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Wilson Cano (Des)Industrializacado e (Sub)Desenvolvimento' Introducgao Para se fazer uma reflexao mais rigorosa sobre a questio da desindustrializagio Tavneeen &necessério preliminarmente advertir sobre trés questées fundamentais: i) 0 sig- ‘Congreso Internacional do nificado a composi¢ao do setor induistria, tal qual figura nos sistemas de contas noe oa Furtado, em. nacionais; if) lembrar os conceitos de processo de desenvolvimento ¢ de subdesen- BRRie ain, volvimento econémico; ei) 0 sentido da industrializago em tais processos. pode ocores concomitant O setor industria € uma agregagio de quatro segmentos: a mineraga mente, predominincia de Jo ci iblica (gé ‘ regimes polices asortrios a construcao civil; o produtor de servicos de utilidade piblica (gis, energia, ltl apamen tee gua); e industria manufatureira ou de transformagao. £ este iltimo segmento lugio enondmica, contd, que envolve maior complexidade tecnolégica, que possibilita e promove a dis- at eae a seminagao do maior contetido de progresso técnico aos demais setores da eco- inieemee aE a nomia (agricultura, resto da industria e servicos) e que, além disso, participa, induzindo um processo de hoje, com peso em torno de 40% do valor adicionado do setor indiistria. Além eee de ser 0 principal vetor das politicas de desenvolvimento, em especial das democraca formal industriais e de comeércio exterior, é também o mais suscetivel na concorréncia internacional, quando se defronta com adversidades cruciais como as de dum- ping, financiamento de longo prazo, acesso a C&T, cdmbio valorizado e outros. Dessa forma, pouco ou nenhum sentido tem usar 0 total do setor indistria, para indagar sobre eventuais problemas de desindustrializacao, sendo o corre- to usar unicamente o segmento de transformacao. Desenvolvimento é 0 resultado de um longo processo de crescimento eco- némico, com elevado aumento da produtividade média, sem 0 qual o exce- dente nao cresce o bastante para acelerar a taxa de investimento e diversificar a estrutura produtiva e do emprego. Esse processo intensifica a industrializacio e urbanizacdo para transformar de maneira progressista as estruturas sociais € politicas do pais Ademais, também se alterario e modernizario hibitos e costumes da sociedade. Esse processo, desencadeado no século XIX, foi liderado pela Inglaterra e seguido por um restrito: grupo de paises até o inicio do século XX, e a partir e > CAOERNOS SDESEMOLYIMENTO, Roseman spine nde 204 | (Bestindestislizacao e (Sub)Desenvolvimento 3. Sobreo sentido ea compo- {goa que chega ese stor tos pais desenvolvidose subdesenvovidos, ver: Cepal (0365), Fartado (1969 7000), Faineyilber (1983), Tensra (1968) eVaderrama (1965). dai, liderado pelos EUA. Dele faziam parte 0 Japao, Canada, os principais pai- ses da Europa Ocidental e da Oceania. A excecao foi a inclusio da Coreia do Sul, gracas a0 apoio e ao “convite” dos EUA, num longo pracesso que se inicia na década de 1950 e amadurece nas duas ultimas do século XX. O subdesenvolvimento, como bem mostrou Furtado (2000), nao repre- senta uma etapa do desenvolvimento ou um “desenvolvimento em grau infe- rior” Trata-se de um processo que se iniciou com a insergao dos demais paises no mercado internacional capitalista, notadamente a partir do século XIX, ¢ decorreu das relagées capitalistas de produgio que neles se internalizaram, mantendo, contudo, promiscua convivéncia com antigas ¢ predominantes relagdes pré-capitalistas preexistentes nos paises periféricos, sem, no entanto, extinguir a maioria delas. Entio, conforme Pinto (1979), decorre uma dind- mica de acumulagio perversa, incapaz de promover a homogeneizagio eco- némica e social, mantendo tracos econdmicos ¢ sociais desse proceso como a heterogeneidade estrutural, a debilidade das contas externas, financiamento de longo prazo, fiscalidade e inflagao latente. Quando um pais se desenvolve mostra alguns indicadores econémicos basicos que se aproximam daqueles ja obtides pelos demais desenvolvidos: elevado nivel da renda per capita e forte diminuigao da participagao do setor agricola no Produto Interno Bruto (PIB) ¢ no emprego. E isso, em todos os casos histéricos, decorreu da industrializagao. A agricultura passa a ostentar menos de 10% do emprego, por forga do aumento mais que proporcional obti- do pelos setores de indistria e de servicos, que também se expande gragas & urbanizacdo. A diminuicdo ¢ apenas relativa, uma vez que 0 crescimento dos demais setores ¢ da urbanizacio obriga a agricultura a crescer, diversifi- car e modernizar-se, reduzindo a diferenca de seus resultados em relagio aos dos demais setores, para assim proporcionar maior homogeneidade estrutu- ral econdmica e social. Se a industrializagéo nao avancar e diversificar-se, a modernizacio agricola ficard obstada ou dependerd de grandes importacoes de insumos modernos e de bens de capital. Para que isso ocorra, a industrializagio tem de avangar e crescer mais que 08 outros setores, aumentar a produtividade, alterar sua estrutura ~ no sentido de implantar os compartimentos de bens de capital e intermediarios, contri- buindo, assim, para a diversificagao da pauta exportadora ¢, se possivel, para a melhoria das contas externas. Nao ha, na histéria, pais algum que se desenvol- veu, prescindindo de uma generalizada industrializagao e de um forte ¢ ativo papel do Estado Nacional. E essa expansio e transformacio mostram uma diversificada estrutura, nna qual os bens de capital perfazem entre 30% e 40% do valor adicionado da indistria manufatureira® E essa notivel expansio, diversificagao e transforma- ‘cdo que intensifica a urbanizacio, induzindo e exigindo enorme crescimento 8 J] eases os DESENVOLVIMENTO. Ro dean v9.7.1. pp39-174 kde. 204 ison Cana. € diversificacdo de servicos de toda a ordem: comércio, transportes, finangas, 4, Sobre opapel da industriat- satide, educacio, pessoais ¢ outros, nao apenas predominantemente vincula- seeds ee dos 20 consumo domiéstico, mas agora cada vez mais interdependentes com as any cUNCTAD ONG necessidades das empresas agricolas e industriais, 5. Vee UNCTAD (2003). Uma Ao atingir esse elevado padri, a estrutura produtiva ¢ ado emprego pas-_silese tratando inclusive A . ar al + do caso do Brasil, esta em sam a mover-se no sentido de expandir, modernizar e diversificar ainda mais pes aot 0s servicos, mais que a agricultura e a indiistria de transformagao, caindo 0 peso relativo de ambas, perdendo posi¢ao para os servios. Assim é que se deve entender por desindustrializacdo em um sentido positivo ou normal.* “Muito diferente é a situacdo que pode ocorrer em um pais subdesenvolvi- do. Muitos deles também instauraram processos de industrializagio em seus territérios. Poucos, entretanto, conseguiram ultrapassar, com alguma expres- sio, a produgio de bens nao duraveis de consumo e a do simples beneficia- mento industrial de produtos primarios. Mesmo na América Latina, apenas Argentina, México e Brasil conseguiram instalar um parque industrial e, des- tes, somente o Brasil avangou na montagem mais expressiva, embora parcial, do setor de bens de capital. Este texto tem ainda duas sessdes. Na proxima, de forma breve e resumi- da, apresentarei alguns fatos ¢ argumentos que julgo relevantes para entender- mos 0 sentido da desindustrializagio normal e o da precoce. Para isso, na sub sessio 1.1 analisarei dados e informagGes sobre alguns dos principais paises desenvolvidos e alguns comentérios sobre o desempenho da China; na sub 25840 1.2, sobre alguns dos principais paises da América Latina, farei algumas mengGes ao “efeito China’, incluindo, ainda, algumas referéncias sobre a India. Na sessio 2 discutirei o caso do Brasil. 1. Adesindustrializaco normal (ou positiva) e a precoce (ou negativa): consideracdes sobre alguns paises desenvolvidos e subdesenvolvidos Ja em 2003 a UNCTAD havia tratado exaustivamente esse problema, mos- trando que o primeiro caso se refere basicamente aos paises desenvolvidos, os quais, entre as décadas de 1960 e de 1970, haviam amadurecido seus processos de industrializagao e mantinham forte presenca exportadora de manufatu- rados, em especial de bens de capital e de tecnologia mais complexa e avan- ada? Naquele periodo, a participagao do Valor Adicionado da Industria de ‘Transformagao (VAt) no Valor Adicionado Total (VA) se situava em torno de 308, e dali em diante se reduziria, como se vé na Tabela 1. CADERNDS do DESENVOLMMENTO, Ro dejo. 9.n. 1 peepee 204 | (Bestindustristizacso e (Sub)Desenvelvimento 1:1 A desindustrializacao em alguns paises desenvalvidos Com a maturidade dessas industrializagGes e de suas respectivas urbaniza¢des, 0 setor servicos teve forte expansio e diversificagio, e passou a crescer a taxas maio- res do que as industriais, fazendo com que a indiistria de transformagao, grada- tivamente, perdesse peso na participagao do PIB. Porém, essa industria nao s6 continuou a crescer ~ dentro e fora desses paises -, mas manteve altos seus inves- timentos, seu desenvolvimento de C&T, a elevagao de sua produtividade e de sua ‘competitividade internacional. £ 0 que; resumidamente, a UNCTAD chamou de “desindustrializagio normal ou positiva”. Alguns paises tiveram seu amadure- ‘cimento industrial mais tarde, como a Itélia, por exemplo, na década de 1970. a Coreia do Sul, néo apenas por ter sido a mais retardatéria, continuou a aumentar aquela participagao, que, dos 18,5% em 1970, atinge hoje 33,19. Apés 0 amadurecimento da industrializacao nos paises desenvolvidos, no inicio da década de 1970, a economia internacional entrou em crise. A medi- da que esta se aprofundava, a hegemonia americana, ajudada pela Inglaterra, deu inicio ao que viria a ser chamado de neoliberalismo e globalizagio, com as politicas de desregulamentagio comercial, financeira, dos contratos de tra- balho (precarizagdo e rebaixamento de seus custos), além das reformas previ- dencidrias e da minimizagao do papel do Estado. Na passagem para a década de 1980, no bojo dessas politicas e da necessidade de enfrentamento da crise, mundo assistiu & jogada de mestre dos EUA, com sua draconiana politica fiscal que quebrou todos os paises internacionalmente endividados, tendo sido inclusive a antessala do desmoronamento do regime socialista. ‘Como mecanismos de defesa a crise, houve forte acirramento da concor- réncia internacional, alimentada pela constituicao e intensificagao dos cha- mados “blocas internacionais” (UE, Asia e mais tarde o Nafta e 0 Mercosul, entre outros). Assistiu-se entao a um intenso proceso de compras, vendas ¢ fuses de empresas internacionais, concentrando e centralizando ainda mais © capital, desencadeando enormes fluxos de investimentos internos e externos que dariam a base de sustentagio para a profunda reestruturagao produtiva internacional, a chamada “III Revolugio Industrial”, Lembro ainda que desde a década de 1960, o capital financeiro vinha apresentando crescente presenca no movimento do capitalismo internacional, exacerbando sua ago na déca- da de 1970, e a partir dai, exercendo uma inequivoca dominancia sobre ele e espalhando pelo mundo inteiro seus efeitos nocivos, cujo maior exemplo viria a sera crise de 2007-2008, até hoje nao debelada. © conjunto desses fatos, consubstanciados na chamada “globalizacao’ teve efeitos diferenciados ao longo desse periodo. Entre os desenvolvidos, os efeitos econdmicos e sociais, positivos e negativos, foram desigualmente dis- tribuidos. Antes da eclosao da crise de 2007-2008, o enorme crescimento do investimento externo para consolidar a formagio dos blocos e 0 substancial © foams rr menia tose sn is. onnea te 204 Wilson Cano aumento do comércio exterior proporcionaram, a maioria, ganhos positives 6. lem. édbvin dos shen de crescimento do produto, mas também de negativos, sobre a desigualdade __Sseeoriternsionaie que distributiva, A perda de lucros no pais sede da empresa investidora foi com- “rep mesma cmprente= lem pensada ~ certamente de forma ainda mais vantajosa ~ pelas remessas de cadointemacionl lucros, juros e royalties enviados por suas filiais e associadas