaglo do Estado do seu ponto de vista patrimonial pablico” (Deputado Rut Macnee, DAR, I Série, n° 83, pgs. 4020-4021) Com efeito,stendendo a0 rigor ou rigid do seu regime juridico pico ~ pense-se, desighadamente, na nots da impenhorabiidade ~afigura-seconveniente que a Cons- tituigh, “interpretando o sentir da comunidade,identfigue o conjunto de bens que, nessa perspetiva, hio de impor-se a lepslador ordinério como subordinados a um regime juriico especfico de dieito publica” ~ para mais, quando "uma das fungoes ddas Consituigdes reside justamente em refletir a formagio e as condigbes econér as de uma sociedade e em racionalizar as aitudes desta perante aqucas (A. MON, (© Domina, pig 18). Além disso, a definigBo consitucional do dominio public serve de referencia ispiradora 3 agéo qualifcadora do legislador orindro, de forma a que este apenas considere como dominiais bens cujo destino publico tenka uma relevae {a minimamente andloga & dos enunciados nas varias alfneas do n° 1 do artigo 84° Enfim,e este aspetoafigura-e decsivo,justifia-se a constitucionalizagio do dominio publico, porquanto ela evidencia devidamente, alo sO a importincia que certos bens Sssumem para a defesa e a seguranca nacionas[alineas a) e) don. do artigo 84°] € para relizagio de liberdades fundamentais basins ~ como € 0 caso da liberdade de crculagSo previsa no artigo 44°, n° 1, da Constituicto [alineas d)e e) do do artigo 84°], como, ainda, 0 comprometimento da ordem constituconal de 1976 om uma ideia de Diteito assent naefetivagio de um Estado de bemvestar[ainea ¢) don” I do artigo 84"). Nesta linha, é ainda de arescentar que, 20 impor a afetagio de todos os bens mencionados no 2° 1 do artigo 84° a um fim de interese public, 4 Constituigdo probe a fruigio ou apropriagio exclusiva (ou sequer principal) das Suas uilidades por parte dos particulars individualmente considerados, sendo, pois dese modo, o artigo 84° expresso do principio jridicoestruturane ou fundamental do Estado Social. 0 VI-O n2 1 do artigo 84° enumera, de modo espectfco, nis bens e categorias de bons do domino pblico. Concretamente, a alinea 1) do n° 1 do artigo 84.” da Constitui 80 refere-se ao dominio piblico hidrica, Nos seus termas, perencem a este "as Sguas terrtoriais com os seus leitose fundos marinhos contiguos, bem como os lagos,lagoas fe cursos de Agua navegaveis ou flutusveis, com os respetivos letos”. Segundo a jursprdéncia consttucional, “trata-se de uma disposicio que assenta na conviegdo de que as éguas, pela sua importincia e afetagio pablicas, devem estar fora do cométcio juridico privado e de que sio, portanto, inaliendves, impenhordveis ‘eimpreseritiveis” (Ac. n° 326/15). "Na verdade, o dominio pico hidrico,na medida ‘em que se ache funcionalmente ligado & ‘citculagio’ de bens, pessoas e ideias, diz respeito a coisas tidas por vitais para a comunidad, ou seja, dotadas de um ‘grau de ~ Arig 84 utilidade publica primordia’, circunstancia que explica a integragéo dominial de que ‘so objeto na generalidade dos ordenamentos jurdicos” (Ac. n° 326/15). Seja como for, na interpretagio desta disposicio da alinea a) do n.’ 1 do artigo 84° {da Constituigéo, tl como als na da alinea b) subsequent ¢ fundamental ter presente, ‘os termos do artigo 8.” da Constituigdo,o disposto nos textes de Direto Internacional convencional aplicdveis, adiante referides. VII - Na redaso original, o texto da Constituigio de 1933 declarava pertencerem a0 dominio pdblico do Fstado as &guas marstimas, com os seus leitos, O artigo 49. foi porém alterado, quanto & primeira part, pela revisdo de 1971, passando a mencionat, além das dguas teritorias e seus leit, a plataforma continental, Com a entrada em vigor da versio originaria da Constituigaa de 1976, deixou “de existir no ondenamento juridico portugués disposigéo da Lei Fundamental a valer como ponto de apoio da ‘aracterizagio dos poderes do Estado sobre a parte maritima do seu territério” (M, (GuEDs, Direto do Mar, pig. 129). Em face do atual artigo 84.1." 