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. * ag H.R. TREVOR-ROPER* 1 1 RELIGIAO, REFORMA E TRANSFORMAGAO SOCIAL. | sg EDITORIAL PRESENCA / MARTINS ‘FONTES CU “Tino orignal Religion, the Reformation and Socigl Change . © Conyright by H. R, Trevoc-Roper, 1985, 1856, 1960, 1969, 196; 1867, 1972 Tradugto de Mara do Cario Cary Revisio de texto de Wanda 'Rainos Capa de Seldanta Coutinho Reservades todos os diteltos pera e Ungua portuguesa & Eaditorial Presence, La, 7 Rua Augusto Gi, 35-A—1090.L1530A * PREFACIO A PRIMEIRA EDICAO Estes ensaios foram redigides iniolalmente em épocas diferentes, mas referemse todos a um dnico problema de cardcter geral: /srice co governo, da sociedade e das idelas que-se ua" Europa e em Inglaterra eritre a Reforma e meados do século XVI. Multos historiadores competentes se tem dedicado ao estude' da Revo- luedo Purltana em Inglaterra, ¢ alguns deles atributram-the impottinela lintea na histéria moderna, considerando-a como o por ida da. Revolugdo Clentifiea a da Revolugéo Industrial. Estou convenclan de quo cate ponte de vista € demasiado insular, ¢ que ndo pode resistir a ume estudo de ferémenos semelhantes ocorridos noutros pontos da Europa Ao considerar os problemas suscitados pela Revolucdo Purllana, conch derel-os portanto sempre que posstvel dentro de um contexto europe; fol PPor essa razdo que reunt neste livro ensaios sobre temas etiropeus ¢ ingleses (0u antes, briténicos). O primeiro ensaio, que dé ao livro o seu titulo, fot suscitedo pelo exame daquilo a que se tem chamado a «ese Tavney-Webern: « toes do gue o calvinismo constitui, em certa medida, a forea moral e intelectual que inspirou o «novo» capitalismo dos séculos XVI e XVI, Esta tese-d Geeite por alguns como um dogma sociolégico e combatida por cutros com base em argumentos irelevantes (segundo me parece). Tem aise citada em apoio da teoria de que o puritanismo inglés era uma ldeologic: capitalistay progressive, e também da teoria de que o capitalism so gm virtude dessa inspiragéo calvinista, ou pelo menos puritana, pode &conquistar 0 mundo». Estou convencido de que, ee corsiderarmos « ape. rigncia inglesa dentro de um. contexto histérleo mais lato, esta perspective nos parecerd simplista. Se os historiadores «socialdgicosy considerassem © calvinismo em geral— na Sufca, em Heidelberga, na Escéoia, em Navarra ¢ na Transitvania, ¢ nao apenas em Inglaterra ¢ na Holanda-~e consi. derassem tgualmente o «apitalismon em geral—na Iidlia e na Flancires medievais, em Augsburgo e em Lidge no Renascimienta, assim como na Inglaterra e na Holanda do séoulo XVII— estou convencido de que se verlam obrigados a. alterar a férmula interessante, mas simplista, que Weber elaborou baseando-se em exemplas historicas limitados a limitatives. A minha versdo modificada dessa férmula fot apresentada pela primeira pez numa conferéneia pronunciada em 1961 em Galway, perante un cadt, t6rlo em que abundavam os monges ¢ as freiras locais, sendo recebida sem entusiasmo mas também, segundo me pareceu, sem sentido critica; mas tive 0 prazer de descobrir pouco depois que 0 erudito sufgo Herbert Lathy ehegara a conclusées muito semethantes a5 minhas, que publicou 7 Be depois na sua obra Le Passé présent (). Lilthy © ew préprio deaconhe- etamos as trabalhos um do outro antes de serers publicados. Devido @ sua origem focal, o meu ensato fo! publieado pela primeira ver nas actos ca Conferencia irlandesa de Historiadores, onde fora apresentado C) O segundo ensaio, que aborda a Crise Geral do século XVII, foi publi- cado pela primeira ves nessa excelente revista histéricaintitulada Past and Present, em Novembro de 1859. Suseitou também uma certa controvérsia © 0 ensdio, juntamente com os debates a que deu origem, fol novamente inchufdo em datz posterior numa antologia de enscios sobre os seculos XVI e XVI publicados pela primeira ver nesta mesma revista (). Apesar desea publicagao recenie, decid: integré-lo neste livro, dado