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8 ‘gregar 0s instintos politicos naturais. Seria uma léstima se também a ciéncia econdmica seguisse o mesmo rumo, na medida em que ela acalentasse um eudemonismo macio, por mais espirituatizado que fosse ms forma, rer detrés da ilusio de ideais “s6cio-politicos” indepen- Também em face da violenta pendiria das massas da nagio, que pesa sobre a consciéncia social mais apurada da nova geragio, devemos Feconhecer francamente que ainda mais fortemente pesa sobre n6s 2 consciéncia da nossa responsabilidade perante a Historia. Nio seré dado & nossa geragio ver se a Iuta em que nos empenhamos dara fru tos, seo mundo vindouro nos reconhecerd como seus antepassados. Somente conseguiremos quebrar a maldigio sob a qual nos encontramos, a do sermos descendentes de uma era politicamente grandiosa, se sou Bemes fomarnes algo vero — a saber, 0s precursors de wma Goce maior. (... 3. A “OBJETIVIDADE” DO CONHECIMENTO NAS CIENCIAS SOCIAIS * A revista [Arquivo para a Ciéncia Social e Politica Social] sempre tratou todos os objetos de suas andlises como de natureza s6cio-econd- ‘mica, Embora ni seja esse 0 momento para dedicar-se a determinagées de conceitos ¢ delimitagdes de ciéncias, impée-se um esclarecimento sumério acerca do sentido disso. Todos aqueles fendmenos que, no sentido mais amplo, designamos por “s6cio-econémicos” vinculam-se ao fato bisico de que a nossa existéncia fisica, assim como a satisfacdo das nossas necessidades mais, ‘deais, defrontam-se por todos os lados com a limitagio quantitativa ¢ a insuficigncia qualitativa dos meios externos, que demandam a pre- visio planejada e 0 trabalho, a luta com a natureza ¢ a associagio com homens, Por sua vez, o carter de fendmeno “s6cio-econémico” de um evento nio é algo que Ihe seja “objetivamente” inerente. Pelo contrétio, cle esté condicionado pela orientagao do nosso interesse de conheci- mento, € essa orientagio define-se conforme o significado cultural que atribuimos ao evento em questo em cada caso particular. Sempre que um evento da vida cultural vincula-se direta ou indiretamente aquele fato bisico, através daqueles elementos da sua especificidade nos quais repousa para nés 0 seu significado proprio, ele contém ou pelo menos pode conter, conforme o caso, um problema de ciéncia social; ow seja, cavolve uma tarefa para uma disciplina que toma por objeto a pesquisa do alcance do fato bésico apontado acima. Entre os problemas econdmico-sociais podemos estabelecer distin- Bes. Temas eventos € complexos deles, normas, instituigdes etc., cujo Reproduzido de Wene politischer Erkenniniss.” ‘rganizada e revista por Johannes Siebeck), 1973. p. 161-214. Nao foi 146461). Trad. por Gabriel Cohn. 1M. “Die ‘Objektiviti’ Sozialwissenschafticher und Sozial- Gesammelte Aufsitze zur Wissenschafilehre. 4. ed. inkeimann, Tabingen, J. C. B. Mohr (Paul ida a segfo introdutéria do ensaio (p. 80 significado cultural para nds repousa basicamente no seu aspecto econd- mico. Por exemplo, acontecimentos da vida bancéria ¢ da bolsa, que desde logo nos interessam essenciaimente sob esse ponto de vista. Em ‘egra, mas ndo exclusivamente, isso sucede quando se trata de instituicoes que foram criadas ou so utilizadas conscientemente para fins econdmi- cos. Esses objetos do nosso conhecimento podem ser chamados, em sentido estrito, de eventos ou instituigdes “econdmicas”, A isso somam-se outros, como, por exemplo, acontecimentos da vida religiosa, que nio nos interessam, ou por certo nao o fazem pri- ‘mordialmente, do fngulo do seu significado ece-.émico e em nome dele, mas que em determinadas circunstincias podem adquirit um significado econémico sob esse ponto de vista, dado que deles resultam determinados efeitos que nos interessam sob uma perspectiva econémica. Sao fend- ‘menos “economicamente relevante: E, finalmente, entre os fendmenos que ndo sio “econdmicos” neste nosso sentido, ericontram-se alguns eujos efeitos econdmicos pouco ou nenhum interesse oferecem para nds, como, por exemplo, a orientagio do gosto artistic de uma dada época, No entanto, tais fendmenos mostram em determinados aspectos.signficativos do seu cardter-uma influéncia, mais ou menos intense, de motives econdmicos; no nosso caso, talvez, pela composigao social do piblico interessado’ pela arte Sio Tenémenos economicamente condicionados Assim, por exemplo, 0 complexo de relagdes humanas, normas ¢ condigbes normativamente determinadas que designamos por “Estado” € um fendmeno “econdmico” no que se refere as finangas piblicas, Na medida em que intervém na vida econémica por vias legislativas, ou de qualquer outro modo (mesmo nos casos em que 0 seu comportamento € determinado conscientemente por pontos de vista completamente diferentes dos econdmicos), é “economicamente relevante”. Finalmente, na medida em que a sua conduta ¢ 0 seu cariter sio determinados por ‘motivos econdmicos, também em outras relagdes que nao as “econd- micas”, € “economicamente condicionado”, Compreende-se, diante disso, que, por um lado, o émbito das mani- festagdes econémicas € fluido endo pode ser delimitado com rigor e, Por outro, que 0s aspectos “econdmicos” de um fenémeno nem sao ‘apenas “economicamente condicionados” nem apenas “economicamente cficazes" © que um fendmeno s6 conserva a sua qualidade de “econé- mico” na estrita medida em que 0 nosso interesse esté exclusivamente centrado no seu significado para a luta material pela existéncia A nossa revista, tal como a ciéncia econdmico-social a partir de Marx e Roscher, n130 se ocupa apenas dos fenémenos “econdmicos”, ‘mas também dos “economicamente relevantes” e “economicamente con- dicionados”. Naturalmente, 0 mbito desses objetos — que varia conforme a orientagio do nosso interesse em cada caso — abrange a totalidade dos eventos culturais. Os motivos especificamente econdmicos — isto é, aqueles que, pelas suas particularidades significativas para nds esto ligados a esse fato basico — atuam sempre onde a satisfagdo de uma necessidade, por mais imaterial que seja, envolve a utilizagdo de meios externos limitados. © seu impeto contribui assim, em todo lugar, para determinar ¢ trans- formar ndo s6 a forma da satisfago como também 0 conteido das necessidades culturais, mesmo as de tipo mais intimo. A. influéncia indireta das relagdes sociais, instituigoes e agru- pamentos humanos, submetidos a pressio de interesses “materiais”, estende-se (muitas vezes de modo inconsciente) por todos os dominios da cultura, sem excegdo mesmo dos mais delicados matizes do senti- mento estético e religioso, Tanto os acontecimentos da vida quotidiana como os fendmenos “histéricos” de alta politica, tanto os fenémenos coletivos ou de massa como as agdes “individuais” dos estadistas ou as realizagdes literdrias e artisticas, sofrem a sua influéncia: so “economi- camente condicionados”. Por outro lado, 0 conjunto de todos os fendmenos ¢ condighes de existéncia de uma cultura historicamente dada influi sobre a configu- racio das necessidades materiis, sobre 0 modo de satisfazé-las, sobre a formagao dos grupos de interesses materiais e sobre a natureza dos seus reios de poder, e, por essa via, sobre a natureza do curso do “desenvol- vimento econémico”, tornando-se assim “economicamente relevant Na medida em que a nossa ciéncia, pela regressio causal, atribui causas individuais — de carater econdmico ou nao — a fendmenos culturais econdmicos, ela busca um conhecimento “histGrico”. Na medida em que persegue um elemento especitico dos fenémenos culturais — neste caso 0 elemento econémico — através dos mais variados com- plexos culturais, no intuito de discernir o seu significado cultural, ela busca uma interpretacdo hist6rica sob um ponto de vista especifico. Oferece assim uma imagem parcial, um trabalho preliminar, para o conhecimento histérico completo da cultura. Embora nem sempre que ocorra uma intervengio de elementos econdmicos, sob a forma de causa ou de efeitos, defrontemo-nos com 82 uum problema econdmico-social — pois este apenas se produz onde o significado de tais fatores problemdtico © s6 pode comprovar-se me- iante a aplicagio dos métodos da ciéncia econémico-social — o alcance do dominio de trabalho do modo de consideragéo sécio-econdmico néo deixa de ser quase ilimitado. Com deliberada autolimitagéo a nossa revista sempre renunciou a0 cultivo de uma série de dominios especificos muito importantes da nossa disciplina, tais como a Economia Descritiva, a Histéria da Economia em sentido estrito e a Estatistica. Do mesmo modo, deixou Para outros érgaos 0 estudo dos problemas técnico-financeiros e técnico- -econdmicos da formagio do mercado e dos precos, na moderna economia de troca. A revista tem mantido como campo de trabalho © significado atual © 0 desenvolvimento histérico de determinadas constelagdes de interesses ¢ de conflitos, nascidos na economia dos modernos paises civilizados, com base no papel preponderante que o capital neles desempenhou, em sua busca de valorizagio. Nisso ela ndo se limitou aos problemas priticos e do desenvolvimento histérico da chamada “questio social" em sentido estrito, tais como as relagdes entre a moderna classe dos assalariados a ordem social existente. E claro que o estudo cientifico aprofundado do crescente interesse que este problema teve no nosso pais no decorrer da década de 1880 constituiu forgosamente uma das suas tarefas essenciais, No entanto, & medida que o estudo pritico das condigSes operirias se converteu, também entre nés, em objeto constante da legislagéo ¢ da discussio piblica, o centro de gravidade do trabalho cientifico foi obrigado a deslocar-se no sentido do estabelecimento das relagdes mais univers: de que estes problemas fazem parte, Assim, teve que desembocar na tarefa de analisar todos os problemas culturais modernes criados pela natureza particular dos fundamentos econémicos da nossa cultura € portanto dela especiticos. Deste modo, a revista logo preocupou-se com as mais diversas condigdes de vida em parte “economicamente relevantes” e em parte “cconomicamente condicionadas” das demais grandes classes das mo- dernas nagdes civilizadas, assim como em examinar, sob um ponto de vista hist6rico, estatistico e te6rico, as relagbes entre elas. Assim, apenas deduzimos as conseqiigncias desta atitude quando afirmamos que 0 campo de trabalho caracteristico da nossa revista 6 pesquisa cientfica do significado cultural geral da estrutura sdcio~ 83 -econdmica da vida social humana e das suas formas de organizacio hist6ricas, E precisamente isto, ¢ nfo qualquer outra coisa, o que pretendemos dizer 20 intitular a nossa revista Arquivo para a Ciéncia Social. Este termo abrange aqui o estudo histérico e te6rico dos mesmos problemas cua solucao prética consttui o objeto da “politica social”, no sentido mais lato da palavra. Fazemos uso nisso do direito de utilizar a ex- presstio “social” no significado determinado pelos problemas concretos da atualidade. Quando se dé o nome de “ciéncias da cultura” as disci- plinas que estudam os acontecimentos da vida humana a partir da sua significagao cultural, entio a “ciéncia social", tal como nds a enten dlemos aqui, pertence a esta