1, alinea a), no é desde logo, claro o sentido da cexpressao “‘dguas territoriis". Ela vem sendo entendida como cortespondendo & de "Sguas exteiores” (Gowtes CaNoTILHo/ Vita Mossi, Constituiglo, pg 412), ou sea, aquelas 4guas que, de acordo com 0 artigo 3 da Convencio de Montego Bay, de 10 de noverbro de 1982 (aprovada pela resolucio da Assembleia da Repiiblica n° 60-B/97 ¢ mitificada pelo Decreto do Presidente da Repiblica n° 67-A/97), articulado com 0 1° do artigo 1. da Lei n° 33/77, de 28 de maio, se estendem, a partir da linha de base (a linha de baixa-mar ao longo da costa), pela largura de doze milhas maritimas, Do dominio publico marftimo fazem ainda parte as “Aguas inzrores, ou se, e nos termos do artigo 8.° da Convengio de Montego Bay, as 4guas compreendidas entre a linha de base do mar territorial a linha da maxima de preia-mar. Noutros termos, so as éguas “compreendidas entre as linhas da maxima preia-mar, por ocasifo das :marés vivas equinocais, eda baixa-mar, ou entre as primeitas eas linhas de base etas (ineluindo de fecho) que tiverem sido tragadas em substituicio da linha de baixa-mar (Maxquss Guess, Direto do Mar, pigs. 95 ¢ 98-99) (s direitos do Estado costeiro relativamente ao seu mar territorial nfo respeitam apenas Bs 4guas, abrangendo igualmente 0 lito o subsolo por elas cobertos (artigo 2. 1n°2, da Convengio de Montego Bay). Por seu turno, a expressio “fundos marinhos contiquos” correspond, como tem sido assinalado, & de “plataforma continental”. Nos termos do artigo 76° da Convencio de Montego Bay, aquela realidade compreende o leito e o subsolo das éreas submarinas para além do mar territorial em toda a extensdo do prolongamento natural do territério terrestre do Estado costeiro até 20 bordo exterior da margem continental ow até uma distancia de dusontas milhar marttimae medidas 4 partir das linhae de base, na hips tese de © bordo exterior da margem continental ndo alcancar essa distancia; 0 artigo 77° da mesma Convenga0 qualifca os direitos exercidos pelo Estado ribeirinho sobre 2 plataforma continental como “direitos de soberania”, cujo contedido se reconduz basicamente a faculdades de exploragio e aproveitamento dos recursos naturais e que presenta como caracteristicas primordiais a exclusividade e a ineténcia (A. MONTZ, (0 Domini, pags. 175-177) Lé-se no Ac. n.*136/16 que aintegragto, ndo apenas do mar territorial, mas também da plataforma continental no Ambito dominio pablico mari- timo se justfica pela “ligagdo que tém com a soberania do Estado. De fact, além de se tratar de bens cuja existéncia e estado resultam de fenémenos naturals, qualidade que jd impbe a sua dominialidade (dominio publico natura), a utilidade que apresentam & coletividade publica esta conexionada ‘de uma forma muito especial com a intgridade Contig Portuguese Avot territorial do Estado, e com a respetiva sobrevicéncia enquanto tal, sendo mesmo com 2 ‘propria identidade(identifagdo) nacional Tntegram ainda o dominio pablico outras aguas, como lage, lagoas ecursns de dgus “nacegdocis ow flutuioeis”, "que so conceites tradicionais suficientemente sedimen- tados para nie poderem ser objeto de manipulagso legislativa” (Gosses CaNomiLHo} /Vitat Montiea, Consttuigdo, pig. 412). O mesmo se diga das bafas, fozes de rios, pportos e ancoradouros (cfr, sobre toda esta matéria, A. Montz, O Domini, pags. 187- 194; Manques Guts, Direto do Mar, pags. 105 e segs). (© Tribunal Constitucional teve recentemente oportunidade de explictar que © coneeito constitucional de dguas terrtoriais deixa "de fora a zona contigua e as dguas (coluna de agua e superticie) da zona econémic exclusioa. Na alinea d), do artigo 3° da Lei n2 54/2005, de 15 de novembro ~escreve-se no mesmo aresto -, faz-se referencia a esta ltima zona, mas 86 os recursos nela existentes é que podem pertencer ao dominio ppliblico, uma vez que decorre do artigo 56.