que se rela- ciona directamente com 9 tema eentral da obra. Aproveitei esta oportun dade para inclutr no ensino algumas observagdes que enunciara ante. rlormente no debate que so segulu d sua publicagdo, e como desenvolvi mento do mesmo. Um dos. distintos historiadores que participow nesse debate fot Rolarid Mousner, que observou entdo que a crise geral do século XVII era raudto reais lata do que a crise da relagdo entre 0 Estado e @ sociedade por raim cnalieada, Tratava-se, segundo ele, de uma emutagdo intelectual ¢ néo 26 de uma crise social: e referix o fim do aristotelismo e a expansdo ds bruxaria como taspectes que tém de ser estudados se quisermos fatar 2 arise do século XViln. B esta a justificagdo que apresento para @ inclistio neste livro do longo ensato sobre a obsessao das brusxas que aacrevi especial. mente para este volume. & perseguipao as brusas € para alguns um tema revoltante, que néo merece ser inelutdo na histéria. Mas trata-se de um facto histérice, de signifieado europeu, ¢ a sua emergencia precisamente nos anes do Renascimento e da Reforma conatttul um problema que nao pode ser ignorado por todos aqueles que sintam a tontagdo de exagerar @ «modernidaden desse periodo. Néo podemos continuar a ignord-lo nas nossas tentativas de compreenséo do\periodo inicicl da {dade Tmoderna, da mesira maneira que nao podemos ignorar o fencmeno do anti-semitisme na histéria «contempordneay. Em Inglaterra a fase mais activa da caca ts bruxas colicidiu com wma época de presséo puritana—o reinado. da rainha Isabel e 0 pertoda das guerroe civis—pelo que ve elaboreram aigumas teorias fontasiosas coms base nesta coincidéncia. ifas também aqui temos ce considercr o problema na ria globalidade antes ‘do. nos aventurarmos em conclusdes.gerais— sobretudo na medida em que a perseguigto ds bruscas em Inglaterra fol trivial em coriparagto com que Se passou ro continente e na Escécia. Considerei portanto no meu ensiio esta obsessdo no sew todo, em toda a Europa, tentondo dascrover « sue ascensdo, frequéncia e declinio no contexto dos movimentos intelectuais ¢ socials da epoca, dos quais a considero insepardvel. Mousnier, por just. posigto de certas expressées, parece implicar— nao sei se fol asea @ cua ‘ntango — que 0 avanco da bruxarla eoincidiu com o declinio do aristo- telismio, Como se verd, defendo um ponto de vista muito diferente, A mou ver, & expansdo da crenca na bruscaria é um produto secundério, em (2H Eitty, He Passe présne conse, 1965, (Historical Studies 1” Papers read ‘before’ the Fifth Irish Conference of Historians, org. 6. A. Hayes-MeCoy (1963). CgGtitt im Burope 1860-1600, Essays rom «Post ard Present, org. Trevor Aston (865). cunsténcias socials especificas, desse endurecimento do aristotelismo (ou anies, do pseudo-aristotelismo’ dos escolastices) que comegara no fim da Tdade Média e fora intensificado polos catéitcos e pelos protestantes depois da Reforma. B 0 reverso de uma cosmologia, uta racionalizacdo social, que sogobrou na revoluedo social e intelectual geral de meados do século XVII. Se a Revolugao Inglesa do século XVII ndo pode ser isolada da crise geral da Europa, foi igualmente influenciada, em minha opinido, or pensadores europeus individuats. Entao como agora, como na Idade Média, a Europa era indivistvel. Todos aqueles que se sintam tentados a considerar os puritanos ingieses como «os Modernos»,.teriam vantagern em estudar a Internacional ideoldgica de que eles sqntiam fazer parte integrante: essa fraternidade cosmopolita dos protestantes perseguicios dz Europa—da Alemanha e da Boémic, de La Rochelle ¢ da Sabsia— que os Stuarts tinkam trafdo, que Gustavo Adolfo’ pretendera salvar, € que Cromwell procurou reuntr sob a sua direcgto. No meu ensaio «Tres Estrangeirosy, que desenvoivi consideravelmente depois da sua primeira publicagdo'em Encounter em 1961, estudei trés homens que ertenceram, pela experiéncia e pelas ideias, a essa Internacional Buro- ela ¢ que, combinando nogdes metafisicas anacrénigas com jdeias baco- nianas vulgarizadas, se tornaram nos filésofos ‘da Revelugao Puritana Tnglesa, na sua combinaedo da reacodo inteleotual éom' novidades cociais ut6picas Aqueles que consideram os calvinistas ou os puritans como Kos ‘Modernos» sdo levados a argumentar, quase sem dar por isso, gue © cal- vinismo ou o puritanismo fot o paida cléncia moderna, conduzindo a0 jlluminismo do século XVII, As Ideias do Tluminismo, parecem dizer-nos {por vezes, foram uma secuiarizacto das ideias do calvinismo ou «pro- { testantismo radicaln. No meu ensaio «As'origens religiosas do Tluminismo» exprimo uma opinido diferente. Dado que a meu ver 0 calvinismo foi uma \ forma da reacedo intelectual. geral. qué-acortin vallgiosas, tentel de mais i file sora divide contribuiram para o Iluminismo, e sugeri que, tambén neste Ponto o Progresso ve fer 8 Gusta. revs ao CuOMn Bate ensaio nance Jor pubtttoentertarniente. Fo escrito origtalirente em Teinenagem esse grande estudioso e patrono da tnvestigacao quem. os amantes- do séeido XVIII tanto dever, 0 Dr, Theodore Bestemmar Mas a sua relact natural com os outros ensaios pubioados neste votume levot-me a felt fo Aqui, de preferéncia a integréla no volume sobre 0, séeulo VIN que, 08 amigos do Dr. Besterman tencionam: dedicar-lhe. Espero que o considere mesmo assim como uma homenagem, pois foi ele que o,inspirou. " Os outros ensaios deste volume trazem-nos de volta a estas ilhas. Foram todos eles publicados pela primetra vex em voluries de homencgem 4 fhistoriadores com os quals aprendi 0. gosto pelo estudo, da, ‘histérla O ensaio «Os Sermées de Jejum do Longe, Parlamenten, piublicado origi. nalmente emt honra do meu tutor de Oxford, St Ketit Felting, ©). des ereve um dos métedos por malo dos quais.o Longo Parlamento' mantinhia € sua coesto interna e definia de tempos ¢ tempos a sua linha partied. © ‘onsato «Oliver Cromwell e os seus Parlamettosn, dedicido me origem a0 grande anatomista, ou antes, yivisector dos parlqmentos ingleses do () Besays in British History, preconted to Sir’ Keith Polling, off. H. R. Trevor Roper (1864), século XVI, Sir Lewis Namier, () sugere uma das razdes pelas quais Gromuwelt fol menos bem sucedida. O ensaio «A Esedcia © @ Revoluclo Puritanan foi eserlto em homenagem a-um historiador escocés de Ingla- terra e da Europa, David Ogg, @) ¢ trata um dos muitos episédios igno- rados da histérla escocesa; um episddio exjo impacto em Inglaterra foi, em minha opiniaoy de fatal importanecia. Todos os historiadores reconhecer que « dissensdo entre apresbiterianos» ¢ «independentes» foi decisiva na Revolugdo Puritan, ¢ essa dissensto— politiea, sociol6gica, religiosa— tem sido definida de 'muitas manelras. Mas quando consideramos esse assunto mais de perto’e vemos até que ponto a fronteira entre «presbite- rianos» ¢ «independentess fot indefinida, temporaria ¢ yariavel, creio que temos de reconhecer os limites das interpretagses sociolégicas’¢ teéricas © admitir que hd épocas em que os partides politicos as atiludes politioas no so uma expressdo directa das teorias ou interesses sociais ox politicos, antes sendo polarizados pér acontectmentos poiltioes: neste caso peld intervertvao fatal dos escoceses, que provocou desgracas tao imediatas nos dots patses. i E Finalmente, como prolongarento deste etudo sobre uma tentativa de unldo’ anglorescocesa, «acrescantel um ensaio escrito em. meméria do falecido Jaime, Vicens Vives, () que. tanto jez pela regeneragdo do estudo da histéris espankola. Esge trabalho aborda um problema enfren- tado pelas coroas tanto da Inglaterra como da Espanha do séoulo XVI: © problema Ua conversto de .uma unido dindstica de coroas numa justo de pases. Jaime I queria ser «Rel da Gra-Bretanhan, endo apenas de ingla- terra, Escécia e Irlanda; Olivares aconselhave Filipe IV a tornar-se 0 «Rei de Espanhan, e ndo's6 de Castela, Aragéo e Portugal, Mas os factos racials, soiais © insfitucionais provaram ser demasiado fortes, pelo que este problema de uma unio mals ampla éontinuou a atormentar os dois paises durante todo o século XVII, para s6 ser resolvido no XVIIL, em clrounstancias” diferentes, apés vérias expériénelas abortadas © por vezes desastrosas. 