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3. Os desafios da informatizagaio Eq nossas peregrinagées de ser, nao ser e vir a ser, sentimos, a cada passo, uma diferenga entre realidade e realizagdo. Nao se trata de fato entre fatos, nem de coisa entre coisas, seja dada, feita ou pronta, seja deste ou de outro mundo. Trata-se da estranheza constitutiva e do de- safio préprio da existéncia histériea dos homens. A reall dade é sub-repticia. Sua vigéncia nunca 6 direta. Seu im- pacto 6 sempre obliquo. A realidade se dé, como realiza- co, na medida e enquanto se retrai, como subtragio. Ora, dar-se enquanto se retrai, apresentar-se na auséncia, man- ter-se vigente na falta, ¢ o vigor proprio da realidade. Questionar os desafios da informatica exige pensar o vigor da realidade realizando-se na informatizacio. ‘A forca e 0 modo de ser de uma sociedade se defi- nem pela integragio da identidade e diferenga dentro do, movimento deste vigor. A existéncia histérica é a, viagem {que os homens fazem entre realidade e realizagio. Para realizar-se, € ao realizar-se, 0 homem irrompe na total. ‘dade do real, e nesta irrupgio se instalam nfveis e limites 'de relacionamento com tudo que se da e se retrai, Em \iua ist ja home realiza de algum modo todas~a8 pete ap ig Impulsionado pelo impacto obliquio da realidade, consiré| sun oxistOneln_num. contacto. .dlreto__da...agie 1 J transformadora do trabalho “= Fealizacbes. SS ,Soreas y istoricas sig as vicissitudes des! actor Sbiiqua.e . \y PES Tens (RR ae ROO BT aay Ve x provocadas nos contactos com as realizacdes pelo impactoy da realidade, Na_mira de suas relacdes, 0 homem nunca consegue ter_a realidade* S6 realizagdes servem de alvo @ suas acdes. Para fazer histéria, o homem é feito pela histéria, Por isso no 18 Brumdrio de Luis Bonaparte, lem. rou Marx aos revolucionérios de ontem, de hoje e de amanha a dialética, t4o citada, mas pouco pensada, do passado e do futuro vigentes na dinamica do presente. Escreve Marx: Os homens fazem a histéria, mas nfo a fazem diseri- cionariamente nas condigdes por eles mesmos escolhi- das e, sim, nas condigdes dadas e herdadas do passa- do. A tradicao de todas as geracdes mortas pesa com grande peso no cérebro dos vivos. © homem 6, pois, uma realizacio que, diretamente, s6 alcanca outras realizagdes e jamais atinge a realidade. Mas as vezes produz realizagées privilegiadas, realizacdes que parecem abolir as diferencas da temporalidade. dao_acesso, embora indireto e obliquo, ao desafio repticio da realidade. Sao as criagées, as descobertas, as inveng6es. Em seu envio se encontram momentos inten- sos de uma temporalidade nao apenas povoada de realiza- Ges, mas sobretudo integrada pela realidade em retracio. A experiéncia histérica deste retirar-se se dd numa aventura e € toda um salto no escuro. O instante de in- vengaio nfo apenas nao se repete, como nunca se aprende. Todo instante se improvisa num risco e se arrisca numa improvisagao. O instante de risco e improvisagio se pro- de hoje nas experiéncias, tensdes e impuisos de uma ver- dadeira passagem histérica, com todas as insegurangas, hesitagdes e ansiedades, mas também com toda ousadia, aventura e o fascinio de toda passagem. O século XX é um século vespertino e o homem de hoje, um homem de transig&o. Dele valem as palavras de Zaratustra:*‘Q gran- de_no homem é ser _ele uma ponte e Século vespertino 6 um século de acumulagéo e esva- ziamento, onde afazeres, relacionamentos, conquistas, re-_ 92 cursos, instituigdes, grupos, individuos, tudo enfim é pro- tegido & favorecido, mas 4s custas da originalidade de | suas yealizagdes. Impera por toda parte um vazio satu- | yado pelas dependéncias de ter e nao ter. Em compen- | gagio, mobilizam-se as forgas da grandeza humana e cres- | . cem o empenho de descer e as tentativas de passar. Num século vespertino o homem é transitivo. SO fala do pas- sado dirigindo-se para 0 futuro, em sintonia com 0 que i| esté por vir. A provocagéo para pensar, gue nos traz_ ho; ica, a avalanche da informatica, ide na _ambivaléncia_v | “pertina, concentra-se_na_ambigi ‘idade transitiva da matizagio. Numa famosa poesia dos Ditirambos de Dioniso, de 1988, Nietzsche opde as composices da informitica as po- sigdes do