categoria. Em breve veremos que conse- aiéncias de principio dai decorrem. Nio hé dévida que sublinhar © aspecto econdmico-social da vida cultural constitui uma delimitagao muito sensivel dos nossos temas. Odjetar-se-4 que o ponto de vista econdmico ou, como se diz de modo impreciso, “materilista” a partir do qual consideramos a vida cultural revela-se “parcial”. Certamente, ¢ essa parcialidade & intencional. A renga em que a tarefa do trabalho cienifico consiste em curar es parcialidade da perspectiva econémica mediante a sua ampliagao até uma ciéncia geral do social sofre desde logo do defeito de que 0 ponto de vista do “social” — isto &, 0 das relagées entre os homens — somente possui uma exatido suficiente para delimiter problemas cientificos quando provido de algum predicado especial que determine 0 seu contetido, Do contririo, considerado como objeto de uma ciéncia, abrangeria naturalmente tanto a Filologia como a Hist6ria da Igreja, € fem especial todas as disciplinas que se ocupam do mais importante elemento constitutivo de qualquer vida cultural — 0 Estado — © da mais importante forma de regulamentagio normativa — 0 Direto. Assim como 0 fato de a economia social se ocupar dos fendmenos da vida ou dos fendmenos num corpo celeste nao obrigam a consideri-la como parte da Biologia ou de uma futura Astronomia aperfeigoada, também a circunstincia de tratar de relagées “socisis” nao. constitu: razio para ser considerada como precedente necessério de uma “ciéncia social geral”. © dominio do trabalho cientifico nfo tem por base as conexdes “objetivas” entre as “coisas” mas as conexDes conceituais entre os pro blemas. $6 quando se estuda um novo problema com 0 auxilio de um método novo e se descobrem verdades que abrem novas ¢ importantes perspectivas é que nasce uma nova “cié Nao € por casualidade que 0 conceito de “social”, que parece ter sentido muito geral, adquire, logo que o seu emprego é submetido a um controle, um significado muito particular e especifico, embora geral- mente indefinido. © que nele ha de “geral” deve-se, com efeito, a sua indeterminacio. Porque se encarado no seu significado geral, nfo oferece qualquer ponto de vista especifico a partir do qual se possa iluminar a significado de determinados elementos culturais. Libertos do preconceito obsoleto de que a totalidade dos fendmenos culturais poderia ser deduzida como produto ou como fungao de deter- minadas constelagées de interesses “materiais", cremos no entanto que a anélise dos fendmenos sociais e dos eventos culturais sob a perspectiva especial do seu condicionamento e alcance econémico foi um principio cientifico de fecundidade criadora, e continuard a sé-lo enquanto dele se fizer um uso prudente e livre de inibiges dogméticas. Quanto & chamada “concepgio materialista da Hist6ria", & preciso repeli-la com ‘@ maior firmeza enquanto “concepedo do mundo” ou quando encarada como denominador comum da explicagéo causal da realidade hist6rica — if 0 caltivo de uma interpretagao econdmica da Histéria € um dos fins essenciais da nossa revista. Isso exige uma explicagao mais concreta. Atualmente, @ chamada “concepgio materialista da Histéria”, se- gundo, por exemplo, 0 antigo sentido genial-primitivo do Manifesto Comunista, talvez apenas subsista nas mentes de leigos ou diletantes, Entre esses, com efeito, encontra-se ainda muito difundido o singular fendmeno de que @ sua necessidade de explicagio causal de um fendmeno histérico nao fica satisfeita, enquanto mio se demonstre (mesmo que sé na aparéncia) a intervencdo de causas econémicas. Feito isso, eles passam a contentar-se com as hipéteses mais frageis ‘as formulagdes mais genéricas, pois jé se deu satisfacio 4 sua necessi- dade dogmética segundo a qual as “foreas” econémicas so as tinicas causas “auténticas”, “verdadeiras” e “sempre determinantes em diltima instancia”. Este fenémeno nada tem de extraordindrio. Quase todas as ciéncias, desde a Filologia até Biologia, mostraram, numa ocasiéo ou noutra, a pretensio de produzir nfo s6 0s seus conhecimentos especi ficos, como até “concepgées do mundo”. E, sob o impulso produzido pela enorme significagao cultural das modernas transformagies eco- némicas, ¢ principalmente pelo transcendent alcance da “questio operiiria”, nao € de estranhar que também viesse desembocar neste 85 caminho a inextirpvel tendéncia monista de todo 0 conhecimento refratério & autocritica. Hoje, no momento em que as nagdes se enfrentam, com hostilidade crescente numa luta politica ¢ econdmica pelo dominio do mundo, a citada tendéncia redunda em proveito da Antropologia. E hoje opiniao corrente que, “em iiltima anélise”, 0 decurso hist6rico ndo seria mais que a resultante da rivalidade de “qualidades raciais” inatas. A mera descrigio acritica das “caracteristicas de um povo” foi substituida pela montage, menos critica ainda, de “teorias da sociedade” supostamente baseadas nas “ciéncias da natureza”. Na nossa revista, seguiremos de muito perto o desenvolvimento da investigagéo antropolégica, sempre que se revele importante para os nossos pontos de vista. E de esperar-se que a situagdo em que tomar 1 “raga” como elo final da cadeia causal meramente documentava 0 nosso ndo-saber — como ocorreu, de modo semelhante, em relaclo 20 “ambiente” ou, anteriormente, as’“circunstincias da época” —, possa vir a ser lentamente superada através de um trabalho metodologica- mente fundamentado, Se até este momento houve alguma coisa que tenha prejudicado esta investigacéo, trata-se da idéia de diletantes zlosos, de que poderiam fornecer ao conhecimento de cultura algo de especificamente diferente ¢ mais importante que o simples alargamento da possibiidade de uma atribuiglo segura dos acontecimentos culturais coneretos e individuais da realidade histérica a certas causas concretas, Iistoricamente dadas, mediante a obtengdo de um material de observagao exato com perspectivas especificas. E apenas na medida em que [a Antropologia] possa proporcionar-nos conhecimentos deste tipo que os seus resultados serio suscetiveis de interesse e que a “biologia racial” adquiriré uma importancia superior & de um mero produto da moderna febre de instaurar ciéncias. ‘Algo de semelhante sucede com a importincia da interpretacao econdmica do histérico. Se hoje em dia — apés um perfodo de desme- ida supervalorizaco — quase existe 0 perigo de se subestimar a sua capacidade cientifica, isso nao € mais que a conseqiiéncia da inaudita auséncia de espirito critico relativamente & interpretagio econémica da realidade, concebida como método “universal”, no sentido de uma dedu- ¢40 de conjunto dos fenémenos cutturais — isto é, de tudo o que para nds € essencial neles — a partir de condigdes que em altima instancia seriam econdmicas. Hoje em dia, a forma l6gica sob a qual se apresenta ‘esta interpretagao nao é perfeitamente homogénea. Quando a explicacio uramente econdmica depara com dificuldades, dispOe de varios meios 86 para manter a sua validade geral como fator causal decisivo. Isto é, trata tudo aquilo que na realidade hist6rica nado pode ser deduzido a partir de motivos econémicos como algo que, por isso mesmo, seria idental” e cientificamente insignificante. Ou ento, amplia 0 conceito de economia até o desfigurar, de modo a que nele encontram lugar todos aqueles interesses humanos que, de uma maneira ou de outra, se ligam a meios externos. No caso de existir a prova hist6rica de que, face a duas situagies idénticas sob 0 ponto de vista econémico, houve reagées diferentes — em conseqlincia de diferengas nas determinantes politicas, religiosas, climaticas ou quaisquer outras ndo econémicas —, todos estes fatores so entdo rebaixados a0 nivel de “condigdes” histori camente acidentais, sob as quais os motivos econdmicos atuam como “causas”, tendo em vista preservar a supremacia do econémico, E de entender-se, contudo, que todos esses aspectos “casuais” para fa perspectiva econ6mica seguem as suas proprias leis, no mesmo sentido em que o fazem os aspectos econdmicos, e que, para uma abordagem que persegue o seu significado especifico, as respectivas “condigSes” econdmicas s20 to “historicamente acidentais” quanto na reciproca. Finalmente, uma tentativa muito comum para manter apesar de tudo 0 significado preponderante da economia consiste em interpretar as constantes cooperagées € interagBes dos diferentes elementos da vida cultural como dependendo causal ou funcionalmente uns dos outros, ou melhor ainda, de um nico elemento: 0 econdmico. Deste modo, quando uma determinada instituigo nao econdmica realizou também, historica- mente, uma determinada “funcio” a0 servigo de quaisquer’interesses ‘econdmicos de classe — isto é, quando se converteu em instrumento desta, como no caso de determinadas instituigdes religiosas, que se deixam utilizar como “policia negra” —, essa instituiclo & apresentada como expressamente criada para tal fungdo, ou, em sentido completa- mente metafisico, como tendo sido moldada por uma “tendéncia de desenvolvimento” de carter econdmico, ‘Atualmente, um perito na matéria dispensaré ser informado de que cesta interpretagdo dos fins da anélise econémica da civilizagio era resultante, em parte, de uma determinada conjuntura hist6rica que orientou 6 interesse cientifico para certos problemas culturais economi camente condicionados, ¢, em parte também, de um raivoso apego & especialidade cientifica © de que essa interpretacao esté hoje pelo menos envelhetida. Em nenhum dominio dos fendmenos culturais pode a redugio unicamente a causas econdmicas ser exaustiva, mesmo no caso especifico dos fenémenos “‘econémicos”. 