You are on page 1of 15
INFLUENCIAS TEORICAS NO ENSINO E CURRICULO NO BRASIL TERESA ROSERLEY (ROSE) N. DA SILVA da Fundagdo Carlos Chagas e FE/USP Este artigo faz um breve inventério das principals influén- clas te6ricas sobre a organizacso do ensino e do curriculo, desde 0 Idealismo subjetivista e 0 modelo da eficiéncia burocréticea — preponderante nas primelras décadas do século XX — passando pelas teorias cognitivistas ou behavioristas dos anos 50, cuja énfase as fases do desen- volvimento Infantil permitiu métodos de ensino @:organi- zagbes curriculeres mals realistas e adequadas, Aborda ainda as teorias que, embora nao se reflitam diretamente ‘em propostas curriculares @ organizativas em nossas esco- las, permitem criticar @, eventualments, reorlenter essas propostas: as teorias sobre a desigualdade de oportunids- des educacionsis, de Coleman e Jencks; as do conflito, de BaudelotEstablet, BourdieuPasseron © Bowles-intis; ‘as correntes interpretativas @ etnogréficas, que propem @ reforma do curriculo e do funcionamento interno da escola, Cad. Pesq., So Paulo (70):5-19, agosto 1989 ‘SUMMARY ‘The article reviews the main theoretical influences on ‘teaching and curriculum in Brazil, from the subjectivist idealism and the model of bureaucratic efficiency applied to school — prevailing in the beginning of our century — ‘through cognitive and behaviorist theories of the 50's — of which the stress on child development phases has led to ‘more suitable and realistic teaching methods and curricula. Other currents are also reviewed which, though not di rectly applicable as proposals of curriculum and school ‘organization, provide the grounds to criticize or to re- ‘model existing proposals: theories on the unequal edu- ‘cational opportunities (Coleman, Jencks); conflict theories (BaudolotEstablet, BourdieuPasseron, Bowles-Gintis); and Interpretative and ethnographic currents, recommending changes in both the curriculum and the internal func- tioning of school. © exame das correntes de pensamento que orienta- ram a configuracdo do ensino e curriculo no Brasil, neste século, precisa remontar ao comego dos tem- pos modernos, na Europa. A escola elementar surge, af, para atender sobretudo a necessidades da nascen- te burguesia, sendo eminentemente urbana. Os pe- quenos comerciantes tinham necessidade de ler, es- crever e expressar raciocinios mateméticos em lingua vernécula local (e no em latim, que era. a lingua ial” da época). O modelo original de escola burguesa, entéo, néo conduzia a nenhum grau de en- sino médio ou superior, tendo como objetivo unico permitir aos alunos receber uma quantidade limitada de instrugao. Tal escola encontraré apoio em trés ordens de fatos: a descoberta da imprensa, a reforma protes- tante € 0 desenvolvimento do liberalismo econémico. © primeiro facilitou a disseminaco de livros: 0 se- ‘gundo deu um fundamento religioso-cultural ao apren- dizado da lingua, na medida em que se considerava ‘como direito e dever de cada um ler a Biblia; o ter- ceiro, por interesse da prética p forcat a consciéncia coletiva de que cada homem. devia adquirir dominio intelectual suficiente para compreender os problemas politicos, sociais e eco- némicos de seu tempo, bem como para situar-se ade- quadamente no conjunto dos fatos naturals, libertan- do-se de temores e supersticées ancestrals. As condi¢des socials, econdmicas e culturais do iluminismo racionalista — cujos movimentos politico- filos6ficos foram forjados nas tendéncias individu listas, idealistas e naturalistas do renascimento, exal- tados pela reforma luterana, pelo racionalismo car- tesiano e' pelo empirismo de Bacon — originaram a escola priméria comum @ the condicionaram o cur- riculo. Determinou-se, entéo, que era fundamental & formago comum a aquisicéo das técnicas bésices de ler e escrever, associadas & necessidade do célculo elementar. A ampliago desse curriculo ori- ginal ocorreu em funcdo da necessidade ideolégica do liberalismo, de fazer com que todos conseguis- ‘sem, de modo geral, situat-se em relagao ao conjunto dos fatores naturais e sécio-politicos. Os séculos XIX @ 0 nosso assistiriam as lute pela universalizacdo da escola para todos, isto , para as populagées urbanas e rurais. Esse proceso — marcado por momentos de maior ou menor am- pliagéo quantitativa da escolaridade bésica, assim ‘como pelo acionar de mecanismos de distribuicéo desigual das ferramentas conceituais implementadas nna escola — vai se caracterizar pelo questionamento da escola cinica para todos e pela escotha de dife- rentes quadros curriculares @ formas de organizagao do trabalho na escola para diferentes clientelas. Nesse processo, 0 fator econdmico teré papel relevante nas mudangas que ocorrerao no curriculo € na estrutura e organizagao das escolas. Nao serd, porém, o nico. Explicar as mudancas ou o desenvol- vimento da educacéo somente em termos econdmicos seria uma simplificaggo. Houve mudancas reals de atitude, de conhecimento, ideolégicas, que esto assocladas as pressdes econdmicas ¢ tecnol mas que, conceitualmente, séo diferentes delas. Este artigo parte do pressuposto de que nao & possivel desconsiderar que houve neste século um avango enorme nas éreas do conhecimento cientifico e das ciéncias humanas que contribuiu, de forma significativa, para a mudanga ocorrida no sistema ‘educacional como um todo. INFLUENCIAS DIVERSAS ATE O INICIO DO SECULO XX Os trabalho sobre educagéo de Comenius (século XVII) e de Rousseau (século XVIll), embora néo resul- tassem de estudos sisteméticos, concluiram que a crianga nfo podia aprender tudo, nem aprender como © adulto, que ja dispde de uma experiéncia organiz da. Dessa posi¢ao resultava a necessidade de gr duago do ensino, que deveria partir do mais fécil para o mais dificil seguindo-se, na aprendizagem in- fantil, 0 modelo fornecido pela natureza, que néo exigia da crienga sendo 0 que ola poderia fazer. A aprendizagem deveria se basear no conhecimento prévio da crianca e favorecer 0 exercicio dos senti- dos, evitando a memorizacdo nao funcional 4Jé como decorréncla do liberalismo racionalizado de época, Locke (século XVIII) propunha, em suas teo- rlas psicolégicas, que todo o contetido mental resul- tarla da experiéncia. A mente seria uma folha em branco, uma “tébua rasa”. Todas as Idélas provinham, da experléncia, Dai ser a educacdo um processo de fora para dentro, quer se tratasse da educagio fisica, ‘moral ou intelectual. O objetivo seria a formagéo de hébitos, adquiridos pelo exercicio ou disciplina do corpo € do espirito. © ideslismo subjetivista © Idealismo racionalista de Descartes (que revivera fa crenga nos poderes da razo humana) recebera, na segunda metade do século XVIII, o impacto do crit cismo kantiano que destrufa todos os critérios de certeza. Estes no seriam exteriores & mente, mas condigées inerentes & prépria mente. (© novo idealismo passou a recusar 0 ponto de vista politico segundo o qual o Estado era concebido como entidade que transcende a personalidade hu- mana. Situando 0 mundo das idéias na consciéncia individual, essa corrente admitia mais facilmente 0 conceito de liberdade da pessoa humana em suas varias formas, bem como 0 conceito de direito natu- ral, Inerente ao individuo e independente de aceita- ¢40 ou recusa do Estado. O Estado, assim, passava 8 posigdo de entidade secundéria e derivada, como produto de uma convencdo pela qual os individuos renunciariam a uma parte de sua liberdade e de seus direitos originais, em beneficio da vida comum. Mas, no século XIX, apés a queda de Napoledo ‘edo movimento restaurador, 0 Idealismo se converte ‘em movimento filoséfico de prudéncia e mediagao. Cad. Pesq. (70) agosto 1989 ‘A fonte ultima de todos os valores espirituais era o individuo considerado, porém, apenas em sua univer- salidado, isto 6, naqueles aspectos racionais e morais que 0 ligam aos outros individuos € cuja expresséo exterior 6 historicamente condicio Segundo a nova posi¢éo idealista, 0 individuo néo nasceria livre, mas conquistaria a liberdade, que deixaria de ser a negacgo de qualquer relacdo de coergéo social, mas a aceitacdo de todos os limites que @ propria consciéncia apresenta como necessé- rios (consciéncia racional de um imperativo categ6- rico). Em vista disso, as instituigdes humanas — da familia 20 Estado — no seriam forcas hostis e re- pressivas da personalidade, mas os meios pelos quals a personalidade se formaria e se libertaria. © compromisso com essa filosofia idealista re- sultou na nfase, para a educagio, ao intelectualis- ‘mo @ a0 moralismo. O intelectualismo escolar © con- seqiiente enciclopedismo traduzia-se, no curriculo primério, na necessidade de dominio das técnicas fun- damentais da leitura © escrita, célculo aritmético, nogdes de conhecimento cientifico e hist6rico acres- cidos, mals tarde, de educacao fisica e trabalhos ma- nuals. Na medida em que o individuo precisaria apren- der a bem situar-se em face da vida natural, civil & cultural, faziase necessério desenvolver todas as ‘suas potencialidades. Isto obrigava o programa esco- lar a abranger um nimero excessivo de matérlas, pols era preciso garantir a0 aluno a maior quantidade Possivel de no¢bes. O moralismo religioso @ o civis- mo manifestavam-se, também, pela simples transmis- so de nogées a serem memorizadas. De acordo com a base te6rica desse curriculo — filosofia idealista subjetiva — o fundamental era adquirir as nogées © compreendé-las: tudo om vinha depois. Havia mesmo quem advogasse que a compreenséo poderia ser posterior, bastando que as nogées ficassem armazenadas. Segundo essa viséo filoséfica, o sistema educa- ional deveria formar a personalidade do individuo, Personalidade esta que deverla ser moldada segundo lum ideal subjetivo de qualidades racionalizedas, que Independiam das condigbes socials e das caracteristi- cas psicobiol6gicas. O objetivo da educagdo era aper- felgoar 0 Ideal da personalidade cultivada, concebida ‘como um