pensamento, nas seguintes palavras: Die Wiiste wiichst, “o deserto cresce”, weh dem, der Wiisten birgt, “ai de quem guarda dentro de si desertos!” A esséncia do_ deserto esta na desolagio, o vigor de_um_deserto.se_ “pela capacidade de assolar. Desolar € pior do que -quilar,-assolar_é mais radical.do que destruir. © aniquila- > |mnento acaba apénas com o que ja existe, enquanto a_de- { acd; conservando”o”existente, acaba com as possibili- \Vjades de~criar, finda com as condigdes de libertar-se. A lGestriicao” elimina o que 6, desfaz o que foi, apaga Os 'tragos do que sera, enquanto, mantendo os seres, 0 asso- lamento_retira as virtualidades da criagao.\Com a infor- [mitica cresce o deserto de assolamento e desolacdo. Mas nfio cresce apenas a desolacio e o assolamento. Pois é a propria informatizacio que nos impGe pensar os desafios da informatica e exige de nés assumir a radicalidade de suas transformagées. sews ey “> Y Ppa gt Cada vez mais circulamos em circuitos integrados de larga escala. O cilicio que hoje nos ameaga, é de silicio. desafio, que hoje nos atinge, provém de uma autodr informacional. A informatica se torna um rolo compres: sor, Em seu tropel a sociedade rola de alto a baixo. Tudo se processa. Por toda parte opera um micro. Nenhuma,, tradigdo parece poder ‘resistir & atropelada_d o.. As novas geragdes de computadores prome-'\ tem face pata tudo. Aumenta sem cessar o numero dos’pefiféricos. Pois-o grande periférico visado é 0 ho- mem que espera o inesperado. Pois neste caso, nada po- \ deré fugir & informatizacao. an OS 93, nie Aa te) Mi obberno Sc ypree ALE] Gree 09% CalOz ergy pen gune Co altro) ® & Mas 0 que 6 isso, informatizar? g Para o Pensamento, informatizar no é 0 verbo que ? 2 designa os fatos e feitos da informatica. Nao nos remete Bs 3 apenas para o funcionamento de ferramentas e aparelhos, a & nao se refere a dispositivos de processamento ou a ins- iS z . talagdes de computagio, com todas as mudangas que acar- 7 “S retam. A informatizagio nfo é o resultado da expansio ,, 2 = mundial de uma parte, de sorte que a totalidade resul- 4 %y > tante_ fosse 0 todo de uma parcialidade Sorat SQ 3 3 % se, reduz a transferir « determinada ‘integracio, 4 ¢ para todas 7 | eesso_meta- matizagdo e por ela, 0 poder de organizagao da Hi <> do Ocidente se torna planetario. -A_dicotomia-de-teoria. e pratica, de_mundo_paciente_de_ objetos e mundo_agente S_yal_sendo superada numa composicéo absor- vente ela se complementam, numa equivaléncia de | constituicao reciproca, 0 sujeito e 0 obieto, o espirito e : | a -matéria, a jnformscie € 0 conhecimento, 0, mundo. dos 1 O pessimismo e 0 otimismo se transformam em catego- rias inofensivas para classificar irmios de uma mesma familia. Sendo um verbo dejesséncia informatizar nos p! Por isso n&o indica primordialmente o processamento au- tomatico de conjunturas, mas um processo autocratico de estruturacao, que tudo aplana, tudo controla, tudo contrai ) numa composicio onipotente. A terra e 0 mundo, a his t6ria e a natureza, o ser e o nada se reduzem/a compo- H compatibilidade ‘universal; A, informatizagio 6 , dade estrutural em que todas as coisas, todas e todos , 630 promovides, mas ao mesmo tempo perdem’ sua Mberdade e fenecem em criatividade. t Youose 2 gl0 Assim, informatizar 6 um jsupermodo de organizngid \ Tanto desencadoia as forcas produtivas,| como contém 0s \, _modog de produgiio no odor _niio poder_de_umalordem ~ ! lanetaria_de_dominagiio, Os modos ciberndticos Ry “nizagéo recolhem om pondicé de toda mu uy o,f" social e de toda alcausilidado] histérica. Ora,-6T0 fluxo Q : ou 7 94, FAIDERS bo lprnsinantes NO UNDO Iyeanvenbar » gat Presse > Gers oA sun ea meth Y SIAR dbics sy Ke Dns Pros wes nds Pe ~ SUS a Doak do uma Socializagio total, 6 na avalanche de uma histo- rizagio que as|ordens simbdlicay se compdem com as jordens_pragmiéticag nas superestruturas da eutomacio. Se pensarmos, portanto, em toda a envergadura o desafio da-(informatizagad) nfo hi cegueira que nos impeca ver (hela a realizacao_da esséncia Planctarizante da técnica \ moderna, {No poder dos chips de marcro- e:micro-bytes, Hegel célebra com Marx o sistema do absoluto, quer em sua versio idealista, quer em sua versio materialista, Ea