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PUC-SP
E ESTUDOS DA LINGUAGEM
SÃO PAULO
2009
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PUC-SP
SÃO PAULO
2009
FICHA CATALOGRÁFICA
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AGRADECIMENTOS
À minha orientadora, Profª. Dra. Maria Cecília Camargo Magalhães, por seu incentivo,
paciência e confiança no meu trabalho. Por me apontar caminhos, mesmo quando pensei
que este empreendimento não poderia ser possível.
À pesquisadora Maria Cecília Camargo Magalhães, cujo trabalho e os valores que ele
encerra são fonte constante de inspiração.
A todos os professores do LAEL, que conheci e aprendi a admirar, por me mostrarem
outros mundos possíveis, abrirem meus horizontes e colaborarem na minha constituição
como pesquisadora.
Agradeço especialmente à Profª. Dra. Fernanda Coelho Liberali, pelas oportunidades de
crescimento oferecidas nos projetos de pesquisa durante este período, e pela crítica ao
meu trabalho durante as aulas em 2008, que me impulsionou a buscar respostas e ir
além.
Agradeço à Profª. Dra. Maria Otilia Guimarães Ninin e à Profª. Dra. Sueli Salles
Fidalgo, integrantes da banca de qualificação, pela leitura cuidadosa, pelas críticas e
orientações exigentes e precisas, que colaboraram muito para reorganização final desta
dissertação.
À Sueli, que me introduziu neste caminho de pesquisa e tem uma importância enorme
na minha vida. Mesmo de longe, foi durante este período um “outro para mim”, com
quem bati longos papos imaginários.
À querida Otília, com quem aprendi muito, muito mesmo, durante os cursos do
COGEAE. Considero-me privilegiada por ter tido a oportunidade de trabalhar com
você.
À Professora Fernanda Moreno Cardoso que acompanhou de longe e de perto a minha
caminhada, agradeço muito mais do que a revisão cuidadosa.
Às minhas queridíssimas amigas, sem as quais não poderia ter realizado este trabalho:
Cris Castelani, por sua alegria e presença constante, e Lena, por sua paz de espírito,
interlocutoras de todas as horas. Norma, Helena, Rose, Mona, Mônica Guerra, Mônica
Lemos, Rosa, Cris, Ilka, Valquíria, com quem dividi risos e angústias, apoio, dúvidas e
questionamentos. E a tantas e tantos outros amigos que fiz neste caminho.
Agradeço, também especialmente, à Vivi e à Edna, por sua disponibilidade, presença e
torcida.
A Maria Lúcia e Márcia, funcionárias do LAEL.
À CAPES, pelo apoio financeiro durante o período de desenvolvimento deste trabalho.
Dedico este trabalho à minha família.
Este trabalho tem como objetivo geral investigar o processo de produção de significados
compartilhados sobre direção escolar a partir do processo colaborativo desenvolvido
entre uma pesquisadora e a diretora de uma escola da rede pública municipal. Mais
especificamente, é objetivo desta pesquisa compreender como e de que maneira a
relação entre pesquisadora e diretora permitiu esse processo, voltado á construção de
uma escola mais democrática e participativa. Desenvolvido em uma Escola Municipal
de Educação Infantil da Cidade de São Paulo, está fundado na Pesquisa Crítica de
Colaboração - PCCol (MAGALHÃES, 1994/2007, 1998/2007, 2009p). Considerando
que este tipo de metodologia propõe a aprendizagem e o desenvolvimento para todos os
envolvidos, o arcabouço teórico está embasado na Teoria da Atividade Sócio-Histórico-
Cultural (TASHC) considerando as discussões de Vygotsky, (1927/2004, 1934/2001,
1925/2004, 1930/2004, 1926/2004), Leontiev (1977, 1978, 1983, 2004), Daniels
(1993/1999, 2002, 2003), Newman & Holzman (1993/2002) e Engeström (1987, 1999a
1999b, 1999c), sobre aprendizagem e desenvolvimento, consciência e mediação. Apoia-
se também nos estudos do Círculo de Bakhtin (1929-1930/2006,1934-35/1998). O
objeto da atividade focalizada neste trabalho é a Formação de Diretor. A discussão dos
resultados foi realizada com base em recortes selecionados de interações entre a
pesquisadora e a diretora ao longo de nove encontros. Está pautada em categorias
desenvolvidas por Bronckart (1999/2007), Kerbrat-Orecchioni (2006); Pontecorvo
(2005), Wertsch & Smolka (1993/1999) Brookfield & Preskill (2005). Os resultados
revelam que: (i) as relações desenvolvidas entre as participantes possibilitaram
aprendizagem e desenvolvimento a ambas; (ii) os sentidos iniciais das duas
participantes sobre direção foram ressignificados; e (iii) as relações desenvolvidas
tiveram uma repercussão no planejamento das ações da direção e sugerem modificações
no contexto imediato. Aponta, também, para a importância da construção de artefatos de
mediação que representaram tanto o compartilhamento de significados como a
possibilidade de avanço na Atividade Formação de Diretor.