equilibrio de qualidades racionais. A forms- ‘so da personalidade, pois, implicava em possuir um conjunto de valores cuja realizacéo deverla constituir 08 objetivos da aprendizagem: cardter, justica social, diferentes habilidades, amor, conhecimento, artes, fi- losofia, religio. A Psicoblologia nascente Por outro lado, comeca a surgir no século XIX certa atitude de consideracéo em relagéo as criangas e jovens, tanto por inspiragéo filos6fico-social quanto ‘em virtude dos avancos da Psicofisica e Peicobiolo- gia, que permitem novos processos de pesquisa e teorizacéo. Pestalozzl, influenciado pela psicologla empirista Influéncias tedricas no ensino. de Locke e pelo filantropismo romantico naturalista, propunha um método que comecava pela observacdo, Passava desta para a elaboragio consciente e final mente chegava & expressao. O curriculo inicial seria determinado pela observacdo simples, pela formagio do idélas © sua expressio oral, pelo medir, desenhar, escrever, calcular. Partindo do préximo para o distan- te, o importante era 0 ambiente imediato que deveria Ir-ge alargando no tempo e no espaco, dando origem a0 curriculo que se julgava essencial a escola pri méria. Froebel (século XIX), assim como Pestalozzi, considerava que 0 curriculo dificiimente poderla ser formalizado, j6 que a crianga se educava a partir de ua prépria atividade. Horrorizado com 08 processos primitives da es- cola de seu tempo, formula, ainda que sem base experimental, seu conceito de ensino com base na intuigdo. Esta, porém, néo se refere & percepcéo pelos sentidos; para ele, a intulcdo 6 uma realizagio con- crete, que permite compreender uma idéla que jé vive no educando. ‘Ao formular seu método didatico, entretanto, ele o faz a partir de uma perspectiva indutivista empiri- cista — 0 olementarismo. Propde que a crianca seja ensinada a considerar cada objeto como uma unidade fem si, Independente de outros objetos que parecam estar a ole assoclados. Assim, decomp6e a prépria in- tuigdo nos elementos que a constituem: os sons (aprendizagem da lingua); a8 formas (geometria, de- senho); e némero (contagem, céleulo). Em fungéo desta decomposicdo ficava praticamente determinado © programa da escola elementar. Pestalozzl, porém, procurava partir da crianga para o ensino @ no de uma predeterminacéo do conteddo a ser ensinado & crianca. © papel decisivo do formalismo de Herbart Herbart, ao aproveitar os dados da Psicofisica e da Psicoblologia recém-surgidas, propée idélas pedagé- gicae de cunho mais naturalista e realista, que melhor condiziam com 0 espirito de século XIX. Assim como Kant, ele considerava a coercio ele- mento fundamental em educagéo, pois acreditava que, pela formacao do hébito, a crianga era preparada para receber, na forma de principios de conduta, leis, primariamente impostas de fora. Para Herbart, a vida mental consistia num jogo de representagées ou reacdes da mente sobre o meio @ que néo exigia uma atividade transcendental. Adota, um assoclacionismo Idealista quando afirma que o conteddo da conscléncia teria dois tipos de repre- sentagdes: as meramente formals ou légicas © as materiais ou fisicas. Sendo a vida mental o resultado de tal jogo de representacdes, dirigir e formar a vida mental seria 0 objetivo basico da formagdo do Individuo. Portanto, educar 6 instrulr. Entretanto, para que a instrugéo fosse proficua, serla preciso despertar 0 interesse do aluno. Nao um interesse afetivo-biolégico mas interesse mental, ou seja, 0 gosto que se adquire por algo, 0 prazer de conhecer e compreender alguma coisa. Dessas premissas surgiu o método herbartiano, uma série de processos rotinizéveis tendo por base 0 seguintes pressupostos: partir sempre daqullo jé conhecido pelo aluno: assoclar 0 novo ao jé conhe- cido: usar a experiéncia anterior do aluno como base para a atividade didética: cultivar o desenvolvimento moral, com base na instrugdo; estabelecer fases ou passos formais do ensino. Assim, enquanto Herbart colocava malor énfase na inteligéncia © na instrugdo, Froebel e Pestalozzi apostavam na atividade esponténea da crianca e no ambiente de ensino-aprendizagem. Entretanto, 0 formalismo de Herbart iria prevale- ccer na organizagao dos sistemas nacionais de ensino a partir do final do século XIX, porque era mais fécil, menos revolucionério e mais suscetivel de rotinize ‘go e uniformizagao. O grande apelo do formalismo herbartiano estava no seu caréter ciclico e associa- clonista, que propunha a organizagéo dos contetidos partindo do j4 conhecido para o que deveria ser co- nhecido, de forma a possiblitar aos alunos, em niveis mais adiantados, recorrer sempre ao que fora ensi- nado num momento antecedents, caminhando assim ara 0 aprofundamento e a extensao cada vez maiores do contetido. Por outro lado, os trabalhos de Pestalozzi ¢ Herbart influiriam na metodologia de ensino, que asserla a ser a grande preocupacdo do final do ‘século XIX, devido aos novos conhecimentos da Psico- logia. ‘Ao movimento elementarista ou atomista em Psicologia passou a corresponder 0 movimento in- tuicionista em Pedagogla. Procurou-se substitulr 0 ensino das nogées através de processos verbais e ‘mneménicos pela experiéncia sensorial, substituindo- ‘se, assim, 08 elementos considerados logicamente simples polos que 0 fossem psicologicamente. ‘A preocupacdo metodolégica, neste periodo, seré constante. Acreditava-se que, desde que os métodos fossem adequados, o curriculo poderia ser cumprido. Dai, a Importéncia atribuida aos métodos pedagégi- cos, que, se fossem bons, cientificamente formule dos, tudo alcangariam. Havia grande valorizacdo das formas didéticas, dos métodos de leitura, dos méto- dos de aprendizagem do célculo, com preocupagio constante de seguir processos de ensino ditos cien- icos. Néo se tratava de inventar métodos miraculo- 808, de ensino rapido, mas atingir 0 método exato de ensinar, que, uma vez alcangado, se tornaria formal @ invariével.. © contetdo curricular nfo era a questéo de maior importancia. Ele podia ser determinado facil- mente, desde que tivesse um cardter naturalistico, partisse da experiéncia individual (intuicionismo pes- talozziano), adotasse um cardter elementarista (ato- mistico) formalizével em passos metodolégicos bem definidos e visasse uma certa formacéo geral do edu- cando (corpo, espirito € relagées morais). Nao se tratava, entéo, do que mais tarde se denominaria for- ‘macao integral do educando sim, de acordo com a linguagem da époce, de desenvolver todas as poten cialidades inatas do individuo. Dada a énfaso aos métodos do ensino, resultante do evolucionismo na Biologia e Psicologia do final do século, e considerando, além disso, a organizacéo dos conteddos de acordo com o sistema ciclico proposto por Herbart, e graduados de acordo com os diferen- tes estagios de aprendizagem infantil, com dificulda- des e obstéculos a serem transpostos — pareceria Sbvio esperar que o ensino ocorresse de forma con tinua, sem grandes saltos ou retrocessos. Entretanto, a organizago do ensino seré contra- ditorlamente muito mais rigida e inflexivel. Os siste- ‘mas de ensino herdaro do préprio idealismo © con- seqUente formalismo herbartiano, o pressuposto asso- Clacionista de que 08 conceitos e idéias devem obe- decer a um principio de hierarquia. Logo, seria pre- iso ter certeza absoluta do que era conhecido, da mesma forma que era preciso garantir, de acordo com a viséo enciclopedista, que todos ‘safssem da escola dominando um certo rol de contedos. Isso possibilita compreender a importancia dos exames como critério de promogao e a conseqiiente quebra de continuidede do ensino, independente dos cuidados com a sua graduacéo. Uma ver aplicado 0 método certo, @ aprendiz gem deveria ocorrer. Caso isto néo acontecesse, 0 ‘aluno repetiria o ano, ou seja, deveria refazer o mes ‘mo curriculo do ano anterior, talvez com os mesmos métados. ustficava-se, assim, a repeténcia, o poder xa cerbado das provas de verificacao de aproveitamento escolar, 08 regimentos escolares prescrevendo mint ciosamente regras de atribulco de notas, a exigén- cia de realizacéo de provas e exames de final de ano, Tals idéias néo deixariam de refletirse no Brasil do final do século XIX, e aparecem em varias propos- ‘tas educacionais entre as quals cabe destacar as de Ruy Barbosa. € possivel notar, nesse periodo, no pals, uma orientagdo nitidamente intelectualista: certa énfase ao’ estudo das clénclas, mediante a experl- mentagdo © a observagéo (que atesta a presenca da didatica experimental positivista); © uma excessiva preocupagéo metodolégica, uma busca constente de métodos de ensino considerados clentificos. PRIMEIRA METADE DO SECULO XX © curriculo presente no Brasil no inicio do século XX resulta das diferentes teorias até aqui expostas. Quer nas disciplinas mentais transformadas em no- Ges intelectualizadas — que ocuparéo a maior parte do tempo didrio das atividades escolares — quer nos exercicios fisicos e nas licdes de moral e civismo, parte-se sempre de uma série de conteidos gradua- dos em ordem crescente de dificuldade. Nossos contetidos escolares mudariam pouco durante a primeira metade deste século, com exce- {¢40 do acréscimo de trabalhos manuals, que se justi- va agora néo 36 devido & importéncia atribuida & experiéncia sensorial, mas pelo proprio agigantar- Cad. Pesq. (70) agosto 1989 -se do capitalismo industrial. Os trabalhos manuais, na escola abrangiam, geralmente, 0 desenho, a mo- delagem, o recorte, a tecelagem, © néo tinham caré- ter profissional ou pré-profissional. No final do século XIX, o positivismo toma vulto em conseqiéncia do grande sucesso que obtivera para explicar alguns problemas sociais, decorrentes das grandes mudangas econdmicas e politicas do final do século. Emile Durkheim e outros socidlogos europeus, que tiveram grande influéncia entre nés, acreditavam que a sociedade era uma realidade psicossocial dife- renciada, existindo independentemente dos in duos que a