5 ‘Agradeo aos editores e responsdivets peli primeira publicagao destes fensaios @ sua autorizacdo para os reediar neste volume. Estou particular. mente grato cos meus editores, Macmillan, que sempre deramn mostras da mator paciéncia para cotigo. Mas a tareja mais drdua foi a compilagio de um indice para um livro deste tipo ¢ € a minha mulher que dedico reconhecidamente este livro, pois, fo! ela que empreendeu essa tarefa espi- nhosa e que, para esse efeito, teve de-atravessar 0 Atlas com as proves 0 restante’ material (1). i) m , "HOR, TREVOR-RopER CChietewood —Metrosé; 3 de Agosto de 1966 vor ch, EMH potted to Sir Lg Namie, on, Richard Pates€ A.J. P Tye ©) Historical Essays, 1600-1750, presented to David Ogg, org. H..E. Bell ¢ R. L. Olllard (2963). nes ee 35 ore Gy Homencio.e Jaime Vieens Vives (arcalons, 1985). () OQ autor refere-se 2 edicdo inglesa desta obra (N. E.). 10 i PREFACIO A SEGUNDA EDICAO Nesta segunda edicdo de Religiso, Reforma e Transformagko Social, fiz algumas correceBes e alguns acrescentos; mas tanto as_primeiras como os segundos se referem apenas a pormenoras que seria pretensioco especificar. Agradeco aos amigos ¢ criticos atentos que descobriram os erros agora emendados ou as confusBes que (segundo o espero) esclarect esta segunda edigdo; assim como acs meus tolerantes editores, que aceitaram pacientemente essas alteragdes do texto. H.R. Trevor-Rover Oxford, 10 de Margo de 1971 nl gue tivera.cutrora um partido protestante forte, a batalha travou-se uma Yee thais em moldes familiares. No reinado de Luis-Filipe, e einda mais no de Napoleso II, a economia de Franca foi revoliciona‘e por empresirios brotestantes, Mas, uma vez mais, néo foi por serem calvinistas ¢ esterem Portanto animados do «espirito capttalistay que’ esses homens’ foram capazes de realizar 0 Wirtschaftswunder do Seguado Império ¢ da Ter, ceira Reptiblica. Nao se inclufam entre os auttnticos protestantes. fran ceses, 05 verdadeiros crentes que, desde 1685, tinhem preservado af calvinista nas algrojas do Deserto» no Languedaque, Se examinarmos ate. famente os grandes empresdrios protestantes da Franca do. séeulo xix, yerificaremos uma vez mais que eram quese todos imigrantes, ‘Econ quer calvinistas provenientes da Sulga —descendentes desses primelros efugiados, italianos da déceda de 1850 ou franceses de 1685-—quer Iuteranos da Alsécia: a Alsdcia que, na sua qualidade de feudo imperial, alo fore atingida pelo dito de Nantes nem, portanto, pela dua Revosane Em qualquer dos casos, o padréo é 0 mesmo. Nos seculos xi © xa ee paises subdesenvolvidos que se tinhem revoltado contra Roma propor clozavam noves oportunidades aos empresérios dos velhos centios indus. triais da Flandres, da Itdlia e de Alemanha do sul; no século sux, 0s pafses catdlicos subdesenvolvidos proporcionavam novas oportunidades aoe des, cendentes desses empresatios, convidando-os assim a regresset. No pi. taelto perlodo, o endurecimento do Estado da Contra-Refarma expulsara esses homens; no século xtx, 0 enfraquecimento desse Estads facil tavarlhes 0 regresso, Com efeito, no século xix 0 Estado da Contra-Reforma desagregousse por fir, Contributram igualmente para esse processo. as ideas do Duminismo, a necessidade de progresso, o doloroso contraste com as Socledades protestantes. Mas a longo prazo talvez outra forea tivesse sido igualmente pogerosa. No século xvui, a Tgreja Catolica Romana ties sofrido uma retraé¢do espiritual e intelectual gerel. Depois’ do. esforeo 2 Contra-Reforma, ‘sobreviera um longo periodo de fanatismo mesquinhe, Q humaniamo dos’ primeiros jesuitas fora de curta duracao. em 1620, Hnham-se tornado meros sofistas do Estado da