87 Em principio, a histéria bancdria de néo importa que povo que apenas se valesse de motivos econémicos na sua explicagéo é natural- ‘mente tio impossivel como, por exemplo, a “explicagdo” da Madona da Capela Sistina a partir das bases sécio-econémicas da vida cultural a época da sua criagio, ¢ de modo algum mais exaustiva que, por exemplo, a explicagao que fizesse derivar o capitalismo de certas trans- formagées dos conteiidos da consciéncia religiosa que contribuiram para a ginese do espirito capitalist, ou ainda a que interpretasse qualquer configuracio politica a partir de determinados condicionamentos geogré- ficos. Em rodos estes casos, € decisive para a determinagao da impor- tincia a ser concedida aos condicionamentos econémicos a classe de causas que devemos afribuir aqueles elementos especificos do fendmeno em questio que consideramos significativos em cada caso particular. © direito & anélise unilateral da realidade cultural a partir de “perspectivas” especificas — no nosso caso a do seu condicionamento econdmico — resulta desde logo, ¢ em termos puramente metodol6gicos, da circunstincia de que 0 treino da atengio para observar o feito de determinadas categorias causais qualitativamente semelhantes, assim como a constante utlizagao do mesmo aparetho metodol6gico-conceitual, ‘oferece todas as vantagens da divisio do trabalho. Ela nao é arbitréria enquanto o seu éxito falar por ela, isto é enguanto oferecer um conhe- cimento de relagGes que demonstrem ser valiosas para a atribuigdo de causas a determinados acontecimentos hist6ricos coneretos. Mas a “par- cialidade” irrealidade da interpretagio puramente econdmica apenas constituem um caso especial de um principio de validade muito genera Jizada para o conhecimento cientifico da realidade cultural. Todas as subseqiientes discussdes terdo como fim essencial esclarecer as bases logicas e as conseqiiéncias gerais de método do que fica exposto. Nao existe qualquer andlise cientitica puramente “objetiva’” da vida cultural, ou — 0 que pode significar algo mais Iimitado, mas segura- mente nfo essencialmente diverso, para nossos propésitos — dos “fendmenos sociais”, que seja independente de determinadas perspecti- vvas especiais e parciais, gracas as quais estas manifestacées possam ser, explicta ou implicitamente, consciente ou inconscientemente, seleciona~ das, analisadas e organizadas na exposiglo, enquanto objeto de pesquisa. Deve-se iss0 a0 cardter particular do alvo do conhecimento de qualquer trabalho das ciéncias sociais que se proponha it além de um estudo meramente formal das normas — legais ou convencionais — da con- vivéncia social. A ciéncia social que nds pretendemos praticar € uma ciéncia da realidad. Procuramos compreender a realidade da vida que nos rodeia fe na qual nos encontramos situados naquilo que tem de especifico; por um lado, as conexdes € a significagdo cultural das suas diversas mani- festagdes na sua configuracio atual ¢, por outro, as causas pelas quais se desenvolveu historicamente assim € nao de outro modo. Ocorre que, téo logo tentamos tomar consciéncia do modo como se mos apresenta imediatamente vida, verificamos que se nos mani- festa, “dentro” e “fora” de nés, sob uma quase infinita diversidade de eventos que aparccem ¢ desaparecem sucessiva e simultaneamente. E ‘2 Absoluta infinidade dessa diversidade subsiste, sem qualquer atenuante do seu caréter intensivo, mesmo quando prestamos a nossa atencdo, isoladamente, a um ‘nico “objeto” — por exemplo, uma transacao concreta — 'e isso to logo tentamos sequer descrever de forma exaus- fiva essa “singularidade” em todos os seus componentes individuais, © muito mais ainda quando tentamos capté-la naquilo que tem de causal- mente determinado. Assim, todo o conhecimento reflexivo da realidade infinita realizado pelo espirito humano finito baseia-se na premissa tGcita de que apenas um fragmento limitado dessa realidade podera constituir de cada vez 0 objeto da compreensio cientifica, e de que 6 ele sera “essencial” no sentido de “digno de ser conhecido”. E segundo que princfpios se isola esse fragmento? Constantemente se acreditou poder encontrar o critério decisivo, também nas ciéncias da cultura, na repeticao regular, “conforme leis", de determinadas conexdes causais. Segundo esta concepcao, 0 conteiido das “leis” que somos capazes de reconhecer na inesgotivel diversidade do curso dos fendmenos deverd ser o nico fator considerado cientificamente “es- sencial”, Tao logo tenhamos demonstrado a “regularidade” de uma conexio causal, seja mediante uma ampla indugio histérica ou pelo estabelecimento para a experiéncia intima da sua evidéncia imediata- ‘mente intuitiva, admite-se que todos os casos semelhantes — por muito rumerosos que sejam — ficam subordinados 8 férmula assim encon- trada, Tudo aquilo que, na realidade individual, continue a resistir & selegio feita a partir desta “regularidade”, ou é considerado como um remanescente ainda nao claborado cientificamente mas que, mediante aperfeigoamentos continuos, deverd ser integrado no sistema das “leis”, ou € deixado de lado. Ou seja, é considerado “casual” e cientificamente secundério, precisamente porque se revela “ininteligivel face as leis” ¢ io se integra no processo “tipico”, de modo que se tornard objeto de uma “curiosidade ociosa”. Em vista disso, € mesmo entre os representantes da escola histérica, reaparece constantemente a concepcio de que 0 ideal para o qual tende ‘ou pode tender todo o conhecimento, mesmo o das ciéncias da cultura — ainda que seja num futuro longinguo —, consistira num sistema de proposigdes das quais seria possivel “deduzir” a realidade. Sabe-se que lum dos porta-vozes das ciéncias da natureza julgou mesmo poder caracterizar a meta ideal (praticamente inalcangavel) dessa elaboragao da realidade cultural como conhecimento “astronémico” dos fendmenos da vida, Por muito debatida que seja esta questio, no poupamos esforgos para um exame mais detido do tema. Em primeiro lugar, salta A vista que esse conhecimento “astrond- mico” em que se pens no caso citado, néo é de modo algum um conhecimento de leis, mas pelo contrério extrai de outras disciplinas, como a mecinica, as “leis” com as quais trabalha, & maneira de premissas. Quanto & propria Astronomia, interessa-lhe saber qual o efeito individual produzido pela agéo dessas leis sobre uma constelagao individual, dado que essas constelagbes tém importdncia para nés. Como € natural, toda a constelagio individual que a Astronomia nos “explica” ou prediz 56 poderé ser causalmente explicdvel como uma conseqiiéncia de outra constelagio, igualmente individual, que @ precede. E, por muito que recuemos na obscuridade do mais longinquo pasado, a realidade para a qual tais leis so vélidas permanece também individual ¢ igualmente refratéria a wma deducao a partir de les. Compreende-se que um “estado original” c6smico que néo pos- suisse um caréter individual, ou que o tivesse em menor grau que a realidade césmica atual, seria evidentemente um pensamento sem qualquer sentido. No entanto, nao sobrevive na nossa especialidade lum resto de representagées semelhantes, quando se supdem “estados primitivos” sécio-econémicos sem qualquer “‘casualidade” hist6rica, quer inferidos do Direito natural, quer verificados mediante a observacio dos “povos primitives"? E 0 caso, por exemplo, do “comunismo agré- rio primitive”, da “promiscuidade sexual”, etc., dos quais nasceria, mediante uma espécie de “queda pecaminosa” no concreto, 0 desen- volvimento histérico individual. Nao hé qualquer diivida de que 0 ponto de partida do interesse pelas ciéncias sociais reside na configuragio real ¢ portanto individual da vida sécio-cultural que nos rodeia, quando queremos apreendé-la no seu contexto universal, nem por isso menos individual, e no seu desen- volvimento a partir de outros estados sécio-culturais, naturalmente 30 individuais também. Torna-s ide aT ee” Saas 2% ee Sap) os Iégicos também utilizam regularmente), e até de modo especificamente acentuado. Enquanto que no Od oe ee ae Sout ohare dans mca ae Sea og eae eae oan 4 primeira vista poderiam parecer. sas ni Segéricas como Salvo 0 caso da meca: és frp canton no tn st gee gt Eom gan Slt, Soci Caen & quanttiagto © portanto, cognoscivel mediante “leis”. Por tltimo, ependeria da definicho mais ou menos ita do conceito de “Ii” que teen ce ec ose sio numérica, devido ao fato de nao serem quantificdveis, " No que respeita expeciaimente & > iamente intervengfo de motvos “esp tuais", esta de modo algum exclui o estabelecimento de regras nae ua tgio acon Mu, sabe, sire que an hoje a despre comptionente «opto de gue € ea Un Peon lcmpear, pn os des “etc 6 Spo, an papel compe rie 4 das ates para sp sensas Ge ner, Pa ae ia decompor os complicados fenémenos da vida social nas "sans ges © etn pics, rules fre Tigos mus Simples poses, ¢enfim classifica ete mos por pbvene e el ss tua ates funciona. Aim, terse comepio Cy lo uma “mecanica”, pelo menos - ia nas suas ake ; uma “uimica” da vida social he bese pias" oy abe deci ala tus es por sigue ver combi com relay. partes que jum talons si lt a a Si re. No tt feta lo algum a possibilidade de se atir a " conkecimentosécio-econdmico, tal como 0 entendemos set -- "es o conecinento da retidade covert segundo 0 seu guido clara as sues relagSes de causa — mediante buses ds repetone veal 1 Supondo que alguma vez, quer mediante a Psicologia, quer de qualquer outro modo, se conseguisse decompor em fatores iltimos € Simples todas as conexdes causais imagindveis da coexisténcia humana, tanto as que j@ foram observadas como as que um dia seré possivel fstabelecer, ese conseguisse abrangé-las de modo exaustive numa imensa casuistica de conceitos ¢ regras com a validade rigorosa de leis, que significaria esse resultado para 0 conhecimento, quer do mundo Ghltural historicamente dado, quer de algum fendmeno particular, como © do capitalismo na sua evolugao e no seu significado cultural? Como meio de conhecimento, no significa nem mais nem menos que aquilo {que um dicionério das combinacées da Quimica Organica significa para © conhecimento biogenético dos reinos animal e vegetal. Tanto num caso como noutro, ter-se-4 realizado um importante ¢ tit trabalho preliminar. Todavia, e tanto num caso como noutro, tomar-se-ia impossivel chegar alguma vez. a deduzir a realidade da vida 2 partir destas “leis” “fatores”. Nao porque subsistssem ainda, hos fendmenos vitais, determinadas “orcas” superiores ¢ misteriosas (dominantes", “enteléquias” ou outras) — 0 que jé constitui outro problema — mas simplesmente porque, para 0 conhecimento da reali- Gade apenas nos interessa a constelago em que esses “fatores” (hipoté- ticos) ‘se agrupam, formando um fendmeno cultural historicamente Significativo para nés, e também porque, se pretendemos “explicar ‘Causalmente” esses agrupamentos individuais, teriamos que nos reportar Constantemente a outros agrupamentos igualmente individuais, a partir dos quais os “explicariamos”, embora utilizando naturalmente 0s citados (hipotéticos) coneeitos denominados “leis”. ‘Assim, 0 estabelecimento de tais “leis” © “fatores” (hipotéticos) apenas constituiria, para n6s, a primeira de vérias operagdes as quais © conhecimento a que aspiramos nos conduziria. A segunda operacéo, Completamente nova ¢ independente apesar de se basear nessa tarefa preliminar, seria a andlise e a exposigéo ordenada do agrupamento Individual desses “fatores” historicamente dados ¢ da sua combinagdo concreta ¢ significativa, dele resultante; mas, acima de tudo, consistiria fem fornar inteligivel a causa ¢ a natureza dessa significagao. A terceira ‘operago seria remontar o mais possivel no passado, ¢ observar como Se desenvolveram as diferentes caracteristicas individuais dos agrupa- mentos de importncia para o presente, € proporcionar uma explicagio hist6rica a partir destas constelagées anteriores, igualmente individuais, Por iiltimo, uma possivel quarta operacéo consistiria na avaliagéo das constelagdes possiveis no futuro. 