integram. Para eles, os fendmenos socials e psiquicos ‘eram resultantes de varias formas de interacéo, estas seriam, conseqientemente, a origem e essén- cia da sociabilidade. Dessa perspectiva, a educagéo passa a ser vista como um fendmeno eminentemente social, dependente de miltiplas varlaveis, ou seja, variéveis politicas, econdmicas e culturais, Esta serd a Idéia sociolégica bésica a partir da qual os educadores do comego do século irdo criticar 08 curriculos existentes, considerados disfuncionais fe excessivamente carregados de contetidos class cos, que no diziam respeito a mudanas que ocor- riam no inicio do século XX. As idéias soclolégicas de Comte e Durkheim, contudo, acabariam colaborando para acentuar 0 ca- réter enciclopédico do curriculo brasileiro, uma vez que este se tornaria mais extenso na érea de Geome- tria, Matemética e Nogées de Coisas nas primeiras séries e enfatizaria, ainda mais, a Educacdo Moral e Civica, aliada indispensavel para o caminho do pro- gresso com ordem, préprio do positivismo da época. A partir da Primeira Guerra Mundial e das gran- des crises econémicas do comeco do século — que abalaram significativamente a sociedade ocidental moderna — a educago passa a ser proposta como 0 mals poderoso instrumento de reconstrucao social, politica e moral — responsével pela melhoria social @ bem-estar coletivos. © individuo passa a ser visto como resultante de miltiplas influéncias do ambiente social. Questio- nase a possibilidade do ensino realizar-se somente na sala de aula, uma vez que o individuo 6 formado ‘4 semelhanga de seus contempordneos, e, conse- qientemente, a amplitude de desenvolvimento pos- sivel do individu s6 pode ser dada pela sociedade. Os estudos e avancos das Ciénclas Humanas, princi- palmente em relagdo ao desenvolvimento psicobiol6- gico, descrevem a crianga como um ser em constan- te interacdo social. A escola, entéo, 6 enfatizada ‘como parte fundamental da comunidade e é a comu- niidade em si, assim como a sociedade, que deve ser (© ambiente privilegiado e 0 campo de trabalho da escola. Em educacdo, tanto a corrente renovadora euro: péla como a norte.americana propunham que a escola priméria no tivesse como objetivo primordial as ma- térias de ensino, mas os processos do desenvolvi- mento das criangas, que deveriam ser estimuladas Intluéncias tedricas no ensino. da melhor maneira possivel. A escola deveria ser viva e ativa, ou seja, rica em atividades comuns vida das crlangas e realizadas em grupo, de forma socializada. No entanto, os europeus foram mais formalistas @ menos radicals: para eles, a escola permaneceu um local separado da comunidade. Nela, organizaram ‘08 “centros de interesse”, isto 6, escolhiam assun- tos considerados do interesse da crianga, para os, quais eram propostos métodos e materiais de ensino especializados visando transformar a escola num lo- cal belo e atraente. Buscavam também agucar os sentidos das criangas com exercicios adequados e planejados previamente. © pragmatismo norte-americano (© questionamento em torn do papel da educagio serd alimentado, primordialmente, pela filosofia prag- mética, que tera em John Dewey seu grande siste- matizador. Essa teoria da vida e da experiéncia hu- mana vé 0 homem basicamente como um organismo, situado num ambiente que se modifica e se refaz continuamente. O homem sofre estas modificagdes e nelas intervém em seu proprio beneficio. Daf a importéneia de conhecer as funcdes d= coisas em ‘seu meio ambiente. O que importa néo 6 a natureza abstrata de um dado objeto, mas suas operagées € relagées no mundo de nossa experiéncia. Dessa forma, promover a cultura do grupo é a grande tarefa da educacdo. As criangas devem ser capazes de viver cada vez mais a vida grupal e acel- tar essa responsabilidade, Nao é suficiente viver a cultura de uma época determinada. Numa situacéo de mudanga acelorada, 6 preciso preparar os jovens para enfrentar o futuro, ou seja, condicdes ainda des- conhecidas. Desse ponto de vista (experimentalista, pragma- tiste) a educagdo onfatiza primordialmente o proces- 30 metodolégico, a aquisigdo de meios, de formas de ‘comportamento, através dos quals os alunos séo pre- parados néo s6 para a resolugo dos problemas con- tidos nas situagdes atuais, como das que ainda estéo por vir. Para Dewey (1959), “o conhecimento € primor- dialmente um instrumento de conduta, néo de pura ‘especulagio conceitual... 0 raciocinio néo se origina ‘em premissas universalmente estabelecidas, mas, ‘em obstéculos concretos com os quais o homem so depara, Ele nfo caminha nunca para uma verdade transcendental, mas para uma hipétese, que se tor- naré verdadeira mediante a avaliacéo prética da expe- rigncia... A fungéio do pensamento, portanto, 6 a de controlar e modificar 0 mundo de acordo com as possibilidades e necessidades humanas” ‘A educagéo, portanto, deveria desenvolver todas ‘as aptidées que pudessem habilitar 0 individuo a controlar seu meio ambiente e realizar suas pos: lidades. Porém, como 0 individuo vive em socledade, © desenvolvimento dessas aptidées deveré estar vor tado néo para um simples condicionamento do com- portamento, mas para a melhoria e bem-estar progres- sivos de toda a coletividade. Dewey. apoiado nos resultados promissores da Psicobiologia do final do século XIX e reagindo tam- bém ao verbalismo pedagdgico, propunha que a esco- la deveria desenvolver as aptidées e as habilidades das criangas por meio de experiéncias vividas. Era 0 famoso “aprender fazendo". Para Dewey e seus seguidores, a escola era uma ‘agéncia da comunidade. As criancas deverlam organl- zar-se em grupos para enfrentar situacdes semelhan- tes as de sua vida cotidiana e fazer, inclusive, julga- mentos acerca do préprio processo de ensino e de avaliagdo a que seriam submetidas. Elas aprenderiam a ler, contar, escrever porque tomariam consciéncia de que essas atividades eram necessérias para resol verem seus problemas dentro e fora da escola, De acordo com esta pedagogla, a organizagéo de centros de interesse, de projetos @ a elaboragio de materiais didéticos especificos, como os de Mon- tessori, era algo estereotipado, vazio de sentido, ar- bitrério pois escolhido independente da participacso da crianga. Nela, 0 professor nao deveria ser nada mais que um conselheiro, um cooperador, que orge nizaria os materiais da vida da crianca (tesouras, martelos, pincéis) em torno de seus interesses ime- diatos, assiz: como os da comunidade que a cerca. A corrente europs Binet © Simon, através de estudos experimer tals, enfatizaram 0 uso de testes mentais @ medidas da aptidéo, que determinaram uma grande influéncia da psicologia aplicada as idéias pedagdgicas moder- nas ¢ tiveram reflexos significativos entre os educa- dores brasileiros. Entretanto, as idéias de Ovidio Decroly (que tém varios pontos em comum com as de Montessori) foram as que predominaram no pen- ‘samento educacional renovador brasileiro. Decroly, diferente de Dewey que considerava a vida social uma condigao basica na evolugéo huma- ‘na, tinha uma fundamentaco predominantemente biolégica. Para ele, talvez como conseqdéncia de sua formagéo — médico em clinicas neurolégicas para criangas anormais — o fim ultimo da educagao seria © desenvolvimento e a conservagio da vida, que de- veriam ser promovidos com a maior economia de energia © tempo possivel. Assim, enquanto que para Dewey os testes psi- colégicos nao pareciam absolutamente necessérios, ‘mesmo para o ensino individualizado, Decroly — ins- Pirado nas idéias de Binet — fundamenta uma classi- ficagdo baseada no desempemho fisico e psfquico da crianga, para possibilitar seu maior rendimento pos- sivel. O ensino para Decroly deveria, portanto, ajustar- se aos diferentes estégios de desenvolvimento das criangas, que seriam classificadas a partir de diag- nésticos feitos através de testes psicolégicos, le. vando & organizagéo da escola em classes homogé- 10 eas, que garantiriam a possibilidade dos alunos tra- balharem em diferentes velocidades, poupandolhes energia © tempo. De acordo com seus principios, a organizagéo do ensino e a elaboracao do curriculo deveriam pre- ver: a formagio de classes homogéneas, através de aplicago de testes diagnésticos; a organizaco de Programas com base nos interesses das criancas e nas condigées locals; a utilizacéo de centros de inte- esse para desenvolvimento das situagdes de ensino, que englobariam atividades tanto de interesse comum, quanto individualizadas; a redugdo do numero de alu- hos por classe, 0 que propiciaria um tratamento In- dividualizado do aluno, As propostas de escola nova surgidas no Brasil teriam maior proximidade com o padréo europeu, talvez porque este se prestasse melhor & centralize. 