ANEXOS
ANEXO 1 - ROTEIRO DA ENTREVISTA INICIAL
ANEXO 2 - TABELA DE AÇÕES
ANEXO 3 - JOGO DOS PAPÉIS
ÍNDICE DE QUADROS
Quadro 1.1 - Tipos de Perguntas com respectivos objetivos e exemplos ...................... 046
Quadro 1.2 - Situação de ação e Tipos de Discurso ....................................................... 050
Quadro 2.1 - Visão geral dos instrumentos de produção dos dados e sua utilização...... 066
Quadro 2.2 - Artefatos utilizados em mediação explícita .............................................. 067
Quadro 2.3 - Linha do tempo dos eventos desta pesquisa ............................................. 072
Quadro 2.4 - Visão geral dos encontros analisados durante a pesquisa ......................... 073
Quadro 2.5 - Código de transcrição ............................................................................... 074
Quadro 2.6 - Plano geral do texto produzido na entrevista de 9 de março de 2007 ...... 075
Quadro 2.7 - Exemplificação de temas introduzidos pelas interlocutoras ..................... 076
Quadro 2.8 - Modalizações: tipos, conceituação, características linguísticas e
exemplos ................................................................................................... 077
Quadro 2.9 - Turnos: classificação, função e exemplificação ....................................... 078
Quadro 2.10 - Tipos de Perguntas .................................................................................... 079
Quadro 2.11 - Categorias de Comentários ....................................................................... 080
Quadro 2.12 - Categorias de verbos utilizados................................................................. 082
Quadro 2.13 - Síntese dos Principais Elementos da Pesquisa........................................... 083
Quadro 2.14 - Ações de Credibilidade da Pesquisa.......................................................... 084
Quadro 3.1 - Conteúdos Temáticos: preocupações da diretora no Primeiro Momento
da Pesquisa................................................................................................. 100
Quadro 3.2 - Tabela de Ações - visão simplificada........................................................ 102
Quadro 3.3 - Visão geral das preocupações da diretora no final deste segundo
momento da pesquisa................................................................................. 127
Introdução
O processo pedagógico é a vida social ativa, é a substituição
de vivências combativas responsivas [...] A vida se revela como
um sistema de criação, de permanente tensão e superação, de
constante criação e combinação de novas formas de
comportamento. Assim, cada idéia, cada movimento e cada
vivência são uma aspiração de criar uma nova realidade, um
ímpeto no sentido de alguma coisa nova (VYGOTSKY, 1924-
25/2004).
Como discutido por vários autores na literatura educacional (cf. NÓVOA, 1995;
LÜCK, 2000, 2006a, b, c; LIBÂNEO, 2004; ALONSO E ALMEIDA, 2007), até há
bem pouco tempo, o modelo típico de direção de escola apresentava um diretor tutelado
1
pelos órgãos centrais, sem autonomia para determinar os destinos do estabelecimento de
ensino pelo qual respondia e, consequentemente, desresponsabilizado de suas ações e de
um compromisso mais amplo com os resultados pretendidos. Seu trabalho consistia
basicamente em repassar informações, controlar, supervisionar, de acordo com as
normas pré-estabelecidas, e agir de acordo com elas. Portanto, “tensões, contradições e
conflitos eram eliminados ou abafados” (LÜCK, 2000: 17).