92 Para todas estas finalidades seria muito til, quase indispensével, 4 existéncia de conceitos claros e conhecimento destas (hipotéticas) eis", como meios heuristicos mas unicamente como tal, Mas mesmo com esta fungio, existe wm ponto decisive que demonstra 0 limite do seu alcance, com 0 que somos conduzidos a peculiaridade decisiva do método nas ciéncias da cultura; ou seja, nas disciplinas que aspiram a conhecer os fendmenos da vida segundo a sua significacao cultural, A significacdo da configuracao de um fenémeno cultural e a causa dessa significagao néo podem contudo deduzir-se de qualquer sistema de onceitos de leis, por muito perfeito que seja, como também néo podem ser justificados nem explicados por ele, dado que pressupéem a relagéo dos fenémenos culturais com idéias de valor. © conceito de cultura é um conceito de valor. A realidade empirica € “cultura” para nés porque ¢ na medida em que a relacionamos a idéias de valor, Ela abrange aqueles © somente aqueles componentes da realidade que através desta relagao tornam-se significativos para nés. Uma parcela infima da realidade individual que observamos em cada caso & matizada pela a¢do do nosso interesse condicionado por essas {déias de valor, somente ela tem significado para nés precisamente Porque revela relagdes tomnadas importantes gracas sua vinculagéo a idéias de valor. somente por isso, ¢ na medida em que isso ocorre, que nos interessa conhecer a sua caracteristica individual, Entretanto, © que para nos se reveste de significagdo no poderé ser deduzido de uum estudo “isento de pressupostos” do empiricamente dado; pelo con- trério, € a comprovacéo desta significagdo que constitui a premissa para que algo se converta em objeto da analise. Naturalmente, o significativo, como tal, nao coincide com qualquer lei como tal, e isto tanto menos quanto mais geral for a validade dessa Ici. Porque a significagdo que para nés tem um fragmento da realidade ndo se encontra evidentemente nas relagdes que compartilha com 0 maior niimero possivel de outros elementos. A relagéo da realidade com idéias de valor que Ihe conferem uma significagdo, assim como o sublinhar © ordenar os elementos do real matizados por esta relagéo Sob o ponto de vista de sua significagdo cultural, constituem perspectivas completamente diferentes e distintas da andlise da realidade levada a cabo para conhecer as suas leis e a ordenar segundo conceitos ger Ambas as modalidades de pensamento ordenador do real néo mantém entre si qualquer relagéo légica necesséria, Podera suceder que, num ‘caso conereto, venham alguma vez a coincidir; mas, se essa coincidéncia casual nos ocultar a sua discrepincia de princtpio, isso poderé acarretar as mais funestas conseqiiéncias. AA significagdo cultural de um fendmeno — por exemplo 0 do coméreio monetério — pode consistir no fato de se manifestar como fendmeno de massa, um dos elementos fundamentals da civilizacio coniemporinea. Mas, ato continuo, o fato histérico de desempenhar esse papel € que constitui o que deverd ser compreendido sob 0 ponto de vista da sua significacdo cultural, ¢ explicado causalmente sob a perspectiva da sua origem histérica, ‘A andlise da esséncia geral da troca e da técnica do trafico comer- cial constituem uma tarefa preliminar, muito embora extremamente importante ¢ indispensivel. Mas ndo fica assim resolvida a questfo de como a troca chegou historicamente a aleancar a fundamental signi- ficagdo que hoje possui; nem a que, em ultima anélise, nos interessa: ‘qual a significagdo cultural da economia monetaria, Pois € por ela que hos interessamos pela descrigio da técnica de circulagio, e por ela também que existe hoje uma ciéncia que trata dessa técnica. De qual- quer modo, nao se deduz de nenhuma dessas “leis”. As caracteristicas genéricas da troca, da compra etc. interessam a0 jurista. Mas 0 que nds interessa é a tarefa de analisar a significacdo cultural do fato histérico de a t1oca consttuir, hoje, um fenémeno de massa. Quando esse fato deve ser explicado, quando pretendemos compreender a diferenca entre a nossa civilizagao s6cio-econdmica ¢ a da Antiguidade — onde a troca apresentava exatamente as mesmas qualidades genéricas {que hoje —, quando queremos saber em que consiste a significagdo da “economia monetéria”, surgem entio na andlise princfpios l6gicos de crigem claramente heterogénea. Por certo que, enquanto contenham. ‘elementos significativos da nossa cultura, ulllizaremos os conceitos que 4 andlise dos elementos genéricos dos fendmenos econdmicos de massa nos oferece como mefos de exposicio. Mas, por muito exata que seja 4 distingdo desses conceitos e leis, no s6 no teremos alcangado 0 ‘alvo da nossa tarefa, como a questo sobre qual deve ser 0 objeto da formagao de conceitos genéricos no ficard “livre de pressupostos”, dado que foi decidida em funcio da significado que possuem, para a cultura, determinados elementos dessa multiplicidade infinita que el Aspiramos 20 conhecimento de um fendmeno histérico, isto é significarivo na sua especificidade. E 0 que aqui existe de decisivo & fato de s6 adquirie sentido Iégico a idéia de um conhecimento dos fendmenos individuais mediante a premissa de que apenas uma parte 94 finita da infinita diversidade de fendmenos é significativa. Mesmo com © mais amplo conhecimento de todas as “leis do devir ficarfamos per- plexos ante 0 problema de como é possivel em geral a explicagdo causal de um fato individual, posto que nem sequer se pode pensar a mera descricdo exaustiva do mais infimo fragmento da realidade. Pois o niimero € a natureza das causas que determinaram qualquer aconteci- ‘mento individual sio sempre infinitos, e no existe nas proprias coisas critério algum que permita escolher dentre elas uma fracdo que possa entrar isoladamente em linha de conta, A tentativa de um conheci- mento da realidade “livre de pressupostos” apenas conseguiria produzit uum caos de “jufzos existenciais” acerca de inimeras percepgdes parti- culares. E mesmo este resultado s6 na aparéncia seria possivel, j4 que a realidade de cada uma das percepdes, expostas a uma anilise detalhada, oferece um sem-ndmero de elementos particulares, que nunca poderdo ser expressos de modo exaustivo nos juizos de percepcio. Este caos s6 pode ser ordenado pela circunstincia de que, em qualquer caso, unicamente um segmento da realidade individual possui interesse € significado para nés, posto que s6 ele se encontra em relagao com as idéias de valor culturais com que abordamos a realidade. Por. tanto, s6 alguns aspectos dos fenémenos particulares infinitamente diver- 0s, © precisamente aqueles a que conferimos uma significacdo geral Para a cultura, merecem ser conhecidos, pois apenas eles sio objeto da explicagdo causal. Também esta explicagio causal oferece, por sua vez, © mesmo caréter, pois uma regressiio causal exaustiva a partir de qual. quer fendmeno conereto para captar a sua plena realidade nao s6 resulta Praticamente impossivel, como & pura e simplesmente um absurdo Apenas pomios em relevo as causas a que se podem atribuir, num caso concreto, os elementos “essenciais” de um acontecimento, Quando se trata da individualidade de um fendmeno, o problema da causalidade no incide sobre as leis, mas sobre conexdes causais concretas; nao se trata de saber a que férmula se deve subordinar 0 fendmeno a titulo de exemplar, mas sim a que constelacéo deve ser imputado como resultado, Trata-se, portanto, de um problema de imputagao. Onde Quer que se trate de explicagao causal de um “fenémeno cultural” — ou de uma “individualidade histérica”, expressio ja utilizada relativa- mente & metodologia da nossa disciplina, e agora habitual na Idgica, com uma formulagio mais precisa —, 0 conhecimento das leis da causalidade nao poderé constituir o fim mas antes 0 meio do estudo. Ele facilita © possibilita a imputacao causal dos elementos dos fend. ‘menos, tornados importantes para a cultura pela sua individualidade, 95 As suas causas concretas. E apenas na medida em que presta esse servico que poderé ter valor para o conhecimento das conexdes individuais. E quanto mais “gerais”, isto é, abstratas, sdo as leis, menos contribuem para as necessidades da imputacao causal dos fenémenos individuais e, indiretamente, para a compreensio da significagdo dos acontecimentos culturais. Que se conclui de tudo isto? De modo algum que, no campo das ciéncias da cultura, o conhe- cimento do geral, a formacéo de conceitos genéricos abstratos, 0 co- nhecimento de regularidades e a tentativa de formulagio de relagoes ‘egulares” no tenham uma justificagdo cientifica. Muito pelo con- sal do historiador consiste numa imputagao de certos resultados concretos determinadas causas concretas, ento & impossivel uma imputagdo valida de qualquer resultado individual sem a utilizagio de um conhecimento “nomolégico” — isto é, do conhecimento das regularidades das conexdes causais. Para saber se a um elemento individual e singular de uma conexio cabe atribuir, na realidade, uma importincia causal para o resultado que se trata de explicar causalmente, apenas existe a possbilidade de proceder & avalia~ ‘gio das influéncias que nos habituamos a esperar geralmente tanto deste como de outros elementos do mesmo complexo que sejam pertinentes explicagao. Essas influéncias constituem, por conseguinte, os efeitos ‘adequados” dos elementos causais em questio. Saber até que ponto o historiador (no sentido mais lato da palavra) 6 capaz de realizar com seguranga esta imputagio, com 0 auxilio da sua imaginagio metodicamente educada ¢ alimentada pela sua expe- rigncia pessoal da vida, e até que ponto estard dependente do auxilio de determinadas ciéncias especializadas postas a0 seu alcance, & algo que depende de cada caso particular. Mas em qualquer caso, e portanto também no campo dos fenmenes econdmics complexon a sguranca Ja imputagéo € tanto maior quanto mais seguro e amplo for 0 nosso iminuido pelo fato de que nunca, mesmo nas chamadas “leis econd- micas”, se trata de conexses “regulares” no sentido estrito das ciéncias da natureza, mas sim de conexdes causais adequadas, expressas em regras, © portanto de uma aplicagio da categoria da “possibilidade jbjetiva”, que nao analisaremos aqui com mais pormenores. Ocorte que 0 estabelecimento de tais regularidades ndo € a finalidade, mas sim tum meio do conhecimento, E quanto a saber se tem sentido formular a sua extensdo —, tanto mais nos afasta da riqueza da realidade, posto De tudo 0 que até aqui se disse resulta que carece de razio de ser tm estudo “objetivo” dos aeontecimentos culture, mo senido ee ae 9 fim ideal do trabalho ‘ientiico deveria comsistt nun. selueio as tealidade empiricn certs leis. Carece de razio de ser; nto ponee como freqitentemente se. sustentou ~~ os acontecimentos cabense ‘se Se quiser, os fendmenos espirituais evoluam “objetivar ” ia menos sujeito a leis, mas: m Dovistvamente” de modo 4) porque 0 conhesimento de leis soeisis ni é isis ndo & um conheciment do socialmente real, mas unieamente um dos diversos meise means ue © nosso peasamento utiliza para ese efi, 6 >) porque nenhum conhecimento dos acont act) and ‘ in Jos acontecimentos culturais Foderd ser concebido senio com base na significacdo que a realidade la vida, sempre configurada de modo individual, possui para nés em determinadas relagdes singulares. Nao existe qualquer lei que nos most ‘a nos mostre em que sentido e em que condigées isso sucede, pois 0 decisivo sio as iddlat de valor prises {ob o qual consideramos a “cultura” em cada caso. A"cultucd” eon segmento finito do decurso infnito e destituido de senile opto de undo, a que o pensamento conferiu — do ponte de vista Jo mney — um sentido ¢ ume significagio, E contiaus a sr ssi’ meow Pan quem se ope a uma cultura conereia como inimigo inplacael ¢ orc Goniza o “rereso 8 natura". Pols apenas pode aotar ea posto awando compara esta cultura coneeta x suas propre