composicao final de todas as posigées e de todas as. opo- sigdes em sua dinamica de locupletacio. E a sintese es- catoldgica de todas as teses e de todas as antiteses, em sua histéria de absolutizagio. : TECNOLOAL A Teerties A informatizacio nfo 6, pois, simples efeito da infor- miatica e sua expansiio. A, informatica é que nasceu da in- formatizacio, _tario_de_realizacio. Neste “horizonte para se pensar o vigor_histéric t zacio em sua esséncia de poder, tanto para‘e Jlibertacio ¢ como_para..a.dominacio. E o horizonte da realidade em * movimento de realizagdo. Aqui no palco da histéria;.o real & ! se faz espetéculo e demonstra o potencial de suas vittua- © Owasns Aes. abrese todo um outro érico. da informati- ; eg Ct lidades de ser e parecer, de nfo ser e vir a ser. Nip x G Mas, neste caso, como informatizar chega a realizar? age STAG Te Y7O, Decerto, realizar e informatizar nfo sio a mesma pa-, lavra. Mas se nfo sio a mesma palavra, em todas as co- “"* munidades lingiiisticas em uso, pertencem & mesma lingua de origem e dizem a mesma coisa, a saber:_a-transforma- géo do real numa forma controlada de poder. Informat Zar é um neologismo derivado de informatica. para 1 desig: nar toda uma ordem de real, realizagio e realidade, ins yy taurada pelo processamento micro-eletrénico das informa‘ codes. Com os recursos denotativos e conotativos da adjeti- vacdo, substantivacio e verbalizacio, se colocou em agio nos dois eixos da modernidade, no paradigmatico e no Sintagmatico, um principio de ordem e uma forga de orga nizacéo, a que nada do mesmo nivel poderd resistir: a ( informatizacio total da sociedade. Para se avaliar a pro- fundidade das transformagées histéricas que aqui se ope- ram, deve-se levar em conta duas coisas essenciais na di- nimica de realizagio da informatica. Em primeiro lugar, a forma da informatica nao remete apenas para o &m- Ope in) . Pie rows Bh gm po AMAL artesanal das artes © oficios. Remete também para Dito armio de qualquer criagio, seja na arte, na cléncia, na industria, na organizagio ou na convivéncia, Em se. gundo lugar, @ forma da informatica indica uma estru- tura plural composta de circuitos @ programagio, De acordo com esta pluralidade se realiza uma composigéo de forma capaz de processar nao apenas dados, mas Co- nhecimentos, sistemas de relagbes. Tudo é, entao, redu. zido a formas e somente a formas. Nesta reduc&o univer. Sal a informatizago nfo apenas realiza, como, sobretudo, Sesafia em todos os niveis a criatividade e o inesperado de qualquer sociedade que se informatiza. Contra essa maneira de se pensar a esséncia da infor- matica como realizaco, e de se fazer aparecer assim os desafios de estiolamento e dominacio, que assomam & sociedade cada vez mais descartavel de hoje, costuma-se Jevantar a objecéo de instrumento e ferramenta. info: seria apenas meio para fim e, de forma’ alguma, fim em si mesma, Muito longe de realizagio, cump! ‘simples instrumentacao da sociedade e do homem. As fei /ramentas cibernéticas liberariam ambos das tarsfas si ‘balternas_de_intermediacao. ‘Com os mecanismos aplicados ‘ao_sistema de produc&9, a mecancia cldssica dispensou_a \forca_ muscular. Com os automatismos, a eletricidade pos- sibilitou 0 progresso industrial e a produtividade econd- mica. Com a automaco, a inteligéncia arificial e a robo- tizag3o, a informatica substitui, num mesmo circuito mi- croeletrénico, Prometeu e Epimeteu ao mesmo tempo, isto é, tanto as funcdes projetivas da imaginagio criadora, como as fungGes executivas da aco transformadora. Subs- tituido progressivamente em seus Orgios de esforco, obser- vacio, atencio, meméria, combinagao, invencio e decisa o homem ficaria livre para viver, sentir e criar. Esta objecdo sofre de cegueira radical. _ i A cegueira radical nfo impede ver. Ao contrério, pos| sibilita ver qualquer coisa, por ja ter reduzido tudo & formas padronizadas de visio, A_cegueira radical _s6_¢) -cega_para_a esséncia das coisas, Por isso, & objecio nfo) ¥é que nos dominios da informdiica ja nao 6 possivel se arar, nem mesmo distinguir,-melo ¢ fim, instrumentagso ‘¢tealizagéo, forma e. substancia, © homem nao vive Prt Fielto ¢ 86 depois existe. O homem niio existe primeito © ‘$0 depois faz estorco, observa, presta