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i ~od “pin 7 FUNDAGAO EDITORA DA UNESP Teva ole tixderica T Presidente do ConthoCuradr ay? Roms thig wl Actonio Manoel dos Sates silva Dror Pride Jou aso Magus Neo Assessor Editorial Terry Eagleton Jéso Hermans mf Caine Cn dri ene ‘guia ore Gonpves Alvaro Oscar Campana Anni Celso Wage ann alos Ervany Fn Trust Res Jost ali Rei de Andrade ost Rabe erie Maco Aur Nope MARX ata Sel Pretec rd Taber esate Rosa Maria Feitero Cavalarh E A LIBERDADE Tl. Kava bios Asians asia Apprcta Busscact Masta Dolores Paes Tradugao de Marcos B. de Oliveira Editora NESP asain nse CCopycight © 1997 by Tery Eagleton “Titulo oxiginal em inglés: Marx and Freedom, publicaZo em 1998 pela Phoenix, uma divisto da Orion Publishing Group Lu Copytighe © 1999 da traducio basi Fndagio Editora da UNESP (FEU) Praga da Sé,108 (01001-9000 ~ 530 Paulo - SP Tel: (11) 2327171 Fax: (011) 232-7172 Home page: ww editors. unespbr E-mail feu@editora.nesp.be Dados Incenacionals de Catalogagio na Publicago (C1P) (Clara Brailia do Lito, SP, Basil) Para Steve Regan Eagleton, Tey Marxealibendade /Tery Eagleton aducio de Marcos B. de Oli- ‘vera, ~Sio Paulo: Edtora UNESP, 1999, - (Coleio grandes sofas) ‘Titulo orginal: Marx and Freedom. ISBN 85-7139-263.9 | 1. Mar, Kal, 1818-1883 - Filosofia. 2. Mars, Kal, 1618-1883 - | Pontos de vista sobre a liberdade 3. Marx, Kaz, 1818-1883 ~ Pontor | de vista sabre o trabalho [. Thu. U Séxe Loeame coo. | Indice para eatélogo sstmitico 1. Filisofosalemies: iograia e obra 193 2. Mars, Kal Filosofia ales 193 Esto finds: Suse teat FILOSOFIA Hegel e Aristételes com certeza eram filésufos, unas ei ue sentido Karl Marx também era? Marx escreveu muita coisa que tem um ar de filosofia, mas era também rispida- mente desdenhoso do espitito filoséfico, tendo declarado fem sua famosa 11* tese sobre Feuerbach que “os fildsofos apenas interpretaram o mundo de diferentes maneias, tr ta-se, entretanto, de transformé-10"." Alguém poderia eteu- car que seria dificil transformar um mundo que nao entende- mos, a ndo ser pelo fato de que o proprio Marx seguramente estaria de acordo, Ele no esté empenhado em substiuir {dias por acies irefleridas, mas em moldar ma eepécie ce flosofia pratica que ajuda a transformar aquilo que procura compreender. A mudanga social e a intelectual andam jun- tas:"A filosofia ndo pode se realizar sem a supera¢ao do pro- letariado", diz ele, “eo proletariaco nao pode se superar sem a realizacio da 2 8 segunda tese sobre Feuerbach afirma: 1 Theses on Feuerbach, in: Feuer, LS (Org) Marx and Engels: Basic Wi tings on Poles and Philosophy. London, 1969, p.288 [IA 14 Nore stro das fontes das cages, indiam-se entre colchetes uma eaiez0 {ds obra em portuguéseorespectivo numero da paging. As referEncas ‘omplecas das obras em portugues siolistadas segue A tadugdo das ‘tages eaisida a parte do cexto em inglés que consa da versio triginal do lo, tendo sido feito 0 cotejo com a taduges ji essen tes, ¢,ocisionalmente, com o oiginalalemio (N.T) 2 Kail ars Early Weitings. Harmondsworth, 1975, .257 (FDU 14). To dds as outras cages provenientes deste Volume so dos Exanomic a DPhibsophical Mencripts de 1844, Futura referencias 3 es volume ome EW so dadas entre partnteses apd as ctag5e5. ‘A questio se uma verdade objetiva pode ser atribulda 20 pensamento humano nio ¢reéca, mas prdtica. Ena prtica que ‘© homem deve demonstrar a verdade, ou sea, a realidade e o poder, o cariter terreno de seu pensamento. A disputa sobre a realidade ou irrealidade do pensamento, quando isolada da prética,é uma questdo puramente escolistica* Este tipo especial de teoria orientada para a acto 6 as, veces atsata de “conhecimento emancipador”, ¢ tem al- {guns atributos distintivos. £0 tipo de entendimenco da pré pria situacZo que um grupo ou individuo precisa para mudar tal situaga entendimento. Mas conhecer-se de uma nova maneirasigni- fica alterar-se neste préprio ato; portanto temos aqui uma forma peculiar de cognigdo em que o ato de conhecer altera aquilo a que se rfere. Ao tentar compreender mim ¢& mi ‘tha condigao, nunca posso pecmanecer perfeitamente idén- tico a mim, pois o eu [self] que estérealizando 0 entendi- mento, bem como 0 eu que ¢entendido,si0 agora diferentes do que eram antes. Ese eu quisesse entender tudo isto, exa- tamente © mesmo processo se estabeleceria. E um pouco como tentae pular a prépria sombra, ou erguer-se pelos pré- prios cabelos. E uma vee que tl conhecimento também leva as pessoas a mudar sua condicio na pritica, ele mesmo se transforma num tipo de forca social ou politica, parte da siuacio material que examina, em vez de mera “reflexao" dela ou sobre ela. E conhecimento como um evento histérico em vez de especulagio abstrata, no qual saber que ndo mais se separa claramente de saber como. Além disso, a procura da ‘emancipagdo envolve quest6es de valor, quanto conheci- mento da situacao é matéria de compreensio factual; desta forma, aqui adistingxo usual que a filosofiareconhece entre fatos e valores perde curiosamente a nitidez. Nao se trata 3 Feuer, p283 [va 12}, apenas de que tal tipo de conhecimento pode ser utilizado com proveito, mas de que a motivagdo para 0 entendimento cestd em primeiro lugar ligada a um sentido de valor. A 11* ese sobre Feuerbach no € portanto apenas algum tipo de apelo filistino para que se passe da especulacao abstrata para “mundo real", embora houvesse um laivo deste enérgico antiintelectualismo no jovem Marx. Tal apelo esquece que, para comerar, sem conccites abstratos no haveria mundo real para nés. A ironia do gesto de Marx & que ele faz esta exi- séncia como filésofo, ndo apenas como militante. Pode-se as sim junté-lo a uma respeitavel linhagem de “antifilésofos” ‘que inclui