ides de val afigurando-se-the aquela como “demasiado superficial”. Referime-nos Precsamente a eva cirnstncia puramente lopca e Torta, anda irmamos que todo 0 individuo historeo esta arrignder demas logicamente necessério, em “idéias de valor”, : 97 ‘A premissa transcendental de qualquer ciéncia da cultura reside, nao no fato de considerarmos valiosa uma “cultura” determinada ou qualquer, mas sim na circunstancia de sermos homens de cultura, dota dos da capacidade e da vontade de assumirmos uma posi¢do consciente face ao mundo, ¢ de Ihe conferirmos um sentido. Qualquer que seja este sentido, influiré para que, no decurso da nossa vida, extraiamos dele rnossas avaliagdes de determinados fenémenos da convivéncia humana ¢ assumamos perante eles, considerados significativos, uma posicdo (posi- tiva ou negativa). Qualquer que seja 0 contesdo dessa tomada de posiglo, estes fendmenos possuem para nés uma significagdo cultural, que constitui a base tinica do seu interesse cientifico. Por conseguinte, quando utilizamos aqui a terminologia dos légicos moderos [Rickert] ¢ dizemos que o conhecimento cultural é condicio- nado por determinadas idéias de valor, esperamos que isso nao seja suscetivel de mal-entendidos tio grosseiros como a opinido de que apenas se deve atribuir significacao cultural aos fenémenos valiosos. Pois tanto a prostituicdo como a religiéo ou o dinheiro so fenémenos culturais. E todos trés o so, tinica e exclusivamente, enquanto a sua existéncia e a forma que historicamente adotam correspondem direta ou indiretamente aos nossos interesses culturais, enquanto animam 0 nosso desejo de conhecimento a partir de pontos de vista derivados das idéias de valor, as quais tornam significativo para nds o fragmento de realidade expresso naqueles conceitos, Disso resulta que todo o conhecimento da realidade cultural sempre um conhecimento subordinado a pontos de vista especificamente particulares. Quando exigimos do historiador ou do sociélogo a premissa elementar de saber distinguir entre 0 essencial e 0 secundério, de possuir para esse fim 0s “pontos de vista” necessérios, queremos unicamente dizer que ele deverd saber referir — consciente ou inconscientemente — os elementos da realidade 2 “valores culturais” universais e destacar aquelas conexdes que para nés se revista de significado. E se & fre- qiiente a opinido de que tais pontos de vista poderéo ser “deduzidos da propria matéria”, isto apenas se deve & ingénua ilusio do especialista que nao se dé conta de que — desde 0 inicio ¢ em virtude das idéias de valor com que inconscientemente abordou o tema — destacou da imensidade absoluta um fragmento infimo, ¢ particularmente aquele cujo exame Ihe importa, ‘A propésito desta selecdo de “aspectos” especiais © individuais do devir, que sempre ¢ em todos os casos se realiza consciente ou inconscientemente, reina também essa concepcio do trabalho cientifico Gqullural que constitui a base da téo repetida afitmacao de que o clemento “pessoal” & 0 que verdadeiramente confere valor a uma obte clentifica, Ou seja, de que qualquer obra deveria exprimir uma “perso nalidade” paralelamente a outras qualidades, Por certo que sem as idéias de valor do investigador no existiia qualquer principio de seleeo nem conhecimento sensato do rea singular © assim como sem a renga do pesquisador na significagdo de um com, fetido cultural qualquer resultaria completamente desprovido de sentido todo © estudo do conhecimento da realidade individual, também grientagio da sua conviesao pessoal e a difragao dos valores no espetho da sua alma conferem ao seu trabalho uma direcio. Eos valores © que © génio ciemttico refere os objetos da. sua investigagao pouerac determinar a “concepgao” que se fard de toda uma época. Ista nag 36 poderio ser decisives para aquilo que, nos fenomenos, se conciders ‘vallosos”, mas ainds para o que passa por ser significativo ou insigni= ficante, “importante” ou “secundario™ © conhecimento cientifico-cultural tal como o entendemos encon- tta-se preso, portanto, a premissas “subjetivas” pelo fato de apenas ee ccupar daqueles elementos da realidade que apresentem alguma relaglo, Por muito indizeta que seja, com os acontecimentos a que conferimes uma significagdo cultural. Apesar disso, continua naturalmente a ser um conhecimento puramente causal, exatamente como o conhecimento de eventos naturais individuais importantes, que tém cariter qualitativo, Paralelamente 3s numerosas confuses originadas pelo imiscuir do Pensamento juridico formalista na esfera das ciéncias culturais, surgiu Fecentemente [em obra do jurista R. Stammler), entre outras, a tentativa de “refutar” a “concepgdo materialista da Histéria” através de uma série dle engenhosos sofismas. Para tanto argumenta-se que, dado que toda a vida econdmica deveria evoluir dentro de determinadas jormas reguladas de modo legal ou convencional, qualquer “evolucao” econdmica deveria adotar 0 aspecto de aspiragdes para a criagio de novas formas juridicas, Isto ¢, que apenas poderia ser compreensivel a partir de certas méximas morais, ¢ seria por isso diferente, em esséncia, de qualquer “evolugao natural”. © conhecimento da evolugao econémica teria assim um carster “teleoldgico”. ‘Sem querermos discutir aqui o significado ambiguo que 0 conceito de “evolucéo” comporta nas cincias socisis, nem o conceito igualmente 99 cabe deixar assente ambiguo, do ponto de vista I6gico, de “teleolégico”, oe scononsa 3 fi tal como pressupde 100 Por outro, Por outras palavras: apenas as idéias de valor que dominam © investigador e uma época podem determinar o objeto do estuio ¢ os limites desse estudo. No que se refere ao mérodo da investigacao — 0 “como” — € o ponto de vista dominante que determina a formagao dos conceitos auxiliares de que se utiliza; e quanto ao modo de utilizé-los, © investigador encontra-se evidentemente ligado as normas de nosso pensamento. Porque sé é uma verdade cientifica aquilo que pretende ser vélido para todos os que querem a verdade. Ora, daqui se deduz a total insensatez da crenga, que por vezes encontramos mesmo entre historiadores da nossa especialidade, segundo a qual 0 alvo das ciéncias da cultura poderia ser a elaboracdo de um sistema fechado de conceitos, que de um modo ou de outro sintetizaria a realidade mediante uma articulagdo definitiva, a partir da qual se poderia de novo deduzi-la © fluxo do devir incomensuravel flui incessantemente ao encontro da eternidade, Os problemas culturais que fazem mover a humanidade renascem a cada instante e sob um aspecto diferente e permanece variével © imbito daquilo que, no fluxo eternamente infinito do individual, ‘adquire para nés importancia e significagao, e se converte em “indi dualidade histérica”. Mudam também as relagdes intelectuais sob as quais so estudados e cientificamente compreendidos, Por conseguinte, 5 pontos de partida das ciéncias da cultura continuaréo a ser varidveis no imenso futuro, enquanto uma espécie de imobilidade chinesa da vida espiritual nao desacostumar a humanidade de fazer perguntas A sempre inesgotavel vida, ‘Um sistema das ciéncias culturais, embora s6 0 fosse no sentido de uma fixagio definitiva, objetivamente valida e sistematizadora das quesides e dos campos dos quais se espera que tratem seria um absurdo em si. Uma tentativa deste tipo poder apenas rematar por uma justa- posigdo de diferentes pontos de vista, especificamente particulares, & Imuitas vezes heterogéneos e dispares entre si, sob os quais a realidade tem sido € permanecerd para nés “cultura”, isto é, significativa na stia particularidade, Apés essas prolongadas discusses podemos finalmente dedicar-nos questo que nos interessa metodologicamente a propésito do estudo da “objetividade” do conhecimento nas ciéneias da cultura. Qual ¢ a fungao Idgica e a estrutura dos conceitos com os quais trabalha a nossa ‘cia, A semelhanga de qualquer outra? Ou, para o dizer de outro modo ¢ em fungio do problema decisive: Qual a significagio da teoria Bev, \ tot ¢ da formacdo teérica dos conceitos para o conhecimento da realidade cultural? Como ja vimos, a economia politica tinha sido originalmente uma “técnica”, pelo menos no que se refere ao niicleo dos seus estudos. Isto 6 considerava os fendmenos da realidade sob uma perspectiva pratica de valor, estével e univoca pelo menos na aparéncia: a da perspectiva do crescimento da “riqueza” da populagao num pais. Por outro lad desde 0 inicio que a Economia Politica néo era apenas uma “técnica”, dado que se incorporou a poderosa unidade da concepcio do mundo do século XVIII, de caréter racionalista e orientada pelo Direito natural. Mas a particularidade dessa concepgao do mundo, com a sua fé otimista na racionalizacao te6rica e pratica do real, comportou um efeito essen- cial, ao evitar que fosse descoberto o carster problematico da perspectiva que cla pressupunha ser evidente. Do mesmo modo que o estudo racional da realidade social havia nascido em estreita relagio com a evolugdo moderna das ciéncias da natureza, assim também’ continuou semelhante a elas no modo de encarar o seu objeto. Ora desde 0 inicio que, nas disciplinas das ciéncias da natureza, a perspectiva pritica de valor relativa a0 que € diretamente stil tecnica ‘mente se encontrava em estreita relagao com a esperanca — herdada da Antiguidade e desenvolvida posteriormente — de que, pelo caminho generalizador da abstracdo e da anélise do empirico orientadas para as relagées legais, seria possivel chegar a um conhecimento puramente “objetivo” — isso significa, aqui, um conhecimento desligado de todos 1s valores — ¢ a0 mesmo tempo absolutamente racional — ou seja, um conhecimento monista {fundado num principio tinico] de toda a realidade e livre de qualquer “contingéncia” individual, sob 0 aspecto de um sistema conceitual de vatidade metatisica e forma matemética. As disciplinas das ciéncias da natureza que se encontram ligadas @ pontos de vista axiol6gicos, tais como a Medicina clinica, e, mais ainda, a chamada “Tecnologia”, converteram-se em puras “artes” praticas. Desde o principio que estavam determinados os valores que deveriam servir: a sade do paciente, 0 aperfeicoamento téenico de um processo de produgio etc. Os meios a que recorreram eram, ¢ s6 podiam ser, fa aplicagao prética dos conceitos de lei descobertos pelas disciplinas teéricas. Qualquer progresso de principio na formacéo das leis era também, e podia sé-lo, um progeesso na disciplina prética. Porque, quando 0s fins permanecem inalterdveis, a redu¢do progressiva de ques- tes préticas (um caso de doenga, um problema técnico) a leis de validade geral ea conseqiiente ampliagio do conhecimento.te6rico g) 102 ligam-se & ampliagao das possibil jenicas ¢ priticas © se i ligam-se & ampliacdo das possibilidades téenicas e préticas e se idemtitica Quando a Biologia moderna conseguiu englobar igualmente os elementos da realidade que nos interessam historicamente (pelo fato de haverem ocorrido precisamente assim ¢ no de qualquer outro modo) dentro do conccito de um principio de evolugao de validade geral, que pelo menos na aparéncia — mas no na realidade — permitia ordenar todo 0 essencial daqueles objetos dentro de um esquema de leis