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Ins Coreape, Tullo. Jalice de Ckarszio , Hoth Geeneecrles SE, Paula: Yerspeetie 2096, p Devains, Ios), 6. ALGUNS ASPECTOS DO CONTO Encontro-me hoje, diante dos senhores, numa si- tuagtio bastante paradoxal. Um contista argentino se dispe a trocar idéias acerca do conto sem que seus fouvintes ¢ seus interlocutores, salvo algumss excegdes, ‘conhecam coisa alguma de suia obra. O isolamento cul- tural que continua prejudicando nossos paises, somado 4 injusta incomunicabilidade @ que se vé submetida Cuba atualmente, tém determinado que meus livros, que jf sio uns quantos, no tenham chegado, a mio ser excepcionalmente, 2s mios de leitores to dispostos € tao entusiastas como os senhores, mal disto nic 6 tanto que os senhores no tenham tido oportunidede de julgar meus contos, mas, sim, que eu me sinta um pouco como um fantasma que Ihes vem falar sem essa 147 ——_ relativa trangiilidade que sempre d4 sabermo-nos pre- cedidos pela tarefa cumprida ao longo dos anos. Eo fato de me sentir como um fantasma deve ser jé per ‘ceptivel em mim, porque hé alguns dias uma senbiora ‘me assegurou no hotel Riviera que eu néo era Julio Cortézar, ¢ diante de minha estupefacio agregou que o auténtico Julio Cortézar € um senhor de cabelos brancos, muito amigo de um parente dela, © que munca arredou pé de Buenos Aires, Como ié faz doze anos que resido em Paris, os senhores compreen- detio que minha qualidade espectral se tenha intensifi- cado notavelmente depois desta revelaciio. Se de repente eu desaparecer na metade de uma frase, nfo me sur- preeaderei demais; e no m{nimo sairemos todos ga- nhando, Afirma-se que o desejo mais ardeate de um fon- tasme 6 recobrar pelo menos um sinal de corporeidade, algo tangivel que o devolva por um momento a vida de carne © osso, Para conseguir um pouco de tangibi- lidade diante dos senhores, vou dizer em pouces pala- ‘ras qual 6 a direglo © 0 sentido dos meus contos. Nao © fago por mero prazer informativo, porque neahuma resenha te6rica pode substituir a obra em si; minhas razes so mais importantes do que essa. Uma vez que me vou ocupar de alguns aspectos do conto como gé- nero literdrio, © € possfvel que algumas das minhas idéias surpreendam ow choquem quem as escutar, pa- rece-me de uma elementar honradez definir 0 tipo de narrago que me interessa, assinalando minba especial maneira de entender o mundo, Quase todos os contos que escrevi pertencem ao género chamado fantéstico por falta de nome melhor, e se opdem a esse falso realismo que consiste em rér que todas as coisas podem ser descritas ¢ explicadas como dava por assentado 0 otimismo filoséfico © cientitico do século XVIII, isto 6, dentro de um mundo regido mais ou menos harmo- nlosamente por um sistema de leis, de principios, de relagées de causa a efsito, de psicologias definidas, de ‘eografias bem cartografadas. No meu caso, a suspeita de outra ordem mais secreta menos comunicével, € a fecunda descoberta de Alfred Jarry, para quem o verdadeiro estudo da reslidade nfo residia nas leis, mas has excogdes a essas leis, foram alguns dos principios rientadores da minha busca pessoal de uma Literatura 148 A margem de todo realismo. demasiado ingénuo. Por isso, s¢ nas fdéias que seguem, os senhores encontra- rem uma ptedileséo por tudo. 0 que no.conto € excep- ional, quer se trate dos temas ou mesmo das formas cexpressivas, creio que esta apresedacéo de minha prépria mareira de entender o mundo explicaré minha tomada de posigéo ¢ meu enfoque do problema. By ‘iltimo caso se poderé dizer que s6 falei do conto tal qual eu 0 pratico. E, contudo, nfo ereio que seja assim. Teaho a cerieza de que existem certas constantes, certos valores que se aplicam a todos os contos, fantésticos ou realistas, draméticos ou kumoristicos. E penso que telvez seja possfvel mostrar aqui esses elementos inva- ridveis que d#o a um bom conto a atmosfera peculiar ea qualidace de obta de arte. A oportuaidade de trocar idéias acerca do conto me interesss. por diversas razées. Moro num pals — Franga — onde este género tem pouca vigéncia, embora nos tiltimos anos se note entre escritores ¢ leitores um interesse crescente por essa forma de expresso. De qualquer modo, enguanto os erfticos continuam acumu- Jando teorias ¢’mantendo exasperadas polémicas acerca do romance, quase ninguém se interessa pela problemé- tica do conto. Viver como contista num pais onde esta forma expressiva é um produto quase exttico, obriga forcosamente a buscar em outras literaturas o alimento que ali falte. Pouco @ pouco, em textos