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68 CIÊNCIA E COM PORTAM ENTO HUM ANO

Condicionamento operante

Para atingir o âmago da Lei do Efeito de Thorndike preci-


samos elucidar a noção de “probabilidade de resposta”. Este
conceito é extremamente importante; e bastante difícil, infeliz-
mente. Discutindo o comportamento humano, muitas vezes
referimo-nos a “tendências” ou “predisposições” de alguém
comportar-se de determinada maneira. Quase todas as teorias
do comportamento usam termos como “potencial de excita-
ção”, “força do hábito”, ou “tendência determinante”. Mas
como se observa uma tendência? E como se pode medi-la?
Se uma dada amostra de comportamento fosse encontrá-
vel somente em dois estados, um em que sempre e outro em
que nunca ocorresse, estaríamos quase impossibilitados de
continuar o programa de análise funcional. Um assunto que só
possa ser descrito em termos de tudo-ou-nada só se presta a
formas primitivas de descrição. Há uma grande vantagem em
supor que, em vez disso, a probabilidade de ocorrência de uma
resposta varie continuamente ao longo dos extremos tudo-ou-
nada. Poderemos assim lidar com variáveis que, diversamente
do estímulo eliciador, não “causam a ocorrência de um deter-
minado comportamento”, mas simplesmente tornam a ocor-
rência mais provável. Poderemos então lidar, por exemplo,
com efeito combinado de muitas destas variáveis.
As expressões do uso diário impregnadas da noção de pro-
babilidade, tendência ou predisposição, descrevem a assidui-
dade de ocorrência de tipos de comportamentos. Não podemos
nunca observar a probabilidade como tal. Diz-se que alguém é
um “entusiasta” do bridge quando se observa que joga e fala
sobre o jogo freqüentemente. Ser “muito interessado” pela
música é tocar, ouvir e falar muito sobre música. O jogador
“inveterado” é aquele que joga muito. O “fã” da fotografia é
encontrado tirando retratos, revelando-os e olhando fotos por
ele e por outros obtidas. O “erotômano” é aquele que com fre-
qüência excessiva enceta comportamento sexual. O “dipsoma-
níaco” é o que bebe com freqüência.
Pressupõe-se, ao caracterizar o comportamento de uma
pessoa em termos de freqüência, certas condições-padrão:
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deve poder executar e repetir determinado ato, sem que outro


comportamento interfira de forma apreciável. Não se pode
saber até onde vai o interesse de uma pessoa pela música, por
exemplo, se por necessidade tiver de se ocupar com outras coi-
sas. Quando é preciso refinar a noção de probabilidade de res-
posta, para uso científico, vê-se que também aqui os dados são
as freqüências e que devem ser especificadas as condições sob
as quais são observados. O maior problema técnico no planeja-
mento de um experimento controlado é conseguir condições
para a observação e interpretação de freqüências. Qualquer
condição que estimule comportamentos que concorram com o
comportamento em estudo deve ser eliminada, ou pelo menos
mantida constante. Coloca-se um organismo em um comparti-
mento isolado em que seu comportamento pode ser observado
através de um espelho falso ou registrado mecanicamente. Isto
não é, de modo algum, um vácuo ambiental, pois o organismo
reagirá de várias maneiras às características da câmara; mas o
seu comportamento finalmente alcançará um nível razoavel-
mente estável, ao qual se possa contrapor a freqüência da res-
posta selecionada a ser investigada.
Para estudar o processo que Thorndike chamou de fixa-
ção, precisamos ter uma “conseqüência”. Dar alimento a um
organismo faminto pode servir. É possível alimentar conve-
nientemente o sujeito experimental através de um pequeno
recipiente operado eletricamente. Quando o recipiente se abrir
pela primeira vez, provavelmente o organismo reagirá de ma-
neira que interfira com o processo que planejamos observar.
Finalmente, depois de obter repetidas vezes alimento no reci-
piente, já comerá rapidamente, e será então possível fazer que
esta conseqüência seja contingente ao comportamento e obser-
var o resultado.
Seleciona-se um comportamento relativamente simples
que possa ser livre e rapidamente repetido, facilmente obser-
vado e registrado. Se o sujeito experimental for um pombo,
por exemplo, o comportamento de levantar a cabeça acima de
uma determinada altura será conveniente. Pode ser observado
ao se olhar a cabeça do pombo através de uma escala fixada
em uma das paredes da caixa. Primeiramente se verifica a al-
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tura em que a cabeça se mantém naturalmente e depois esóo-