Kierkegaard, Nietzsche, Heidegger, Adorno, Ben- jamin, Witcgenstein, ¢, nos dias de hoje, pensadores como Jacques Derrida e Richard Rorty, para quem hi algo de funda- ‘mentalmente equivocado em todo o empreendimento filosé fico de nossa época. Para estes autores, a prépria filosofia, ‘no apenas este ou aquele t6pico no interior dela, tornou-se uma busca profundamente problentdtica, Eley desejam por- tanto ou transcender o projeto inteiro por motivos que per- ‘manecem filosoficemente inceressantes, ou encontrar alguma forma de remoldé-lo num registro inteiramente novo, um ob jetivo que para muitos destes pensadores significa forjar um novo estilo de escrita tedrica. A maioria se propoe a esvaziar as pretensées metafisicas da filosofia, atacando-a pelos flan- cos com algo aparentemente mais fundamental: ser, 0 po- der, adiferenga, formas préticas de vida, ou, no caso de Marx, “condigdes histéricas". Um antifilésofo deste tipo difere de lum mero opositor da flosofia da ineira que um “anti-romance” come Ulisses dere de um ndo-romance como ‘uma lista celef6nica Por que Marx era to eético em relagZo a filosofia? Um motivo era que ele a via comecando do lugar errado. A Filosofia nao comecava longe o suliciente. A filesofia alema fem moda na sua época - 0 Idealismo - comegava com as idéias, vendo a consciéncia como 0 fundamento da realidade; porés: Mark estava clente de que apenas para que tenhamios tuma ies muta coisa jd deve ter acontecido. O que ja deve ter que comecemos a refleti? Devemos jé estar ‘igados :-2:.camente com 0 mundo que ponderamos e, desta ‘os num conjunto inteiro de relagSes, condi- snstituigdes sociais: 0 de ids, de concepgbes, da conscitncia, de inicio ‘sntrelagada com aatividade mater com ainteracio ‘sta! Zs homens, alinguagem da vida real. O conceber, open =, 5 iteracdo intelectual dos homens aparecem neste estigio ‘or ima emanagio direta de seu comportamento material. O| ‘mesco vale para a producio espiritual expressa a linguagem da politica, das lets, da moralidade, da rligito, da metalisca etc. de lum povo. Os homens sio os produtores de suas concepyses, dias ex. ~ homens reais, atvos, tal camo sio condicionados por um desenvolvimento determinado das foreas produtvas eda in- {eracin eotrespondente a estas, até suas formas mals avangadas, A canscincia nunca pode ser outra coisa sendo existéncia cons- dente, ea existncia do honnetn € seu processa de vida rel” Devemos cbserar que embora Marx quia flando eps logement, lia esteamente aconscencia eo mando metal hum set peer ue eda cl, como vemos, somos mais humanose me coms utes animals quand produzimos live, rata « ndependencemente de qualquer necessidade matt! ime iat A lberdade para Mats € uma especie de soperabundin. eva acima do que € materalmentessencia agua que aleapass a medida ese toma seu prop patie. Arve au, para tudo isto aconecer na sovedae,cetas cones materi sioneessras: de tl orma qu opeepio“eeesso" de consciecia cima da natureza que Marx onsiera a marca 4 Karl Marc, The Geman ielogy, organinasio e intradugio de C.J ‘Anthut, andon, 1974, p.a7 [a 367), Putoras eects seat vou ‘econ Gl so dads ene parénteses apse a cages, to distintiva de nossa humanidade é ele proprio um estado de coisas materialmente condicionado. O lugar onde a conscién~ ciae a pratica social convergem mais obviamente para Marx éa propria linguagem: ‘A linguagem & 0 antiga quantoaconsciéncia;alinguagem é2 conscigncia pritiea, real, que existe igualmente para outros homens, e apenas assim existe para mim também; a linguagem, como a conscieneia, somente emerge a partic da caréncia, da necessidade de interagdo com outros homens. (C1 51) (1A 43] ‘Mas se a linguagem surge a partir da necessidade, como ‘uma dimensao necessiria do trabalho coletivo, ela nao per- smanece atrelada a esta necessidade, como testemunha o fe- némeno conhecido como literatura. Quando se trata nlo apenas de “consciéncia”, mas do tipo sistemitico de reflexdo conhecido como filosofia, entio hé claramente necessidade de especialistas, academias ¢ um {grande numero de instituicoes afins, todas elas podendo, ex: filtima andlise, ser sustentadas apenas por trabalho alheio, Este € um aspecto do que Marx quer dizer com a divisdo entre trabalho intelectual e trabalho manual. Somente quando uma sociedade atingiu certo excedente econdmico acima da neces- sidade material, liberando uma minoria de seus membros das texigencias do trabalho produtivo, e concedendo-the o privi- Légio de se tornar politicos em tempo integral, académicos, produtores culturais, e assim por diante, somente entio a filosofia pode surgir e florescer no sentido mais completo. ‘Agora o pensamenco pode coueyat a ter fantasias de que & independente ds realidade material, simplesmente porque ha tum sentido material em que de fato 0 & [A dvisio do trabalho apenas sedi verdadeiramente a partir do iomento em que aparece a dvisio entre o trabalho intelectual © ‘9 manual. (A primeira forma de idedlogo, a dos sacerdotes, é ontemporines ) Deste momento em diante, a conscitneia pode fealmente alimentar a ilusto de ser algo diverso da consciéncia da Dritica existente, de realmente representar algo sem repretentar algo real; de agora em diant, a consciéncia€ capaz de se eman- par do mundo e dar inicio i formacio da “pura” tori, ceologia, flosofia,étca ec. (C151) [ta 44-5] Para Marx, a cultura na realidade tem apenas um proge- nitor, 0 trabalho ~ o que para ele equivale a dizer, a explo. racio. A cultura da sociedade de classes tende a reprimir esta verdade indese}ivel; pretere criar em sonhos para si propria ‘um progenitor mais nobre, negando sua filiaio inferior ¢ imaginando que surgiu simplesmente da culeura anterior, ou dda imaginacao individual sem peias. Porém Marx se propde a nos lembrar que nosso pensamento, como 