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pasts _ 24 . CO wo Neoliberalismo e reforma trabalhista no Brasil ' Andréia Galvdo oe SA FAPESP Preffécio: Armando Boito J. Tntroducio... Capitulo 1: A difusso das idéins neoliberais no Brasil oa. 1.1 Ideologia neoliberal, Estado. clases soci 1.20 processo de constituigSo da hegettonia neoliberal no Bras 1.3 Neoliberalismo e classes dominarites: a burguesia industrial paula, 1.4Reformas neoliberas:xitose resistencia 1.5 Neoliberalismo e classes dominadas 1.5.1 O pragmatismo da Forga india. 1.52. CURagestagio do sindicalismo propositve Seagk 26 & Capitulo 2: A reforma trabalhista na primeira metade dos anos 1990 . 101 2.1 Estrutura sindical: origens de um velho debate 2.141 ACUTyeabandeicada iberdadee utonomiasindical 105 2.1.2 QGT eo apego A uniidadetndica.. . 2.13 AForga Sindical eadefesa tia da crtrucurasindical 7.14 Ashestagbee patrones dantedo plus : 2.1.5 Asiniciatvas legnisnaprimeia metade dos anos 1990 won 135 222i Xcontrato: alivee negociagiona erd neoliberal bI 2.2.1 Ocontratacoletivo de trabalho em debate wee 157 22.2 As centraissindicas frente ao contrat coletiv de wabalho 162 22.3 A poposta da burgusia industrial palist:prevalenciado | neqociado sobre o legisla. 14 2.2\4 Em busca da moderizagio dasrelacées de trabalho? 18 2.2.50 fracasso de uma experiéneia de mudanga concertada 12 Capitulo 3: O caréter priotitério da desregulamentago das relagses de ‘tabula . nae 1 3.1.A ofehsiva patronel diante daestabilizago monetétia sun 1% 3.2.0 governo Femando Henrique Cardoso ¢ o combate 32.1 Dizeits abalhistas:a via de menor resistencia. 3.2.2 Digressfo:eforma tabalhistaeinceresee de classe 219 32.3 A dinfmica politica: refluxoe reativacio das propostas es 7 ins 1: 3.2.4 A Justia do Trabalho em xequee a criagdo de novos instrumentos| deconciliagio deconflicos ow 2D 3.3 Tbalhadorese centrissindicais diante da ofensiva neoliberal 40 44 A ascensio do sindieato-cidadéo" Capitulo 4: reforma da legislagao sindical em segundo plano. 4.1 Um falso consenso. 4.1.1 Unicidade X pluralism: hertagées,dverginciase contradigies 4.1.2 Novase velhas fointes de curteio : 2 4.2 Mudangasna pritic. Conclusio.. Referéncias bibliogréficas PREFACIO Armando Boito Jr. ‘modelo capitalista denominado desenvolvimentista, que 'vigorou nas principais economias latino-americanae até o final da década de 1970, foi substituido, ao longo das décadas de 1980 e 1990, pelo modelo eapitalista neoliberal, ou, para dizé- lo mais sinteticamente, pelo neoliberalismo. Tal substituiglo re- presentolt uma regressio hist6rica para a populacao trabalha- dora da regido, na medida em que acarretou a elevagio das taxas de desemprego de subemprego, um novo processo de reconcentracdo da riqueza e da renda e a degradago dos direi- tos socials ¢ dos servicos ptblicos. E certo que néo devemos superestimar 0 que o velho desenvolvimentismo realmente ofe- receu 20s trabalhadores. A dependéncia e a internacionalizagio da economia nacional, a concentrago da propriedade da terra € a concentragao da renda sio tragos do capitalismo dependen- te brasileiro que antecedem, em muito, a implantagéo do capi- talismo neoliberal. Porém, © processo de substituigéo do antiga , pelo novo modelo foi muito seletivo:eliminaram-se os agpectos do antigo modelo que beneficiavam mminimamente os trabalhadores e, ‘em contrapartida, mantiveram-se ¢ inclusive aprofundalam-se 08 tragos que Ihes eram prejudici ‘As mudangas na érea trabalhista ¢ sindical sé0 uma das ddimenases mais importantes dessa transicio hist6rica regressi- va, ¢ so justamente elas que constituem o tema do livro de Andréa Calvi. O livro, tratando do Brasil, situa essas mudan- ‘cas no interior de-uin.processo social emplo e complexo, que a autora. mostra ser formado por dimensdes heterogéneas: pelas condig6es histéricas vigentes na sociedade' brasileira no mo- ‘mento de crise do antigo modelo capitalista, pela agéo das or- ganizagbes sindicais, das associagées patronais ¢ dos sucessivos 15 ‘mercado nacional ¢ internacional leva os primeiros a defender interesses capitalistas como redugio da-carga tributéria, isen- ‘ao de impostos e crédito subsidiado, Essas medidas, porém, ndo garantem o nivel de emprego, a nfo ser por perfodos muito cur- tos, Em contrapartida, elas comprometem a arrecadagao do Es- tado € levam a uma maior deteriorago dos servicos ptblicos, justificando © combate aos servidores e a redugo dos direitos . sociais. Acabam, portanto, jogando os trabalhadores uns contra ‘0s outros. 100 Capiruto 2 f ° / A REFORMA TRABALHISTA NA PRIMEIRA METADE DOs ANOs 1990 No capitulo anterior vimos que © necliberalisme proporcio- nna as classes dominantes um instrumental para se apoderar do discurso das classes dominadas, atribuindo-lhe novos contetidos Asclasses dominantes aproveitam-se de uma revolta popular difusa contra a ma qualidade dos servicos piblicos e o caréter restrito dos direitos sociaise trabalhistas para reduzir esses direitos e trans- ferir parte daqueles servicos 20 mercado. A reforma trabalhista emerge nese contexto como uma demanda “nova” e “imprescin- divel” para adequar as condigées de trabalho & conjuntura poltti- cae econémica que se desenha entre o final da década de 80 ¢ 0 inicio da déceda de 90. Mas a reforma trabalhista no constitui tuma demanda nova, nem é prerrogativa dos neoliberais: a defini- ‘s20 dos contomos da réforma trabalhista varia conforme o agente social considerado € © contexto em questo, No perfodo compreendido por esta pesuisa, abrigavam-se sob o rétulo “refolma trabalhista” projetos com contelidas bastan- te distintos, que énvolviam desde a reformulacao du revogacio das leis de protec ao trabalho até a mudanca ina 1a de orga- nizaao sindical. Assim, se & possfvel observar alguns temas recor- rentes nos discursof sindicais, patronais e também em algumas iniciativas Bovernamentais, esses temas adquirem feigSes distin- tas no decotrer do movimento histérico. Em alguris momentos, as Posigdes estio indefinidas; em outros, a correlagdo de forcas