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Os mé . s métodos na pesquisa em educacao: a analise epistemoldgica As revistas especializadas em educaco vém dedicando es- paco cada vez maior a andlise da investigacao realizada na area? Ha uma preocupagio, entre outros aspectos, com o grau de efi- cAcia da investigagio em educagao, sua utilidade, sua correspon- déncia as necessidades reais, a conveniéncia ou nao de determinar prioridades de estudo, a importancia de se detectar se as investiga- des estao orientadas na direco da conservagao do status quo ou em direcéo da mudanga das atuais estruturas da sociedadeJHoje, i i dernos de Pesquisa da Fundagao 3, Revistas como Perspectivas da Unesco, Ca u \ Carlos. Chagas Fducagao e Sociedade do CEDES, Educagdo ¢ Realidade da GAGs, Revara Brasileira de Estudos Pedagégicos do NEP, Ciéncia ¢ Cultura da SBPC, entre outras. [...] estudos empiricos ‘com a maior das inten¢ f consciéncia dos pressupostos culturais, dividuais que se escondem sob a engan' objetivos. (Goergen, 1981, p- 65) ou tedricos executados muitas vezes des podem mudar 0 sentido a partir da \ sociais, politicos ou in- | ‘osa aparéncia dos fatos Nos diferentes métodos ¢ formas de abordar a realidade educativa, estao implicitos diferentes pressupostos que precisam ser desvelados, Nesse contexto, os estudos de carater qualitativo sobre os métodos utilizados na investigagao educativa e seus pres- supostos epistemoldgicos ganham significativa importancia. ‘Um indicador da crise da educacao ~ crise da sua natureza, do seu estatuto epistemoldgico e do estudo do préprio método ~ é ‘0 de que, sendo mie e berco do método cientifico, aplicou pouco de si mesma a seus proprios assuntos. Tais assuntos sao desloca- dos para outros campos como os da filosofia, da epistemologia e da gnosiologia. No'caso’especifico do método, desde o ponto de vista da epistemologia, tem a ver com os caminhos e os instru- mentos de fazer ciéncia, Um estudo epistemolégico significa “(...] um estudo critico dos principios, da hipétese e dos resultados das diversas ciéncias, destinadas a determinar sua origem légica, seu valor e seus objetivos”” (Lalande, 1967, p. 298). A epistemologia aplicada 4 investigacao cientifica em educaco tem como papel fundamental questionar constantemente esta atividade, ; Um estudo epistemoldgico dos métodos na investigacao edu- cativa, segundo Demo (1981, p. 55), estaria preocupado em a) ques- tionar a “cientificidade” — desses métodos — tida como cientifica; b) eto cientifico — quais os —= Pressupostos ideolégicos, caréncias tedricas, va- aliticos etc.; c) estudar as abordagens classicas e modernas 26 questionar criticamente a construgao do obj temas preferidos, métodos os " 'odos foi realizada sobre as pesqui: versidade de Brasilia (1974-1981) nihil Alguns conceitos basicos da andlise epistemoldgica dos métodos “Investigagao” vem do verbo latino Vestigio, que significa “seguir as pisadas’. Significa, portanto, a busca de algo a partir de XN 7 vestigios. “importante assinalar que 6 método ou modo, ou caminho, de se, “chegar'a objetoyo tipo de pracexo para chegara ele, €dado pelo, tipo de objeto e nao 0 contrario, | como pode ser entendido quando © caminho ganha destaque, dado o éxito de certos métodos em certos campos, chegando a ser priorizado de tal maneira que o objeto fica descaracterizado (‘desnaturalizado”), recortado ou en- quadrado nos codigos restritos das metodologias. | Pesquisa da pesquisa em educagao Segundo Vielle (1981), na literatura especializada, encontra- se uma nova categoria da pesquisa educativa chamada “pesquisa das pesquisas’, que tem como finalidade classificar uma série de novos estudos que pretendem refletir sobre a pratica da pesquisa educativa. Tais estudos averiguam, dentre outras coisas, que tipo de