originals ou mediante tredugSes, vamos acumulando quase que ran- corosemente uma ‘enorme quantidade de contos do ppassado e do presente, ¢ chega o dia em que podemos fazer um balanco, tentar uma aproximacto apreciadora esse género de tio diffcil definiclo, to esquivo nos seus miltiplos e antagénicos espectos, e, em ltima antlise, to secreto ¢ voltado para si mesmo, caracol da linguagen, irmao misterioso da poesia em outra dimenséo do tempo literdrio. ‘Mas além desse alto no caminho que todo escritor deve fazer em algum momento do seu trabalho, falar do conto tem um interesse especial para n6s, uma vez. que todos os paises americans de lingua espanhola estio dando a0 conto uma importincia excepcional, que ja- mais tivera em outros palses latinos como a Franca ou a Espanba. Entre nés, como é natural nas literaturas Jovens, a criago espontinea precede quase sempre 0 149 cexame critico, e € bom que seja assim. Ninguém pode pretender que s6 se devam escrever contos aps serem conhecidas suas leis. Em primeiro lugar, no hé tais leis; no méximo cabe falar de pontos de vista, de certas onstantes que dio uma estrutura a esse género tio pouco classificével; em segundo lugar, os teSricos © os criticos nfo tém por que serem os proprios contstas, ¢ € natural que aqueles 36 entrem em cena quando exista i um acervo, uma boa quantidade de literatura que ermita indagar ¢ esclarecer o seu desenvolvimento 48 suas qualidades. Na América, tanto em Cuba como no México ou no Chile ou na Argentina, uma grande quantidade de contistas trabalha desde 0s comegos do sfculo, sem se conhecerem muito entre si, descobrindo- vse 8 vezes de maneira quase que péstuma. Em face desse panorama sem coeréncia suficiente, n0 qual pow. cos conhecem a fundo 0 trabalho dos demais, creio que é til falar do conto por cima das particularidades na- Cionais ¢ internacionais, porque 6 um género que entre 16s tem uma importfincia e uma vitalidade que crescem 4 dia. Alguma vex faremos as antologias definitivas como fazem os pafses anglo-saxoes, por exemplo — © se saber até onde fomos capazes de chegar. Por ora no me parece init! falar do conto em abstrato, como género literério, Se tivermos uma idéia convincente des- Sa forma de expressio literéria, ela poderd contribuir para estabelecer uma escala de valores para essa anto- logia ideal que esta por fazer. Hé demasiada confusio, demasiados mal-entendidos neste terreno. Enquanto of ccontistas levam adiante sua tarefa, j4 € tempo de se fa. Jar dessa tarefa em si mesma, A margem das pessoas ¢ das nacionalidades.(E preciso chegarmos a ter uma idéia viva do que 6 0 conto, c isso é sempre dificil na medida fem que as idéias tendem para o abstrato, para a desvi- talizagdo do seu contetido, enquanto que, por sua vez, 8 vida rejeita esse lago que a conceptualizacao Ihe quer atirar para fixé-la e encerré-la numa categoria Mas se ‘io tivermos uma idéia viva do que 6 contovteremos Perdido tempo, porque um conto, em ditima anélise, se ‘move nesse plano do homem onde a vida e @ expresséo eserita dessa vida travam uma batalha fraternal, se me for permitido o termo; ¢ o resultado dessa batalha € 0 Préprio conto, uma sintese viva ao mesmo tempo que ‘wma vida sintetizada, algo assim como um tremor de 150 Agha dentro de um cristal, uma fugacidade numa per- manéncia. $6 com imagens se pode transmitir esse al- quimia secrela que explica a profunda ressonineia que uum grande conto tem em n6s, € que expjica também por ‘que hé to poucos contos verdadeiramente grandes, Para se entender o caréter peculiar do conto, cc tuma-se comparé-lo com 0 romance, género muito mai? popular, sobre o qual abundam as preceptisticas. Assi nala-se, por exemplo, que o romance s¢ desenvolve ma re, potato, no tempo de lets, sm ous I Fs gus oexpotumooto da ala romaceada por son vez, 0 conto parte da nogéo de limite, e, em primeizo lugar, de limite fisico, de tal modo que, na Franca, quando um conto ultrapassa as vinte péginas, toma jé co nome de nouvelle, género a cavaleiro entre o conto & © romance propriamente dito, Nesse sentido,{o romance” © 0 conto se deixam comparar analogicamente com o cinema e a fotografia, na medida em que um filme € em ptinefpio uma “ordem aberta”, romanesca, enquan- to que uma fotografia bem realizada pressupée uma jus ta Bautagdo.prévia, imposta ean per pelo reduiuo campo que a cimara sbrange ¢ pela forma com que fotbgrafo utiliza esteticamente essa nasi Nao sei ‘se 08 senhores terio ouvido um fotégrafo sional falar da sua propria arte; sempce me surpreenden que ‘se expressasse tal como poderia fazé-lo um contista