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Fundogée Eeitora do UNESP (FEU) Praca da 6, 108; (0101-900 ~ 0 Poulo - SP Tol: (Oot Fox (Ox wornedilorounesp.com.br wor veriaunesp.com.br fou@edltora.unesp.br CIP Bes. Cotalogagéo na fonts Sindicato Nacional dos Editoces de ios, Te2p — Tuan, Yiu, 1980. Peisagens do medo / Yifu Ton; radugio Livia de Oliveira, ~ S50 Ediore UNESP 2005, bibliografi 39-6159 1. Modo, 2, Fobies. 3. Poisagem — Aspectos psicolbgicos. | Pra o. os.as93 cop 152.4 Editore oflede! axac Abe Sumario 1. Intredugéo7 2. Medo na crianga em crescimento 3. A crianga como natureza em formagio 41 4, Sociedades “sem medo" 57 5, Medo da natureza: grandes cacadores ¢ fazendeiros pioneiros 73 6, Calamidades naturais efome 91 7. Medo no mundo medieval 117 8, Medo de doenga 139° 9. Medo de natureza humana Bruxas 10. Medo de natureza humana: fantasmas 179 Yiu Tuon encontrados nas mesmas cacimbas onde ds modernos armaram seus acampamentos.!® kung 5 Medo da natureza: grandes cagadores e fazendeiros pioneiros ~“/ Modos arcaicos de vida tém sobrevivido na época moderna. la loresta tropical como no deserto, pequenos grupos de pes jas com um conhecimento perspicaz do seu meio ambiente e ‘ias bem modestas parecem ser capazes de levar vi- s tranquilas sem sombra de medo. Sera que os habi iéios de vida desses grupos primitivos nos dizem alguma coisa ist6ria da humanidade um tempo de quase perma- tio, um tempo de paz uma baseada na coleta e ‘caga nfo, especializada em. umn nicho ecolbgico rico e amplamente diversificado; e a outra baseada em 73 habilidades especializadas neces: animais grandes e velozes. Certamente coletar e comer carniga aconteceram muito at tes da caca especializada, Se explorarmos o passado distant ‘mais ou menos dois milhdes de anos atrés, podemos imaginat seguinte cena: as margens de um lago aficano ou na ribans ceira de um rio, em um ambiente de bosque-savana, pequenos rupos de hominideos ou proto-humanos coletam no meio de abundantes recursos da terra, praia e aguas rasas. Podemos Postular uma sociedade igualitéria na qual homens ¢ mulheres cooperam nas tarefaselementares de coletar plantas comest, vels, rastrear pequenos animais ¢ levar para a base doméstica 0s alimentos mais importantes (uma carcaga on um tubérculo) Pode-se inferir uma vida familiar “centrada nas criangas’”, devi- do ao seu longo periodo de dependéncia, pois este jé era um ‘trago que distinguia esses proto-humanos dos primatas nao hu- manos. A evidéncia arqueolégica disponivel, dispersa como tatifica este quadro doméstico calmo, e do que conhecemos dos rimitivos coletores dos tempos modernos é po: , gee pas solrevis les levassem uma vida livre de conflicos € Retrocedendo na linha da evolusao até meio milhéo de anos, encontramos proto-humanos que a literatura técnica de. signa como o género de Homo— Homo erectus, O melhor represen tante desta raga 6 0 Homem de Pequim, da China Setentrional Suas ferramentas de pedra nfo mostram avangos signifiatives After the Austatopithec the Middle Pletetoce ive Home of Man?. In fe. Berkeley/Los Angeles: University of Cali- Poisogens do medo ttelagio as anteriores dos hominideos africanos, mas eles im cagadores muito mais habeis. Uma variedade extraordi- ja de animais foi vitima de sua habilidade: cervos, elefantes, Hocerontes, bisées, bifalos de égua, cavalos, camelos, javais, jes-dentes-de-sabre e ursos das cavernas. Dada a pobreza de itis equipamentos materiais, os seus sucessos na caga devem Gf sido o resultado de um eficiente trabalho em equipe, o que lidade de que tenham desenvolvido uma rede © de velagées conscientemente mantidas e que possufam uma lin- a sulada, Uma evidéncia adicional da sua bumanida- © outro lado, a expectativa de vida da populacéo do Homem de © Pequim era curta em relagao aos padrées modernos: 40% mor- | a impressio de que o Homem de Pequim matava sua propria espécie em busca de carne, miolos ¢ tutano (O Homem de Neanderthal, que viveu hé mais ou menos 50 mil anos, possufa uma capacidade mental comparivel & nossa. Como os proto-humanos de Pequim, os de Neanderthal eram "ndbeis cacadores de aves e animais grandes; mas as técnicas usa- das mostraram pouca mudanga, permanecendo basicamente uma combinagiio de flechas de madeira e armadilhas de buracos. Porém, os Homens de Neanderthal podiam reivindicar duas rea lizagSes das mais notéve! as frios,.quereque- ria habilidade para fazer roupas com peles e couros-e possibilida- de de cobrir cabanas com esses mesmos materiaigy 0 enterro, 0 = qual documenta a crenga exclusivamente humana.na vide apos ‘a morte. Por outro lado, os Homens de Neanderthal devem ter “DGHANG, K. the Archaeology of Anciont Chita 3.0 New Haven, Connecticut: Yale University Press, 1977. p.48-9. 18 Yiu Tuan tido pouca disposicio para fazer enfeites e objetos simbélicos; gtia) so escassas.? Assim como os proto-humanos de Pequim, eles praticavam 0 canibalismo: em um lugar na Iugoslévia os ‘ossos de uma dtzia de individuos, homens e mulheres, jovens ¢€ velhos, foram quebrados com 0 propésito de extrair 0 tutano. Os proto-humanos da Africa tropical coletavam entre a ri- queza da natureza, e podemos supor que suas vidas foram pa- cificas, nao especializadas, no centradas neles mesmos, e sem estresse. Esse foi nosso distante Eden, se alguma vez. existiu um. Depois, o curso do desenvolvimento humano no longo periodo do Paleolitico (pré-agricola) teve uma relacio mais antagonica com a natureza, Essa tendéncia culminou com as grandes reali- zagbes dos habitantes do paleolitico superior, que floresceu em partes da Europa e sudoeste da Asia, no final da Idade Glacial mais ou menos entre 35 mil e 12 mil anos atrés. Nesse tempo as calotas de gelo cobriam a maior parte do norte da Europa e 0s Altos Alpes. A paisagem, ao contrério do cenério afticano, em um petiodo bem anterior da evolucdo humana era desola- dora‘e o clima inclemente e varidvel. Neste ambi @ cultura humana alcangou um dinamismo e sofi viamente desconhecidos. Talvez pela primeira vez os humanos por si mesmos tenham se estabelecido indisputavelmente, como aespécie dominante. Mais eficientemente que nunca, eles caga- ram animais grandes e perigosos, incluindo mamuites, rinoce- rontes peludos, bisdes e ursos. Eles podem ter abusado do seu poder e contribuido para a extingao de parte da megafauna do final do Plistoceno. Os artefatos que deixaram para trés, espe- cialmente esculturas ¢ pinturas nas cavernas, ainda causam ad- miragdo. Aqui ha um paradoxo, As obras de arte dos grandes LARK, G. World Preiser in New Perspetve. Cambridge: Cambridge Unc versity Press, 1977. p36; MARSHACK, A. The Art and Symbols of le Age Man. Human Native, x1, 9.9, p32, 1978, 6 wtistico como o do broche Tata (Hun- Poisogens do medo cagadores so evidéncias de um tempo livre, de um espirito imaginativo e confiante e de grande deleite com o dominio téc- = nico sobre os materiais. Porém, também sugerem ansiedade. O gontedido da arte deixa poucas dvidas de que ela foi concebida = dom esperanca e medos das pessoas que, apesar da habilidade | hacagae armadilhas, estavam submetidas a todas as tensGes de _ uma sobrevivéncia que dependia da disponibilidade de umas | poucas feras grandes. Diferentemente das dietas dos coletores ©. epescadores em ambientes mais férteis, as dietas dos cagadores © provavelmente auferiam pouco das plantas. A restrita variedade > de alimentos dos quais podiam depender deve ter feito a vida parecer insegura, Aves ¢ animais