90 que caracterizaria nosso sistema educacional. entre nés por esta incentivado até 1937, quase desapareceria nos anos 40 @ retornaria com muito vigor de meados dos anos 50 até 0 final da década de 60. © modelo burocrético Embora as reformas educacionals foitas nas prim ras décadas do século XX, no Brasil, sejam associa- das somente a John Dewey @ ao movimento de “edu- cagéo progressiva", Kliebard lembra que, nos Estados Unidos, aquele foi um periodo de grande efervescén- cla na area educacional, em busca de uma resposta & decadéncia da teoria da disciplina mental. Os re- formadores educacionais do perfodo divergiam con- sideravelmente, e as idéias educacionals de um Franklin Bobbit eram frontalmente opostas as de um John Dewey. E preciso, pois, considerar o movimento educa- clonal presente nos Estados Unidos, no Inicio do século XX, e sua semelhanga com 0 que ocorreria nos anos 50 — e que teria influéncia marcante entre és na década de 70 — ou seja, a 6nfase & tecnologia educacional @ a priorizagéo de objetivos comporta- mentais em educagio. Esses movimentos tém sua raiz no desenvolvi- mento industrial americano, que transformou a efi- ciéncia organizacional da produgéo em Idéia predo- minante na educagéo americana do século XX. © aumento do custo de vida no inicio deste século e a crise dos anos 20 levariam no s6 0s em- Presérios, mas também a classe média americana, a 8e interessarem por uma maior eficiéncia a custos mais baixos. A administracao clentifica, que tinha ‘como principal mentor Frederick Taylor, conquista a imaginagdo norte-americana na passagem do século, © taylorismo difere das concepcées classicas de burocracia porque enfatiza a simples eficiéncia 1 preciso ressaltar a grande aproximaco que existe entre as proposicdes de Dewey e as de Paulo Freire Cad. Pesq. (70) agosto 1989 prética e nfo @ anélise de linhas de poder e de in- fluéncia dentro das organizagGes. Na concepcéo da administragdo cientifica, a produtividade ¢ central € © individuo passa a ser cuidadosamente investigado como um elemento capaz de obter uma produgao cada vez maior. Através de ostudos de tempo e movimento, 03 atos de um operério eram subdivididos em operagdes minuciosas, e padrdes de eficiéncia eram estabeleci- dos para cada uma dessas operagées. A seguir, a0 trabalhador eram aplicadas regras de administracéo cientifica e principios psicolégicos, a fim de elevar seu nivel de eficiéncia. A esséncia da administracéo Cientifica era a fragmentagao e andlise do trabalho © sua posterior reorganizagéo na seqiéncia mais efi- cliente possivel. A eficiéncia burocrética seria aplicada na admi- nistragao das escolas; porém, seu efeito mais profun- do acabaria ocorrendo na teoria de curriculo. Em 1912, John Franklin Bobbit comeca a adaptar as téc- nicas burocréticas & administragéo escolar. Propde, Iniclalmente, 0 uso intensivo da area escolar. Prevé, a seguir, a divisio de tarefas e a especializagao das fung6es escolares — com 0 objetivo de obter o mé- ximo de eficiéncia com o menor ntimero de trabalha- dores — assim como a eliminagéo de gastos supér- fluos. Finalmente, dé 0 salto para o campo da teoria educacional ao sugerir que se “trabalhe o material bruto de forma que se torne o produto final para 0 qual 6 mais adequado. Aplicado & educacio, isso significa educar o individuo segundo suas potenciall- dades, Exige que 0 contetido do curriculo seja sufi- cientemente variado para satisfazer 8s necessidades de todos os tipos de individuos na comunidade; © que o ritmo de treinamento e de estudo seja suficien- temente flexivel, de modo que s6 se d@ ao Individuo, aquilo de que ele necessita” (Kliebard, 1968) © curriculo tornou-se algo a ser programado a partir da andlise cientifica das atividades humanas. Dessa forma, nao se admitiam concepgdes vagas dos objetivos educacionais. Em 1915, Bobbit afirmava que 0 programador de curriculo deveria analisar a natureza humana e trar no mundo dos negécios. Uma vez ai, identificar habilidades, habitos, formas de conhecimento neces- sérios aos seres humanos, que passariam a ser, rota ou indiretamente, os objetivos do curriculo. Dessa perspectiva, 0 curriculo no seria mais constituido a partir do acervo cultural da humanidade, mas deveria abarcar um ndmero ilimitado de ativida- des humanas, habitos, capacidades etc. Por volta de 1920, Bobbit e seus seguidores fa- zem um esforco de reformulagao curricular através da técnica de padronizacéo © predeterminacio do produto. Buscavam algo semelhante as pequenas uni- dades de trabalho de Taylor. Visavam eliminar do curriculo tudo que no fosse funcional e 0 faziam em nome das massas populares que, segundo eles, se Preocupavam com que a escola transmitisse conted- dos iitels a seus filhos (Kllebard, 1971). A crianga em idade escoler tornava-se algo a ser Influéncias tesricas no ensino. moldado @ manipulado de modo a se encaixar num papel social predeterminado. Os departamentos de orlentagéo sondavam suas aptidées individuals para determinar quals de suas potencialldades eram dignas do ser exploradas. Em geral, essa politica era adota- da em nome da modificagiio de um curriculo acadé- mico ultrapassado, para melhor adaptélo & nova clientela da escola secundéria, onde agora predomi navam os menos favorecidos. Propunha-se um cur- riculo mais “democratic”, onde, como num passe de mégica, as potencialidades do individuo coinci- diam com’ as necessidades da sociedade moderna Industrial, Eram duvidosos, porém, os Julgamentos sobro a cepacidade inata das criancas, suas aptidées, poten- cialidades, base sobre a qual se diversificariam os curriculos. Esses julgamentos tendiam a tornar-se profecias que se auto-realizavam, no sentido de pre- determinar quais individuos ocupariam que posigées nna ordem social Bobbit, em atitude francamente oposta as idéias de Dewey © de seus seguidores, afirmava que a finalidade da educagao deveria ser a de preparar a crianga para a idade adulta. No final dos anos 20 durante a década de 30, 0 ideal da eficiéncia social para a educago @ a linguagem da producéo como base para a teoria de curriculo entram, temporaria. mente, em declinio. Elas explicam, porém, a existéncia entre nés, durante 0s anos 30 ¢ 40, de propostas de ensino vocacional apés 0 4° ano primério, bem como dos gindsios com curriculos diversificados que, segundo as autoridades da época, tinham o objetivo de melhor adequar a escola as fungées especificas a serem desempenhadas pelos filhos das elites dirigentes (i: nésios académicos) @ das classes. trabalhadoras (Gindsios industriais e agricolas). © clissico e o roméntico em Educagi Desde 0 inicio do século XX, estaria claramente delt neada a presenca de duas perspectivas opostas de estrutura e organizacdo do ensino e do curriculo, que continuarsio permeando 0 pensamento educacional.. Segundo Lawton (1973) essas perspectivas, que tam- bém se fazem presentes na educacao brasileira, po- dem ser classificadas como classica e romantica. ‘A perspectiva clissica dé énfase ao conhecimen- to organizado em disciplinas, e mais recentemente ‘em Areas de estudo, e vé o currfculo como um instru- mento para introduzir os jovens nas formas estabele- cidas de pensamento e conhecimento, A perspectiva romantica vé a educacao escolari- zada muito mais como parte integral da vida do que como uma preparacéo para o mundo adulto, enfati- zando a experiéncia, a participagao, a criatividade. Para melhor visualizé-las, Lawton (1973) propos dols modelos “ideais", uma vez que, na prética, 6 impossivel encontrar uma escola ou um professor que caiba exatamente num ou noutro modelo. " CLASSICO ROMANTICO Gentrado na disciplina, matéria ou érea Centrado na crianca de estudo Enfase em: Enfase em: — Hobilidades — Criatividade — Instrugdes — Experiéneia — Informacéo — Descoberta = Obediéncia — Participagao = Conformidade — Originalidede = Disciplina — Uberdade Pressupoe: Desenvolvimento natural Bondade inata Pecado Original © modelo cléssico tem sido tradicionalmente associado a formas de organizagdo escolar afeitas 20 controle social e a momentos politicos e econdmicos definidos como de uma maior coesio social. A viséo romantica seré enfatizada em momentos s6cio-politi- cos divergentes © economicamente mais criticos. Seré predominante em fases de transicao, de profun- da mudanga social, de disputa ideolégica entre dife- rentes grupos, na medida em que preconiza diversi dade de opinides. Entretanto, sendo esses modelos duas faces de uma mesma moeda — pols nenhum. dos dois se afasta do pensamento liberal moderno & de suas raizes idealistas — fica dificil apontar argu- mentos sobre a natureza do conhecimento e sua rela- 80 com o curticulo que os diferenciem radicalmente. Na realidade, o que parece estar mascarado como uma disputa sobre o conhecimento 6 uma questo de divergéncias sobre a forma como a crianca aprende. © POS-GUERRA E OS ANOS 60 Em que pese toda a controvérsia existente na érea, 6 preciso reconhecer que a Psicologia ofereceu, no século XX, especialmente a partir dos anos 50, con- tribuigdes consideréveis a0 entendimento do proces- ‘80 educacional, possibilitando uma malor compreen- ‘880 do ensino-aprendizagem e do planejamento de ccurriculo. As teorias psicolégicas que influenciaram 0 pen- samento educacional brasileiro foram muito diversas, abrangendo desde os trabalhos de Jean Plaget e Jerome Bruner — de tendéncia idealista cognitivista marcante nos anos 60 — até os de Robert Gagné Benjamin Bloom — identificados com 0 behaviorismo © a tradigao funcionalista que prevaleceu nos anos 70. E muito dificil fazer uma apresentacdo sucinta e ‘ainda assim adequada da obra de Piaget, Principal mente interessado na epistemologia genética, Piaget do se interessou em construir uma teoria da instru. $40, isto 6, da aprendizagem do ponto de vista edu- cacional 12 © trabalho de Piaget reflote 0 desenvolvimento de conceitos colocados por Kant (formas @ prior! que integram a estrutura do sujeito cognoscente). A Partir daf, ele procura mostrar que categorias como ‘tempo, espago, causalidade s8o construidas pelo de- senvolvimento da capacidade cognitiva e passam por reformulagdes & medida que a crianca se desenvolve. Reformula a proposta kantiana, colocando 0 desen- volvimento intelectual no rol das habilidades natu- que tem 0 seu momento propicio no desenvol- vimento do individuo. Os trabalhos de Piaget chegaram até nds duran- te os anos 60 € se tornaram quase obrigatérios nos anos 70. A organizagio do ensino © dos curriculos acebou sendo bastante influenciada por suas obras e, de forma geral, sua influéncia fol positive. A partir de Piaget passou-se a ter, por exemplo, mais apoio te6rico, maior clareza para a substituicdo, no inicio 40 trabalho como operagses mateméticas, da simples memorizagio mecénica pelo uso de materials con- cretos. Nos anos recentes tem havido muita critica Piaget, tanto em relagéo & metodologia derivada de seus trabalhos como & énfase dada ao estudo do desenvolvimento infantil. Isto deve-se, segundo ‘Vygotsky (1962), a0 fato de que, a partir de Piaget, dou-se muita atengdo aos aspectos restritivos dos estégios iniciais do desenvolvimento, ao invés de se enfatizar aquilo que a crianga J sabia e fazéla