em muitos aspectes. Fotégrafos da categoria de um Cartier- Bresson ou de um Brassaj definem sua arte como um aparente paradoxo: 0 de recortar um fragmento da rea- lidade, fixando-Ihe determinados limites, mas de tal modo gue ei recorte fue como une explo, gut tbra de par em par ue reulidade muito ta angie, ‘como uma visio dinémica que transcende espiritual. mente 0 camgo abrangido pela cémara. Enquanto no Cinema, como no romance, eapagio dese easase mais ample e multiforme & alcangada mediante o de- Senvolvimento de elementos parca, acumlavos que ‘ndo excluem, por certo, uma sintese que dé o “climax” da obra, una fotografie ou oun cote de grande gon lidade se procede inversamente, isto 6, 0 fotdgrafo ou 0 contisinsentam necestdade de esclher & Uta roa imagem ou um acontecimento que sejam signification que néo 86 valham por si mesmos, mas também sejam apazs de atu no specador ou ne lr come tam 1st tT espécie de abertura, de fermento que projete a inteli- sgéncia e a sensibilidade em diregdo a algo que vai muito além do nto visual ou literério contido na foto ‘ou no conto.(Um escritor argentino, muito amigo do ME que nesse combate que se trava entre lum texto apaixonante ¢ o leitor, o romance ganhe sem Pre por pontos, enquanto que o conto deve ganhar por ‘knock-out. & verdade, na medida em que o romance facumula progressivamente seus efeitos no leitor, enquan- to que um bom conto ¢ incisivo, mordente, sem trégua| desde as primeiras frases, Nao s¢ entenda isto demasia- do literalmente, porque o bom contista € um boxeador muito astuto, © muitos dos seus golpes iniciais podem parecer pouco eficazes quando, na realidade, estio mi- nando jé as resistincias mais sblidas do adversério. ‘Tomem os senhores qualquer grande conto que seja dé sua preferéncia, e snalisem a primeira pigina. Surpre- ender-me-ia se encontrassem elementos gratuitos, mera ‘mente decorativos. O contista sabe que no pode pro- Ceder scumulativamente, que néo tem o tempo por alia 40; seu tinico recurso & trabalhar em profundidade, ver calmente, seja para cima ou para baixo do espaco Werérioc JE isto que assim expresso parece uma met fora,’ exprime, contudo, o essencial do método. © tem> PO € 0 espaco do conto tém de estar como que conden sados, submetidos a uma alta pressio espiritual e for. mal pata provocar essa “abertura” a que me referia antes, Basta perguntar por que determinado conto. é ‘uim. Néo é ruim pelo tems, porque em literatura nflo ‘hd temas bons nem temas ruins, hé somente um trata- ‘mento bom ou ruim do tema, Também néo é ruim por. ‘que 0s personagens caregam de interesse, jé que até Uma pedra ¢ interessante quando dela se ocupam um Henry James ou um Franz Kafka. Um conto 6 ruim quendo é escrito sem essa tensto que se deve manifestar desde as rimeiras palavras ou desde as primeiras cenas. Eas. sim podemos adiantar jé que as nogées de significacio, de intensidade e de tenséo ho de nos permitir, como Se vers, aproximarmo-nos melhor da propria estrutura 0 conto. Diafamos que o contista trabalha com um material ‘que qualificamos de significativo. O elemento significa- {io do conto pareceria residir principalmente no seu tema, no fato de se escolher um acontecimento real ou 452 ficticio que possua essa misteriosa propriedade de irra- diar alguma coisa para além dele mesmo, de modo que sum vulgar episédio doméstico, como odorre em tantas admiréveis narrativas de uma Katherjne Mansfield ou de um Shervood Anderson, se converta no resumo im- placével de uma certa condigio humana, ou no simb candente de uma ordem social ou hist6rica. Um cont signifcativo quando quebra seus préprios limites com ‘essa explosto de energia espiritual que ilumina brusea- mente algo que vai muito além da pequena e &s vezes miserivel histéria que conta. Penso, por exemplo, n0 tema da maioria das admiréveis nerrativas de Anton ‘Tehecov. Que hé ali que no seja tristemente cotidiano, mediocre, muitas vezes conformista ou inutilmente re bbelde? O que se conta nessas narrativas € quase o que, quando crianzas, nas enfadonbas tertilias que deviamos compartilhar com os mais velhos, escutévamos nossas avs, ou nossas tias contar; a pequens, insignificante crOnica familiar de ambigtes frustrades, de modestos dramas locais, de angistias 8 medida de uma sala, de lum piano, de um ché com doves. E, contudo, os contos de Katherine Mansfield, de Tehecov, séo significativos, alguma coisa estala neles enquanto os lemos, propon- do-nos uma sspécie de ruptura do cotidiano que vai muito além do argumento. Os seahores jé terfo. perce- ido que ess signiticaggo misteriosa