podem migrar ou nfo se re- produzir, Para os habitantes do Paleolitico Superior nem a fer~ {ilidade dos animais nem a dos humanos podiam ser dadas = como certas. Sua arte, que tanto admiramos, satisfazia nao so- mente impulsos estéticos, mas também exprimia a magia do trabalho nessa vida incerta, Assim, para promover a fertilidade, ram feitas estatuetas de mulheres que mostravam seios ¢ na- degas grotescamente exagerados. E na parte mais profunda das ‘cavernas de cale4rio, a luz tremeluzente dos archotes, podemos imaginar como 0s artistas-magicos esforgavam-se para aplacal ‘com gravuras em 4gua-forte e tinta, os espiritos dos anin : que tinham matado, para assegurar a fertilidade permanente. Nés s6 podemos fazer conjeturas sobre os sentimentos e humor dos povos pré-histéricos. Sobre os noss0s contempora- eos somos capazes de falar com maior confianga. No capitulo precedente, destacamos quatro grupos de cacadores-coletores cuja maneita nao especializada de viver poderia ser modesta ett bens naturais, mas era, por outro lado, livre de graves tensoes. Como comparacao é titil considerar os grandes ‘cagadotes ‘do [Artico, 0s esquimés. § Yeu Tuan Frequentemente aparecem relatos entusiastas sobre seu modo de vida em livros escolares, best-sellers, e em obras socio- Ges, pois eles tém-se adaptado com muitos recursos técnicos a um meio ambiente no “fim do mundo”. Os esquimés si0 conhecidos por desfrutar intensamente a vida. De acordo com Peter Freuchen “eles acreditam ser © povo mais feliz da terra, vivendo no mais lindo pais que ha”. Apesar da sua economia mais especializada e excelente cul- tura técnica, os esquimés compartilham com os pigmeus ¢ bo- ximanes certos tragos sociais que no seu conjunto compéem tum quadro atrativo da vida em grupo. Sua sociedade é essen- cialmente igualitaria, Em teoria, © homem 0 senhor da sua casa e sua palavra é lei, Na verdade, a mulher realiza fungdes econ6micas vitais; nfo tem autoridade formal, mas tem muita influéncia ¢ nao é, de modo algum, servil. A unidade social bésica, centrada no nicleo da familia, & pequena. A respeito disso, os esquimés assemelham-se a outros grupos de caado- res que tém de se adaptar aos habitos migratdrios de aves, pei- xes ¢ animais comestiveis, e em geral a escassez de recursos Novamente, como os cagadores-coletores nao especializados, 0s esquimés amam profundamente seus filhos, Um homem pode perder sua honra se espancar uma crianga. & quase certo que.o pai que disp6e de uma hora livre com sua familia passard esse tempo brincando com seus filhos. Disciplina rigida e indu- fo deliberada das criangas ao medo, tio frequentemente prat cadas entre os, povos.agricolas, devem parecer aos esquimés algo extremamente perverso, H4, no entanto, diferengas importantes entre os esquimés e 6s semang ou os boximanes,~ diferengas que talvez expliquem © maior elemento de medo no mundo artico. Cacadores de aves, 5. FREUCHEN, Poo ofthe Hskimos. Greenwich, Connecticut Fawcett Crest Books, 1965. p.145 8 2s. Bis aqui um povo que podemos admirar sem restri- Poisogens do medo poixes animais grandes, os esquimés sio mais migrat6rios; “gm de percorrer distancias muito maiores em busca de alimen- {os que os habitantes da floresta da Malisia ou do deserto do ‘alaéri. Como resultado, sua ligagio com o lugar é em’certa © medida, mais fragil do que a dos pigmeus ou dos tasadai. Os ‘be identificar com o especifico, ternamente amado e intima- “mente conhecido torrao familiar, Uma segunda diferenga im- ‘portante é que nao apenas os habitantes da floresta tmida, mas também os boximanes do Calaari, obtém grande parte dos ali- -mentos das plantas comestiveis, cuja variedade e disponibilida- sHio quase totalmente dependentes dos animais para alimento, fanimais que migram ~ nem sempre de forma previsivel ~ pelas terras e Aguas do Artico, Por isso ¢ mais provavel que os esqui- = més ou comam regaladamente ou sofram mais fome do que os © habitantes da floresta ou até mesmo do que os boximanes do Caladri, que quase sempre encontram raizes comestiveis. Uma terceira diferenca é 0 maior dominio dos esquimés sobre a na- tureza. Sofisticadas técnicas de caga thes permitem sobreviver em um meio ambiente indspito, mas ao mesmo tempo 0 exer clcio do poder parece lembrar-Ihes a sua relagao antagénica com anatureza. O fato de estarem cientes da simultaneidade de explorar os animais e depender completamente deles cria uma sensagio de culpa e medo. Embora os esquimés possam as vezes dizer que si “o povo ',nem tudo € perfeito. Tanto por evidéncias objetivas quanto pelo que as proprias pessoas dizem, pode-se perceber que esses exitosos habitantes das tertas érticas fre- quentemente sentem-se pressionados, ansiogos ¢ dominados pelo medo. Evidéncias objetivas incluem morte ou abandono de criangas, 6rfios ¢ velhos em periodos dé tenis40: Quando nas- cem gémeos, un pode ser motto, especialmente se for mulher soe sores Vist Tuan Peisagens do medo rem severos.* Este € Ava, que declama de medos: Criangas defeituosas sio mortas. A morte ¢ geralmente impos- esquimé de Igi ta ao nascer, mas pode ser adiadla para os quatro ou até seis anos de idade.* E obrigagao da familia cuidar dos érfios, viiwas e velhos; na falta de parentes préximos a comunidade maior oferece ajuda. Mas quando a comida escasseia eles podem ser abandonados. Os érffios sao encerrados nos iglus, e os velhos (muitas vezes a pedido deles mesmos) sao deixados para tris quando a familia migra. Este tipo de ato drastico deve afetar as mentes e emog6es de seus criminosos involuntérios. Os esqui- més contam histérias nas quais as pessoas que abandonam seus depencentes expdem-se a uma morte ignoi bém nas quais 0s abandonados sao miraculosamente salvos. Além disso, sentem muito medo das pessoas mortas, mesmo quando em vida eram um ente querido. A menos que todos os ituais prescritos sejam seguidos ¢ tomadas todas as precau- ‘Ges, 0 morto pode descarregar uma terrivel vinganga.” Os esquimés so inventivos e pessoas eminentemente pré- ticas que normalmente nao procuram causas sobrenatur: eventos naturais. Porém, muitos acontecimentos de interesse vital para eles parecem to além da sua compreensio, que de- vem ser postulados poderes sobrenaturais para manter uma vi- sfio do mundo como um sistema harmonioso, e nao como caos. Por que ali nfo hé ursos? Um cagador pode responder: “Nao hé ursos porque nao ha gelo, e nao ha gelo porque venta muito, e venta muito porque temos ofendido os poderes". O mundo dos ‘esquimés é controlado pelas forcas personificadas da nature: por almas humanas e néo humanas, espiritos e divindades. guns desses poderes sto maus, muitos nao tém atributos mo- ual devernos tera edo mat Temas mao de Sila Temes med da mvt eda TTemos medo de Tékanakapséllak, @ famosa mu- iodo mar, que domina as feras maritimas. Tememos a smente encontramos pot toda parte} nfo a morte, mas 0 softimento, Temos medo dos maus espititos da vidi, do ar, do mar e da tera, que podem ajudar os malvados ams a preju- dicar seus companheitos. josa, ¢ tam- Mas, para Ava, o maior perigo na vida jaz no fato de que 0 imento humano consiste totalmente de almas. Pode haver ex- ppressio mais profunda de culpa e medo do que esta? Toss as criaturas que devemos matar ¢ comer, todas aquelas aque temos de derrubare destruir para fazermos roupas tém alias as que ndo perecem com 0 corpo, ¢ que nds por conseguinte temos de aplacar a fim de que nfo se vinguem de 1nés por termos tirado seus corpos.? como as nosss