pro- gredir a partir desse ponto. Jerome Bruner considera o trabalho de Piaget fundamental e, a partir dele, organiza uma complexa teoria da instruco, na qual combina os trés niveis de desenvolvimento da inteligéncia — inativo, icéni- co e simbélico — com a estrutura de um contetido especifico. Muitas criticas feltas @ obra de Bruner residem na falta de clareza sobre a interrelacdo existente entre a estrutura de uma disciplina e 0 estaglo de desenvolvimento da crianga, ponto bésico para entender sua teoria da instrugéo. € particula mente controvertida sua afirmacéo de que “qualquer contetido pode ser ensinado a qualquer crianga de alguma forma honesta” (Bruner, 1972). Bruner (1972) tenta mostrar — através da apre- sentagéo de seu “curriculo em espiral’ — que, “se respeitarmos os modos de pensar da crianca em crescimento, se traduzirmos o material educacional para suas formas Idgicas de pensamento, e formos suficlentomente capazes de desafié-la a tentar pro- gredir, entdo seré possivel introduzi-la precocemente 9 idéias estilos que, na vida posterior, fazem um homem educado*. Diferentemente de Piaget, Bruner tem uma pers- Pectiva antropolégica de desenvolvimento, ou sej vé 0 homem produzindo o mundo e este criando um novo homem. Afirma que 0 progresso tecnolégico produziu trés sistemas amplificadores das capaci des humanas: os amplificadores das capacidades motoras (faces. roda), os das sensoriais (simbolos, telégrafos, outros meios de comunicago) e os dos processos de pensamento (linguagem, teorias cienti- ficas). Para ele, existe em nossos dias uma estreita Cad. Pesq. (70) agosto 1989 relacdo entre esses sistemas © os trés niveis de conhecimento apontados. A diferenca mais significativa entre Bruner ¢ Plaget 6 que Bruner considera todos os niveis de conhecimento importantes na vida do sujeito, embora em diferentes proporgdes. Ele acredita que a crianca comega a desenvolver conhecimentos inativos antes. dos Icdnicos @ estes antes dos simbélicos, embora como adulto use os trés conjuntamente. Para Bruner. a diferenca bésica, entre as teorias do desenvolvimento da aprendizagem ¢ as da instru- ‘so, 6 que estas cltimas se preocupam oom a forma para ser melhor aprendido aquilo que alguém deseja ensinar, ou seja, estéo preocupadas no em descrever aprendizagem, mas em especificar métodos capazes de encorajar. acelerar ou modelar aprendizagens de varios tipos. Talvez a grande contribuicéo de Bruner tenha sido a de mostrar que qualquer teoria, que pretenda explicar 0 processo de ensino-aprendizagem, deve necessarlamente levar em consideragao @ natureza do conhecimento a ser aprendido, 0 processo de aprendizagem ¢ as caracteristicas da propria crianca. A interagéo desses fatores é tio complexa que ele considera cada situagao de aprendizagem uma expe- riéncia tinica para cada crianca, sem deixar, contudo, de reconhecer que & possivel generalizar 0 proceso de aprendizagem e oferecer algumas linhas mestras para o planejamento do ensino e de curriculos. Outra contribuigéo importante de Bruner foi a 4nfase que deu a0 conhecimento como algo dinamico, como proceso e ndo como simples ¢ acabado produ- to. Introduzir 08 alunos no conhecimento, para ele, era torné-los capazes de participar do processo de conhecer, mais do que fazé-los memorizar conheci- mentos. ‘As teorias do desenvolvimento, Incluindo as de Bruner, reforgariam 0 conceito de prontidio, que se tornaria popular entre nés, © roforgaria a partir do final dos anos 50 a presenca, na escola, de testes © medidas psicolégicas. 0 mesmo conceito estaria im- plicito nas teorias de caréncia cultural. ‘A idéia de prontidgo, presente j4 nos trabathos de Binet e Simon, significa que a eprendizagem, para ser eficiente, deve levar em conta o estagio de de- senvolvimento da crianga e que o ensino seria facili- tado pela homogeneizacao de grupos de alunos. Estu- dos posteriores viriam mostrar que nao se pode es- perar simplesmente que a prontiddo ocorra, pois o professor pode se arriscar a perder boas oportunida- des para encorajar 0 crescimento e 0 desenvolvimen- to do aluno. € preciso estimular as criangas expon- dos a situagdes prévias mais ou menos epropriadas. (© conceito de prontidéo valorizou sobremaneira © trabalho @ ser desenvolvido no chamado periodo preparatério & aprendizagem da leltura © escrita, dando destaque & necessidade de universalizagéo da educagao pré-escolar. Piaget e Bruner exerceram grande influéncia no pensamento educacional, na medida em que seus es- ‘tudos possibilitaram programas de ensino mais rea- listas, unidades de contetido passiveis de serem atin- Influéncias tedricas no ensino. gidas, métodos de ensino © aprendizagem mais ade- quados as varias foses de desenvolvimento dos alu- ros. Mesmo néo tendo oferecido uma férmula aplicé- vel a cada matéria do curriculo, que fosse capaz de especificar 0 ensino e a aprendizagem em situacdes cconcretas, apontaram o8 diversos fatores que ests- vam envolvidos nessas situages, de forma a tornar 0s professores e o sistema escolar mais conscientes a complexidade de sua tarefe. Finalmente, a grande ligo que nos deixam — principalmente no que diz respelto a conteddos mini- mos comuns — 6 a de que, dado que duas criangas nunca so to semelhantes a ponto de serem tratadas de forma idéntica, todo curriculo, a0 ser posto em prética, deve prever um espaco para o planejamento Individualizado do ensino. © retorno do modelo burocrético © impulso inicial no sentido da padronizagao, prede- terminago e fragmentacdo do curriculo escolar ocor- rera no inicio do século, com o desenvolvimento in- dustrial americano. Durante 08 anos 60, com o desen- volvimento da indistria eletronica norte-americana, que se assemelhava a uma nova Revolugdo Indus- trial, essa tendéncia ressurgiria e teria grande in- fluéncia sobre 0 pensamento educacional brasileiro dos anos 70. Agora, porém, existiam algumas diferencas. A teoria behaviorista ganhava espaco no campo da Psi- cologia e 0 funcionalismo estruturalista prevalecia nas Ciéncias Socials, 0 que justificava especifica des de objetivos em termos de comportamentos observéveis do aluno, dava um verniz académico & antiga doutrina da eficiéncia social da década de 20. ‘A metéfora da eficiéncia burocrética, da produtivi dade, teré um percurso chelo de altos @ balxos du- rante 0 século XX. Vallence mostra que a linguagem usada nas duas primeiras décadas do século — que justificava & reformulava objetivos educacionais em termos de ne- cessidades sociais — seré substituida por outra, que prevalece até meados dos anos 50, buscando liberar © curriculo da orientacao de controle social e desen- volver uma escola centrada na crianga, onde os inte- resses desta definiam o ponto de partida para a aprendizagem (Messick, 1980). A perspectiva roman- tica predominava, colocando em segundo plano, ne- quele momento, a eficiéncia econdmica ¢ a respon- sabilidade civica. Durante @ década dé 60, porém, haveré um re- torno & énfase na eficiéncia organizacional, na tecno- fogia educacional, na instrugo programada. Em vir- tude de problemas de ordem econémica e social — © langamento do Sputnik russo em 1957, a presence da Guerra Fria, a crise econémica dos primeiros anos desta década — ganha um novo impeto o movimen- to de controle dos resultados da aprendizagem. A eficiéneia econdmica e a responsabilidade civica re- cuperam sua proeminéncia, como objetivos educacio- nais, na érea da educacéo. 13 Esse retorno ser exacerbado em conseqiéncia do novo surto de industrializagdo tecnolégica desen- cadeado mundialmente. A busca de maior eficiéncia produtividade do sistema escolar pressionard para a necessidade de definigao e clareza dos processos de avaliagdo e estabelecimento de objetivos educa- cionais. Isto conduz a uma postura mals préxima & da perspectiva classica, que leva grupos de educado- Fes a repensar 0 curriculo da escola bésica em ter- mos de disciplinas separadas ou de grandes éreas de estudos (Hyman, 1973). Aparece, nesse periodo, um grande niimero de publicagées sobre curriculo, entre as quais tornam-se muito populares no Brasil: O curriculo primério mo- derno, de William Ragan (publicado em 1960) e Cur- ticulo moderno, de Robert Fleming (de 1963). Essa preocupagdo com o planejamento curricular, entretanto, tinha precedentes no movimento iniciado ‘em Chicago nos anos 50, com os estudos de Ralph Tyler sobre as principals fontes para definicéo de objetivos educacionais comportamentals, que se transformariam no livro Principlos bésicos de cur- riculo e ensino (1975), muito popular entre os educa- dores brasileiros na década de 70. Nessa mesma direogo, alguns psicélogos © edu- cadores americanos, liderados por Benjamim Bloom, tentardo estabelecer um sistema classificat6rio, ou seJa, uma taxonomia de objetivos educacionais, orga- nizado em trés éreas independentes: cognitiva, afeti- va e psicomotora. No final da década, Bloom e seus colegas jé haviam publicado dois volumes referentes. 