nfo reside so- ‘mente no tems do conto, porque, na verdade, a maioria dos contos ruins, que todos nés'jé lemos, contém epi- s6dios similares ‘aos tratados: pelos autores citados: & idéia de signiticagéo nao pode ter sentido se nfo a rel sionarmos com as de intensidade e de tenslo, que jé io se referem apenas ao tema, mas ao tratamento lite Tério desse tema, & téonica empregada para desenvol- vélo, E € aqui que, bruscamente, se produz a distingso entre © bom ¢ © mau contiste. Por isso teremos de nos deter com todo o cuidado possivel nesta encruzilhada, para tratar de entender um pouco mais essa estranha forma de vide que 6 um conto bem realizado, e ver por que esté vivo enquanto outros que, apareniementer a le se assemeliam, ndo passam de tinta sobre o papel, alimento para o esquecimento. ‘Vejamos a questio do Angulo do contista e, neste caso, obrigatoriamente, da minha prOpria versio do as ‘unto, Um contista é um homem que de repente, rodea- 4153 do pela imensa algeravia do mundo, comprometido em maior ou menor grau com a realidade hist6rica que o contém, escolhe um determinado tema e faz.com ele um conto. Esta escotha do tema no & to simples. As vezes © contista escolhe, e outras vezes sente como se 0 tema se Ihe impusesse irresistivelmente, o impelisse a escre~ vélo|\No meu caso, a grande maioria dos meus cont a ‘como'se eu. nfo fosse mais que um meio pelo qual passava e se manifestava uma forga alheia. ‘Mas isto, que pode depender do temperamento de ca ‘um, néo altera o fato essencial: num momento dado ‘hd tema, jé seja inventado ou escolhido votuntariamente, ou estranhamento imposto a partir de um plano onde nada 6 definivel. HA tema, repito, e esse tema vai se tornar conto, Antes que isto ocorra, que podemos dizer do tema em si? Por que este tema ¢ nio outro? Que raz6es levam, consciente ou inconscientemente, 0 con- jsta_a escolher um determinado tema? ece-me que o tema do qual sairé um bom conto & skimpre excepcional, mas nfo quero dizer com isto que um tema deva ser extraordinétio, fore do comum, rmisterioso ou insélito. Muito pelo contrério, pode tra- tar-se de uma histOria perfeitemente trivial e cotidiana, © excepcional reside numa qualidade parecida a do ‘ima; um bom tema atrai todo um sistema de relagées conexas, coagula no autor, e mais tarde no leitor, uma imensa quantidade de nocées, entrevisbes, sentimentos © até idéias que the flutuavam virtualmente na meméria ou na sensibilidade; um bom tema 6 como um sol, um astro em torno do qual gita um sistema planetétio de que muitas vezes no se tinha consciéncia até que o Contista, astrénomo de palevras, nos revela sua exis- ‘tenciZ] Ou entdo, para sermos mais modestos © mais atuaig, a0 mesmo tempo um bom tema tem algo de sistema at6mico, de nicleo em tomo do qual giram os elétrons; e tudo isso, afinal, néo € jé como uma propo- siglo de vida, uma dindmica que nas insta a saismos de ‘nds mesmos ¢ a entrarmos num sistema de relagées mais complexo ¢ mais belo? Muitas vezes tenho-me pecgun~ tado qual seré a virtude de certos contos inesqueciveis. Na ocasiio os lemos junto com muitos outros que in- clusive podiam ser dos mesmos autores. E eis que os 154 anos se passaram’e vivemos ¢ esquecemos tanto; mas ssses pequencs, insgnficantes contos, estes gros, de arcia no ‘mar da literatura continuam af, palpi- tando em nés, Nao € verdade que cada’um tom sua répria colegio de conot? Bu tenho pina © podeia citar alguns nomes. Tenho “William Wilson", de Edgar A. Poe, tenho “Bola de Sebo”, de Guy de Maupassant. s pequenos planetas giram e giram: af esté “Uma Lem-* branga de Natal”, de Truman Capote, “Tin”, “Ugbar”, “Orbis”, “Tertius”, de Jorge Luis Borges, “Um Sonho Realizado” de Juan Carlos Onett, “A Morte de Ivan lich”, de Toktéi, “Fifty Grand”,'de Hemingway, “Os Sonhadores”, de Isak Dinesen, ¢ assim poderia continuar continuar... Os senhores jé terdo advertido que nem todos estes cottos sio obrigatoriamente antol6gicos. Por que perduram na meméria? Pensem nos contos que nfo poderam esquecer ¢ verdo que todos eles tém a mesma ‘caracteristica:(s4o aglutinantes de uma realidade infini- ‘tamente mais Vasta que a do seu mero argumento, e por isso influfram em nés com uma forea que nos faria sus- ppeitar da modéstia do seu conteddo aparente, da brevi- dade do seu texto} E esse homem, que num determinado ‘momento escolhe'um tema t faz, com ele um conto, ser& ‘um grande contista se sua escolha contiver — as vezes sem que ele o saiba conscientemente — essa fabulosa abertura do pequeno para o grande, do individual ¢ ‘circunscrito para a esséncia