com validade geral, dir-se-ia que, sobre todas as ciéncias, pairava ameaga- doramente o creptisculo dos deuses de todas as perspectivas axiolégicas. Dado que também o chamado devir hist6rico era um fragmento da realidade total, © que o principio de causalidade — premissa de qualquer ‘trabalho cientifico — parecia exigir a redugéo de todo o devi a “leis” de validade geral, e dado também o descomunal éxito das ciéncias da natureza, que haviam incorporado esse principio, parecia impossivel conceber um trabalho cientifico que nao fosse 0 da descoberta de leis do devir em geral. O elemento cientifico essencial dos fendmenos apenas Podia ser constituido pelo aspecto “legal”, enquanto que os “aconte- cimentos individuais” s6 podiam levar-se em linha de conta como ‘ipos”, 0 que significa, aqui, como representantes ilustrativos das leis. © interesse por eles préprios e enquanto tais néo era considerado um imteresse “‘cientiic Toma-e impossivel pormenorizar aqui as importantes repercusdes deste estado. de esto eho. de confange do, mona patraina sobre asdsiplinas econdmiea Quando erica soilia'eo watalha dor histriadores comesaram a trasformar em problemas as poneee tvas aiolipcas originals, a poderosn evoluto damvestiqagde beloes por um lado, ea in uencia do panlogsm fdovtrinn resto waives el hegsino, por euto,impediram que a Economia Poles reemheree com precio fodaa amplitude Ja telagio ente 0 concelto a reldooe © resultado disso, no que nos interessa aqui, é que, apesar do formidavel dique erguido pela filosofia idealista alema desde Fichte, pelos sucessos da escola histérica do Direito e pelos trabalhos da escola Historica alema da Economia Politica contra a infiltracdo dos dogmas naturalistas, no foram ainda superados, em determinados aspectos decisivos, os pontos de vista do naturalismo, e, em parte, essa situagdo ocorre por causa desse esforco. Entre eles, cabe citar a relagao, ainda Problemética, que na nossa disciplina existe entre o trabalho “teérico” € 0 “hist6rico”. 103 Ainda hoje 0 método te6rico ¢ “abstrato” se opde de maneira direta € aparentemente incontorndvel & investigac3o hist6rico-empirica. Ele reconhece com toda a exatidio a impossibilidade metodoldgica de substituir 0 conhecimento hist6rico da realidade pela formulago de “leis”, ou de, pelo contrétio, chegar ao estabelecimento das “leis”, no sentido estrito do termo mediante a mera justaposigio de observagdes historicas, Para conseguir estabelecé-las — pois esta convencido de {que esse é 0 fim supremo da Ciéncia — parte do fato de que experimen- ‘tamos constantemente as relagdes da atividade humana na sua realidade imediata, Em face disso, julga poder tornar esse curso dos eventos diretamente inteligivel com evidéncia axiomética ¢ assim exploré-los nas suas “leis”. A tinica forma exata do conhecimento, a formulagio de leis imediata ¢ intuitivamente evidentes, seria a0 mesmo tempo a tinica ‘que nos permitiria deduzir os acontecimentos nao diretamente observa veis. Conseqiientemente, o estabelecimento de um sistema de proposi- des abstratas e puramente formais, por analogia com as proposigdes das ciéncias exatas, seria 0 tnico meio de dominar intelectualmente fa diversidade social, pelo menos no que se refere aos fendmenos fundamentais da vida econémica. Apesar de ter sido 0 criador desta teoria [H. Gossen, precursor da teoria marginalista na Economia, em 1854] © primeiro e tinico a cfetuar uma distingéo metodolégica de principio entre 0 conhecimento legal e 0 hist6rico, atribuiu uma validade empirica as proposigies da teoria abstrata, no sentido de uma possibilidade de deducao da realidade fa partir destas “leis”. B certo que o nfo fazia no sentido da validade empfrica das proposigées econémicas abstratas por elas préprias, mas sim no sentido de, uma vez alcancadas teorias “exatas” correspondentes fa todos 0s outros elementos que entram em linha de conta, dever 0 conjunto de todas estas teorias abstratas conter a verdadeira realidade das coisas, isto é, tudo aquilo que, da realidade, fosse digno de ser conhecido. A teoria exata da Economia estabeleceria a influéncia de um motivo psicolégico, enquanto que outras teorias teriam como tarefa desenvolver analogamente todos os restantes motives num conjunto de proposigies de validade hipotética. Fm relagio com o resultado do trabalho tedrico — isto 6, das teorias abstratas da formagao dos pregos, dos juros, dos rendimentos etc. — houve quem divagasse que, numa suposta analogia com as pro- posigdes da Fisica, seria possivel empregé-las para deduzir de premissas reais dadas, resultados quantitativamente determinados — portanto leis em sentido estrito — com validade para a realidade da vida, posto que 104 face a fins dados, a economia humana ficaria claramente “ os mesmo falar por comple, dos fim de formar um quatio homogénco de peruano, ornace pureca conceit, po ates de ma mopia, A adage Heston Fee detrontse com a taf Je dtemint em cade oso paren ® protmidade on statment ene a reldade ¢ 9 quad Weal om ave medida potato cater ccondmio das condihet Je determina cide. poderd ser quliicado. como economia bana” em nnlo conceit Ora, devde que ciidadosamenteaplcnd esse conc campre as fugiesexpecias qu del se esperam, ea Benel.da invenigngio © da representas, manifeste, Além disso, pode-se tentar delinear uma ra qual encontrem dominados por maxima: a plicagdes 107 indistria, obtido a partir da abstragéo de determinados tragos da grande indistria moderna para, com base nisso, tentar-se tragar @ utopia de ‘uma cultura “capitalist”, isto 6, dominada unicamente pelo interesse de valorizagio dos capitais privados. Ela acentuaria diferentes tragos difusos da vida cultural, material ¢ espiritual modema, ¢ os reuniria num quadro ideal nao contraditério para efeitos da nossa investigacao. Este quadro constituiria entio uma tentativa de tragar uma “idéia” da cultura capitaista — quanto a saber se isso € possivel, e como, nao seré tratado agora. corre que € possivel, e deve mesmo considerar-se como certo, formular muitas e mesmo iniimeras utopias deste tipo, das quais ne- ‘nhuma se pareceria com outra, das quais nenhuma poderia ser observada ha realidade empirica como ordem realmente vélida numa sociedade, mas cada uma das quais pretenderia ser uma representacto da “idéia” da cultura capitalista, ¢ cada uma das quais poderia realmente pretender, nna medida em que selecionou certas caracteristicas da nossa cultura significativas na sua especificidade, reuni-las num quadro ideal homo- géneo. Pois os fenémenos que nos iteressam como manifestagdes ulturais derivam regra geral 0 seu interesse — a sua significardo cultural — de idéias de valor muito diferentes, com as quais podemos relacioné-las, Do mesmo modo que existem os mais diferentes “pontos de vista", @ partir dos quais podemos considerar como significativos os fendmenos citados, pode igualmente fazer-se uso dos mais diferentes principios de selegdo para as relagées suscetiveis de serem integradas no tipo ideal de uma determinada cultura, Qual & em face disso, a significagdo desses conceitos de tipo ideal para uma ciéncia empirica, tal como nés pretendemos praticé-la? Que- femos sublinhar desde logo a necessidade de que os quadros de pensa- mento que aqui tratamos, “ideais” em sentido puramente ldgico, sejam rigorosamente separados da nogio do dever ser, do “exemplar”. Trata-se da construgdo de relages que parecem suficientemente motivadas para nossa imaginagdo e, consegiientemente, “objetivamente possive que parecem adequadas a0 nosso saber nomolégico. ‘Quem for da opiniio de que 0 conhecimento da realidade hist6rica deveria, ou poderia ser uma c6pia “sem pressuposicses” de fatos “obje~ tivos”, negar-lhes-& qualquer valor. E mesmo quem tiver reconhecido que, no ambito da realidade, nada esté isento de pressuposicOes em sentido Iogico, ¢ que 0 mais simples extrato de atas ou documentos apenas poderd ter algum sentido cientifico em relagio a “significagoes" 108 tenes bed cS =e en telagio a idéias de valor, consideraré no ental consragao de gunlguer epic de "topa” Palen um meio isto pergow part objeviade dota cease & som mais enc, como um simple jogo. E, elas, see lera decidir @ priori se se trata de mero jogo mental, ou de uma cor ‘ros sonceitualfecunda para a cignclaFambem gui apense ite um cit oda fick, para 0 conkecinento de fentmenoeutaas cones, nt nas se conedes como no te conicananens tad so. Portant, a consniao depos ides Sosa nao interessa como fim, mas. tinica Bo interesa exclusivamente como meio do Ouslgur exame ateto dos elements cones htrien mostra, 'no enanto, gue 9 hsoradr = ogous eae sim da mera comprovagi ‘de relaiesconercas, pa denne Signing cultural de um even india, por mak onic ae io, para “eaacterslo"™ tabula, ete de bag ces i cetor gue via de war apenas podem se tminads dems any g, voc sob a fora de tips ideas “Ov werd que a eneie ae consis, ab como’ indvihaimo' “impetalsne’, “ety cream etena sm cmt nen cose dade pela ees ea compreenoy dover ser decreas means 8 desis, "sem pressposes” eum fodmena cone, oes Imeiante @sintess, por abstain, dagulo que ¢ oe cae fenomenos coneretoitA lingugem ett due 0‘halorisiey fa ees enemas de paltras que comportam semelhante oaseor mene gue Ho imprecs porque ticolhidr segunda arcawane ae ROO ne vocabuldrio corrente no claborado pela reflexao, e cuja eificacdo iniialmente 56 € intida sem ser pensada coms secre, inUmeros casos, ¢ sobretudo no campo da histéria Pp = carter impreco do coneido dos conetion ni Prfionae eae alm cera de expo. Neses exon, bata que sta es femos com a presenga difusa de uma especificacd ricuar do con teidoconceiul,no eas singular de ae ele conta Ma” &° SO Mas quanto mais clara consciéncia se Senienive de um fndmeno clr tame Pt ea Ae Jecrernaan d& tabathar com coneios claros, que nio tenham sido Granados segundo um s aspecto particular, mas. segundo todos, 'o conferir a essas sinteses do pensamento hist6rico uma 109 “definigdo” segundo 0 esquema “genus proximum, differentia specifica”; que se faca a prova. Este mado de comprovacao da significagao das Palavras apenas existe no campo das disciplinas dogméticas, que tra- balham com silogismos. Também nao existe, ou apenas na aparéncia, uma mera “decomposigao descritiva” desses conceitos nos seus elemen- tos, posto que 0 que importa & saber quais desses elementos deverdo ser considerados essenciais. Se queremos tentar uma definigdo genética do contetido do conceito, apenas resta a forma do tipo ideal, no sentido anteriormente estabelecido, Trata-se de um quadro de pensamento, © nao da realidade hist6rica, e muito menos da realidade “auténtica”, € nao serve de esquema no qual se pudesse incluir a realidade & maneira de exemplar. Tem antes 0 significado de um conceito limite pura- mente ideal, em relagio ao qual se mede a realidade a fim de esclarecer © contetido empirico de alguns dos seus elementos importantes, € com 0 qual esta € comparada. Tais conceitos sao configuragSes nas quai construimos relagies, pela utilizagao da categoria da possibilidade obj tiva, que a nossa imaginagdo, formada ¢ orientada segundo a realidade, julga adequadas. Nesta fungio, 0 tipo ideal é acima de tudo uma tentativa para aprender 