im- pe uma modificagéo no conte‘ido das demandas. Mesmo quan- dose considera cada um dos egentes socinis isoladamente, verifi- case que as questdes edvolvidas nesse debate sio polémicas, nio podendo ser compreendidasidé maneira untvoca e linear, 101 De modo geral, 0s diferentes projetos de reforma trabalhista ‘em confronto tém em comum a tentativa de modificar a relagéo entre Estado e grupos de interesse organizados. Essa relagio diz respeito tanto & participagio das associagdes patronais e dos sin- dicatos de trabalhadores no processo de negociaglo coletiva quan- to 8 forma de constituiglo das organizagées que representam seus interesses. Num caso e noutro, propée-se revisar © papel da lei. Mas existem diferengas substanciais entre a reforma pretendida por parcela dos sindicatos e a reforma preconizada pelos neoliberas, ‘embora em alguns pontos elas possam convergit. E certo que reivindicagées por liberdade e autonomia sindi- cal e pela maior partcipacéo dos sindicatos na negociagéo coletiva fazem parte da pauta sindical desde os anos 70. Porém, com o ad- vento do neoliberalismo, as antigas demandas dos movimentos so- ciais e dos sindicatos pela autonomia das organizagées frente a0 Estado so redimensionadas, consagrando um modo de relagio entre Estado, capital e trabalho, em que esses dois agentes so vistos como “parceiros® socials, interessados em negociar autonomamen- te as regras que regem sua relagéo, independentemente da inter- vengéo da lei. Dessa maneira, © neoliberalismo se reapropria de duas bandeiras do movimento social e sindical que remontam a0 final dos anos 70, investindo-The de outros significados: a luta pela extensio dos precfrios direitos sociais e trabalhistas coniverte-s¢ em denGncia aos “privilégios” de uma minoria que age corporativamente, ao passo que a luta pela ampliago da participa 80 politica ¢ sindical se transmuta no combate aos excessos da legislacdo e na contratualizagéo das relagSes de trabalho. Enquanto no final dos anos 70 e ios anos 80 os sindicatos combativos manifestavam-se contrariamente & tutela do Estado dlitatorial-militar e oo caréter repressivo da intervengéo estatal, defendendo genericamente a bandeira da liberdade e da auto- rnomia sindical, nos anos 90 hé uma modiffeacéo tanto em rela 80 20 protagonista do movimento antiestatal quanto 20 contete do das reivindicagées apresentadas. Embora os herdeiros do “novo sindicaliseo” contain 1 se proclamar favoréveis ao fim da es- pn ae “ trutura sindical, & 0 patronato que assume a dianteira do proces- so de combate ao Estado, aproveitando-se de ‘uma conjuntura econdmica e politica desfavoravel aos trabalhadores, bem como de seu discurso ém prol da liberdade de organizagio ¢ de negoci- acto coletiva para combater as leis de protegio ao trabalho. Este capitulo pretende tratar das tentativas de reforma traba- Ihista na primeira metade dos anos 90. Para isso, discutiremos a posi- fo dos agentes sociais ¢ as mudangas ensaiadas, assim como as ‘mplementadas, tanto no plano da negociagéo colétiva quanto da forma de organizaglo sindical. Esses temas j6 eram alvo de discuss nos anos 60 ou até mesmo nos anos 70, mas o término da transigo ‘pelo alto” com a eleiglo difeta para presidente da Repiiblica, de um lado, a ascenséio do neoliberalismo, a maior intemacionalizagéo dos mercados e a reestruturago produtiva, de outro, trouxeram novos elementos para o debate, gerando pressées diversificadas sobre a le- gislagéo sindical e trabalhista vigentes no Brasil. Trataremos esses dois temas num tinico capitulo, pois, naquele momento, eles eram freqiientemente associados no discurso dos agentes. Jé a partir da segunda metade da década de 90 eles se tomam crescentemerite dissociados, como procuraremos mostrar nos capitulos seguintes. Por fim, como mencionado na apresentacéo deste liv, no govemo Lala ‘a reforma sindical seria formalmente desvinculada da trabalhista. Para alcanger © objetive aqui anunciado, apresentaremos, na primeira parte do capftulo, a posigdo dos agentes frente &estrutura sindical corporativa. Para isso, ser necessirio recuperar as raizes das diferentes posighes referentes & legislagfo sindical. Na segun- da parte, analisaremos a questéo da nego coletiva, éenfatizando a discussfo em torno da livre negociagio ¢ do contrato cxletivo de trabalho. 2.1 Estrutura sindical: origens de um velho debate » stiAs eriticas & intervengio do Estado na-organizagio sindical ‘ititwileira’ndo so novas, Desde a introdugao da legislagio sindi- ‘ilipor Vargas nos anos 30; uma parcela do movimento sindical 103 scusa 0 Estado de pretender cooptar e controlar a atividade de Tepresentagio de interesses dos trabslhadores. Essas criticas fo- ram retomadasno final dos anos 70'pelo “novo sindicalismo, que adotou como uma de suas bandeiras a defesa da liberdade ¢ au- tonomia sindical. No entanto, os herdeiros daquele movimento no passaram'do discurso & prética, mantendo uma posigfo no minimo ambigua a esse respeito, como procuraremos discutir Na décéda de 30, 0 patronato também havia se contraposto 20 corporativismo estatal, mas apenas para preservar suas associa- ses de classe. A unicidade sindical, os impostoe sindicais e © po- der normativo da Justiga do Trabalho eram vistos como mecanis- ‘mos convenientes para controlar of trabalhadores e reduzie o con- flito capital X trabalho. Assim, até 0s anos 80, os ‘Tepresentantes Patronais nfo se manifestavam de maneira critica frente & estrutu- ra sindical, tanto é que atuaram contra o fim da unicidade na (Constituigio de 1988, A partir da Constituicio e, sobretudo, com a Posse de Colloy algumas liderangas patronais passaram a spontar as contradigées entre corporativismo ¢ democracia, apresentando uti discurso favorével ao pluralismo. No entanto, também no se mo: veram de modo decidido pelo fim da unicidade sindical, Por fim, desde 0 governo Sarney, politicos e burocratas esbo- am projetos mais ou menos amples de mudanga na estrutura sindical. A primeira iniciativa consistente de reforma coube a0 tinistro do Tiabalho Almir Paszianotto. Em 1985, 0 governo tw tara votar a Convengio 87 da OIT no Senado®. As associagtes atronais ¢ os sindicalistas da Coordenagéo Nacional da Classe Aili iittala A Convengao 87 da OFT, de 1948, havia dado entrada na Cémara dos Deputados em 1949 e fora aprovada naquela casa no final do governo Figueicedo. A refride Convengéo estabelece como umdos plares da liber dade sindical"O diteito de os trabalhadores]constituirlem| organizages de sua propria escolha ede a elaslivremente sefiiarem [..]foque] envolve a live determinagéoda estruturae comporigio dos sindicatos, odreto de ¢riar una ou mais orgunizagSes em qualquer empresa, profi ou stor de atividade, eo direito de constiuis com absolutaliberdade, federagSes¢ confederagées” (OMT; 1995: 39). 