lhe-se uma linha na escala que raramente seja atingida. Olhan-
do para a escala, podemos começar a abrir o recipiente com
alimento, assim que a cabeça se erguer acima da linha. Se o
experimento for conduzido de acordo com as especificações,
o resultado é invariável: observamos uma mudança imediata
na freqüência com a qual a cabeça cruza a linha escolhida.
Também observamos, e isto tem certa importância teórica,
que linhas ainda mais altas estão sendo agora também alcan-
çadas. E possível avançar quase que imediatamente para uma
linha mais alta ao determinar a condição para apresentação do
alimento. Em um ou dois minutos a postura do pássaro mudou
tanto que raramente o topo da cabeça fica abaixo da linha ini-
cialmente escolhida.
Vemos, quando demonstramos o processo de fixação as-
sim tão simplesmente, que são supérfluas e comuns certas in-
terpretações do experimento de Thorndike. Aqui a expressão
“aprendizagem por ensaio e erro” freqüentemente associada à
Lei do Efeito fica claramente desbocada. Estar-se-á dando uma
interpretação ao que foi observado se denominarmos “ensaio”
qualquer movimento para cima da cabeça do pássaro, e não há
razão para chamar dé “erro” todos os movimentos que não le-
vem à conseqüência especificada. Mesmo o termo “aprendiza-
gem” está mal-empregado. A afirmação de que um pássaro
“aprende que obterá alimento estendendo o pescoço” será um
relato descurado do que aconteceu. Dizer que adquiriu o “hábi-
to” de estirar o pescoço é meramente recorrer a uma ficção
explanatória, pois o único indício do hábito é a tendência ad-
quirida de realizar o ato. A maneira mais simples de enunciar o
processo é a que segue: tomou-se uma determinada conse-
qüência contingente a certas propriedades físicas do comporta-
mento (o estirar a cabeça), e verificou-se um aumento na fre-
qüência do comportamento.
E costume o referir-se a qualquer movimento como uma
“resposta”. A palavra foi emprestada do campo da ação reflexa
e sugere um ato que, por assim dizer, responde a um evento
anterior - o estímulo. Mas é possível tornar um evento contin-
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gente a um comportamento, sem identificar, ou sem que se


possa identificar, um estímulo anterior. O meio ambiente do
pombo não foi alterado para eliciar o movimento de levantar a
cabeça. É provavelmente impossível demonstrar que um deter-
minado estímulo precede invariavelmente este movimento.
Comportamento deste tipo pode vir a ser colocado sob o contro-
le de estímulos, mas não o será a relação de eliciação. O termo
“resposta” não é por isso inteiramente apropriado, mas está tão
bem estabelecido que o usaremos nas discussões futuras.
Uma resposta que já ocorreu não pode, é claro, ser previs-
ta ou controlada. Apenas podemos prever a ocorrência futura
de respostas semelhantes. Desta forma, a unidade de uma ciên-
cia preditiva não é uma resposta, mas sim uma classe de res-
postas. Para descrever-se esta classe usar-se-á a palavra “ope-
rante”. O termo dá ênfase ao fato de que o comportamento
opera sobre o ambiente para gerar conseqüências. As conse-
qüências definem as propriedades que servem de base para a
definição da semelhança de respostas. O termo será usado tan-
to como adjetivo (comportamento operante) quanto como
substantivo para designar o comportamento definido para uma
determinada conseqüência.
Cada ocasião singular em que um pombo levanta a cabe-
ça é uma resposta. É um segmento de história que pode ser
relatado usando qualquer sistema de referência que se queira.
O comportamento denominado “levantar a cabeça” , não im-
porta em que circunstâncias específicas ocorra, é um operan-
te. Pode ser descrito, não como um ato acabado, mas como um
conjunto de atos definidos pela propriedade que a altura, até
onde a cabeça for levantada, representa. Neste sentido um
operante se define por um efeito que pode ser especificado em
termos físicos; a “craveira” a uma certa altura é propriedade
do comportamento.
O termo “aprendizagem” pode ser mantido proveitosa-
mente no seu sentido tradicional para descrever a redisposição
de respostas em uma situação complexa. Termos para o proces-
so de aquisição podem ser tomados da análise pavloviana dos
reflexos condicionados. O próprio Pavlov denominou “refor-
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ços” todos os eventos que fortaleciam um comportamento e