0s objetivos nas areas cognitiva e afetiva em ter- mos de mudancas a serem medidas no comporta- mento dos alunos. Publicacées detalhando centenas de objetivos educacionais — partindo das aprendizagens mais simples para as mais complexas — serdo, nesse pe- iodo, colocadas & disposicao dos professores. Os objetivos eram formulados com tal preciséo que a rética no campo curricular, durante os anos 60, pa- rece consistir primordialmente no enunciado de listas intermindveis de especificagdes pormenorizadas em termos comportamentals. O julgamento final sobre © &xito de um procedimento educacional consistia nas mudangas comportamentais do aluno como conse- qiéncia do que the fora ensinado. Hé multas criticas @ taxonomia de Bloom, devido & separagdo do conhecimento nos dominios cognitivo, afetivo e psicomotor: talvez util a nivel teérico, 6 impossivel de ser efetuada. Entretanto, a objegéo mais forte ao trabalho de Bloom diz respeito a énfase fem objetivos comportamentals, que acaba Induzindo 08 educadores a acreditar que $6 vale @ pena ensinar aquilo que é passivel de ser medido. Hé, porém, uma discordancia mais fundamental, entre os que véem os objetivos comportamentai ‘como algo passivel de ser universalmente aplicado, @ os que véem neles somente um valor limitado, que diz respeito & natureza do processo educacional. Re- sultados educacionais propostos em nivels extrema: ‘mente particularizados — por exemplo, a resolugio “4 de um certo niimero de operagées mateméticas por ‘minuto ou a simples recitacéo de pequenos fragmen- tos de informacéo — tornam-se Irrelevantes. Mate- mética, Hist6ria ou qualquer outra disciplina sé0 muito mais que um simples aglomerado de fatos ou do habilidades especificas. © professor no pode se limitar @ ajudar o aluno ‘@ aprender um novo comportamento e mudar com- portamentos anteriores, ou apenas determinar onde © quando os comportamentos so apropriados. O en- sino deve fornecer ao aluno conhecimento suficiente para que ele mesmo possa tomar a deciséo de mudar ou nao seu comportamento. Como afirma Lawton (1973): “ver 0 professor como um mero fornecedor de estimulos aos quais o aluno deve responder é uma visio behaviorista do comportamento e da aprendiza- gem humana, com a qual néo 6 possivel concordar. A educagio néo diz respeito diretamente a uma mu- dana de comportamento, mas a um processo que torna a mudanga de comportamento uma possibili- dade". Messick (1980) afirma que algumas formas atuais de planejar o que 6 ensinado demonstram a presenca da linguagem da eficiéncia em técnicas educacionais: “uma delas 6 a anélise comportamental usada pela primeira vez por Taylor e retomada por Gagné. Em esséncia, essa técnica analisa tarefas através da sua decomposicao em pequenas partes e pelo estabele- cimento de uma hierarquia de pré-requisitos. A outra técnica € a anélise de sistemas. Esses procedimen- tos, em resumo, comegam elaborando uma lista abrangente de resultados desejéveis ¢ dai procedem 2 construgéo de instrumentos de medida que ver! quem em que grau os objetivos foram alcancados” A taxonomia de Bloom ¢ a decorrente tendéncia € operacionalizacéo de objetivos comportamentais in- fluenciou sobremaneira 0 curriculo ¢ a organizagio do ensino brasileiro nos anos 70. Esteve presente néo 36 na elaboragdo das propostas curriculares feltas a partir da Lei 5692/71, mas também no interior das escolas ¢ universidades, onde se discutiu a relev cia e @ qualidade do que era ensinado, dedicando-se ‘tempo demasiado & operacionalizacéo formal de obje- tivos @ estratégias de ensino. © CALDO DE CULTURA A PARTIR DOS ANOS 70 Nos anos 70, os educadores brasileiros serdo influe iados por varios tipos de abordagens tesricas, as vezes até contraditérias. De um lado, chegario até 1nés tanto as correntes psicolégicas, de cunho behe- viorista, discutidas anteriormente, como a teorla do capital humano, de cunho funcionalista, proposta pelo economista T. W. Schultz, de Chicago — que vinha ao encontro da preocupagao, nos palses desenvolvidos, com 0 gigantismo dos sistemas educacionais no pés- {querra, que oneravam cada dia mais os cofres pabli- cos. De outro lado, aparecem, na mesma época, estu- dos criticos norte-americanos © europeus sobre o problema da desigualdade de oportunidades entre os individuos provenientes de diferentes classes social Cad. Pesq. (70) agosto 1989 ou seja, com a distribuicao desigual do conhecimen- to e com o controle social da transmisséo cultural A corrente norte-americana exerceré grande in- fluéncia entre nés. Estudos de natureza macrossocio- l6gica abrangerao tanto 0 empiricismo metodolégico de Jencks @ Coleman, como o neomarxismo de Bowles e Gintis. Do lado europeu, receberemos um impacto significative das obras de Bourdieu © Passe- ron e Baudelot e Establet sobre o papel reprodutor da escola. A partir dos anos 80, abordagens etnogréficas, sociointeraclonistas, interpretativas, que professam grande desconfianga, e até certo desprezo, pelas ané- lises macrossociolégicas, fazem-se cada vez mais Presentes, estimulando o aparecimento entre nés de varios estudos sobre 0 conteddo escolar e o funcio- namento interno das escolas. Para esta perspectiva, concorrem os trabalhos de Bernstein e mals recen: temente os da Psicolingistica. ‘A presenca da teoria do capital humano A teoria do capital humano adequava-se ao funcion: lismo tecnolégico dos anos 50. Ambos davam énfase fungdo técnica da educagéo e ao uso eficlente dos recursos humanos. Porém, tipico da teoria do capital humano 6 seu apelo a ideologia pré-capitelista, ou ‘seja, sua insisténcia em afirmar que o trabalhador é ‘© dono do capital (representado por suas habilidades conhecimentos) e tem capacidade de investir em si mesmo. Assim, 0 assalariado, sem nenhuma pro- Influéncias tedricas no ensino. priedade e sem controle do processo ou do produto de seu trabalho, é transformado em capitalista, A idéia bésica era simples e se enquadrava no individualismo da ideologia liberal: as habilidades @ conhecimentos adquiridos pelo processo de educe- ndo deviem ser vistos como uma forma de con- sumo, mas como um investimento produtivo, ou seja, redundavam em producSo mais eficiente e salérios mais altos, beneficiavam tanto o individu quanto a sociedade. Dessa forme, ambos deveriam estar inte- ssados em fazer sacrificios e participar de tais westimentos. ‘A teoria do capital humano exerceu grande in- fluéncia na politica social dos paises subdesenvolvi- dos. Insinuava que a pobreza das nagdes do Terceiro Mundo deviese muito mais & sua falta de capital humano do que as relagées econdmicas internacio- nais. Conseqlentemente, o desenvolvimento era pos- ivel somente através de uma melhoria na qualidade dos recursos humanos. Néo era necessério pensar fem mudangas estruturais radicais. Organizagées fi- nanciadoras internacionais tiveram papel marcante na difusdo dessa teorla, e passaram a fornecer auxilios para a educagio do Terceiro Mundo. Assim, a teoria do capital humano chega até nés, na segunda metade dos anos 60. 0 exemplo brasileiro daquele auxilio internacional 6 0 Acordo MEC-USAID. Influenciaria a reforma do ensino superior e inspiraria, em grande arte, a Lei 5692/71 que reestruturou o ensino de 18 @ 2 graus, dando ao ultimo um caréter profissio- nalizante. Nos anos 70, essa concep¢io sofre ataques vi- ‘gorosos, principalmente a um de seus pressupostos basicos — 0 de que o mercado de trabalho assegura, uma maior produtividade, malores salérios. Outros fatores, além da produtividede, determinam os salé- rios: a existéncia de salérios minimos, o status da Profissao, o resultado das lutas entre as classes so- ciais pela distribui¢éo da riqueza nacional etc. ‘A polémica da igualdade de oportunidades © debate sobre a desigualdade tem sido o ponto nevrdlgico deste século, tanto no que se refere 2 classe social, como mais recentemente, em relagéo a raca e a sexo. Os trabalhos sobre desigualdade de oportunida- des educacionais, que exerceram maior influéncia no cenério educacional brasileiro, foram os de Coleman (1966) © de Jencks (1972). Coleman apresentou, em 1968, um relatério so- bre igualdade de oportunidades educacionais para a comisséo de direitos civis do Congresso Americano, ‘em resposta as manifestagdes ocorridas em bairros negros. Embora a expectativa fosse contrarla, Cole- man concluiu que as escolas de criangas brancas ¢ negras eram bastante semelhantes entre si, e que melhorias no sistema educacional tinham pouca rela- 80 com o rendimento escolar. Os resultados de Coleman levavam a conclustio de que 0 ambiente familiar tinha relac&o muito mais 15 icativa com as diferengas de rendimento entre as criangas do que as caracteristicas da escola. O perigo desses resultados era de que eles tendiam a reforgar a crenca acerca da privacéo cultural das fe- milias mais pobres. Por outro lado, porém, na medida ‘em que os resultados apontavam a maioria das esco- las inibindo 0 desempenho académico das criancas pobres — negras ou néo — sugeriam a hipstese de que as proprias escolas eram uma fonte de desigual- dades, pois as diferengas aumentavam a medida que a crianga permanecia mais tempo na escola, ‘A grande contribuigéo de Coleman, portanto, foi a de ter mostrado que nao bastava manter a crianga nna escola, era preciso que a escola estivesse roal- ‘mente comprometida a fazer um bom trabalho com criangas de diferentes grupos sociais. A importante © controvertida contribuicéo de Jencks foi a de questionar o papel da extensio das oportunidades educacionais na obtengio de maior igualdade de oportunidades fora da escola; pois, se- gundo seus dados, a escolaridade seria indicador bas- tante modesto de sucesso na vida adulta Entretanto, nao possivel afirmar com certeza que a igualdade absoluta de oportunidades educacio- nais néo afeta as outras relacdes socials. Além disso, na medida em que trabalhos como os de Jencks néo tém suporte numa andlise do que ocorre no interior das escolas, seus resultados so colocados om divi- da, pois podem refletir apenas os aspectos educacio- nais mais correlacionados com a manutengao da desi- gualdade (Karabel e Halsey, 1977). Os trabalhos de Jencks, a0 colocar a escola numa Posigao marginal, isto é, ao mostrar que ela néo 6 ‘capaz de produzir uma mudanca social profunda, aca- baram inadvertidamente induzindo & idéia de que a escola era totalmente dispensdvel & obtengéo de maior Igualdade social, dando origem a atitudes con- trérias & propria existéncia e expansio das escolas, que se refletiram no pensamento educacional brasi- Ieiro. No Brasil, esta postura gerou tanto estudos pro- pondo a construcéo de propostas curriculares @ ma- térias pedagégicas levando em conta contextos so- cials diferenciados, quanto pesquisas empiricas que desvelavam como as medidas burocréticas, assim ‘como alguns comportamentos de professores e dire- tores, eram indutores de alta seletividade em relagtio, as criangas mais pobres. © empiricismo metodolégico, entretanto, seria