1
Depoimentos de profissionais participantes dos cursos organizados pelo LAEL, PUC-SP e oferecidos
pelo COGEAE-SP: “Diretor Escolar - Articulando Papéis Funções e Reflexões”, e também o Projeto
Ação Cidadã, desenvolvido pelo LAEL, PUC-SP.
2
da educação são muitas vezes organizados por órgãos centrais, cuja tendência é
considerar a problemática educacional em seu caráter genérico e amplo, o que muitas
vezes resulta num conteúdo abstrato e desligado da realidade. Tal distanciamento está
associado a uma separação entre o pensar e o fazer. Por esse motivo costumamos ouvir
desses profissionais que “na prática, a teoria é outra”.
Rojo (2006) sinaliza que a partir das mudanças históricas dos últimos dez anos,
as discussões na área da Linguística Aplicada apontam cada vez mais para o seu caráter
transdisciplinar. Na mesma direção, Celani (2004) já discutia e apontava que o linguista
aplicado tem como ponto de partida “um problema com o qual as pessoas se deparam
ao usar a linguagem na prática social e, em um contexto de ação, procuram subsídios
em várias disciplinas para que possam iluminar as questões em jogo” (CELANI,
2004:114). Atualmente, muitos autores têm insistido numa Linguística Aplicada
3
comprometida com a busca de solução de problemas contextualizados, ligados ao uso
da linguagem, suficientemente relevantes para exigir contribuições teóricas que tragam
ganhos às práticas sociais e a seus participantes (ROJO, 2006; KLEIMAN, 2004) e que
superem a tradicional divisão do trabalho entre teoria e prática (KLEIMAN, 2004;
MOITA LOPES, 2006b).
4
diretor influenciam de maneira decisiva, facilitando ou dificultando a implantação da
inclusão escolar de alunos com necessidades educacionais especiais.
5
1929/2005, 1929-30/2006) sobre dialogia e polifonia do discurso, que explicam a
multivocalidade dentro da TA.
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CAPÍTULO 1. FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
(...) os homens transformam as circunstâncias e o próprio
educador precisa ser educado (...). A coincidência da mudança
das circunstâncias e da atividade humana ou automudança só
pode ser considerada e compreendida racionalmente como
práxis revolucionária (MARX, 1845-46/2007: 100).
(1) o pano de fundo social para as novas exigências que influenciam os papéis na escola
(professor, aluno e equipe diretiva);
(2) as questões referentes ao conceito de gestão e ao papel do diretor tal como têm sido
discutidas por pesquisadores e teóricos sob diferentes perspectivas;
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1.1 O pano de fundo social: o mundo contemporâneo – concepções,
perspectivas e desafios
Ainda que não seja objetivo deste trabalho aprofundar essas questões, considero
que apontar para elas é importante por identificar que estão em campo novas realidades
econômicas, sociais, tecnológicas, que “entrelaçam uma série de novos significados,
práticas técnicas e institucionais, procedimentos de subjetivação e relação discursiva
sobre o mundo, o homem e a sociedade tornando reduzida qualquer tentativa de
explicação simplista a respeito de qualquer fenômeno social” (FABRÍCIO, 2006: 47).
Dessa maneira, não faria sentido estudar o papel do diretor sem considerar o papel da
escola e o universo sócio-político-cultural e histórico de que faz parte.