0s individuos hist6ricos ou os seus diversos elementos em cconceitos genéticos. Tomemos como exemplo os conceitos “igreja” © “seita”. Mediante a classificago pura, podemos analisé-los num com- plexo de caracteristicas, com 0 que no s6 0 limite entre ambos os conceitos, como 0 seu contetido, permanecerio indistintos. Pelo contrério, se queremos compreender © conceito de “seita” de modo genético, isto , com referencia a certas significagdes culturais importantes que 0 “esp rito sectirio” teve para a civilizagéo moderna, tornam-se entdo essenciais certas caracteristicas precisas de ambos, dado que se encontram numa relagdo causal adequada relativamente aqueles efeitos. Ora os conceitos se tornam entio tipos ideais, isto é nio se manifestam na sua plena pureza conceitual, ou apenas de forma esporddica o fazem. Aqui, como fem qualquer outro campo, qualquer conceito que nao seja puramente classificatério nos afasta da realidade. Mas a natureza discursiva do nosso conhecimento, a circunstancia de apenas captarmos a realidade através de uma cadeia de transforma- ‘gbes na ordem da representacio, postula este tipo de taquigrafia con- ceitual. E bem certo que a nossa imaginagio pode com freqiiéncia prescindir da sua formulaglo conceitual explicita ao nivel dos meios da investigagdo, mas em numerosos. casos, torna-se imprescindivel a sua 110 utilizagéo no campo da anélise cultural quando se trata da exposicao, © enquanto esta pretender ser univoca. Quem dela prescinde completa- mente, forgosamente se deverd limitar ao aspecto formal dos fenémenos culturais, como por exemplo o histérico-juridico. O universo das normas juridicas pode ser claramente determinado a partir do ponto de vista conceitual e, ao mesmo tempo, é vélido para a realidade hist6rica (em sentido juridico). Mas é da sua significacdo pritica que se ocupa 0 trabalho das ciéncias sociais, tal como as entendemos, & muito fre- giiente, porém, apenas se poder tomar univocamente consciéncia: desta significagdo quando se refere o empiricamente dado a um caso limite ideal, Se o historiador (no sentido mais lato da palavra) rejeita a tenta- tiva de formular um tipo ideal como esse sob o pretexto de constituir uma “construc te6rica", ou seja, algo indtil ou desnecessdrio para © fim conereto do conhecimento, resulta entio, regra geral, que este historiador utiliza, consciente ou inconscientemente, outras construgies andlogas sem as formular explicitamente e sem claboracio lgica, ou entio fica encalhado na esfera do vagamente “sentido” Nada hd decerto de mais perigoso que a confusdo entre teoria e histéria, nascida dos preconceitos naturalistas. Esta confusio pode apresentar-se quer sob a forma de se acreditar na fixagio em tais qua- dros conceituais e tebricos do contedde “propriamente dito” ou da sua utilizagéo a maneira de leito de Procrusto, no qual a Histéria deverd ser introduzida & forga, ou ainda hipostasiando as “idéias” como se fossem a realidade “propriamente dita” ou as “forcas reais” que, por detrés do fluxo dos acontecimentos, manifestam-se na Hist6ria. | Este “ltimo perigo € tanto mais constante quanto mais habituados estamos a entender por “idéias” de uma época os pensamentos ¢ ideais que governaram a massa ou uma parte historicamente decisiva dos homens dessa época, e que, por esse mesmo motivo, constituiram elementos significativos para o aspecto particular da cultura citada. A tudo isso convém acrescentar mais duas coisas. Em primeito lugar, a circunstncia de que entre a “idéia", no sentido de tendéncia do pensamento pritico © teérico de uma época, e a “idéia", no sentido de tipo ideal desta época, por nés construido como meio conceitual auxiliar, existem por via de regra determinadas relagdes, Um tipo ideal de condigées sociais determinadas, obtido através da abstragio de deter- minadas manifestagbes sociais caracteristicas de uma época, pode ter efetivamente passado aos olhos dos seus contemporineos como um ideal a ser aleangado na pritica ou, pelo menos, como maxima para a 1 regulagdo de certas relagdes sociais. Assim acontece com a “idéia” da “protecio dos bens de subsisténcia” ¢ de outras teorias dos canénicos, especialmente de Santo Tomas de Aquino, em relagio com o ja citado cconceito tipico-ideal da “economia urbana” medieval utilizado atual- mente. E, com maior razio, assim sucede com 0 famigerado “conceito fundamental” da Economia Politica: © do “valor” econdmico. Desde a escolistica até & teoria marxista, aqui se entrecruzam duas nogées, a do “objetivamente” valido, isto é de um dever ser, ¢ a de uma abstracio 1 partir do processo empirico da formagao de pregos. A idéia de que ‘© “valor” dos bens deveria ser regulado segundo determinados principios do “direito natural”, teve um incomensurével significado para o desen- volvimento da nossa civilizagio — e nio apenas na Idade Média — e ainda hoje o tem. Em especial, influiu intensamente no processo empirico da formacao dos precos. Ora, & apenas mediante uma construgdo rigorosa dos conceitos, ou seja, gragas ao tipo ideal, que se torna possivel expor de forma uni- voca o que se entende e pode entender pelo conceito tedrico do valor. Era isto 0 que o sarcasmo acerca das “robinsonadas” da teoria abstrata deveria ter em conta, pelo menos enquanto ndo for capaz de nos oferecer em seu lugar algo de melhor, o que aqui significa algo de ‘mais claro, A relagéo de causalidade entre a idéia historicamente comprovivel que domina os homens e os elementos da realidade histérica dos quais se pode fazer a abstracio do tipo ideal correspondente pode adotar formas extremamente variaveis. Em principio, deveremos apenas recor- dar que ambas as coisas so fundamentalmente diferentes. aqui surge a nossa segunda observagto. As “dfs” que domi- haram os homers de uma época, sto €, ase nelesatuaram de forma Gifs, 6 poderdo ser ompreendidas, sempre que Tormem um quodro do pensamento. complica, com rigor conceal, ob a forma de um tipo ileal, pols emprcamente eas habitam as meates de uma quantidade ineterminada'e mutivel de indvidyos, nos quas estavam expostss 205 mas diverees matizes, segundo a forma eo conteldo, a clreza © 0 fentda, ‘Os elementos da vida spiritual dos divers indviduos em Scterminada epoca da Idade Média, por exemplo, que. poderfamos dignar pelo termo de “ristianisme™ dos indviduos em questo, cons titutom, caso féssemos eapazes de exp0-los. por completo, um eaos de rolagiesinelectais ede senimentos de todos of tipo infisitamente diferensinds ¢ extemamente contaditsroy, se em que Tere da Tdade Media tenha sido’ capaz de impor, em elevado grav, @ uridade 112 da f6 © dos costumes. Posta a questio do que correspondia, no meio daquele caos, a0 “cristianismo medieval”, com 0 qual temos de traba- Thar continuamente como se se tratasse de um conceito jé estabelecido, ‘ou o problema de saber em que consistia o elemento “cristio” que encontramos nas instituigées da Idade Média, logo descobriremos que izamos constantemente um quadro mental puro por n6s_criado, Trata-se de uma combinagdo de artigos de {6 de normas éticas e de direito candnico, de méximas para o comportamento na vida, e de intimeras relagdes particulares, que nds combinamos numa s6 “idéia”; numa sintese que serfamos incapazes de estabelecer de modo nfo con- traditério sem recorrer a conceitos tipico-ideais Claro que tanto a estrutura légica dos sistemas conceituais em que expomos essas “idéias” como a sua relagéo com o imediatamente dado na realidade empirica sao evidentemente muito diferentes. As coisas apresentam-se no entanto de forma bastante simples sempre que se trate de casos em que um ou alguns raros princfpios diretores tesricos facilmente traduziveis em férmulas — como a f€ de Calvino na pre- destinagdo — ou entéo certos postulados morais formuliveis com clareza, tenham governado 0s homens ¢ hajam produzido determinados ‘efeitos hist6ricos, de modo que nos seja possivel introduzir a “idéia” ‘numa hierarquia de pensamentos inferidos logicamente desses principios diretores. Ja ento se passa por alto que, por muito importante que tenha sido 0 poder constritivo puramente Idgico do pensamento na Historia — de que o marxismo € um exemplo notével — o processo empirico- -hist6rico que se desenvolveu na mente das pessoas dever4 ser geralmente compreendido como um processo condicionado psicologicamente, ¢ no logicamente. cardter tipico-ideal dessas sinteses de idéias que tiveram uma aco hist6rica manifesta-se de forma ainda mais clara se esses prinefpios diretores € postulados fundamentais néo vivem, ou jé ndo vivem, nas ‘mentes dos individuos, ainda que estes continuem dominados por pen- samentos que séo a conseqiiéncia I6gica destes principios ou que deles sairam por associagdo, quer porque a “idéia” historicamente original que Ihes servia de base se extinguiu, ou porque apenas conseguira ter influéncia através das suas conseqiiéncias. E essas sinteses adotam ainda mais o caréter de “idéia” por nds construida, quando, de inicio, esses principios diretores fundamentais ndo tenham sido captados, ou apenas de modo incompleto, pela consciéncia dos homens, ou ainda quando nio tenha adotado a forma de um conjunto claro e coerente de pen- samentos. 113 ‘Assim, se nos empenhamos neste procedimento, como tantas vezes sucede e deverd suceder, essa “idéia” que formamos — como a do “tiberalismo” de um determinado periodo, a do “metodismo” ou a de qualquer variante embrionéria do socialismo — nao € mais que um tipo ‘deal puro com 0 mesmo caréter que as sinteses dos “principios” de ‘uma época econdmica, de que falamos acima. Quanto mais vastas sio as relagies que se devem expor, e quanto mais variada tenha sido a sua significagao cultural, tanto mais se aproximaré do tipo ideal a sua apresentacdo sistematica ¢ global num sistema conceitual e mental, ¢ tanto menos se torna possivel ficar-se com um tinico conceito deste género, E* dai resulta ser tanto mais natural e necessério repetir a tentativa de construir novos conceitos de tipo ideal, com a finalidade de tomar consciéncia de aspectos significativos sempre novos das relacGes. Assim, por exemplo, todos os enunciados de uma “esséncia” do cristia~ rnismo constituem tipos ideais que, constante e necessariamente, apenas tém uma validade muito relativa e problemética se reivindicarem qua- lade de enunciado histérico do empiricamente dado. Por outro lado, possuem um elevado valor heurfstico para a investigacdo, e um enorme valor sistemético para a exposi¢do, se apenas forem utilizadas como ‘meios conceituais para comparar e medir relativamente a eles a realidade. Com esta fungao, tornam-se mesmo indispenséveis, Tais exposigdes tipico-ideais, contudo, comportam em regra mais ‘outro aspecto que complica ainda mais a sua significacao. Geralmente pretendem ser, ou inconscientemente 0 so, tipos ideais nfo somente ro sentida [dgico mas também no sentido prético. Ou seja, tipos exem- plares que — seguindo © nosso exemplo — contém aquilo que o cristia~ nismo deve ser segundo © ponto de vista do cientista, aquilo que na sua opiniéo €* “essencial” nesta religido, porque representa um valor permanente para ele. Ora, no caso em que isso ocorra de forma cons- ciente ou — mais