104 r ‘Trabelhadora (Conclat, futura CGT) se manifestaram contraria- ‘mente A medida, porque esta instaursria o pluralismo sindical e levaria & perda do imposto sindical. Pazzianotto anistiara as lide- rangas sindicais afastadas de seus cargos, abolira o controle mi- nisterial sobre as eleigdes sindicais, reconhecera as centrais sin- dicais, satisfazendo, dessa forma, as principais demandas dos sin- dicalistas da Conclat. A CUT, por sua vez, que se pronunciara favoravelmente.& adogéo da Convencio 87 da OIT e tinha um projeto alternativo de organizagfo sindical, ocupava cada vez mais ‘espagos no interior do sindicalismo oficial, 0 que comprometeu sua alegada intengo em substituir a estrutira sindical corporativa Em 1987, 0 Ministério do Trabalho elaborou o projeto de Ie n’ 164, que dispunha sobre organizagéo sindical, negociagSes ot letivas ¢ direito de greve. No que se refere ao primeiro tema, 0 projeto estabelecia, entre outras medidas,.a organizagio sindical ‘por categoria, profissiio, empresa ou estabelecimento, de acordo com a opgao de empregados e empregadores; um ntimero minimo de associados no caso de fundacéo de um segundo sindicato na mesma base; a extingio gradativa da contribuigio sindical em cinco anos; receitas sindicais provenientes de mensalidades dos sstociados e de cbtas fdas ei assembléia, descontadas dos as- sociados ou no associndos, em contrapartida a representaco sin- dical por ocasifo da negociagio coletiva; repasse de receita as federagées), confederagées e centrais conforme deliberacao da diretoria, réferendada pela assembléia geral do sindicato. Esse projeto; apedar das condicées que estabelecia, tornava possivel a criagdo de mais de.um sindicato numa mesma base territorial. Todavia, “a répresentagéo sindical patronal, parcela significativa das entidades de trabalhadores sem participacio ativa no movie mento sindical,\o establishment do judiciéri trabalhista e a buro- ‘cracia ministerial'formavam uma vasta coalizio a favor do status quo” (Almeida, 1996: 171), impedindo tanto a tramitagao da Convengao 87 no Senado quanto a votagéo do PL n’ 164, Como se sabé, a unicitade e 0 imposto sindical foram preser vados pela Constituigio de. 1988 que, a0 afrouxar os controles esta- 105 tais sobre os sindicatos, eliminou grande parte das criticas sindicais enderecadas a estrutura oficial. Paradoxalmente, nos anos 1990 observa-se uma intensificagao das criticas dirigidas & estrutura. De fato, poucos so aqueles que a defendem ativamente. Mas quando se observam as propostas de mudanga da estrutura concebidas na Primeire metade da década de 1990, € possfvel constatar duas coi- sas: 1) esses projetos referiam-se principalmente ao imposto sindi- cal, nfo alterando o principio da unicidade; 2) ainda assim provo- caram controvérsias no émbito sindical e patronal e nao tiveram prosseguimento. Essas constatagSes nos levam a formular duas in- dagagoes: 1) por que nem mesio projetos timidos — que nfo pro- duziriam impactos profundos na estrutura sindical posto que niio suprimem a unicidade — foram aprovados? 2) por que projetos mais amplos néo foram concebidos? Por ora, 86 podemos formular algumas hipéteses na tentativa de responder a essas questdes. O descompasso entre discurso ¢ pratica parece indicar que os agentes tém interesses na preserva- so do corporativismo estatal, Além disso, esse descompasse podé traduzir os conflitos internos e as disputas de poder nas’ quais cada um dos agentes aqui considerados se encontram envolvi- dos. Que interesses sto esses e quais as razdes desses conflitos internos? E 0 que nos propomos a discutir na seqiiéncia. 2.1.1 A CUT, ea bandeird da liberdade e autonomia sindical O surgimento da CUT € uma decorréncia da Tearticulagao do movimento sindical verificada no final da década de 70, em plena crise da ditadura militar Apesar de se diferenciar de outros Segmentos a partir de palavras de ordem contrérias & estrutura sindical, a CUT constituiu-se a partir dos sindicatos oficiais, as- sumindo a perspectiva de transformé-los “por dentro da estrutu- 72". Contudo, a posigio da CUT frente & estrutura sindical vai se tedefinindo ao longo dos anos. Grosso mado, pode-se identificar quatro fases no decorrer de sua trajetéria, que expressamn dife- rentes, posigdes: 106 | | | 1), desuaconstitugéo, em 1983, até 1988, ncental eshoga uma critica genérica estrutura sindical,utilizando-a para constituit ‘uma “estrutura sindical cutista”, mas “nao toma partido quanto ophiraismo sindical” (Almeida, 1996: 169)5 2) de 1988 até 1994, defende alguns aspectosda estrutura offci- al, pasando dioputargsfederag Sexe confedergSes, 2 mesmo tempo que admite a hipétese do pluralismo, mas no edota ne- nhuma atiude conereta para implementé-lo, Ease 6 tambémo perfodo emaque a central aprofunda sua proposta de contratagio colctivade tubalho, formulande tum piojeto de “sistema demo. crético de relagéesde trabalho” que dscutiremos adiantes 3) apaiticde 1994 intensifica suascriticas destruturasindical, merle acting dosindcato ogc ist 6, fifa dos sindicatos de uma mesma categoria numa Gnica organizagio, que nao seria filiada a central, mas faria parte de sua estrutura {interna Isso significa que, num cenério de pluralismo sindical, os sindicatos-CUT dixputariam a epresentagio dos