pesquisa se realiza, que tipos de contetidos se desenvolvem, sua qualidade, sua utilidade etc.; entretanto, sobre os métodos utiliza- dos até esse momento nao se tinha registros. Gouveia (1976, p. 78) detecta este vazio e propée “assinalar as tendéncias metodoldgicas que orientam as pesquisas na drea considerada, e indicar os mar- Cos tedricos que explicita ou implicitamente as inspiram” Essas Poucas referéncias ja indicam a importancia dos estudos de cara- ter epistemoldgico sobre as tendéncias metodold gicas na pesquisa educativa. O problema epi gi Pp ‘Pistemol6dgico da Pesquisa educativa O discurso epistemoldgico encontra n: {pios e na ciénci iT cipio: Héncia seu objeto. Tem como funcao nao sé resolver o problema geral das relagdes entre a filosofia e também servir de ponto de encontro entre 2 filosofia seus prin as ciéncias, mas. : wel elas, Esse encontro sé + ossivel em u dtica cone P ma pratica concreta; portanto, quando falamos de epistemologia da pesquisa o fazemos com base em um exercicio concreto nesta area, buscando instrumentos analiticos na filosofia, A epistemologia € uma palavra que designa a filosofia das ciéncias, porém com um sentido mais preciso. Nao ¢ uma teoria ' geral do saber ou teoria do conhecimento que seria objeto da gno- siologia, nem é um estudo dos métodos cientificos que seria obje to da metodologia, O estudo sobre os problemas epistemoldgicos da pesquisa \cientifica tem tomado diversas direcdes, especialmente a partir do Circulo de Viena (1927), quando surgiu um grupo de pesquisa- dores que se ocuparam profissionalmente dessas questoes. Carnap ce tesgata a logica indutiva. Popper parte da logica dedutiva ¢ da primazia do exame critico € estabelece uma primeira tentativa de a metateoria do método cientifico. Piaget desenvolve a episte- mologia genética, na qual considera 0 conhecimento nao como um estado, mas como um “processo genético estrutural”. Bache- lard se preocupa com uma reflexdo sobre as filosofias implicitas nas praticas cientificas, e, com a introdugao da nogao de “ruptura epistemoldgica’, opde-se as tradigées positivistas, reconhece que 29 ee eee es ee a, ciéncia mesclada de intuigao de erros, de pontos de vista e de ideologias.\Kuhn afirma que a ciéncia nao é acumu- lativa; sua evolugao se deve as revolugses cientificas. A revolugio cientifica consiste na mudanca de um antigo paradigma ou matriz disciplinar por uma nova; a matriz velha se incrusta na nova. Es- Sa reestruturagao representa o desenvolvimento das\ciéncias. Na mudanca de paradigma, incluem-se elementos extracientificos, como a propaganda e o proselitismo que 0 novo paradigma utiliza para ganhar adeptos. oti¢ault procura um Iécus para as ciéncias humanas entre as quais ha uma relacao estranha ¢ indefinida em um espaco comum; esta atitude de busca parte da arqueologia do saber e ajuda a questionar o que esta soterrado, o que esta por tras dojexercicio’das eiéneias)Para a Escola de Frankfurt, 6s /pesquisa® dores necessitam interrogar-se sobre o significado da ciéncia que fazem; a ciéncia esté integrada em um processo social, econdmico € politico, é uma pratica social entre outras, marcada pela socie- dade em que se situa e refletora de todas as suas ambiguidades eicontradi¢oes, A Escola de Frankfurt propée analisar a pratica cientifica nao como uma atividade neutra, mas vinculada estreita- mente aos interesses; o conhecimento ¢ 0 interesse esto interliga- dos; a epistemologia critica pretende revelar essas ligagées (Ursua Lezaun, 1981). Tal preocupacao critica com a ciéncia em geral também vem acontecendo com a pesquisa em educaco, particularmen- te a partir da década de 1970. \Oslestudos sobre a pesquisa em educagao tém identificado, Por exemplo, que durante essa década Predominou a influéncia das tendéncias baseadas nas