“condicionamento” todas as mudanças resultantes. No experi-
mento de Pavlov, contudo, um reforço é associado a um estímu-
lo, enquanto no comportamento operante é contingente a uma
resposta. Desta forma o reforçamento operante é um processo
separado e requer uma análise separada. Em ambos os casos, o
fortalecimento do comportamento que resulta do reforço será
adequadamente chamado “condicionamento”. No condiciona-
mento operante “fortalecemos” um operante, no sentido de tor-
nar a resposta mais provável ou, de fato, mais freqüente. No
condicionamento pavloviano ou “respondente” o que se faz é
aumentar a magnitude da resposta eliciada pelo estímulo condi-
cionado e diminuir o tempo que decorre entre o estímulo e a
resposta. (Note-se, incidentalmente, que os dois casos esgotam
as possibilidades: um organismo é condicionado quando um
reforço (1) acompanha outro estímulo ou (2) segue-se ao pró-
prio comportamento do organismo. Qualquer evento que não se
classifique nem como (1) nem como (2) não tem nenhum efeito
para mudar a probabilidade de resposta.) No experimento do
pombo, então, o alimento é o reforçador, o apresentar alimento
quando uma resposTaToF emitida è o reforço. O operante será
definido pela propriedade à qual o reforço for contingente - a
altura até onde a cabeça for levantada. A mudança da freqüên-
cia com que a cabeçajpjdevantada à altura determinada consti-
tui o procésso de condicionamento o p e r a n t e ^
Enqnantü^stam õsdFspgrtosrggirnos gonstantemente so-
bre o ambiente, e muitas das conseqüências de nossas ações são
reforçadoras. Através do condicionamento operante, o meio
ambiente modela-o-repertório básico com o qual mantemos o
-equilíbrio, andamos, praticamos esporte, manejamos mstrumelT-
tosjg,ferramentas, falamos, escrevemos, veleiam osum barco.
.. dirigimos um automóvel ou pilotamosjjm avião. Uma m odffP'
cação no ambienté ^ m novo automóvel, um novo amigo, um
novo campo de interesse, um novo emprego, uma nova residên-
cia - pode nos encontrar despreparados,._mas,o_CDmp_Qrtamento
ajusta-se rapidamente assim quefedquirirmos novas respostas)
deixarmos de lado as antigas. Veremos no capítulo seguinte
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que o reforço operante faz mais que modelar um repertório


comportamental. Aumenta a eficiência do comportamento e o
mantém fortalecido muito tempo, depois que a aquisição ou a
eficiência já tenham perdido o interesse.

Propriedades quantitativas

Não é fácil obter uma curva para o condicionamento ope-


rante. Não se pode isolar completamente um operante, nem se
pode eliminar todos os pormenores arbitrários. No exemplo
citado podemos projetar uma curva mostrando como a fre-
qüência, com a qual a cabeça do pombo se levanta a uma deter-
minada altura, altera-se com o tempo ou com o número de re-
forços, mas o efeito total é nitidamente mais amplo do que isso.
Há modificações maiores no padrão de comportamento e para
descrevê-las completamente seria preciso seguir todos os mo-
vimentos da cabeça. Mesmo assim, o relato não seria comple-
to. A altura até a qual a cabeça deve ser levantada foi escolhida
arbitrariamente, e o efeito do reforço depende desta escolha. Se
reforçarmos uma altura que foi raramente atingida, a mudança
no padrão será bem maior do que se tivéssemos escolhido uma
altura mais acessível. Para um relato adequado necessitaríamos
de um conjunto de curvas cobrindo todas as possibilidades.
Ainda outro elemento arbitrário aparece se forçarmos a cabeça
a posições cada vez mais altas, pois poderemos seguir esque-
mas diferentes quando elevamos a linha selecionada para re-
forço. Cada esquema produz sua própria curva, e o quadro só
estaria completo quando tivéssemos abrangido todos os esque-
mas possíveis.
Não se podem evitar estes problemas pela simples escolha
de uma resposta mais rigorosamente definida por características
do ambiente - por exemplo, o comportamento de operar o trinco
de uma porta. Indicadores mecânicos do comportamento têm, é
claro, suas vantagens - por exemplo, ao nos ajudar a reforçar de
forma consistente. Podemos registrar a altura da cabeça de um
pombo através de um dispositivo fotossensível, mas é mais sim-

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