alvo de diversas criticas, principalmente devido & inexisténcia de um referencial tedrico mais sélido que possibilitasse uma forma mais adequada de in- terpretagio dos dados obtidos e a freqiente falta de clareza entre abordagem empirica e tratamento esta- tistico. ‘A despeito dessas limitagses, 0 empiricismo me- todolégico teve influéncia significativa no pensamen- to educacional brasileiro dos anos 70 e resultou num. questionamento, tanto da desigualdade de oportuni- dade das criancas que frequentam as escolas publi- cas (e que abrigam criancas de diferentes classes 16 sociais), como sobre a inadequacéo da organizacdo do contetido e ensino dessas escolas. Assim, no final dos anos 70, enquanto no plano legal vigia a recente Lei 5692/71 de caréter funciona- lista, convivia-se também com a critica empiricista e com 0 despontar das teorias do conflito que enfatiza- iam o papel reforcador da escola frente as desigual- dades de origem de classe, que as criangas trazem a0 chegar na escola. ‘As teorias do contflito As teorias do conflito, que jé vinham aparecendo desde 0 final dos anos 50 associades as abordagens funcionalistas (Wright Mills e George Simmel), bus- cavam explicagdes tedricas capazes de melhor inter- pretar a complexidade das diferentes sociedades mo- dernas, que pareciam falhar quanto a realizacéo dos seus declarados ideais de igualdade. Entre os trabalhos que mais influenclariam 0 pensamento educacional brasileiro encontramos os de Bowles (influenciado por Parsons). os de Baude- lot e Establet e os de Bourdieu e Passeron. Enquanto os trabalhos realizados na linha webe- riana (Collins, 1977) atacam explicitamente a teoria funcionalista de estratificagao social e defendem o argumento de que o sistema educacional reflete me: nos as necessidades tecnolégicas do desenvolvimen- to econémico © mais os efeitos da competi¢ao por status entre diferentes grupos, envolvendo a disputa por riqueza, poder @ prestigio, os marxistas contem- poréneos vem nas relacdes sociais de produgao a chave da andlise dos sistemas educacionais. Essas relagdes que, no sistema capitalista, estéo baseadas na propriedade privada dos meios de producéo, so para eles a ralz do sistema hierérquico de diviséo do trabalho. Afirmam Karabel ¢ Halsey (1979) que a obra A escola capitalista na Franca, publicada em 1973, por Baudelot e Establet, “constitui um importante esforgo empirico de andlise marxista para entender © papel da educacdo como agente de reproducao social, mas fica de certo modo comprometida pelo modelo dicotdmico de classe social (burguesia versus, proletariado) de sua base tedrica. A reproducso de Bourdieu e Passeron, publicada em 1970, uma andlise te6rica muito questiondvel da fungo reprodutora da escola, ndo 6, propriamente, uma teoria do conflito ‘em educagéo, uma vez que néo prevé nenhuma resis- téncia da classe trabalhadora a0 modelo de hegemo- ia burguesa. Bourdieu, considerado erroneamente como marxista, 6 um socidlogo com formagao filosé- fica bastante influenciada pelo estruturalismo fran- cés e pelos trabalhos de Weber e Durkheim” Para Bowles ¢ Gintis, 08 estudos sobre 0 sistema educacional néo podem prescindir de uma anélise do sistema de estrutura de classes onde esta inserido. Em sua teoria sobre 0 papel da educacdo na repro- dugéo da diviséo social do trabalho, a familia, o tre- balho € a escola estdo intimamente associados e s80 Cad. Pesq. (70) agosto 1989 as fontes dos diferentes valores que constituem as subculturas de classe. No esforco de mostrar que o papel do sistema educactonal 6 0 de reproduzir a desigualdade social’ ‘08 neomarxistas propdem um quadro teérico que su- gere um entrosamento perfeito entre a escola © as outras Institulgdes. socials. Hé, nessa perspectiva, uma ligagdo estreita entre familia-escola-trabalho, que contribui para reproduzir a desigualdade, sob um sis- tema to dominante e autoperpetuador, que se acaba ‘questionando a possibilidade de ocorréncia de qual- quer mudanca. Porém, uma vez que as mudancas ocorrem, os neomarxistas acrescentam em suas anélises a nocdo de que a estrutura educacional re- sulta de disputas politicas ¢ ideolégicas entre dife- rentes classes sociais. O sistema educacional, consi- derado tradicionalmente apolitico, transforma-se num espago de conflito de classes. Para superar @ enfren- tar o problema da mudanga em educacdo, alguns mar- xistas introduzem em suas anélises 0 conceito de contradigo, num esforco de fornecer uma explicacéo te6rica adequada a0 papel simultaneamente reprodu- tor e transformador da educagéo escoler. ‘A concordancia de educadores brasileiros, tais como Dermeval Saviani, Guiomar Namo de Mello, Vanilda Paiva, Carlos Roberto Cury, Neidson Rodri- ‘ues, com essa linha de andlise teérica — que re- sulta numa valorizagéo da escola e de seus conteddos ‘como um espaco de luta importante ao questione- mento e superacdo das desigualdades de classe — teve decisiva influéncia na politica educacional no inicio dos anos 80. Por outro lado, como resultante do empiricismo metodolégico e dos trabalhos criti- co-reprodutivistas (Bourdieu, Establet), surge também entre nés, nese periodo, um grupo de educadores que questiona radicalmente a existéncia da escola, assoclando-a & reproducéo do sistema desigual de produc capitalista. Foram representantes desta nha Moacir Gadotti e Mauricio Tragtenberg, entre outros. ‘A maior parte dos trabalhos que percebem a educago como espago de disputa politica tem cen- trado sua atenco nos conflitos existentes na estru- tura do sistema educacional (controle, distribuigo ¢ organizagao das escolas, limites de obrigatoriedade escolar, extensio dos anos e niveis de escolaridade obrigatéria) © praticamente desprezado o contetido da educagéo. De acordo com Karabel @ Halsey (1979), “0 de- senvolvimento de politicas de educacéo mostra a necessidade de se ir além dos estudos de padries de controle e estrutura educacional e examinar mu- dangas no diae-dia das instituicSes educacionais que ‘ocorrem apés transformacdes macroestruturais”. © fato de ndo terem dado suficiente ateng&o 20 contetido escolar — 0 que também ocorreu nas abor dagens funcionalistas ¢ empiticistas metodolégicas — temhes impedido de desenvolver uma teoria sa tisfetéria sobre mudanca curricular @ oferecer uma resposta ao problema que consideram fundamental, © da educacao das criancas provenientes das cama- das mais pobres da populacéo. Influéncias tedricas no ensino. .. As correntes interpretativas e etnogréficas Os estudos etnogréficos tentam mostrar a fragilidade dos acordos mituos nos quals as interagées sociais esto baseadas. Ao fazélo, néo questionam a legiti- midade das instituigdes sociais e politicas existentes, mas sim a interpretagdo que 0 senso comum faz da propria realidade. Esses estudos, embora ctiticos, dirigem sua tengo mais para as interacdes ao nivel micro do que para a estrutura social mais ampla. Sua rebeliéo contra as rotinas do diaadia evita uma confrontagéo direta com 0 status quo. O seu aparecimento parece também estar associado ao fracasso das politicas igualitérias propostas pelos diferentes paises euro- peus, Como afirmam Karabel © Halsey (1979): “inca- Pacidade da escola em reduzir a desigualdade social levantou questdes sobre a eficiéncia de reformas estruturais; porém, as mudangas organizacionais que elas provocaram indicaram a necessidade de reforma curricular. As escolas anteriormente muito seletivas ham agora que enfrentar a entrada de um grande nimero de criancas cujas experiéncias e interesses anteriores chocavam-se com os valores académicos tradicionais. Além disso, a extenséo dos anos de escolaridade obrigatéria demandava um novo cur- Ficulo que fosse mais adequado as necessidades dos alunos — agora praticamente obrigados a freqientar a escola por um period mais longo". © Insucesso de reformas educactonals para a realizagdo das aspiragdes igualitérias era consequén- cia, segundo a abordagem interpretativa, da dificul- dade em se reformar 0 ponto central do sistema: 0 curriculo, 0 conteddo a ser ensinado e o funciona- mento Interno das escolas. © paradigma interpretativo, profundamente in- fluenciado pela sociologia do conhecimento, possuta trés reas bésicas de preocupagao: interagéo pro- fessor-aluno; categorias e conceitos educacionais; © curriculo. Como os etnografistas séo extremamente sensi- veis & fragilidade dos “construtos do senso-comum”, alguns deles investigaram certos pressupostos que estéo implicitos na avaliagéo do desempenho acadé- mico de criangas em escolas (Cicourel, 1977). Apre- sentaram estudos empiricos do fendmeno das distor. ‘ges de desempenho em testes, devidas ao contexto social e & falta de compreenséo lingiistica, num qua- dro de referéncia extremamente relativista. Ao ler esses estudos, tem-se a impressio de que os testes de compreensio em leitura so construtos humanos totalmente arbitrérios; e mais, que séo tantos os vieses de classe existentes que ni tabelecer qualquer relacdo entre aquelas medidas ‘@ capacidade do aluno para entender um material escrito. As criticas feitas & coleta © interpretagio de dados mostraram-se extremamente ttels, pois havia uma tendéncia antiga de assumir que toda evidéncia ‘quantitativa era automaticamente cientifica. Os etno- grafistas puseram fim d este mito, porém seu ultra- criticismo as técnicas de medida tornou-se freqien: 7 ‘temente uma rejei¢do ao uso de toda e qualquer in- formacéo estatistica, assim como um estimulo 20 ‘abandono completo das medidas de desempenho aca- damico. No interior das diferentes tendéncias da corren- te interpretativa, enquanto os etnografistas preo- ‘cupam-se com a “construcao social da realidade”, os interacionistas voltam-se para a anélise sociolégica do processo de negociagao de “significados", Ambos dio um tratamento especial as relagdes face-e-face, uma vez que pretendem mostrar que as interagdes socials cotidianas capacitam o homem para entender ‘seu mundo. Mesmo