concep¢ées Positivistas de ciéncia. Como alternativas a essa telativa exclusivi- dade, apresentaram-se novas tendéncias epistemoldgicas, dentre elas a “pesquisa participante” ea “pesquisa-acao”, que desenvol- vem a critica a perspectiva positivista, Em relagao a essa perspec- tiva, critica-se a preocupagao por constatar, descrever, congelar e prever fatos, comportamentos humanos e sociais ou sistemas de representa¢ao como se fossem objetos inanimados e distancia~ dos do pesquisador por meio dos instrumentos e das técnicas de pesquisa. Critica-se a pretensio de se reduzir a complexidade do real a visdo simplista e superficial de uma fotografia estatica. JAI Perspectiva analitica que fundamenta o positivismo conduz a se- para¢ao, por um lado, dos que sao investigados Para serem conhe- cidos e dirigidos e, por outro lado, dos que investigam, produzem oconhecimento, determinam seu uso e “dirigem ao Ppovo em seu proprio nome ou com freqiiéncia em nome de para quem traba- Tham” (Brandao, 1981, p. 10). Nama outra perspectiva, a “pesquisa Participante” e a “pesquisa-aco” pressupoem/que'o conhecimento seja essencialmente um produto social, que se expande ou muda continuamente, da mesma maneira que sé transforma a realidade concreta, e que, como ato humano, nao esta separado da pratica; 0 objetivo ultimo da pesquisa é a transformagao da realidade social eo melhoramento da vida dos sujeitos imersos nessa realidade. O problema do método © método tradicionalmente é estudado como um capitulo da légica e se define como um caminho para o conhecimento. ‘A pesquisa sobre 0 método leva implicitas indicagoes de card. ter gnosiol6gico, metafisico ¢ ainda de concepsao de mundo, Se o método é efetivamente um modo de aproximar-se da re. alidade, um caminho, a concepsao da realidade ser determi. nante para o método, (Ferrater Mora, 1971, p. 905). Diferentes concepgoes de realidade determinam diferentes métodos. No percurso histérico da filosofia, temos muitos exem- plos da preocupagao com o método e com a tomada de consci- éncia sobre o proprio método; exemplos como 0 do Organén de Aristételes, a légica escoldstica e de forma mais sistematica a par- tir de Descartes, que coloca em primeiro plano a reflexao sobre o método. A questo do método é motivo de uma série de tensdes que no século XX se situam entre a legitimidade logica (Carnap, Reinchenbach, Nagel) ea reivindicacao heuristica (Hanson): entre a racionalizacéo formal do processo cientifico (verossimilitude de Popper, por exemplo) e contextos normalizadores da atividade cientifica (por exemplo, paradigmas de Kuhn): entre teorias do método, em sintese, e a liberdade de jogo (Feyerabend). (Ursua Lezaun, 1981, p. 108). Em determinados periodos do desenvolvimento das cién- cias, 0 método é “fetichizado” e com ele também seu objeto; nes- Ses casos, torna-se necessdria a reflexio sobre este, questionando seus proprios fundamentos, Interrogar os métodos utilizados na Pesquisa cientifica é uma tarefa historica da filosofia, tomar consciéncia da importancia e das limitagdes d co) é impli mo também de suas implicacées e contradicées in que ajuda a los métodos, erentes. “Tipotogia dos métodos na pesquisa aw eduéagao? Considerando as abordagens epistemoldgicas, Torres (1979) detectou quatro paradigmas ou légicas: empirismo, formalismo, voluntarismo e dialética objetiva. Goergen (1981) indica trés ti pos de métodos na pesquisa educativa: 0 fenomenoldgico — her- menéutico -, 0 empirico e 0 critico; Burns (1981) distingue trés modos de abordar 0 conhecimento: 0 légico-positivista, o herme- néutico eo critico. Demo (1981) distingue em termos esquemati> aL alan eT ‘pela forma simplificada de situd-los, utilizamos neste estudo para “classificar as pesquisas objeto de nossa anélise; estas as aborda- EEE a uma atitude ante a