Contra-Reforma, Meso no século xvii, a unio entre a Igreja e 0 Estado manteve-se: os principes febronianos tentaram reformar uma e outro, © nao separélos. Mas co stoulo xix procurou-se finalmente separar a Igreja Catdlica do Estado gatdlico dos principes. Como era de esperar, essa. tentativa fo! felts ae France, a wltima monarquia catélica a aceitar ee primeira a tepudier essa unit fatal. B como era também de esperar, foi em Roma, o Estado. Igreja por exceléncia, empurrado para noves posicbes de rigidez pela derradeira luta pelo Poder Temporal, que a resistencia a esse tentaava: fo} mais forte. Mas, por fim, 0 objetivo foi alcancado. 0 facto de os paises da Contra-Reforma terem_podido enfim igualarde, d0 ponte ge vista econdmico, aos paises da Reforma sem-uma nova revolta contre Roma deveu-se, em parte, & nova elasticidade adquirida pelo eatolicams no séoulo xix: & sua dolorosa separagto do ancien régime, O Mereads Comum Europeu dos nossos dias, essa criago dos democratas-ctistios de Italie, da Alemanka e da Franga, deve alguma coisa a Hugues de amennais, 2 2 A CRISE GERAL DO SECULO XVII Qs meados do’ séoulo xvii foram ym ‘perfodo de ‘revélucdes_na Europe. Fssas revolugdes ‘e"Toeal para Tocal ¢, quando estu- ~daday separadamente,, parecem ter a sua origem. eth causas particulares e locals. Quando porém as cansideramos no'seu conjunto, encontramos-hes tantos tragos comuns, que quase se nos afiguram, umarrevolti¢go geral. ‘Temes, por exemplo, a Revolucto Puritsina em Inglaterra, qué se estendeu pelos vinte anos que medelnm ents Tedlre 1600, me cbs cle ce lala yt te A 618 Nese eos dese fore labia doves 59" designades ‘pelo nome de Fioada om Franca, 6 em 1090, vesificoune ten wt /~ coup ddtat ou tevolucso dalasita ata aint Uae gts ee > unl” tas Provincing Unidas doe ‘mas Provincias Unidas dos Palses Balxos_ As perturbacdes 0 sspa= 7 contemporaneas das inglesas- Em 3ea0 tiverain lugar a rovaiea “in Cat ERCGSIOU, @8 TevOlia de Portugal, que fol bem #Heeelde; fen 1641 quase houve uma Tevglir na “Andalusia, em TOHT tore yor a =Nigoles, a revolia de Masanelle. Ao Aos observadores contemporlineas pare- ia que foda a sociedade estava am crist que esta era geral na Europa. «Estes dias so dias de convulsdes...», dizia em 1643 um pregador inglés, 2 essas convuls6es so universal ye : no Palatinado, na Boémia, na Ger- mania, na Catalunha, em Portugal, na Irlanda, em Inglaterra (2). Os varios * paises! da Europa mais néo pareciam que teatros diferentes, em que se Tepresentava simultaneamente a mesma grande tragédia, se bem que ' ‘em linguas diferentes e com variagoes locais. jual ora a causa ou cardcter gerel dessa crife? Os contemporancos, - /¢ quando Yam além das meras 's- superficial, ihham tendéncia org "pata_—encontrar_razBes.esprituaia EEpIntia potunaas siavam ctor de_que _havia ume crise 1 uma geragio que sentam que dle Gstave pore Gin “Desde pelo menos 1618 que se falava de dissolueao as socteuade: wots Bee", “aon Stathers A" ong 1” festava emi todos esses anos era por-vezes justificzda por novas inter: “-pretagoes da Sagrada Escritura, outras vezes por novos fenémenos celestes, “Gam a descoberta de novas estrelas &, prisclpalmente ao nove comets yo" yende 1618, a citncla parecia apoiar ‘os profetas da catdsttofe, O mesmo % , fazia a histéria. Foi nesta época que estiveram em voga, teorias.ciclicas a de historla © 0 declisio e queda das nagdes foram antinciados nio 36 pele ye Escritura © pelas estrelas, como também pele passagem co temeo e pelos ‘Processos orgénicos de decadencia. Os reinos, dizia um. pregador puritano Jeremiah Whitaker, yore, Crist the Setoment ‘of Unsetted Tes, erect on prog perl c Gore ee aeeaat ot Una Tes Vide. G, Stic, Bnelanta Present Diseactisns poralehd ath age of Soahe ft other foreign covets (142) Paderiamos el ues cutee exlalee 8 em 1643, depois de se referir brevemente a influéneia corroborativa do cometa de 1618, duram um perfodo maximo de 500 ou 600 anos, «e todos re jo ¢ suficiente. As guerras europeias de 1618-59 + Mas a exolicacto ni x > ‘nfo foram afinal um fen 10¥0. Eram uma continuaco das guerras ‘vos sabeis quanto tempa 1€ pastou desde a Conquistan @). A nessa (}.