mesma da condigéo huma- na. Todo conto perdurével € como a semente onde dor- me 2 drvore gigantesca. Essa érvore cresceré em n6s, inscreveré seu nome em nossa meméria. ‘Entretanto, é preciso aclarar melhor esta nogéo de temas significativos. [Um mesmo temfa pode ser profundamente sigoifi- cativo para um esctitor, ¢ anédino para outro; um ‘mesmo tema despertaré enormes ressondncias num leitor © deixaré indiferente a outro. Em sume, pode-se dizer que nfo hé temas absolutamente significativos ou abso- Tutamente insignificantes. O que hé € uma alianga mis- teriosa © complexas entre certo escritor e certo tema num momento dado, assim como a mesma alianga po- derd logo entre certos contos ¢ certos leitores.)Por isso, quando dizemcs que um tema 6 significativo; como no caso dos contos de Tchecov, essa significagao se ve de- terminada em certa medida’ por algo que esté fora do 155 tema em si, por algo que esté antes e depois do tema. © que esté antes € 0 escritor, com a sua carga de valores ‘humanos ¢ literérios, com a sua vontade de fazer uma cobra que tenha um sentido; o que esté depois é 0 tra- tamento literério do tema, a forma pela qual o contista, em face do tema, o ataca ¢ situa verbal ¢ estilisticamente, ‘estrutura-o em forma de conto, projetando-o em wiltimo termo em dirego a algo que excede o proprio conto, Agui me parece oportuno mencionar um fato que me ccorre com freqiéncia ¢ que outros contistas amigos conhecem t&o bem quanto eu. E comum que, no curso de uma conversa, elguém conte um epissdio divertido ‘ou comovente ou estranho e que, dirigindo-se logo 20 ccontista presente, the diga: “‘Ai tem voc® um tema for- midével para um conto; the dou de presente”. J4 me presentearam assim com uma porgio de temas ¢ sempre Tespondo amavelmente: “Muito obrigado”, e jamais es- revi um conto com qualquer deles. Contudo, certa vez ‘uma amiga me contow distraidamente as aventuras de uma criada sua em Paris. Enquanto ouvia a narrativa, senti que isso podia chegar e sex um conto, Para ela esses episddios nfo eram mais que histérias curiosas; para mim, bruscamente, se impregnavam de um sentido que ia muito além do seu simples e até vulgar conteddo. Por isto, toda vez que me perguntam: “Como distin- guir entre um tema insignificante — por mais divertido ‘ou emocionante que possa ser — e oittro significativo?, respondo que 0 escritor 6 0 primeiro a softer esse efeito indetinivel mas avassalador de certos temas, e que pre- cisamente por isso é um escritor. Assim como para Mar- ‘cel Proust o sabor de uma madeleine molhada no ché abria subitemente um imenso leque de recordagSes apa- rentemente esquecidas, de modo andlogo o esctitor reage diante de certos temas, da mesma forma que seu conto, mais tarde, fard reagir 0 leltor. Todo conto é assim predeterminado pela aura, pela fascinagdo irre- sistfvel que o tema cria no seu etiador. Chegamos assini ao fim desta primeira etapa do nascimento de um conto ¢ tocamos o umbral da sia criaglo propriamente dita. Eis af 0 contista, que esco- Thew um tema, valendo-se dessas sutis antenas capazes de Ihe permitir reconhecer os elementos que logo have- Hio de se converter em obra de arte, O contista esté iante do seu tema; diante desse embrifo que jé 6 vida 456 (reece eee mas que nfo adquiriu ainda sua forma definitiva, Para cle esse tema tem sentido, tem significacio, Mas se tudo se reduaisse a isso, de pouco serviria; agora, como ‘iltimo termo do processo, como juiz vel, est esperando 0 leitor, 0 elo final do 0 criador, 0 ccumprimento ou 0 fracasso do ciclo, E & entéo que o conto tem de nascer ponte, tem de nascer passagen, de dar o salto que projete a significacio inicial, des- ccoberta pelo eutor, a esse extremo mais passivo e menos vigilante ¢, muitas vezes, até indiferente, que chamamos. leitor/Os contistas inexperientes costumam cair na ilu- so d€ imagirar que thes bastard escrever chi ¢ fluen- temente um tema que os comoven, para comover por seu. turno os Ieitores. Incorram na’ ingemuidade daquele que acha belissimo o préprio filho e d4 por certo que (08 outros 0 julguem igualmente belo. Com o tempo, ‘com 0s fracastos, o contista, capaz de superar essa pri- ‘meira etapa ingénua, aprende que em literatura no va- Jem as boas intengSes.