trabelhadores com sindicatos CGT, FS ete. Aqui cumpre notar que se a unifi- cago dos sindicatos é uma medida que conta com o apoio das. diferentes comrentes cutistas hi um ntenso debate sobire como ‘essa unificagio seria feita, bem como sobre a relagao desse sindi- cato unificado com aesteuturasindical (pois algumas correntes dlefendem a unificacio ¢, simultaneemente, a preservagio da unicidade)s 4) erltre 1998-2002, a central redefine suaestratégia ern relagion Acetrufura sindical, em virtude das agées governamentais frente ‘08 direitos trabalhistas da oposigao das correntes minoritérias ao sindigato orgénico. Essa iiltima fase se caracteriza por um. recuo nal propostas cutistas de mudanga”, i li titados e A periodizago proposta foi baseada na anélise dosdocumentoscita cexdtdicagien ese afta Asani fal tol intesessante trabalho deSantos (2002), que recuperaem detalheso debate 107 Essa periodizacdo tem o intuit de nos ajudar a compreen- der as mudangas na posigio da CUT ao longo de sua trajetéria. Para isso, é importante relacionar cada fase ao contexto politico em que ocorre, buscando formular algumas hipéteses para ex- plicar as diferentes posigées. As ctiticas & estrutura e.a bandeira de liberdade e autono- mia sindical que caracterizam a primeira fase podem ser melhor compreendidas quando se considera o papel exercido pela dita- dura militar, que torna o sindicato mais sujeito & ago repressi- va do Estado. A central critica os aspectos em que a interven- 0 do Estado na vida interna do sindicato é mais visivel (cas- sacio de dicetorias, catatuto-padrio), sem estender esse critica a todos os aspectos da estrutura sindical. Isso ocorte porque a CUT se aproveitou da estrutura oficial para se constituir e se firmar como uma central combativa, devendo grande parte de seu crescimento a éstrutura, 0 que explica a oposigio a alguns de seus aspectos ¢ a dependéncia frente a outros. Assim, a0 mesmo tempo que considera que a estrutura corporativa res-~ tringe a prética sindical e constitui um entrave & implantagio do sindicalismo cutista, a central entende que sua proposta ino- vadora no campo sindical.e a luta por ela assumida jé teriam proporcionado uma ruptura “com os limites estreitos da estrutu- ra sindical oficial” (CUT, 1988: 24). sobre estrutura sindical ao longo da trajet6ria cutista. Discordamos desse autor em dois aspectos: 0 primeiro é que, baseando-se em Jécome Rodrigues (1997), Santos caracteriza a primeira fase dodebate cutista sobre aestrutura sindical como uma fase “herdica”, marcada pelo combate radical a estrutura no plano do discurso; 0 segundo & que o autor engloba o que identificamos ‘como terceira e quarta fases num s6 perfodo, oque, a nosso ver, éincongni- ente como refluxo verificado no debate cntista em virtude das polémicas desencadeadas pelo sindicato orgéinico e; ‘pélas iniciativas do governo FHC. Neste capitulo trataremos apenas das duas primeiras fases acima menciona- das.Essa periodizagacTeeré tetomada no capitulo 4, quando abordaremos.as. duas frases subseqiientes, 108 De um lado, a CUT identifica cometamente os limites do corporativismo; de outro, concebe ums titica equivocada: a0 invés de se constituir organizagGes paralelas e aut6nomas frente a0 Estado, busca-se a conquista dos sindicatos oficiais para transformé-los. A central acredita ser possivel, a um sé tempo, praticar um sindicalisms livre e independente da estrutura ofi- cial, ¢ continuar lutando no set interior, atribuindo & sua combatividade o poder de romper com a estrutura por dentro. ‘Um dos instrumentos concebidos para atingiresse objetivo era a propria organizagio intema da CUT, constituida por meio de departamentot organizadas por ramo de atividade econémica. Essa organizagio alternativa seria implantada nos sindicatos ofici- ais conquistados, objetivando alterar o enquadraménto sindical, tendo em vista a aglutiniago de diferentes organizagbes e, conse- qlientemente, a desmunicipalizagao do sindicato (Rede Estadual de Formagao da CUT, 2001). E certo que a desmunicipalizagéo se choca com a estrutura, pois esta foi concebida para dividir os tra- balhadores em organizagées distintas, enquanto aquela levaria & ampliagéo da base territorial, mas nao garante sua superacéo, pois € possivel ter sindicatos organizados por ramo e, ag mesmo tempo, preservar a unicidade sindical. Esse parece ser 0 caminho escolhido pela CUT nesse primei- zo perfodo, pois, apesar de propor a revogagéo do titulo V da CLT (que trata da, organizagéo sindical) e de, em outros momentos, reivindicar a ratificagio da Convengio 87 da OIT, a central no faz eriticas explicitas & unicidade: ‘Na verdade, esta impedida de fazé-lc, devido ' sua opgio de lutar por dentro da estrutura. As- sim, muito embéra o texto dprovado em seu 1” Congreso defina como plataformaide ago a luta.por “liberdade e autonomia sin- dical com-o reconhecimento do direito de greve e desatrelamento da estrutura sindical do. Estado, com a revogagio imediata do titulo V da CLT” (CUT, 1984: 8), os contomos de tuma estrutura sindical alternativa sao esbogados de modo bastante genérico: deveria ser uma estrutura democritica e de luta, que possibilitas- ise a defesa da unidade.da-classe trabalhadora, organizada por 109 ramos de atividade produtiva desde o local de trabalho, com li- derangas eleitas livremente, que fosse sustentada voluntariamente pelos trabalhadores, os quais, por sua ver, decidiriam em assem- bléia o destino dos recursos arrecadados. Diferentémente da unicidade, que niio é discutida, a abo- ligdo do imposto sindical ¢ a definigéo auténoma de novas for- mas de sustentagéo financeira séo propostas desde a 1* Plenéria (1985). O imposto sindical € mesmo considerado o “principal sustentéculo” (CUT, 1988: 35) da estrutura oficial. Todavia, essa avaliagdo é questionada pela bibliografia. Taspirada em Aziz Simao (1981), Boito Jr. (1991a) observa que a unicidade sindi- cal éc fundamento do edificio corporativo, na medida que de- fine qual sindicato tem o direito de representar o trabalhador