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CAPITULO 1 Formulagao de um modelo de ajuda profissional A partir da sua formacao e das suas experiéncias profissionais, cada interveniente vai construindo, de uma forma mais ou menos articulada, 0 seu modo singular de estar em relagao com os clientes. Esta forma de fazer estar estrutura-se em torno de algumas varisves, independentes das con- digdes em que a ajuda é dispensada. Uma anélise sistemética das nossas intervengdes, permite constatar que estas sio directamente influenciadas pela nossa personalidade, conhecimentos e habilidades profissionais, pela nossa concepeio de pessoa e satide, pela nossa compreensdo das razdes ¢ prin pos na origem da necessidade de ajuda psicol6gica e ainda, pela nossa re- presentagio do papel daquele que ajuda e do ajudado ¢ ainda, que elas variam segundo o contexto. Em suma, 0 profissional intervém a partir da~ quilo que ele é e orienta-se segundo um modelo de ajuda que lhe serve de referéncia. A definigio das varidveis deste modele modifica-se, de um modo ‘mais ou menos marcado ao longo dos anos, influenciado pelas experiéncias de vida e de trabalho do interveniente, pela aquisicao de novos conhecimen- tos e pela evolucgo do contexto em que ele intervém. Contudo, constatamos que um grande nlimero de intervenientes, vvivenciam dificuldades em nomear e descrever 0 *modelo” que conduz a sua pritica, Essas dificuldades traduzem-se entre outros, pela presenga de con- tradigdes entre os valores que defendem e os comportamentos que adoptam, Uma tal incoeréncia se nio € reconhecida e corrigida, prejudica considera- velmente a qualidade da relagio e consequentemente a eficdcia da interven- fo. O terapeuta e o cliente deparam-se com contradices entre o “estar” € 0 “fazer”, que aumentam a confusio num ea ansiedade no outro. Para além disso este desconhecimento relativamente ao seu proprio modelo de pritica, pode por vezes impelir o terapeuta a intervir de uma forma técnica ou £ CAPITULO 1 automitica, ignorando certas vatidveis presentes na relagdo,correndo 0 risco de privar o cliente de uma intervengao personalizada ¢ adaptada as suas necessidades. Estas observagdes ilustram a importincia de o interveniente conhecer bem ‘© modelo que privilegia e os principios tedricos que sustentam: as suas interven, 008 a fim de as adaptar a0 contexto da sua pritica. E apenas nssta condiglo que cle poderd oferecer uma ajuda verdadeiramente eficaz. Para ald disso, o conhe- cimento do modelo que utiliza pode constituir-se como critério para conduzir ¢ avaliar a pertinéncia das suas intervengdes, nomeadamente quando os resul- tados nao sio evidentes, De facto, ao conhecimento deste modelo de referéncia pessoal estéligada uma parte da sua autonomia profissional, Neste capitulo propomos um modelo geral de relagto de ajuda profis- sional sob o qual o interveniente se pode fundamentar para personalizat ¢ especificar 0 set modo particular de conceber a relagao de ajuda. Determi= nari igualmente o espago que deseja atribuir a este modelo na sua pritica Profissional. Para discernir a dimensio relacional subjacente a0 modelo Proposto, faremos uma breve sintese de alguns postulados da escola de Pensamento humanista que inspirou amplamente a nossa rellexdo sobre a relagao de ajuda profissional. Em seguida, com a ajuda de um esquema, apresentaremos resumidamente os principais constituintes deste modelo ¢ 0 lagos que os tnem, que nos capitulos subsequentes e no segundo volume serdo examinados de um modo mais detalhado. Este modele inspira-se principalmente na corrente de pensamento exis- tencial-humanista adoptada por varios autores que se interessiram pela abor- dagem centrada na pessoa (Meador & Rogers, 1984; Merans & Thorne, 1989; Rogers 1968; Rogers & Kinget, 1969a, 1969b; St.Arnaud, 1983, 1995; ‘Watson, 1979), pela Gestalt terapia (Bouchard, 1990; Delisle 1992, 1998; Ginger 1992; Polster & Polster, 1983; Zinker, 1981), pela corrente interaccionista en enfermagem (Beck, Rawlins & Williams, 1984; King, 19715 Orlando, 1979; Psplau, 1952), por certas estratégias terapéuticas apresenta. das no volume 2 (Aguilera, 1995; Bloch, 1996; Hanus, 1994; O'Honlon & Weiner Davis, 1995; Werman, 1984; Wordon, 1991). A or'ginalidade e 0 interesse do modelo que aqui apresentamos, residem na conjugacdo das idcias estes autores em torno de uma visdo existencial e humanista da relagao de ajuda profissional e da intervengao terapéutica. A descrigao deste modelo estabelece as diferengas e as ligacoes que existem entre a comunicagao cor rente, a relagdo de ajuda profissional, a entrevista e a interven¢ao psicoterapéutica, Através destas clarificagdes os intervenientes podem reco- hecer diferentes estratégias de intervenglo, que sero tanto mais eficazes quanto forem ccnsideradas as necessidades e expectativas do cliente, 0 contexto de intervengao profissional e os objectivos visados. Formulagao de um modelo de ajuda profisional 9 1.1. AS PREMISSAS NA BASE DESTE MODELO wntrariamente a outras escolas do pensamento, a abordagem existencial- fanart nao enol Ut pensador, ela resulta de uma reflexdo colectiva que ainda hoje € produzida. As pessoas que intervem em relagio de ajuda com base nos seus fundamentos, sustentam-se em certas crengas que orientam as suas intervengSes de um modo particular. Neste sentido, o modelo aqui apre- sentado inspira-se mais directamente em trés premissas relativas a pessoa aju- dada, a0 aspecto relacional e ao interveniente que favorece esta relacao, ‘A primeira premissa em que assenta a nossa teoria refere-se a0 cliente. Este poco recuroslatentes que Ihe permitem actualizar de um modo idea todas as suas caracteristicas. A dificuldade ou dificuldades que vive privam-no ou impedem-no temporiria ou permanentemente de os reconhecer, acitar ¢ viver plenamente, Assim, a intervengdo consiste em ajudar o cliente alibertar- -se de certos entraves que o impedem de reconhecer 0 seu modo particular de estar no mundos consiste em acolher 0 cliente de modo a que este se possa desenvolver de acordo com a sua natureza. Em certos casos, 0 papel do interveniente consistiré também em suprir de modo transitério ou perma nente as suas incapacidades. Deste modo, o interveniente ajuda o cliente a conduzir a sua vida de acordo com a sua natureza respeitando a sua tendéncia actualizante. A este propésito Rogers & Kinget (1969, p. 172) escrevern: “Esta rnogao corresponde & proposigao seguinte: Todo organism esté animado de uma tendéncia inata para desenvolver todas as suas potencalidades e para as desen- volver de um modo que favorega a sua conservagao ¢ 0 seu enriquecimento [A segunda premissa refere-se a0 ser humano enquanto ser de relagio. B através da qualidade das relagdes que estabelece com o seu ambiente humano e fisico, que 0 homem percorre 0 seu caminho no sentido da actualizagio ideal dos seus recursos. E necessério considerar as relagdes que estabelece com o ambiente externo, mas também a qualidade das re- lagdes que mantém consigo préprio, uma vez que nestas trocas com 0 ambiente ¢ a totalidade da pessoa que esté envolvida, mesmo que a sua necessidade de ajuda se expresse mais particularmente numa das suas di- mensdes, Neste sentido, como refere Blattner (1981, p.4), “[...] a pessoa deve ser percebida enquanto unidade, relagoes, processos, interacgbes, liberda- de e criatividade’, ¢ nao enquanto partes separadas ¢ isoladas do seu am- biente. Com frequéncia, a necessidade de ajuda de uma pessoa deriva da sua dificuldade em estabelecer relagdes harmoniosas consigo propria € consequentemente com o seu ambiente. Nestas situacbes ela tem dificul- dade em responder as suas necessidades. interveniente; & na expresso Por fim, a terceira premissa refere-se ao int. tes consciente das suas qualidades pessoais e profissionais que se situa @ base de 10. CAPITULO 1 2 cartituto todas as suas intervengdes. Em diversas situaghes de ajuda serdo as suas qualidades humanas que se constituirdo como os principals uten refere Rogers (1968, p.52): s. Coma Quanto mais o cliente vé no trapeuta um ser verdadeto ou autentico, empitico que 0 respeta incondicionalmente, mais ele se distanciaré de lum mad de funcionamento esttico, fixo,insensivel ¢ impessoal ¢ se dirigiré para um funcionamento marcado por uma experiencia fuida, transformadora e plenamente acitante de sentimentos pesoaiscambian” tes. Deste movimento resulta uma evolugdo da personalidade e do com= portamento no sentido da sade e da maturidade psiquica e de relagdes ‘mais relistas consigo com os outros e com o contexto exterior. Em condigoes de exercicio profissional, que considerem a necessidade de ajuda expressa pelo cliente, o interveniente pode manifestar este modo de estar e simultaneamente exercer as fungoes de perito relativamente a0s pro- blemas e as dificuldades vividas pelo cliente, quer estas sejam de ordem fisica ou psiccssocial, Ele pode igualmente manifestar estas atitudes através do seu papel de “facilitador’, ajudando o cliente a aceder mais facilmente aos seus processos internos ¢ a desenvolver uma maior consciéncia de si, de modo a que se torne mais apto na gestio das dificuldades que vive. 1.1.1 Um modelo de tipo desenvolvimentista Apoiados nos enunciados precedentes, vamos descrever os diferentes compo- nentes de um modelo geral de relagio de ajuda profissional, no ambito de uma relagdo entre um interveniente e um cliente que interagem no sentido de, ober uma resposta satisfatéria a um problema, modificar um comporta- mento, gerir un sintoma, desenvolver habilidades de adaptacio ou de auto- controle. O contexto e o ambiente fisico e social de uma tal relagdo podem influenciar 0 seu desenvolvimento, Trata-se de nomeat e descrever as varid- veis presentes neste sistema particular que constitui a relagio interveniente- cliente e de descrever o seu funcionamento, a partir das observagdes por nés realizadas ao longo da nossa pritica profissional e das miiltiplas obras con- sultadas. A est-utura deste modelo inspira-se em Rosnay (1975, p. 95-96): Dois grupes de tragos caracteristicos permitem descrever de um modo _getal 0s sistemas que observamos na natureza, O primeito grupo refere- ‘se a0 seu aspecto estrutural, o segundo ao seu aspecto funcional, Estru- tural: trata-se da organizagao dos componentes ou elementos de um sistema no espaco; da sua organizacao espacial. Funcional: trata-se de processos, isto é, de fendmenos dependentes do tempo (troca, transfe- oncia, fino, crescimento, evolugdo, etc.); & a organizagio temporal. A figura 1.1 ilustra como se traduzem coneretamente estas caracteris- ticas, num modelo geral de relacio de ajuda. Formulago de um modelo de ajuda proisional u FIGURA 1.1 A relacao de ajuda profissional 08 PROGESSOS =— Di, fez —— t¢ ‘A intorvoncio psicoterapéutca \ fENTE 6 INTERVENIENTE OCLIENTE —Torasia expresiva fvorecerdo nocessaes $e eee ye sonsagsee 2 Emogdes $< —— Resolugdo de problema « — Pevcepedes psonaae G<—— Guoacres +f Penanons Percepgées 4 <—— Trabalho de luto, |< —— €_Emogées sensagses 2 <—— Sorta Notagbos Pn cratity <—— A lagi —— © CONTEXTO E 0 AMBIENTE Ese modelo compreende quatro componentes: i a aaa 1 € que transporta em sia ~ 0 cliente, que constitu a razao de ser desta