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Aescola dos sonhos ara as escolas eas dendezciros ‘Todo dia vou escola. Uma escola que habits em mim ‘e me faz lembrar © quanto eu sou mitido quando me ppermito matutar as coisas do mundo abragado pela sombra da palmeira. Se tem algo que persigo desde quando me percebi adulto, alterado pelo aciimulo de coisas apresentadas ao longo do tempo, écacar nessa “adultice” o menino queainda sou. No 6 porque uma. pessoa temaidade que for queeladebsade sero que ela era quando estava nisso que convencionamos chamar de infancia, A sabedoria de rodopiar nas voltas dessa spiral conhecida como existéncia esta exatamente na capacidade de encontrar ameninice no velho e a forga do tempo naquilo que 6 movido pela curiosidade, pela brincadeira e pelo descobrimento das coisas. ‘Aescola que é uma palmeira me tirada pressa das ccertezas medida que vai deixando suas sementesem ‘minhas maos para, ali, evaprender com a capacidade de fazer perguntas. Como tempo nio medido emuma ‘eta, mas com suas pontas unidas, adentro as salas deaula, seus livros, seus mestres e suas ligbes. Acada semente que ficanas mios, um trago dos eaminhos que descortinam as possibilidades de um mundo que cencontra solugdes no improvavel. Sewedueagao-éum_ radical da vida, por que nio-enxergarmos as muitas cescolas que estio por ai? Enquanto alguém que se dedica & educagio, sou cconstantemente interpelado com intimeras critica escola. Os questionamentos sao sempre bem-vindos. ‘quando ressaltam a escola como tempo e espago de disputa por experimentagées ¢ pela defesa de um ‘mundo plural efalante de miileiplas linguas. Quando as mengoes descredibilizam a escola de sua forga ‘ea simplificam como mero espaco de reproducio, aco uma finta, lembro da escola palmeira c percebo ‘que a floresta 86 se ergue com a interagio de dife- rentes érvores e sores. Para tilhar esse rumo tendo a propor algumas perguntas para cruzar os discursos que’ reduzem a escolae as experiéneias educativas como ‘senco uma tinica coisa. Fazendo perguntas proponho ‘© caminhar. Na medida em que elas surgem, a prosa se alonga ¢ topamos em caminhos que ja estavam abertos, mas no enxergivamos. [No Brasil, educagao escolar comeu na gamela da colonizagio, fo imestida para perpetwar as dimensoes desaber e poder domoclelo dominante. A catequese ‘operoucomo escola,eaescolarizagio da calénia pela ‘metrépole plasmou tum curriculo que no é restrito aos herdeiros doseuproterorado. Pelo contririo, seu conteddo est em todos os lugares e em diferentes ‘boeas,disseminando as linguagens que sustentam 0 pedro de existencia que divide o mundo em opres- sores € oprimidos, colonizadores ¢ colonizados. ‘Vivemos em um pais blindado pela 6gide do Estado colonial, com oracsmo,aescravidio, opatriarcado, a silagem e ofurto como motores do acimulo econd- ‘mico que se concentra em uma pareela intima de sua populagio, Por aqui ainda érecentea democratizagio doacesso d escola, endo essa ainda mantenedora da mentalidade dominance alvo dacobiga daqueles que ‘6 enxergam luro. Tendo esses aspectos como forma: ores de nosso eho, qual é avaliagio que podemos fazer da escola, sem que nio nos reconhegamos como parte desse problema? “Herdeiros da catequese como pritia de escola rizagio do primado colonial, acabamos por reduzir (© problema «uma lgica maniqueista, destiuindo a ceducagio de vivacidade. A escola deve ser habitada pelo confte produtor de invengio, ser o lugar de ‘questionamentos, responsivel com didlogo efavo- ‘vel ao reconhecimento de nosso cariterinconcluso «, por isso, emergir como um terreno propici para tramar esperangas. Porém, isso passa muito longe doquetemos atualmente. A escola refiee erefrata 8 16a de um mundo que nos conformamosa ter. mas ‘que nto & ideal, pois no ¢ justo