nos paises recep- een De tores Mas o volumoso desempregoe a precarizagdo do trabalho causadosno ye pais sede foram inteiramente arcados pela classe trabalhadora do proprio pals, _neamidade denna spa mitigado, é verdade, pela expansio derivada nos servicos. esi sobre sr madanas Ha que entender que grande parte dessas “perdas” de produgo nos paises “ttulmmisna producto « 2 lnvestiment ao impres- desenvolvidos significa, na verdade, apenas um deslocamento geogrifico da pro- cine, params com dugdo, pois o pais investidor continua a se apropriar de boa parte do valor agre- perranieiis ee gado dessa producio, via recebimento de royalties, de lucros, ede outros direitos (uso de marca, por exemplo). Estudos recentes sobre as cadeias produtivas de valor mostram boa parte desse fenémeno, chamando a atengo especialmente para a produgio de processamento de produtos (intermedidrios ou finais), e que respondem por essas remessas e por grande volume de reexportagoes, que mas- caram 0 volume efetivo do comércio internacional desses bens. Entretanto, a China nos tltimos dez anos tem aumentado sua geracao de valor nesses proces- samentos, diminuindo, portanto, a apropriacao pelo pais investidor” Contudo, a qualidade estrutural desse crescimento, seja em termos de emprego, da producio ou do consumo pouco foi discutida$ Com o aprofunda- mento da crise de 2007, na Europa, os “primos pobres” (0s “pigs’, como foram chamados) dessa familia arcaram com o pior dos énus, e amargam ainda hoje as dores de seus draconianos ajustes comandados, de fato, pela Alemanha. O Japao nao conseguiu escapar a forte deflacdo e recessio impostas pela politica fiscal dos EUA e pelo reajustamento do valor do délar, amargando violenta recessao entre 1990 ¢ 2002 e baixo crescimento daj até hoje. Os EUA foram os grandes vencedores — embora sua populacio wiesse a sofrer acentuada piora distributiva e elevado desemprego -, seguidos pela Alemanha. A eclosio desses fatos exacerbou o debilitamento que ja era notado na maioria das economias socialistas, e foi o vetor principal na derrocada do regi- me naqueles paises. Mas em sentido oposto, ha que destacar o caso da China ~ 0 novo “convidado” dos EUA desde 1971 -, que também serviu, de forma indireta, para a derrocada da URSS. Condigées politicas favoraveis aos EUA e a busca incessante por trabalho barato foram elementos fundamentais que beneficiaram ~ produtivamente - a China e alguns outros, notadamente paises asiiticos. ‘Vejamos a Tabela 1. Ela contém dados de paises selecionados: desenvolvi- dos, subdesenvolvidos, e da China, Em sua primeira parte, sio apresentadas as taxas médias anuais de crescimento do VA e do VAt, e podemos resumir nossas observagdes no seguinte: CADEROS do DESERVOLYIENTO, Ro cn v.8 m5 sso Leese | J oetinsetatnseo(sit)Oesemvehimento a) para a maioria dos desenvolvidos, essas taxas diminuem entre 1980 e 2012. ‘As exceges sio a Coreia do Sul ea China, que apresentam taxas de cresci- mento do VAt superiores as do VA, que resultam da intensificagao indus- trial nesses paises. A primeira diminui suas taxas, mas elas ainda sao altas as maiores entre os desenvolvidos. A China apresenta taxas ainda mais altas do que todes, e que sofrem pequena queda no periodo pés 2007. A Coreia do Sul conseguiu se articular melhor com a dindmica da economia da China. O Japdo, embora também tenha se beneficiado com essa articu- Jago, ndo conseguiu superar alguns efeitos negativos acumulados durante ‘sua longa crise a partir dos anos 1990. 'b)_arelacao VAL/VA também diminui para quase todos esses paises, apresentan- do quedas profundas, especialmente apés a crise de 2007, situando-a, para EUA, Canadé e Europa Ocidental, entre 10% e 12% apenas. O Canad, contudo, merece uma ressalva, que comento logo adiante. As gran- des excegdes sio Alemanha (23,8%), liderando o bloco da UE, ¢ Japao (18,7%), além das ja comentadas taxas coreana e chinesa, mais de duas ‘vezes maiores do que as da maior parte de todos os paises selecionados. Tabela 1. Valor adicionado total (VA) e da indistria de transformacao (VAT) ‘Tera média anual decrescimento. VA" | Taxa méila anual de crescimento da VAT! | Partcipagso do VAT no VA® (%) s70/ [iseoj | 1990/ |2000/ | 2007/ | s70y [2980p [12307 [2000/ | 2007/ ga0_|1990 | 2000 |2007 | 202 |1s80 | 1930 |2000 | 2007 |2or [1972 [1980 | 1980 | 2000 | 202 EUA 270 [280 | 300 [130 | 20 [sve | ase [280 | 190 | -050 | 2aao| mao | v2 | 1530 | a0 Coad [aio [azo | 290 | 260 | 120 | ase | 230 | a1 | 060 | 200 | veo | vee0 | vio | 30 | vaso Aemanta [290 [2a | rao | vao | 07 | vo | 200 | 00 | 200 | or | a3a0 | 2860 | a0 | 2230 | za80 Fran 370 [40 | 200 | o¢0 | 020 [340 | we [ane [rae | vse | ease | ano | ao | rsa0 | 00 Togatera [ro | 285 [290 | 290 | -o40| x20 | x90 | 090 | -o20|-v80 | 2750 | ao 1560 | woo Rata aso | aa0 | sso | v20 | 30 | 620 | 220 | 130 [ogo | -a40 | 2660 | 2800 2250 | 20.00 | as50 opto 50 [400 | rao [x50 | -40] aso | 470 [080 [240 | -080 | 33%0 | 2600 | asa | 2050 | 870 EociatoSui [740 | a0 | 600 | ato | 300 | 1580] 220 | eae | 680 | soo | vaso | 2460 | 2660 | 2830 | 310 Gin ago [920 | 980 | 10.60[ 920 [930 | moo [ago [neo [570 | 650 | aa90 | 3670 | 40.00 3850 as 300 | 560 | ss | 270 | 6.80 | 400 | 770 | sa0 | 850 | s20 | sao | xe30 | s650 | 5.80 | 350 eentna™ [270 [00 | aso | 420 | 500 [150 | 90 | 370 | 440 | 480 | 3570 | 2540 | 28c0 | 750 | oso Beast aso [ao | 250 | 360 | 240 | a0 | 030 | x20 | 380 | -os0 | 2730 | s100 | asso | a0 | aa0 = 285 [ago | 610 [460 | 370 [rao | 260 [190 [660 | 200 | 60 | v4.40 | ws00 | x970 | 20 sso [240 | 270 | 570 | 380 | so | 250 [120 [460 | e4o | a0 | 1970 | ws0 | 15.00 | 13.00 700 [tao | 4a [230 [190 [720 [2% [390 [090 | x30 | aso | 1820 | 2000] 2030] 790 420 [20 | 400 [sao | 560 | aa0 | -200[ a0 | 430 | 320 | va40 | ng0 | 1670 | s580 | 1450 160 | 460 | ooo | 520 | 190 | t30 | 210 | -100 | 2aso | a3aa| a0 | vaa0 | wae 280 [320 | a0 | 400 | 220 [240 | soo [avo | 2a90 | azo | ass0 | 1620 | 570 a 2008/7008 pas Aric Lana. a 9 DESENVDLVIMENTO. Rio de fant, v.9, 6, p.139174,ul-der. 2014 A incluséo da China nessa tabela — e entendo que ela néo pode ser enqua- drada naquelas categorias por ser socialista -, mostra que em 1970 ja tinha alto VAUVA (36,5%)’ nao por ter completado a diversificacéo de sua indus- trializagdo, mas principalmente em razdo de sua clevada populacio (e empre- 0) rural ¢ de sua escassa urbanizagao e, portanto, de reduzido setor servicos. A tabela mostra que aquela cifra cresce, situando-se em torno de 40% ao longo do periodo 1970-2012. Contudo, cabe lembrar que o pais ja reduziu a partici- pagao do setor rural, e a forga de sua industrializacao recente transferiu mais, de 300 milhées de pessoas do campo para a cidade, aumentando a participa- G40 do setor servigos, que, dos 24,4% de 1970, ja alcanga hoje 44,6%, Para que a China possa também apresentar uma eventual desindustrializago normal, como a dos desenvolvidos, ela precisaria expandir muito mais sua urbaniza- ‘s4o, hipétese que provavelmente s6 se manifestaria a longo prazo. Contudo, cabem ressalvas sobre essa aparente desindustrializa¢io, nota- damente no periodo pés 1990. £ que boa parte dos paises desenvolvidos incrementou fortemente suas inversdes produtivas na Asia, especialmente na China, deslocando parte de sua capacidade produtiva para essa regio e, portanto, criando assim uma desindustrializacaio que tem um sentido muito mais espacial do que efetivo. Esses deslocamentos sem diivida foram liderados pelos EUA, UE e varios asidticos, notadamente o Japao, Taiwan, Hong Kong € Coreia do Sul. Outra ressalva merecem os paises que, além de terem uma indistria madura, contam também com um setor agricola e um mineral de grande porte, Essas nagdes muito se beneficiaram com o forte aumento das exportagdes desses bens, a partir de 2002-2003, notadamente para a China, aumentando as taxas anuais de crescimento desses setores, acima das da industria. E 0 caso do Canadé, Australia e alguns paises latino-americanos. Mas ha ainda uma terceira questio: a acentuada diminuigao da relagdo VAt/ VA apés 2000 pode estar influenciada pela desaceleracao do crescimento ps 2007, 0 qual pode ou nao ser temporirio, Wilson Cana 9. indstria da China, na Ea ‘Man.en consttudaem grande parte pela chamads ndstria pesada (bens de produto) que dria importante base pars desenvolvimento posterior Ein 1970, seu VA industial (nine ‘ag, transformacio e SUP) fem USS correntesera de cerca de 50% do setorequivalente do Japao,sillar ao da Fangs © superiors da tine Canad {AGERNOS do ESENVOLVIMENO, Ream... pope Me oe | _(Beshindustrializacao e (Sub)Desenvolvimento “Tabela 2. Exportar6es de manufaturados (xm) XM/X TOTAL 00 PAIS (%) XM/XM TOTAL MUNDIAL (%) Pe ia | ee] s| ou] as at ee! | Lose ea | eee Na Tabela 2 figuram os mesmos paises da tabela anterior, com seus dados sobre exportagdes de manufaturados. Na primeira parte aparece a propor desses bens no total das exportacdes de bens de cada pais, e nela hé perdedo- res entre os desenvolvidos. Contudo, ha que considerar que entre 1990 ¢ 2012 as exportagdes mundiais de manufaturados cresceram 378% em valor (USS correntes) enquanto a inflagdo nos EUA (IPC) situou-se em torno de 80%. Com efeito, essas participages crescem entre 1970 e 1990, mantendo-se altas até 2000; sé caem um pouco entre 1996-1998 para Japao e Italia, e quase todos sofrem as maiores quedas no periodo 2004-2007, afetados nao sé pela crise, ‘mas, principalmente, pelo enorme crescimento da participacdo da China, que passa de 1,9% em 1990 para 6,2% em 2002, ¢ de 12,8% em 2008 para 16,8% em 2012, Contudo, 0 “desvio de comércio” ocorrido contra esses paises se dew sobre parte do crescimento dessas exportacdes, nao as reduzindo, em termos absolutos, em nenhum deles. A excegdo foi a Coreia do Sul, que no periodo | SASERNOS ce DESENVOLVIMENTO, fade janeiro v9.1.5, pp.139-74jleder. 2004 Wilson Cone passa de 2,5% para 4,0%, figurando a partir dai como o quarto maior exporta- 49, Sobe de 26% pan 4%, dor de manufaturas!”, se excluirmos a China do total Mais importante ainda é lembrar que a participagio das exportagdes de ™™ manufaturados no total de cada um desses paises, variava er 1980, na faixa ‘entre 60% e 90%, sobe ainda mais até 2000, atingindo niveis médios superio- res a 80%, salvo no caso do Canada (63,5% em 2000) dado o elevado peso de bens agricolas e minerais em suas exportagdes. Nesse pais, aquela participagio cai para 46,3% em 2012 pela questo apontada nos demais paises (exclusive Coreia do Sul e China), que caem cerca de dez pontos percentuais, As razdes para a queda do periodo 2000-2012 sio trés: primeiro, porque em varios pai- ses as exportagdes de primarios cresceram mais do que as de manufaturas; a segunda é que todos sofreram deslocamentos de exportagdes adicionais causa- dos pela expanséo comercial da China; terceira & que a crise pés 2007 afetou todos, notadamente paises europeus, que, em alguns dos anos de 2007 a 2012 sofreram quedas nominais no valor de suas exportagées. Contudo, tamado 0 periodo 2000-2012, o menor aumento nominal foi o da Inglaterra, com 46%; €, no mesmo periodo, o IPC dos EUA cresceu 33%. Ha ainda que considerar que o perfodo é de grande baixa de precos dos bens de contetido eletrdnico, Observemos, na segunda parte da tabela, a participagdo mundial de cada pais nessas exportagées, incluindo e excluindo as exportagdes da China. As perdas nominais s4o evidentes, notadamente apés 1990, quando a China ace- lerava seu crescimento e suas exportacdes. As perdas, nesse caso, si maio- res, por aquilo que deixaram de exportar, por causa da expansio da China e da crise pés 2007. Os tinicos ganhadores liquidos foram a Coreia do Sul ea China. Vistos os dados de 1990-2012, excluindo as exportagdes da China, as perdas sao menores ¢ 0 nico ganhador liquido entre eles é a Coreia do Sul, que quase duplica sua participagaio. A China se converteu no maior atrativo do investimento externo também. paraa Asia, principalmente para Japao e Coreia, que para Id canalizaram parte de sua capacidade produtiva industrial. Com iss0, 0 “bloco asidtico” ampliou ¢ intensificou sua integracio de fato, em termos produtivos, financeiros, tee- nol6gicos e comerciais. Salvo 0 caso do Japio ~ ainda que lhe caiba uma das duas ressalvas que fiz. logo acima -, raros seriam os paises desse bloco que efe- tivamente estariam softendo de uma desindustrializagio, positiva ou negativa. CADERNOS Co DESENVOLVIMENTO Rode janet. 