05 nossos senti- dos tao fisicos, é ele préprio o produto da histéria com a qual se confronta. A histéria ~ 0 mundo real ~ de alguma ‘maneira sempre escapa 20 pensamento que busca abran- gé-lo, e Marx, que como bom dialético enfatiza a natureza dindmica, aberta e interativa das coisas, detestava aqueles pretensiuses sistemas de pensamento que (como 0 idealts ‘mo hegeliano) acreditavam poder de algumma forma costu- rar 0 mundo todo no interior de seus conceitos. E tene- brosamente irdnico que seu préprio trabalho tenha, entre outras coisas, dado a luz mais tarde exatamente esta estéril construgao de sistema. ‘A questo para Marx é assim a das causas ¢ condigSes ma: teriais do pensamento. Podemos investigar as causas disso ou daquilo, mas serd possivel a este pensamento voltar-se para si préprio, por assim dizer, para apreender algo da pré: pria histéria que o produziu? Talver para nés modernos haja boas razées pelas quais isto ndo possa nunca ser totalmente conseguido, pois ha sempre algum tipo de ponto cego, algu: ‘ma amnésia ou auto-opacidade necessaria que garante que a ‘mente no fim sempre falhard neste empreendimento. O pré- prio Marx, como filho do Iluminismo, era talvez bem mais con- fiante que nés no poder translicido da razio; mas como pensa- dor historicista ~ e estas correntes gémeas, a racionalista e a R historicista, esto feeqdentemente em tensio no seu trabalho ~ reconheceu que se todo pensamento fosse hist6rico, entio isto deveria naturalmentevaler para seu préprio pensamento. NZo poderia ter havido macxismo algum no tempo de Carlos ‘Magno ou Chaucer, uma vez que 0 marxismo é mais do que uum simples conjunto de idéias brilhantes que qualquer ‘pessoa, em qualquer épaca, pudesse ter to. E em vez dis- 20 um fendmeno situado no tempo € no espace, que reco nhece que as préprias categorias em que pensa —o trabalho abstrato, a mercadoria,o individuo com liberdade de movi- mento e assim por diante ~ 6 poderiam ter emergido da he ranga do capitalismo e do liberalism politico. marxismo como um discurso emerge quando é tanto possivel quanto necessério que o fa¢a, na qualidade de “critica imanente” do capitalismo, e assim como um produto da prépria época que ele deseja ultrapassar. © Manifesto comunista€ prodigoem seu louvor 3 grandiosa burguesiarevolucionsria e a magnifica I beragdo de potential lus ww couliecida como capitalismo: A burguesia, onde quer que tena chegado 20 poder, iquidou tora as relagbesfeudas, patrarcas eidlicas. Dilacerou impie: dosamente os variegadosIap0s feudals que prendiam o homem a seus ‘superioresnaturais”, endo delxou subsistir entre homem ¢ homer qualquer otra ligado além do interesse proprionu ecru, cdo impiedoso “pagamento vista”. Afogou nas guas geladas do tilelo egoista 08 mais celestais éxtases do fervor religioso, do tentusiasmo cavalheitesco, do sentimentalismo flistino .. Numa palavta, em lugar da exploracio velada por lusdes religiosasepoli- Ticas,colocou a exploragio aberta, despudorada, deta e brutal [Arrancou da familia seu véu de sentimentalism, e eduzi ala (fo familiar a mera relagio monetiria ... A burguesia nfo pode fxistr sem cevolucionar constantemente os instrumentos de producdo, e consequentemente as rlacBes de preducio, © com estas todas a8 relagdes socials. O revolucionamento constante da producto, » perturbacio ininterrupta de todas as condigées socais, a permanente incereza e agitacdo distinguem a época bburguese de todas as anteriores. Todas a relagdesfixas eeristali. B 2zadas,com seu séquito de antigose venerivels preconcetos e opi nies, siodissolvidas, todas as relagbes novas tornam-se antiqua. das antes de se consolidar. Tudo o que ésbido se desmancha no a, tudo o que é sagrado& profanado, eos homens sio por fim for. ‘ados a confrontar com sobriedade suas reais condides de vida e suas relagdes uns com o$ outros Sio estas energias revolucionérias, 20 mesmo tempo ad. -idveis e devastadoras que, por um lado, estabelecem as ba ses materiais para o socialism e, por outto, frustram sempre tal projeto. O capitalismo varre todas as formas tradicionais, de opressio, e ao fazer isto coloca a humanidade face a face com a realidade brutal que o socialismo deve entio reconhe- cer e transformar, Apreender o préprio pensamento como enraizado nas réprias condigGes materiais que ele procura examinar é ser lum filésofo materialista, uma expressio que evoca mais que ‘uma sugestdo de paradoxo. A tarefa do pensamento materia lista € incluir em seus cilculos esta realidade - 0 mundo ma- terial - que é externa ao préprio pensamento e que é, em cer- to sentido, mais fundamental que ele. [sto é 0 que Marx quer dizer ao alegar que, na histéria da espécie humana, 0 “ser s0- cial” determina a consciéncia,e nfo vice-versa, como querem 0s Idealistas: ‘A moralidade, a religito, a metafsia, todo o resto daideoto Bia € suas correspondentes formas de consciéncia perdem assim sua aparéncia de autonomia.Elas no t8m historia, nem dese volvimento; potém o2 homens, desenvolveinky sua aoalyau ei teragdo materiais, alteram junto com isso sua existéncia real, seu pensamento ¢ os produtos dele. A vids no € determinada pela ‘onsciéncia, mas a conscigncia pela vida, (G1 42) 1A 37] 5 The Communist Manifest, em sarc and Engel: Selected Works. London, 1968, p38 (4367-8). Fucuas referencias este volume como SW sio dadas entre parntesesapds a8 cas, 4 is aqui entéo a bem-conhecida inversio marxista de Hegel, cujadialética de ponta-cabega, em que as idéias deter rminam a existéncia social, precisa ser assentada firmemente em seus pés materialistas. Para Marx, 0 que dizemos ou pen: samos & em tiltima andlise determinado por aquilo que faze- ‘mos. Sio priticas histéricas que se encontram no fundo de :nossos jogos de linguagem. Mas um pouco de