coma vida em sua pleninude. Desea forma, se nossa tarefa a transfor ‘magi, nos cae batalla elas escolas que queremos. Existe quem acredite que a luta por descoloni- ‘agdoniose coadunacom aescola. mas eu ni estou ‘e acordo com este pensamento. Pergunto a vocds: ‘a quem interessa fevorece a perda da escola como ‘tempo e espaco de presenca clue cordiana? Fixar'a ‘escola como mero lugar de reprodusio de modo domi ante €desconsiderara emergincis dos cotisianos que | cruzam e dos viventes que praticam com corpos ispuramavidaatodo momento, Nioa ‘09, hd um padi que diz, quem sto aqueles que, all, “serio determinados como bem-sucedidos ou fracas- sados. A questio é que, diante da complexidade de ‘um tempo aquebranadono desencante,deveros set _ incansiveis em questionar sso com que aprendemos 8 conviver aceditando ser normal. ‘Aqueles que no ercem que a escola deve ser lida ‘como um lugar de dsputa alver tenham esquecido ‘em qual chio elas foram construidas. Chios que ‘gustentam aldeias, que se inventaram terreiros, nos ‘qual ge enterraram os mortos e os cordées umbili- cals, onde se escavaram ashist6rias antepassadase5¢ cultivaaesperanga d semeadura de um novo tempo. (0 jogo da educagio na escola demandanio somente ‘uma leisura de mundo que preceda a das palaras® das coisas al aprendidas, mas uma leitura de cho. ‘Otermo chia da escola'—comumente usado pelos praticantes da educagio paraserefevr ts textualidades > Wer Paso Fe (2006, cotidianas inscritas nas inimeras relagbes as vine {formas de fazer nesse ambiente — pode nos dizer algo ‘amas, como a emergincia de uma escutasensiveler ‘olago aos dizeres dos noseos colos. Dossamaneia, 0 ‘io da escola nos convida anos recanhecermos como ‘sees em rlagio ¢responsabilidade com o todo. eas ‘escolas, slam quaisforem, estho enguldas nos chios ‘dagui esendo praticadas das mais diversas maneiras, ‘las também deve ser agar de lura pela descoloni- ‘zai. Entendé-ls meramente como parte integrante ‘doprojeto colonial ésimphfcaraforga das pritieas que _acruzam dos chios que asustentam e que reverberam ‘as tensées e 08 conflitos de um mundo imposto sob ‘adimensio do ctrcere exstencial a que grande parte ‘dos viventes daqul esto submetidos. (0 chio da escola pode e deve emergir como um lugar propicio para uma penetragio nas funduras desea tera e dos seus achatdos, para remontarreper- {Griostiticos transgressores do quebranto que aqui fi Jangado. Nesse tom, haverd aqueles que deseonhecem, ‘os saberes guardados nos caroos da palmeia, assim come havers os que sabem Klos dessasleituras rio sacar historias, ligdes e remédios que nos permitam slargar subjetividades, esperangar © nutrir novos cielos. A escola deve, entio, assumir 0 compromisso ‘coma sew chao, que nesse caso é0 solade im Bras) rofundo que nao pode se submetere conciliar com ‘osabusoe deuma nagio plantation, cyjonomeguaréa ‘a quentura do fogo da ganincia daqueles insensiveis 4 Mloresta, mobilizados somente pela tara da derru- ‘ada e do trfic de seus troncos. ‘Das mettrias dos dizeres do chio fica a aprend- ‘zagem de que ¢ necessirio ‘sdiar 0 fim do mundo’ e {ocarno cater primordial dele, que é ser inconchso’ ‘Dai, quais hstéias ‘eseritas' guardadas nas ‘vivén- ‘is’ podem ser contadas para suspender 0 ctu, ler 0 chlo coofli’ em um envolvimento com a diversi ‘dade de vidas que habitam essa casa chamada planeta"? ‘Certa vez, em uma conversa com uma erianga ul ‘uestionade sobre como, endo professor, eu imagi> snava que deveria sera escola do futuro, Tendo como ‘base um tempo em que as pontas possam ser emen- -dadas, penso que a escola que desejo para oamanhi ‘tem muito do que reside no que no pode serconsu- _mido pelo cardver uilitarista da vida. Recorti as _escolasque tenho frequentado, sejam elas de cimento ‘0u'a escola palmeira, ¢ dali desenhel o caminho _ que soprei como resposta. Respondi apostando em ‘uma escola que tem duas caracterstiens mareantes. Primeiramente, ela deveriater‘um corpo docente _miltiplo, que nesse caso implica ter professoras € [profereoret mate que humanoe ‘A erianga foi eategériea: “Como assim? Mais que ‘humanos? Seriam entio extraterrestres?”