9, 1s. gps sex ne | _Besjindustrializacso e (Sub)Desenvolvimento ‘Tabela 3. Estrutura das exportacdes de manufaturados” () Maquina, eqaipamentos, ] (2) Produtos Automotives | (3) Equipamentos elev () Tete ConfecrBen exclusive (2) componente, Extratura | Partie. Mundial seo] 180| 2000] zon] so] 90] 2000] 2012| 2000] 20m| 2000] 2012 ‘eg0| 2000] 2012 Beles] Sc) sea| tan) ats] wal wal ane] onl al eel aw il aol =P EE oie Porc roror nono r nrc ES mets | sero emi] inc] savo] ta] waa] axa] ase] oysi| aa] eel ama] a] ose) 7] an Teai,, | ss00| ava] saao] anzo| vo] a0] a0] nar] anss| vase] wo] wo] evs] nae] re] ee Fone axis anton: st ta. statacprograjwadbidta aap s apeos USS) caents. (}aaaunes,sausarentan «components 2] Volos ar potsana, dara atop. eth mae fro so roe metocls als tm) (Equant de Pcl ccc egrecin es etess prope ce orem wtkon score kro Ss telinin alacorer nto open 8 ‘A Tabela 3 mostra a evolucio da composicéo estrutural das exportagdes de manufaturados. Nas quatro primeiras colunas figura 0 item “méquinas, equipamentos ¢ seus componentes’, ¢ dele excluimos “produtos automo- tivos'; e o saldo, portanto, tem um significado mais apropriado de “bens de capital’, Apesar dos altos niveis apresentados em 1980, observe-se que varios paises continuam a elevar essa participa¢ao, a maioria situando-se, em 2000, entre 45% e 55%. O Canadé é uma excegio, e seu menor peso & compensa- do pela elevada participacio de produtos automotivos. A China, retarda- téria, cresce muito rapidamente, superando em 2012 todos os demais. A Coreia do Sul, retardatéria desenvolvimentista, situar-se-ia logo em seguida 4 China. Certamente, o enorme crescimento das exportagdes de bens de capi- tal da China, a precos menores, deve ter deslocado parte da demanda outrora @ | cee scocesevc.vmenro isle. v.50.5. pomp sre tee 204 atendida pelos desenvolvidos, a despeito da queda do investimento, 0 qual certamente também exerceu contragao naquela demanda. segundo grupo da Tabela 3 ¢ 0 de produtos automotivos (veiculos de passageiros, de carga, inclusive autopegas, nao incluindo veiculos aéreos, fer- rovidrios, nauticos, motociclos e suas pecas). Sua participagio era, em 1980, ‘entre 10% e 15% e se eleva muito pouco ao longo do periodo. Salvo a Coreia, que em 2012 jé tem participagdo elevada (15,6%), a China estava dando seus primeiros passos nesse segmento, Portanto, nesse item, ndo se pode falar em -deslocamento de comércio causado pela China, No terceiro grupos figuram os equipamentos eletrdnicos e seus compo- nentes, que mostram profundas alteragbes no periodo recente. Por indisponi- bilidade de dados, limitei-os aos anos 2000 e 2012. Em 2000, observe-se que a participagdo desses bens no total das exportacbes de manufaturados era alta, refletindo a situacao mundial da reestruturagao produtiva, e como era restrito ‘0 clube dos paises que os produziam. Os desenvolvidos contidos nessa tabela (excluida a Coreia) detinham 44% das exportagées mundiais desses produtos, ‘¢, em 2012 aquela cifra se reduz. para apenas 21%. Também se reduzia forte- mente a participagdo desses bens no total das exportagées de manufaturados. Mas a questo chave é que houve uma verdadeira revolucéo na estrutura -concorrencial do segmento, com o deslocamento parcial do setor para a Asia, ‘onde nove paises passaram a responder por 66% da produ¢io mundial, com China detendo 32%, a Coreia 5,4% e 0 Japio, 49%. E essa transformagio se deu com forte queda de pregos ¢ alteragies de escalas de producio. Quase todos os paises desenvolvidos nao sé perderam posigio nesse segmento, mas vViram deslocada parte importante de seu comércio para a Asia, A quarta parte da Tabela 3 se refere as exportagdes de téxteis ¢ confecgées, ‘Como se sabe, esse setor é um dos mais tradicionais na inddstria. Observe-se ‘que, no caso dos desenvolvidos, ele diminui sua participagio & medida que os setores mais complexos se consolidam. Algumas excegdes se encontram em paises europeus onde se destacam aspectos de alta qualidade nessas exporta- ‘goes. £ 0 caso, na tabela, de Franca, Inglaterra, Alemanha e Itélia que, embora também caissem, ainda em 2000 mantinham percentuais expressivos. O caso da Coreia se explica por ser retardataria e ter ainda, em 1980, nesse setor, um peso expressivo na estrutura industrial. Observa-se, contudo, que em 2012 todos estio praticamente alinhados em baixas percentagens. Contudo, isto ainda ¢ uma visio parcial do que ocorreu: as exportagdes mundiais entre 2000 e 2012 duplicaram em valor, em que pese a elevada pre- senga chinesa com seus costumeiros precos baixos. Elas passaram de US$ 353 bilhées para USS 708 bilhdes. A China, sozinha, passou de USS 52 bilhdes para US$ 255 bilhdes, participando com 57% desse aumento, ¢ os europeus outros 10%, Isto mostra, evidentemente, que os paises desenvolvidos puderam CADERNOS So BESEWOLMNENT, Rede inn. penea ee | (Desjindustsiaizario « (Sub)Desenvolvimento 11. Vera respeito Cano (1995 1998), especialmente sobre os "efeitos desse processo sobre a América Latina AR. Afora os cos d io Chile (2973) Argentina (1976), ‘mpostas por seus governas dita ‘oriss,ambas fracassadas. chegou a a década enfrentar essa concorréncia e sobreviver dentro dela: é Sbvio que para isso tiveram de elevar seus investimentos e sua produtividade. Ainda assim, man- tém altos déficits no segmento. Em sintese, se houve perdas para os desenvolvidos, provavelmente elas se concentraram no segmento de eletronicos. 1.2 Desindustrializacéo, subdesenvolvimento e neoliberalismo No caso dos paises subdesenvolvidos, a UNCTAD a denominou de “desindus- trializagdo precoce ou negativa’. Isto porque suas indiistrias, ainda que continu- assem a crescer, o faziam a taxas reduzidas, diminuindo suas participagées na produgao mundial, reduzindo a taxa de investimento, sofrendo estagnacio ou queda da produtividade, perda de competitividade externa e interna e flagrante queda na participagio de exportages de manufaturados. A. propria UNCTAD mostra as poucas excecdes, como os NIC's asidticos que se incorporaram a dina- mica da China, ou o México com sua industria maquiladora na base de trabalho barato. Mas o México nao conseguiu se manter, nao resistindo ao "efeito China’, perdendo inclusive parte de suas exportagdes para o mercado norte-americano. Para esses paises, a crise também chegou nos anos 1970, agravando-se sobremodo na década de 1980, periodo que foi denominado a “década per- dida’"' Esses paises, mormente os latino-americanos, haviam retomado 0 crescimento da produgao e do investimento industrial na segunda metade dos anos 1970, crescendo a taxas elevadas ¢ iniciando um processo de diversifi- cagio da pauta exportadora, com crescente incorporagio de manufaturados. Essa expansio se deu com forte contetido de financiamento externo, que, no momento, era a taxas flexiveis, mas muito baratas em termos reais. Contudo, a partir de 1974-1975, com os primeiros sintomas da crise internacional, come- ‘sam as restrigGes crediticias ¢ a pa de cal viria com a draconiana politica fiscal dos BUA, a partir de 1979, elevando desmedidamente a taxa de juros real, ¢, ‘com isso, quebrando todos os paises endividados. Conforme mostra a Cepal, a despeito da América Latina ter sofrido uma transferéncia liquida de recursos no valor de US$ 225 bilhdes na década de 1980, sua divida externa — que em 1979 era de US$ 180 bilhdes — saltava para USS 453 bilhdes em 1990. Todo © esforco ¢ os sacrificios que passamos foram negativos, além do baixo cres- cimento, da estagnagao tecnolégica e da inflagdo. A implantacao das reformas neoliberais, no mundo subdesenvolvido, deu-se um pouco mais tarde, entre fins dos anos 1980 e inicio dos 1990." Com essas reformas, vieram também as politicas de estabilizagdo lastradas naquelas mesmas politicas, na valorizagao cambial e no pesado Snus fiscal decorrente dos elevados juros sobre o débi- to externo e interno desses paises. As politicas de estabilizacio foram vitorio- sas, gracas a uma elevada valorizacao cambial," eo cambio barato, amparado por um financiamento externo agora abundante ¢ por juros elevadissimos, a” [erases nese. mento Ro dane. 9,915 p54 bd 204 permitiu uma verdadeira enxurrada de importagGes, estimulando os setores de servicos (comércio e finangas, principalmente) e reativando 0 crescimen- to ~ que atinge bases mais altas do que na década anterior, As privatizagdes, entre 1990 e 1997, geraram recursos equivalentes a 1,4% do PIB desses anos, quantia modesta frente & argumentagao de que com elas “pagarfamos nossa divida’. A enxurrada de importagdes nos custou déficits em transagées corren- tes que somaram, de 1991 a 2000, USS 493 bilhées, com 0 que a divida externa saltou para US$ 740 bilhdes. O Estado foi transformado em tesoureiro do sis- tema financeiro, “administrando” recursos piiblicos anuais para o pagamento dos juros, que chegaram a perfazer cerca de 8% do PIB, comprimindo o gasto pblico e, notadamente, o investimento publico. Se a década de 1980 tolheu nossa trajet6ria de industrializagao, a de 1990 nos impés um dnus cumulativo perverso, Enquanto os paises desenvolvidos se reestruturavam produtivamente, articulavam seus “negécios com a China” € consolidavam a implantacdo da revolugo tecnolégica dos anos 1980, nos distanciamos ainda mais dos niveis por eles atingidos em termos de produtivi- dade e competitividade internacional. Quase todos os paises subdesenvolvidos foram negativa e duramente afe- tados por todo esse processo. Foram varias as restricdes impostas pelas politi cas de controle inflacionirio e a valorizacio cambial e 0s juros elevados afeta- ram tremendamente as finangas piblicas e implicaram em baixo investimento (piiblico e privado) e baixo crescimento. A abertura comercial (que causou a perda de exercer uma politica comercial de interesse nacional), pega vital na politica anti-inflacionaria, alterou significativamente as contas externas, € 05 elevados juros internos passaram a constituir 0 elemento vital para atrair capi- tal para suportar a sangria de divisas causada nas contas externas. As restrigdes impostas sobre o cambio, juro, crédito e financa piblica impe- dem ou causam fortes restrigdes de fato a0 manejo da politica macroeconémi- ca de desenvolvimento que efetivamente atenda aos interesses desses pafses. E, ‘uma verdadeira “camisa de forca” que restringe muito o manejo da politica eco- némica nacional. E é com essa heranga perversa que entramos no século XI. ‘Conseguimos nos livrar da Alca em 2005, mas jé havfamos entregue nossa poli- tica comercial em 1994, quando aceitamos o jogo da OMC. A Alca nos obrigou a muito trabalho politico e diplomitico, dadas as dificuldades em dizer nao aos EUA, mas essa proposta tinha apenas a fachada de “livre comércio’, pois con- tinha cliusulas comprometedoras com varias questées delicadas: comércio de servicas e eletrénico; compras governamentais; acordo de investimentos e de propriedade intelectual. Era tio draconiana que o préprio Stiglitz denunciou-a.!* A mitigar nosso dificil caminho, a crise internacional, embora nos tenha afe- tado, serviu, pelo menos, para baixar a taxa de juros internacional. Mas ao invés de a América Latina tentar se aproveitar disso, ao contrario, continua a praticar Watson Cona 14. Ver soa entrevista de 0/06/2003 fr kp wwr, folhawolcom.bifipidinheiro! £13006200312.hum. Para uma critica mais detalhada ver (Cano (2003) CADERNOS do DESENVOLVIMENTO, Rlodefaneiov. 9.7.15, pp.135-174 jul-dez zone | (Desjindustriaizaczo e (Sub)Desenvalvimento 15. OChile sebeneficia do pert odode enteesafas dos pases ddesewolvidos.O deserwol- ‘ment das tecnologis que do sustentacdo a esses stores se fe por meio de longo e intenso ‘rabalho da Fundagdo Chile, do Fstado, que arcou com esse ‘nvestimenta, “60 peinileoresponde por 25% do PIB, 75% das exportacoes ‘eda receta fiscal do Estado-e “ porapenas 2% do emprego. 