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TRABALHO FINAL - PARENTESCO, FAMÍLIA, PESSOA E GÊNERO

Jéssica de Azevedo Moura Marcaccini Bôdo

O presente trabalho tem como objetivo, analisar uma relação familiar a partir da
observação de uma “Tia Emprestada” e das pessoas de seu meio social. Para isso, foram
consultadas algumas bibliografias para embasar o relato cientificamente. As informações
foram obtidas através de entrevistas com familiares os quais tiveram observação ao longo de
26 anos. Inicialmente, é importante contextualizar sobre a família a ser analisada. A Família
Marcaccini Bôdo, é moradora do Bairro Santa Cecília da cidade de Juiz de Fora. A vinda ao
bairro veio por parte do meu avô, Sebastião Bôdo (76 anos), o qual reside há 57 anos na
vizinhança. No ano de 1972, Sebastião se casou com Elani Marcaccini na Igreja Católica de
São Mateus. Sendo assim, minha avó Elani, foi morar com meu avô após o casamento e
posteriormente teve três filhos. O primeiro filho foi Anderson (1973), o segundo foi
Alexandre (1975) – meu pai–, e por último o terceiro filho foi André (1982). A infância e
adolescência dos três filhos foi relativamente tranquila, pois meu avô possuía emprego
estável como mecânico industrial na Paraibuna de Metais, atualmente conhecida como
Votorantim Metais. Todos os filhos estudaram na mesma escola: Escola Estadual Fernando
Lobo, e posteriormente Alexandre e Anderson serviram o Exército Brasileiro durante oito
anos. Na infância e adolescência, não houveram grandes problemas para se preocupar com
Alexandre e Anderson. No caso de André, se assumiu como homossexual para a família e
não houve problema com isso, entreanto, ele frequentemente faltava as aulas da escola. Para
Cohn (2005), a rebeldia vivida pelos adolescentes são dados culturais e não explicáveis pela
condição biológica, sendo esse um período mais libertador. Futuramente, ele é o único filho
que ainda reside com os pais e é muito mimado.
Ao terminar seu tempo no Exército, Anderson o qual possuía Carteira de Habilitação
Nacional de Categoria E, decidiu trabalhar como motorista de ônibus de viagem, o qual
permaneceu nessa função por 15 anos. Atualmente ele trabalha como motorista de ônibus
circular da UFJF. Anderson conheceu sua futura esposa Gilseia em uma festa com amigos no
ano de 1994. Eles se casaram em Dezembro de 1996 e foram morar juntos no terraço da casa
de Sebastião. Na época, no terreno da família só havia uma casa principal, onde moravam
Sebastião, Elani, Anderson, Alexandre e André. Posteriormente, a intenção era aproveitar o
terreno para construir mais três casas para os respectivos filhos. Entretanto, foram construídas
duas casas, uma em cima da outra e uma garagem. Após se casarem, enquanto a casa era
construída, Gilseia e Anderson, se estabeleceram no espaço do terraço da casa principal, onde
havia um quarto, cozinha e banheiro. Com a casa pronta, em 1998, nasceu a primeira filha do
casal: Raphaella, e posteriormente em 2003, o segundo filho Gabriel.
Tudo parecia estar bem, mas por trás de seu relacionamento com Gilséia, existem
muitos problemas que foram e estão sendo enfrentados pela família. Em primeiro lugar,
Gilseia possui Ensino Médio e curso de cabeleireira, entretanto, boa parte do tempo ela fica
em casa. Além disso, veio de uma grande família que é bem diferente da nova família que
ingressou. Os primeiros problemas surgiram durante o envolvimento dos dois, pois percebeu-
se que ela controlava muito Anderson e frequentemente brigava com seus sogros. Apesar de
Anderson não ser filho único, foi mimado pelos pais, especialmente sua mãe Elani, que
sempre preparava suas roupas e comida para ir trabalhar. Gilséia de início criticou bastante a
atitude que os pais tinham com ele de forma muito grosseira. Dessa forma, aos poucos ia
moldando Anderson conforme atendesse melhor aos seus desejos. Conforme os anos se
passaram, ela conseguiu colocar ele contra seus próprios pais e irmãos.
Quando nasci em 2001, possuía uma idade próxima à minha prima Raphaella, logo
ficamos muito próximas quando pequenas, entretanto, de acordo com um relato dos meus
pais Zuleika e Alexandre, uma vez quando nós duas estávamos brincando em sua casa, sua
mãe Gilséia, havia falado para eu sair pois já tínhamos brincado muito e batido a porta de sua
casa no meu rosto. Como eu era muito nova, não me lembrava do fato. Um episódio mais
recente ocorreu em 2014 na casa do meu avô, quando me deparei com o computador que
compartilhamos estava sem seus arquivos, perdendo várias fotos importantes. Ao retornar
para casa, antes mesmo de passar pela porta consegui ouvir minha tia Gilséia e minha prima
Raphaella conversando sobre o ocorrido, afirmando que ela (Raphaella), estava certa em ter
apagado as fotos. Ao ouvir isso, fui rapidamente comunicar ao meu avô, o qual não acreditou
em mim – na verdade ele pouco acredita, sempre prefere dar ouvidos aos meus primos.
Depois do ocorrido, me afastei dela, mas permaneci conversando em eventos sociais da
família para não aborrecer meus avós.