origem do conhecimento, opée-se ao racionalismo e sustenta que a fonte do conhecer nao éa razio ou 0 pensamento, seno a experiéncia (Locke e Hume, dentre outros); todo empirismo tende a reduzir a experiéncia ao experimento sensivel. (© empirismo alimenta a expectativa de lo- ‘tese depois de verificada: A corrente empirista nega toda classe de imento a priori da realidade. metafisica entendida como conhecim: “ica'e Matemiitica) ow as ciéncias empiric. A validez dos enun- 6 na base empirica. A demons- ciados cientificos reside na Jogica e ; smatica € a observagao das ciéncias da natureza sao, tragdo mate! segundo esta corrente, © método ideal. (O/POSIEIVISMO! Consideram-se positivistas as doutrinas que tém como objeto do conhecimento sé aquele obtido mediante os dados dos sentidos; esta corrente nega-se a admitir outra reali. dade fora dos “fatos” e a pesquisar outra coisa que nao sejam as relacdes entre os “fatos”. Recentemente, 0 positivismo légico tem enfatizado como base do desenvolvimento cientifico a exigéncia da exatidao e rigo- rosidade na teoria das ciéncias. Para esta doutrina, todo constructo te6rico tem de ser rigorosamente articulado, segundo as condi- g6es légico-formais, e tem de referir-se 4 sua base observacional (Circulo de Viena). Jé Popper, que aparece neste contexto como critico do Circulo de Viena, questiona o principio da verificagao empirica e propée o principio da “falsagao ou refutabilidade”: os enunciados cientificos sao “falsedveis” por meio dos fatos e podem ser empiricamente refutaveis pela experiéncia. Tanto o racionalismo critico de Popper quanto 0 positivismo légico que ele critica tem sido submetidos a importantes objecées, que mais adiante serao analisadas. ‘Olfuncionalismozo conceito de funcio segundo Merton (1968) se refere aquela consequéncia observada que se forma para a adapta¢ao ou 0 ajuste de um sistema dado; caracteriza-se como um item, como uma contribuigao para a manuteng¢ao de certos tipos de unidade em um sistema social. Pode-se distinguir dois tipos de investiga¢ao: a funcional e a funcionalista. A investigacao funcional, chamada também de andlise fun- cional, tem estes propésitos: a) explicar o passado ou o presente dos acontecimentos; b) predizer os acontecimentos futuros; e c) servir de base para a selecdo de medidas de controle efetivas. A andlise funcional surge como uma modificacao da “explanagao teleoldgica” 34 contém dua: is 's partes, explanans (premissas) e explanandum (conclu- ‘ © efeito descrito no explanandum era de ser esperado, tendo em vista determinad: 86es), € busca demonstrar que 4 las circunstancias antecedentes (C) e as leis gerais (L) relacionadas : no explanans, Ve- jamos um exemplo: Explanans —11,12...In Leis gerais Cl, C2... Cn Afirmacées de fatos particulares (circunstanciais) .. Premissas Explanandum B Conclusio A abordagem funcional tem se mostrado frutifera em certos contextos biolégicos e pouco nos contextos sociais; ademais, acu- sa inconvenientes no uso empirico dos termos-chave como “ne- cessidade’, “requisito funcional’, “adaptacao” etc. A investigacao funcionalista moderna tem como base as Re- gras do Método Socioldgico de Durkheim (1972), quando privile- gia na andlise o estabelecimento das causas no estudo das funcées. “Deve-se buscar a causa determinante de um fato social entre os fatos antecedentes e nao nos estados da consciéncia individual” (1972). Posteriormente, Parsons (apud Ursua Lezaun, 1981) des- cobre um esquema bdsico de funcionamento de alguns processos de socializacéo, chamado estrutural funcionalista. Segundo ele, os fenémenos acontecem dentro de normas invaridveis devido a uma estrutura basica, geral e comum. O pressuposto da funciona- lidade parece excluir 0 conflito e as mudangas histéricas. Parsons justifica tal tese quando afirma