atengaio, memoria,’ ila, pus & . ' 9g ro @ Med Arn orncrvrne. ¢ alee, ant a howe deo eo mnt ao Ge aN combina, inventa, decide, sonte, relaciona:se.. & fazendo 4 forgo que ele existe.” observando, prestando ‘atencio] 2 memorizando, 6 combinando, inventando, é decidindo, € 7, sentindo que ele existe. Cego, portanto, e cego de cegueira € radical, 6 quem, vendo apenas formas processadas, mio ’ pode perceber a mesma realizagio superando as dicoto- mias pré-cibernéticas nas préprias diferengas cibernéticas. f t Trata-se do tipo de cegueira que o efeito de distorgao da / informatizagéo espalha por toda parte nas sociedades in-/ formatizadas. De tanto processamento automéatico j4 nao) se consegue ver os processos essenciais. Tudo perde subs- tancia e profundidade, tudo se dimensiona em formas com) funces politénicas, sejam bindrias, sejam tercidrias. Al funcionalidade se torna_um_destino_histori la furmanidade! Sag } Este efeito de distorcio, a esséncia da informatica lp 40 0 criou, mas o herdou da tatica com que a ciéncia q fe a técnica se foram impondo planetariamente desde o $e / inicio da idade moderna. As equagées: objeto = real, i objetividade = realidade, objetivismo = realizac&o, cons- s tituem imposigdes e produtos de uma equiparacio histd- ica: em todos os exercicios da modernidade se igualou saber a poder: Scire est_posse. Para vir a ser efetivamente um poder, 0 conhecimento moderno teve de fazer-se obje tivo. Para objetivar-se, teve de operacionalizar uma inter- rupedo histérica: 0 ideal de saber prémoderno tinha de ser substituido pelo ideal de saber moderno. Desde sua origem e para sua origem, esta necessidade descobriu uma maneira de impor-se ambigua e um modo ambivalente de proceder, Durante séculos, a ciéncia foi entendida pelo pensamento anacronico do ideal de saber pré-moderno. Segundo tal entendimento, também a ciéncia moderna seria uma atividade de cardter interpretativo pretendendo uma visio tedrica do real. Continuava-se assim a distin- guir teoria e prdtica, ciéncia e técnica, conhecimento e agio nas peripécias do novo desenvolvimento, Era uma tAtica eficaz para encobrir o alto prego de liberdade & realizagio que o mundo moderno haveria de pagar pelo predominio do bindmio: sujeito x objeto, em todas as 4reas da produgio histérica do ocldonto. 2 Imperialismo Romane.so construiu na forga de_uma .palayra de ordom: divide ct Imperd, Com a mesma titica, © conhecimento moderno fol. .transterindo_ a legitimidade 07 2 gat doe KE CMW do saber de aceitagio_ da realidade, —-vigente~na filosotia grega_ teologia medieval, para a_ciéncia e técnica de. ‘transformacio do real operante desde o inicio da idade~ moderna. .O positivismo comtiano, ao rejeitar a filosofia m nome da ‘ciéncia, nada mais fez do que retomar para ‘a ciéncia os ideais de que se valera até entao a filosofia para justificar-se. A rotorica da ciéncia nfo correspondia, pois, a seu efetivo exercicio. Os conceitos com que a cién- eia se interpretava a si mesma nao condiziam com a pré- tica cientifica. O que a ciéncia vinha fazendo, era de fato outra coisa do que proclamava a retérica de sua inter- pretagio de si mesma, toda louvada na linguagem filosd- fica da tradicio pré-moderna. Assim, todo um arsenal de conceitos, como teoria, verdade, conhecimento, abstracio, experiéncia, axioma, empiria, método etc. era sistemati- camente utilizado, como se 0 ideal de saber moderno, con- eretizado na ciéncia de transformacéo do real, fosse igual ou realizasse o mesmo ideal de saber, encarnado pela filo- sofia de aceitacdo da realidade. Nem se percebia que as categorias, os discursos e percursos praticados pelo pro- cessamento moderno sofrem uma distorgo de uso, sen- tido e operagdo, assumindo novas fung6es sintaticas @ car- regandose de outros desempenhos seménticos, por efeito da operacionalidade cientifica. Assim, por exemplo, pata & ciéncia, 0 uso, 0 sentido e a operacio de um termo como teoria, j4 nao sio os mesmos que lhe atribufam Plato, Aristételes ou Rogério Bacon. Nos vértices dos novos ¢o- ecimentos, a pratica cientifica nao se conforma nen se 30% como_pensavam A, Comte e seguidores, com-as Agias eos principios do empirismo filosdfico ~de“um (Wocke’e seguidores. Com a informatizacéo, o que aparece