canadense acreditam em trés grandes divin- dades: uma esté associada & Lua, outra ao ar, ¢ a terceira a0 mar. ‘Somente o deus Lua é bom e bem intencionado com os huma- nos. Ele é 0 protetor da fertilidade e visita as mulheres estéreis. Ble € um cagador vigoroso, disposto a comparti com os seres humanos. Tem influéncia sobre a deusa do mar ¢ ‘animais marinhos ~ uma cren¢a baseada, aparentemente, 1a ob- 80 Yiu Tuen servagao dos esquimés de que a Lua afeta o movimento das ua sobre a terra ¢ ameaga as pessoas com 0 vento, nebli- huva ¢ tempestades ‘mat; porque ela é ao mesmo tempo mae e amante dos animais, tanto daqueles do mar quanto dos da terra, Na ladainha de Ava, cla é Takanakapsdluk, a famosa mulher do fundo do mar. Ao longo da costa éttica, ela é conhecida como diferentes verses da hist6ria sobre as origens d: edo porqué de ela quase nao tolerar os seres humanos. Todavia, em todas elas esto conticios os temas de traigZo, abandono ¢ crueldade sob a pressio de extrema necessidade. Fis aqui uma versio: ixou a aldeia de Qingmertog, avessar a 4gua e tinham con balsas com caiaques amarrados uns aos outros. Eram m 8 pes: 1am pressa em partir para noves campos de caga, E no balsa iguém se preacu- iguém era seu parente, de modo que a pegatam ¢ a formou-se em espitito, o espirito do mar, ¢ tormou-se ‘a mie das feras do mar, porque as focas nasceram de seus dedos gue foram cortados. Ela também transformou-se em st 82 Peisogene do medo todas as coisas vivas, das feras terresttes que os seres humanos deviam cagar. isco, Até na vivificante flo- fantes que podem se tornar A caga é uma ocupagao de al resta dos pigmeus ha javalis ¢ ele © violentos ¢ ameagadores quando encurralados. Os esquimés, a0 contratio dos pigmeus, so grandes cacadores que precisam enfrentar enormes feras do mar e da terra, Uma morsa, uma baleia ou um urso feridos podem se tornar extremamente peri- {g0808. Mas 05 esquimés nfo temem os animais. Eles temem mais 6 a sua auséncia sua falta em tempos de necessidade ~ € aquelas forcas da natureza que Ihes negam os animais. Entre 0 cesquimés e outros cagadores que devem confiar na presenga de ‘uns poucos grandes animais de caga, a incerteza é uma forma mais estressante de medo do que os perigos fisicos que podem cados com habilidade, Em contraste com a dependéncia dos cacadores-coletores das provis6es invaridveis da natureza, os agricultores procuram criar um mundo proprio, uma horta bem cultivada na qual plantas e animais - os preferidos pelos humanos ~ podem cres- cer sob 0 cuidado e controle dos homens. O alimento se torna nao somente mais abundante, mas também mais confidvel. Por crescerem dentro de um espago pequeno, com limites fixados pelo homem, as pessoas no necessitam mais vaguear ent busta ns da agricultura remontam a mais de 12 de uiia horta férell e plécida exerce um enorme atrativo para os povos tivilizados, Mas serd que alguma vez, de fato, existiu um Eden? Seid que os ores primitivos viviam em tim ‘thtiide sent pieoctipa- . K, The Neti Hekino, Report of the 5th Thule Exper 1921-1924, 1981.8, p225-6. 83 Yiety Tuan Paizagens do medo in visto, e enfrentado, seu meio ambiente. Hoje, e prova- wsado, o periodo da derrubada das &r- jis é um cempo de ansiedade e estresse. A comida é pouca e ite do alimento. Como of roniveis eram de origens diversas, prov = ultores correm o risco de que cheguem as primeiras chuvas. 0 ido em vao, ¢ a escassez da comida 1s quase no podem descansar: tém de éombater-a invaséo lantas daninhas e rizomas de tocos de arvores que ficaram ‘campo. Os campos semeadlos precisam ser protegidos con- ssoas no perderam completa iva destruigao por ruminantes e péssaros. A natureza parece ides como coletores e cagadores. © higatil e é preciso uma vigildncia constante para manté+ Nas latitudes mais altas, com maior sazonalidade, os culti- £Na Zambia, Pierre Gourou escreve: vadores tendiam a rej referiam aquelas com sementes de grios ¢ cereais. A agricul- izada. Embora tal mudanga tenha significado maior capacidade técnica e controle sobre a nature- As espigas de milho verde atraem herbfvoros selvagens, © ¢s- nn ser espantados. Os bembas da Zambia mantém os pre- dadores longe erguendo paligadas. Os bandos de pissaros que se Tangam sobre as espigas de milho sio afugentados com gritos ou saraivadlas de pedras, Uma rede de cordas € colocada sobre a plan- 1m vigia empoleirado em uma plataforma jocalho para espantar os passaros .... O8 tes escalonadas durante todo 0 ano, ocorriam em tempos dificeis ¢, quando malogravam, as pessoas eram ameagadas pela fome. A adores frequentemente precisam abandonar suas al ansiedade era o prego do progresso. | oaviamente perto da rog pars manter uma vi O cultivo itinerante ~ uma forma pioneira de agricultura em : : i a ndo set que que a cada periodo de poucos anos é aberta uma nova clareira — esi “dos cagadores-coletores, p idade e bem-estar. O paradoxo do stieesso 6 clara 33 GOUROU, P. The Topical World: 4.04. London! Longmans, Green & Co, 1966. p34 ‘Angeles: s.n., 1956. v.19, p.125, 84 Paisagens do medo Yeu Tuan érgica ¢ imprevisivel. Uma man ia como se estivesse cheia de e dos, Quase sem excegio, 08 € uma carga. Comparados com os pigmeus, os agricultores 10 é verdade, groides s6 chegaram recentemente a floresta, tendo se mud durante os 108. Che} superiores com poder de modificar 0 meio an no humana; 6s aldedes no se incomo- maneira nao sonhada pelos cagadores-coletores, om faze: 1, 08 esp 108 rodeiam o povoado e tendem a ser benevolentes, ou menos inofensivos, embora snham de Iutar muito mais pela sobrevivéncia do que seus “se ivindades da natureza dominam a mata circundante. Os vos", os caradores-coletores, Para cultivar qualquer coisa, do jes tém medo da mata, da qual pouco saber viam abrir uma clareira na floresta. A tarefa é rd : im diferentes partes co mundo, a atitude dos aldeses para porque frequentemente as dtvores tém de diametro, Uma vez a terra jo para evitar que as litudes basicas, vejamo: manter um mundo ai 4 08 mende e os tarongans. le so povos agricolas de Serra Leoa. © seu meio biente na floresta tropical e na savana é razoavelmente be ‘higno, mas eles nao se sentem muito seguros: veem a si mes- (98 A mercé de secas e inundagées, reldmpagos ¢ rajadas de ven- para instalar seu acampamento provisério, os plantadores pre- sam de meses para construir sua aldeia, Uma vez concluida, a temperatura chega aos 32°C, ao meio-dia. A terra, coberta de < 6 seco asfixiante, converte-se em barro depois de uma chuva. 