que “uma teoria geral do processo de mudanca do sistema social nao € possivel neste estado atual do conhecimento”, somente so possiveis as mudangas dentro do sistema. Excluem-se os conflitos e as mudangas radicais por falta de instrumental apropriado de coleta de dados. Ao estudar os fe- némenos sociais ou educacionais, o funcionalismo legitima a si-) tuacio idealizada de harmonia social e considera 0 conflito como, patolégico. (Olsistemismd!lo sistema pode se descrever como [..] um complexo de elementos componentes, direta ou indi- retamente relacionados em uma rede causal, de sorte que cada componente se relaciona, pelo menos, com alguns outros de modo mais ou menos estavel dentro de determinado perfodo de tempo. (Buckley, 1970, p. 68). ‘No\sistemisio, o componente mais importante é a organi- za¢ao dos elementos que permitem o controle proprio e relativa- mente limitdvel do sistema. Nesse sentido, 0 todo é mais que a soma das partes, ele organiza as partes. A visdo sistémica do mun- do se centra na organizaco e privilegia o aspecto relacional dos componentes de uma realidade; como uma pe¢a na imensa mac A Por exemplo, o homem aparece quinaria da organizacao social, 'm sido bastante utilizada nas or- mantém, como resistem as mudangas; a mudanga de um sistema a outro é um fenémeno no aceitavel no sistemismo, o qual se con- firma como um método particularmente adequado “a legitimacio de sistema de poder porque esconde sob sua dinamica a circula- ridade do sistema: apenas se repete ou se confirma” (Demo, 1981, p-241). \QNESHRLIFALIEAIO! Se 0 sistemismo acentua o fenomeno da organiza¢ao, estruturalismo acentua o fendmeno do intercim- bio, da comunicagao e das relacées, A nocao de estrutura social nao se refere a realidade empiri- ca, mas aos modelos construidos em conformidade com esta [...]. As relages sociais sio a matéria-prima empregada para a construcao dos modelos que tornam manifesta a propria es- trutura social. (Lévi-Strauss, 1970, p. 65). Ovestruturalismojfiao faz como o fancionalismo, que gene- raliza sobre as observacées particulares, mas busca o que ha em comum em todas as sociedades de diferentes tempos e espacos, busca uma invariante nas variantes, uma espécie de ordem das or- dens, de inconsciente coletivo ou algebra do cérebro. A histéria (Diacronia) seria apenas a realiza¢ao das diferencas e das ordens; aestrutura nao tem histéria. oO estruturalismo como método tem recebido algumas cri- ticas, especialmente das correntes histéricas e humanistas. Sartre (1963) sintetiza, em parte, essas criticas. Ele reclama do estrutura- lismo a localizagao da historia no nivel da contingéncia. Negar a historia é negar a praxis, é substituir 0 movimento por uma suces- sio de “imobilidades”, Ao desacreditar a historia e a praxis, tam- bém se desacredita o homem, sujeito ativo da praxis e da historia. (WUialética\existem muitos tipos de dialética, nao nos in- teressa aqui estudar cada um deles. Limitar-nos-emos a dialética entendida como 0 método que nos permite conhecer a realidade concreta no seu dinamismo e nas inter-relagdes. Marx, em O mé- todo da Economia Politica (1983), nos apresenta a dialética como © processo da construgao do concreto do pensamento a partir do concreto real. O que se denomina concreto nao é mais do que a sintese de multiplas determinagées mais simples, é 0 resultado, no pensamento, de numerosos elementos cada vez mais abstratos que vao ascendendo até construir 0 concreto. O concreto € concreto porque é a sintese, e a unidade do diverso é o resultado e nao o ponto de partida. Para uma maior compreensao da dialética, ¢ im- portante distinguir 0 concreto real, que é o objeto real que se deve conhecer, e o concreto do pensamento, que é 0 conhecimento da- quele objeto real. A constru¢ao do pensamento se daria, pois, da