0 | movimento dos pesos interna- | conals do dleo aft fortemente a co pais, notadamente a ogasto pablo. elevadas taxas de juros internas, para atrair o insaciével capital financeiro inter- nacional, para “equilibrar” nosso balanco de pagamentos. Os juros menores nos ermitiram respirar um pouco mais e a monumental expansio da China reativou nossas exportagbes de primétios, com substancial elevagio de seus precos. $6 recentemente, no entanto, a América Latina se deu conta de que 0 maior prego que estamos pagando é o da desindustrializacio, Repito o mesmo percurso que fiz na anélise dos paises desenvolvidos. Os subdesenvolvidos incluidos nessas tabelas também foram selecionados. Além da India, nela constam sete dos maiores paises da América Latina, A Tabela 1 mostra a profundidade da crise dos anos 1980, quando passamos das elevadas taxas de crescimento dos anos1970. Na década de 1990, as taxas ainda sio baixas, mas ha que apontar algumas especifici dades que explicam comportamentos tio diferenciados como 0 do Chile. Este pais, a partir do regime ditatorial, praticamente abdicou de uma poli- tica de industrializacao, abracando uma politica liberal de comércio exte- rior, lastrada por sua base de recursos naturais; mineragio, notadamente a do cobre; frutas temperadas e sua agroindustrializagao; madeira e mobilié- rio; salmao de criatérios e crustéceos."* Contudo, a histéria nos ensina que confiar apenas em uma base de recursos naturais reprodutiveis, mas que podem nao ser inesgotiveis, ¢ algo que envolve sérios riscos, Ja ha forte preocupacao sobre o esgotamento das recursos maritimos ¢ a criagio de salmio tem apresentado problemas sanitirios desconhecidos, que tem causado o fechamento de alguns criatérios, A Venezuela é um dos maiores produtores de petréleo, sofrendo com isso 8 percaleos de uma economia petroleira."* Além disso, a vitéria de Chaves em 1998 reacendeu a luta politica do pais, que desde 2002 vive com tentativas de golpe, todas até agora frustradas. A direita golpista se vale das dificuldades de compatibilizar as estruturas de oferta do pais, com as de demanda interna, € a instabilidade recorrente de uma economia petroleira que pretenda ter um estado atuante e desenvolvimentista. O Peru tem uma base produtiva lastrada ‘em recursos minerais — notadamente cobre ¢ ouro —, e tem obtido taxas ele- vadas de crescimento nos tiltimos 20 anos com essas exportagdes. (O México ja contava, desde a década de 1960, com legislacéo que favore- cia a implantagdo de indéstrias maquiladoras, politica s6 exitosa a partir dos anos 1980, mediante acordo com os EUA. Tal politica permite a importagao de partes e pecas para montagem de bens que sero exportados. Na média, 0 contetido de entrada equivale a cerca de 85% do valor exportado, mostrando a exiguidade da geracio de valor interno em tal atividade, que cresceu estimula- da pelos baixos saladrios mexicanos. A atividade cresceu ainda mais a partir de 1994, quando © México ingressa no Nafta. O pais, que tinha 2/3 de suas expor- tages dirigidas aos EUA, com essa decisio, que envolveu muitas mudancas © J cates co esenvo.eeno, Ro ene v-8.0.95.pomn974 dee 2004 legislativas internas, acabou por atrelar sua economia & dos EUA, com cerca de 85% das exportacies dirigidas aos BUA e Canada. Em artigo recente, Jorge Castanheda (ex-ministro do exterior 2000-2003) fex um balanco dos efeitos positivos e negativos dessa insergio no Nafta, mostrando que, se em 1994 as exportagdes das maquiladoras compreendiam 73% do total, hoje compreendem 75%, e as industrias maquiladoras criaram apenas 700 mil empregos. Ou seja, 0 efeito de internalizacio foi minimo. A taxa média de crescimento entre 1994 e 2014 foi de apenas 2,6%, resultando em baixo aumento da renda per capita. Nesses 20 anos, 0 México teve apenas quatro anos de alto crescimento (entre 2006 ¢ 2010), dois depressivos (1995 2009), dois de crescimento nulo (2000 e 2013) ¢ os outros 12 com baixo cres- cimento, Se em 1994 havia 6 milhdes de mexicanos nos EUA, esse mimero hoje é de 12 milhdes. Além disso, tornou estrutural um permanente colar de déficits em transagdes correntes em todos esses anos.” O crescimento do PIB na década de 2000 ¢ mais elevado, pelo menos nos seus oito primeiros anos, embalados pelo “efeito China’, com a excepcional elevagio das exportacdes de primérios, pouco afetadas pela valorizagao cam- bial. No periodo 2008-2012, essas economias sio afetadas pela crise externa, baixando, em alguns casos, suas taxas de crescimento. Contudo, a segunda parte da Tabela 1 mostra o lado mais negative desse processo: as taxas de crescimento da inddstria de transformagao despencam entre 1980 e 2000, ganham um alento em 2000-2008, beneficiadas pelo efeito China, e caem novamente diante da crise externa, A parte terceira da Tabela 1 € mais cdustica: mostra a violenta queda da participagao do VAt no VA total: a da Argentina, que cai dos 29,4% de 1980 para 19,5 em 2012; a do Brasil, de 31% para 13,2%; ou mesmo a do Chile, caindo para 11,2% ; a da Colémbia, para 13%; a do Peru, para 14,6%; ea do México, que atinge 17,9%. Essas quedas nao foram ainda mais profundas, pelo tipo de manufaturas produzidas, muitas das quais também estimuladas pelo efeito China. E que tanto a minera¢do como a agropecudria permitem que varios de seus produtos sejam transformados industrialmente, fazendo crescer as exportagdes desses tipos de manufaturados, como artefatos simples de produtos metdlicos ~ principalmente os do cobre -, caso de Chile, Peru México; combustiveis ¢ lubrificantes (México, Venezuela, Peru, Colombia, Argentina e Brasil) ou como alimentos e bebidas industrializados, na maio- ria desses paises. O fator determinante dessa expansio & que esses produtos tém seus precos determinados, em primeira instincia, pela evolugdo dos pre- ‘gos dos bens primarios que os constituem, e, em muitos dos casos, sai mais barato compré-los na origem do que transformé-los no destino. E isso, como no caso das commodities, envolve uma produtividade “monetéria’ (via precos) que supera 0 obstéculo do cambio valorizado, Wilson Cono 17. Ner Castaneda (2014). Sobte 0 fraco desempenho ccondmico do México e uma ‘proposta para reverotratado com o Natta, reestruturar sua «economia eeu crescimento, ver Guilén (2008) ‘CADERNOS do DESENVOLVIMENTO, Rio de Janeiro, v.9,n.15. ppx39-174,jul-dex 2004 | ‘eshiedustratizaczo e (Sub)Desenvolvimento ‘18. Em alguns casos, desigio ating 80% do valor deface Foi alm o percentual negociado (eansta qu teria sido de apro- ‘ximadamente 93%), porémem smeados de julho de 2014, justiga norte-americana dev ganho dle scams alguns credores, cist, ‘no momento (agosto/2018), tem ‘causado varios protstos de movi ‘mentos socias atino-americanos cedestinadesde apoio & Argentina [Por virios gvernos do regiie, ‘A Argentina, depois de 15 anos desastrosos de ditadura, reingressa no neoli- beralismo, obtendo taxas de crescimento mais altas na década de 1990. Contudo, a farra das importagoes ~ como no caso do Brasil ~ resultaria também num desastre cambial e numa profunda crise entre 1999 e 2002. O novo governo, a partir de 2001, toma medidas drasticas de politica econémica, entre as quais ‘05 duros “acordos”* sobre a divida e a imposigéo de tarifas adicionais sobre as exportacdes agropecudrias. Com isto sustentou a taxa de cambio e, com a reto- mada do crescimento pelo Brasil, pode usar 0 Mercosul com 0 escoadouro de parte de sua producdo industrial. Ha que lembrar também que 0 mesmo gover- no elevou os salétios dos funcionétios puiblicos e o valor das pensdes ¢ aposen- tadorias, elevando com isso 0 consumo familiar € reativando a economia, A India foi inserida nessas tabelas, mas nao € para comparé-la aos latino- -americanos. Antes pelo contrario, nio tem sentido, inclusive, fazé-la parte de um suposto conjunto ~ 0s BRICS -, dadas suas diferencas substanciais. A pri- meira é que, além de ter se recusado-a abrir a conta de capital de seu balango de pagamentos, cla manteve um Estado atuante ¢ uma politica industrial possivel, Mas sua estrutura € muito complexa: sua agricultura ainda participa com 19% do PIB, um pouco acima da indtistria de transformagao e dos servigos, com ape- nas 57%. A India usou suas possibilidades — além de seu trabalho barato e do fato de o inglés ser sua segunda lingua. Avancou na produgio industrial, “onde fosse possivel’, isto &, em setores de menor complexidade e, nos mais comple- x05, de forma ainda contida. As elevadas taxas de crescimento mostram que seu caminho, se nao foi o melhor, foi o possivel, especializando inclusive grande parte de seu comércio exterior na exportagao de servigos (computacionais, de informitica e de telecomunicagdes), equivalentes a 40% do total das exportagdes € pouco mais alto do que o das exportagGes de manufaturas. Fol dos raros paises que escaparam da camisa de forga do neoliberalismo. A Tabela 2 mostra, em sua primeira parte, a trajetéria similar de todos esses paises em termos de elevagio da participagio das exportagdes de manu- faturados no total exportado, entre 1970 e 2012. Mas mostra também dife- rengas substanciais, como a mais alta participagio no México, e as pequenas de Venezuela, Peru e Chile, paises que nio enveredaram por uma produgao manufatureira de maior complexidade e alcance. Desnuda, para o periodo 2000-2012, a fragilidade dos paises subdesenvolvidos, diante do problema da valorizacao cambial, da falta de investimentos e do relativo estancamento tec- nologico. Nao resistimos & “invasio chinesa’, que na verdade é também norte- -americana, alema, coreana, japonesa... A segunda parte da Tabela 2 nos mostra a participagio mundial de cada pais na exportacio mundial de manufaturados. India e México elevam for- temente suas participagdes ¢ a do Brasil se mantém em torno de 0,7%. Nas duas uiltimas colunas, retirei do total mundial as exportagdes da China: as do © | croenwos do vesenveLvMeNTo Ro dane. 9.5 35-74. Md 204 ‘México e da India sobem ainda mais; a do Brasil avanga para 0,86% e as dos demais, embora todas subam, apresentam valores muito pequenos. Na Tabela 3 temos a estrutura das exportagées de manufaturados. Na primeira parte estdo bens de capital de todos os tipos, excluidos os produtos automotivos. As diferencas entre a parte superior da tabela e a inferior, agora, € gritante: retirados os veiculos, apenas México (gragas as maquiladoras) € Brasil conseguiram ampliar a participagao desses bens, com a india atingindo modestos 16% e a Argentina 13%. Os dados mostram claramente a fragilidade desse setor nos subdesenvolvidos, A segunda parte, dos produtos automotivos, mostra outra anomalia: Argentina, Brasil e México, paises pobres e subdesenvolvidos, mostram par- ticipagdes iguais ou superiores as de muitos paises desenvolvidos. Sao as facilidades geradas por acordos (automotivo, ou de livre comércio, como 0 Mercosul) e politicas de incentivos fiscais que explicam parte da questio. A India ainda tateia nesse campo, onde entrou tardiamente, ostentando atual- mente apenas 5,6%. Chile e Colombia marcam valores modestos (provavel- mente de componentes), enquanto os do Peru e da Venezuela sao infimos. Na terceira parte estd o segmento mais complexo e moderno, o dos equi- pamentos e componentes eletronicos. Por limitagées de dados, s6 pude regis- trar 0s do periodo 2000-2012, Os dois primeiros dados sao os referentes a par- ticipagao dessas exportacdes no total de manufaturados: os grandes niimeros estdio com 0 México: 24,5% e 23,5% de suas exportagdes de manufaturados, ou, em bilhdes de délares, US$ 34 e US$ 63,4, respectivamente, em 2000 e 2012, e nestes mesmos anos essas importagbes atingiram valores um pouco inferiores, gerando pequeno superavit. No caso do Brasil, suas exportagdes equivaleram, nos mesmos anos, a apenas US$ 0,5 € USS 1,4 bilhao, mas suas respectivas importagdes foram de US$ 7,6 e de USS 20,1 bilhdes, gerando pesados déficits na balanga comercial. Mostra com isso a pior situagio na América Latina. Os dados dos demais pai- ses $80 pouco expressivos, em valor e em relativos. A India expande suas par- ticipagdes, mas seu déficit comercial nesses bens saltou de US$ 2 para US$ 20 bilhdes, similar ao do Brasil, As duas iltimas colunas mostra dados sobre a participago mundial de cada pais: tirando 0 México (3,5% e 3,8%), os demais apresentam valores inexpressivos e a India ostenta um simbélico 0,3%. ‘A quarta parte da Tabela 3 se refere as exportagées de téxteis e confeccdes. A India tem uma estrutura industrial retardataria, onde esse segmento pesa ainda com 40% do total das exportagdes, s6 reduzindo-a em 2000-2012, Mas essa reduclo relativa é enganosa, uma vez.que essas exportagdes passam de US$ 11,6 bilhdes em 2000 para US$ 29,1 bilhdes em 2012. Dos latino-americanos presentes na tabela, a Colémbia ainda resistia com porcentual elevado até 1990, reduzindo-o a partir dai, provavelmente menos por ter promovido alteragGes Watson Cana CADERNOS do DESENVOL MENTO, Ro prev. 98. 