. Fiquel surpreso com o questionamento e matutei por que claecorreu aos extraterrestes como ideia de mais que Jnumanos’,quando eu imaginava professores plantas, sementes, pedras de ro, formigas, passaros edemais habitantes desse planeta. Quando mencionel que temos a aprender com esses seres e suas escolas, percebi que mesmo em uma crianga a crenga no ‘humano como ser superior a0s outros viventes é bastante forte. Recorr ao xami® que nos sopra pala ‘yeas de forga, questiona a seguridade desse seleto ‘grupo chamado humanidade, e busca nos avds rio € ‘montana ligdes de plenitude da vida Firmei o ponte invocando a mata como escola e ‘© encantamento, politica mais que humana, como ‘pedagogla. Afinal, a escola palmeira tem me post bilitado aprendizagens através dos eaminhos apon- ‘ados por suas sementes, Ali tenho me permitido aprender com as inteligéncias de intimeros seres em suas mais diversas formas, que cruzam as barras do tempo para circular experiéneias atadas nas varias ‘camadas do existir. Quando o dito humano no se apega. sua precenstio de grandeza,cle senteo mundo {feito crianga e se abre para o segundo elemento que € indispensivel a escola que miro: a _atar perguntas que no obstinam uma finiea resposta. anon Krak 20, "Naeseala que cago em meus sonhosriscoa proposta {de que os processos educativos sejam lidos e proble- ‘matizadosa parti da capacidade que os envolvidos ‘enham de fazer perguntas, endo de dar respostas. A ‘rianga,entio, saltou os othos e perguntou: “Desse Jelto seria 6timo para as criangas, pois todas seriam aprovadas,né”. Fiquel matutando e questionei qual é ‘8 logiea demedigio entre sucesso einsucesso que nao ‘vasculha as possibiidades inscritas nas itinernci do ser? Acivida como esfera queinstaura movimento ‘nos leva aperambular com inteligencia,curiosidade € inventividade 20 dar 0 acabamento provisério no ‘que entendemos sendo a vida e © mundo. Investir nas perguntas nos lanca na responsabilidade do dislogo ‘ena experiéncia radical com a diferenga. (O queseducagio.nos pede é disponibilidade para transitar. Afetados pelos processos educativos, como podeinos vira ser sem esse arrebate dos movimento=? ‘Acescola palmeira tem dado ligbes sobre a capaci ‘dade de fazer boas perguntas ¢ apostado que 9 efeito ‘delas € tomado pelo poder daquele que € todo equal ‘quer mela de comunicagio,inguagem dislogo; que 6 também o instaurador das dividas que fazem 08 Jhumanos serem desbundados de sua arrogancia, O ‘que poderiamos aprender e nos tornarmos em uma ‘escola emque os mestres fossem plantas, ros drvores, ‘de todo tipo, bichos,insetos, pedras.e gente epartise ‘de uma ética de *biointeragso? ‘A descolonizagio néo pode ser fetchizada no it evirde uma demanda produtivita de iscursos que semente tice a pocira das obras, das protegSes, dos consensose dos privilégios mantdos pelo modelo ‘dominante. Nease sentido, adescolonizacio nao esti para escola como mero malabarsmo discursivo que mene o peso domundo que €earregado pola agenda ‘dominante epor todos seus apetrecos.Adescoloni- _2a¢o demanda corpoxpaiticos que possam insure. ‘serebelar econfrontar as. opresses mantidas a= tequra do projets da modernidade,Pede-secorpoern ‘morimento: se uma eianga que brina, um punhado ‘ecarogos de dence, uma loresta que se mantém de é, a cabegada de um capoeira, as aprendizagens de Jnimeras linguat uss perguntas que desconcertem, ‘ontrontem, questianem e natrem outras historia. ‘emergéncia da