seguinte forma: parte-se do empirico se passa pelo abstrato e se chega ao con- creto, Diferentemente, pois, da crenga que caracteriza o empi- rismo, 0 positivismo etc. [que confundem 0 concreto com 0 empirico}, 0 concreto nao é 0 ponto de partida senao o ponto de chegada do conhecimento. (Saviani, 1980, p. 11). O concreto nao é o dado empirico, é uma totalidade arti- culada, construida e em construgao. Entretanto, a légica formal tem por objeto as leis que regem o pensamento na condicao de pensamento, ldgica das formas como o seu nome indica; a légica dialética, em mudanga, tem por objeto as leis que governam o real, Podendo-se chamar a légica dos conteidos contemporaneamen- te; a dialética tem sido colocada pela Escola de Frankfurt; para a “Teoria Critica” (Horkheimer, Adorno, Marcuse, Habermas), 0 importante para o conhecimento € a cri conceito dialético da totalidade itica (Razao Critica) e 0 (Razao Dialética). A andlise da sociedade s6 pode desenvolver-se na sua totalidade. A tarefa da ciéncia esta orientada para a critica dos interesses ¢ para a emanci- pagio do homem; nao sé questiona o que é ou como, senao 0 para que se tem de fazer ciéncia. Anilise epistemolégica dos métodos Para constatar ¢ interpretar os mais importantes pressupos- tos epistemologicos, implicitos nos métodos utilizados nas inves- tigagées, fos utilizada como instrumento organizador uma matriz paradigmatica.‘ Essa matriz, construida com base em um primei- fo projeto apresentado por Bengocchea ¢ colaboradores (1978), parte da concepyao de paradigma entendido como “logica recons- tituida’ A unidade basics da analise paradigmatica € sempre um aU tacdo mais detalhada da matriz paradigmatica sera apresentada no Ima apresentag terceiro capitulo deste livro. A matriz que apresentamos no terceiro capitulo permite, 4 maneira de uma “matriz disciplinar’, desvelar (processo herme- néutico) os transfundos da pratica investigativa, seus pressupostos tedricos, ldgicos, gnosiolégicos e ainda ontoldgicos. Esta andlise segue um processo hermenéutico-critico. De- pois de esquematizar os contetidos explicitos no referencial técni- co, metodoldgico e tedrico € de interpretar, a partir dessas referén- cias, os pressupostos epistemoldgicos, sao abordados criticamente os resultados do processo interpretativo, procurando outro nivel de pressupostos, os gnosioldgicos ¢ os ontoldgicos, exigindo-se, para isso, a contribuigao da filosofia. Neste-caso, a reflexao filosd- fica nao pretende ficar na hermenéutica; buscaria também uma dimensio critica. “A filosofia tem de um lado uma missdo essen- cialmente hermenéutica (interpretativa) e de outro uma fun¢ao essencialmente critica, critica dos pressupostos do conhecimen- to” (Gadotti, 1980, p. 33). Por essa raz4o, este estudo inclui uma discussio sobre as contradigées, os conflitos ou os paradoxos da pratica da investigacdo educacional. Em sintese, essa primeira experiéncia de andlise epistemolé- gica procurou, em primeiro lugar, _Implicitos em cada um dos métodos. Depois de classificadas as investigagdes ~ segundo o método utilizado, com ajuda da “ma- triz para a andlise paradigmética” -, foi possivel realizar a inter- aa elaborando conclusées parciais sobre cada método, logo, : re esses resultados e agrupados em um sé conjunto foi possivel egar a conclusdes gerais sobre as tendéncias da investigaca : igacdo na exemplo a produgo do Mestra- de de Brasilia (1974-1981), essas Aproximadamente ‘um tergo das dissertagdes se situou como ‘fancionalista o que é explicével em razao da porcentagem delas que trata de temas sobre organiza¢ao, administracao, funciona- mento ¢ avaliacao de sistemas educativos e que se situa na area de concentra¢ao predominante: Planejamento Educacional. As teo- rias sobre a fungao de producio, o capital humano, teoria