5 peas na tesa | (Bestindustiatizaszo e (Sub)Desenvolvimento 19. Ataxade clmbio real nos Amos anos esteve sempre valorzada. Na década de 1990, faces polticas de estabilizasto, avalorizasio médiaatingla cerce de 50%, conforme dados 4 Cepal. Em 2011, etre 20% € 28% em 2012, (janeiro s Junho) entre 20% e 25%, em selaca0-4.de2005, CE peaData, “Taxa de cimbio real cetva de cxportagSes de manofeturados Dados obtidos em 15/8/2012, de -chtplwenpeadata goxbri> Segundo Oreiro (2012), entre 112003 «2/2012, «valorizacion ‘era sido de 37.3%. Nesse ‘texto. autor faz interessante ie disiato eatre« “dicotomia“poupanga interna “poupanga externa” eas discus _sbesenvalvidas sobre recursos, extemos valorizagio cambil profundas na pauta exportadora e talvez mais pelas debilidades advindas com ‘0 neoliberalismo, que reduziu o investimento e obviamente a produtividade. O Ainico que manteve um alto percentual desse segmento é o Peru, porém seus valores absolutos so infimos e sé ganham alguma relevincia no confronto ‘com as exportagées totais de manufaturados, pequenas também. As cifras da Argentina, do Chile e da Venezuela sio também infimas. As do Brasil so um pouco mais expressivas, situando-se em torno de USS 1,2 bilhao. As tinicas real- mente com uma expresso um pouco maior so as do México (US$ 11,2 bilhdes ‘em 2000, mas que despencam para US$ 6,7 bilhdes em 2012). Contudo, as cifras de importacdo mostram em 2000 fluxos similares, mas que duplicam em 2012, passando a gerar déficit de US$ 12,5 bilhdes, do qual 0 do Brasil foi de USS 5,7 bilhdes. Aqui as perdas sio muito claras, mesmo ‘num segmento em que tinhamos condigées de competitividade internacional -¢ éramos exportadores liquidos. Mais uma dolorosa perda, na contabilidade nacional e latino-americana. 2. A desindustrializacao no Brasil Vejamos sumariamente, no caso do Brasil, os principais fatos que esto cau- sando a desindustrializacio precoce e nociva, dando-lhe um sentido regressi- vo do progresso econdmico: a) Uma das causas principais tem sido a politica cambial prevalecente, instaura- sda a partir do Plano Real. Com as reformas liberalizantes e a politica de esta- Dilizagio, o cambio excessivamente valorizado cumpre, até hoje, o papel de ancora dos pregos, no que recebe o devido apoio “logistico” da pritica de juros seais absurdamente altos e da ancora fiscal. Isso implica na maior parte do ‘pagamento dos juros da divida puiblica.” resultado combinado dessa insana ‘rilogia — juros, cAmbio e desregulamentaglo foi a crescente perda de com- ‘petitividade internacional da indiistria nacional perante outros paises. b) Outra razdo resulta da abertura desregrada pela qual o Brasil passou e passa desde 1989, ainda no governo Sarney, quando ocorreu uma primeira investida quanto a protegéo que tinhamos sobre as importagbes. Tal investida anspliou- -se sobremodo no governo Collor, em 1990, A terceira foi feita no governo de Fernando Henrique Cardoso, a partir de 1994, ampliada por nosso ingresso na OMC. Essa desregulamentacio manteve-se e assim est até hoje. A abertu- ra comercial com a queda das tarifas e demais mecanismos protecionistas da indistria nacional complementou o nocivo efeito do c4mbio valorizado, redu- zindo drasticamente o grau de protegao perante a concorréncia internacional. @ | cave 0s conesenvoLvMeNTa Ride ano..5 15, pom9-74 de. 2014 Wilson Cano ¢) Terceira razao: taxa de juros elevada do pafs faz com que o empresirio 20, Banco Cental do capitalista - tanto na visio de Marx como na de Keynes - compare-a com See panniers a taxa de lucro, com a expectativa de acumular capital. Com excegio de ara 7.25%, quando voltov a raros ou ilicitos setores para os quais a taxa de lucro é exorbitante, pode-_ subir ortements, atingindo ‘mos constatar que, no financeiro, esses ganhos tém sido muito elevados, ay ae a compensando a tendéncia & queda da taxa de cro operacional. Ataxade {013} Ayesnuss wanda lucro da economia industrial moderna é relativamente contida e, quando __emeamvénlocom olpeaca cla se confronta com uma taxa de juros como a oficial (Selic) brasileira, C-Pahenoe stress hoje, de 11%,” © empresirio nacional fica atento a esse fendmeno € $6 ios, industria teres). investe em Ultima instancia. Caso contrario, quebra e fecha. Em tais con- dices, o investimento é fortemente inibido, o que deixa a indiistria vulne- rivel. Uma indiistria que nao investe envelhece, torna-se, em parte, obso- leta, no cresce, tem dificuldades enormes de assimilar progresso técnico no dia a dia. Enfim, perde produtividade, novas oportunidades e compe- titividade, passando a ser forte entrave ao desenvolvimento econémico do pais. A propésito, pesquisa recente sobre o tema mostra que, entre 2002 € 2009, de 28 setores industriais pesquisados, 23 apresentaram redugio da produtividade média e apenas cinco tiveram taxas médias anuais positi- vas: automeéveis (4,3%), tintas ¢ vernizes (2,2%), (celulose (0,8%), méqui- nas ¢ equipamentos de escritério e informatica (0,8%) e téxteis (0,4%).”" d) Quarta razio: o investimento direto estrangeiro. £ verdade que tal fluxo cresceu em niimeros absolutos nos iiltimos anos, fato comemorado por muitos economistas. Eles, porém, tém um defeito grave quando falam de investimento porque pensam apenas no sentido global, no volume e participacdo no PIB. O investimento, no entanto, é uma varidvel tao importante na economia que os economistas deveriam ser mais cuida- dosos. Uma taxa de investimento precisa ser estruturalmente analisada. Primeiro, deduz-se do fluxo total de capital estrangeiro o investimento em carteira, em titulos privados ¢ na divida publica, em geral, predomi- nantemente, de cardter especulativo. A série histérica do IDE no Brasil, feita pelo Banco Central, mos- tra dados inequivocos: na década de 1980, a participagdo da indistria de transformagio no IDE total girava em torno de 75%. Esta cifra cai para cerca de 60% na década de 1990 e flutua entre 30% ¢ 40% a partir de 2001, ‘Ao mesmo tempo, a participacao dos servigos sobe e com eles a das ativi- dades financeiras. O mais grave, porém, é que a média anual do IDE na industria - que girava em torno de US$ 17 bilhées na década de 1980 ~ sobe para US$ 25 entre 1990 e 1995, mas cai fortemente a partir dai para US$ 85 bilhdes entre 1996 e 2010. No periodo de 2011 a set./2013, subiria para a média de US$ 20 bilhdes, chasis Viena ire ose (Wesjindustrializacio e (Sub}Desenvolvimento Quanto ao investimento interno, também se observam fatos seme- Ihantes, predominando a alocaco nos servicos, especialmente no setor financeiro, construgao, negécios imobilidrios, agropecudria e mineragio, sendo hoje mais reduizida a participacio na industria de transformagio. Isso é compreensivel, pois a produtividade e a competitividade da industria brasileira contiveram-se e, em muitos casos, cairam e isto foi bem percebido pelo capital. Ao mesmo tempo, houve a guinada de IDE predominantemente americano e asiético para a China em busca de tra~ balho barato, cambio desvalorizado e alta competitividade. Por essa razio, ‘le se mudou, em grande parte, para a China a fim de produzir mais bara- to, abandonando ou diminuindo sua presenga em antigas areas onde havia tido grande expresso, como, por exemplo, a fronteira norte mexicana. Os nocivos efeitos internos de tal fato foram: + perda de competitividade das exportagdes industriais brasileiras (pro- dutos manufaturados) e, ainda, deslocamento de parte delas, pelo pro- duto da China, em tradicionais mercados como o dos EUA; + elevado aumento de importagoes desses produtos, tanto de bens finais de consumo ou de capital como, inclusive, de insumas industriais de toda ordem, especialmente os quimicos ¢ eletronicos, afetando muitas cadeias produtivas da indiistria brasileira de forma nociva; + 08 dois efeitos anteriores afetaram profundamente os investimentos produtivos do setor, tornando-os de carter mais especifico, oportunis- tas e atomizados. €) A quinta razéo que deixa os economistas ainda mais preocupados é que, de 2007 para cd, a economia mundial desacelerou. Nota-se, especialmente a partir da politica econémica norte-americana ea da Uniao Europeia, que, possivelmente, poderemos atravessar um periodo de longa crise na maior parte das economias desenvolvidas como, aliés, varias instituigdes € economistas criticos tém previsto.” Tais economias, especialmente os EUA, mais a China - a qual perdeu parte dos mercados que disputava =, estio desenvolvendo politicas agressivas no mercado internacional de produtos manufaturados, obtendo taxas elevadas de crescimento dessas exportacdes e recuperando parte do terreno perdido. Alguns dados macroecondmicos nos ajudam a compreender com mais profundidade o problema, para que se possa entender melhor a complexidade de nossa situagio: 1B Ver entre outros, as previsdes 2 OCD (2012) edo Levy an). © | ccm co peseweuvmerro Ringe neo. 9 5.1 ppt9-74 b-de20% Tabela 4, Brasil: taxa média de crescimento dos componentes de demanda efetiva (%) 7003-2008 7008-2012 2018 PIB tata 50 2 Consuma famtia 70 46 6 ansuma gaverno 3A 184 investimenta| 20 Expartagées 363 2 Inaportagbes 3 aa Entre 2003 ¢ 2008, apés um periodo de crise ¢ recessio, a taxa do eresci- mento do PIB sobe, gracas a trés fatos especificos. 0 primeiro e mais impor- tante foi o crescimento do consumo familiar, estimulado pelo aumento do cré- dito a0 consumidor, pela forte elevagao do salério minimo real e de outras politicas sociais, como por exemplo, a da Bolsa Familia. © segundo, a despeito da politica fiscal restritiva, foram as decisées de expandir 0 financiamento puiblico ao investimento (ptiblico e privado) e 0 ter- ceiro decorre da grande expansio gerada pelo setor exportador, apesar de as importages, a partir de 2005, crescerem mais que as exportagdes. Foram esses fatores que permitiram um avanco maior na renda e no emprego, expandindo ademanda de consumo, esta mais intensa do que a do investimento. forte aumento das exportagdes decorreu do boom internacional entre 2004 e 2008, com forte elevacdo de pregos de matérias primas ¢ da demanda fisica, principalmente a gerada pela economia chinesa. Contudo, com a maior extensao mundial da crise iniciada em 2007-2008, 0 crescimento médio do PIB caiu ea taxa média 2008-2012 (2,7%) aproxima-se da trajetéria critica dos anos 1990, quando foi de 3%. A taxa de investimento, fortemente deprimida desde a década de 1980, caiu ainda mais até 2005, recuperando pequena parte do terreno perdido, subindo em 2008 para 16,9% e cerca de 19% em 2010 e 2011. Em 2012, volta a cair para 17,6%, tornando mais dificil a recuperagio do necessério nivel alcangado nos anos 1970, da ordem de 25% do PIB. A Tabela 5 mostra as taxas de ctescimento setoriais da economia brasileira, Observa-se que a industria de transformacio obteve os piores resultados, os mais softiveis do PIB. Como indicado previamente, o investimento € muito baixo, quadro agravado pelos efeitos da crise pés-2007. Hé outra consequéncia desse cendrio: a perda de posicdo relativa dos pai- ses subdesenvolvidos na produ¢do industrial mundial. Incluindo-se ou nao a China nesse rol, os dados mostram que o Brasil esté perdendo terreno de ‘maneira acentuada no panorama internacional. Com efeito, a participagio do Brasil na produgao da indiistria de transformacao mundial, que era de 2,8% em 1980, vai caindo para 2% em 1990 e atinge 1,7% em 2010." 