cautela é neces afrio aqui. Poia o que fazemos enquanto seres histéricos & sem dtvida profundamente ligado com 0 pensamento e a lin {guagem; n3o ha pratica humana fora do dominio do sig- nificado, da intengao e da imaginacio, como 0 préprio Marx (© animal éimediatamente um com sua atividade vital. Nao se dlistingue dela. Ele € sua atividade vital. © homem torna sua propria atividade vital objeto de sua vontade e sua consciencia Ele tem atividade vital consciente. Esta nfo é uma determinacio com a qual ele se amalgama dicetamente. (EW 328) [H 156] [Uma aranhsa realiea operayoes seuelhautes as de um tecelo, ‘uma abelha envergonha muitos arquitetos na construcio de sua colméla, Mas 0 que distingue opiotarquiteto da melhor abelha € f fato de que o arquiteto constréi sua estrucura na imaginagio antes de erigi-ta na realidade * (0 ser social dé origem ao pensamento, mas ele mesmo & ‘envolvido pelo pensamento. Mesmo assim, Marx sustenta ser aquele mais fundamencal assim como sustenta que a“base” dda sociedade dé origem & sua “superestrutura” cultural, juti= dica, politica e ideol6gica [Na produgdo social de sva existencia, os homens ensram em relacBes determinadas, indispensivels ¢ independentes de sua Wontade, elagdes de produgio que correspondem a um estagio 6 A segunda pate desta ctagio & de Karl Macy, Capital. New York, 1967, Sasbu178 [er 143], Buturas referdncias a ese volume como Cs8o dx {as ene parentess aps as ctagoes Is decerminado de desenvolvimento de suas foreas produtivas materais. A totalidade destas relagdes de produgdo consttui a cstrutura econdmica dz sociedade, a base rea, sobre a qual se fergue uma superestrutura legal e politica e 8 qual crrespondem formas determinadas de conscigncia social. O modo de producto 4a vida material condiciona o processo de vida socal, politico e intelectual em geral. Nao & a consciéncia do homer que deter- ‘mina seu ser, porém, 20 contro, & seu ser socal que determina sa consriéncia. (Preficio de A Contibtion tothe Critique of Polit cal Economy, SW 182) (1233) Temos aqui entio a celebrada “teoria econdmica da histé- ria" de Marx. Suas alegacées sobre as prioridades do ser social ‘eda consciéncia sfo ontoldgicas, referentes a0 que el julga se- ‘fem os homens. E bem possivel que a doutrina da base/supe- restrutura seja isto: ela sustenta que todas as formas sociais ¢ politicas, ¢ todas as principais mudancas histéricas, sio em Gltima anilise determinadas por conflitos no interior da pro- dusio material. Mas pode também ser vista mais historica mente, como descrevendo 2 maneira em que a politica, 0 diteito, a ideologia e assim por diante operam nas sociedades de classe. Marx quer dizer que, em tais ordens sociais, preci- samente porque a “base” das relagbes socias € injustae con- tradit6ri, tais form: esconder esta injustica, e assim podem ser consideradas, nes- te sentido, secundiérias ou superestruturais em relacao a elas. Pode entéo haver uma implicagdo de que se as relag6es sociais fossem justas, ta superestrutura seria desnecessétia, Trata-se aqui, em outras palavras, da funcio politica das idé dade, mio apenas de sua origem material. E isto nos leva a0 conceito marxista de ideologia As i 8 da classe dominante sfo em cada época as iddlas ddominantes, isto &, a classe que constitu a forga material dom rnamte da sociedade & a0 mesmo tempo, sua forga intelectual ominante. A classe que dispse dos meios da producSo material detém a0 mesmo tempo o controle sobre os meioe de produc cspiritual, de tal modo que, em geral, a idéias daqueles que carecem dos meios da produgdo espritual fleam sujeitas 2 esta classe. As idéias dominantes sao nada mais que a expressio ideal clas relagies materiais dominantes, sig as relagdes materiais ‘dominantes concebidas como idéias.. 6 64) (1A72] Quando a filosofia se torna ideologia, tende a desviar a atengéo dos homens ¢ mulheres dos contlitos hist6ricos in. sistindo no primado do espiritual, ou oferecendo uma reso- lugao destes contlitos num plano mats alto, imagindrlo. £ por isso que Marx censura os hegetianos. Sua visio da histéria, ‘em contraste, epende de nossa capacidade de expor 0 processo real de produ- ‘40, comesando pela preducio material da pr6pria vida, edecom= preender a forma de interaptoligada a ¢criada por, este modo de prodcio (isto &, a sociedade civil em seus varios estégios) como base de toda a hstéra;e de mostréJa em sua as30 como Estado, de explicat todas as diversas formas teicase produtos da cons- ‘itis religdo, lofi, ica ec etc tracar sua origem edesen- voluimento a pari desta base; e por meio dist, evidenenene, coisa em sua totalidade pode ser representada (e, portant, tam ’bém aacio reciproca destesvirios elementos uns sobre os outros). (aise) (5) Diferente do pensamento Idealista, tal concepsio materi lista “permanece sempre no fundamento real da histéria” [Eta] nfo expicaaprtica a partir dada, mas formagio das {déias a partir da pritica material; e, em conseqiéncia, chega & conclusio de que todas as formas e produtos da consciéncia nfo podem ser dissolvidos pela critica spiritual, yea dissolugio cm utoconsciéncia® ou tansformacso em "aparies", “espectos", antasias” ete, mas apenas pela derrubada pritica das rlagBes sociais reais que deram origem a esta mistificagio idealista (6158) [14 56} [A afirmagio de Marx € que se os problemas teéricos cruciais estio ancorados em contradigdes sociai, entao s6 podem set resolvidos politicamente, em vez de filosoficamente. Um certo " estilo de flosofar di origem assim a certo “descentramento” da propria filosofia. Como muitos anciilésofos, Marx tenta deslocar todo o terreno em que o discurso esté assentado, apreendendo os enigmas filoséficos tanto como sintomiticos de um subtexto histérico real, quanto como uma maneira de