admitindo que as relacdes estabelecidas nas instituicdes educacionais so construidas pelos homens, é preciso levar em conta as limitacdes so- clais que permeiam o cotidiano. Assim, a disputa pela “definigio de uma dada situagdo” 6 uma questio proeminentemente de poder, pois ha limites em fun- ‘Go dos quais “as definicSes de uma situagdo podem ser negociadas*. A nogéo de que os “significados” so recriados a cada momento numa instituigéo educacional é um elemento importante, porém pode desviar a atengéo para o fato de que as interacdes ocorrem em padrdes. Fepetitivos. Professores e alunos nfo se encontram rum vacuo; 0 peso da situacdo precedente condicio- na o resultado da “negociagéo” em cada situacdo. Quando as anélises da situacao de sala de aula nao so relacionadas estrutura social, elas tendem a ignorar as restrigdes sobre as quais atores human« operam e, assim, a exagerar a frégit rotina diéria da vida escolar. Basil Bernstein, sociolingiista inglés, publicou, ‘nos anos 60, trabalhos importantes que contribuiram para o entendimento dos cédigos lingiisticos © das, influéncias destes cédigos na escolaridade das crian- gas provenientes das classes mais pobres da popu: lagéo. Na década seguinte, o foco central de suas Preocupagées seria o problema do conhecimento e dos processos educacionais. Bernstein tem feito um esforco importante para integrar nivels micro e macro de andlise. Ao conside- ar 08 aspectos estruturais e interacionals da vida social, ele apresenta, segundo Karabel e Halsey (1977), dois tipos de andlise em seus trabalhos: “uma, sociolingtista, que examina como a reprodugao das relagdes de classe estdo delineadas tanto na estrutura de comunicagao como na sua base, o nacleo familiar; e outra, cultural, que procura mostrar os efeitos das relagdes de classe na institucionalizagéo de cédigos elaborados transmitidos pelas escolas’. Os estudos de Bernstein sobre classe social © Cédigos lingUisticos fornecem um bom exemplo de andlise integrada de estrutura e processo da repro- ducdo de classe. Bernstein percebe a estrutura social como um sistema de classes desigual, cujos efeitos so trans- mitidos de forma lingijfstica pela familia, seu princl pal agente. Consegiientemente, ele considera a posi- ‘go de classe da familia fundamental na determina. 80 do cédigo lingutstico. 18 Os estudos sociolingdisticos de Bernstein, entre- tanto, enfrentam uma série de dificuldades tanto do ponto de vista conceitual — na medida em que o C6digo lingifstico ndo pode ser observado, porque ‘io é uma simples forma de expressio, portanto sua relagéo com as classes socials néo passa de um construto — como do ponto de vista empitico, uma vez que praticamente inexistem avaliagées das in- ter-relacées entre papéis sociais, formas de controle @ orientagées lingiisticas. Apesar disso, esses estu. dos tém sido muito usados entre nés e, com freqién. cia, influenciado a explicagéo do desempenho acadé- mico das criangas provenientes de diferentes classes sociais. Embora Bernstein negue, de forma enfética, é Preciso reconhecer que existem em suas obras pon- tos em comum com a teorla da privagdo cultural. Para ele, a grande diferenca 6 que a educagio com. Pensatéria tenta mostrar, erroneamente, que as defi- cléncias das criangas mais pobres e de suas famillas 80 responséveis pelo fracasso de seu desempenho escolar, enquanto ele, ao contrério, responsabiliza es, relagées de classe presentes no trabalho escolar por ‘esse fracasso. Nao basta, portanto, compensa as criangas de algo que elas no possuem — 0 que Permite consideré-las carentes, ou deficientes — mes sim, mudar a organizagéo interna’ das escolas, o con: texto educacional (Bernstein, 1970), Bernstein tem-se dedicado cada vez mals a0 pro- blema da transmisso do conhecimento pela educa- G40 formal e usa abordagens interpretativas e norma. tives, para tentar integrar as andlises estrutural © Interacional. Sugere trés temas que esto profundamente re- lacionados entre si e que t8m merecido atengdo es- Pecial de estudos da Psicolinglistica também numa ‘abordagem interpretativa: curriculo, ensino e ava- liagao. E AGORA? Na década atual, a preocupacéo com rendimento ecadémico, padrées linguisticos das criangas prove- nientes dos estratos mais baixos da populagdo e con- trole da transmisséo da cultura tem influenciado cada vez mais 0 contexto educacional brasileiro. Tra- balhos na érea da Sociolingdistica e da Psicolingds- tica, desenvolvidos desde o final dos anos 70, om instituigdes de pesquisas © universidades, assim como 0s estudos de natureza interpretativa, tém-se refletide em medidas de politica educacionel, tals ‘como as novas reformas curriculares e as novas me- todologias de ensino inspiradas nos trabalhos de Emilia Ferreiro. estado da educagao brasileira, entretanto, aln- da 6 muito precério, mostrando que & preciso encon- trar novos indicadores que possibilitem 2 construgao de uma politica e prética pedagégica mais adequadas. Para tanto, seré preciso ousar e, como aflrma Young (1974), ser capaz de relacionar “os principios de se- Cad. Pesq. (70) agosto 1989 lego @ organizagéo — que vinculam os curriculos as situagdes institucionais das escolas e das salas, de aula — & estrutura social mals ampla”. Consogiientemente, s6 se formos capazes de in- corporar as contribuigdes das diferentes correntes, educacionais e integrar, sem preconceltos, andlises estruturals e interaciongis que déem conta tanto das, ligagées que se estabelecem entre a escola as outras Instituig6es como “das relacées que existem entre a distribuicgo do poder e a distribuiggo do co- nhecimento” (Keddie, 1971), 6 que estaremos enfren- ‘tando o desafio de construir um ensino e um cur- riculo mais adequados as condigées concretas de nosea sociedade, REFERENCIAS BIBLIOGRAFICAS BAUDELOT, C. & ESTABLET, R. La escuela capitalista, Mé xico, Siglo Veintiuno, 1875. BERGER, T. & LUCKMAN, T. The social construction of reality. London, Allen Lane, 1967. BERNSTEIN, B. Class and pedagogies: visible and invisible. In: KARABEL, J. & HALSEY, A. Power and ideology in education. New York, Oxford University Press, 1877. . Class, codes and control. London, Paladin, 1973, va Class, codes and control. London, Routledge and Kegan Paul, 1975, v. 3. -. Education cannot compensate for society. New Society, fev. 1970. Social class, language and socialization. In: KARABEL, J. & HALSEY, A. Power and ideology in ‘education. New York, Oxford University Press, 1977. BLOOM, 8. et al. Taxionomla dos objetivos educacioneis. Porto Alegre, Globo, 1972. BOURDIEU, P. & PASSERON, J.C. A reprodugdo. Séo Pau- lo, Francisco Alves, 1975. BOWLES, S. Unequal education and the reproduction of the social division of labor. In: KARABEL, J. & HALSEY, ‘A. Power and ideology In education. New York, Oxford University Press, 1977. BOWLES, S. & GINTIS, H. IO in the United States clase structure. In: GARTNER, A. et al. (od) The New assault on equality: 10 and social stratification, New York, Harper & Row, 1974, Schooling in capitalist America: educational re- form and the contradictions of economic life, New York, Basic Books, 1976. BRUNER, J. 0 processo da educagéo, Sto Paulo, Nacional, 1972, CICOUREL, A. & KITSUSE, J. The school as a mechanism ‘of social differentiation. In: KARABEL, J. & HALSEY, ‘A. Power and ideology In education. New York, Oxford University Press, 1977. CICOUREL, C. Method and measurement In sociology. New York, The Free Press, 1964. COLEMAN, J. et al. Equality of educational opportunty. Washington, D.C., US. Government Printing Office, 1966. COLLINS, R. Functional and conflict theories of edu- ‘cational stratification. In: KARABEL, J. & HALSEY, A, Power and ideology in educstion. New York, Oxford University Press, 1977. DEWEY, J. The child and the curriculum. In: DEWEY on. Education. Richmond, William Byrd Prose, 1959, Como pensamos. Séo Paulo, Nacional, 1959, Influéncias tesricas no ensino.. . Vide @ educaeéo, $80 Paulo, Melhoramentos, 1967, FLEMING, R. (org. Curriculo moderne, Rio de Janeiro, Sidador, 1974. GAGNE, R. Como se realize @ aprendizagem. Rio de Janel- 0, Ao Livro Técnico, 1873. GARTNER, A. (ed.) The new assault on equality. New York, Harper & Row, 1974. HYMAN, R. (ed.) Approaches in curriculum. New Jersey, Prentice Hall, 1973. JENCKS, G. et al. Inequality. New York, Harper & Row, 1972. JOHNSON, H. Curriculum y educacién. Buenos Alres, Paldos, 1970. KARABEL, J. & HALSEY, A. (ed) Power and Ideology in ‘education. New York, Oxford University Press, 1977. KEDDIE, N. Classroom knowledge. In: YOUNG, M. ed.) ‘Knowledge and control. London, Collier Macmillan, 1971 KLIEBARD. H. Bureaucracy and curriculum theory. In: HAUBRICH, V. (org.) Freedom, bureaucracy, schooling. Washington D.C, Association for Supervision and Curriculum Development, 1971 KLIEBARD, H. The curriculum field in retrospect. In: WITT, P. (org) Technology and the curriculum. New York, Teachers College Press, 1968, LAWTON, D. Social change, educational theory and curricu- Tum ‘planning. London, University of London Press, 1973. MESSICK, RG. ot al. Curriculo: anéli Janeiro, Zahar, 1980 MOLNAR, A. & ZAHORIK, J. (04). Curriculum theory. Washington D.C., Association’ for Supervision and Curriculum Development, 1977. RAGAN, W. Curriculo primério moderno. Porto Alegre, Globo, 1973, TLER, Ri. Principlos basicos de curriculo © ensino. Porto ‘Alegre, Globo, 1975. VELLOSO, J. Financiamento das politices pablicas: a edu- aco. Brasilia, Universidade de Brasilia, 1987. mimeo, VERNON, P. Intelligence and cultural environment. London, Bethuen, 1968, VYGOTSKY, L. 8. Thought and language. 2. ed. Cambridge, MILT. Press, 1962, WILLIAMS, R. The ong revolution. London, Chatto & Windus, 1961 YOUNG, M. An approach to the study of curricula as socially organized knowledge. In: YOUNG, M. (ed) Knowledge and control. London, Collier Macmillan, 1971. © debste. Rio de The rise of meritocracy. London, Thames and Hudson, 1958. 19

You might also like