hoje cada vez mais claro, é que o conhecimento cienti- fico e as praticas técnicas nada mais tém de imediato ¢ espontaneamente real. Ao contrario, estio todos imbuidos de modelos, teorias e processamentos. Acham-se indisso- luvelmente ligados a priticas operatérias e s6 admitem, como fungio de verdade, valores operativos. hora sisto entre retérica interpretativa e exercicio efe tivo serviu, por muito tempo, de tation para impor por SPEeaaPaaIes a estratégia geral de construgio de um tos @ Ec aE feito quase que sé de sujel séoulo pee Neste horlzonte de funcionalidade, nosso torica ats Ju ¢ assiste & dontincia desta impostura his- através do desenvolvimento das ciéncias e da ox 98 ae ea x & gs * pansfio das técnicas de processamento automitico, Os cir ? s integrados de microeletrénica refletem a ciéneia e ¢ & técnica de maneira adequada & sua complementaridade y © essencial e condizente com seu efetivo exercici encial Técnica | ci@ucia_perfazem um sé processo de funciohamento. apegamso ae elforeooe, nao™apenas“ dentro das orden3, mas também entre as ordens da técnica e da ciéncia, Ja {nae-existe_distingao. Veocini agi estrutura_entre—ciéncias—naturais, pSociais -humanas ou-historicas, nem. entre_ciéncia pura ou sistemética e-aplicada,nem entre ciéncia e técnica. O que “realmente existe 6 _a_ciénciaté ca, Ol téchica- | pea encia- tecnica tecnica, . | Siencia; Na operagio dos chips aparece com toda a clareza desejavel a oposigéo dos discursos técnico-cientificos e dos percursos cientifico-técnicos a todos os demais dis- cursos e percursos possiveis. A Esséncia técnica do conhe- ~ cimento cientifico surge, entio, como alavanca de Arqui- 0 ~ \ medes, que desloca e empurra histdria abaixo a avalanche ls da informatica. A técnica j4 nfo pode ser entendida como + resultado_de~aplicacio-da ciéncia. “A” contrario, a: ciéncia ~. €_que' nasce-estruturalmente, nfo decert técnica, { igor, e vive. na Essencializacao da técnica. Nesta Essen- “ falizagio se encontra: a ciéncia nio é uma_interpretacaio nem _especulativa, nem_contemplativa, nem. reflexiva,nem | transcendental da realidade. A ciéncia_é_técnica,.um_con- junto-de praticas. operatérias; tanto_de_natureza_axioma- - ica, como de natureza operacional,.comprometidas_ com z a transformagao do real em objetividade e da objetividade ws lem operatividade. O problema fundamental de todo este g ‘proceso histdrico relaciona-se com a composigéo. Trata- sIse de se decidir cada vez o que define concretamente o cardter técnico-cientifico de um conjunto de processos; © que distingue uma integragéo microeletrénica de qual- quer outra composigio; que fungées contrapdem a razio e a ldgica da ciéncia-técnica a outros possiveis usos da Raz&o e a outras formas ldgicas de acio! t ele Aa Ceretn Estas quest6es s6 poderao ser postas e desenvolvidas na e pela realizacgio da informatica, de seus efeitos e fatos que se recolhem e concentram na informatizagio. Pois somente a informatizagéo tem condigdes de determinar o papel da experiéncia e o lugar da ldgica na produgiio do conhecimento técnico-cientifico. Torna-se indispenstivel ana- lisar 0 funcionamento auténomo da ciéncia-técnica dentro 99 AY gt NV ojos vertices da informatizagio. Ora,_de_ver_que.a_ciénoia- » XY técnica opera_sempre_racional_e materialmente,.compreen- XM og jue o problema central yemete para a dinamica ci-, ©] Bernstica da ciéncia-técnica, Em sua_agio, éncia-téeni? fy ire gly sy \s se mantém~em conti \UO__PIORIESSO. Po! ‘ Futo-organiza,-se_realiment \ smo, Ora, um tal movimento se pode explicar nem pela psicologia dos sujeitos impli- cados, nem pelo nicho social ou pelo contexto historico ,dos cientistas e técnicos. Somente_um samento eS- » ‘tritamente cibernético, ciijo—nticlea_se} natureza hi- g Fida, tanto 1égica_ como microeletronica, s A capaz~de dar conta de toda esaauto-organizacao. Dois mecanismos & ou procedimentos coordenados, 4 conjectura e a deducio, em_implementar—a~dinamica~integrativa’ deste processa- .mento-da-ciéncia-técnica. /Tnstala'se, entao, a seguinte-ftin- 5 ¢ ~¢ionalidade: de um dadd conjunto de informagées dedu- >< | zem-se conjecturas operatorias que se integram automati- *\ Camente em sistemas de alternativas em transformacio. | ‘A seguir, a automacio se encarrega de eliminar as alterna- | tivas que nao forem eficazes, 0 que remete a deducio de novas conjecturas, e 0 jogo recomega. ey } Toda essa integracdo recorrente de ciéncia e técnica 7) {sugeriu a Karl Popper a idéia do terceiro mundo. Tam- pém na informatizacio existem trés mundos: um mundo y material de coisas com que lidam os processamentos e ¢ © > em que vivem e agem os homens. o primeiro mundo. 