relagdo e que transporta em si final dade deste sistema isto é, que apresenta uma necessidade de ajuda mais ‘ou menos definidas c necessidades ¢ os = 0 interveniente, que ajuda o cliente a reconhecer a5 suas ne seus recursos (facilitador) ¢ em fungio das necessidades, pde de um modo sustentado, as suas competéncias ao servico do conteddo desta relagio (pe- rito) de forma a ajudar o cliente a mobilizar certos processos de natureza psicoterapéutica; 3s de estir em relagdo € que = 0s processos, que representa diferentes modos “ serve de catalizador a esta conjugacio de energia coma finalidade de res poniler & necossidade de ajuda: iente fisieo e sock Jo, que influenciam directa ~ O ambiente fisicoe social, e 0 contexto da relagdo, qu ; mente a forma e estrutura da relacio ¢ ainda, 0 tipo de servigo oferecido. aspecto funcional do modelo faz. com que, a imagem de toda a relagio numa ees aberto se constitua, tome forma, res, se desenvolva e Sinalmentedesaparea,Conhece moments de excelente funcionamento quando as duas pessoas em presenca interagem entre elas, 0 que contribui para ali- ‘mentar esta relagio de ajuda: o cliente mantém a interacydo através das suas 2 CaPrTULo 1 ualidades pessoais e do seu envolvimento na exploraga nento na exploragao de sie na busca de solugdes. Por seu lado, o interveniente, com respeito e consideracio, oferece- Ihe suporte ¢ uma ajuda perceptivel ao longo deste processo, fruto dos seus conhecimentas ¢ habilidades relacionais e da sua competéncia profissional. Datos 0s aspectosfuncionais ea finalidace deste sistema, as interacgdes progridem a0 ritmo dos encontos e estes sio influenciados pelo lugar, 0 ‘momento, a duracio e outras condigSes psicossociais em que se desenvol- vem, Este sistema serd imediatamente ameagado quando um ou mais destes componentes falharem. De facto, nfo € possvel imaginar uma relasio de ajuda eficaz sem a presenca do interveniente e do cliente. De igual modo, 1ndo pode haver uma relagao de ajuda profissional sem uma necessidade de ajuda ou sem conhecimentos profisionais. Neste sentido, todos os campo. nents do sistema sio igualmente importantes pelo que &necessério dispen- sat-lhes uma atengio continua ao longo de todo 0 processa de relagao. ‘Tomando por referéncia Chin (1984), constatamos que este modelo apresenta as caracteristicas de um modelo de tipo desenvolvimentista. De acordo com 0 autor citado, um modelo desenvolvimentista € constituido por um corpo de conhecimentos que se centra em torno do crescimento ¢ a mdanc, Chin salenta quatro grandes cracteristicas nestes modelos: 0, estados identificaveis, um modo de ao, tm deco, ead icéveis, um modo de progressio, forgas ¢ A primeira caracteristica implica que este sistema se diri te este sistema se dirige para algum lugar; dito de outro modo, que essas mudangas vio numa direcgao, por exemplo de actualizagao, de auto-realizacao ou de resolugio de uma dificul- dade, Estes objectives sao privilegiados pelos intervenientes que se inspiram ‘uma visio existencial ¢ humanista da intervengao. No que se refere & segunda caracteristica, Chin salienta que, dado que se desenvolvem no tempo, certas fases, etapas ou periodos podem ser reco- nhecidos. O desenvolvimento da relagao entre o interveniente e o cliente 6 constituido por estados distintos que podemos reconhecer em todos os pro- cessos presentes neste modelo. A terceira caracteristica, a progressdo, possai segundo Chin quatro pro- priedades: PEN ES ~ 0 sistema-cliente ultrapassa etapas continu. Entre o inicio e o final da relacao, é possivel designar certas fases ultrapas- sadas pelo interveniente e 0 cliente. © reconhecimento dessas fases © a realizacdo das tarefas a elas ligadas permitem fazer progredit esta relacio, ~ A mudanga, o crescimento e o desenvolvimento seguem um movimento em espiral com oscilagdes. Formula de wm modelo de aida profissonal 13 ‘A relagio, numa abordagem existencial-humanista, ndo € um processo linear. Todos os seus clementos, ainda que de modos ditsintos, estio fre- quentemente presentes em cada etapa do processo. Segundo o grau de dificuldade ¢ o tempo disponivel, cada etapa seré vivida e revivida num movimento de vai-e-vem constante, pontuado por momentos fortes asso- ciados a relagao ou a dificuldade presente. = As oscilagoes entre diferentes etapas aparecem de forma ciclica. Como toda a relagdo humana a relacao de ajuda profissional vive momen- tos intensos de interrogagées profundas e, de insucessos que por vezes “poem {a prova” a confianga estabelecida, Estes momentos de questionamento, que frequentemente se parzcem com retrocessos, levantando incertezas acerca dos adquiridos,estarac presentes a0 longo de toda a relacio, principalmen- te se esta se prolonga no tempo. Por exemplo, o facto de aumentar a cons- cincia de si nao condwz necessariamente a pessoa @ viver menos ansiedade cou tristeza, Por vezes esta tomada de consciéncia desencadeia um acesso ‘mais directo a certas emogdes e pensamentos que habitam a pessoa, abri- gando-a a vivé-las de um modo mais intenso, podendo levé-la a interrogar a pertinencia do processo terapéutico em curso. — A progressio caracter:za-se por um desenvolvimento e diferenciagao das suas estruturas © processos. ‘A necessidade de ajuda manifesta-se por um desconforto difuso que se cla rifica ao longo dos primeiros encontros ¢ desencadeia a organizacao de estra- ‘égias terapéuticas particulares. A comunicagao corrente dos primeiros ins- tantes da entrevista, transforma-se progressivamente em relagio de ajuda profssional e numa intervengao de caricter psicoterapéutico ou fisico, segun- cdo a necessidade ¢ expectativas do cliente, Veremos adiante as cinco estraté- gias psicoterapéuticas mais frequentemente utilizadas numa prética profissio- nal corrente. De acordo com a dificuldade psicossocial vivida pelo cliente, 0 terapeuta escolherd aquela que melhor responde as suas necessidades. No que se refere & quarta caracteristica, Chin menciona que as forcas do sistema ou os factores geradores de desenvolvimento € crescimento, sto fre~ quentemente percebidos pelos préticos como sendo inatos e fazendo parte dda natureza humana; em condigBes ideais o ambiente estimula essas forcas inatas de crescimento. E.0 que acontece nas intervengdes de tipo existencial ou humanista onde a tendéncia actualizante e a necessidade de reconheci- ‘mento so dus importantes fontes de energia, uma interna ¢ outra externa. © autor refere que quando o stress e o constrangimento do sistema se tor- ‘nam demasiado importantes, cria-se uma ruptura e libertam-se forgas para criar uma nova estrutura e atingir um novo equilibrio, Neste modelo, conhecimento cada vez mais elevado que o cliente adquite de si-mesmo, constitui esta forca libertadora, que corresponde a um primeito nivel de mudanga levando-o para outras mudancas. 4 CAPITULO 1 Enfim, no que se refere as potencialidades a maioria dos intervenientes que se inspiram num modelo desenvolvimentista reconhecem um enorme Potencial de desenvolvimento no sistema, e consideram que as condigdes do ambiente podem influenciar este potencial (Chin, 1974, p.56-58). Como vveremos, o cliente e o interveniente transportam em si a energia necessitia para fazer progredir a relagdo. Para além disso, como salientaremos ao longo deste livro, © contexto do encontro, as estratégias de intervencao utilizadas © 0 ambiente no qual se desenvolve a relagao, influenciam directamente a sua forma e qualidade. 1.2, OS COMPONENTES DO MODELO DE RELAGAO DE AJUDA PROFISSIONAL Para uma visio de conjunto do modelo de relaga de ajuda profissional, ‘vejamos 0 que caracteriza cada um dos seus componentes, isto é, 0 cliente, © interveniente, 0 ambiente, 0 contexto e os procestos presentes na relacao, 1.2.1. O cliente Um sistema aberto A pessoa que sente uma necessidade de ajuda pode ser considerada como lum sistema aberto, composto por caracteristicas biol6gicas, cognitivas, so- ciais, afectivas e espirituais, Estes componentes sio interdependentes sob 0 plano energético ¢ por essa via, cada um deles é simultaneamente consumi- dor e produtor de energia, de informacao e de matéria que troca com os ‘outros componentes do organismo. A qualidade destas caracteristicas esta directamente relacionada com a unicidade da pessoa na medida em que dependem directamente da sua hereditariedade e das experiéncias por ela vividas a0 longo do seu processo de maturagio. Esta descri¢do da pessoa inspira-se de Ludvig von Bertalanffy (citado por Beck, Rawling & Williams, 1984, p. 287), que propae a definiczo se ‘guinte: ‘As pessoas sio sistemas. Neste sentido, interagem continuamente com o ambiente onde vao buscar de um modo significativs informago, enes- gia e matéria: reenviam diferentes formas de informegao, de energia e de ‘matéria para 0 ambiente, Vejamos brevemente 0 que contém os diferentes aspectos desta defini- so (ver © quadrol.1). No contexto de uma relagzo de ajuda em que a pessoa ¢ considerada como um sistema, quando uma componente da pessoa Formulagao de um modelo de ajuda profsional 13 & perturbada, quer scia de ordem fisica, psicol6gica, social ou espiritual, a totalidade da pessoa € afectada, Como sublinha Rogers (1968, p. 217): «Na sua interacgao com a realidade (com 0 seu meio), 0 individuo comporta-se como um todo organizado, isto é, como uma “Gestalt” ou estruturar. ‘QuADRO 1.1 0 cliente Um sistema aberto = O cliente possul caracteristicas Iigadas & sua hereditarieda volvimento (biolégice, cognitiv, social, afectivo e espiritual) = Tem experiéncias de vida diversiicadas = Tem sensagées (cinco sentidos, sentido interno) = Percebe (esté atento a cartas sensagoes) = Pensa (atibul significados) ~ Sente (vive emogdes) = Tem motivagio (tem necessidades, valores, gostos, intencionalidades) = Manifesta comportamentos (diz, faz) que favorecem a sua adaptagao © a sua actualizagéo a0 seu desen- Em interaceao com o ambiente = Vive confltes, frustagies e ameacas que se manifestam no organismo sob forma de stress © de ansiodade = Apresenta uma necessidace de ajuda que se manifesta sob forma de sintoma, problema, difculdade de adaptagio, disturbio do comportamento ou distirbio mental Na literatura acerca desta matéri, € geralmente reconhecido que a pessoa, como todo o sistems, é constituida de subsistemas biologicos, cognitivos, afectivos, sociais e espirituais. B igualmente reconhecido que cada um destes ‘componentes s6 pode ser compreendida em ligagdo com as outras. Também no contexto de uma relagao profissional, qualquer que seja a dificuldade que ‘ cliente apresenta € necessério considerar 0 conjunto das suas caracteristi- cas, A pessoa pode aceder a esta relacio gragas aos seus processos fisicos e psiquicos. Para o profissional, estes processos, sdo simultaneamente fonte de informacao e objecto particular de intervencio, Manifestam-se sob a forma: de sensagées corporais captadas pelos sentidos internos ¢ externos; de per- cepgao dessas sensacoes provenientes do que a pessoa entendeu, vith sabo- reot, tocou, etc; das significagbes que a pessoa atribuin a essas sensacbes sob 6 plano intelectual (interpretagao, explicacdo, sentido, avaliagao, etc.)s das ‘emogdes e dos sentimentos que s80 mobilizados: das motivacoes; das inten- {g8es, desejos, necessidades evidenciados pela pessoa; dos comportamentos ‘verbais e nao verbais que acompanham este movimento interno e que dele resultam. 