4 ne Emer anoea a triunfa sobre a vila ¢ os cultivadores de- juase toda parte, Suas ages, no 13 vem mud para outro local e comecar novamente seu ciclo 4 ias. Os mende apren- z trabalho, Ao contririo dos cagadores-coletores, entio, os um sistema hierrquice deios veem a floresta como um inimigo, de quem desconfiam e @ © Vagamente concebido. No alto da hierarquia esté o Deus su- “eles povoam a floresta pramo. Ele manda cair chuvas na sua “esposa”, a'Terra, mas sob pectos 0 seu impacto nos assuntos humanos:épéque- . Para os mende so muito mais importantes 0s espiritos attr ais. Eles estdo perto de Deus, e so mediadores entre Deus @ os seres humanos. Os ancestrais no sao nitidamente dife- {onciados das varias classes de divindades'da natiireza. As ve- Yiu Tuon Poisagens do medo ‘Quanto mais os tarongans se distanciam do seu povoado, ‘os da natureza lugates especificos e fixam tempos precisos pat receber ofertas formais de grupos comunitarios, iguais Aquelas.” dadas aos ancestrais. Outras nfo esto ligadas a um lugar; si individuos caprichosos co1 ptopésito. Existem diversos tipos. Os menos perigosos so bras travessas, semelhantes aos humanos, que vivem em pera eee eee s onde € densa, Uma ameaga maior so 08 “ne- mend devem enfrenti-as como individuos com a ajuda da es sores malévolos que vivem em grandes drvores isolaclas, Perteza e magia humana. Dos espiritos ligados a um lugar, ype ce onde vivem os humanos. Ainda mais poderosos e ame- dos rios esto entre os mais poderosos. Antigamente esses es-! idores sio os Sa’er, cujo habitat, também so as grandes r- ritos dos rios exigiam sactificios humanos. Até hoje eles sig. pres e capoeiras escuras. Os Sa’ero s4o invariavelmente mal- Fesponsaveis pela morte de pessoas que procuram atravess4-los Intencionados; chegam até a atrair as pessoas para fora de suas em pirogas, ou nadar e pescar em suas fguas. O medo concen- 1s para Ihes fazer dano, Felizmente eles nfo sio numerosos, tra-se nas correntezas, remoinhos ik maior classe de seres sobrenaturais, e portanto aqueles co dos nas vertentes rochosas. quais se pode topar com maior pro flexivel termo “no Os tarongans cultivam arroz. Vive em pequenas comuni dades isoladas na extremidade noroeste de Luzon, nas renga, acidentes € morte. So onipresentes a noite € nas. Sua regido acidentada, mas atraente, consiste de monta-’, “k¢ompanham a escuridéo quando esta invade a casa. Por esse has majestosas, com escarpas cobertas de bambus ¢ vales ‘motivo, dizem William & Corinne Hydegger: terraceados que chegam até o mar. A vida vegetal é abundante. Muitas frutas silvestres, plantas e raizes aproptiadas a0 consu- ‘mo humano. A vida animal, ao contrario, & escassa, exceto pe- los onipresentes ¢ inofensivos lagartos. As cobras sio raras. De fato, a mata abriga poucos animais perigosos. A natureza pare- nte, mas o mundo dos tarongans é um mundo fe. Os espfritos manifestam-se de forma desagradavel a0 redor de matorrais sem luz, charcos sombrios, sob grandes drvores isoladas, perto dos quintais e até dentro de casa. Seres ancestrais assombram o terreiro da casa; embora amigéveis na ‘maior parte do tempo, eles podem também ser perigosos. Quan- do 0 espirito ‘de um morto toca uma pessoa, ela sente frio ¢ apresenta dor de cabeca e febre. Cs songs fecha os postigareamdetro de aa fo posse quan prec a evan wn nga em eto cnet hs qe foram pred pores. iment cm nite de, qn Te ri guts se - spans terreiro, gas espadas de madei Por que os aldedes vivem em mundos tio endemoniados? (Os mende realmente enfrentam diversos perigos reais ineluin- do cobras venenosas e porcos-do-mato, Mas 0 que'os tarongans temem do seu meio ambiente benéfico? Ocorrem doengas, 3s prematuras, mas essas aflgses:sto'o dest SAWYER, H. The Springs of Mande Bele and Conduct. Free Leone University Press, 1968, p39, 47, 88 Jinescapavel de todos 08 mortais e por si s6 nao ex jor de cama) dela pode estar cheia de incerteza ¢ estresse, exac bbados (talvez) por uma sensagao de transgressio contra a natwi ‘Teza. Dentro de tals circunstancias, a imaginagao € rapida em. ovoar 0 espaco com espiritos malignos que estao a espreita (pons do optrate oahu,» sie Do mesmo. modo, a 6 Calamidades naturais e fome fa geralment® 10 5 ivos cacadores-coletores, para estado, da cultura Hentem mais seguros do mica e 0 desencadeamento de forgas naturais am destruir regides inteiras. Um fato notavel sobre as mento do cosmos. O movimeiito dé Sol 0 citio das estagoes € a conduta ordeira da propria sociedade'ndo sfo assumidos como 7 Paisogens do medo certos. Por que os antigos se sentiam to vulneriveis quando, ara onde quer que olhassem, viam cidades, monumentos obras de irrigasio que testemunhavam as realizagSes humanas controle? Uma razio pode ter sido que a ameaga da fome con. | tinuava sempre ae e tinha implicagdes devastadoras, es. i todos os campos de Oryx-Nome, smantende ec pecialmente para os habitantes das cidades que nem colhiam vantes. Depois vieram grandes Nilos, tiqueca de pros etm nem produziam seu préprio alimento. Os 8 de transporte Be das as coisas, mas eu no arrecadei as vidas do campo" F ‘eram muito primitivos para poder levar auxilio as provincias dis- Se tantes, ¢ a evacuacio de multidées de pessoas famintas era rare ue no Egito. Comparada como vale do Nilo, a natureza na ter~ ‘mente possivel. Mesmo na zona rural, a dependéncia de uma ou do Tigre ¢ Eufrates realmente caprichosa. Havia, aswel duas culturas principais significava que, quando a colheita fra- mente, as grandes periodicidades diurnas ¢ Se wloe cassava, as pessoas no tinham outros alimentos com os quais _lencias imprevistas como tempestades: cess Geseri ale \ se alimentar. Ademais, os agricultores das civilizagdes arcaicas “Inesopotamicos como “temiveis labaredas de luz") e as haviam perdido as habilidades para viver confortavelmente na bes desorganizavam-nas. i distante natureza selvagem. Vejamos uns poucos casos. 4 ‘A violenta inundagfo que homem nenhum pode deter O Egito foi abengoado com um meio ambiente confidvel: 0 Cer res I: Sol fazia sua previsivel trajetéria através do céu, e 0 Nilo, gracas Em um apavorante cobertor envalve mae e filho, ' j sua densa rede de afluentes na nascente, na Africa subsaaria- [Abate 0 verde do exuberante bambuzal na, transbordava regulatmente, Por essa razio, 0 Sol ¢ 0 quando esté madura? EB afoga a colhet eram as duas supremas divindades do antigo Egito. Confiabil dade é, no entanto, um termo relativo, O Sol dé vida, mas seu “Todas as pessoas anseiam pela vida, mas os desejos dos su- 8 calor intenso pode matar: Também pode destruir a vida ao reti- série ttm um pts especilprg elo arta em i 3 rar-se ¢ enviar frio e escutidao sobre a Terra. Ademais, como os uum paradisfaco mundo do além. A seguranga até neste mundo eeipcios o compreendiam, luz e calor nv eram garantidos, por- 6 ilus6ria. O medo, dizia o orientalista S. N. Kramer, mistetio- i que toda noite o Sol, na sua viagem através das extzemidades satnente tingiu a vida dos sumérios. antipodas, tinha que lutar com Apéfis, a cobra da escuridio. Este esforgo era especialmente intenso na primeira manha do novo ano, quando o ritual humano tinha que complementar 0 poder do Sol para que ele nascesse novamente, Quanto a0 Nilo, a outra grande fonte de vida, sua certeza também era relativa, QNilo era mais confiével que os,ti0s mesopotémicos ¢ o Huang Ho, mas.os niveis de égua oscilavam durante curtos ¢ longos | KW. Barly Hydraulic Civ : ; cago Press, 1976. pA causar um desastre no Egito, Piilesoply. Harmondsworth, Middlesex: Pllen Books, 1951. p.139. Do nascimento até a morte muitas vezes eles tveramn. ocasifo de temer seus pais, seus professores, seus amigos & coneidad ito, a violencia vin Rat Eheagos Univer of 92 93 Yiefu Ton Poisogens do medo dda navureza, animais selvagens, monstros ¢ deménios malvado: 4 guerras [Shang] eram empreendidas nao como guerras de doengas, morte ¢ esquecimento.