{~ 4” —guropei do steulo x01; das guettes de Canlos V contre fisneioes Toa perspective racionalista pode levar-nos a cret que as novas descobertas ~", _,!")). —Henrique 11, de Filipe I! contra Isabel e Henrique-de-Navarra 6 Prine Ga lenis teriam como efeit desacreditar 08 vaticnios apocaliptics 1, 2°” eipe de OFzige, Essah guerrasdo-s€etlo oi" tianam-acebatie—CORe 6 a Bacritura; mas, na realidade, néo ere assim, Consttal um facto inte: 2° 0" yoga om TE Soa ea a et = ressante e inegavel que entre os cientistas mais avangados do principio 4_¢ J wents om 1618, 1621 ¢ 1695. Filipe TV lembrava. constantemente o exem- do, século vr se inclufam tanibém os estudiosos mals eruditos da mate: po" "| =-plo-de File Tl, emi abielo y mi sefiors;.o Principe Mauricio ¢-0.Principe miatica biblica; e, nas stias méos, a ciéncia e a religido convergiram > yf >” “Frederico Henrique 0 de Guilherme de Orange, seu pai; Oliver Cromwell para situar entre 1640 e 1660 a dissolucéo da sociedade e o fim do wn »-9-da «Rainha_ -memérian.-Richelieu e Mazarin tentaram frundo @) : CE pV inverter 0 veredicto de Cateau-Cambresis do 1859. © no entanto, as guertes Este ambiente intelectual ¢ significativo, ma medida em que nos 1, “ve™, — do séeulo x¥1 ndo tmham conduzido a tevolindes sendin, oe es mosiza que a crise de meados do'século xvi nfo velo de surpresa, por uma coineidéncia da ccasos: era uma crise profunda e esperads, ainda que 56 vagamente, mesmo antes de se verificarem as contingéncias que a desen- cadearam. Néo ha divide de que essas contingencias tornaram @ revo. lugdo mais prolongada e mais profunda nalguns locais, mais breve e mais Superficial noutros. Endo hd divida também de que a universalidade da revolugto se deveuem certa medida av contégio: a moda da revolugto alastra rapidamente, Mas 0 contégio implica a receptividade: um corpo saudavel ou vacinado no cantrai umg doenga epidémica. Por conseguinte, ‘admaitindo embora 2s contingencias 6 modas, temos de por uma questio tals profunda. Temos dv perguntar qual era,a condig&o geral da socie- cade curopeia ident gia. rtdos d0 slo ‘meados do séewlo xvii, a fOmOu tad —unrvarsalmente vulneraval—ntelacpual e-Histameats=-a asus orden — sit _da_revalugao? “ie ie Algumas das respostas sto 6bvias. E a mais obvie é a Guerra dos yyiTtint Ads que comegou em 1618.0 ano do cometa, e contisuava ainda jpPlacesa na década a luge. A Guerra dos Trinta 30 Anos, nos 1640, 08. anos da: rev rt pees ate atic p sepa. gamin a5_duas nals teferidas, a Revolucio Puritana— ww Viol ita lassificam imediatamente as wwe outras revolugées europeias de revolugées Gourgeaiser-aeeene hip6- Luma Vez Formulada, @ ilustrads por outras hipdteses. Ora, tom cs fer flemonstrada com factos, além de que pode basear-se em premisses Causial Para a sua histéria do que, por exemplo, as revolucGes hecsite s teborita na Boémia do século xv, as quais se aesemelha tio obvinecte. Si ctise do steulo xv, tendo sido embora geral na Europe ont dena at ana eke mneraments anatase) ae a nto dei fel ania _Proponho-me apre-— geral —ou seja, abstraindo das variages locais irrelevantes ie i de que fol, a_realidade, uma cnisé-dee slonados com slen. Na realidade, nfo apresenta uma dnica prova docamen- », Ov Jo —/iR-s-mais_vaga-da Es Te de es se das tada do que.