Durante a leitura do artigo “Antropologia da Criança”, ela mostra a importância da
transmissão cultural entre as crianças, percebe-se que através do comportamentos de Gilséia,
seus filhos a seguirem fielmente, se tornando hoje sujeitos mais parecidos com suas atitudes.
Além de manipular Anderson, Gilséia conseguiu também manipular seus filhos Gabriel e
Raphaella, para odiar cegamente à família. Inicialmente eles foram afastados de mim e meu
irmão, e posteriormente de seus avós. Diversas vezes ouvi ela dizer coisas horríveis sobre
mim e minha família, como dizendo que meu pai era muito “bobo”, que meu irmão era um
“capeta”, e frases gordofóbicas e machistas contra mãe (as quais não eram verdadeiras). Por
conta disso, cresci com muito medo das atitudes dela. Como moro na casa de cima, consigo
ouvir quando ela conversa alto ou bate nas paredes. Na minha casa não podemos andar ou
conversar que ela sempre xinga ou faz barulho zombando. Frequentemente pode-se ouvir
seus filhos caçoando da nossa família.
Para Fonseca (2000), existe uma diferença entre a unidade residencial e o sistema
familiar, o qual podemos perceber na família Bôdo. Como pôde-se observar, a unidade
residencial corresponde à casa de Anderson e Gilseia, pois eles cortam seus laços com o
restante da família a partir do momento que os tratam com falta de respeito. Logo para eles,
eles pertencem a unidade residencial que está próxima ao seu sistema familiar, que por sua
vez possui uma relação conturbada, mas o sistema familiar em si, é mais unido com outros
integrantes da família que não eles.
Um dos piores episódios, com certeza, diz respeito à garagem. A garagem foi
construída especialmente para guardar os carros da família, mas recebeu contribuições
somente do meu pai Alexandre e meu avô Sebastião, todavia, todos que possuem carro
podem usá-la. Naturalmente ela possui três vagas de carro, mas atualmente está comportando
quatro, sendo dois do meu pai Alexandre, um do meu avô, e por último um do meu tio
Anderson. Gilséia não gosta muito da ideia de que meu pai tenha duas vagas para o carro,
pois segundo ela atrapalha para que entre na sua casa – o que não é verdade. Diversas vezes
ela riscou os dois carros, chegando inclusive a arranhar uma das figurinhas que haviam meu
rosto. É uma luta diária sair e voltar de carro em casa, às vezes é melhor desistir, pois ela
sempre dá um jeito de atrapalhar.
Outro episódio importante para se relatar se deve ao fato de que a água era conjunta,
ou seja, todos a usavam e dividiram posteriormente o valor. Porém, durante a pandemia, com
o aumento da conta, Gilséia se recusou a pagar a conta, pois ela não usava muita água (algo
que se provou ao contrário, pois frequentemente ela regava suas plantas e lavava sua casa
com a mangueira. Ao conseguir separar as contas de água, após alguns meses, ela pode
perceber que o problema realmente era ela, pois enquanto a conta das outras duas casas eram
menores, a dela continuava com um valor alto.
Nada explica o fato dela ser assim, pois não ocorreu nada para que ela ficasse com
raiva. Infelizmente, ela se faz de vítima, e consegue manter seu teatro para seu marido. Os
avós continuam tratando melhor os filhos dela, sendo que eles pouco os visitam e ligam, e em
contrapartida, eu e meu irmão todos os dias ajudamos nossos avós. É uma questão muito
injusta o que ela vem fazendo, e isso cada vez vem me fazendo não querer mais estar em casa
por não me sentir à vontade em um espaço que deveria ser confortável. Na obra produzida
por Claúdia Fonseca, a oposição entre pessoas da família (especialmente os consanguíneos)
afins é um debate clássico da Antropologia de sociedades tribais, entretanto, podemos
perceber que esta oposição é comum na família Bôdo analisada. “Para determinado homem,
os cunhados e sogros não são exatamente parentes, pois não pertencem a seu grupo de
descendência. No entanto, sendo parentes de sua mulher, é impossível ignorá-los. [...] Graças
a essa linha de investigação, tornaram-se inteligíveis muitos dos conflitos em sociedades
tradicionais.” (FONSECA, 2000). A partir dessa citação, podemos colocar no lugar a Tia, a
qual não é descendente da família, mas faz parte dela, pois se casou com um dos membros, o
que infelizmente acabou gerando um grande conflito.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:

COHN, Clarice. Antropologia da Criança. “Introdução”, “Estudos pioneiros em


antropologia”, “Uma nova antropologia da criança”, “A criança e a infância”, “A criança
atuante”, “A criança produtora de cultura”). Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 2005.
BISPO, Raphael. Tempos e silêncios em narrativas: etnografia da solidão e do
envelhecimento nas margens do dizível. Etnográfica, Juiz de Fora, v. 20, n. 2, p. 251-274,
2016.

FONSECA, Cláudia. Família, fofoca e honra: etnografia de relações de gênero e violência em


grupos populares. (Capítulo 2: “Aliados e rivais na família” e Capítulo 5: “Humor, honra e
relações de gênero”)

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