* jquista mas com o nico propésito de capturar prisioneiros". i808 prisioneiros eram mottos ¢ oferecidos aos deuses. O cos- ine de usar vitimas humanas para manter a fertilidade esten- 4ese muito além dos lugares de rituais solenes. Em algumas homens ficavam & espreita, perto de fontes, esperando Para a mente arcaica, 0 principal medo era de que o préprio cosmos poderia ruir momentaneamente, Até os grandes ciclos da natureza poderiam malograr a nfo ser que fossem mat por rituais e sacrificios, incluindo sacrficios humanos. Na Ba- bil6nia, por todo o primeiro milénio a.C., durante 11 dias de | cada primavera, os pensamentos de toda a populacéo fixavam: se nas ceriménias do Festival do Ano Novo. As ceriménias Embora nos tempos de Confiicio (século VI a.C.) fossem destinavam-se a tranquilizar os mesopotamicos, que achavam toibidas todas as mortes rituais, a pratica foi relatada nas re- que © cosmos poderia converter-se em caos ¢ que a sorte do! ides centrais da China até o século XI apés. O famoso festival pais dependia do julgamento dos deuses. Somente um ritual le barcos, no sul da China, festejado todos os anos na primave- ‘tao esmerado e carregado de virtudes mégicas poderia resolver ha sido anteriormente uma forma de oferecer vitimas hu- esta inevitével crise de f& e colocar um ponto final na terrivel ertlidade.* Nas cortes feudais durante \certeza que oprimia todo 0 povo." Em certo momento do fes- oda dinastia Chou (c. 1030-722 a.C.), um exorcista dan- |, um sacerdote deveria decapitar um cameiro, esfregar © | ava na inauguracio do Ano Novo, a ceriménia acabava com sangue nas paredes do templo e, depois, jogar tanto a cabeca | 0 esquartejamento de vitimas humanas nos quatro portées da como o corpo no rio. Poderia um ser humano ~ talvez 0 proprio © cidade principal. Até a época de Confiicio, os chineses ainda rei ~ alguma vez ter desempenhado este papel de bode expia- pensavam que, para inaugurar um novo reino e dispersar 0 torio pelas transgress6es do ano que passara? O historiador = miasma da velha classe, era bom matar um homem e arremes- babil6nio Berossus sugeriu, no século MI a.C., a possibilidade gar seus membros aos quatro portoes da cidade. Quando uma de um sacrificio real em tempos remotos. O que os textos que | {grande seca assolava a terra, pedia-se aos feiticeiros que dan- ainda existem registram é a humilhagio pablica do rei: ele foi | Gassem nos campos até a exaustdo, ¢ entao eram queimados. golpeado na cara até que as 4 Entretanto, no comeco da dinastia Han (202 a.C.-9d.C.), sacer- Os antigos chineses, especialmente durante a dinastia = dotes e autoridades realizavam somente atos sactificiais simbé- Shang (c. 1500-1030 a.C.), acreditavam que os sacrificios hu- licos para manter 0 correto revezamento das estagées. EM tama ‘manos eram necessérios para promover a fertilidade da terra. época adequada, imagens do espfrito da estiagem de’ uin ho- i “Tem-se a impress4o”,escreve Wolfram Eberhard, “que muitas mem ede uma mulher eram jogadas na Agua; ot effete He nina familia de camponeses podia ser imoladd.* Sumerians. Chicago: University of 3 KRAMER, §. Ns cago Press, 1963, “F EBERHARD, W. A History of China, 2e¢: Bork: University of California .as2. Press, 1960. p23, 4 ROUX, G, Ancient aj Harmondsworth, Middlesex: Pelican Books, 1966. 6 GRANET, M. Chins Civilization. New Yorks Mecidlan Books, 1958. p.191, 360-1 ki a Vis Toon idade cap uma populagdo de 300 mil pess as eram prisioneiros de guerra, Na verdade, o princi propésito da guerra era consegi de vitimas. Eles eram um povo robusto que, a part cio modesto, criou uma cultura urbana superior em menos de du: parecia inseguro, Os astecas acreditavam que tinham existide outras épocas anteriores & deles e cada uma tinha acabado éf hatureza nao conseguiam amenizar a tendéncia dos astecas ansiedade. O Sol aparecia todas as manhas, mas poderia fazé. ‘mas toda a humanidade. Homens eram oferecidos ao Sol e mor. tos no alto de uma pirémide. Mulheres eram oferecidas as dew: sas da Terra: enquanto dancavam, fazendo de conta que nic conheciam sua sorte, suas cabegas eram cortadas. Criangai cram afogadas em oferenda a'Tlaloc, rei da chuva.? Antigos impérios e Estados como o chinés ¢ o asteca tinham o conhecimento ¢ organiza¢go para construir monumentos e cide: ureza. Artefatos admiré- “7 io exam capazes de persuadir as pessoas de que elas viviam ife ofthe Aztec onthe ve of the § nford University Press, 1970. p.95-102; ORTIZDE 7 MONTBIIANO, B.A Cama te Cale An Belge Neco? #, v.200, p.611-7, may 1978. a Paisagens do medo mundo previsivel. As estrelas, como os monumentos Him construidos de acordo com as coordenadas celestes, im permanentes. Porém as pessoas sabiam muito bem 10 que dizia respx , esses garantidores de {dade tinham pouco ou nenhum efeito. © comporta- Hto-da natureza junto a terra eta incerto. Ninguém podia inosticar o tempo com certeza € pressagiar se no proximo ‘povo iria progredir ou morrer de fome. Nessas circuns- r parecido uma ilusio € 0 ca0s -ameaca constante, Nao é temerério dizer que, exceto uma {quase todos os adultos da sociedade pré-moder- onheceram a ameaca e, frequentemente, a realidade da Bivie, PlantagSes ressecadas pelo sol, submersas pelas inun- wiar a ansiedade dos habitantes e preven! las massas, governantes cultos estabeleceram reservas de ali- i ir0s. O Livro do Génese conta a histéria de José, suit armazéns como previ- fo a pri . Com 08 gros armazena: , José pad alimentar tanto os egipcios quanto os habitantes 1s paises, porque “a fome era uma afligo em todos 08 Han, a China pelo menos reconhe- 10s. Como Chia Yi (220-168 aiC), 0 pode pedir ajuda?" No antigo México, para todos os governos foi importante acumular grdos nos celeiros, cots pi a 580 m. (NT) ae 18 CHIL, C. Key Economic Aves in Chines istry 2.64 NeW York: Pitagon Books, 1963. pé. Yeu Tuan caso de desastres naturais graves. O imy . yetador asteca, conh do tradconaimence com "0 pal ea hae eae ai ea mie de seu povo”, Obrigado a utr po el, conta a fame. Ox npendons ny mam suas obrigagdes seriamente, Montezuma distribu al mentoseroupas ta popula Auto citibts 200 caregamnts dni ene sw de inna lor chines, igualmente 0 “pai do seu povo”, el Ct tera, Quo ar cols erm Inti monstavaa sua preceupagio paternal perdouno os impostos tngidas e abrindo os celeiros. Se a calamiade nats ‘al perssta, oimperador tina que interceder a0 clu, Os deere, tos imperais de 1832 ¢ 1878 mostram que, nadinastia Chingy © governante chinés ainda concordava com a antiga crenca de ue a8 propia transgressies podem seater deconlon ee mea osu crea ja oes sci com io de 1832 em parte sel: Bae anode sca © mais neon. Overioaabou nfo cho- ¥-Niosomentea peut eons humo eaten or we ridade, mas também bestas e insetos, ervas e érvores. i seed Cl cin duns «pn Dor manter a ordem no lo a amy . - € acalmar poo. Une dis de ejuei e ofereci abundantes sacrificios nos altares dos deuses da, |) sme seta ue esa arden pre ive mene has em ow salen ara pra oss do, plo ao Ck que peoe mine lgnrtnc eoarice es me concedaautorrenovaro; pore mies de pessosino- cde deni o ome Nan Un News een Soo none ue il eeapr dees O vere panes tne con cpr mas sia eee np lemente suplico ao Céu apressar-se € concede = doagio — uma chuva répida e di mente benéfica, para s: rm P vida dos habitantes ¢ em certa medida redi se des, Oa de mint Cea ingen Poisogens do medo i] Céu imperial, seja benevolente com eles. Eu estou inexpri- sré-modernos em quase todas as partes, mas em nenhum ‘em tais proporgées como na india e na China, Jé no sécu- ‘A.C. ambos os paises tinham grandes populagdes. A China iuht‘cerca de 50 milhées de habitantes, a maioria concentrada vyales subtimidos e planicies da bacia do Huang Ho, ea po- fagdo do subcontinente indiano era quase o dobro da chine- seas duas grandes e densas multiddes de seres humanos no sndo dependiam (e ainda dependem) da chegada e safda pon- lil das chuvas mongénicas. Quando chegam muito atrasadas 1 passam muito cedo, a fome ameaca centenas de milhares, is izes milhoes de camponeses. Na india, uma das piores calar ‘sades de todos os tempos ocorreu em 1770, como resultado de “lois anos de colheitas magras seguidos pela completa falta de shuvas no terceiro ano. Cerca de 30 milhées de pessoas em Ben- {gala Ocidental e em Bihar sofreram, e talvez perto de 10 “Ihdes delas morreram de inanigéo e doengas. Em Orissa ¢ a0 | iongo da maior parte da costa oriental da india, a seca de 1865- 1866, seguida de chuvas torrenciais em 1867 ea inabil politica ‘governamental, produziram cerca cle 10 milhdes de mortos por © “doencas e falta de alimentos.”