1.1.1. Nova sociedade, novos desafios para a escola e para a formação de seus
atores
Diversos autores têm abordado as mudanças na sociedade atual e a forma como
modificam a maneira de concebermos a realidade e a nós mesmos (cf. FABRÍCIO,
2006; MOITA LOPES, 2006; LÜCK, 2006a,b). Sob a designação geral de
Globalização, são enumerados diversos fenômenos, tais como: as transformações
decorrentes dos avanços tecnológicos e científicos nos últimos 20 anos, que
desencadearam uma revolução tecnológica sem precedentes; a difusão maciça da
informação, possibilitada pela velocidade de circulação oferecida pela TV e pela
Internet, que afetou a circulação e o consumo de cultura; a reestruturação do sistema de
produção cultural, com consequente aumento da distância entre os incluídos e os
excluídos quanto ao acesso às novas formas de conhecimento. No plano sócio-político,
discute-se a transnacionalização política e econômica e o surgimento de
megaconglomerados e corporações estratégicas que atuam num nível global (ARRUDA
e BOFF, 2000).
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Todas essas transformações impactam de diferentes maneiras na forma como a
sociedade humana se reorganiza, produz seus meios de existência, com consequências
diversas que vão além do escopo deste trabalho. De qualquer forma, para fazer frente a
essa nova realidade, em que o domínio do conhecimento se torna essencial, o indivíduo
precisa desenvolver novos saberes e habilidades, ser capaz de pensar autônoma e
criticamente, encontrar soluções para os problemas que se apresentam, desenvolver
competências de trabalho em grupo, cuidar de sua formação, para participar ativa e
conscientemente da sociedade.
Para fazer frente a esses novos desafios, a escola tem que ser aberta, pensante,
reflexiva e crítica, uma organização aprendente, que continuamente se repensa, capaz de
proporcionar aprendizagem e desenvolvimento a todos os envolvidos – professores e
alunos, pais, equipe diretiva e funcionários (ALARCÃO, 2005). Mas o que é a escola?
2
SARESP: Sistema de Avaliação Escolar do Estado de São Paulo; ENEM: Exame Nacional do Ensino
Médio.
9
Uma comunidade educativa, um grupo social constituído por alunos, pais, professores e
comunidade (LIBÂNEO, 2004). Discuti-la implica, necessariamente, a discussão dos
indivíduos e grupos que a compõem. Mais ainda, tornar a escola uma comunidade
colaborativo-reflexiva exige a possibilidade de contar com profissionais que
signifiquem constante e sistematicamente suas práticas, com vistas ao desenvolvimento
de um ensino que satisfaça as necessidades e valores colocados como necessários à
constituição da cidadania. Assim, os papéis tradicionais dos profissionais da educação
(equipe diretiva, professor, funcionários) e dos pais e alunos, as funções que exercem e
a divisão de trabalho na escola, para atingir os objetivos propostos e suprir as
necessidades colocadas, precisam ser revistos em duas direções principais, articuladas
de forma interdependente: a) na formação de educadores, identificando o contexto
escolar como lugar preferencial dessa formação; e b) na própria re-organização dos
sistemas de ensino.
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parágrafos e artigos, os princípios da gestão democrática da escola e da participação da
sociedade nela. Atribui à escola a função de elaborar e executar sua proposta
pedagógica, administrar o pessoal interno e os recursos financeiros, além de se articular
com as famílias e com a comunidade, fortalecendo os processos de integração escola -
comunidade, entre outras obrigações (BRASIL, 1996). Nesta pesquisa, tal discussão é
importante, na medida em que todas essas realidades influenciam a percepção que pais,
educadores (professores, diretores, coordenadores e funcionários em geral), alunos têm
do papel da escola e do seu papel, considerando-se que estas influências são recíprocas,
em maior ou menor grau.
3
SAEB: Sistema de Avaliação da Escola Básica; ENEM: Exame Nacional do Ensino Médio; Prova Brasil: Avaliação da Educação
Fundamental I, de âmbito nacional.