6 rr TEN pant peso dest por vii autores ques intressra ! risticas da pessoa (Miles, Nunnally & Wackman, 1975: Nai & Moy, 1990; Platchik, 1980), ou que se debrucaram sobre a sea wiles terapéutica, nomeadamente em terapia Gestalt (Bouchard, 1980; Delisle, 1998; Ginger, 19925 Perls, Hefferline & Goodman, 1977, 1975; Polster & Polster, 1983; Zinker, 1981). Para os autores da Gestalt estes processos observam-se no ciclo de centacto onde as fungbes do self se manifestam. Uma parte significativa des observagdes ¢ intervengdes faz-se a partir dos processos presentes neste ciclo. Por fim, estes processos so igualmente utilizados para fins de rflexao e andlise da pratica profissional (Orlando, 1979; St-Armeud. 1983, 1995; Wiedenbach, 1964). : ___Através destes processos, a pessoa privilegia de modo consciente ou inconsciente, comportamentos que favorecem a sua adaptagao ou actualiza- 0, como salienta St-Armaud (1983, p. 58): A adaptaio consist em priviegar um comportament tamento qu comespon des nonin do meio, comportamento que ser onsderado comme ade uno no cao de in suber, A acto cone er vilegaroccmporamento que melhor corvesponde i xigenias decd pessoa, aqusle que é objecto de uma escolha pessoal * Sea pessoa for capaz de atingir uma consciéncia apurada de si e do seu ambiente, poderi reconhecer melhor as suas necessidades nao satisfeitas, as fontes de ameasas internas ¢ externas, 0 sentido que cla thes atribui e as emogdes que a habitam. Aps esta analise estar em condigdes de escolher ‘9s comportamentos a adoptar, Por outras palavras, em condigoes “ideais”, a pessoa pode privilegiar comportamentos que favorecem simultaneamente a sua actualizago e as exigéncias do meio, Nesse caso, a pessoa favorece @ recuperagao ou a manutengao da sua saiide. ___ Para adquirir esta consciéncia de si, a pessoa possul um sistema que a informa constantemente do grau de satisfacao das suas necessidades, como referem Rogers & Kinger (1969a), esta avaliacao ¢ organismica na medida em que é a tendéncia para a actualizagio que lhe serve de eritrio. A pessoa assume esta tendéncia quando consegue libertarse dos entraesbioldgicos intelectuais, afectivos, sociais e espirituais, que a impedem de reconhecer a informagdo que o seu organismo Ihe transmite. Como refere Lewin (1958). citado em St-Ammaud (1982, p. 109): «/..] 0 comportamento de wma pessoa ‘num dado instante é funcao da percepeao que essa pessoa tem de si pripria do seu ambiente, nesse preciso momento», Assim, se a pessoa tiver uma per cepcio errénea de si ou do seu ambiente, pode fazer escolhas pouco adap- tadas & situago e pouco susceptiveis de responder as suas necessidades, Por exemplo, é 0 ¢as9 de uma jovem que apesar das suas ambicBes profissionais se impede de fazer estudos universitios imaginando que nao possti as ormulagao de um modelo de ajuda profisions! vz hrabilidades intelectuais necessérias para ter sucesso nesses estudos. Esta per ‘cepgio pode ser 0 resultado de uma subavaliacto das suas competéncias intelectuais ou ainda, de uma sobrevalorizacao das dificuldades que com- portam os estudos. Um trabalho terapéutico com esta pessoa poderia ajuda- “laa reconhecer as fontes de distorgdo das suas percepgdes e a aproximar as. suas percepgdes da realidade, por exemplo, faclitando o contacto com as habilidades que ela domina. Os processos que acabdmos de descrever desenvolvem-se frequente- ‘mente de modo quise automético, suportado pelos elementos biologicos € fisiologicos da pessca. O organismo faz a sintese de todos estes dados e reage para responder a essas necessidades ou para se proteger. Quando certos destes processos so negados, desviados, impedidos, ¢ a prépria vida que € negada, desviada e impedida de se expressar. A pessoa torna-se mais vulne- ravel e desprovida, uma vez que as suas escolhas se fazem a partir de uma informagio reduzida ¢ por isso menos adaptadas &s suas reais necessidades. A interacgao com o ambiente 'A pessoa esti em constante interacgao com ambientes fisicos ¢ humanos muito diversificados. De modo mais ou menos consciente efectuou milti- plas aprendizagens que influenciam o seu modo de estar em relacao. Deste modo, adquirit valores, aprendeu regras ¢ leis, ¢ herdou costumes que modelam a sua vida em sociedade. Da integragao destas aprendizagens e das stias caracteristicas hereditérias (inatas) resulta um modo particular de estar ¢ fazer, traduzido nos seus comportamentos com os outros. Esta integracio nunca ocorre sem dificuldades. Todo ser humano, ao longo do seu desenvol- vimento, é susceptivel de viver um certo nrimero de crises psicossociais. ‘Autores como Erikson (1976), Sheehy (1982) e Levinson (1974) nomearam fe descreveram algumas destas crises do desenvolvimento que constituem ‘momentos criticos porque representam ocasides de auto-questionamento © de realizagdo de escolhas. Se estas crises sio vividas de um modo positivo, serio geradoras de crescimento, de aprendizagem de desenvolvimento da auto-estima, Porém, se s2o percebidas de um modo negativo, acompanhadas dde uum sentimento de medo e de uma atitude de retraimento, poderdio dar lugar a bloqueios importantes no desenvolvimento da pessoa. Nesta procura de satisfagdo das suas necessidades a pessoa vive inevi- tavelmente tensdes oriundas de frustragoes, de contfltos e de ameagas mais (ou menos importantes. Estas dificuldades resultam da propria pessoa ou do ambiente humano ou fisico em que vive (Collette, 1979). Estes agentes stressotes tém repercussées sobre a pessoa na sua globalidade. Multiplos estudos, nomeadamente de Selye (1975), Billings & Moos (1982), Pelletier 13 CAPEIULO 1 (1984), SIRIM (1983), Cohen, Kessler & Gordion (1995) e Lazarus & Folkman (1984) descrevem os efeitos fisiolégicos, cognitivos, emocionais e sociais @ estes agentes e que serdo diversos, em funcao da percepcdo que a pessoa tem dlles, da significagao que lhes atribui e da representagZo que possui da sua ‘competéncia para interagir com eles. O stress pode aumentar e tomar a forma de desconforto mais ou menos difuso, denominado ansiedade. Se @ pessoa consegue utilizar esta energia ‘mobilizada pelo stress, para encontrar em si prépria ou no seu ambiente um modo de o reduzir e de o actualizar, entdo a necessidade seré satiseita, 0 stress diminuiré € uma nova necessidade emergiré. Quando a pessoa necessita de ajuda, estes processos deixaram de fun- cionar de um modo harmonioxo ¢ nao consegue fazer escolhas satisfat6rias para si propria. Dito de outro modo, a pessoa é susceptivel de sentir uma necessidade de ajuda quando uma ou varias das seguintes condigoes estio presentes: ~ possui um conhecimento de si deficitério ou erréneo; — possui um conhecimento insuficiente ou erréneo do seu ambiente; — apresenta um défice de atengao relativamente as informagdes que conti- nuamente capta através dos seus sentidos internos ou externos; ~ recusa em acolher favoravelmente a informacio que é transmitida pelo seu organismo; ~ interpreta incorrectamente 0s dados que provém do seu organismo e do seu ambiente, por défice de conhecimentos, de julgamento, de capacida- des imtelectuais ou ainda, porque os interpreta & luz de experiéncias pas- sadas que nao tém relagao com a situagdo actuals ~ € invadida por certas emotes que afectam (medo, ira, ansiedade, culpa- bilidade, receio, ete.); = €incapaz de reconhecer uma necessidade, um gosto, uma preferéncia, um desejo de modo suficientemente marcado, para mobilizar as suas energias no sentido de uma accao concreta; ~ manifesta dificuldade em fazer uma sintese destes dados e de fazer as escolhas necessérias; ~ no € capaz de agir por falta de competéncias, por falta de confianga nos seus recursos ou por falta de coragem perante os riscos que corre. Em tais condighes, se a dificuldade é percebida pela pessoa como uma ameaga importante a sua integridade psiquica e se nio recebe a ajuda neces- Formulagio de um modelo de ajuda profisional 9 siria, & passivel de viver um distirbio mental mais ou menos grave em fungdo da sua personalidade particular. Esta falta de competéncia em utili- zat os seus préprios processos internos pode explicar igualmente a presenga de miltiplos distarbios fisicos, cujas primeiras manifestagses sio frequente- ‘mente ignoradas pela pessoa até que o organismo faga uma triste chamada pela presenca da doenga. De facto a necessidade de ajuda psicoldgica ¢ especialmente forte em dois tipos de circunstancias. Aparece nas pessoas que esto de tal modo bem integradas no seu meio que chegam a negar quase totalmente a sua prépria individualidade, O seu organismo, através de todos os tipos de sinais e sin- tomas, procura entdo trazé-los a realidade (ao quoticiano): desordens psicossomiticas, exacerbacao do estado emotivo ou perturbagbes do funcio- namento perceptivo, intelectual ou espiritual, Em situagdes extremas como a psicose a pessoa deixa de reconhecer os seus sinais de alarme, a0 ponto de perder quase totalmente 0 contacto consigo e de se tornar uma estrangeira para si propria outros casos, as pessoas ndo conseguem interagir de modo satisfat6rio com o seu ambiente fisico ou humano a fim de responder as suas necessi- dades e simultaneamente de respeitar as exigéncias deste ambiente. Vive tensoes, ansiedade e sentem-se incapazes de ir buscar ao seu ambiente 0s recursos necessirios para a satisfagao das suas necessidades., Na relagao com o interveniente, o cliente tentaré retomar o contacto com os scus processos psicol6gicos internos e reconhecer 0 desconforto que vive. Noutras circunstancias far a aprendizagem de comportamentos so- ciais susceptiveis de responder de um modo satisfatério as suas necessida- des, reconhecendo em si esse processo de actualizagao continuamente pron- to 2 manifestar-se. Em stimula, € com estas caracteristicas gerais e com expectativas, mais ou menos precisas, que o cliente entra em relacao com © interveniente na esperanga de reduzir este desconforto psicol6gico ou fisico do qual nao consegue abstrair-se. A saiide Para melhor compreender 0 que caracteriza 0 bem-estar e 0 desconforto, vvejamos 0 significado dos conceitos de satide e de doensa de acordo com alguns autores da corrente de pensamento holistico-humanista. Numa visto universal da satide passivel de aplicagdo a todos os seres vvivos, Capra (1983, p. 307) menciona: «Para estar sao, um organismo deve reservar a sua autonomia individual ¢ simultaneamente ser capaz de se integrar de um modo harmonioso em sistemas mais vastos [...]