° Na China, praticamente néo © choveu entre 1876 ¢ 1879 nas densamente povoadas provin- |. cias setentrionais; a fome e as consequentes explosves de vio- Iencia mataram entre 9 ¢ 13 milhdes de pessoas. Fomes produ- zidas pela seca ocorreram novamente nos anos de 1892-1894, 1900, 1920-1921 e 1928: 0 ntimero de pessoas que miomen dur Eo WILLIAM, S. W Theale Kingdom, ed ex. New Yorks Charles Seribner's Sons, 1907. V.1, pA67-68, : : 10 AYKROYD, W. R. The Conguet of Funine. Londons Chatto 8 Windus, 1974. psa. | | i Yiefu Tuan Poisagens do modo is Jina, que tem sua histéria bem docu- ante € logo apés cada um dos desastres variou entre 500 mil sem um pafs como a China, que kem sua hist ri aes trés milhoes, fantada. Ping-ti Ho, entretanto, foi capaz de fazer uma res que afetaram a provincia ‘A seca foi a maior, mas no a tinica calamidade natural, Né ero ¢frequéncia dos dea one (uote 1911), China, as inundagées vinham logo em segundo lugar, segui Hupei rane 08267 anos da natin Cn 164-7811) Pela peste e terremotos. A inundagao do rio Yangtze em 19314 E Durante todo esse perfodo ocorreram s« afetou mais de 12 milhGes de pessoas. Mais ou menos 14 mis _ Ihdes ficaram sem moradia quando esse mesmo rio se enfure: ceu em 1935. O niimero total de mortos nesse desastre permae rece desconhecido, mas deve ter sido extraordinatiamente alto: ‘um municipio imprevidente da provincia de Hupei percieu 220 mil pessoas de uma populagao total de 290 mil. A inundagao do Huang Ho entre 1938 ¢ 1946 provavelmente tirou a vida de meio milhao de pessoas.” Na india, o densamente povoado del- ta do Ganges esté a menos de um metro acima do nivel do mar ¢ facilmente fica submerso durante a estagao cicl6nica. Quase todos os anos, milhares de camponeses bengalenses correm ris- co de morrer em temporais comuns. Tormentas inusitadas car- regam culturas de arroz e podem provocar escassez de alimen= tos ¢ fome em uma extensa regido. As autoridades estimaram em um milhao e meio © mimero de mortos na fome de 1943, apesar de o niimero real poder ser duas vezes maior.” Meio mi- Iho de pessoas pereceram quando um furacio atingiu a Benga- Ia Oriental, em novembro de 1970. Uma mera exposicéo das maiores calamidades exclui 0 grande niimero de secas menores em 190 anos. Os documento de Huet indica au U taluidades naturals atingiram, todos os anos, uma média de de um total de 71 muni outa pala, cera de a décima pare da provincia fol ating anualmente por wm {1 outro tipo de infortinio. Outas partes da China especial Frente aquelas do Nore eda baca do cio Hua, podem ter 9 fo mais ~ muito mais — porque néo tinham o cma regular provincia de Hupei nem o meio ambiente diversficado.” ene socumentos histérios raramente descrevem cenas de fo = neem toda a sua desolagéo e horror. Autoridades ave teste haar os desastesexcreveram em um estilo formal e parece ue omitram seus sentimentos, talvex porque eles prSprios sinha o suficiente para comer quando procuravam shud 0 moribundos que se amentonvam a0 redor dees. Os afi, quando sobreviviam, nfo tinham a educacao formal para fe da sua angistia. Porém, existem uns poucos relatos claros. A seca da Caxemira em ssrzanie ft descrita por Kalhana em Réjatarafgini (Uma crénica dos re! Caxemira). Kalhana (Al. 1.148) escreveu: gistrar a profundidad undagdes pequenas que atormentam uma area, omite as verdadeiras experiéncias de sofrimento e medo, As variagdes da natureza nao precisam pro- vocar fome em extensas Areas para projetar uma sombra de medo quando se repetem frequente e imprevistamente. Carece- mos de dadlos confidveis sobre eventos me: 7 gua na qual haviam permanecido por longo'tenpe: sera fl- a todas as partes, completamente coberta com ‘08808, até pa~ »s draméticos, mes- 11 HO, ® Studies on the Popudation of China, 1368-1953. Cambridge, Massachu setts: Harvard University Pres, 1959. p.231-5. 12 AYKROYD, W. Conquest of Fonns, op. cit, p.55. of Ching, op ct, p28. 100 101 Viste Toon Peisagons do medo XVI, 0 Império Mo, ene aaa fe Ini satava no apogeu do seu o ero de camponeses jf estava morrendo antes que tivesse grande calamidade ‘fom Péde fazer para impedir uma {feito algum esforco coordenado para levar alimentos. Quan- lamente conheci- a tarefa de wansportar a quantidade necesséria de gros eentenas de quilémetros em estreitos caminhos de terra jonstrou ser quase imposs{vel. O horror resultante foi cla- mente descrito em um relatério oficial: cipes indianos, ao contrétio d como sua obrigacio providenciar attes do pais onde ex Durante o inverno e a primavera de 1877-78, reinava soberana 4 desordem mais espantosa ao longo da rota a Shansi. Fugitives, As autoridades exam (es para criar qualquer forma de ordem nas montanhas, O hho estava completamente deteriorado, Camelos, bois, mulas burros eram tangidos na maior confusio... Viajar & noite estava fora de cogitagao. O caminho estava marcado pel 4queletos de homens e bestas, e os lobos, pPunham fim ao softimento d que se se recuperar ~ ou morrer ~ da sua doenga, Carrogas quebradas, sacos de grios espalhados, homens e animais agonizando muito frequentemente bloqueavam a rota, e era necessério suspender por virios dias seguidos a entrada de comboios de um lado, para ia escassez deste tipo, que carccem, Mas né: nportando pelo mat as coisas de mos longe do mar. ado contritio pudesse passa Secas ¢ inundagdes, fore e morte sio horriveis. Apesar de haver| ae India, em comparagao, fayorecido onde a natureza é benéyo- Ja, O tempo oscila, mas em pequena escala, ¢ os ios europeus so pequenos e bem compor Porém, fome e inanicfo causadas foram um aspecto import pos modernos, Fomes ter : do interior da China, 9 ; buiu para levar a morte 20 menos as noticias © 08 portos da costa. Grande dos ws OH. K: nia and Pakistan, New Yorks. sare, 1 New Yorks. p 20 NAZIANZEN, 6. (i tado em HO Jn: ABRAMS, P, ‘nomic History and His Press, 1978, p46, Dutton & Co, 1954, WY, WH. China Lid of Feming. New York Ametict Geographi- 926, p30. 