descolonizacic, principalmente por ser poteiteao‘cruzo de inimeras préticas de saber, ser arebatada pea imprevisibilidade einventvidade ‘dos cotidianos e concentrar parte dos corpos pol- tices que, ao longo do tempo, so alvos dessa enge- ‘nharia de destogar vida e esperanga. Cabe 8 escola ‘er msn wn camper de bazatha em que ve dizputea ‘descaloninagi, manifestadanapritiea como parted emo, Ingerago entre os miiplos viventes—ea produ “de experanga como sua forca motrz. ‘Tenho frmado ques principal arefa da edscagto emma sociedad como a brasileira éinserever ‘descoloniagio, cresslto que essa tarefa demand “compromisso, rigor © aghoeotidiana © continunds, ‘Assim, elas faa como uma explosio provocada pela Inconformidade dos submetidas ao encarceramento existencial plantado pela domingsao. Essa explosio ‘qe fe dew ecomtiuna reverberar precisa exescer ‘cadaver mais. 20 ponte de plurversalizr®’o mundo ‘com fas, Joos, gingas, entes, modos,presengas, saberese gramitieasaquebrantadas po ese sistema manolégico. Aescola que miro em minhas viragbes ‘mais que humana, pois somente o humano nfo comporta a grandeza ea forea do “vir a ser. Ela é, sind uma esol fazedora de perguntas, que nto se fecha 20 mundo eadvoga por uma politea do cone- mento questa potica, Cabedestacireue mo hf descolonizagio sem ums _poltcadapresenga edo conlcimento que trangrids ‘as hierarquias de poser fincadas por aqui A colon zagioasrassineu mihares de sere enguewseumundo por meo de uma politica bancira em que as moedas ‘so almas;rapinou as iquezas do solo:investu em um ‘stems politic mantidona perperuacto do traume aver, um dos pontos importantes para fortalecimento da descolonizagio inaescola tratarmos este evento como algoque ainda ‘permanece,e dimensionarmos seus efeitos para além ‘dos aspectos materiais.E fundamental ampliagio ‘nog de colonizagio em seu ‘como uma politi de ataque, controle e desenean aspectos biocbsmicos ¢ suas multiplas igraméticas. Cabe, também, salientarmos a coloni- zagio como umaampla maquinria de destruigao da sentido pautadonas nogSes débioinceragio' ‘vont aca’, como defendidas por Négo Bispo. ‘escola que me leva a cultivar um rogado de atos politicos ¢ poéticos & aquela em que possam tran- ‘sitar corpos sensivels aos dizeres do chio.O chi da escola guarda ¢ conta histéras que ventilaram espe- rangasque afugentam oassombro colonial Nela, entre ‘uma brineadeira ¢ outra, descansaremos na sombra ‘da palmeira que nos guardaré em tranquilidade enos ‘dara conselhas de como caminhar suavemente por ‘essa terra, Guardaremos a palmeira ea escola com as nossas vides, nossas utas € 08 nossos amores, 20 Ponto que nia diferenciaremos mals 0 quede ato ¢a ‘escola, pois tudo seplasmaré:na vida enquanto sentido forga comunitris. Guerrilha brincante ‘Para as crianas eas avés [No mundo que c& estamos, no aterro que custeou & sustentagio da Europa como centro, haverd ainda ‘um lua que acenda a beirad'égua o, al 0 de vista {orteeintuio segurairSo ouvir asrisadas dos curu- ‘mins que brincam. Estes descersio dos céus enquanto ‘a cidade desencantada dorme, vio se despir de sua forma de estrela pata vadiarem naareia.Naprimeira luz de dia retornario a0 firmament explorario ‘outros tempos — e, por aqui, as eriangas que entio {dormiam ¢ardo continuidade ao seu trabalho. Assim sefazo ciclo, Alguém artisca um palpi sobre qual fo trabalhodos curumins? Antes que se apressem, eu digo: brincar. Ele deseem das estrelas para plantar a brncadeira c4 onde estamos, as criangas do conti- ‘dade a esse plantio. No dia em que a brincadeira Imperar, os eurumins poderio tirar uma folga © ‘esttelas sero vistas mesmo sendo dis. ‘A colonizagio incutiu traumas e desvios nas ‘rlancas, ncusive abords-la por esse recorte talver

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