23, Basicamente, pelo cit ‘consignado e amparadn pelo desconto em folha de aitiose deaposentads. 24.CLONU, Sistema de Contas Naconais,em USS, a pregos de 2005. isponivel em: ,Acesso em: anata CADERNOS do DESENVOLVIMENTO, lode ane, v.30. 16. poser ten aoe | (Deshindustriaizacio e (Sub}Desenvolvimente Tabela 5. PIB Total e Setoria: taxas médias anuals de crescimento (%) PERIOD 1983-2002 2002-2008 2008-2013, PIB otal 35 PiBagrcola 48 23 PB industrial 6 18 Pl ndustial ansformagao 6 om Pig sarvigos _ 28 I Sabe-se, também, quanto as taxas de crescimento da indastria, que o setor de bens de capital e de consumo durivel vinha apresentando, desde 2002, um crescimento acentuado, mas, na verdade, era o segmento de bens de consumo duraveis o que mais puxava a demanda, ‘Ainda que dados e fatos acima apresentados mostrem essa anormal desin- dustrializagdo em nosso processo econémico, até hé pouco tempo aceita- Go dese fato ndo era pacifica e varios economistas, nao raro, nao acreditam. ue essas perdas tenham sido téo acentuadas, Uma das raras instituigdes que também denunciam a desindustrializagio € o Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industral (Iedi), que em suas Cartas Mensais tem advertido, denunciado e demonstrado o fendmeno.* No sentido de reforsar essas criticas, juulgo importante acrescentar em seguida alguns outros dados que desnudam um pouco mais a debilidade & qual foi submetida a indiistria de transformacao. 2.1 A relaco VT! (valor de transformacao industrial) / VBP (valor da producao industrial) Cabe esclarecer que essa relacio era cerca de 0,55 no periodo de alta inflagio (entre 1988 e 1994), mas poderia significar, em parte, um markup mais alto como mecanismo de defesa das empresas. Com 0 inicio do Plano Real, ela baixa para 0,52 em 1995, Contudo, por problemas de mudangas metodolégi- cas da fonte dos dados primérios, é preferivel nio incluir tais dados no Grafico a seguir, restringindo-se ao periodo 1996-2011. 25.GE ie vistas Caras not amente a partir de 2010, tas Ieserdas em crvciedong b> @ | cemeso0esewo.ymerTo Re dine. 9.9.5 sae 204 \Witson Cone Grafico 1. Relagdo VTI/VBPI (IndOstria de transformacao) eles ppara.os dados no periodo 1970- 2003, ver Cano (2008). Ver também Valderrama (1966), 450 O Gréfico mostra a acentuada queda sofrida pela relagdo VTI/VBP. Observe-se que ela se situava em torno de 0,47 em 1996, foi caindo até 2004 € 2005 (em torno de 0,41), apresentou pequena recuperaciio e estabilidade em 2006-2008 (em torno de 0,42) e subiu um pouco em 2009 (0,43) e em 2010 ¢ 2011 (0,44), paradoxalmente, em um perfodo de crise. Muito prové- vel, porém, que isso se deva aos seguintes fatos: i) mudanca conjuntural na estrutura produtiva causada fundamentalmente pelo desempenho de setores mais oligopolizados que tém alto poder de fixagao de markups; i) intensi- ficagao das importacdes industriais no perfodo recente, rebaixando precos e custos de insumos e bens de capital importados, possivelmente em parte nao repassados aos compradores dos produtos fabricados com tais bens; ii) essa intensificagio das importagdes, com certeza, alterou cadeias produtivas, substituindo produtos mais onerosos e menos lucrativos; iv) forte elevagio dos pregos de exportacao de varios produtos industriais semielaborados pés 2003-2004; e v) redugdo de custos financeiros e tributdrios decorrentes das politicas anticiclicas praticadas recentemente. 2.2 Aestrutura produtiva da indiistria de transformagao, segundo o critério de uso dos bens ‘Como aqui esta em andlise apenas a industria de transformacio, nao se pode empregar neste item os dados e a classificagio usada e divulgada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatistica (IBGE), pois este inclui a industria extrativa mineral em suas estimativas. Assim, emprega-se uma metodologia que classifica 0s setores da inchistria de transformagio em predominantemente produtores de: #) bens de consumo nao duréveis; i) bens intermediarios; ¢ iii) bens de consumo dunaveis e de capital, este, o setor de maior complexidade tecnolégica2* O setor i (onde estao presentes importantes segmentos exportadores), & medida que a industrializaco avangou, diminuiu fortemente seu peso entre {ADERNOS do DESENVOLIMENTO, inde neo v 910.5, 939-76 see sane | (eshindustriaizacao e (Sub) Desenvolvimento 1939 1980, caindo de 67,5% para 33,9% do VI, o que reduziu a sua partici- Pacdo, situando-a entre 35,2% em 2009 e 33,1% em 2011. setor ii, com forte presenga exportadora, teve expressivo aumento de sua participacio entre 1939 € 1980, passando de 25,9% para 41%, oscilando entre 43,6% em 2009 e 41% em 2011, parecendo também ter perdido espago em nossa industrializacio. setor iii teve as maiores taxas de crescimento entre 1939 e 1980, quan- do passou dos exiguos 6,6% para 25,1%. Sua trajet6ria posterior, no entanto, é decrescente, atingindo 24% em 1996, 21,6% em 2003, 21,2% em 2009 e 25,9% em 2011, quando parece retornar ao patamar de 1980, Esse movimento da estrutura mostra, sem chivida, uma tendéncia regressiva de 1980 para hoje, com a volta do predominio de nao duraveis e de setores exportadores de semi-industrializados. Essa metodologia, contudo, faz com que grande parte do setor ifi conte- nha uma fracdo maior de bens de consumo durdveis do que de bens de capital, dado problemas metodolégicos e de sigilo estatistico do IBGE, notadamente quando operamos a mais de trés digitos nos subgrupos de atividades. Fez-se lum pequeno e parcial exercicio com os Censos Industriais de 1970 e 1980 ea Pesquisa Industrial Anual do IBGE referente aos anos de 1996, 2003, 2009 e 2011, retirando, do setor i, itens que predominantemente se destinam mais a consumo doméstico ou a insumo produtivo, do que ao investimento produti- vo. Os itens retirados foram os de veiculos de passageiros (automéveis e utili- térios), autopecas, eletrodomésticos e aparelhos de som e imagem (dos quais nao é possivel, a trés digitos, excluir os celulares). Deduzidos os VTIs desses quatro segmentos, a produgao restante, do ssetor iii, fica com um sentido mais préximo a de bens de capital, embora ainda contenha um residuo importante de bens durdyeis de consumo e de bens intermediérios. Os novos dados passariam a ser: 15,6% em 1970; 19,9% em 1980; 14,1% em 1996; 10,0% em 2003, 11% em 2009 ¢ em 2011, uma subi- da expressiva para 16,2%, mas que ainda deixa a participagao desse segmento abaixo da de 1980. Com efeito, o que explica mais da metade do crescimento havido entre 2009 e 2011 foi o excepcional aumento de veiculos e equipamen- tos de carga (0 resto do setor de veiculos automotores), conjunto este que, em. 2009, pesava com apenas 0,22% do VTI total da industria de transformagio € que, em 2011, gracas as politicas especiais de incentivos que recebeu, mais ‘que decuplicou sua participagio, que atingiu 2,76%! Mas, embora esses bens sejam considerados bens de capital, nao so maquinas. A regressio industrial mostra-se, aqui, ainda mais transparente, 2.3 Problemas com a nova insercio comercial externa ‘Apés os sucessivos déficits comerciais da década de 1990, sé revertidos apés a crise cambial de 1999, gragas expansio das exportagées de primérios, © | ee05 so vesenvor Meo, Ro dene. 5.0.5 pps Pade 204 tivemos superdvits médios de US$ 42 bilhdes em 2004-2007. A expansio das importacdes de produtos industriais, todavia, reduziu aquela média, em 2008-2011, para cerca de US$ 25 bilhdes, caindo para USS 19 bilhdes em 2012 € USS 2,6 bilhdes em 2013. Qs coeficientes percentuais de exportagao (Cx) e de importagao (Cm) da indistria de transformagio, calculados pela Fundagdo de Comércio Exterior (Funcex), cresceram com a abertura comercial com Cx, passando de 12,7 em 1985 para 16,8 em 2004. O Cm, porém, saltou de 3,9 para 10,9 ¢ entre 1995 ¢ 2000 atingiu niveis mais elevados (de 12 a 14), superando os Cx. Alguns seto- tes apresentaram enormes aumentos de seus Cm, entre 1985 e 2004, como, por exemplo, material elétrico (de 8 para 26), equipamentos eletronicos (de 12 para 85), farmécia e perfumaria (de 4 para 35).” Pela nova série ~ de 1996 a 2012 -, a Funcex apresenta Cx que sobe de 12,7 para 21,6 até 2004, caindo depois até 2012, quando atinge 15,6. Para as impor- tacées, divulga os Cpm (coeficientes de penetracao das importacées),"* que passam de 14,1 mantendo-se em torno de 15 até 2009, e aumentando para 19,3 em 2012, niimeros que, por se iniciarem em 1996, quando as importagées jé haviam crescido vigorosamente em termos absolutos € relativos, subestimam parte das modificagdes ocorridas ao longo do periodo de abertura, Ainda assim, examinados os coeficientes dos 23 segmentos divulgados para a indistria de transformagio, cabe dizer que o Cpm aumenta em 18, dos quais 05 casos mais notiveis foram os de produtos quimicos (19,4 para 27,6), borracha (9 para 15), metalurgia (9,6 para 18,8), maquinas e equipamentos (33,7 para 36,9), maquinas € aparelhos elétricos (15 para 19,8), equipamentos de informatica (36 para 44), ‘outros equipamentos de transporte (de 28 para 31), farmoguimicos e farmacéu- ticos (17,4 para 27,6) e indiistrias diversas (21para 35,7). ‘A questio fica mais transparente quando se analisa o resultado liquido do comércio de produtos manufaturados.” Apés a crise de 1999, foi possi- vel reverter, a partir de 2003, o déficit de produtos manufaturados. Em 2003- 2006, houve um superivit médio anual de US$ 5 bilhées que se convertem em déficits sucessivos a partir de 2007 (-USS 9,3 bilh6es), em -USS 38 bilhoes na média 2008-2009, -US$ 76,7 bilhdes em 2010, -US$ 95,8 bilhdes em 2011, -US$ 94,1 bilhdes em 2012 e, em 2013, -USS 105,0 bilhdes. Mas, onde est localizado esse déficit? Como o investimento contrait-se na indiistria, os setores de alta e de média alta tecnologia estio pesadamente repre- sentados nesse numero e constituem mais da metade do citado déficit. Com efeito, a estrutura das exportagdes de produtos industriais (semi-industrializa- dos mais manufaturados), em 2012, mostra que os de alta tecnologia perfaziam apenas 6,8%, os de média alta, 27,1%, os de média baixa, 26% e os de baixa, 40,1%, Em 2012, do total de nossas importagdes desses produtos, 48,5 % eram de bens de alta tecnologia, 21,5 de média alta, 21,5% de média baixa e 9% de Wilson: Cona 27. Cosficentes obtides em. 2005, no site da Fancex. Esses cleus foram mais tarde subs tituidos por nova série, de 1996 até hoje, que apresenta os Ce ‘com valares um pouco diferen- tesa série anterior e, no lugar dos Cm, divulga os Cpm, 28. Cpm = M/ (PN), 081 sein, importagies sobae o consumo aparente, 28, Total de produros Industria, exclusive os semi-industrializados, CADERNOS do DESENVOLVMENTO, lode ante v.8..35. posta an ae | [Desjindustrializacso e (Sub)Desenvolvimento baixa tecnologia, Até mesmo no setor de baixa tecnologia é surpresa constatar que téxtil e confeccées, setores tradicionalmente superavitdrios, tém apresenta- do déficits de aproximadamente USS 5 bilhées, segundo dados da OMC. 2.4 Negécios do Brasil com a China O exuberante crescimento anual da economia chinesa expandiu sobremo- do sua demanda externa de forma generalizada. A nova divisdo internacio- nal do trabalho, elevada produtividade e cambio desvalorizado fizeram, no entanto, com que as relagdes comerciais com a América Latina passassem a ter a forma classica da relacao centro-periferia, com a pauta exportadora chinesa constituida, fundamentalmente, de produtos manufaturados e sua pauta importadora, de produtos primérios, ao contrario da estrutura comer- cial que pratica com 0 resto da Asia, UE e BUA. A Tabela 6 mostra a estrutura das exportagées latino-americanas do México e do Brasil para a China. Observe-se que, em 1990, era alta a parti- cipacio dos produtos industriais no total das exportagdes do Brasil (80,5%) e do México (98,4%) e a dos primarios, baixa. Jé em 2000, aquela participagao comega a cair, fortemente a do Brasil (32,1%) e ainda moderada a do México (96%). Em 2008, caem ainda mais, ow seja, para 22,5% a do Brasil e 72,3% a do ‘México. Ademais, as exportacdes chinesas para os EUA deslocaram boa parte de exportacées industriais mexicanas, centro-americanas e brasileiras, pioran- do muito a insergdo externa, ‘Tabela 6. América Latina e Caribe, México e Brasil: Estrutura (%) das exportagbes para a China Latin eaned Mexico BRASIL Produto 7008 790 | 2000 | 2008 | 1990 | 2000 | 2008 Primarios 750. v4 | 37 sas | wa | 775 ingustias 250 286 | 963 gos | 25 | 2s Rleursos naturals 48 7 [na ao | aa | aa Sava tecnologia 24, 67 | 1a | 28 | va] as | 26 =a tecnologia a6 ma | 249 | 96 | 289 | 90 ‘Ala tecnologia 343 og | sea | wo | oa | sa Outros 8, 03, oa | oa | _on Por dificuldades para atualizar essas informacées, s6 pude apurar, para anos recentes, dados parciais do Brasil; do total de suas exportagdes para a China, 82,9% eram de produtos basicos, ¢ os industriais perfizeram 171%, sendo 11,3% de semi-industrializados e apenas 5,8% de manufaturados. Na ordem neoliberal, entretanto, nao se pode reclamar disso, do “livre comércio” © | cxemes covesenvo1vmerT0, Rodel... 