104 a; ‘assez, ¢ hordas de pessoas com fome a procura de alimentos periodicamente assediavam mosteiros e os portdes da cidade, © fato era que, mesmo nas boas época ~s¢ a anos de fartura, e mesmo nas melhores temporadas m tas pessoas tinham que se contentar em viver precariamenté durante a primavera ¢ nas semanas que precediam a colheita, Depois de 1300 comesou uma época de escassez catastréfi- para o sul de modo que /egagio da Norue- 82 para a Groenléndia teve de ser mudada, Uma sucessio de ;pocas chuvosas fez com que as dificuldades erénicas com co- tas insuficientes se tornassem mais agudas e provocassem, em 1309, no Sul e Oeste da Alemanha, uma crise no abaste: mento de trigo que depois se espalhou para o restante da Euro- a Ocidental, Durante o pior perfodo, de 1315 a 1317, foram radas quebras nas lavouras da Irlanda até a Hungria. Em 1316, os arquivos de Ypres, em Flandres, mostram que maio ¢ outubro cerca de 2.800 cadaveres, ou aproximadamen- te a décima parte da populagao, foi enterrada pelo servigo pii- blico. Al 1, foram abandona- lente, © muitas delas nunca mais foram Fomes de compardvel severidade foram ameacas iais para as cidades europeias no final da Idade Média. ar sete perfodos de fome entre 1334 e meados do século XVI. O problema com o abastecimento de al todas as partes, um problema constante, agudamente sentido em todas as comuni- in: KINSMAN, R. 8. (B.) The Darker the Feld of Reason. Berkeley e Los Angeles: ‘of California Press, 1974, p.26-7 22 WHITE JR, L, Death and Vis 106 Paisagens do medo [és espera - pes ‘suas aldeias, cidades e feudos, fossem retrégradas, por igencias da natureza. Mas, quando nos dirigimos pase ngado século XVI, descobrimos que os its do Grande ‘hffo estavam em melhor situacao. A natureza ainda era to a francesa atinha-se muito as colhelta {hj especialmente verses frios e chuva excessiva, ¢ estas saree sam com frequéncia anormal durante todo o século XVIL dos 0s ue causava um grande aumento dos pregos dos gros no ercados. De tempos em tempos pessoas morriam de fom« jento, mas porque 0 prego era odos de relativo bem- estar revezavam-se com perversa regularidade. Tempo ruim © colheitas magras causaram a foe geral de 1661-1662. Mendi- gos das reas rurais aglomeravam-se nos portes das oe cuig6es de caridade, pedindo pio, Em todo 0 pals ck dadios formaram milicias para repeli-los. Um periodo de bon tempo produzi boas safras em 1663, esse ano mareou 9 iniio de uma década de telativa prosperidade. De 1674 em diante, po- Ho timido em 1674 diminuiu a colt lugares; os dos anos 1677, 1678 e 1679 foram piotes. A producto fol escas~ ‘sa.em 1681 e catastréfica em algomas fegibes éin 1684, 0 prego fe thy Meioval West, Colina: Yes Toon 1679 € 1684 0 ntimero de mé 108 comecou a aumentar em toda a Franca. © tempo {oi bo} novamente de 1684 até 1689, Excelentes 1m ps baixar os pregos dos grios, e as pessoas ficaram bem aliment das, Entio chegou a grande fome de 1693-1694, o auge de u série de anos frios e imidos. A mai de infelizes almas, débeis pela fome e desgraga ‘emorrendo de misétia e falta de pao nas ruas ¢ pracas, nas cidades € no campo, porque néo tendo tra io para comprar pio. Procurando prolongar um pouco vidas, estes pobres homens comem coisas impuras, como gatos ¢ carne de cavalos esfolados e jogaclas em montes de excrementos Outros desenterravam os feijdes e sementes de mitho plantados Foi a inanigo um problema sério na Inglaterra dos Tudor € Stuart? A histéria aponta nessa diresao. Peter Laslett sugere pelo menos a possibilidade de que o indice de mortalidade mui- to alto em Colyton, De fe, em 1645 teve como causa a fome local. Os aldeses de Hartland, oitenta quilémetros a oes te, tinham o suficiente para comer, mas parece que nao tinham excedentes para ajudar seus aflitos vizinhos.* Andrew Appleby argumenta que os a noroeste de Cumberland e Westmoreland eram influenciados pela fome e nao pelas doencas epidémicas como se pensava an- tes. Pessoas morriam por falta de alimentos no norte da Ingla- Tent Million Frenchmen, New York: Pantheon Books, 1970, p.178-81;citacio na p.216, 25 LASLETT, P The World We Have Lost. New York: Charles Scribner's Sons, 1968. p.its | mas também para pessoas de Poitagens do medo sequéncia devew- jem 1587-1588, 1597 e 1623. A triste seq fra, o aumento ‘io timid, seguido de uma quebra na safra, digo dos prevos m do aleance dos po- essoas pas campos por falta de pio". Os arquivos do condado de Newcastle conf ‘mam a desgraca: em setembro e outubro de 1597, 25 “pessoas po- melhor aparentemente ter rf 20 norte, gragas a importacio de graos do estrangeiro. Nao fosse p a essoas teriam morti~ esses carregamentos de gras, mil le pe do de inanicdo, o Decano de Durham escreveu a Robert Ci No século XVII, a vida era insegura nao s6 para os trabalha- nos proprietérios ¢ os pobres em geral, «J econdmico superior. Apesar de carecermos de dados estatistcos para apeia esse afirmacto, ‘um detathado estudo de caso, como a descrigfo que Alan Mac farlane faz de um clérigo ingles, transmite eficazmente = pressto da precaredade da vide. Ralph Josslin (1617-1683) 18s importantes fontes anuais de rendimento: 0 cargo rio de Farls Colne em Essex, luctos provenientes de terras snorétios por ensinar em uma escola, we espago.no. sett tages religiosas ocupam bastante esp iam ‘o mesmo espago ¢ tomado por referencias ao telypo €.a0 Yisfu Tuan alguns dizem que 9 irzeas subinerge e morre, se tinos destrufdos por case aeeae tecimento de al ele podia economizar e gastar com seus devia gastar em combustivel. Contud |. Contudo, mesmo nos do final da década de 1640, Jossel nga rural do século XVI, ndo eram mais ‘corréncias comuns. Gracas a condigées climéticas mais clemen. {es, a.um governo real mais eficaze a uma distribuigdo nacional Tins eficiente dos suprimentos, as calamidades locais deram lugar a talvez em um sentido desesperado -, ou 's crOnicas. © fim da grave tornou posstvel que as pessoas pobres da Franca se issem. Uma populago morrendo de fome no se re- Produz, mas uma que sé esta mal nunca poderia se ausentar de suas Ro passado, a fome ameagou por- «1e, depots de uma safta estassa, a exploracio dos comercian, mentes. Ainda mais do qi 27 MACFARLANE, A. Th Family Life of Ralph J Clergyman. Cambridge: Cambridge University Press, 1970. p.71-6 A Seventeenth-Century Poisagens do medo que nfo ifientar deve ter se perguntado se poderia comprar comida ido houvesse escassez. O medo escondia-se na profundida- ie as pessoas se mostrassem calmas € sscreve Olwen Hufton. As pesso- 1 daqueles que Em tempos de privagio ... os medos mt se agtegam, no menos o medo das intengSes dos estranhos inte- ar os gros de uma comunidade para forgar 0 aumento dos pregos ¢ o medo da vila pela cidade, e da pequena cidade pela grande cidade, cada uma desconfiada de que a outra cestaria desfrutando melhores condligées e pregos mais baixos."* ‘As calamidades naturais obviamente nao afetam da mesma ‘maneita todas as camadas socials. Em geral os que trabalbam a terra e 08 pobres sofrem mais. Dados estatisticos sobre indices de mortalidade, relatérios contemporéneos ¢ documentos do da fome, mas as as ~ os milhares e, no caso da india ou China, até ue pereceram em cada grande desastre ~ no deixa- ram um registro pessoal de seus medos, angiistia e sofriment De fato, ser uma vitima era ser desconhe tavam o ar eram rapidamente absorvidos por ele, Quando. um ,0 conserva os medos das pessoas, nés consideramos ‘io do relato um acontecimento afortuniado, De um th-Cantury Fran, 1780-1789, Oxford: res, 1974, p355-6; VRIES, J de. The Recon of Ekoope nan Age 750, Cambridge: Cambrldge Unlversty ress, 1976, p.115. — s erplexidade das pesso: ‘Quando uma inundacao repentinaprodiz morte, ele zomba Esta também é sabedoria popular, registrada em | tum classic chinés, Os compo: 's comportamentos ¢ humores da natureza oscilavam previsivelmente. Essa inconstancia era uma fonte permanente de medo desde os tempos antigos até o comego da Idade Mo- derna, Inundagé ia. Inundagbes, terremotos € pragas de gafanhotos apare- ciam ‘ com pouco ou nenhum aviso. A resposta era um alarme uma massacrante sensagio de destruicéo do mundo conheci do. A se i ca, pelo contrdtio, aparecia gracualmente. Enquanto 0 Sol queimava dia apés dia, as pessoas se tornavam cada vex eae lia aps dia, as pessoas se t e mais ansiosas e procuravam no céu qualquer pressigio de va céu qualquer pressigio de chu- tes do