langar este subtexto fora do campo de visio. Por mais que af losofia goste de sonar que se produz a si mesma, ela deve confrontar se com aue dependéucia daguilo que a transcen- de, A abordagem materialista ‘mostra que a histéria no termina aa ser dissolvida em "auto- ‘onscitncia® como o "esprito do espirito”, mas queem calaesté sio encontra-e umm resultado material: uma soma de foras Pro ddutivas, uma relagdo historicamente criada de individuos com a nnatureza e entre si, a qual & tansmitida para cada geragdo pela precedente; uma massa de forcas produtivas, de capitals e con- digSes que, por um lado, & na verdade modificada pela nova sgeragio, mas também, por outro lado, prescreve a ela suas con AlgSee de vida ¢ Ihe dd um desenvolvimente determinado, un carter especial, Ela demonstra que a5 circunstincias fazem os homens tanto quanto.os homens fazem as crcunstincas. (G1 58) Uas6) A humanidade, portanto, nfo 6 apenas o pro corm nado de suas condigdes materiais; se fosse, como poderia Marx ter esperanga de que ela pudesse algum dia transformé- las? Ele n3o & um materialista “mecinico", como, digamos, ‘Thomas Hobbes, que vé a consciéneia como mero reflexo das ircunstancias, mas um materialista histrico no sentido de que deseja explicar a origem, o cariter e a funcio das ideias ‘em termos das condigGes hist6ricas nas quais estio inseridas. Ble parece ter esquecido, entretanto, que nem toda filo- sofia é necessariamente Idealista. Seu préprio pensamento do 0 é, nem o dos grandes materialistas burgueses do Hlumi- nismo francés com os quais tanto aprendeu. Também a ideo- logia, na verdade, nem sempre é “Idealista. Mesmo assim, a concepgao de Marx da filosofia Idealista 6 original: ele a v8 te como uma forma de fantasia, que se esforga para atingir na ‘mente aquilo que nfo pode ainda ser conseguido na realidade hiistérica. E, neste sentido, a resolucio das contradigdes his t6ricas significaria a morte da especulacao filoséfica. Mas isto também é verdade em relagio a0 proprio pensamento de Marx. Nao haveria lugar para a filosofia marxista numa sO ciedade verdadeiramente comunista, uma vez que tal teoria existe unicamente para ajudar a par em existancia ral socie> dade, Na verdade, em seu registro antiutépico, 0 trabalho de Marx tem surpreendentemente pouco adizer sobre como ef: tivamente seria 0 futuro estado de coisas, Seu pensamento, como toda teoria politica radical, € portanto no fim auto- climinante. E este é talvez o sentido mais profundo em que € histérico. i tt ANTROPOLOGIA, © pensamento (pés)moderno tende a sex autifundacion nista, suspeitando que qualquer fundamento objetivo para nossa existéncia seja alguma ficg4o arbitréria de nossa pré: pria autoria. Marx, em contraste, & um pensacior mais clissico ou tradicional, para quem o fundamento de nosso ser é aquela forma compartilhada de natureza material que ele denomina “ser genérico". Como a expresso “natureza humana’, este conceito paira ambiguamente entre a descricao e a prescrigo, entze fatoe valor, entre uma explicagdo de como somos e como devemos ser. Somos animals naturalmence sociais, depen- dentes une los nstros para nossa prépria sabrevivincia, con tudo isto deve se rornar um valor politico além de um fato an- ‘tropol6gico. Como um pensador hiscoricista, Marx propoe-se a resgatar as instituigdes humanas da falsa eternidade que pensamento metafisico lhe atribuiu; 0 que foi historicamente criado pode sempre sez bi é também, um tanto paradoxalmente, um tipo de essencialis: ta aristotélico, sustentando que existe uma natureza ou es séncia humana e que a sociedade justa seria aquela em que tal natureza pode se realizar. Como entio ele resolve esta apa- rente discrepancia em seu pensamento? Ele o faz, como Hegel jf o fizera, vendo a mudanga, 0 de- senvolvimento, como a esséncia da humanidade. Faz parte de nossa natureza realizarmos nossos poderes: porém de que es ppécie de poderes se trata e em que condigdes 0s realizamos, ¢ luma questio historicamente especifica. Pata o jovem Marx dos Manuscritosecondmico-filsifcos, somos hurmanos na medida fem que compartilhamos um tipo especifico de “ser genérico ‘com nossos semelhantes: 2 ‘esti humana da nates existe apenas para homem Soc pois, apenas nescecaz, a atureza exe aa cle como un vinculo com outros homens, como sua exit par os outros ¢ a existecia dos outros para ele, como elemento vital da elidade humana: pena asim esta exec eit come a desu pe pectin Stents extant oe exists mara, ea nate tora parle oem, Ae dae é porno pena unidade essen comer com nate ter, averdadeia essa darurern onsale etina 4 do omen humans reliada du natueet Aca de tuo neces evar uma ve mas ener sofa” como uma aba ana econ indo, Ondo €or sea Sua expresso vital ~ mena quando no spate ma oes direra de ua expressto clea, concdida em ating com outros homens € porno ura cxpesio econo ie ‘ec A vida individual a vide gentricn do omem no sto doas ‘eis dina. (20 98) (P15) Este ser genérico tem alguma finalidade ou meta? Marx tim pensdor teleolégico? Nui sentido sim, em outro nia, Pols afinalidade de nosso ser genérico, numa espécie de tau. tologia cratva, consiste simplesmente em realizar-se. Para Mars, assim como para outros rominticosraicais, no existe sem devera existir uma rzdo lima para aexisténcia uma. na além de seu desenvolvimento por sis prazeroso, Qanio tralia communists se reénem, seu abeivo imino 2 insta propaganda ce Ma o'mesmo tempo tle passa ster uma nova esata neces dese Salo ~ eo qu puresa como um meio tomas mi, Ete Asenavimento prc pode ser cheat a mane mals surprendente nas eunier dos nablhaores cls fon, cess. Fama, comer, bere, diam de ser eos dct ‘Ses eneas pessoas, A compan, vaso seomere soe Por suaver tema scedae como objet et que bat ars fs A ateraiadedohomem nto