freqiientemente — inconsciente, tais descrigdes contém determinados ideais aos quais 0 pesquisador refere 0 cristianismo ava- liando-o; isto & as tareas e finalidades segundo as quais orienta a sua éia” de cristianismo. Claro que tais ideais podem ser completamente diferentes, ¢ sem diivida que serdo sempre, dos valores com que, por exemplo, 0s contemporaneos dos primitivos cristéos compararam 0 cristianismo. Neste caso as “idéias” j4 nfo sio meios auxiliares pura- mente Idgicos, nem conceitos relativamente aos quais se mede a realidade de modo comparativo, mas antes séo ideais a partir dos quais se julga fa realidade, avaliando-a, Jé ndo se trata aqui do processo puramente te6rico da relaco do empitico com determinados valores, mas sim de 114 juizos de valor adotados no “‘conceito” do cristianismo. Dado que 0 tipo ideal reivindica aqui uma validade empirica, penetra na regiio da interpretacao avaliadora do cristianismo: abandona-se 0 campo da cién- cia experimental para se fazer uma profisséo de £6 pessoal, néo uma construgao conceitual tipico-ideal. Por muito notavel que seja esta diferenga quanto aos principios, confusdo entre estas duas significacoes, fundamentalmente diferentes da nogéo de “idéia", dé-se com extraordinéria freqiiéncia no decorrer do trabalho hist6rico, Da-se sempre que 0 historiador comeca a desen- volver a sua propria “apreensio” de uma personalidade ou de uma epoca. Contrariamente aos padrées éticos constantes que Schlosser esta- beleceu segundo o espirito do racionalismo, o historiador moderno de espirito relativista, que por um lado se propoe “compreender por si propria” a época de que fala, e que por outro também quer “avalié-la", sente a necessidade de obter os padres dos seus juizos a partir da “propria matéria” do seu estudo. Isto 6, deixa que a “idéia” no sentido de ideal nasca da “idéia” no sentido de “tipo ideal”. E 0 atrativo estético desse procedimento constantemente o incita a esquecer a linha que separa ambas, donde esta situacao intermedidria que, por um lado, no pode reprimir o juizo de valor, e que por outro tende a declinar a res- onsabilidade dos seus jufzos. E necessétio opor a tudo isto um dever elementar do autocontrole cientifico, tinico meio suscetivel de evitar surpresas, que nos convida a realizar uma distingéo estrita entre a relagdo que compara a realidade com tipos ideais em sentido légico, ¢ a apreciagéo avaliadora dessa rea- lidade a partir de ideais. Devemos repetir mais uma vez. que, no sentido que the damos, um “tipo ideal” algo de completamente diferente da apreciagao avaliadora, pois nada tem em comum com qualquer “per- feicdo”, salvo com a de caréter puramente légico. Existem tipos ideais tanto de bordéis comé de religides. E, entre os primeiros, tanto existem uns que, segundo a atual perspectiva da ética policial poderiam parecer tecnicamente “oportunos”, como outros em que aconteceria 0 contrério. ‘Vemo-nos obrigados a passar por alto a discusso pormenorizada do caso que é, sob muitos aspectos, 0 mais complicado e interessante: ‘a questo da estrutura légica do conceito de Estado. A este respeito pretendemos apenas fazer notar que, quando perguntamos o que corres- onde & nocdo de “Estado” na realidade empfrica, deparamos com uma infinidade de agdes ¢ sujeigdes humanas difusas e discretas, de relagdes 115 reais ¢ juridicamente ordenadas, singulares ou regularmente repetidas, ¢ unificadas por uma idéia: a crenca em normas que se encontram efeti- vamente em vigor ou que deveriam estar, assim como em determinadas relagées de dominio do homem pelo homem. Esta crenga ¢, parcial- mente, uma posse espiritual desenvolvida em pensamento, em parte sentida confusamente e em parte aceita de modo passivo, ¢ que se manifesta com os mais diferentes matizes nas mentes dos individuos. Se ‘os homens chegassem a conceber com toda a clareza esta “idéia”, ndo precisariam da “teoria geral do Estado”, que se propde esclarecé-la, © conceito cientifico do Estado, qualquer que seja a forma pela qual se formule, constitui sempre uma sintese que nds realizamos para determinados fins do conhecimento. Mas, por outro lado, obtemo-lo também por abstragdo das obscuras sinteses que encontramos nas mentes dos homens histéricos, Apesar de tudo, 0 contetido concreto que a nogio hist6rica de “Estado” adota poderd ser apreendido com clateza mediante uma orientagio segundo os conceitos de tipo ideal. E, além disso, ndo hé a menor divida de que © modo como os contemporaineos realizam essas sinteses, de uma forma légica sempre imperfeita, ou seja, as ‘idéias” que cles tém do Estado — por exemplo, a idéia “orginica” de Estado da metafisica alema em oposiggo & concepgio “comercial” dos americanos — possui uma eminente significagao pratica. Por outras palavras, também aqui a idéia prética em cuja validade se cré, assim como 0 tipo ideal te6rico construido para as necessidades da investiga- io, correm paralelos e mostram uma constante tendéncia para mutua- mente se confundirem. Mais acima, encaramos intencionalmente o “tipo ideal” como uma construgio intelectual destinada & medicdo e a caracterizacao sistemética das relagdes individuais, isto 6, significativas pela sua especificidade, tais como o cristianismo, © capitalismo etc. Isso se deu para eliminar a opiniao corrente de que, no dominio dos fendmenos culturais, 0 tipico abstrato é idéntico a0 genérico abstrato. Esse no é 0 caso. Sem pro- curarmos analisar aqui logicamente 0 conceito de “tipico”, tao discutido € téio desacreditado pelo abuso que dele se faz, podemos jé deduzir dos hnossos estudas precedentes que a formacao de conceitos de tipos no sentido da eliminacio do “acidental” também, e sobretudo, tem lugar no estudo das individualidades histéricas. Como é natural, também aos conceitos genéricos que encontramos continuamente sob a forma de elementos constitutives dos enunciados 116 hist6ricos ¢ dos conceitos histéricos concretos podlemos conferir a forma de tipo ideal com 0 auxilio da abstragio e da acentuacio de determi nados dos seus elementos conceitualmente essenciais. Trata-se mesmo de um dos modos praticos mais freqiientes e importantes de aplicar os conceitos de tipo ideal, pois cada tipo ideal individual & composto de elementos conceituais que tém um carter genérico e foram elaborados maneira de tipos ideais, ‘Também neste caso exibe-se a fungio légica especitica dos con- ceitos de tipo ideal. O conceito de “troca”, por exemplo, é um simples conceito genérico, no sentido de um complexo de caracteristicas que sa0 comuns a virios fenémenos, sempre que eu deixe de considerar a signiticagdo dos elementos conceituais, e portanto limitar-me a analisé-lo ‘nos termos da linguagem cotidiana, Se este conceito, contudo, & posto em relagdo com a “lei da utilidade marginal” ¢ se forma o conceito da “‘troca econémica” & maneira de um processo econémico racional, este conceito — como qualquer outro integralmente elaborado de forma logica — conterd um juizo sobre as condicdes “tipicas” da troca, Assume entdo um caréter genético e converte-se em tipico-ideal no sentido 16 Bico; isto €, afasta-se da realidade empirica, que apenas se pode comparar © referir a cle. Algo de semelhante se pode dizer acerca de todos os supostos “conceitos fundamentais” da Economia Politica: sé & possivel desenvolvé-los de forma genética enquanto tipos ideais. A diferenga entre conceitos genéricos simples, que apenas rednem as caracteristicas comuns a diversos fendmenos empiricos, e 0s tipos ideaisgenéricos, como, por exemplo, um conceito de tipo ideal da “esséncia” do artesanato naturalmente & fluida nos pormenores. Mas nenhum conceito genérico possui, enquanto tal, um cardter “tipico”, como também nao existe um tipo “médio” puramente genérico. Sempre que falamos de grandezas “tipicas” — como na Estatistica, por exemplo — encontramos algo mais que um mero termo médio. Quanto. mais se trata de classificagdes de processos que se manifestam na realidade de uma forma macica, tanto mais se trata de conceitos genéricos. Pelo contririo, quanto mais se atribui uma forma conceitual aos elementos que constituem 0 fundamento da significagdo cultural especifica das relagies hist6ricas complexas, tanto mais 0 conceito, ou o sistema de conceitos adquiriré 0 cardter de tipo ideal. Porque a finalidade da formagao de conceitos de tipo ideal consiste sempre em tomar rigorosa- ‘mente consciéncia nao do que € genérico mas, muito pelo contrério, do que € especifico a fenémenos culturais. 117 © fato de poderem ser utilizados os tipos ideais, incluidos os de carter genérico, ¢ de efetivamente o serem, apenas oferece um interesse ‘metodologico relativamente a outra circunstincia Até este momento, temo-nos principalmente ocupado com os tipos ideais no seu aspecto essencial de conceitos abstratos de relagdes, que concebemos como relagdes estiveis no flux do devir, come individuos hist6ricos nos quais se processam desenvolvimentos. Mas apresenta-se- nos agora uma complicagdo que o preconceito naturalista, segundo o qual a meta das ciéncias socizis deverd ser a reducio da realidade @ “teis", introduz na nossa disciplina com grande facilidade, valendo-se do conceito de “tipico”. £ que também € possivel construir tipos ideais de desenvolvimentos ¢ estas construgdes podem ter um valor heuristico muito consideravel. No entanto, surge neste caso 0 perigo iminente de que se confundam o tipo ideale a realidade, Assim, por exemplo, pode chegar-se a0 resultado te6rico de que, num* soviedade organizada rigorosamente segundo normas “artesanais”, & tinica fonte dé acumulagio de capital seria a renda da terra, A partic daqui poder-se-ia taivez construir — nao cabe examinar agora a cxati- dao dessa construgio — um quadro ideal puro da transformagio da forma econdmica artesanal na capitalista, com base apenas em deter- rminados fatores simples, tais como a escassez do solo, 0 erescimento da populaco, a abundancia de metais preciosos © a 1acionalizagio do modo de vida Para saber se 0 curso empirico do desenvolvimento foi efetiva- mente 0 mesmo que o construido, € necessirio comprovi-lo com 0 auxilio desta construgo tomada como meio heurfstico, procedendo-se a uma comparacao entre o tipo ideal e os “fatos”. Se o tipo ideal tiver sido construido de forma “correta” e 0 decurso efetivo ndo corresponder a0 decurso de tipo ideal, teriamos a prova de que, em determinadas relagdes, a sociedade medieval ndo foi uma sociedade estritamente “artesanal”. E no caso de 0 tipo ideal ter sido construido de modo heuristicamente “ideal” — no interessa saber aqui se © como no pre~ sente exemplo esse caso poderia dar-se — entdo orientaria a investigacao para o caminho que conduz a um estudo mais profundo da natureza Particular e da significagao hist6rica dos elementos da sociedade me- dieval que nao tém carfter artesanal. Se conduzir a esse resultado, tera cumprido o seu papel l6gico, precisamente a0 tornar manifesta a sua propria irrealidade, Constitui, nesse caso, a prova de uma hipstese. O processo néio desperta qualquer objecio metodolégica, enquanto se tiver presente que a histéria © a consirucéo tipico-ideal do desenvolvimento

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