e, conseqientemente, de aceder aos recursos financeiros previs. tos em lei", Desse modo, € o monopélio legal da representagéo que sustenta as contribuigdes compulsérias e nao o inverso. Com a climinagéo da unicidade, seria dificil preservar as contribui- g6es garantidas pelo Estado, pois, para que os recurso¥ arreca- dados compulsoriamente sejam distribuidos, € necesséria a in- tervengio do poder piblico:’Diante de mais de um sindicato tepresentando a mesma categoria, como o Estado iria definir a destinagio desses recursos?” Essa teve também. Male (1997) O problema da destinagéo das contribuigdes compuls6rias jé havi si levantsdo por Moraes Fillo relativamente Sicntctaltw anes ‘.absointa iberdade sindical, no sentido do sindiato primo, perguntamos: quem cabe receber ess fungbes delegadas [do Poder Pblico]? Tedos os sindicatos, algunsdeles ou somente umn? Ademais, em face do immposto sind cal existente em nosso sistema associativo, podemos igualmente pergunt ‘em favorde quem reverteré aimportiincia dessa taxa destinada aos sindica- tos? Como € notério, essa contribuigéo & paga por todos os ccupantes da profissio, indistintamente, dat ser dificil conséguir-ee um meio concilatétio para distribuigio dessa importincia entre diverwossindicatos de uma mesma profissio” (Moraes Filho, 1978:278). lefendida por! Juza (1990), Gomes; D'Araiijo (1993) 110 As criticas ao imposto sindical séo sustentadas em duas or- dens de fatores: 1) 0 fato de ser a tinica contribuicio compulséria ‘ho votada em assembléia faz com que 03 sindicatos combativos queiram se afastar dessa contribuicdo imposta por lei, attibuindo- The um cardter autoritério; 2) a existéncia de outras contribui- que jé vinha sendo utilizado para registrar as ntovas organizagées sindicais - como érgao encarregado de rea- lizar tal tarefa. Além disso, criam comissdes bi ou tripartites para resolver as disputas de representagio entre sindicatos, de modo a assegurar 9 principio constitucional de ndo-intervengao do Ministétio da, Trabalho na vida interna dos sihdicatos. Anda que pretendam fazer valer os princfpios constituci- onais de “libetdade” sindical, nenhum desses projetos admite a hipétese do pluzalismo sindical, pois, legalmente, estéio impedi- dos de fazé-lo. Assim, os projetos que se propéem a modificar a ano antes do inicio dé periodo estudado, a fim de dar uma indicagio acerea do tratamento dado & matéria imediatamente apés a Constituigdo de 1988. A tese que deu origkm a este livro contém um apéndice que sistematiza toda « legislacao consultada. 137 forma de organizagao e de financiamento dos sindicatos limi- tam-se a extinguir o imposto sindical sem tocar no prinefpio da unicidade, pois isso s6 poderia ser feito mediante emenda cons- titucional destinada a suprimir o inciso II do artigo 8° da Cons- tituigo de 1988, cujo contetido é 0 seguinte: “é vedada a orga- nizago de mais de uma organizagéo sindical, em qualquer grau, representative de categoria profissional ou econémica, na mes- ma base territorial, que sera definida pelos trabalhadores ou empregadores interessados, néo podendo ser inferior & area de um municipio”. \ Jones Santor Neves, autor de um desses projetos, apresen- ta a seguinte justificativa para as alteragSes propostas: Nio obstante o ponto de vista de que a adogéo do regime da pluralidade methorrefleteo principio de liberdadesindical, a Cons- tituigdo Federal, promulgada em 5-10-88, adotouo sistema sindi- cal unitétio de representagio, mantendo. contribuigéo legal com- pulséria, Forseu tumo, a vedagio eonstitucional deo Poder Pébli- ~ co interfere intervirna organizagSo sindicalalterou de forma substancial conceitos até enti vigentes, ampliando, sensivelmen- te, aliberdade de auto-governo e auto-organizagao das.entidades sindicais. Dentro desse contexto,-a presente proposicao visa ti somente adaptaro sistoma de rogéneiajurdica a realidade fi dasorganizagéessindicais” (Justificacio doPL 1.52869, In: Dit doCongresso Nacional, 24 fevertiro 1989, p.351). ‘Assim como outros projetos elaborados no periodo, oPL 1.528/ 89 contempla a possibilidade de um sindicato vir a ser substituido por outro, caso este tiltimo prove ser mais representativo do que o sindicato pré-existente. Desse modo, os trabalhadores so supos- tamente livres para fundar um sindicato, mas este sé passa a representé-los legitimamente caso seu:registro seja aceito pelo organisr2o pablico designado para atribuir personalidade juridica a0s sindicatos. Isto é, em tese os trabathadores podem criar suas entidades de representacao, mas na pritica podem ver negado 138 esse direit6, Esse projeto ~ que, convém mencionar, foi baseado ‘em proposta da CNTI ~ mantém, dessa forma, limites a livre or ganizagao sindical, preservando a subdtdinagao dos trabalhado- res a0 Estado. O principio do sindicato mais representativo jé hava sido propos- to por Moraes Filho (1978), ardoroso defensor da tnicidade mas, ain- dh assim, critico do modelo sindical brasileiro, porque, “uma vez reco nhecida uma essociagio como sindicato, estabiliza-se 0 quadro sindi- cal, sem que 0 sindicato venha a perder a prerrogativa de representa- ‘¢fo da categoria” (Moraes Filho, 1978: 271), Para 6 autor, o ideal seria. que o sindicato considerado mais representativo pudesse variar ao lon- go do tempo, admitindo-se a possbilidade “de uma associagio profiss- onal, mais representativa da profissio do que o sindicafo reconhecido, conseguir tirarhe esses poderes, substituindo-o na organizagio da clas- se” (Moraes Filho, 1978: 272), tal como propde 0 PL 1.52869". Assim, desde que a associagéo verha a ficar mais forte, mais representativa do que o proprio sindicato, deve este ser substituido pela primeita [...] Permanecer como esti [...] ¢ desestimular as boas associages profissi- onais, protegendo injustamente os maus sindicatos” (Moraes Filho, 1978: 291). Essa posicio €, porém, distinta do entendimento da OIT sobre liberdade sindical, pois a OIT admite o principio dé sindicato ‘mais representativo para fins de “negociagio coletiva, consulta por parte dos governos ou designacéo de delegados junto a organizacSes Mooeenel Mas enfatiza que casa distingSo ndo deve “impedir 0 de orgenizagSes minoritérias que devem ter, pelo me- nos, 0 direto le apresentar as reivinicagdes de seus membros e de representilos durante o exame de uuma teclamagio que lhes diz res- peito” (OIF, 1993: 43). Bota Je (199 1e.52) define esse sistema como unicidadle concorrencial, nna medida que preserva o monopélio legal da reptesentagao sindical: ndo obstante a existéncia de diferentes organizagSes em disputa, o Estado defi- ne osertérios de representatividade e depois aplica esses eritérios, definindo “qual associago, nump momento dado, é merecedora do monopélio legal da representagio sindical” (Boito Jr, 1993: 33). 