018814. Miter 204 (Os dados da Tabela 3 mostram que a regressio é mais grave quando se anali- sam 0 setores por intensidade tecnol6gica: a participagio na pauta brasileira cai em todas as categorias. Na do México também ocorre o fenémeno, mas as categorias de média e alta tecnologia ainda mantém participacdes expressivas muito mais altas que as infimas participagées na do Brasil, deixando claro que 05 resultados do comércio com a China mostram uma situagio mais regressi- va, mesmo em termos de América Latina, Em contrapartida, torna-se dificil para o Brasil pressionar e negociar com a China sobre essa estrutura e sobre a “invasio” de produtos chineses, dado ‘que, de 2009 a 2012, a China foi responsdvel, em média, por cerca de 30% de nosso saldo comercial total. 2.5 A reprimarizaco de nossa pauta exportadora A Tabela 7 mostra a estrutura da pauta exportadora nos anos mais recentes, segundo os niveis de industrializagao: produtos basicos, semi-industrializa- dos e manufaturados. Note-se 0 que ocorre com 0s manufaturados: © peso das exportagdes dos produtos indicados na balanca exportadora brasileira, de pouco mais de 60% em 2000, passa a apenas cerca de 38% em 2011-2013. Mesmo no segmento de semi-industrializados, observa-se que a curva tam- bém é descendente. Ainda ha quem nao aceite a ideia de que se possa estar passando por um processo de desindustrializacao. Tabela 7. Brasil: Exportaces segundo fator agregado (%e)* ‘Ana. Bisicas ‘Semimanufaturados ‘Manufaturados 1384 54 80 6a 7980 2a 7 448 7385 333 108 543 7990 278 162 542 1995; 228 208 $62 2000 24 58 607 ae0e 239) us 55.6 2007 328 33 335 2008 373) 38 481 2003 ata a? 45.0 a0 455 43 402 20% 283 143 36.8 202. 278 39 33 203 a8 a 383 Fare wine so Deensvimert, aura Coma MO) (et Opeagbe Eset {AOERNOS do DESEWVOLVIMENTO Ri de ani... 1,98:367A juodee 2056 | (Desjindustrializaczo e Sub)Desenvolvimento "30. CEGaimarics (2014). -#LCE Stig (2014), Os dados acima séo incontestes: significam forte regressio e reprimari- zagdo da pauta exportadora. O fenémeno também atingiu a América Latina, conforme mostram os dados da Cepal: entre 1980 2000, a participagao dos manufaturados para o total da regio sobe de 17,6% para 58,2%, caindo em 2011 para 39,3%, Se retirados os dados do México, aquelas cifras passam a ser, respectivamente, de 19,3% para 30,6%, caindo para 21,6%, Ha que acrescer algumas palavras sobre o Mercosul a despeito de suas limitagdes, uma vez que o total exportado pelo Brasil, nos ultimos 20 anos, tem se mantido em torno de 12% a 13% de suas vendas externas, e suas com- pras tem sido em torno de 8% a 9% apenas, Uma primeira boa razéo para apoid-lo é que, de 1990 a 2013, sé tivemos déficit em nove anos, Uma segunda e melhor razdo é que em nossas exportagées predominam os manufaturados, com cerca de 84% do total. Uma terceira é que a Argentina é nossa terceira maior parceira mundial - s6 recentemente ultrapassada pela China. Tomados 0s dados de 2013, do total exportado em automoveis, veiculos de carga ¢ auto- pegas (US$ 11,1 bilhées), 71% foram para a Argentina, 7,3% para os demais paises do Mercosul e 5,9% para o México, Para o total das importagées des- ses mesmos produtos (US$ 20,7 bilhées), a Argentina contribuiu com 33,3%, tendo saldo nulo; 0 México contribuiu com 9,2%, nos causando saldo devedor de USS 1,2 bilhao; ¢ 0 grosso do déficit desse segmento se originou dos EUA € de alguns europeus e asiiticos. Ou seja, ainda que o Mercosul nao resolva hoje nossos problemas comer- ciais, hd que fortalecé-lo. Estou de acordo com as preocupagées externadas pelo embaixador Samuel P. Guimaraes, que, em recente artigo, adverte que se © Acordo Mercosul-UE for aprovado, significaria, de fato, 0 fim do Mercosul, pois as vantagens que ora as empresas sediadas no Mercosul gozam desa- pareceriam, favorecendo as europeias. Por relacdo indireta, via Acordo ‘TransPacifico e Acordo EUA-EU, tais vantagens seriam estendidas aos paises membros desses acordos, representando, de fato, uma provavel extincio do Mercosul, sem obter as vantagens prometidas por aquele acordo. Estarfamos repetindo os erros cometidos na Rodada Uruguai e no ingresso junto 4 OMC.” Aliés, e por falar em AcordoTransPacifico, é bom lembrar as advertén- cias recentes feitas por Stiglitz ao governo norte-americano sobre os males que esse acordo causard aos EUA, em termos de desemprego, chamando a aten- io em especial para a desregulamentacdo de normas e aumento dos direitos internacionais que acordo proporcionara As empresas, atropelando o direito nacional de todos os paises membros desses acordos.”! 2.6 Aestrutura da pauta importadora A Tabela 8 indica a estrutura das importagdes totais em termos de bens de capital, de consumo duraveis, consumo nao duraveis e bens intermediarios @ | casero ve DESENVOLVIMENTD, Ride janeiro v. 5,15, 136-74 jl-cle. 2014 (excluindo-se combustiveis e lubrificantes). Enquanto as importagoes totais crescem 5,1 vezes entre 2002 ¢ 2013, as de bens de capital e de bens interme- didrios crescem um pouco menos (4,4 e 4,6 vezes, respectivamente), mas as de consumo nao duraveis multiplicam-se por 5,5 e as de consumo de duriveis crescem 8,9 vezes. ‘A verdadeira “avalanche” de importagdes, principalmente quanto aos bens de consumo duraveis, deu-se gracas ao délar barato e a abertura comercial mal negociada. Esse aumento de importagées vem, em parte, quebrando ou debilitando clos de varias cadeias produtivas e, assim, eliminando empresas e linhas produtivas de varias empresas. Ao mesmo tempo, o fendmeno ¢ alta- ‘mente inibitdrio do investimento normal e daquele tipico inovador ou mesmo © que complementa cadeias produtivas. Hé de se entender que eliminar uma empresa é relativamente facil, em tais circunstincias, Destruir uma lideranca industrial nacional, um empres4- rio industrial dinamico, come ocorreu com varios, também ¢ facil. O dificil é criar ou tentar recriar tais empresas respectivas liderangas. Criar e recriar empresas nacionais expressivas e grandes como as do grupo de Mindlin (Metal Leve, do setor de autopecas) ou outras, como a Kasinski, que antes pro- duziam pecas e as exportavam aos mercados norte-americano e europeu para se transformarem em simples montadoras de motocicletas na Zona Franca de Manaus e, finalmente, venderem as novas empresas para o capital estrangeiro. Ainda, o que também € muito grave, grandes empresas téxteis nacionais, como a Hering, que antes tinham na produgio industrial sua principal atividade e, agora, regrediram para a atividade predominantemente comercial. Tabela 8. Brasil: ImportacSes (em USS bithdes) TANG TOTAL eK oo eco BEND 2008) 5. 234 25 34 “003 483 oa 258 2A a 2004 be A 2S 32 a7 2005 Be 154 33 46 2006 Evi #3 | 5 58 2007, 1206 25 83 78 2008 wa 358 a7 38. 2009 276 237 16 9 2070 1806 ne 839 185 Be 200 79 100.3 2a 160 207 286 99.8 aaa v2 20 2335 6 1065 223 8) CADERNS do DESENVOLVIMENTO, ide nev... 15. ppsema Mee aoe J {Des)industrisizagao © (Sub)Desenvotvimento ext, por forgs e outros 2.7 A politica macroecondmica e o balanco de pagamentos A Tabela 9 sintetiza para algumas das contas externas efeitos diretos e indiretos dessa perversa politica macroeconémica, os quais nao se limitam as importa- gdes e exportagées, pois o cambio barato estimula os gastos de varios tipos de servigos. Os gastos liquidos em servicos (turismo, aluguel de filme, servicos de engenharia, servigos de transporte internacional, servicos financeiros etc.) saltaram de -US$ 8,3 em 2005 para -US$ 47,5 bilhdes em 2013. ‘Tabela 9. Batanco de pagamento (em USS bithdes) ‘Ane ‘Comercial Services Rendas | _ Transagies correntes 2005, $47 “83 250 40 2006 45 “36 214 Bs 2097 498 a2 334 6 2008 248 67 205 28.2 2008 253 332 337 243 2010 202 308. =6 an 30H 298) 373 478 52.6 208 134 410 354 54a 203) 26 a5; 398 Sa (© cambio barato e a baixa oportunidade de investimentos geram efeitos ainda piores na conta de rendas, fazendo com que diminuam os reinvesti- mentos e aumentem as remessas de lucros e dividendos. Os nuimeros tam- bém sao assustadores: seu déficit, que em 2005 somou -US$ 26 bilhdes salta em 2010 e 2011, respectivamente, para -US$ 39,6 bilhdes e -US$ 47,3 bilhées, baixando um pouco para -US$ 35,4 bilhdes, em 2013, certamente devido a crise e reducio de lucros, bem como & redugdo passageira dos juros. Assim, servigos ¢ rendas somaram, entre jan./2010 e dez./2013, a fantastica cifra de -US$ 319 bilhdes. Como se sabe, a soma algébrica do balango de servigos e do balango de rendas com a balanga comercial indica (aproximadamente)”* 0 saldo em transagées correntes, que atingiu -US$ 81,4 bilhdes em 2013. Para fechar esse déficit, a politica macroeconémica mantém a economia desregulada e 0s juros reais em nivel surpreendentemente elevado, com 0 objetivo Sbvio de atrair capitais externos, os quais, com a volipia dos juros altos, entram em maior quantidade do que o necessério. Sendo assim, a ori- gem do actimulo de reservas torna-se mais financeira do que comercial. Cobertos os déficits ao longo desses anos todos, depois de 1999 nao houve mais crise cambial ¢ ainda houve o acimulo de US$ 359 bilhées de reservas internacionais. Varios analistas olham esses niimeros ¢ afirmam que © | cxsemescovesewvowvmerto, Rc janet v.91. ,6s8574 Me 014 a vulnerabilidade externa do pais acabou, Os US$ 359 bilhdes de reservas internacionais, no entanto, custam muito caro para todos, pois esto aplica- dos basicamente em titulos do governo norte-americano cuja taxa de juros é préxima a zero. O governo, porém, para acumular essa. reserva, tem de emitir titulos da divida publica, aos quais pagam juros que hoje chegam a aproximadamente 11% anuais e equivalem a cerca de 5% do PIB, em uma grande sangria da receita e do gasto puiblicos. desestimulo ao investimento interno ¢ délar barato incentivam for- temente a saida de capitais brasileiros, Até 2001, o total aplicado lé fora era de USS 68,6 bilhdes - este valor cresceria velozmente, atingindo USS 275 bilhdes em 2010, dos quais 25,5% aplicados em notérios paraisos fiscais.” Em 2012, aquela cifra saltou para USS 356 bilhdes, e desse estoque total, 0 IDE somava USS 268 bilhdes e sua estrutura de aplicacio externa revelava forte similaridade com a do investimento de capital nacional no Brasil: 25% em agricultura ¢ mineragio; apenas 18% na indistria de transformacao; ¢ 57% em servigos, dos quais 65% em servicos financeiros. Ao todo, os capitais brasileiros teriam criado cerca de 200 mil empregos no exterior. © mais paradoxal, contudo, é que, para isso, boa parte desses investi- mentos tem sido financiada por recursos piblicos (em geral subsidiados), principalmente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econdmico e Social (BNDES). Estdo sendo financiados investimentos no exterior, quando ¢ aqui que se deve criar empregos, modernizar a indiistria, erradicar o analfabetis- mo ea fome, acabar com os buracos nas estradas, promover politica habita- cional aos pobres, acabar com as endemias rurais que sao uma barbaridade. A Tabela 10 mostra a divida externa total, nosso passivo externo liquido € as reservas acumuladas, Os