é pressuposto ser’ o acontecimento mais crucial de toda a?" 4 smelt e tempo mais longo do que € habitualmente con. i Trata 2 historia do capitalismo europeu. E, Hobsbawm 6 ainda mais sucinto. lengemente de economia da Eurapa no tempo das revolugtes. Pessupoe a importincia «portentosay da Revolugio Puritana na transformagio. economia, Mas néo diz uma palavra sobre a relago efectiva entre as ve Gliou convencido de qué a Wentfeacso marssta das_revolugses_ do _S€culo_x0/1_com_a Fevolugd0 erfion op ue Bowes Sessa pre dials di dt Givi © se @) © met, eee Chcsnte ¢ teeing aoe tebe ie tee eat 6 ie Spent rar d8 dopoge, © aa Go testes capt 48 siderado necessdzio. Com efeito, as crises sociais gerais tarsmere coo fupllcdveis em termos de meras décadas.. N&o.pretenderiames ewallcne ele em dia..2 Revolucdo comunista na Russia em termos dos dove ooee Sah G2 3005, nem a grande Revolugso Francesa em fungi do petions do reinado de Luis XVI. Teriamos nos dois casos de estudar todo canaes regime que terminou, ali em 1617, agui em 1789. £ pelas meamas cae up Precedeu a crise: a forma global do Estado e da sociedade que tones Made (xPandirse continuamente, absorvendo todos os choques, adaue Tune, Ue erescente seguranca ‘ao longo de todo 0 século su; 2 ue Do eeng, Seu termo em meados do século xvul: aquilo a que chamazemps, Proves West#o de contodidade, o Estado e a sociedade da Renascence europeia. fi Renascenca—como este termo é vago e impreciso! Defini-lo ¢ daliTo Yet constitutdo tarefa constante dos investnacons, Aone Fresco internacionais e das revistas de cultura. Mas no nos dexence talimidet Por es8e facto. Todos os termos gerais— ancien régimen, ceapi, fallsmo>, «dade Médian — sao vagos e imprecisos, embora texban: ches seniade, desde que os utilizemos na generalidade, E em termes persis sabemos bem 0 que entendemos por Renascenca europeia, fs Sets expansio da nossa civilizacdo, a deseoberta emoxi de 1i6VOs_mun- —-S05a_avenvura_constante:—o-alargamento progressive da_sensibilidade _ 72 da pompa_que atingiu a sua io méxima no século xvi ¢ cue, “aa tlh die latagia = sko essas as suas a. efeto, 0 S€eulo xv no € “uma era de~ ‘ 49 se identico a si mesmo na tecnologia, no representa miticgs. Leonardo, Montaigne, ‘tal como ela udancas ei 2 20, PNURRAtS: no_governo. Ne taolog HOUcay ncangaseoeanes~ iram, pelo _menos depois de ~axparisao—daEyropa-oria. ete eed a te fades, Tas os mecanismos de pro- “dugde mantem-se basicamente constantes. ‘Tambeny na cultura os grandes Ys ce seus milous de governs a Renasoenea fora uni fendmen ce urban cOmecata nas eldades de Ilia, du Flandres @ & #0} da Alemanha, — fe constantes. Tarct na Cult antes de ter sido adoptada ¢ motifieade pelos principes e pélos papas Montiigne, Covantes, Shakespeare, scat & wae feo ene. Tica. Fevestira-se-d0-carkster das clades amit » tive has oe ~-hascera—Tal_como elas, "era_ordeira, responsével, controlada Pois por See ie Sakae Boe ae eee ae Sob E> ky ~ anlto grande que Tages Tgaees SP tS eee POs Dak seein i pean a Sor aah Epo S0zatna aponiace- ct masa pie seus hospitals ‘pais, as suas igréja8_¢ pracas,encon- Ae eS RonntGe novos TAPES, por Hoses Mate Vanoe Me ae nei jot, evamos-sempre elas um. vestgio.de“poupinen fe conte Tete eS neha maa ~He que Ines & possivel conter Gurante malta tempo semi mdancas inter=s 0 “HES NG entanth, Esvas THUdantas nao se verificam ange: $0 no asedlo went” setratareo-goverso-€alfeacn de moo a poder alsiase& expensio- “territorial do atzulo xvr-em Espanh, em Franca © na Gri‘Bréterha (). “Antes disso, o Estado aa Renascenca expazide-se continuaments, sem des: truir o seu’ antigo invélucro, O invélucro é a monarquia aristocrética ¢ medieval, 0 governo do principe cristéo. ed a “o seu cardcter ¢ novo: sf ma ‘mais coloridas do que os seus “Dredetessores—So homens cul 5, POF VeZeS bizarros, extra Vagantes mesmo: espantam-nos com os seus gostos IUxUoS0S, a Sua espE tosa energia, a sua falta de escripulos, a sua panache (*). Mesmo quando! so introvertidos, devotos, melancélicos, sio-no A escala herdica: tal como Carlos V orientando o seu funeral em Yuste ou Filipe II condenando meto- dicamente milhoes de vidas futuras 20 encargo de orar ininterruptamente pela sua alma. No século xvt, os.principes so inegavelmente tudo. Tira- nizam o passado e o futuro; alteram a religiéo e a verdade divina com um simples aceno, mesmo quando ainda ndo tem vinte anos; sto padres © papas, sic deuses e