- Esta capa- 20 CAPITULO 1 ormulagto de wn modelo de ajuda profisional oh Po catty cidade de integragao esté directamente ligada a flexibilidade do organismo A doenga ¢ a0 conceito de equilfbrio dinamico». também neste sentido se manifestarn i Hagan & Proulx (1996, p. 44): ‘Numa visio holistica, também a doenga assume uma significagdo particular nm rio recon! ‘este propésito, Capra (1983, p. 130) refere: ‘As mudangas de mentaldades, tanto ds euidadores como das pes ae € necessério reconhecer. A este propésit, Capra (1565; p soas cuidadas, a par com as politicas oficiais de sade e bem-estar © [Numa acepeio holistica, a doenga mental pode ser considerada como os critérios de competéncia de associagées prefissionais, favoreceram resultando de uma incapacidade em avalfar e em integrar uma expe- a emergencia de um conceito revisto e alargado da satide: global, riéncia, Nesta Gptica, 0s sintomas de uma perturbagio mental reflec~ holistica, Estes qualificativos designam a satide como um recurso per. tem as tentativas do organismo para se tratar eatingir um novo nivel mitindo a retlizagdo e a procura de uma equilibrio fisico, mental de integracio. O processo que constitu um sintoma nao deveria ser social suprimido: deveria a0 contrério, ser intensificado numa atmosfera particular e numa introspecgao continua conduzindo 2 sua plena re- Reteremos destas definigdes, o facto de a pessoa saudével possuir uma alizagao e & sua integragio consciente, deste moco completando o pro- boa capacidade de adaptacao e saber o que é bom para si, Estas definigdes cesso de cura, deixam igualmente subentender que a pessoa saudavel possui os recursos necessarios para entear em relaggo com 0 scu ambiente e com os outros, ¢ para procurar aquilo de que necessita. E neste sentido que Greenberg (1989, p. 3-4), numa visio holistica, descreve a satide como uma qualidade de vida Esta visio da doenca que Capra propée, deixa entrever a atitude que o que se caracteriza sob o plano: interveniente deveria adoptar. Em vez de procurar atenuar os sinais e sinto- ‘mas manifestados pelo seu cliente, trata-se de os acolher sem julgamento, com empatia, autenticidade e respeito, a fim de os explorar num clima de abertura e de compreender a sua significacdo para o cliente, convidando este E igualmente neste sentido que Nightingale (1980) menciona que a doenga pode ser percebida como um processo de reparacao. ~ da satide social, pela capacidade de interagir com os outros ¢ com o seu ambiente e de ter relacdes interpessoais satisfat6rias; — da satide mental, pela capacidade de aprender © desenvol ver as suas ‘iltimo a fazer © mesmo. Frequentemente, esta atitude de acolhimento por capacidades intelectuai Si 96 € suficiente para atenuar os sintomas. Noutros casos, permite reconhe~ ~ da satide emocional, pela capacidade de dominar as suas emogoes de cer os meios de intervengao mais adaptados para ajudar o cliente a prevenir modo a expressé-las no momento oportuno e de forma ajustada; € gerir os sintomas. ~ da satide espiritual, pela crenga numa forca unificadora (a natureza, as Para melhor compreender esta visio da doenga e a importneia de leis cientificas, a forca divina, ete.)s acolher” e escutar, vejamos o que escreve Larouche (1985, p.19) a este ~ da satide fisica, pela capacidade de realizar as tarefas quotidianas sem Propésito: sentir um cansago excessivo e conservando a sua integridade biologica Segundo a abordagem holstica da saide,a doensa nao é propriamente falando, uma infeegdo ou uma deficiéncia do onginismo. £0 organisino Pocreau (1983, p.190), numa visto semelhante da saiide, propse um na sua totalidade que esté desequilibrado e detilitado. © processo de certo mimero de meios para atingir este bem-estar. Segundo o autor a saiide cura implica um auto-questionamento de si-mesmo, dos seus valores, mental é: dos seus comportamentos, das suas relagbes com as outros, do seu modo de viver. Quanto mais a doenca é grave, mais profundo e radical dever [...] a capacidade de fazer face a0 real ¢ de a ele se ligar pela utilizagao do set potencial riativo a fim de a dominar. Nes:a condigao o ser pode viver em harmonia com o sew ambiente, particigar plenamente na sua evolugio e transformagao em vez de se submeter passivamente |[...J. ‘Sendo responsavel pela escolha dos seus valores eatitudes e capaz de os viver concretamente, ele [o ser) poder realizar-e, isto &, continuar a desenvolver-se ¢ tornar-se mais plenamente humano, A satide mental & ortanto esta capacidade que a pessoa possui de se desenwolver e de se realizar conforme os eixos da sua natureza humana, ser o auto-questionamento. Nesta perspectiva, a doenga constitui uma ocasiao para se interrogar sobre o sentido e otientagio da sua vida, segundo miltiplos terapeutas é estabelecendo relagdes harmoniosas com © universo fisico, o ambiente social e com 0 mundo espiritual que a verdadeira cura se torna possivel[...] Nesta perspectiva, a doenga é uma ‘ocasiio para se interrogar sobre a orientaggo dada & sua vida Nesta éptica, a tarefa do interveniente consise antes de mais, em atrair a atengio da pessoa para um ou varios aspectos da sua experiéncia, com 0 objective de a ajudar a reconhecé-la e assim reactivar os seus processos 22 CAPITULO 1 —W $$ ari psicolégicos internos, para actualizar o seu potencial. Esta estratégia de in- terven¢ao aplica-se tanto aos problemas de satide fisica como psiquica, Como jé menciondmos, o cliente é visto como um sistema aberto for- mado por componentes fisicas, afectivas, cognitivas, socials e espirituais estas componentes sio indissociiveis no seu funcionamento, e nao podem ser compreendidas isoladamente. O cliente interage com o ambiente huma- no ¢ fisico de que ele proprio € um componente, e donde retira a energia necessiria a sua sobrevivéncia. Através de suportes bio-fisioldgicos exprime- -se psicologicamente através de certos processos, nomeadamente: ~ aqueles que estao ligados as sensagdes captadas pelos sentidos internos e externoss ~ aqueles que estdo ligados & percepeao dessas sensa¢bes, quer elas prove- ham de si-mesmo ou do seu ambiente; ~ aqueles que estao ligados a significagio cognitiva e afectiva atributdas a essas percepcdess ~ agueles que estio ligados as motivacdes que resultam das significagdes atribuidas; ~ aqueles que estdo ligados as manifestagdes verbais e nao verbais que dat resultam. Pela sua natureza, a pessoa tem tendéncia a actualizar 0 seu potencial hereditério. Féi-lo nomeadamente procurando satisfazer as suas necessida- des, com a ajuda de um sistema que Ihe permite avaliar o seu grau de satisfacdo, Nesta procura de respostas s suas necessidades, a pessoa nao vive apenas satisfacies, mas faz também face a constrangimentos, ameacas,frus- ‘agoes, receios ou conflitos que geram stress e ansiedade. Se a pessoa nao ossui os recursos psiquicos necessérios para aftontar os problemas que considera importantes, viverd dificuldades de adaptacdo, sintomas e certos rirbios de comportamento, Em consequéncia, a pessoa no consegue continuar a escutar um ou virios destes processos psicolégicos internos ¢ naturalmente utilizar de modo pertinente os recursos do seu ambiente para fazer face as dificuldades vividas. Ela tem necessidade de ajuda 1.2.2. O interveniente Um sistema aberto O iinterveniente constitui o segundo componente do modelo de relagio de ‘ajuda profissional. Para além de possuir as mesmas caracteristicas humanas ue 0 cliente, possui conhecimentos habilidades e atitudes ligadas a0 seu Formulagao de wim modelo de ada profisional 23 apel profissional. Esté consciente de que as suas expectativas pessoais ¢ Profisdonas terho repercusbes sobre forma e sobre a qualidade da sua relacao com o cliente (ver quadro 1.2). ‘QuapRo 1.2 Um sistema aberto ereditarladade @ 20 = 0 imerveniente possui caracteristicas ligadas & sua hereditari seu desenvolvimento (biol6gico, cognilivo, social, afectivo © espiritua) ~ Tom experiéncias de vida e de trabalho civersiicadas = Possui cartes conhecimentos = Dest 1 cancun tercosnecesséros ds suas tengtes, do tnconaen- to dos processos em curso numa relagao de ajuda’ ~ Possul certas hablidades * De contacto (utilizar 0s seus sentidos, o movimento # a palavra) * De reconhecimento @ interpretagdo das mensagens conceptuals © afectivas + De comunicagao: verbal (colocar questbes, emit feesback, refleci, fazer sinteses, revelar-se, informar) @ no verbal (gests, mimicas e voz) + De acompanhamento de determinacos processos (processo de entrevista, processo ralacional « terapéutico) = Adopta atitudes de compreenso empatica, de respeito, de autenticidade, de compaixao e de esperanga = Manfesta comportaentos intencionais (perio, faciitador) Os conhecimentos trabalho profissional exige um bom conhecimento de si do seu papel, dos fundamentos tedricos que conduzem a sua pritica e dos processos em curso numa relagao de ajuda e nas intervengoes de cardcter psicoterapeutico. Ve- jamos em detalhe o que caracteriza cada uma dessas exigéncias © modelo de intervenso equ propose erge que o intereniente se wista verdadeiramente na relacao. Para tal é essencial que tenha elevados conecientoe consitncia de srmesm, com a fnadade de discern 0 mais distintamente possivel 0 que € que esta relagio suscita em si, de que rmaneira as suas caracteristicas pessoais influenciam a qualidade da relagao € que tilizagao pode fazer de si-mesmo, para fins terapéuticos. a ientificos, das ‘A partir da sua formagio dos seus conhecimentos cientficos, experéncias de Uabelho, dos valores econcepeto de ajuda individuas das expectativas do meio ¢ da visio pessoal do cliente, cada interveniente cons- 24 captruno 1 tr6i (se) a sua percepgao pessoal do que significa “estar em relacio” E entre outros, a partir desta concepcio do exercicio do seu papel que o interveniente pode durante um encontro com o cliente, decidir qual a melhor conduta a adoptar. Mesino nas situagdes em que ¢ dificil avaliar, a curto termo, os efeitos sensiveis da ajuda, é frequentemente a partir desta concepgao que 0 interveniente decide modificar ou no as suas intervengdcs. Por exemplo, em cuidados de enfermagem, cremos que € no “cuidar” da pessoa que se estrutura 0 papel do enfermeiro, Este “cuidar” situa-se antes de mais na qualidade da telacdo que se estabelece entre ele ¢ 0 cliente. E é na forma de fazer ¢ de estar nesta relacdo que se situa o aspecto terapéutico do cuidado. ara além da sua contribuigdo enquanto pessoa, o interveniente desen- volve certos pracessos ¢ estratégias terapéuticas com a finalidade de estruturar «fazer progredir as suas intervengoes. E com este fim que ele utiliza por exemplo a entrevista, o processo de resolugdo de problemas ou outras estra- tégias terapéuticas. A parte acordada para estes dois aspectos do seu envolvimento variaré em fungao das necessidades do cliente. Na realidade, a arte de ajudar consiste na capacidade de dosear de um modo excelente as fungdes de facilitador € de perito ao longo das suas intervengdes. © profissonal deve também conhecer os principios teéricos em que sus- tenta a sua pritica, Neste sentido, precisa de possuir um bom conhecimento geral das teorias correntes do desenvolvimento e do funcionamento psiquico do set humano e, carece de uma visio clara da(s) teoria(s) que priviegia na sua pética, O mesmo acontece relativamente& sua concepgao de satide, de doen, de ajuda ¢ de intervengao terapéutica, Para além disso, deve possuir uma boa compreensio dos processos em curso nas suas intervencées e uma justa percep- sao das forgas e dos limites da abordagem terapeutica que escolheu utilizar. Em sinteso, a partir deste conhecimento de si, do seu papel ¢ dos con- tetidos tedricos em que actedita, o interveniente define a sua prépria ccn- cepgao de relacao de ajuda profissional, que ce reflectiré no scu modo par- ticular de fazer e estar a0 longo das