dados mostram que, se descontadas as reser- vas do passivo externo, o passivo liquido aumenta de US$ 298 bilhdes, em 2004, para US$ 826 bilhdes em 2012, caindo para US$ 764 bilhdes em 2013. Ainda, é preciso considerar que grande parte do investimento externo cons- titui-se hoje de titulos em carteira mais facilmente mobilizaveis e passiveis, portanto, de fuga mais répida, CCADERNOS ce OESENVOLVIMENTO, Ri de ani, v. 90.15, 139-74 Wilson Cano 33. amo os dadosdesses itvetimento sho por pues, ‘nto qu se detifcam poucos dees come paaios fiscais, certamente-a cifra esti- mada no exo et fortemente ‘subestimada. Virias pesquisas sofongo dese itimos der nos apontam cfasquese sitar ete 50% € 70%, Para 3 dados ofcns ver: Banco Central dota Capitals Braelrno Exterior ce behgnebelexchelpore: datos obtidos em 2405/2012, (Bes)Industrializaczo e (Sub)Desenvolvimento Tabela 10. Divida externa e passivo liquide externa ‘Ane Divida externa bruta | Passivo externoliquido | Reservas totals 2004 2202 238 9 2005 188.0 37 540 2006 3994 369 ase 2007 240-5 $50 803 2008 2629 283 193.8 2000 ast9 887 2886 2H 4041 764 3520 2012 408 326 3733 203 4828 764 2588 ‘Como superam as reservas, a vulnerabilidade ainda se mantém. £ claro que as reservas sio importantes ¢ estratégicas, mas nao o suficiente para evitar ou sair de uma crise internacional que possa causar grande fuga de capital. Seria possivel reverter esse quadro de desindustrializagao? As crises ante- riores mostraram que nao hé como ser liberal em depressdo. Se 0 “cofre” esté vazio, sem dinheiro, como ser liberal? Ao contririo, em tais circunstincias é preciso ser interventor com a coisa piiblica, nao hé remédio menos amargo. ‘A consolidagao da empresa nacional é um investimento caro e muito importante, cujos maiores exemplos, antes da China, vém da Alemanha, Japio e Coreia do Sul. Em tais casos, as circunstancias internacionais eram outras, pois a ameaca do socialismo era muito forte e condicionou positivamente parte das reagdes americanas a politicas de intervengao estatal que beneficia- ram fortemente a economia desses paises. Houve uma intervengéo dristica na sociedade ¢ na economia alema, na japonesa e na sul-coreana. As maiores e mais radicais foram a reforma agraria ¢ a reforma do capital. Quando 0 Japao se “abre’, reestrutura sua industria e recupera-se da derrota da guerra, e quando a Coreia do Sul é amparada pelos EUA, entio, ambos “abrem” seus mercados. Tais paises tinham nao sé circunstancias internacionais extremamente favoraveis para {que suas empresas ficassem mais fortes e agressivas e fossem vitoriosas no cenério internacional, como tinham politicas de Estado voltadas para isso, ou seja, protecionistas, direcionadas para a industrializacio, financiadoras da atividade industrial. A Coreia do Sul chegou a proibir o consumo inter- no de televisao colorida, direcionando sua producio para exportar. Houve a pratica de politicas macroeconémicas internas e politicas industriais, além de circunstincias internacionais, que permitiram que suas grandes empre- sas crescessem e alcangassem um desempenho extraordinario no cenario @® | cA0ewV0s v0 oESENVOLVINENTO. fi de jane... pEARE-DA dee 234 internacional. Houve, acima de tudo, um Estado Nacional e, nao raro, um estadista que soube conduzir esse proceso. Seria possivel, hoje, reverter esse quadro de desindustrializagao no Brasil? Para isso, a formulacio de uma nova politica industrial, apesar de necessdria, no seria suficiente, Em meu entendimento, nenhuma politica especifica (seto- rial, regional, industrial, agricola, de comércio exterior ou outra) sera bem- -sucedida se a politica macroeconémica nao Ihe der a necessaria sustentacio politica e econémica, ou seja, a politica industrial tem de ser consenténea com a politica macroeconémica. De outro modo, com a taxa de juros em vigor, a atual politica cambial, o nivel de abertura da economia e com 0 nao controle da conta de capital do balango de pagamentos, nao ha politica industrial que possa reverter 0 quadro acima analisado. E uma verdadeira “camisa de forca” As medidas de desoneragio fiscal e previdenciiria, por exemplo, sobre a folha de pagamento e de IPI utilizadas recentemente para alguns setores (vestuario, calgados, méveis e confecgdes, construgio civil, veiculos e, tam- bém, producdo de softwares) surtiram efeitos positivos sobre a demanda em momentos de desaceleragéo da economia. No momento atual, elas estao sendo renovadas e estendidas a varios setores industriais. Restringem-se, no entanto, preponderantes 4 demanda e menos ao investimento, salvo no caso da cons- trugio residencial. Em 2012, 0 governo lancou um plano de investimentos pri- vados pablicos para logistica de transporte, oportuno, necessério ¢ elogidvel, ‘com recursos importantes em termos do setor, porém muito limitados em ter- ‘mos gerais, equivalentes a cerca de 0,4% anuais do PIB nos préximos cinco anos. Tal plano amplia ainda a capacidade de investimentos dos governos esta- duais, cujos investimentos, porém, séo proporcionalmente muito pequenos no total da formacio de capital fixo do pais." Para os empresdrios desses segmentos, sio medidas boas porque reduzem seus custos, amortecendo prejuizos ou aumentando lucros. Sao, no entanto, muito insuficientes, tendo em vista as necessidades nao s6 conjunturais, mas estruturais do pais. Com o prolongamento da crise internacional, as exportagées ja desacele- raram, o que reforca ainda mais a adverténcia de que 0 crescimento nao se pode manter via consumo da familia, que, alias, parece também ter desacelerado, Nao se deve esquecer os diferenciais de produtividade para com os produ- tos similares da China e dos BUA ¢, ainda, a defasagem cambial, que até recen- temente esteve em torno de 30%. Entio, & preciso fazer muito mais do que est sendo feito e proposto, para que esses empresirios enfrentem a concorréncia € reestruturem a industria. Subsidios e investimentos puiblicos, porém, sio sempre limitados, nao sé pela “obrigagio” do comportamento fiscal restrin- gido como também pelo fato de que o pais passou a integrar a Organizacao Mundial do Comércio (OMC) desde 1994 e subscreveu a Rodada Uruguai (GATT). Assim, o governo esta sempre “de maos amarradas”. A OMC até 34, Eo pacote de logistica anunciaco a imprensa em 15/8/2012, com investimentos totais de RS 133 bile, endo RS Boies para os proximos cinco anos eo restante para os 25 anos seguintes. 0 peso deles come proporcio anual do PIB seria de 04% nos primeiros © apenas 0.05% nos seguintes. CARS DESENLOL MENTO, Rade ea va ons-raees | (Des}industralizacao e (Sub) Desenvolvimento admite algumas medidas temporérias, mas esses subsidios podem tornar-se inaceitaveis para ela, E necessario lembrar que se atravessa, neste momento, ndo apenas mais uma crise, mas, sim, a continuidade de uma crise muito longa que vem desde © final da década de 1970. £ um processo cumulativo nefasto, que ndo apenas destruiu nossas instituigées de desenvolvimento, mas debilitou o proprio Estado além de desvirtuar o caminho do empresariado produtivo e progressista. Essa é a questio central da crise brasileira, mas nela ndo se toca. Nenhum dos governos que atravessaram partes desse longo periodo tentou algo mais profundo e necessirio. Para tal fato, tem-se de enfrentar sérias adversidades politicas e econdmicas internas ¢ externas. O Brasil entrou na chamada glo- balizagio, assinou tratados ¢ assumiu compromissos internacionais que nao deveria, A China declarou-se como economia de mercado, mas nao abriu a conta de capital. A India fez a mesma coisa, assim como a Riissia. Nao abrir a conta de capital significa manter o controle sob a entrada e sada de capital internacional e nacional, sobre as remessas de lucros ¢ os fluxos de investi- mentos. Mais do que isso, ¢ ter um grau avangado de soberania no manejo de sua politica cambial, fiscal e monetéria, o que nao se tem. No Brasil, ha politica industrial. Ha ages importantes de varios érgos publicos, como o BNDES. Ha, entretanto, muitos equivocos. Ha acertos nas tentativas de fusio e resolugio de problemas estruturais de grandes empresas nacionais, inclusive para tentar fortalecé-las futuramente em termos de pre- senga internacional. Ao mesmo tempo, nao ha nenhuma estratégia macroeco- nOmica e industrial para que seja sustentavel ¢ exequivel a fim de enfrentar a desindustrializagao, como apontaram Cano e Goncalves (2010). Economistas precisam aprender que a economia vai além das premissas teoricas de que os neoclassicos tanto gostam. A economia é political A eco- nomia como ciéncia é muito limitada, Economia é fruto de decisdes sociais tomadas por homens que tém poder. Sejam empresérios tomando decisées de investir ou nao, de comprar ou vender, seja 0 Estado em adotar e tentar fazer cumprir certas metas e objetivos econdmicos. Essas tomadas de decisdes sio sempre conflituosas. Sempre se defrontam com interesses diversos ou mesmo contraditérios, ¢, principalmente, com a incerteza de seu sucesso futuro. Nao adianta pensar em economia apenas por um prisma técnico de for- mular uma determinada receita quando o problema é politico. Se os governos, depois de 1990, “venderam a alma ao diabo’, ou seja, ao sistema financeiro, precisamos romper esse acordo. F, todavia, uma atitude muito complicada, pois quando se faz acordo com o diabo, ele vai exigir a alma, depois de levar © figado eo pancreas. De todo modo, os atuais horizontes politicos interna- cionais so pelo menos imprecisos e imprevisiveis. H4, portanto, a meu juizo, uma janela aberta para uma reflexio sobre o futuro. © | crc; 00 0 nesenvo ven To Ri de jana. 9.7.15, ppmag-74 u-de. 2014 governo norte-americano é democrata, mas a politica econémica, de certa forma, continua sendo controlada pelos republicanos. Na Europa, 0 qua- dro é exatamente o mesmo. A direita mais reaciondria esté & testa do manejo da administragao desses problemas e da crise. Ha uma boa entrevista da pro- fessora Maria da Conceigdo Tavares ao site Carta Maior®* em que ela chama a atengdo para as diferengas em relagdo a Crise de 1929. Naquele momento, 0 vencedor foi Roosevelt e, por meio do New Deal, foi possivel, além de tomar medidas para a economia, passar a olhar um pouco mais para os pobres ¢, a partir dai, desenvolveram-se politicas de Welfare State no mundo ocidental. & preciso atencio para a diferenga crucial entre as estruturas de poder anteriores € posteriores & Crise de 1929 e as atuais estruturas de poder, conservadoras € reacionatias, ¢, ainda, deflacionistas. Ou seja, a julgar pelas atitudes consuma- das ¢ intencdes declaradas até agora, elas tendem a aprofundar a crise. No Brasil, para administrar a Crise de 1929 e seu periodo subsequente foi necesséria uma revolucio, a Revolugio de 1930. Aqui, houve um estadista, ‘Vargas, que se antecipou aquelas medidas, © México teve Cardenas e ambos souberam, inteligentemente, conduzir seus paises. © Brasil pode e deve enfrentar a crise estrutural reportando-se, em grande medida, ao mercado interno, Ha quase 200 milhées de habitantes, um grande territério e uma boa dotagao de recursos naturais. Nao se trata de uma ati- tude voltada exclusivamente para o mercado interno, mas complementada em um Programa Nacional de Desenvolvimento que tenha, além desse vetor, ‘uma estratégia especifica de exportagées, introjegao tecnolégica e uma prio- rizagio setorializada e regionalizada de infraestrutura e alta tecnologia.» Em contrapartida, tal via ndo pode estar voltada apenas para fins de crescimento e produtividade, mas contemplar, prioritariamente, os setores que atendem as necessidades basicas da populagao e do pais como habitagéo popular, sanea- mento bisico, educagio e satide publica, que, sem diivida, deveriam encimar a agenda de planejamento. 8 Wilson Cano 1770372011, 36. 0 autor publicon, recentemente, propos sentido, na qual o programa € relativamente detalhado. Ver Cano (2010). CADERNOS do DESENVDLUIMENTO, Ro gene. 9. SREP 34 | (Des}industralizacao e (Sub}Desenvolvimento Referéncias bibliograficas BANCO CENTRAL DO BRASIL Capitaie ‘rasieros no exterior. 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