estouro da mi ia do que os lavradi ia do que os lavrado- res poderiam sentir enquanto esperavam pelos ventos timidos. Homem ¢ animal definham ansefam por at, enquant smo em casa 0 termémetro marca . Quase todas as coisas verdes muse! at6 a raz sulcada de gretas;e toda a paisagem tem um aspecto de secura e 7a, Por fim, em junho; 0s ventos quentes param de sop Segue-se uma calma; e agora; de fato, 0 calor & ver assustador; 08 anteparos de eapim nfo ser a coisas anelamn por chuva; mas nada de chuva, nem sequer wna 29) Tao The Ching. Tad, John C. H. Wa, ae New York: St. John's Universi Press, Poisagens do modo de esperar até que os ventos do sul-e do leste te- as 0 que acontece se a nao chegam? Antes que se construfssem modernas redes do Ganges, esta era uma nas de milhares de campo- 6, € que os atormentava todos 08 anos. * Os seres humanos nao suportam viver em permanente es- de ansiedade. Necessitam manter uma sensaco de con- ,, nfo importa quéo iluséria possa ser. Celeiros, pogos € tudes proporcionavam um certo grau de seguranga no passa~ ‘mas somente um certo grau: nada podia proteger o popula- o dos grandes desastres. Até que a tecnologia moderna deu los seres humanos a sensacdo de dominio sobre a natureza, les néo podiam confiar nos seus proprios artefatos; estes ti tham de ser complementados com rituais magicos e cerimé as, Para os astecas, as cerimOnias requeriam tanto r tesforco organizacior {les nao usaram seus recursos ¢ ei tais como c dda 4gua. Mas os astecas acreditavam que o proprio cosmos es- tava ameagado e 0 Sol podia néo nascer. Nenhum trabalho hu- ‘mano poderia fortalecer 0 cosmos, € somente o sangue humano poderia dar ao Sol a forga para movimentar-se na sua trajetoria. ‘os humanos sangrentos, um horror para as nossas sei ‘dades, eram para os astecas um meio de mitigar a ansieda- de do medo. Mesino o medo das vitimas pode nao ter jintenso como nés agora imaginamos, porque rituals dé. catego- ria celestial podem fazer parecer a propria morte ngo, 86 pert; nente e dignificada, mas também distante,¢ impess 30 MERK, M. J. Um residente de Punjab, Cltao.em KENDREW, ‘Climates ofthe Continents. London: Oxford University Press, 1987. p146 3 Yio Tuan Os desastres naturais eram vistos como um desvio da monia essencial da natureza, que devia ser restabelecida 06 rituais humanos. O ritual tem isto em comum com o pro mento cientifico ou a ago pritica eficaz: procede de | com regras definidas e prediziveis, Em tempos de incerteza, execucio de gestos predeterminados pode ser em si mesi tranquilizadora; © a sensacio de certeza é profundamente ai mentada quando se acredita que os gestos individuais e colet! Vos transmitem poderes sobrenaturais. Sacrific empreendidos para promover a fertilidade ou para repelir dees sastres sempre foram parte de uma ceriménia. Com o passar dé tempo, os animais tomaram o lugar das vitimas humanas, 4 animais de palha foram substitutos para os vivos. Somente 06 estos foram mantidos. A literatura etnogréfica documenta nui. ‘merosos tipos de rituais que existiram e provavelmente aindit existem em diferentes partes do mundo. Os indios do sudoesté americano continuam realizando a danga da chuva. Nas igre rurais, quando as pessoas ficam de pé ou de joelhos, ainda sio oferecidas oragbes por uma chuva oportuna e uma boa colheita, ritual é um ato ptiblico e uma expresso de f nos orde- nados processos do mundo. Quando a vida e os meios de vida arecem incertos ~ devido a razGes naturais ou attificiais -, ou- {ra resposta mais pessoal é possivel, e esta & 0 jogo, Os chineses sao famosos por sua predilegdo pelo jogo. Paderia 0 vicio nos jogos de azar ser uma resposta & precatiedade da vida? Nao 0 sabemos. Porém, virios estudiosos tém sugerido que nas terras semitimidas e semiridas de Alberta, Kansas Novo México os agricultores tém desenvolvido uma atitude de apostar em sua empresa diante da grande variagdo das chuvas. Os agricultores de terras dridas frequentemente sao pessimistas, entretanto ‘tém suficiente confianga em sua sorte para continuar tentando, Eles dizem, “E boa sorte quando acertamos e mé sorte quando no acertamos” ou “Estamos apostando nosso trabalho, nossa semente ¢ nosso combustivel na esperanga de conseguir alguma Poisogens do medo nals resignados. Acreditam na sorte absoluta, sorte gue gp pode enganar ~ sea lo que sea (0 que tiver que ser, ser4). 9/6 fatalismo. Ser fatalista é ver 0 mundo natural como o iVAvel ou tio arbitrétio ¢ poderoso no seu career ina humans equentemente acaba em fracas ‘As pessoas cansadas ¢ amedrontadas, o fatalismo oferect olacio de uma paz letgica. a "Por outro lado, a violénciaimpulsionada pelo medo é ur yposta humana comum a escassez de alimentos e as fomes ai x razoavelmente fo catastréficas, Visto que a raiva nao pode ser ce ida coniraanatrea tem sido righ conte sees 35 tais como funcionarios desumanos ou irresponsves, co: rciantes que se aproveitam da adversidade e compass . yam por suprimentos de comida que de- softimento que Iutavam por supti " ; areciam pouco a pouco. Na China, durante a dinastia Tang = (618-907 d.C,), por exemplo, os desastres naturais atuaram “em 22 de um total registrado de 39 “revoltas agrérias meno . é & um levante empreendido "(Uma revolea agraria menor € um 1 snore sem oapoie de um ide poltco-itar ou de fia ideologiaartculada) No Ta Chit T'ang Chien, uma histé- A em 1084, i como os seguintes esto re- ra escri © gistrados: ev vee 62, less is com aes com sr dara Cw be de sg Te nm sl resin Hes earns ros ata en chow no cumin sua promets.. Un inundeo eo setembro de 81] no Hu-nan ocidental, Os funciond- ieee camponeses a reparar a barragem.,O8 vee poneses ree mecaram uma revolta qué durou varios dias. enchusetis! Harvard Un! $31 VOGT EZ, Modern Homestoaders. Cambridge, Massachusetts! Harve versity Pres, 1985, p.90-1 Yisfy Toon e 10 corrupto e e ies 0 do povo podiam bem eclodir ia O resultado era um mundo in: il ea wundo inseguro do qual ameagavam desaparecer todas as harmonias as da natureza Raiva e alarme ainda significam vida. Perto do final, a me: | ida que a fome continua, essas sensagées transformam-se em ‘um desespero indiferente, Uma paisagem de homens agonizan- tes, mulheres e criangas com ener chorar pode ter originado sentime transeuntes, mas néo sabemos o que sentiam as pro ‘mas; o registro é mudo. 32 POON, K. A Histortel Geographical Agrarian Ricts, Tese inédita de M. A., Univers 57-65, ly of Natural 7 Medo no mundo medieval ‘Uma natureza externa que parecia todo-poderosa e dificil le prever era uma das principais causas de inseguranga humana izagoes arcaicas € ~ nas sociedades tribais e tradicionais. Outra era e é a natureza ‘humana, sua inconstancia, seu potencial para a violencia e cru dade, Jé mencionamos os frequentes esforcos rudes dos adultos para domesticar a natureza infantil. Nos capitulos seguintes, ‘examinaremos 0 medo do mal e do caos nos individuos e gru- pos humanos. Assim, as forcas que ameagam a humanidade de dentro e de fora podem ser exploradas uma a uma, No entanto, thé necessidade de se observar como todas elas parecem se as- semelhar e até se fundir em uma cultura pr6} der a esta necessidade, deveremos explorar a Europa medieval, ‘Uma boa razao para selecionar a Europa é, naturalmente; 0 St papel histérico na geragéo de crengas ¢ atitudes da ‘dade sos ¢ veeméncias, tem suas rafzes no pagsado, Quaig foram os ‘medos supersticiosos que prevaleceram no pasado?

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