reis. Mas se quisermos compreender a crise que pos fim ao seu dominio, temos de nos lembrar de que o seu poder nao surgin do nada. A expansio extraordindria do poder dos principes no séeulo xt néo foi uma expansdo in vacuo, A Europa teve de arranjar lugar para ele, Os principes fortaleceram-se @ custa de alguém ou de alguma coisa, @ traziam consigo os meios de garantir esse novo poder usurpado ¢ sibito. Na realidade, engrandeceram-se & custa dos Orgaos mais antigos de civilizacao europeia, as cidades; © traziem consigo, como meio de conquista, um novo instrumento politico, «a Corte renascentistay. ensa_nelas depois de 1500? s da Flandres e de I @) Vide 0 meu ensaio, wA Unifo da Gré-Bretanha no Século xv, (2) Em francés no original (N. R). () Fomand Bride! abordon este’ aspect ranée ef [¢ monde meditorranéen a Vepoque de Philippe II (Paris, 1848), pa sua grande obra La Médlter Pp. 285-31, 50 © eclipse das cidades europeias nas vésperas da Rena: sido umterea pouco eptuéado, Wate se, porem do Um Teudmen impor ~tamte Cy. Efectivamente, a0 tmaginar 2 Wdads-Médie-quom mio. pores —tambvern fas cidac Avia, “Na Idade-Média_as comunas livres da Flandres « a bouts wide Talia, As cidades bélticas da Hi PEL nis eda Dinamatee ou arrcherassoe Bi yo” —qor el de Aral, Maraslha-ab val de Tees Ate eos ee “mesmo de_uma_virtude caracterstica do governo municipal auténoma,. mesmo nde ésontrolad go algae un ma menalldade taulto dif’ “Ente do exbicloniome extravagante, esbanjador, irrespons&vél_dos_prin- cipes que se manifestaria mais tarde. or Ora, entre os séculos XV €-RVr Toram surgindo os pretendentes srin— ipesdbe, € as cidades sucumbiram mas atras das outras,_As ricas cidades_ fa_Flan fa uma ires_Toram_conquistadas pe lansa foram abSorvidas pelos zeis da, Polo. —— résisiincia va. Barcelona vedeu, ns, - ides_concubinas», ligadas 1. __Bor correntes de ouro ao rei de Espanha e ao.Imperador-O or6pto Do ig roptio Doge. zu se Wansformou também fui prinepe, cpmiseade ootees lates ‘menores em terra muito poucas, comie-CeNebrs,-permarecersin__ ~solteironas tredutveis; © essa vidas taoda © irae infratavel’ nko conheceu-a~ “ scons. AS-proprias @s codtirmam a regra. A nova ‘osperidade Ge Fra - Ha 80. pode ser atris uida a fraqueza acident OOS a a Tendiclo ere "6 preco da continuacio da prosperidade: pois de que outro modo poderiam wo cidates sibrevies depois de os prinipes terem descoberto o sugreds Go Estado? Submnetencs a Igreja, alargando a sua jurisdicgo, mobilizando 6 campo, os principes tinham érlado-um novo aparelno de poder, ao Estado da Renascencan gee les pecmitia lancar impostos sobre a iquéza das eidaces, proteper's datas volver o seu coméreio, chamar a i e desenvolver a aus ane © & rua ste: tecture,’ Agora as cidades 26 podiam prosperat por novos métodes, NEO podiars' continua independentes, esses cas tinhum partedo, heisueclena agora atyavés do monopélio, como concessiondrias exclusives do eoneeeie do principe nos dominios em expans&o: foi assim que Lisboa e Sevilha pros- peraram através das coneassdes dos reis de Portugal'e de Espanta Oc Podiam prosperar na qUalidade de centros do conseino extcayreante dos Prineipes, de capitals reals, pols os principes vitoriosos estabelectara as sins novas cortes nalgumas dessas velhas cidades: cortes que sugavam, ariqueza ds todo 0 pais e a derramavam sobre a cicads onde resiciamy © seule avy essencialmente uma era no de cidades, mas ce Cortes! de capitals que 6 governo, mais que o comércio, torna sumptuosas. Nao foi na qualidade de cidades industrials ou comercais, tas como. sees de umm oorte ue cidades conio Bruxelas; Paris; Roma Madric-Népoles, Praga aicancacam— Tne se ndor, E 6 brilno dessas cortes ‘nao é aauto-propa- ~ganda disereta e complacenté dos mereadores, deduzida dos setis iucros ~ Galena fea a.sem limites dos reise dos cortésdos, que ndo —Precisam de fazer contas, porque néo preisam de ganhar, —

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