suas intervencées. As habilidades No momento da intervencdo, aquele que ajuda deve ser capaz de traducir em comportamentos articulados, as suas caracteristicas pessoais 0s seus conhecimentos profissionais. Este modelo preconiza certas habilidades que © interveniente deve possuir para tornar a sua acgio eficaz e que so tea- tivas ao contacto, ao reconhecimento ¢ interpretagao das informagOes per- cebidas, a comunicagao verbal e nio verbal, ao suporte e expresso dos seus préprios processos psiquicos e dos do cliente e ainda, & elaboragio e desen- volvimento de intervencdes pertinentes. Formula de wm modelo de ajuda profissional 25 A intervengio, como jf foi referido, caracteriza-se primeiramente pela qualidade da relagio que se estabelece entre a pessoa que ajuda e aquela que 6 ajudada. Logo é importante que a0 longo dos encontros, o interveniente se preocupe com a qualidade da relagao, sobretudo com 0 modo como se ‘estabelece, se mantém e € utilizada sob o plano terapéutico. E possivel que ‘este privilegie certos comportamentos ¢ evite outros em fungio das suas caracteristicas pessoais e das suas experiéncias de vida. Deve estar consciente disso para reconhecer, por exemplo, que 0 seu modo particular de usar os sentidos, 0s gestos e a palavra pode dificultar ou facilitar a relagao (Satir, 1980; Polster et Polstes, 1983), ou ainda, que privilegia as manifestagoee de cettos processos internos e descuida outros. Por exemplo, pode estar muito atento as emogdes, mas pouco desperto para a significagao que o cliente atribui a experiéncia em curso, ou até negligenciar as expectativas do cliente inferindo erroneamente que sio semelhantes as suas. Gragas a utilizacao dos seus modos de contacto, 0 interveniente recebe ‘uma enormidade de informacées que Ihe sfo transmitidas verbal ¢ nio vverbalmente pela pessoa com necessidade de ajuda, Essas informagdes refe- rem-se particularmente aos processos psicolégicos da pessoa ¢ que ji ante- riormente descrevemos. A tarefa daquele que ajudada consiste em reconhe ‘cer e interpretar as mensagens conceptuais e afectivas comunicadas nesta relacio (Peavy, 1981). Neste modelo, o interveniente nao tenta dar-lhes um sentido a partir de teorias ou da sua experiéncia pessoal, mas sim reconhecer qual 0 seu significado para o cliente. £ nesta dptica que Rogers & Kinget (1969a) distinguem 2 compreensio de tipo empética da interpretagdo, a primeira elaborando-se a partir do cliente, a segunda, a partir de uma teoria ou da experiéncia pessoal do interveniente. E por esta razao que uina ajuda deste tipo é qualificada de terapia “centrada no cliente” pois ela interessa-se pela significagao particular que este atribui sua experiéncia Para além de perceber as mensagens conceptuais e afectivas transi das pelo cliente, o interveniente emite as suas proprias mensagens. Ele deve ser sensivel a0 que comunica e assegurar-se de que 0 contetido verbal das suas interveng6es, no fundo e na forma, € apropriado face aos objectivos perseguidos. Para tal deve possuir habilidades e técnicas de comunicacio: saber colocar questées, reformular, reiterat; dar feedback, sintetizar, revelar- -se, transmitir informagbes, ec. (Brammer, 1979; Cormier, Cormier & Weisser, 1984; Ivey, 1983; Pauzé, 1984). Deve ainda conhecer com clateza 0 poder da comunicagio nao verbal e utilizé-la de modo consciente ao longo das entre- vistas. Desde 0 primeiro contacto ¢ a0 longo das trocas, 0 interveniente esté em presenga de um certo niimero de processos que deve reconhecer e apoiar. (© modelo que apresentamos designa alguns, intimamente ligados e com os 2 CAPITULO 1 $3 CAPITULO quais se deve familiarizar (ver 2.1.4); 0 primeiro, que 6 certemente o mais fundamental, é relativo & prépria relago, seu contexto ¢ sua evolucio; 0 segundo diz respeito a entrevista e aos seus diferentes tipos;o terceiro refere- se as estratégias psicoterapéuticas de intervencao que so utilizadas em fangao de uma dada necessidade As atitudes Partilhamos da opiniao de vérios autores humanistas (Bugental, 1987; Carkhuff, 1969; Delisle, 1998; Hamann, 1996; Jourard, 1977; Rogers, 1968; ‘Watson, 1979; Yalom, 1998) e de numerosos outros, relativamente ao efei- to da qualidade da relacio sobre a eficacia da ajuda prestada, A relacio exprime-se especialmente no reconhecimento do outro como pessoa total © manifesta-se através de certas atitudes do interveniente. Exteriorizando- -as ele convida o cliente a adopté-las para si -mesmo. Retermos cinco atitudes que sio frequentemente mencionadas na literatura. Trés de entre clas sao qualificadas de receptivas ou “facilitadoras”: a compreensio empitica, a autenticidade e o respeito caloroso. As duas outras atitudes, particularmente essenciais ao suporte do cliente em sofrimento, sto a compaixao e a esperanca. Os comportamentos intencionais A\ presenga destas atitudes no interveniente depende amplamente do seu desenvolvimento pessoal ¢ profissional. Relacionam-se directamente com a ‘qualidade do seu contacto, com as suas motivacées pessoais e profissionais telativamente a cada cliente ¢, com o seu nivel de consciéncia quanto as razdes que justificam as suas intervensdes, Neste sentido sec4 dada uma atencdo particular a essas raz5es, nos primeiros encontros 0 cliente ¢ 0 interveniente devem definir a dificuldade que a pessoa vive e estabelecer objectivos comuns que fardo parte do contrato terapéutico. Em ligagdo com as expectativas ¢ caracteristicas particulares de cada cliente, o interveniente, enquanto perito e facilitador, reflecte o conjunto das suas caracteristicas essoais e profissionais no seu modo de intervir. Em suma, o interveniente ¢ antes de mais uma pessoa que possui certas caracteristicas, humanas e profissionais, indissocidveis. E com estas caracte- risticas que entra em relacdo. Utiliza com exceléncia e intencionalmente os seus conhecimentos, habilidades e atitudes a fim de criar condigdes relacionais ‘cue constituem 0 meio de dispensar uma ajuda ou 0 seu contexto de apli- casao. Um conhecimento aprofundado das motivagdes pessoais e profissio- Formula de um modelo de ajuda profisional 27 znais que o habitam permitem-Ihe dar um sentido a esta relagao e dosear a energia que nela investe. i A relagio de ajuda profissional desenvolve-se num determinado ambiente ¢ contexto, Estes dois elementos constituem o terceir componente do mode- Jo, Tém uma influéncia directa nos objectivos, na estrutura das trocas € no resultado destas. O interveniente tem de os ponderar, adaptar-se a eles e por vyeues modificar certos aspectos que podem por em risco a qualidade da relacio ou do servigo oferecido. O contexto ¢ 0 ambiente da relagao O contexto Entre as varidveis que constituem o contexto, algumas estdo ligadas ao clien- te: as suas caracteristicas, a razao pela qual consulta e as stias expectativas. ‘Outras referem-se ao interveniente: 0 scu estatuto profissional e de emprego, as suas competéncias. Outras ainda sio relativas & instituigao: 0 sew manda- to e finalidade, polticas de funcionamento ¢ estrutura de organizagao do trabalho (por exemplo, exercicio privado, meio institucional, em equipa interdiseiplinar, etc.). Estas varidveis t8m uma determinada influéncia sobre as modalidades e tipo de servigo oferecido. Porém, qualquer que seja 0 contexto deve ser sempre acordada uma grande atengao & qualidade da relacao. Por exemplo, se um cliente se apre- senta num servigo de urgéncia devido a um problema de ordem fisica, seré em primeito lugar com esse problema que nos preocuparemos. Nao obstan- te uma parte da intervencao deverd ser consagrade a relagio: aptesentar-se, informar-se do seu pedido de ajuda, questioné-lo acerca das suas expecta- tivas, interrogé-lo afim de melhor compreender a origem do problema, verificar 0 seu conforto durante os cuidados ou tratamentos, solicitar a sua colaboragio, dar seguranga sempre que necessério, responder as suas ques- t0es, realizar aconselhamento ou medidas de educagao para a satide. © ambiente fisico [A ajuda profissional ocorre em lugares muito diversficados. Quer seja num gabinete privado, no domicilio de um cliente ou numa unidade de cuidados, © profissional deve criar as condigdes que facilitem a troca ¢ respeitem o seu carécter confidencial. O capitulo 3 descreve diversas estratégias para que © contexto e o ambiente fisico de entrevista facilitem as trocas verbais entre © interveniente ¢ 0 cliente. aa CAPITULO 1 erro 1.2, Os processos presentes na relacao de ajuda profissional Abordemos agora o quarto componente do modelo de relagio de ajuda profissional, que se refere aos principais processos em curso numa relagao: a comunicagao, que toma a forma particular de uma relagdo, a entrevista ‘que resulta desta relacao ¢, as intervengdes com caricter psicoterapéutico, {que podem ser utlizadas a0 longo desta relacao. Os dois itimos processos sto objecto do segundo volume. Pera facilitar uma visio de conjunto do modelo de relacao de ajuda profissional, vejamos 0 que caracteriza generi- camente estes t18s processos (ver 0 quiadro 1.3) A relagao A relagdo que se estabelece num contexto de ajuda profissional reveste- vse de um cardcter particular. A priori parece apresentar as caracteristi- cas de uma comunicagao corrente onde, como em toda comunicagao social, ocorre troca de informagao entre duas pessoas. Porém no contexto de uma ajuda profissional, o papel das pessoas em presenga, a posi¢ao que ocupam uma relativamente @ outra e o cardcter frequentemente intimista de uma tal experiencia, contribuem para que o objecto da troca € as expectativas das pessoas assumam uma outra importancia. O inter- Veniente esté atento ao contetido desta comunicagio e a0 serviga ofere cido, mas também, a0 modo de o oferecer e & forma como o cliente 0 recebe e reage perante ele, Em certos contextos de ajuda onde o proble- ‘ma vivido pelo cliente ¢ sobretudo de ordem relacional, particularmente quando consiste numa dificuldade em entrar em contacto com os outros, a atensio dispensada ao outro e a qualidade da relacao, deve ser o miicleo da intervengio terapéutica. s axiomas de Watzlawick, Helmick-Beavin e Jackson Para melhor compreender em que consiste a relagao num contexto de ajuda profissional, vejamos em primeiro lugar os cinco axiomas de Watlawick, Helmick-Beavin & Jackson (1972) que descrevem as propriedades de toda a comunicagao humana e, por essa via, de toda a relacéo humana, Dado o seu ‘ardcter universal, estes enunciados tanto se aplicam as trocas profissionais correntes como aquelas que se efectuam no quadro de uma psicoterapia. Vejamos brevemente as aplicagoes que podem ser feitas no ambito de uma relagdo de ajuda profissional. Formulagao de um modelo de ajuda profisional 29 QUADRO 1.3 = | (Os processos presentes na relacao de ajude profissional A relagéo = A comunicagéo corrente ~ As fases da relagdo de ajuda profissional ‘A orfentagao da relagao (© trabaho ou a emergéncia das identidades * A conclusao A entrevista = As fases da entrevista © Antes * 0 ineio * 0 corpo da entrevista + 0 fin © Apss A psicoterapia ‘Teraple expressiva favorecendo a conscincia de si ‘erable de resolugao de problemas ‘Terapie da orise TTrapie de luto ‘Terapie de suporte “B impossivel nao comunicar” Watzlawick, Helmick-Beavin & Jackson (1972, p. 46) completaram este enunciado do seguinte modo: (Ora, se admitimos que numa interacgao, todo comportamento possti o valor de uma mensagem, ou seja, é uma comunicacio, logicamente no podemos niio comunicar, quer o desejemos ot. nio. Actividade ou inac- tividade, palavra ou siléncio, tudo tem valor de mensagem. ‘Uma tal afirmagdo tem implicagdes na prética profisional tanto para 0 cliente como para o interveniente. Ela convida o profissional a ter uma clevada consciéncia de si-mesmo e do seu cliente e a prestar atengao, nao apenas a mensagem que deseja transmitir mas também a todos 08 outros, aspectos da comunicacao, quer se trate do modo de comunicar a men- sagem, da maneira de a cla reagin, da forma utilizada para a transmitir, do contexto em que € transmitida, do tempo que Ihe € consagrado, ete. ‘A este propésito 0 segundo axioma torna-se bastante explicit. 