geral de sistemas, teorias de facetas de Guttman sao as mais utilizadas. De forma geral, as criticas se dirigem para os formalisms na educa- 40, os sistemas fechados, a incongruéncia entre a lei ea realidade, a copia acritica dos métodos e técnicas educacionais estrangeiras, 0 paternalismo, o legalismo e 0 economicismo na educacao. Além dessas criticas bastante comuns, ha dissertagdes que nao fazem nenhum tipo de critica, nem citam nenhuma discussio sobre 0 tema estudado. Com respeito ao interesse implicito, aimtaioriaidosy 4l Entre os pressupostos epistemoldgicos, destacam-sela/cony (cepeao deNeauwalidadé entendida como uma relacdo entre as premissas e as conclusées, uma correlagao de varidveis que se acompanham como uma relagio insumo-produto, meio ambien- te-sistema e a explicacao do presente a partir de fendmenos pas- sados, geralmente relacionados com a influéncia ou vigéncia de uma lei. A validade dos requisitos da prova se reduz a validade dos instrumentos, 4 confianga nos modelos de anilises escolhidos e 4 confianga no processo do raciocinio légico. Os pressupostos ontolégicos, entre os quais estao a concepcio de historia, homem e realidade, se manifestam da seguinte maneira: a concepcao de histéria é reduzida na maioria das dissertagées a um tempo conjuntural, relativo ao momento em que se faz a obser- va¢ao ou a coleta dos dados, uma espécie de eterno presente, preso a um cédigo, a um dado ou a uma faceta da realidade. A realidade se concebe predominantemente como estatica, que esta ai para ser conhecida, ou como complexidade de variaveis possiveis de medir, entrelacar, inter-relacionar, estruturar ou sistematizar. Também, a tealidade é considerada como cenério ou circunstancia; excepcio- nalmente é considerada dinamica ou contraditéria, . _ Discussio Além das verificacdes e interpretacées anteriores, a andlise €pistemoldgica nos permitiu descobrir Spistent uma série de paradoxos implicitos nos métodos, tornando -S€ necessdria uma discussao, a 42 pares s4o pontuados na sequéncia. Toda investigaca é om métoda nucle pee UM corpo tedrico, e este deve ter J@ apropriado; porém, a relacio importante no Processo da elaboracao do conhecimento ¢ desvirtuada pela mitificagao dos métodos que sio desvinculados dos contextos ted ricos, ainda mais es sa is quando estes sao utilizados indiscriminadamen te, ee maneira de uma moda, ¢ a teoria ¢ reduzida a um corpo de ‘. lefinigées, a um simples marco de referéncia ou a uma revisio bibliogréfica superficial. O método, quando ¢ considerado como Unico critério de 0 objeto a seus codigos, reduzindo-o, fo- objetividade, transfere dividindo-o em setores, facetas tografando-o, dissecando-o, ou ou variaveis; em suma, inter-relaciona- a do método, seja como l6gica d guagem logico-matematica, pode uando este deveria ter a primazia © ou sacrifica-o ao rigor légico. A primazi ja razao, contro- le da experiéncia, ou ling “desvirtualizagao” do objeto, 4 levar a 43 ante o método, ea objetividade deveria se centrar no objeto e nao, como 0 constatamos neste estudo, nos critérios de validez dos ins. trumentos, na exatidao dos registros, ou na definicdo operacional dos termos ou na rigidez do processo légico racional. “Anndlise quantitativa e andlise qualitativa Muitas dissertacdes apresentam dados demais e andlises de menos. A simples coleta e tratamento de dados nao é suficiente, faz-se necessario resgatar a andlise qualitativa para que a investi- gacio se realize como tal e nao fique reduzida a um exercicio de estatistica.