9 A liberdade sindical continuaria a ser negada no govemo Collor Anténio Rogério Magri, que assumira o Ministério do Trabalho ¢ Previdéncia Social em margo de 1990, instituiu o Arquivo de Enti- dades Sindicais Brasileiras para acolher todos os tegistros de sindica- tos pattonais e de trabalhadores (Instrugéo Normativa n® 9/90), pois ‘© mandado de seguranca n° 290, do Superior Tiibunal de Justica, havia determinado que o registro voltasse a ser feito no Ministécio do ‘Trabalho até que os principios inscritos na Constituigio fossem regu- lamentados. Além disto, o ex-presidente da COT estabeleceu que a carta sindical s5 seria expedida pelo Ministério apés consulta ao Ar- quivo, a fim de evitar a duplicidade de sindicatos, oat —_ ferpo ave peeve unicidade, que constitu, a 5 0 pilar de sustentagéo do sindicalismo tivo, Magi Scere ee tacos naquele contexto. O projeto de lei 821/91, de autoria do Exe- Cutivo, constitui a mais importante iniciativa normativa do perfodo. Com o propésito de regulamentar os artigos 8° e 11 da Constituicio, 0 referido projeto trata a um s6 tempo da onganizagio sindical ¢ de negociagio coletiva. A Exposigio de Motivos enviada pelos minis- tros Antonio Rogério Magri, Zélia Cardoso de Mello e Jarbas Passa- tinho ao presidente Collor alegava que 0 anteprojeto estabelecin: ‘moderna disciplina legiglativa para as elagdes coletivasde trabalho, conforme preconizao ProjetodeReronstro Nacional [..] Amo- demizacioda Legilagéodo abalho pasanecesercorente pelo ofa tanento do Estado do campo das relaces cdletvas, permitinde que cs Interlocstoressociasocubem o espace que efetivanente Tes pertence na ‘esto dos prépriosconfltos, buscando encontrar sokugdes que melhor considtem seus interess | acolhe-se [ainda] a fexiblzacio de dire- tos, respeitadas as nomasde ordem piblica, Desta sorte, através da negociago— vale dzes sb tute sindical~podetio aspartes buscar «melhor forma de adaptarasnormas legaisisrelagSes de trabalho, tendoemcontaa naturezaeascarncteristics da atividade erapreen- dda, o local da prestago de trabalho e seus interesses eapectficos" {Dittio do CongresioNacional,9 maio 1991, p.5682-3-grifosnoson), 140 ‘TTrata-se da primeira tentativa de instaurar a flexibilizagio pela via legal promovida na era neoliberal. As criticas dirigidas pelas cehtrais sindicais, especialmente‘a CUT, ao projeto leva- ram o governo a desmembré-lo em duas partes: 0 PL 1.231/91 abarca artigos referentes & organizacéo sindical e o PL 1232/91, aqueles referentes & negociagao coletiva. OPEL 1.231/91 estabelece, de um lado, que o ambito de repre- sentagéo a base territorial dos sindicatos serio definidos pela as- sembléia que deliberou pela sua criago. Por outro lado, define re- gras para dirimir disputas sindicais relativas @ representatividade sin- dical, prevendo a substituic&o de um sindicato por outro mais repre- sentativo (em nimero de associados e convengées ou acardos cole- tivos celebrados): O projeto extingue o imposto sindical, embora pre- serve uma das contribuigdes compulsérias, a contribuicao assistencial, convertida em taxa negocial (a ser cobrada de associados e no asso- ciados). Também assegura a tepresentacéo dos trabalhadores na ‘empresa, reconhecendo-Ihes as seguintes atribuigdes: discutir a forma e acompanhar a implementagao da participagiio dos srabalhadores na gest da empresa nos seus hucres ouresdtcos, em consonéncitt com o estipulado em negociagiio coletiva; conhecer as inovagdes tecnol6gicas e projetos de automagio e participar da ‘mplementagfo do process [..|jestimulara composgao de contro- ‘vérsias tlabalhistes individuais no ambito da; empresa, antes da ‘ ‘propositurada ago cabivel,e assistir ac trabalhador no acordo, valen- doo que for pactuado como transaciio para tridos os efeitos legais; { eeomparkara elaboragéo de planos e respectiva execuciona éreade recursdshumanos;implementarquaisquer outrasegSesque visema integragodo trabathador (artigo 13 do PL 1231/91, epud Ditio do Congress Nacional, 26 out. 1991, p.20984—grifos nossos). Jéo PL 1.232/91 institui a flexibilizacdo de direitos por meio de negociagao coletiva, isto é, permite que o negociado prevale- ga sobre 0 legislado, e estabelece a prevaléncia do acordo coleti- ‘Vo (negociado, segundo o projeto, no nivel categorial e de em- 141 Presa) sobre a convengéo coletiva (que passaria a ter um caréter nacional). O projeto também restringe o acesso dos sindicatos ao Judiciério, a0 condicionar a instauragio de dissidio coletivo & Comprovagao de que a negociagéo coletiva fracassou, e limita o direito de greve, ‘ao delegar 20 presidente do ‘Tibunal a decisio de julgar se o processo de negociacéo se esgotou ou no. Uma das interpretagdes correntes sobre o PL 1.231/91 atri- bufa-Ihe a intencao e o poder de instaurar o pluralismo sindical no Brasil. Essa 6, todavia, uma interpretagio equivocada: © projeto de lei mantém a unicidade sindical, na medida que s6 uma entida- de setia credenciada para atuar como representante legal da cate. goria'™. A. prépria CUT reconhece que o projeto nfo instaura 0 Pluralismo, pois mantém e até mesmo amplia as formas de inter- lerdo PSDBna Camara, deputado Antinio Carlos Mendes Thame, “O que o govemo pretende é implantaro pluralismo sindi- calpor uma via desonesta”. Tanto é que seu partido