2. “Toda comunicagio manifesta dois aspectos: 0 contesido e a relagao, sendo que © segundo engloba o primeiro e consequentemente é uma meta comunicagio” Os autores descrevem assim estes dois aspectos (Ibid. p. 50-51): Se voltarmos agora & comunicagio humana, constatamos que uma tal relagdo liga os aspectos “indice” ¢ “order”: o primeiro transmite os $e captrut0 1 ‘dados” da comunicado, o segundo diz como a devemos compreender. Dizer: “isto é uma ordem’, ou “estava a brincat” sao exemplos verbais de ‘uma comanicagio sobre a comunicagio, A relagdo pode também expri- mir-se de maneira nao verbal, pelos gritos, o sorriso e uma infinidade de utras maneiras. A relagdo pode também compreender-se perfeitamente através do contexto onde ocorre a comunicasio. Por exemplo, um diagnéstico de distirbio mental emitido relativamente a alguém no meio de uma acesa discussio, teré um efeto distinto sobre «ssa pessoa se for emitido noutra circunstancia, por exemplo por um perito apés uma consulta Segundo Watzlawick, Helmick-Beavin & Jackson (1972, p.51),"[..] 0 aspecto “rela” comunicagao sobre a comuniengaa, € evidentemente andlogo ao conceito de meta-comunicagio” ° No mesmo sentido Mucchielli (1988, p.34) escreve: ‘A comunicagao inter-humana auténtica apenas possui semethangas muito superfcals ou por abstracio as toca desnascoifcadon que poder efectuar duas maquinas ou duas personagens que unicamente desempe- nnham os seus papéis sécio-culturais no Ambito de uma informagao bi- lateral necesséria ao “funcionamento” do seu “sistema”. f acima de tudo, sem hesitasdo, porque esté enraizada numa necessidade, . As trocas entre um interveniente ¢ um cliente ultrapassam largamente a simples partitha de informagao, Assim, 0 modelo cibernético clissico de comunicac4o composto pelos quatro elementos: emissor, receptor, men- sagem ¢ canal; é em si insuficiente para explicar a complexidade da re- lag2o humana. No modelo que apresentamos, vimos que o cliente e 0 terapeuta sio antes de mais pessoas que possuem uma identidade pré- pria e que sto habitadas por diferentes processos fisiol6gicos e psicolé- ‘icos. Todos estes aspectos devem ser considerados a0 longo da troca. ‘Assim, a atengio seré dada & mensagem mas também ao modo como é transmitida e recebida e ao seu efeito no cliente. A este propésito ‘Mucchielli (1988, p.47) menciona o seguin Se concordamos em design de “comuniagto primar aque ssfre a0 objecto em sida comnicago,o conte textual da hensageres ortanto a Sua poreo propriamente“infrmatial denominarenos de informa sandra ainformagio latina a recepezo da norte, cao primar, que const un fsna de feedbock © autor acrescenta ainda que (Mucchielli 1988, p. 52): {A comunicagt ¢ portato una toca de signings que no se reduz ‘nformasio, nem 20 esquema emissio-recepio. Ela implica uma inter subjetvdadefandamenta, lag viva e vivida entre Pesca ¢ na teciprocidade. " Formulagto de ums modelo de ajuda profisional, 31 Assim, numa troca, o interventente convida o cliente « reagit & men- ‘sagem recebida. Por exemplo, se realiza um aconselhamento, verifica se 0 cliente compreende 0 que the foi ensinado, se tem divides, questionamentos, etc. Estar atento as suas reaccbes nao verbais (fran- zir as sobrancelhas, suspiros, sorrisos) e de acordo com as necessida des, validaré as suas percepgdes junto dele. £ neste sentido que num contexto profissional a comunicagao acerca da comunicagao se torna relagio, 3, “A natureza de uma relagio depende da pontuagio das sequéncias de comunicagao entre 0s parceiros.” Watzlavrick, Helmick-Beavin & Jackson (1972, p. 53-54) comentam este terceiro axioma nos termos seguintes: E indicutivel que a pontuacdo estrutura 0s factos de comportamento, que por isso 6 essencial& prossecugdo de uma interacgo |... 0 desa Cordo entre a mancira de pontuar a sequéncia dos factos origina ins- ‘merdveis conflitos que recaem sobre a relagdo. ‘Aeeste propésito os autores dio o seguinte exemplo. Num casal, 0 marido acusado de passividade dira que ele se submete porque a sua mulher é ‘autoritéria e por sua vez esta replicard que ela o critica por causa da sua passividade, Dito de outro modo, a causa e 0 feito de um comporta- mento nao sdo tio evidentes quanto parecem acteditar cada uma das pessoas envolvidas e requer uma anzlise muito mais complexa, © mesmo acontece numa relagao entre um interveniente ¢ um cliente, em que 0 cenfermsiro salienta que 0 seu paciente ¢ dependente enquanto que este refere que nao pode ser independente pois fazem tudo no seu lugar. Numa outra situacio, poderia ser realcado que um dado cliente parece ‘confiar pouco nos seus recursos pessoais, todavia a pratica dos profissio- nais revela que estes determinam como prioridade do tratamento a toma dda mecicagao, 4, “Os seres humanos utilizam dois modos de comunicacio: digital ¢ analégica” Para Watzlawick, Helmick-Beavin & Jackson (1972, p. 59}, a comunicagio analégica corresponde a todas as formas de comunicacao nao verbal ¢ a ‘comunicasio digital, 4 comunicagio verbal: Na comunicasao humana, podemos designar os objectos, no sentido lato do termo, de dois modos completamente diferentes. Podemos representi-los por alguma coisa que lhes seja semelhante, um desenho por exemplo, ou entio designs-los pelo nome, |...]. Estes dois tipos de ‘comunicago, uma semelhanga cuja explicagao é em si satisfatria e uma palavra, sto no primeiro caso 0 equivalente do conceito de comunicagio analdgica e no segundo de comunicacao digital CAPITULO 1 Resumnindo, se retermos que toda @ comunicagdo possui dois aspectos: contetido ¢ relagZo, podemos entender que em toda a mensagem, estes dois modos de comunicagao, coexistam e se completem. O contetido serd transmitido sob o modo digital enquanto que a relagio ser essen- cialmente de natureza analégica (Ibid. p.61). Mais uma ver. 0s autores salientam o lugar que a relagao ocupa no seio da comunicagao verbal e de como é ela que Ihe dé todo o seu sentido. Ao longo das trocas com o cliente, 0 interveniente deve portanto assegurar- -se das condigdes em que ocorrem as trocas e de que aquilo que diz correspond aquilo que manifesta através da sua linguagem nao verbal, Se assim nao for, uma certa confusao recaira sobre a mensagem, 0 que suscitard ansiedade no cliente. “Toda a troca de comunicagao é simétrica ou complementar, segundo se fundamente na igualdade ou na diferenca” Os autores prosseguem (1972, p.67): ‘Tornou-se corrente designar (as interacgdes humanas] simplesmente pe- los termos de interacgao simétrica e interacsao complementat. Podemos dizer que se trata de relagQes fundadas ou pela igualdade ou pela dife- renga. No primeiro caso, 0s parceiros tém tendéncia a adoptar umn com- portamento de espelho, a interaccao pode ser designada simétrica {...]- No segundo caso, 0 comportamento de um pareeiro completa o do outro para formar uma “Gestalt” de tipo diferente: designada interaccio complementar. Uma interaceto simétrica caracteriza-se portanto pela igualdade e a minimizagio da diferenga, enquanto que uma interacgao ‘complementar se baseia na maximizagio da diferenca. ‘Nama relagio complementar hi duas posigbes diferentes possives. Um. dos parceiros ocupa uma posicio designada como superiot, primeira ou “alta” (one-up), € 0 outro a posigdo correspondente dita inferior, segun- da ou “baixa” (one-down). Em certas situagdes, 0 contexto social ow cultural fixa uma relagdo complementar (por exemplo mae-filbo, médi- co-doente, profesor-estudante), em que comportamentos diferentes mas adaptados uns aos outros se interpelam reciprocamente. Quando o cliente ¢ o interveniente nao conseguem chegar a um enten- dimento sobre as suas posigdes reciprocas, 0s conflitos surgem fre- quentemente, o cliente recusa reconhecer a competéncia do interveniente € consequentemente, seguir as suas orientagdes; por seu lado o interveniente considera que o cliente no colabora. Noutros casos, se 0 terapeuta pretende que o cliente ocupe uma posicao simétrica (por exemplo convidando-o a fazer escolhas e a participar no seu tratamen- to), enquanto que este deseja ocupar uma posiggo de dependéncia, declinando a sua capacidade de fazer escolhas, a relagdo corre o risco de se tornar conflituosa. Formulagao de um modelo de ajuda profisional 33, Em resumo, estes axiomas salientam que num contexto de relagio de ajuda profissional, & indispensavel que o interveniente reconhega que a ‘comunicagao ultrapassa amplamente a troca de informagées e que implica ‘uma dimensio relacional multifacetada que as partes nao podem ignorar. interveniente deve ponderé-las ¢ utilizé-las de um modo estratégico nas suas intervengdes. Alids, na terapia centrada no cliente e na Gestalt terapia, o trabalho sobre a relacao e o contacto constitui o Amago da intervengio. No Ambito de uma intervencZo profissional, ignorar um destes axiomas pode por em causa a qualidade da relagio e simultancamente a intervengao. ‘Uma definigao de relagdo de ajuda Neste modelo a relacdo situa-se num contexto de ajuda profissional. Veja- mos brevemente 0 que abarca a expressio “relagio de ajuda” a fim de reflectir sobre 0 que este conceito veicula. O dicionério Petit Robert (1978, p.1651) define “relagao” como a: “caracteristica de dois abjectos tais que, ina modificagao num conduz a uma modificagao no outro [...]