[Descobre que para voltar a criar no leitor essa gue levou a ele proprio a escre- ver 0 conto, é necessério um offcio de escritor, ¢ que ese offcio coasiste entre multas outras coisas em con- seguir esse clima préprio de todo grande conto, que obriga a continuar lendo, que prende a atengSo, que isola o leitor de tudo 0 que o rodeia, para depois, ter- minado 0 conto, voltar a pd-lo em contacto com o am- biente de uma maneira nova, enriquecida, mais pro- funda e mais ela. E 0 Gnico modo de se poder conse- Buir esse seqtestro momentineo do leitor é mediante ‘um estilo baseado na intensidade ¢ na tensio, um estilo ‘no qual os elementos formais e expressivos se ajustem, sem a menor soncessto, & indole do tema, the déem a forma visual 3 auditiva mais penetrante e original, 0 tornem ‘nico, inesquecivel, o fixem para sempre ‘no seu tempo, no'seu ambiente e no seu sentido primordial. © que chamo intensidade num conto consiste na elimi- nhagdo de todas as idéias ou situacées intermédias, de todos 05 recheios ou fases de transico que o romance permite ¢ mesmo exige,]Nenhum dos seahores teré es quecido "O Tonel de Amontillado”, de Edgar Poe. extraordinério deste conto € a brusca renincia @ toda descrigfo de ambiente. Na terceira ou quarta frase esta~ mos no coragio do drama, assistindo ao cumprimento implacével de uma vinganga. “Os Astassinos”, de He- 157 mingway, 6 outro exemplo de intensidade obtida me- diante 2 eliminacio de tudo 0 que nfo convirja essen- cialmente para o drama. Mas pensemos agora nos con- tos de Joseph Conrad, de D. H. Lawrence, de Kafka, ‘Neles, com modalidades t{picas de cada um, a intensi- dade 6 de outra ordem, ¢ prefiro dar-lhe 0 nome de tenséo, E uma intensidade que se exeres na meneire pela qual o autor nos vai aproximando leatamente do que conta. Ainda estamos muito longe de saber 0 que vai ccorrer no conto, e, entretanto, nfo nos podemos sub- trair A sua atmostera. No caso de “O Tonel de Amon- tillado” ¢ de “Os Assassins”, 0s fatos, despojados de toda preparagSo, saltam sobre nés © nos agarram; em toca, numa narrativa demorada e caudalosa de Henry James — “A Ligo do Mestre”, por exemplo — sente-se de imediato que os fatos em si carecem de importhncia, que tudo esté nas forgas que os desencadearam, na ‘malha sutil que os precedeu ¢ os acompanha. Mas tanto a intensidade da ago como a tensKo interna da narra- tiva sio 0 produto do que antes chamei o oficio de excritor, ¢ 6 aqui que nos vamos aproximando do final deste passeio pelo conto. Em meu pafs, © agora em Cuba, tenho podido ler contos dos mais variados auto- res: maduros ou jovens, da cidade e do campo, dedica- dos a literatura por razies estétices ou por imperatives sociais do momento, comprometidos ou nfo compro- metidos. Pois bem, embora soe a trufsmo, tanto na ‘Argentina como aqui os bons contos tém sido eseritos pelos que dominam o offcio no sentido jé indicado. ‘Um exemplo argentino esclareceré melhor isto. Em nossas provincias centrais e do Norte existe uma Tonga tradigéo de contos orais, que o: gatichos se trans- mitem de noite & roda do fogo, que 08 pais continuam contando aos filhos, ¢ que de repente passam pela pena de um escritor regionalista e, na esmagadora maioria dos casos, se convertem em péssimos comtos. O que su cedeu? A$ narratives em si $80 saboroses, traduzem € resumem a experitneia, 0 sentido do humor e o fata lismo do homem do cainpo; alguns se clevam mesmo & dimensio trigica ou poftica. Quando os ouvimos da boca de um velho gasicho, entre um mate ¢ outro, sen- ‘mos como que uma anulagdo do tempo, e pensamos ‘que também os aedos gregos contavam assim as faga- 158 mp cg thas de Aquiles para maravilha de pastores ¢ viajantes, Mas nesse memento, quando deveria surgir um Homero que fizesse uma Ifada ou uma Odisséin dessa soma de tradigdes orais, em meu pafs surge ym senhor para quem a cultura das cidades ¢ um signd de decadéncia, para quem os contisas que todos nés amamos so este. as_que escreveram para o mero deleite de classed sociais liquidedas, ¢ esse senhor entende, em troca, que para eserever um conto a tinica coisa que faz falta & registrar por escrito uma narrativa tradicional, conser- vando na medida do poss{vel o tom falado, os torneios do falar rural, as incorregdes gramaticais, isso que cha- ‘mam a cor local. Néo sei se essa maneira de escrever ‘contos populares & cultivada em Cubs; oxald nfo seja, porque em meu pafs nfo deu mais que indigestos volu- ‘mes que no interessam nem aos homens do campo, que preferem continuar ouvindo os contos entre dois tragos, nem aos leitores da cidade, que estario em franca deca- ddéncia, mas nio deixaram de ler bem lidos os cléssicos do género. Em compensago — ¢ refiro-me também & Argentina — tivemos escritores como um Roberto J. Peyr6, um Ricardo Gtliraldes, um Horacio Quiroga ¢ uum Benito Lynch que, partindo também se temas mui- tas vezes tradicionais, cuvidos da boca de velhos gatichos