apresentow emendas a fimde preservar a unicidade sindical (CUT qualifica como atentado' pro- jeto que prope mudangasna CLT. Gazeta Mercantil, 04 maio 1991). Técni- cosdo Diap | ‘também consideram que oprojeto “permite aexisténcia de mais de um sindicato na mesina base territorial” (Lombardo, Joio Alexandre. Critics & proposta de livre negociagéo. Gazeta Mercantil, 04 maio 1991),O deputado pelo PCdoB Aldo Rebelo, relator do PI.871/91 na Comissdo de ‘Trabalho, de Administeagio e Servigo Pablico da Cémara dos Deputados, alegava que tanto 0 projeto original quanto seus desdobrammentos (PL 1.231/ 91¢ 1.232)91) “introduziram na pratica o pluralismo sindical, admitiva 0 ‘flexibilizagdo de direitos’ e condicionara a participagiodos sindicatos nas negociagdes coletivas a um prévio credenciamento dos patrses" (Rebelo, 1991:5). Oparecer elaborado pelo relator argumenta quieo proto “macula” © principioda unicidade e é inconstitucionel sob vétios aspectos, ‘6" Essa interpretagao € confirmada pelos autores da Exposigio de Motivos do projeto original (PL 821/91), que atribuem o fato de nio se tocar na onganizagio sindical aos limites impostos pela Constituigao de 1988: “o ante- rojeto néc se aprofunda na regulamentagio de'organizagio sindical em virtude do principio da liberdade sindical,consagrado no aputdo art. 8° da Constituigao, softer indesejével imitagao pelo disposto no incisa II do mes- 142 vengio do Estado na vida sindical™. O projeto assegura a inter- vengio do Estado ao estabelecerprazos para convocagio de assem- biéias,regras para o registro de candldatira a cargo de dirego representagio sindical, ao impor limites ao ntimero de dirgentes com estabilidade, entre outros agpectos. Mas a intervengfo mais nefasta se dé, segundo Douglas Gérson Braga, assesorjuriico da CUT, na exigéncia de depésito do registro sindical no Ministério do Trabalho, © que “equivale a exigir autorizagio do Estado para exist” (Braga, 1992: 4), e na forma de solucionar controvérsias relativas & representatividade sindical: dditimir dGvidas sobre definigao da categoria ou base territorial dos sindicatos, na maior parte das vezes, equivale a decidir sobre a fundagao oungo de uma entidade sindical, pois inviabilizada a definigio da categoria ou da base territorial pretendida, automa- ticamente estaré inviabilizada.a entidade, nos moldes pretendi- dos (Braga, 1992: 4), i ° ‘Congcesso Nacional, 9 maio 1991, p.5682).Ad- Soe Cote toeaiiaiaotl Executivo ao Con- gressonfo eramo instrumento normative adequado parg realizar uma m- danga constituejonal, eae 1 Sobre a posigdo da CUT, vers CUT qualifica como “atsitado” projéto que propoe mudangasa CLT. GaetaMerunt 4 mato 1991; Braga (1991; 1992). 1 Destaque-se qle 0 autor critica a intervengio do Estado, via Ministério do Trabalho e Previdéncia Social, na solugdo de controvérsias,alegando tratar-se de tema de interesse de trabalhadores ou de correo oie levem dirimir eles pr6 as disputas de representagéo, podendo ainda eo tunics casei demu ins xclha ona Polar ui Paradoxalmente, o Judiciério nfo é, aqui, compreendido como parte do Estado, Esta instituigao estatal s6 éanalisada criticamente quando o autor trata do processo de negociagio coletivae do dieito de greve, Nessescatos, Braga considera que o Judiciério intervém para limitar as possbilidades de aco sindical (Braga, 1992: $-6). 143 O autor admite que a aferigao da representatividade pelo Ministério do Trabalho e Previdéncia Social pode prejudicar um sindicato anteriormente constitufdo, pois ele seria descredenciado em beneficio de um outro considerado “mais Tepresentativo”, isto é, com maior néimero de associados, favo- tecendo um sindicato submisso ao patrio, seja ele criado pelas empresas ou no (Braga, 1991; 1992). ‘Apesar das criticas a intervengio e tutela do Estado, as ané- lises do assessor da CUT evidenciam a dependéncia da central frente & estrutura sindical, assunto j4 abordado anteriormente. Se, por um lado, 0 autor entende que as inovagdes introduzidas pelos projetos de lei do governa “nin server 00 aperfcigoamento ou A construgéo de um novo modelo de negociagio coletiva e de estrutura sindical” (Braga, 1992: 9), deixando o Brasil ainda dis- tante da Convengéo 87 da OIT, por outro condena a sujeicao da cobranga da contribuigio assistencial & concordancia do traba- Thador (sindicalizado ou nio), defendendo essa fonte de financi- amento, pois “o sindicato necessiia desses recursos para desenvol ver suas lutas” (Braga, 1992; 6 - grifo nosso), € 0 patronato “pode muito bem pressionar o trabalhador para que este nfo efetive a contribuigao” (Braga, 1992: 6). A intervencéo estatal se tora, a tum 86 tempo, nefasta e positiva: nefasta ao.controlar a negocia- Gio coletiva, 0 exercicio do!direito de greve, 0 registro de sindi- catos, 2 solugtio de controvérsias relativas:a representacio; posi- tiva ac garantic u sustentacio financeira das organizagGes sindi- cais, o.que, por sua vez, remete A questo da unicidade: se o autor considera que o sindicato tem o direito ~ e a necessidade — de cob:ar contribuigdes de toda a categoria, mesmo dos niio-as- sociadcs, subentende-se que essa prerrogativa s6 funcionaria caso houvesse um Gnico sindicato reconhecido por lei. Oestatismo também se revelaiem outro momento da andli- 8, quando 0 autor critica a possbilidade de que a organizagio no local de trabalho tenha poder de negociagéo, advertindo que ‘esse papel cabe a0 sindicato, Braga entende ‘que participaciio nos eros ¢ resultados, introdugao de novas tecnologias e projetos de 144 itomago sejam questées que produzem impactos sobre a socie- dade como um too, e no apenas sobre os empregados de uma determinada empresa, devendo ser negoGiadas num nivel mal amplo. Para 0 autor, a representagio ne local de trabalho no é 0 nivel mais adequado para negociar essas © outras questées, pois, nesse mbito, os trabalhadores se encontram sujeitos & prea @ ao controle patronal, sendo mais facil abrir mio de direitos. As- sim, 0s representantes dos trabalhadores nas empresas devem com plementar