. Tudo 0 que nna actividade de um ser vivo, implica uma interdependéncia, unia interacgao (com 0 seu meio}. Quanto ao termo “ajuda” (Ibid. p40) € definido en- quanso: “Acgao de intervir a favor de uma pessoa conjugando os seus esforcos aos desta’, Estas duas definicoes destacam nitidamente toda a importancia da tro- ca e da influéncia reciproca que se estabelece entre as pessoas, assim como, a contribuicao de cada uma delas para a realizagao de um obctivo. Esta concepeao de ajuda ¢ muito diferente de um processo unidireccional através do qual um perito dispensa ajuda a um cliente que a recebe. Como temos vinde a analisar, a relacio de ajuda profissional é feita de trocas,o que exige ‘uma abertura miitua onde cada um aceita influenciar e ser influenciado, dar e receber. Em sintese, num contexto profissional, a relagio de ajuda consiste ‘numa interaccio particular entre duas pessoas, o interveniente eo cliente, ‘cada uma contribuindo pessoalmente para a procura ea satisfacio de uma necessidade de ajuda, Para tal o interveniente adopta um modo de estar e de fazer, e comunica-o de forma verbal e nao verbal em fungio dos objec- tivosa alcancar. Os objectivos estao ligados ao pedido do cliente e a com- preensio que o profissional tem dessa dificuldade. Os objectivos da relagio de ajuda Conforme os contextos da pratica, a relacio entre o interveniente ¢ o cliente pode ser utilizada para diferentes finalidades. Assegurando-se em criar con- digdes relacionais excelentes, o interveniente visa diversos fins, que podemos, resumir do seguinte modo: 4 caPiTULO1 ~ favorecer a presenca de um contacto fisico (pelos sentidos) ¢ de um con- tacto afectivos ~ assegurar que o cliente se sente compreendido e entendido; ~ assegurar(se) que o servigo oferecido & personalizado ¢ responde as ex- Fectativas do cliente; ~ estabelecer um clima de confianga, de calor e de respeito; ~ fivorecer uma participagao optimizada do cliente; ~ fazer desta experiencia relacional uma ocasiao de aprendizagem e desen- volvimento para o clientes = utilizar de um modo adaptado a exper ita contribua para os efeitos terapéuti incia relacional por forma que -as pretendidos; ~ en certas situagdes servir de meio psicoterapéutico privilegiado, para me- thor compreender relagdes traumiticas passadas ou mesmo, para as “re parar’. As fases da relacao de ajuda Quando uma ajuda profissional decorre ao longo de virios meses ou anos, € possivel reconhecer uma certa evolugdo da relacao entre o interveniente e © clente. A. semelhanga de Peplaut (1952), varios autores, entre os quais Cha ifour (1982), Hartman (1984), Stuart & Sundeen (1991), Travelbee (1978), Ujhely (1968), nomearam e descreveram um certo ntimero de fases cara-teristicas do desenvolvimento da relacio entre o enfermeiro ¢ o cliente. Outros autores de disciplinas conexas tais como Brammer (1979), Carkhuf (1969), Egan (1987), Mearns & Thorne (1989) e Rogers (1968) também se interessaram por estas fases. De acortio com a sua visto pessoal, dividem o procsso relacional num ntimero mais ou menos grande de fases que nao obstante é possvel reduzir a trés e que correspondem a0 inicio, ao corpo e ao fim da relacao, Para as qualificar utilizaremos as expresses empregues Por miltiplos autores em cuidados de enfermagem: fase de orientagio da relagio, fase de trabalho ou de emergéncia das identidades ¢ fase de conclu- sto da relagao (ver capfrulo 3). Cada uma destas fases evolui ao longo dos encontros, nomeadamente em fungao dos objectivos visados, do conteiido das trocas, da qualidade dos lagos entre as pessoas ¢ dos papéis assumidos por cada uma em fungio da necessidade de ajuda definida. 1. A orientacao da relagao Esta fase caracteriza-se primordialmente pelo acolhimento do cliente num. lima de abertura, de respeito, de autenticidade e interesse por aquilo que Formulagao de um modelo de ajuda profissional 35 cle €. A relagao comega a constituir-se. O interveniente e o cliente fami- liarizam-se, de um modo mais ou menos explicito, expressando as suas ‘expectativas e receios e confirmando ou infirmando os seus preconceitos. £ um momento privilegiado onde se criam lacos de confianga reciproca. # também a ocasido em que é concedida uma atengdo particular a0 co- nhecimento do cliente, a dificuldade que ele apresenta e as suas expecta- tivas. Gragas a recolha de dados, o interveniente pode estabelecer um diagnéstico estrutural e um diagnéstico da dificuldade do cliente e se for ‘caso disso, propor um plano de intervencao. 2. 0 trabalho ou a emergéncia das identidades [As pessoas conhecem-se melhor e aprofundam a sua confianga, Através da revelagdo de si, 0 ajudador e 0 ajudado podem progressivamente re- comhecer que sao diferentes ¢ tinicos. O ajudado compreende melhor a intervensao do profissional, bem como as habilidades ¢ os limites deste relativamente a ajuda levada. Por seu lado, o interveniente identifica melhor as capacidades do cliente para encontrar uma resposta a sua necessidade, Numa relagio marcada pelo respeito, compreensao, autenticidade, com- paixao e esperana, 0 ajudado terd, apesar dos seus receios, a coragem de se olhar, de se reconhecer e de se aceitar de um modo realista, de tomar decisdes e de efectuar mudangas na sua vida. Resumindo, esta é uma fase onde o interveniente ¢ 0 cliente tentam encontrar respostas satisfat6rias as necessidades definidas, gragas & expressio da vivencia do cliente ¢ pela ‘via de certas estratégias psicoterapéuticas. F igualmente a etapa da expe- rimentagio e da consolidacao das novas aprendizagens realizadas. 3. A conclusio A relacio de ajuda desenvolve-se no tempo. £ por isso importante, desde io, determinar © momento em que ela terminaré, Ao longo da te- lacao, particularmente durante os ultimos encontros, 0 ajudador deverd assumir um certo néimero de tarefas, visando facilitar a transicao entre a terapia e a vida quotidiana. Neste estadio, o interveniente e o cliente compreendem que a relagdo deve terminar. Dever utilizar este momento privilegiado para partilhar a sua visio desta experiencia comum e facilitar 2 transferencia das aprendizagens realizadas para outras situagoes de vida, £ com esta concepgao da relacao de ajuda que o interveniente entra em relagio. No ambito de ajuda psicossocial do nosso modelo, a vivéncia relacional expressa-se através de diferentes processos. Numa intervencao profissional corrente, utilizaremos nomeadamente a entrevista nos seus di- ferentes tipos e determinadas estratégias psicoterapéuticas: a terapia expres- siva que visa a abertura & consciéncia de si (awareness) e que serve de base 3 CAPITULO 1 as outras estratégias, seja a resolucio de problemas, a gesto da crise, 0 trabalho de luto e de suporte. A descricio destes processos & 0 objecto do volume dois. Por agora, importa situié-las num modelo de relacio de ajuda profissional. Vejamos em primeito lugar as caracteristicas da entrevista e em seguida as diferentes estratégias psicoterapéuticas. A entrevista A telagio de ajuda manifesta-se através e na comunicagio verbal e nio verbal que se estabelece entre o interveniente e o cliente, Esta comunicagio pode assumir formas muito diversificadas. Cabe ao interveniente assegurar- se da sua eficécia, Para tal precisa de se certificar de que a mensagem comun:cada é clara e compreensivel ¢ ainda, de favorecer uma estrutura de trocas edaptada em fungao do objectivo visado. Esta estrutura é inerente as caracteristicas da entrevista. Aqui o termo “entrevista” designa um tipo par- ticular de interacsées verbais e nao verbais entre um interveniente e um cliente,ao longo das quais os participantes utilizam certos modos de fazer ‘estar em funcio da compreensao dos seus papéis, do contexto, das suas caractetisticas particulares, do contetido tratado, dos objectivos esperados do tempo que acordaram para este fim. Um bom conhecimento ¢ uma utilizagio criteriosa das caracteristicas gerais da entrevista permitem optimizar as trocas. Estas caracteristicas referem-se a trés aspectos: relacionadas com as varidveis em curso na entrevista, relacionadas com as fases de desenvolvi- mento da entrevista e relacionadas com os tipos de entrevista realizados. ‘Vejamos sucintamente estes trés aspectos. As variiveis em curso numa entrevista Numa pritica profissional corrente, as trocas s4o muito diversificadas. Esta diversidade deve-se &s caracteristicas do cliente e do interveniente, a0 abjec- tivo da entrevista, ao contetido tratado, & duracao, & frequéncia; a0 lugar onde se desenvolve a entrevista e ao seu contexto situacional. O interveniente deve aralisar a influencia dessas variéveis sobre a qualidade da relagio € verificar se clas facilitam ou perturbam a entrevista e a consecucao do objec- tivo visudo. Considerando estas caracteristicas ele procura os meios neces- sérios para assegurar a eficécia da troca As fases da entrevista As caracteristicas que acabamos de enunciar junta-se um outro aspecto de analise da entrevista: 0 seu desenvolvimento. A sua anilise permite conhecer a evolupéo das varidveis no decurso da entrevista, Como todo o processo Formulacdo de um modelo de ada profissional a7 {que se desenvolve no tempo, compreende um momento de preparacio, de inicio, de corpo, de fim ¢ um “apés” (Benjamin, 1987 Fine & Glasser, 1996; Pauzé, 1984; Shulmen, 1982). A cada uma destas etanas, 18s aspectos 80 a considerar: 0 contacto ot a relacio afectiva e fisica, 0 objectivo e os temas e, as suas modalidades de desenvolvimento. Estes trés aspectos assumirao uma forma particular segundo as fases ¢ o tipo de entrevista. Para além de as reconhecer, o interveniente favorece a sua expresso. E seu papel assegurar a qualidade do contacto e dos temas que estdo em relagio com os objectivos, utilizando os meios que julga mais pertinentes e assegurando-se de que sio valorizados pelo cliente. mio reconhecimento de alguns destes aspectos pode ter consequéncias negativas sobre 0 resultado do encontro. s tipos de entrevista Em fungzo da sua formagao, das necessidades expressas pelo cliente, da concepcao do seu papel, do objectivo visado e do seu contexto de trabalho, © interveniente & susceptivel de realizar diferentes tipos de entrevistas (Bermosk et Mordan, 1964; Brammer, 1979; Mucchielli, 1975; Pauzé, 1984). Distinguimos cinco tipos de entrevista em fungdo da sua estrutura: a entre- vista inicial, a entrevista Gnica, a entrevista formal estruturada, a entrevista formal nao estruturada ¢ a entrevista frequente e de curta duragao. A entrevista constituird um instrumento terapéutico eficaz. desde que 0 interveniente saiba pé-la a0 servigo da relagdo e adapté-la as diferentes va~ ridveis em presenca. A intervengao psicoterapeutica ‘Até agora apresentimos as diferentes condicoes de base necessérias a toda ‘elagao profissional. Essas condigdes gerais aplicam-se tanto no ambito de um cuidado ou tratamento fisico, como no quadro de wme interven¢io psicossocial. Em variados contextos de pritica profissional, essas condicdes relacionais s4o suficientes para oferecer um servigo de qualidade; porém em muitas outras situagdes a qualidade da relacao tem um valor psicoterapéutico. Por analogia, poderiamos dizer que a dimensio relacional corresponde a0 cuidado & pessoa fe que a psicoterapia corresponde ao tratamento. Assim quando o cliente apre- senta uma necessidade particular de ajuda psicossocial, € possivel oferecer ‘uma ajuda psicoterapéutica especifica no ambito de entrevistas adaptadas a0 tipo de intervenco terapéutica escolhida, Na literatura corrente, estas distin~ bes nem sempre sio estabelecidas, 0 que deixa pairar uma certa confusio € ambiguidade relativamente aos conceitos de relacio de ajuda e de psicoterapia. & CAPITULO | ——————— CIOL Para melhor compreender as diferengas entre a relagio de ajuda e a psicoterapia, apresentaremos algumas definigdes de psicoterapia e descreve- remos sucintamente as diferentes estratégias psicoterapéuticas que retere- mos no nosso modelo. Definigdes de psicoterapia Para certos autores, o termo “psicoterapia” é reservado unicamente para intervenes de longa duracao visando o desenvolvimento e a transforma- sao da personalidade, Neste volume e no seguinte atribufmos-Ihe um sen- ‘ado mais ample, uma vez que admitimos que a psicoterapia pode igualmen- te ter como