umattasevaia umes lade, nobreza do homer bia em es semble dear. tados pel ao. (2 965) (9271 2 ro Esta nogo roméntica de uma natureza cujo autodesen volvimento é um fim em si mesmo estS em oposicio a duas coutras poderosas formas de pensamento da época de Marx. A primeira é 0 tipo de raciocinio metafisico que convocaria a atividade humana para se explicar diante de algum tribunal superior: do dever, da moral, das sangSes religiosas ou da idéia Absoluta. Marx é profundamente hostil a tal metafisica, cemhora seja wm moralista profundo por sua propria conta ‘Acontece apenas que para ele a moralidade consiste em ver- ‘dade neste processo de desdobramento de nossos poderes € capacidades critivos, no em alguma lei posta acima dela, ou algum majestoso conjunto de fins plantados além dela, Nao hd necessidade de justificar esta dindmica, no mais do que se precisa justificar um sorriso ou uma cangao; ela pertence sim plesmente & natureza que temos em comum. Mas esta ética também se encontra em conflito com @ forma de razio instrumental para a qual os individuos existe fem virtude de alguma finalidade maior: 0 estado politico, por ‘exemplo, ou ~ como no pensamento utilitério dominante na época de Marx ~ a promogao da felicidade universal. Este ra- ‘ciocinio de meios e fins €« forma de racionalidade que Marx. acredita predominar nas sociedades de classe, nas quais as ‘energias da maioria sfo instrumentos para o iucro de poucos, Na sociedade capitalsca, co trabalho, a atvidade vital, propria vida produtiva aparece 20 hhomem apenas como um meio para a satisfagao de uma necessi dade, a necessidade de preservar a existencia fisica. Mas a vida produtwa € vida do gener. £ vida produtora de vida. Todo ‘ardter de uma espécie, seu carter genéric, reside na natureza tte sua atvidade vital ea atividade livre consciente constitu ocx titer genérico do homer. [No eapitalismol, a propria vide apa- fece apenas como um mio de vid. (EW 328) (H 156} Na sociedade de classe, 0 individuo é forgado a converter © que é menos funcional em si- seu ser genético auto-realizador~ ‘em mera ferramenta da sobrevivéncia material 2B [Nilo que Marx, é claro, epudie completamente esta razdo instrumental. Sem ela, ndo poderia haver aco racional algu- ‘ma; e sua prépria politica revoluciondria envolve o ajuste de ‘meios a fins. Mas uma das muitasironias de seu pensamento € que isto esté a servigo da construgéo de uma sociedade em que os homens e mulheres seriam livres para florescer como fins radicais em si mesmos. E apenas porque valorizao indivi duo do profiundamente que Marx rajita uma ordem social ‘que, enquanto apregoa o valor do individualismo em teoria, ra pratica reduz homens e mulheres a unidades anonima- ‘mente intercambiveis Diante de um pedido para caracterizar a ética de Marx, nada plor do que a chamar de “estética". Pols esta € tradicionalmen- tea forma de pritica humana que nio requer justificacio utili- ‘ria alguma, mas que prové suas préprias metas, fundamen- tos erazées. £ um exercicio de energia auto-realizadora como tum fim em si mesmo; ¢ o socialismo para Marx é simples- mente © movimento pritico para estabelecer in estado de coisas em que algo semelhante a isto estaria disponivel para tantos individuos quanto possivel. Onde estiver a arte, li es- tard ahumanidade. Por isso ele almeja uma sociedade em que © trabalho seria tanto quanto possivel automatizado, de tal forma que homens e mulheres (capitalistas bem como traba- Thadores) no mais seriam reduzidos a meras ferramentas de produgio, sendo em ver disso livres para desenvolver suas personalidades de maneira mais harmoniosa. O socialismo para ele depende crucialmente do encurtamento da jornada de trabalho, para permitir que este flowescineuta geral se tor ne disponivel: A liberdade neste campo [do trabalho] s6 pole consist em 0 hhomem socializado, es produtores associados regularem racio- nalmente seu intercambio com a natureza; ¢ conseguindo isto ‘om o minimo dispendio de energiae sob as condiges mais favo ives ae dignas de, sua natreza humana. Mas rata-se ainda do dominio da necessidade. Além dele comega aquele desenvolvi- 24 a enter tte mento da energia humana que é um fim em si mesmo, 0 verda deiroreinodaliberdade, a qual, entretanto,s6 pode florescer com base neste reino da necessidade. A diminuigio da jornada de a- balho € seu pré-requisico bisico. (C V3 85) (C3 273] (Qutra maneira de expressar tal idéia consiste em dizer que Marx almeja libertar 0 “valor de uso” dos seres humanos de seu aprisionamento ao “valor de troca”. Um objeto é para ele algo sensivel que deveriamos usar e usuftulr por suas qualld- des especifcas; isto 6 0 que ele quer dizer com o “valor de uso”, Sob condig&es capitalistas, entretanto, os objetos sio redu: dos a mercadorias: eles existem meramente em fungiode seu valor de troca, de serem comprados e vendidos. E quanto a isto, quaisquer duas mercadorias do mesmo valor s40 reduzi- das a uma igualdade abstrata entre elas. Suas qualidades sen- siveis especificas sfo assim deleteriamente ignoradas, a me- dida que a diferenga é dominada pela identidade, Mas isto vale igualmente para os seres humanos sob 0 ‘mesmo sistema social. Sob condicoes de mercado, os indivt- duos se confroncam enquanto entidades abstratas, intercam- bidveis; os trabalhadores tornam-se mercadorias, vendendo sua forca de trabalho para quem paga mais; e ao capitalista rnio importa o que produz desde que seja lucrativo. O que vale para o dominio econdmico é também verdadeiro para a arena politica: ¢ Estado burgués considera seus cidadios abs tratamente iguais quando se trata, digamos, da cabine de vo: tagio, mas apenas de maneira tal que suprime e esconde suas desigualdades sociais especificas. © objetivo da democracia socialista€ sanar esta issuta