3 A seguir, um mundo subjetivo de cérebros processadores weale | de informacio. E o segundo mundo. E, por fim, um ter- ceiro mundo, distinto dos dois outros e feito de entidades \ culturais produzidas pelos homens, mas que, depois de 4 \produzidas, se tornaram auténomas’ e seguem seus pro: - || prios caminhos. No terceiro mundo encontramos 0S. S! | temas simbdlicos e todas as obras construidas pela li guagem, sejam de natureza mitica, religiosa, artistica, filo-| \ 4 s6fica ou qualquer outra. 1 neste terceiro mundo que tém | lugar os efeitos e artefatos cibernéticos e microcletrénicos | | da informatizagio. © mundo da informatizagio 6 uma nebulosa de siste- mas em evolugio, Dotada de autonomia independente das pessoas que a produzem, sé so liga aos homens de maneira extrinseca, Como sistema autOnomo, possui seus mecanismos préprios de crescimento e impée uma légica ° ined x Won 100 politOnica aos outros sistemas de que se . cer ¢ desenvolver-se, Estes outros ‘slsternte aie de wes jado, 0s cérebros humanos e no as pessoas humanas e, de outro, as coisas materiais. Cérebros humanos ma. quinas de criar informagées e coisas materiais sio ener- gias de agio. O princfpio-chave para se compreender o vir a ser e@ a evolugio da informatica é o principio da auto-organizagao. Como os sistemas bioldgicos, os siste- mas microeletronicos se organizam de tal maneira que se vio complexificando por seus préprios dispositivos. Mas tal autonomia nao exclui e sim inclui até a necessidade de ir buscar energias e insumos nos outros sistemas. Gragas a interagdes e inter-relacionamentos entre os siste- mas, a informatizagéo aumenta sua complexidade, cresce e evolui. Assim, também no nivel do terceiro mundo ope- yam muitas das propriedades e caracteristicas dos siste mas bioldgicos. Por isso é que a cibernética e a micro- eletronica s6 podem evoluir e desenvolver-se em conexao com os cérebros humanos, de um lado, e com os siste- mes materiais, de outro! O mundo da informatizacao_pro- .. gride por trocas_com os’ dois outros. E sao estas trocas \\que éxplicam por que todo desempenho cibernético tem ois pdlos, um, polo 1dgico, que remete. para_as interag es ‘com 0 mundo subjetivo dos cérebros, e um _pdlo micr eletronico. que remete para 0 mundo material das coisas e dos objetos técnicos. Chegamos, pois, a uma leitura da (Ciéncia-técnica que nada tem a ver com taticas de persuasio, mas se constrdi toda sobre o proprio funcionamento e desempenho da in- formatizacao. Esta leitura nos mostra nao somente 0 que significa transformar 0 real em objeto e 0 objeto em dis- positivo operacional, mas também como é que se dé efetua um nivel destas transformag s_Tada_a_xealidade \ se reduz a trés mundos: o mun ‘0 dos sistemas \ “cerebrais; 6 Witindo’ “objetivo dos sistemas materiais_e_o | “mundo ‘simbélico dos sistemas. cibernéticos ¢ informatiza- dos. Com esta leilura’ se pretende excluir qualquer visio “antropoldgica e filoséfica da ciéncia-técnica. Pois, uma and- lise na perspectiva do homem, como pessoa e sécio, jd / nfo falaria da ciéncia-téenica em si mesma e, sim, do que os homens, como pessoas e sécios, fazem a propé- \ sito da ciéncia-técnica, ou por meio dola, ou com. vistas \\ A cléncin-iéenica, Neste caso fularseia das interagées en- re os sistemas cientifico-lécnicos @ os seres humanos ou 101 das reporcussoes nos peres bunanos dos sistemas elentl- fico-téonions, mas pho da eléncia e dn técnica em sl mes Tvs, O quo se dina, entho, reflerinsesa nio & propria ¢ ohvldontea, mas fy representagoes @ Imagens mals Ou me- how antropomorficas que os homens fare da elénela- tecnica, Kstas Jolturas, embora sejam na_verdade uma gigan- teach abstragho, dispocin de poder ¢ forga de dominagi Conatituen Alé Uma tities Indispensdvel para a expansho du jdeologin de um mundo feito de funcionalidades