° da CNUDM que nessa zona 0 Estado por fugués apenas detém direitos de soberania no que tange & exploragio, aproveitamento gestdo dos recursos naturais” (Ac. n° 136/16). Por outro lado, o Tribunal Constitucional esclarece que “as margens de dguas pil cas” nao integram, & luz da Constituigao, “o dominio publico por natureza’. Lem- bra-se, a este propésito, que “a sua clasificacio legal como dominiais surgiu com © artigo 2° do Decreto Régio de 31 de dezembro de 1864, que ineluiu no dominio plblico imprescritivel os portos de mar e prains e os rios navegiveis ¢ flataaveis com as suas margens, os canais de valas, 0s portes arifciais e as docas existentes fou que de futuro se construissem [.... Segundo a doutrina, a atrbuigio de carscter dominial as praias ~ e [..] as margens de cursos de agua navegaveis e flutuaveis = implicou, tKo-somente, a incorporacio no dominio publico dos terrenos marginais ue jf pertenciam 20 dominio privado do Estado. Por outras palavras, ‘a lei nao teve ‘manifestamente em vista reduzir de um golpe & propriedade pablica todos os terrenos ‘das prains incluindo os que estivessem na propriedade privada dos particulars’ [..." (Ac. n° 326/15 do Tribunal Constitucional VIII— A Constituigdo refere-se, de seguida, ao dominio piblico aéreo, ou sea, “camadas agreas superiores a0 territ6rio acima do limite reconhecido ao proprietério ‘ow superficidrio” [alinea b) do n.° 1 do artigo 84:), Em sentido préximo, referia ja = Constituiglo de 1933 que o dominio pablico do Estado abrangia: “5. — As camadas _ereas superiores ao terntono, para alem dos limites que a let fxar em beneticio de proptietario do solo.” ‘Oespago aéreo dominial conhece limites verticals, superiores e inferiores. Quanto 0s primeiros, interessa salientar que, de acorde com 8 artigos Ie IL do Tratado sobre (0s princes que regem as atvidades dos Estados ne explora ewtilfzagto do espago exterior incluindo a Lua e outros corposceleses, de 27 de janeino de 1967 (fx. traducio portugues: publicada em anexo ao Decreto-Lei n.” 286/71, de 30 de junho, que © aprova pare adesio), "0 espaco extra-atmosférico (espago exterior) tem um regime semelhante a0 do alto mar (além de as respetivas exploragao e utilizacso deverem ser conduzidas em benefico ede acorde com os interesses de todos os Estados, preside-Ihes uma intencSe de liberdade ¢ de igualdade relativamente ao acesso a todas as regides dos corpos colestes, ito se reveland o espaco exterior suscetivel de apropriacso nacional) ~ ¢ ue [..] permite concluir que, atentos os limites superiores, 0 espaco aéreo integrante cdo dominio pblico aéreo compreende apenas as camadas atmosféricas (cf. ainda os artigos IT ¢ IX do mesmo Tratado)” (A. Moniz, O Dominio, pigs. 195-196). Antigo 4° {Quanto aos limites vertcas inferior, a linea) do 1° do artigo 84° da Const {iio renunciou também 3 sua fxaglo. O dominio piblica aéreo comoga a partic “do limite recoahecido ao proprietério ou ao superticdrio". Neste sent, do mesmo modo, artigo 134° do Codigo Civil determina que propriedade de imoveisabrange 0 espaco aéreo correspondente & respetiva superticie, sem que 0 proprietério possa, contudo, egitimamente impediratos de trciro que, pela altura em que ocorem, 1o haa interesse em impediz. Em qualquer caso, do ponto de vista constitcional, mo se pode astra da Fungo social da propriedade privada. “Ora ¢ também esta fungi, no interior da qual se projtao inatituto do ‘abuso do diel, que justifica 4 impossbilidade de o proprietério privado impedir determinados atos de terceitos Sempre que nao detenha