entre a forms politica ¢ 0 contes do. social, de tal forma que nossa presenga dentro do Estado politico, como cidadios participantes, seria nossa presenga como individuos reais: Somente quando o homem real, individual resume em si 0 idadio abstrato, ¢enquanto homem individual tiver se tornado tum ser genérico em sua vida empirca, em seu trabalho individual teem suas relagbes individuals, somente quando @ homem ter 25 reconhecido © organizado suas forgas proprias como forsas so eiais, de tal modo que a forga social ndo mais se separe dele na forma de forga politica, somenteentio.aemancipacio humanaes. tard completa. (EW 234) (5 198] Assim como Marx almeja abolir a roca de mercadoria na esfera econdmica, de tal modo que a produgao se torne pro- ‘agonismo as cidade, Aestrutra hier nui da propiedad da sera ea vassalgem armada associa a ela eram &nobre=apo- der sobre os servos. Ta organiza (eudal ea, ato quanto & pYopriedadecomunalaniga uma associ contra ua dasse Produtora subjugada,porém a forma de associa ea relagio om os prdtores divtoseram diferentes gragas ierenga nas condiges de produio. 145) (UA 34) ‘Ao lado das propriedade feudais rurais surgiram as guildas ‘mercantis nae cidades, com produgo em pequena cscala ces: cassa divisio de trabalho. Mas as reformas sociais do feuda- lismo, com seu sistema de guildas restrito, acaba tolhendo desenvolvimento da burguesia emergente nas cidades, a qual finalmente rompe estas restrig6es numa revolugio politica ¢ fibera as torgas de produgio numa escala épica. Mais tarde, contudo, como classe industrial capitalista plenamente for- ‘mada, esta mesma burguesia se revela incapaz de continuar a desenvolver tais forgas sem gerar desigualdades extremas, depresses econémicas, desemprego, escassez artificial e a desteuigio do capital. Ela entSo prepara o terreno para oun r6pria superardo pela classe operdria, cujatarefa é conquis- tar o controle dos meios de produsao e operi-los no interesse de todos: To logo este processo [a ascensfo do capitalism) decompse sufcientementeavelha sociedad de alto a balxo, ta logo os taba. Thadores sio convertdos em proleciros, e seus meios de trabalho fem capital; to logo 6 modo de producto capitalista se sustenta 38 sobre seus préprios pés, toma nova forma a sacializagio ulterior do trabalho e a transformacio ulterior da terrae outros meios de produgio em meios de produgio sociatmente explorados, ¢, por tanto, coletiva, bem como a expropriacto ulterior da proprieda- e privada. 0 quedeve agora ser expropriadojénio 0 trabalhador AautSnomo, mas. capitalista que explora muitos wabalhadores. Tal ‘exptopriagdo sed por efito das leis imanentes da prépria prod ‘fo capitalsta, pela centralizagao do capital. Cada capitalista mata muitos outros, (Historical Tendency of Capitalist Accummu Tation, sw 236) [C233] 0 capitalismo, em outras palavras, prepara o caminho de sua prépria negacio, socializando o trabalho e centralizando o capital Paralelamente a esta centalizagdo, ou esta expropriagso de muitos eapitalistas por poucos, desenvolve-se, em escala sempre crescente, a forma cooperativa do processo de trabalho, a apli- ‘acho téniea conseiente da ciénca,o eultivo met6dico do solo, a rraneformacia dos instruments de trabalho em instrumentos de trabalho utilsiveis apenas coletvamente, 0 processo de tornar ‘ais econémicos todos os melos de producto através de seu uso, ‘como meios de producio do trabalho socal combinado,oentrela: ‘amento de todos os povos na rede do mereado mundial e, com ito, o cariter internacional do regime capitaista. bidem, SW 236) {ci 293), E ocapitaismo, portanto, que fz existir seu proprio anta- gonista coletivo- 08 trabalhadores~ dando luz, numaironia sardonica, a seus préprios coveirs: ‘Ao lado da diminuizao constante do nimero de magnatas €o capital, que usurpam e monopolizam todas as vantagens deste pro- cess0 de transformagio, cesce a extensfo da miséria da optessio, da servidto, da dopradacio, da exploragio; mas com isto cresce também a revoltada classe trabalhadora, cada vez mais numerosa te disciplinads, unida, organizada pel préprio mecanismo do pro- cesso de produgio capitalista, O' monopélio do capital tora-se lum entrave sobre o modo de produc, que surgiu €floresceu 39 junto com esob ele. A centralizagia dos meios de producio ea so Galizagdo do trabalho atingem finalmente um ponto em que se ‘tomnam incompativeis com sew invélucro capitalist. O inv6lucro se rompe. Soa o dobre de finados da propriedade privada capita lista. Os expropriadoressio expropriados.(Ibidem, SW 237) (C1 293.4) Descrito desta forma, todo o processo da revolugao proleti- 1a soa inverossimilmente augomético. Nesta vers4u do psa ‘mento de Marx, as classes dominantes ascendem e decaem de acordo com sua capacidade de desenvolver as forcas produti- vas, e cada modo de produgéo - © comunismo primitivo, aes cravidio, 0 feudalismo, o capitalism ~ passa por uma mtacso ‘ransformando-se em outro em virtude de sua prépria légica imanente, Temos aqui uma espécie de versio historicizada da antropologia de Marx: 0 positivo é 0 desenvolvimento huma- ‘no, € 0 negative é qualquer coisa que atrapalhe este processo, Mas nio € claro como se possa compatibilizar este modelo com as partes da obra de Marx que cugerem que 0 que tral ndo so as forgas, mas as relapbes de producdo, pois as classes dominantes desenvolvem as forcas de produgao em seu proprio interesse e suas préprias finalidades de explora ‘gio. Uma vez que isto causa privagSes nas classes subordina das, a revolugio politica neste modelo se da diretamente por meio da luta de classes, nao por causa de algum impulso geral ‘trans-historico de libertar as forgas produtivas de seus cons- ‘trangimentos sociais. Fo confito de classe que constitui a di- mica da