como um Dom Segundo Sombra, souberam potenciar esse material ¢ tornélo obra de arte. Mas Quiroga, Gtli- raldes © Lynch conbeciam a fundo 0 aficio de escrtor, isto €, 56 aceitavam temas significativos, enriquecédores, assim como Homero teve de pér de lado uma porgio de epis6dios bélicos e migicos para nfo deixar senfio aque- Jes que chegaram até nés gragas & enorme forca mitica, 4 ressonfincia de arquétipos mentais, de horménios psf- quicos como Ortega y Gasset chamava os mitos. Quiro- 2, Giliraldes e Lynch eram escritores de dimensio ‘universal, sex. preconceitos localistas ou étnicos ott po- plistas; por ‘850, além de escolherem cuidadosamente 06 temas de suas narrativas, submetiam-nos a uma for- ‘ma literéria, ¢ tinica capaz de transmitir ao leitor todos (08 valores, tado 0 fermento, toda a projeco em pro- fundidade 'e em altura desses temas. Escreviam tensa- ‘mente, mostravam intensamente,[Nao hé ontro modo para que um conto seja eficaz, faca alvo no leitor © crave fem sua meméria:] 159 (© exemplo que acabo de dar pode ser de interesse para Cuba, B evidente que as possibilidades que a Re- Volugo oferece a um contista so quase infinitas. A cidade, 0 campo, a uta, o trabalho, os diferentes tipos paicol6gicos, os conflitos de ideologia, de caréter; € tudo isso como que exacerbado pelo desejo que se vé nos senhores de atuarem, de se expressarem, de se co- municarem como nunca puderam fazer antes. Mas tudo isso como hd de ser traduzide em grandes contos, em ‘contos que cheguem ao leitor com a forca e a eficécia necesséria? E aqui que eu gostaria de aplicar concre- tamente 0 que venho dizendo num terreno mais abs- ‘rato. O entusiasmo ¢ a boa vontade no bastam por si 36, como também nfo basta o offcio de escritor por si s6 para escrever contos que fixem literariamente (isto 6, na admiracfo coletive, na meméria de um povo) a grandeza desta Revolugio em marcha. Aqui, mais que em nenhuma outra parte, se requer hoje uma fussio total dessas duas forgas, a'do homem plenamente com- pprometido com sua realidade nacional ¢ mundial, ¢ a do escritor lucidaments seguro do seu oficio. Nesse sen- tido nfo hé engano possivel. Por mais veterano, por mais ‘abil que seja um contista, se Ihe faltar uma motivagio entranhével, se 0s seus contos nfo nasceram de uma pro- funda vivéncia, sua obra no ird além do mero exercicio estético. Mas 0 contrério seré ainda pior, porque de nada valem o fervor, a vontade de comunicar a men- sagem, se se carecer dos instrumentos expressivos, esti- Isticos, que tornam possivel essa comunicagto. Neste ‘momento estamos tocando 0 ponto crucial da questio, Creio, © digo-o apés ter Tongamente todos os elementos que entram em jogo, que eserever para uma revolugéo, que escrever revolucionariamente, néo sig- nifica, como créem muitos, escrever obrigatoriamente acerca da prépria revoluglo. Jogando um pouco com as palavras, Emmanuel Carballo dizia aqui hé alguns dias que em Cuba seria mais revolucionério escrever Contos fantésticos do que contos sobre temas revolucio- nétios. Por certo a frase exagerada, mas produz uma impaciéncia muito reveladora{Quanto a mim, creio que © escritor revoluciondrio ¢ aquele em que se fundem indissoluvelmente @ consciéacia do seu livre compro- isso individual e coletivo, ¢ ssa outra soberana liber- dade cultural que confere o pleno dominio do offciS7Se 160 esse escrito, responsével ¢ IGcido, decide escrever lite- ratura fantéstica, ou psicol6gica, ou voltada para o pas- sado, seu ato € um ato de liberdade dentro da revolugéo €, por isso, € também um ato revolycionério, embora S248 contos nfo se ocupem das fordfas individuais ou coletivas que adota a revolugio. Contrariamente ao, treito critério de muitos que confundem literatura com pedagogia, literatura com ensinamento, literatura com doutrinagio ideol6gica, um escritor revolucionério tem todo 0 direto de se dirigir a um leitor muito mais com- plexo, muito mais exigente em matéria espiritual do que imaginam os escritores ¢ os criticos improvisados pelas circunstincias ¢ convencidos de que seu mundo pessoal 60 tinico mundo existente, de que as preocupagtes do ‘momento sio as tinicas preocupacées vélidas. Repita- ‘mos, aplicando-a 20 que nos rodeia em Cuba, a admi- rével frase de Hamlet a Horécio: “Hé muito mais coi- sas no cfu e na terra do que supbe tua filosofia...” E pensemos que no se julga um escritor somente pelo tema de seus contos ou de seus romances, mas, sim, por ‘sua presenga viva no seio da coletividade, pelo fato de que © compromisso total da sua pessoa é uma garantia insofismével da verdade ¢ da necessidade de sua obra, por mais alheia que esta possa parecer A vista das cir” cunstincias Yo momento. Essa obra nfio é alheia a re- Volugio por néo set acessivel a todo © mundo. Ao con Itério, prova que existe um vasto setor de leitores em potencial que, num certo sentido, estio muito mais separados que'o esctitor das metas finais da revolucéo, dessas metas de cultura, de liberdade, de pleno gozo da condi¢o humana que os cubanos se fixaram para admi- rao de todos os que os mam © os compreendem. Quanto mais alto apontarem os escritores que nasceram para isso, mais altas serdo as metas finais do povo a que ertencem. Cuidado com a fécil demagogia de exigit luma literatura acesstvel a todo © mundo. Muitos dos que a apéiam ndo tém outra razo para fazt-lo senfio a da sua evidente incapacidade para compreender uma I- teratura de maior alcance. Pedem clamorosamente te- ‘mas populares, sem suspeitar que muitas vezes 0 leitor, por mais simples que seja, distinguiré instintivamente entre um conto mais dificil © complexo, mas que o obrigaré a scir por um momento do seu pequeno mun- do circundante ¢ The mostraré outra coisa, seja o que 161 for, mas outra coisa, algo diferente, Nao tem sentido falar de temas populares a seco. Os contos sobre temas populares 36 sero bons se se ajustarem, como qualquer Outro conto, a essa exigente € dificil mecfinica interna que procurimos mostrar na primeira parte desta pa- lestra. Faz anos tive a prova desta afirmagio na Ar- gentina, numa roda de homens do campo 2 que assis- tiamos ‘uns quantos escritores. Alguém leu um conto baseado num epis6dio de nossa guerra de independén- cia, escrito com uma deliberada simplicidade para pé-lo, como dizia o autor, “no nivel do camponés”. A narra tiva foi ouvida cortesmente, mas era fécil perceber que nfo havia tocado fundo. Em seguida um de nés leu A pata do macaco, 0 conto justamente famoso de W. W. Jacobs. O interesse, a emogdo, o espanto e, finalmente, © entusiasmo foram extraordinérios, Recordo que pas- samos o resto da noite falando de feitigaria, de bruxas, de vingangas diabélicas, E estou seguro de que 0 conto de Jacobs ‘continua vivo na lembranga desses gaichos analfabetos, enquanto o conto pretensamente popular, fabricado para eles, com 0 vocabulério, as aparentes possiblidades imtelectuais e os interesses patristicos de- les, deve estar to esquecido como o escritor que o fabri- cou. Eu vi a cmogéo que entre gente simples provoca uma representacko de Hamlet, obra dificil sutil, se existem tais obras, ¢ que continua sendo tema de’ es- tudos eruditos ¢ de infinitas controvérsias. B certo que essa gente nfo pode compreender muitas coisas que apaixonam os especialistas em teatro isabelino. Mas que importa? $6 sua emogo importa, sua maravilha © seu arroubo diante da tragédia do jovem principe dinamar- qués. © que prova que Shakespeare escrevia verdadci- Tamente para o povo, na medida em que seu tema era profundamente significativo para qualquer um — em Siferentes planos, sim, mas atingindo um pouco de cada um — ¢ que o tratamento teatral desse tema tinha a intensidade propria dos grandes escritores, gracas & qual se quebrar as barreiras intelectusis aparentemente mais rigidas, © 0s homens s¢ reconhecem e confraternizam ‘num plano que esté mais além ou mais aquém da cul- tura. Por certo, seria ingénuo crer que toda grande obra possa set compreendida e admirada pela. gente simples; ndo 6 assim e no pode sé-lo. Mas a admiragio ‘ue provocam as tragédias gregas ou as de Shakespeare, 162 ama uspelta- rem de que sua nopo de povo € pércial, injusta e, em \iltimo termo, perigosa. N&o se faz favor algum a0 povo ses he pope a Tiere que le poss agar sem esforgo, passivamente, como quem Vai 20 ci Contos © romances que conteré, transmudada ao plano estético, eternizada na dimenséo intemporal da arte, sua sgesta revclucionsria de hoje, Mas estas obras nfo terfo sido escritas por obrigaeio, por mandado da hora. Seus temas nascerfio quando for 0 momento, quando o escri- tor sentir que deve plasmé-los em contos ou romances (ou pecas de teatro ou poemas. Seus temas conterio luma mensagem auténtica e profunda, porque nfo terdo sido escolhides por um imperativo de caréter didético ou proselitista, mas, sim, por ume irresistivel forca que se impord ao autor, ¢ que este, apelando para todos os Feeurgos de sua arte ¢ de sua técnica, sem sacrificar nada a ninguém, haverd de transmitir ao leitor como se {ransmitem as coisas fundamentais: de sangue a sangue, de mio a mio, de homem a homem. 163

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