® Na maior parte das dissertacées analisadas, predomina o tempo curto ou conjuntural, expressando seu carater a-histérico ao reduzir a realidade a uma fotografia instantanea. Por outro la- do, as ciéncias sociais nao se podem limitar a relacées entre mag- nitudes estaticas, pois essas exigem abordagens mais amplas que considerem 0 tempo como processo € nao s6 como um dado, uma data, uma varidvel ou faceta, 6. Uma discussio mais ampla sobre essa questi iscus a ; questao encontra-se no livro Pesquisa ducacional: quantidade-qualidade (Sanchex Gamboa, Santos Filho, 005)" cimento permanecem Teduzidos a Tepresentacao do primeiro sem Permitir a interacao do Sujeito. Supdem, também, que a relagdo Sujeito/objeto acontece numa relacdo de duplo empirismo entre um individuo real ¢ isolado (Pesquisador) e um pedago de realida de também real estatica; entretanto, 0 sujeito empirico é portador de uma cultura, de uma linguagem, de uma estrutura de pensa- mento e uma es cala de valores; sua telagdo com o objeto, nesse sentido, nao é neutra. O sujeito eo objeto do conhecimento nio so duas entidades que entram em fea¢ao por meio de uma ter ceira entidade chamada sensacao, observacao ou experimentagio, mas sao dois aspectos de uma mesma realidade numa relagao de unidade e de contradigées dialéticas (Torres, 1979), ou, como diz Sartre, “o experimentador faz parte do sistema experimental” nem objetividade pura nem subjetividade pura, na unidade do conhe- cido, objeto e sujeito se aliam irredutivelmente. A investigacao como requisito académico ” ou como “trabalho humano’ A pratica da investigacao te: m as caracteristicas do wapalho| ices de apenas cumprir um mero re- humano, porém, nas condit quisito académico para a aquisicao de um titulo ou ssexadee num grau universitario, essa dimensao se perde e se reduz a um “proto- } colo” que tende a ser repetido em outras pesquisas de teor apenas | académico. Nessas circunstancias, a pesquisa perde a capacidade | de instrumento de conhecer a problemitica da realidade a sua di- | mensio transformadora, como todo trabalho criativo deveria ter._} Outras consideracgées Finalmente, gostaria de destacar algumas sugest6es e, ainda, algumas quest6es que devem ser aprofundadas a partir desta pri- meira experiéncia da andlise epistemolégica sobre os métodos na pesquisa em educacao. Destacamos a importancia de continuar a discussao sobre os métodos e suas implicacgées epistemoldgicas aqui iniciadas. E im- portante ter consciéncia dos métodos utilizados na investigagao educativa para superar a forma espontanea e acritica como estes, muitas vezes, sao utilizados, desconhecendo-se suas implicagées e Seus pressupostos, A epistemologia sobre os métodos, na a mais, mas como uma tomada de da investigacao educativa, nao como uma discipli- consciéncia dos processos deve ser incluida nos diferentes niveis (iniciagao cientifica, mestrado ¢ doutorado) da formacio do pes- ~ quisador. A critica do método segue sendo um dos Ppapeis fundamen- tais da filosofia; sua presenca € necessiria no estagio atual da pes quisa em educa¢ao que, num Processo de reflexado sobre a pratica ¢ de aprofundamento qualitativo, Pretende ampliar as linhas de “investigacao sobre as investigagdes” Se tomarmos 05 esforgos da iniciagao cientifica € a elabo- racdo de dissertacdes € teses, exigidos nos cursos de graduagio e pos-gradua¢ao, como um “trabalho humano” ¢ ndo como simples exercicio académico, certamente ¢ possivel superar os diferentes desvios ¢ condicionantes que reduzem a capacidade de compreen sio da problematica da realidade ¢ a dimensao transformadora da Pesquisa a um simples exercicio de repetigao de um saber técnico, Tal reducionismo que desvirtua a tarefa fundamental de produzir novas respostas e acumulac¢do de massa critica para a transfor- magao da realidade precisa ser superado em prol de um conheci- mento que contribua para que nossos paises em desenvolvimento Percorram seus caminhos de afirmagao cientifica, econdmica, po- litica e cultural de que tanto necessitam.

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