histéria, mas um conflito enraizado no processo de producio material, ‘Marx nacuralmente concentra sua atengio, e no apenas em sua obra mais importante, O capital, no mado de producto de sua época. Neste sistema, o trabalhador, que no possui nada além de sua capacidade de trabalho (ou forca de traba- tho), é forgado a vender tal capacidade ao proprietério de ca- pital, que entio o emprega para seu préprio lucto, Os seres hhumanos em si mesmos sio convertidos em mercadorias subs- ‘ituiveis no mercado, © capitalista paga pelo aluguel da forca 40 de trabalho do operirio nesta troca de mercadorias que conhe: ‘cemos como salirio - sendo este 0 custo do que o operirione: cessita para “teproduzir” sua forca de trabalho, isto é os bens necessrios para ele se manter vivo e trabalhando. Mas a forga de trabalho, uma vez que no € um objeto fixo, mas uma for- ‘ma de energia e potencial humanos, é um tipo de mercadoria patticularmence sem limites e determinagSes; e a0 pé-la em ‘gdo,o capitalista é capaz de extraic dele mais valor, sob a for~ ma de bens produzidos ¢ vendidos, que o necessério para pa- {aro trabalhador. Este processo, que Marx denomina aextra- fo de “mais-valia” da classe opersria, ¢ a chave da natureza cexploradora das relagbes sociais capitalistas; porém dado que 4 troca de salério por trabalho aparenta ser equitativa, esta cexploracio é necessariamente ocultada pelo préprio funcio- ‘namento rotineito do sistema. (O sistema capitalsta,entretanto, é um sistema competitivo, ‘em que cada empresério precisa se esforcar para expandir seu capital, ov entio perceer. Um resultado disto, na concepefo de Marx, uma tendéncia da taxa de lucro cai, levando is famige- radas recesses que tém caracterizado o sistema até agora. As contradigées do sistema desta forma se agucam, ¢ 20 lado de- las a propria luta de classes, uma vez que interessa a0 capital apropriar-se tanto quanto possivel dos fruiws do abate dos ‘operitios sob a forma de lucros, ¢ aos operirios recuperar tan {to quanto possivel os proventos de seu trabalho. Para Marx, a Linica resolugéo final deste impasse & a revolusio socialist, nna qual a classe operdria expropria o préprio capital, assume ‘o controle coletive sabre ele, ea colaca a servica das necessi= ddades de todos em vez do beneficio de poucos. (© marxismo nao é uma forma de moralismo, que denuncia (0s capitalists como vilbes e idealiza os opersrios. Sua meta é ‘em vez disso uma teoria “cienifica” da mudanga histérica, na «qual nenhuma classe dominante pode ser considerada inequ ‘vocamente positiva ou negativa, Numa interpretacéo, uma classe é “progressista” se ainda é capaz de desenvolver as for- «as de producio ~ 0 que pode significar que a escravidio era | «em sua época um modo progressista Isto ofende claramente nosso sentido de justiga; porém o préprio Marx parece algu- mas vezes ter considerado conceitos como 0 de justica como ‘mera ideologia burguesa mascarando a exploracao, ainda que sua obra fosseironicamente alimentada por um desejo ap xonado de uma sociedace justa. A burguesia pode ser hoje um obstéculo a liberdade, a justica e ao bem-estar universal; ‘mas em seu apogeu era uma forga cevolucionsria que dereo tou seus adversérios feudais, legou a seus sucessores social tas as idéias de justicae liberdade e desenvolveu as forgas de producio até 0 ponto em que o préprio socialismo pode se ‘ornar um projeto vidvel. Pois, sem a riqueza material e esp ritual que 0 capitalismo desenvolveu, o socialismo néo seria possivel. Um socialismo que precisa desenvolver as forcas de Producto partir do zero, sem o beneficio de uma classe capi- Calista que tenha realizado esta tarefa em seu lugar, tende a acabar como a forma autoritéria de poder estatal conhecida como stalinismo. E um socialismo que nao herda da burzue ia rico legado dos direitos liberais e das insttuigGes civicas simplesmente reforgard esta autocracia. A burguesia pode ter feito 0 que fez pelo menos louvavel dos motivos, o do lucro individual; porém em conjunto este demonstrou ser um meio otavelmente eficaz de levar as forcas de producio até 0 pon to em que, com sua reorganizacao socialista, elas poderiam fomnecer of recisos para eliminar po ‘i paraclimiara pobreza ea privagio em todo o mundo. rs pus ‘Mas as conquistas da burguesia revoluciondria nao foram apenas materials. Ao conduziro individuo a novos pincaros de desenvolvimento complexo, também produziu uma riqueza ‘humana da qual o socialismo seria permanentemente devedor. (© marxismo nio trata de excogitar novos e admiraveis ideais para a sociedade, mas sim de perguntar por que os ideais ad mirdveis que ja temos se revelaram escruturalmente incapa- 2es de se realizar para todos. Ele se propde a criar as condigses, ‘nas quais isto possa se tornar possivel; e uma de tais condigées é0 fato de que a burguesia¢ a primeira classe social a2 genvinamente universal, que rompe todas as barreiras paro- Auiais e era o tipo de comunicacéo genuinamente global que pode formar abase de uma comunidade socialista internacional ‘Uma eoriaverdadeiramence dialética da hist6ria das clas ses se esforca entio para apreender seus aspectos emancipa- dores e opressivos conjuntamente, como elementos de uma ‘nica Kogica. Marx resume este ponto de vista numa passs- sem uipicamente eloyitente Nos das de hoje, tudo parece grivido de seu contriri. AS i= quinas, dotadas do maravilhoso poder de abreviar e tornar mais {ecundo o trabalho humano, em vez disso o levam &inanigéo € 20 ‘excesso. As fontes de riqueza que aparecem como novidades, por algum estranho e fatidico encantamento, so transformadas em fortes de privagio. Os tiunfos da arte parecem ser comprados com a perda de cardter, No mesmo ritmo em que a humanidade

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