finalidade, ajudar uma pessoa através de processos psicol6gicos, @ modificar um comportamento, a gerir um sintoma ou um sindrome e a desenvolver as suas capacidades de adaptacio, Os diferentes tipos de estra- tégias aqui descritos debrugam-se especialmente sobre estes problemas. Dado © modo como propomos utilizar estas estratégias terapéuticas, cremos que «estas intervensdes terdo inevitavelmente efeitos benéficos sobre a personeli- dade, Porém, a terapia dirigida directamente as perturbacbes da personali- dade nao faz parte das estratégias terapéuticas descritas neste modelo. Veja- ‘mos agora algumas definigdes de psicoterapia. Os conhecimentos actuais em psicoterapia so muito diversificados. En- tre os modelos explcativos propostos, alguns opdem-se as estratégias sugeridas ‘ou mesmo & designagao do que ¢ terapéutico. Existe portanto uma grande variedade de definigoes de psicoterapia, o que por vezes torna dificil eleger juma de entre elas, Por exemplo, ao longo dos altimos anos, 0 dossier de psicoterapia do Gabinete das profssoes do Quebeque originou mltiplos desenten- dimentos, nomeadamente entre as profissdes de ajuda, relativamente a uma definigao comum de psicoterapia e as exigéncias do seu exercicio, Esta mesma dificuldade ressurgiu na altura de um coléquio organizado pela Ordem dos psicélogos do Quebeque acerca deste assunto, Apés uma vasta consulta levada a ‘abo por esta ordem profissional junto dos seus membros, afim de propor uma definigao de psicoterapia, Bélanger (1994, p.5) analisou as diferentes sugestoes € propés uma definicao da natureza ¢ dos objectivos da psicoterapia que con- siderou © conjunto das opinides recolhidas. Observemos essa defini AA paicoterapie & um processo de interacgdo dinamico, organizado com © objectivo de giudar uma ou virias pessoas com difculdades de ordem pst uica. Este processo assenta num conjunto de procedimentos e de métodos de intervencao utlizados por especalistas cuja competéncia particular foi avaliada por um organism inter profissonal habilitado pata esse efeito. A «acgdo do psicoterapeuta resulta de attudes e de conhecimentos cientificas € priticos referentes & dindmica da mudanga, assim como a0 desenvolvi- ‘mento e a0 funcionamento psicoldgico normal e patolégico. ‘Traduz-se es- Farmuluto deur modelo de ajuda profisional 39 ss sso inencional,fndado sobre a interacgo de {Suis posous pests conetad para elude poblanas fetes, Comportamentse soca, ut finale €susctar uma mudans por tans dude no fanconamento pilin do (ou dn) cliente). Exe proceso, que situa os its de um contract teraptic eo contest Ae uma rly profsional cons ote deve eer sonore 3 0 sms deétca O pscoterapeutacompromete-s a confdensialidade tra pessoa do dlente com mais profundo respeito Esta definiggo permite discernir mais nitidamente aquilo em que a psicoterapia se lstingue da reagdo de juda profissiona,corrente Para ale disso mostra como a relacéo de ajuda profissional ¢ arte integrante dela, Corsini (1984) di uma explicago parcial para esta difetldade de formulas de una nia defingao de psicoterapia« que resulta o facto dos grandes sistemas psioterapéutcns apresentados nas obras cinta se assemelharem estranhamente&s pessoas que os descrveram, Por exemplo,o auto identifea ‘uma grande semelhanga entre @ personalidade de Rogers, de Freud, de Perls fe de Moreno e os seus sistemas teraputicos respectivos. Segundo 0 autor, podem existir tantas definigoes quanto as formas de psicoterapia existentes. Porém, econhece que as picterapias tm como caracteristica comum cons tturem-se como meétodos de aprendizagem Todas ss pioterapas diz Corsini se propdem mudar as pessoas, gjudando-as a pensar de um modo diferente (cognigio), 2 sentizem-se diferentes (sentimentos) ¢ a agir distintamente. ‘A psicoerapia € uma aprendzagemsnalgumaso cients aprende algo nov, noutrasaprende como aprende. Noutras ands, paradoxalmente, pode ser ‘uma ocasigo de desaprender para reaprender aquilo que o cliente j4 conhece. No nosso modelo reteremos uma definigao mais global de psicoterapia, formulada por Frank (1996, p. 5): Secouiades legs de fet, de reconhecimento © de gutonomiy Shands orig co de cet oges cet comport shenosesadapaos que pruda saago dass needs Nest sentido, pacotrapa procure anentar ay neces soci © ferry vera sadn s psa a acta osteo emo Cimaspo ete! did squad pose a yl a servigo do seu deenwolvinento peal No ambito deste modelo, saientamos cinco estratégias psicoterapeuticas «que diferentes profissionais de saide sio susceptives de utilizar na sua prtica geral. Cada uma enquadra-se numa visio existencial-humanista da pessoa ¢ da intervengio terapéntica, A escolha de uma ou de outra destas estratégias, relist em fangio da dificuldade vivenciada peo clients, das suas carat risticas, das suas expectativas ¢ do contexto da pritica. Lepende ainda, eviden. temente da competéncia que possui o interveniente pera a utilizar. = CAPITULO 1 A terapia expressiva favorecendo a consciéncia de si (awareness) No nosso modelo, a terapia expressiva &a base das outras quatro estratégias ¢ serve-lhes continuamente de suporte. Esta estratégia constituiu em certa medida a ponte entre a relagdo de ajuda profissional ¢ a terapis. Visa pri- mordialmente a tomada de conscitncia de si (awareness). Esta tomada de consciéncia debrusa-se particularmente sobre os processos psicoligicos que J deserevemos, No seu desenvolvimento, procedimentos e técnicas,aterapia expressiva inspira-se na abordagem centrada no cliente (Meador & Rogers, 1984; Mearns & Thorne, 1989; Rogers, 1968; Rogers & Kinget, 1963a, 1969b) na terapia Gestalt (Bouchard, 1990; Delisle, 1992, 1998; Ginger, 1992; Perls, Heflerline & Goodman, 1979; Polster & Polster, 1983; Zinker, 1981). A terapia de resolugio de problemas Entre as diferentes intervengdes terapéuticas descritas neste modelo, a tera- Pia de resolugio de problemas é a mais conhecida dos clinicos dado que na sua pritica corrente se inspiram nela e isto mesmo fora do contexto Psicoterapeutico. Todavia, num contexto psicoterapéutico, esta abordagem tem as suas indicagses particulares e os seus limites. Deveremos sonceder- lhe uma grande atengio a fim de a utilizar com conhecimento de causa, Esta estratégia terapeutica ¢ particularmente indicada a curto e médio prazo quando o cliente deseja aprender a gerir um sintoma ou a modifica um Comportamento que Ihe provoca sofrimentos, Esta estratégia ¢ usialmente utilizada como complemente no quadro de outras intervengdes terapéuticas. Esta intervengao pode assumir diferentes formas (no volume 2, descrevere. ‘mos trés que podem ser utilizadas de modo complementar), A terapia da crise A terapia da crise ¢ utilizada particularmente quando o cliente se encontra refém de dificuldades de adaptagao, de desenvolvimento ou situacionais, Esta abordagem, uilizada a curto prazo, centra-se em primeiro lugar na dificuldade vivida pelo cliente ¢ visa judé-lo a reencontrar 0 estado de equilib que ele conhecia antes do aparecimento da crise. Para tal, um processo guia o interveniente ¢ o cliente desde o principio até ao fim das intervengbes. Uiizada ‘numa éptica existencial-humanista, esta estratégia concede wm lugar impor tante 20 cliente durante todo o processo terapéutico, quer seja no modo de Prestar atengdo a si-mesmo ou na importincia dada as suas escolhas ¢ aos seus recursos pessoais. A terapia do luto © trabalho de tuto refere-se a diferentes tipos de perdas em relagio com Pessoas ou objects de valor afective. Na pritica corrente, o protisional Formulagao de um modelo de ajuda profisional aL FIGURA 1.2 - | Os processos em curso na relagao de ajuda profissional © CLIENTE —————> Diz, faz ————>_0 INTERVENIENTE Um sista aberto Um sistem’ abbrto pogo, cognate, lic, conte, ‘A intorvengio ‘ : mel, cea, paleotorapeutica sori, fet afectivo e espiritual) @ espiritual Terapia expressiva eeerd Possui certos: poste de orca Se i i tives or Connecmentos — mec ensagbes —percepoaes Terapia de recolugdo __~80 eu pepe! Spensariewtes "de problemas” “— ~des teotas erage 08 preceesos “revessiaes Possui habilidades mee contacto de interpreta Esta em interacgao com o ambient <— Terapia da crise <— das mensagens de comunicagao de acompanhamento de certos processos , unos ca Vive tensdes « Terapia do luto ~atitudes . ~ (empatia, respeito, crore ee : force ee oe ajuda esperanga) ‘Manifest . aeerepia wI ~ Manifesta Se le re ee cy Pests ae © AMBIENTE E © CONTEXTO nifestagdes no cliente € ajuc deve ser capar de identificar as suas manifestagi fazer o trabalho de luto subsequente, ajudando-o a reconhecer a realidade da perda, acompanhando-o ao longo do estado depressivo dai decorrente ¢, apoiando-o no periodo de restabelecimento a aceitar reinvestir na vida e a conceber novos projectos apesar da perda vivida, Ao longo do trabalho de Iuto, 0 interveniente deve saber utilizar com competéncia as estratégias te- rapéuticas do modelo, A terapia de suporte O suporte pode utilizar-se em numerosos contextos de trabalho para enco- rajar ou ajudar emocionalmente uma pessoa numa experiéncia dificil, Mas enquanto estratégia terapéutica, dirige-se primordialmente §s pessoas que vive distiebios severos, temporirios ou persistentes. Esta estratégia pode ser utilizada eficazmente com pessoas que apresentam limitagdes intelec- tuais importantes. Como as outras estratégias terapéuticas deste modelo, compreende regras e exige diferentes “estratagemas”, por exemplo dar segu- ranga, servir de agente da realidade ou ensinar. Os trés processos que acabamos de descrever transformam-se, numa interdependéncia continua, ao longo da relagao de ajuda; a sua sinergia constitui a ess@ncia do processo presente na relagao (ver @ figura 1.2): Se- gundo a necessidade definida, a duracdo da relacdo e as caracteristicas das, essoas envolvidas, uma parte mais ou menos grande seré dispensada a. um ‘0u outro dos processos presentes. Resumo A pessoa possui uma tendéncia natural para a actualizagao das suas possibilicades, Para tal, procura em si prépria eno seu ambien- tes recursos de que necessita. A necessidade de ajuda surge quan- do, conscientemente ott nao, ela nega ou ignora uma parte de sie se impede de a expressar. Agindo deste modo, torna-se uma esira- nha para si propria, A ajuda profissional do interveniente visa gju- dar o cliente a aprender ou reaprender, a estar i escuta dos proces- 505 internos do seu organismo ¢, a expressar-se livremente. Gragas a esta maior proximidade com a sua natureza auténtica, a pessoa poderd buscar no ambiente os recursos de que necessta, respeitin- do as regtas que o orientam, O cliente atingird estes objectivos na ‘medida em que o interveniente for capaz de conjugat os seus saber, saber-fazer e saber-estar com os dele, numa relagio marcada pela aceitaséo, compreensto, acolhimento e esperanca. Esta intervencio suporta-se em regras de aplicagio de trés processos: a relagio em si propria, a entrevista e, quando necessério, a intervencio psicoterapéutica Formulacta de wm madelo de ajuda profssional 43 Bibliografia [Acuitts4, D.A, (1995) intervention en situation de crise théove ot méthodolgie traduit par 'M Zeghouani, Montréal, Editions du Renouvean pédagogique. 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