a atuagdo sindical, e nfo concorrer com ela, out ss devem fiscalizar 0 cumprimento da legisla trabalhista, dos acordos ¢ convengées coletivas, ¢ nfo se comportar como um sindicato de empresa. Desse modo, a0 conceder “prerrogativas t- picamente sindicais’® representagGo isolada na empresa, o PLg [pro- jeto de lei do govemo] proporciona o aniquilamento de resistén- cias, a fragmentagao organizativa e a flexibilizagio de direitos’ : 8 — grifos nossos). bina ren ‘iinet organizagio no local de trabalho defendido pela CUT visa mais 0 estabelecimento de ‘uma a sindical na empresa do que de uma organizagéo auténoma de trabalhadores.E por esse motivo que o PL 646/91, referente & or- ganizagio e financiamento sindical, elaborado pela CUT apre- sentado pelo deputado federal Paulo Rocha (PT/SP), renge tarefa da organizagéo no local de trabalho e da dele ago sindi- cal ria empresa & constituigéo de “instrumentos prioritdrios e pri- vilegiados de fiscalizagio das normas contratadas”. A ong fo no local, de\ trabalho objetiva, pois, “complementar e e al, c&cia & organizagao sindical” (Diério do Congresso Nacional, ‘naio 1991, p. 6200). Tanto as criticas do assessor da CUT quanto 0 projeto de lei ehaborado pela central revelam o temor que atin- ge até mesmo o sitidicalismo combativo a respeito da organizacao no local de trabalho: o de sofrer a concorréncia de organizagdes 1 balhadores nas empresas. : Se oa wpa da CUT frente & estrutura sindical j4 foi anteriormente considerada, voltemos as iniciativas govemamen- tais. O PL 1.232/91 ‘estabelece a obrigatoriedade da participagio 145, de entidades sindicais representativas de trabalhadores, direta- ‘mente ou mediante “credenciamento especifico”, na negociagio coletiva. O deputado: Aldo Rebelo-(PCdoB/SP), que relatou tanto © projeto original como os desmembrados, alerta para o risco de hhaver ingeréncia patronal no credenciamento e acrescenta que a esse respeito hi, “claramente, a intengio de afestar as entidades Sindicais-do processo de negociacéo e da representacéo da catego- ria na defesa de seus direitos e interesses” (Parecer publicado no Distio do Congresso Nacional, 20 jun. 1991, p. 10243). Tadavia, 0 Pivjeto néo diz quois sio as condligSes de credenciamento para a -nezociagio caletiva, nfo determina quem pode se credenciar nfo fica claro se a tepresentagao dos trabalhadores no local de trabalho poderia desempenhar esse papel — nem perante quem deve ser feito o credenciamento. No que se refere ao PL 1.231/91, cumpre notar que, a despeito das avaliagdes dissonantes, 0 projeto preserva a unicidade, implementando uma reforma — mas néo a extingSo — da estrutura sindical. Apesar desse limite, Boito Jr. (2002: 74) considera que o reeo- nhecimento da organizacio no local de trabalho visava eaters sindicato de categoria ¢ a unicidade sindical”, possbilitando que a representagao dos trabalhadores nas empresas negociasse salérios € condigdes de trabalho, “passando por cima inclusive do acordo do sindicato” Boito Jr, 1991c: 15). No entarito, os projetos de lei ana- lisados nlio permitem susténtar essa hipdtese de maneira inequivo- ca. O artigo 12 do PL 1.231 afirma que “é essegurada a representa- sfo dos trabalhadores na empresa, com 0 objetivo de promover 0 entendimento direto e permanente com © empregador sobre as con- digSes individuais de trabalho que lhe sao peculiares” (Diério do Congresso Nacional, 26 out. 1991, p. 20984). Esse mesmo projeto define como atribuigdes da representagéo dos trabalhadores intermediar confltos entre a empresa e trabalhadores considerados individualmente, riegociar PLR, automagéo e acompanhar politica de 2ess0al/RH. Assim, podemos inferir que, caso o projeto fosse apro- vado, a interpretagao da letra da lei seria, no minimo, controversa. A possibilidade de a organizacao no local de trabalho negociar est 146! cicounscrita a temas especificos. E claro due esses temas podem ser jnterpretidos de maneira mais ou menos ebrfgente (por exemplo: 6 que so “planos na érea de recursos’ humanos”? Planos de contratagéo, demissio, de cargos e salérios!). A possibilidade de as representacoes de trabalhadores nas empresas negociarem salérios ‘rao esti colocada de forma explicita no projeto, deixando margem a uma multiplicidade de interpretagées. Os projetos aqiai mencionados apresentam ainda outras con- tradigées e pontos obscuros que podem ser explorados. A hi tese de que a negociagiio de empresa podétia’desrespeitar reitos estabelecidos em acordos ¢ convengées coletivas nos pa rece ser passivel de questionamento. Em primeiro lugar, o PL 1.232/91 deterniina que o acordo coletivo sera celebrado entre entidades sindicais representativas de trabalhadores e uma ou mais empresas. Em segundo lugar, ao mesmo tempo que admite a.flexibilizagio dos direitos, o PL 1.232/91 acrescenta que.“seré nula de pleno direito a cléusula de contrato (individual) de trabalho que reduza direito estipulado em acordo coletivo”. Ou seja: supde-se que 0 acordo de categoria ou de empresa possa contrariar a convengao coletiva ou a lei, mas acordos celebra- dos por representantes de trabalhadores na empresa nfo. ‘Como indicamos acima, a maior parte das iniciativas normativas do periodo 1989-1992 visava a extingéo do imposto sindical, mas,naoi se propunha « eliminar a unicidade sindical, pelo contrério, reaficmavam a unicidade ao definic regra’ para 2 resolugao de conflitos de jurisdigio. Ainda assim, provocaram. criticas provenientes da maior parte dos agentes sociais, mesmo aqueles que sustentam um discurso favoravel a extingio da es- trutura sindical,,como a CUT. O PL 821/91, por exemplo, foi rejeitado pelo relator Aldo Rebelo, que propés um substitutivo apoiado pela CUT e pela FS. Este foi aprovado por consenso pela Comissio de Trabalho, de Administragéo ¢ Servigo Pabli- co da Camara dos Deputados, o que motivou o.desmembramento do projeto original em duas.partes, como mencionado. O substitutivo eliminou a parte referente a0 registro das entida- 147

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