trans- formadas om artefatos © disposiiivos microeletrénicos. Y que os problemas da cléncla e da técnica entendidas Jhornclicamente se restringem ao funclonamento da clonela ¢ da técnica JA constituidas em si mesmas, as suns fungdcs de equilibrio, a scus mecanismos de autorna- gho, deixando de fora, em principio, as questOes da inte- yagho entre a clénclatécnica ¢ a realidade sub-repticia do homem ¢ da natureza na construgio do mundo. apenis © Ora, do ponto de vista dos desafios e impactos da ciéncla © da tecnologia na dinamica da cultura, os proble- mas dit interagio ¢ das trocas so os decisivos e, por isso musmo, s¢ Lorna indispensdvel @ urgente sua colocagao ¢ neu questionamento, J5 sfio fustamente as quest6es do po- der ¢ da dominagio com que mais nos acenam os impac- tos da ciénela-técnica nas interagées com os sistemas so- clals © huranos. A caracterizacio de alguns destes impac- 1o% serviri, a Utulo de conclusio, para deixar entrever a profundidade ¢ 0 sentido das transformagées em causa na Informatinagio, Um tmpatto inte 4 i planetarizagio da politica e do poder organizaciona). Hoje tudo é politica. A cada passo deparamos com politica, De sentinela do direito, 0 poder folse totalizando e se fez providéncia universal. Tudo 4 poder, 0 poder é tudo, Todo e qualquer problema 4 questiio politica de politica, Todas as dreas de ativi- dade esto sendo absorvidas pelo sorvedouro do poder JA politica fol se alargando, alargando ¢ terminou por ala! far tudo; Por forga da tecnica_e da cléncia, todos os nf vels da vida © convivenela se viram progressivamente absorvidos| Na avalanche da ciénela eda técnica, vivemos - hoje Imperceptivelmente o desaflo totalitério da politica total, Mas, por outro Indo, para tudo se tornar uma ques: 102 | tio de poder, a politica tem de descobrir flancos e ser questlonada em suas pretenses totalitérias. Se tudo for um problema politico, a politica esté em crise. Qual é a crise da politica total? — Para algarse a uma extensio planctiiria, a politica teve de esvaziar-se ao maximo, E neste vazlo a ciéncia ¢ a tecnologia vio substituindo a } antiga arte politica pelos poderes da informatizac’o. Por isso, pensar 0S desafios e impactos da consciéncia histé- rica atual inclui renunciar, de certo modo, as imposicdes de poder e dominagio da ciéncia e tecnologia escondidas © mascaradas Pela extensaio universal da politica total. 2h ee) ytiaqn ws pt My ‘O segundo ‘impacto se refere ao estiolamento da Lin! guagem por perda progressiva de criatividade. Para_a_in- formatizagio da ciéncia ¢ da técnica, a Linguagem_se re- duz a um instrumento de processar informagées. As pos- sibilidades significativas de uma lingua se determinam é se medem, entio, pelo jogo de seus usos! Fosse suficiente esta determinagio, nunca poderia haver no interior de uma comunidade lingitistica crises de incompreensio. Ora, ; a vitalidade de uma comunidade lingiiistica esta na razdo direta de sua capacidade de sofrer crises de incompreen- siio, Quando a envergadura do uso j4 nao pode articular © jogo das experiéncias criadoras, determinada lingua en- tra em crise em suas préprias possibilidades de significa- Gio, buscando vencer o perigo e ultrapassar a ameaga de tornar-se insensata. © que uma lingua sé comunica se e na medida em que sua competéncia tiver sentido, isto é, enquanto puder articular as experiéncias inovadoras parti- Ihadas pela comunidade. Responder a pergunta, se um dis- curso é ou nao significativo, equivale a responder & per- gunta, qual dimensfio da experiéncia comunitdria nele se consolida e se exprime? S6 depois de satisfeita esta exi- géncin é que se poderd tratar da correta aplicagio e da integragio dos princ{pios légicos, sejam de ordem mono- tOnica ou politénica. Porque sé um discurso significativo é crlador, por isso a questéo do sentido prevalece sobre a questiio da eficiéncia e validade de sistemas microeletro- nicos e circuitos integrados. No mundo da informatizagio estamos vivendo cada vez mais intensamente as ameagas de insensatez dos dis- cursos, O péndulo da linguagem oscila de extremo a ex: tremo sem chegar a uma posigiio de equilibrio. Estas os- 103 cilagdes extremas se refleterm em nosso discurso. Se for- mos bastante informatizados para