um interessesufcientomenteséro eatendvel nesse sentido. #, portanto, possvel admitir que a fungi social no interfere apenas a0 ivel do contedido do direito de propriedade privada, mas também contribul para traar os Timites objetivos (extrsivos co mesmo” (A. Motz, O Domino, pigs, 198199). Assim, «© dominio pablco aérea tem inicio a partir da altitude em que o proprietti ji nBo tem interes legitimo em impedir quaisqueratos de tecero, "No fund, também a08 limites objetivos da propriedade preside uma intencd funcional, devendo entender-se ‘coisa como unicarente submetida aos poderes do proprietrio (ou da superficirio) za exata medida em que se revelanecessria por preservarautiidadeondinaviamente proporcionada pelo bem imével em causa” (A. Mow, © Doni, pg. 193). Como refere esta Autora, “0 que esté em causa 6 portant, a delimitagao da fonteira (algo precisa) entre 0 que consttuem atos de intromisedo na propriedade privada (que como tis presupdem um direto de indemnizagio na titularidade do proprierio) dlaqucles alos que, jutamente por no contturem uma intromissdo na propriedade prvada(atentas as suas possbilidades de utiliza), ndo se devem compreender como praticados no ambit desse direto” (A. Montz, © Dono, pg. 200), ‘© dominio pablico abrange todo oespaco aéreo sobzejacente a0 teritrio nacional, inclundo, portato espago sobre o mar teritorial © dominio pabiico aézeo compreende, ainda, 0 “espectro radioelétrco”. Segundo artigo 14° da Lein.”5/2004, de 10 de Fevereiro (Lei das Comunicagdes letsnicas) if allerada,o espago através do qual podem propagar-se as ondasradieltrcas integra © dominio publico do Estado, correspondendo a espetva gestao 20 ICP-ANACOM, entidae regulaora do sector (ft, sabre o especttoradioeltrco, A. Moniz, © Dom io, pig. 201-216). IX ~ A alinea e) do n® 1 do artigo 84. refere-se ao chamado dominio piblico geoldgico, o qual compreende os “jazigos minerais", as “Aguas mineromedicinais” e “as cavidades natura existentes no subsolo, com excegdo das rochas, teras comuns € ‘outros materiais habitualmente integrados na eonstrugo Pertencem, assim, ao dominio pablo, todas as substncias minerais encontradas (ou a encontrar) quer & superficie quer na subsolo, assim como grutas e furnas (A, Mowiz, O Dominio, pig. 217). Neste contexto, precisa o Tribunal Constitucional (ct. Ac n° 315/14) que, desta alinea c) do n.’ 1 do artigo 84. decorte que também “os jazigos ou depésitos minerais situados no leito ou subsolo do mar teritorial ou nos fundlos marinhos contiguos (plataforma continental) so bens que adquirisam o estatuto dda dominialidade: sa0 bens do domo pico ox "bens dominii, seitos a um regime Jurdico espectico de diteito pablico”, Efetivamente,“[..] a estrutuza material e fun- ‘anal dos bens interados no dominio pablico geoldgico diverge substancialmente dos bens que fazem parte do dominio pablico maritime, Uma coisa é 0 leito do mat, Co subsolo correspondente e os fundos mazinhos contiguos da plataforma continental, Consign Portuguese Artada ‘outra bem diferente sSo as ocorrncias minerais existentes nesses espagos maritimes. (Os depositos ou jazigos de substincias mineraisexistentes no solo e subsolo cabertos pelas aguas do mar constituem tuma categoria de coisas publicas distinta dos bens ‘em que esto integradas e que por isso mesmo pode ser sujita a um regime jurtdico ‘de dominialidade diverso do previsto para os bens em que se integram. Ndo obstante ‘a conexio fisica indissocidvel entze ambos os bens, para efeto da dominialidade, 0s recursos minerais marinhos autonomizam-se do solo subsolo marinho, que pertence ‘20 dominio pblico maritimo, e integram-se no dominio piblico geol6gico [cfr alineas 12) c) don I do artigo 84° da CRP]". A distincio formulada entre as duas referidas

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