Nn entregar de corpo e alma a inversoes extremadas, J4 nao nos sobraré outra alternativa, sendo a de renunciar & criatividade de toda ingua natural e de todo discurso origindrio. Os informatizados de hoje j4 dao sinal de aprisiona- mento num mundo pobre de linguagern criativa. Um pro- cesso de graves conseqtiéncias politicas. E que com a ava- lanche da informatizagao se vive progressivamente num mundo em que a linguagem natural vai perdendo sempre mais autoridade, num mundo que, em sua tendénciz his- torica, j4 nfo necessita das linguas naturais, Pois tudo que o homem conhece, sente, pensa, sabe ou faz, s6 se torna realmente significativo, sé adquire sentido essencial, se houver possibilidade de conversa e didlogo, na medida em que dele se puder falar a partir de sua linguagem. Nao hd verdade no singular, fora de toda e qualquer enverga- dura de discurso. Toda verdade é plural. A verdade sé se d4 por existirmos na linguagem_do_plural, numa cor- lrenteza que nos arrasta para uma convivéncia de didlogo. Enquanto vivermos, pensarmos e agirmos na_Terra, sé faz sentido 0 que pudermos falar uns com os outros, 0 que puder receber um significado na e da linguagem. O .~ esvaziamento das linguas naturais é uma conjuntura_que a informatizacio progressiva, instalada péla ciéncia e tec- nologia em nosso mundo, traz consigo irremediavelmente. . SRV TAY Too sgitto. ‘Um ceiro_impacto. provém da atitude negativa ,diante do trabalho. O mundo informatizado da ciéncia e da técnica nao gosta palhar. O trabalho nao tem rae por si. Sd vale como meio e instrument le _meio_precirio, de um instrumento primitivo. ‘patho tem sido mal “joveseerto;-que’—o Dray ciéncia e da técnica vai remediar de todos os modos/ “AY —— neers See se tornam a panacéia do traba- : initivamente com os lagos imemo- riais com que desde sempre o trabalho entrelacara h mem ¢ terra, realidade e realiza agai } ‘a vida livre do jugo de trabalhar nao é um | sae Leenoligico. E uma condicio paradisiaca. Em todos temp s,m vida sem trabalho tem pertencido aos los de poucos que sempre dominaram e tripudia- 104. ram_ so i ram Sobre. nulla) A. informatizagso acena com a_possi- onho que todas as geragd Dustdo £0 perm sonar ¢ nincachernats tase, parecem, sio realmente uma esperanca, mas uma esperanca de Pandora. Reduzindo o homem exclusi- vamente 4 produciio,_a_informatizacio . unidimensionaliza a sociedade, como se individ } . os e grupos s6_ existissem | para produzir e consumir. E uma historia de bruxa ma: a_satisfagao do desejo_transforma a promessa de béngio ‘em maldigio e “do trabalho é faz da esperanga desespero. A libertagio agenciada pelas possibilidades automatiza- das da, robotizacao. & que o mundo da informatizagao fetatiss sabe mesmo produzir, Nao conhece outras ativi lades pelas quais valesse a pena lutar e libertar-se das peias do consumo. Estandardizada por_necessidade_tecno- l6gica, a socied lade informatizada nao.dispde de instancias | que pudessem mobilizar outras poténcias da condicao hu- | jana. Por uma questio de principio, todas _as_fungées, | todos os dispositivos estio a servico e comprometidos com uma produtividade sem limites. Tudo é producéo-e con- sumo. O mundo gira num circulo vicioso: a meta 6 pro- _Guzir_mais, para consumir_mais, para_lucrar_mais, para| produzir ma Somente sonhadores, amantes, poetas, pen- Ysadores e religiosos, é que ainda pretendem realizar-se no elemento Linguagem © ‘confiam num instante de criagao: rara hora et pauca mora! Mas tudo isso, toda esta situagao histérica de infor- matizagao da técnica e da ciéncia, serd mesmo vidvel? Sera mesmo. )_possivel_viver_num_mu bh que © trabalho, trago de unio, com | mente substituid morar_ num mun gem, onde as monossemias de linguas ¢ metali _\ mesmo possivel supottar um mun cao, onde uma mas se apdla engendra caprichos comegasse espontane! ndo_informatizado_em: a terra, fosse total- fo pela automagio? Sera mesmo possivel ido sem as ‘vivencias criadoras da lingua- \nguas naturais fossem exorcizadas pelas inguas cibernéticas? \Sera do-sem-a terra da cria- ‘umesa ji no se firma com os pés no chao, na cabega, e em seu cérebro de madeira muito mais prodigiosos do que se amente a dangar”?

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