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1.2. A emergência do paradigma de gestão escolar e o papel do
diretor escolar
12
questões: a) à relativa autonomia das escolas em relação aos sistemas educacionais,
possibilitando que as unidades de ensino possam, em seu interior, praticar a busca de
soluções próprias para seus problemas e, portanto, mais adequadas às suas necessidades
e expectativas; b) ao modo como cada unidade vai conduzir seus processos internos,
desenvolvendo compromisso coletivo (pais, alunos, educadores e comunidade em geral)
na efetivação de resultados educacionais considerados necessários. Na literatura
revisada, encontramos semelhanças quanto à compreensão do papel do diretor, com
foco no papel de administrador que também o torna responsável pelo trabalho educativo
Para Libâneo (2004: 216), “o diretor de escola é o dirigente e o principal responsável
pela escola, tem a visão de conjunto, articula e integra os vários setores (setor
administrativo, pedagógico, secretaria, serviços gerais, relacionamento com a
comunidade)”. Semelhantemente, Saviani (2000: 207) mostra que o diretor é o principal
responsável, nos limites da unidade escolar, para “garantir o cumprimento da função
educativa que é a razão de ser da escola”. Lucchesi (1997) e Parro (2000) salientam
outra questão interessante: a contradição existente no papel do diretor quando este se
assume como legislador e educador, uma vez que a forma como o Estado conduz a
organização educacional leva o diretor, muitas vezes, a privilegiar tarefas legislativas e
administrativas, em detrimento da sua função de educador e de gerenciador das
relações.
13
objetivos educacionais e os pressupostos teórico-metodológicos, ou seja, a filosofia, as
teorias pedagógicas que sustentam e orientam as ações da escola para o atendimento dos
objetivos pretendidos (cf. GARRIDO, 2008; VASCONCELLOS; 1999; PADILHA,
2006; GADOTTI, 1994). Tem como princípio considerar a diversidade da realidade de
cada escola, suas necessidades específicas, seu processo de desenvolvimento interno,
“em que cada escola é resultado de um processo de desenvolvimento de suas próprias
contradições” (GADOTTI, 1994: 3). A elaboração ou reorganização do Projeto Político
Pedagógico (doravante PPP) recuperaria a história daquela realidade, o conjunto dos
seus currículos, dos seus métodos, o conjunto dos seus atores internos e externos e o seu
modo de vida, ou seja, o que representa o “instituído da escola”. Mas, segundo o autor,
“dialeticamente confronta esse instituído com o instituinte, aquilo a que a realidade
chama naquele momento, os desafios e necessidades particulares do seu contexto”
(ibid., p. 3).
Todas essas discussões são importantes para esta pesquisa. Num sentido mais
amplo, são úteis para entender quais são as prescrições para a função de diretor escolar.
Num trabalho que se inscreve no campo interdisciplinar da Linguística Aplicada, que
discute educação e linguagem, essas teorizações representam o resultado de uma
organização da leitura de mundo historicamente contextualizado.
4
O conceito de instrumento será discutido na próxima seção
14
Como apontam Bakhtin/Volochinov (1929-1930/2006), quando uma palavra
entra no horizonte social, ela representa um valor para aquela sociedade e passa a fazer
parte dos mais diferentes discursos: das conversas cotidianas à sua expressão em lei.
Nesse quadro, a compreensão do diretor a respeito de seu papel está relacionada
também a experiências anteriores. Além disso, na realização de uma tarefa, o sujeito não
pode ser concebido como um mero executor, pois o significado dado a seu papel dialoga
com objetivos pessoais, com as várias questões e dificuldades que enfrenta no contexto
de trabalho. O sujeito dialoga com essas dificuldades, re-elabora sua tarefa, redefine sua
função. Ou seja, elas se inscrevem, para ele, na sua história (CLOT, 1999).
15
termo “histórico” permite entender que os sujeitos dessas atividades se constituiriam ao
longo de uma história, com identidades peculiares forjadas no processo histórico. Não
só os sujeitos foram assim constituídos, como também as relações que são percebidas
entre eles, a cultura na qual estão inseridos e a própria atividade enfocada (LIBERALI,
2006a,).
Discutindo as bases das duas teorias (TSH e TA), Dimitri Leontiev (2005)
aponta que enquanto Vygotsky focaliza o desenvolvimento da consciência a partir da
perspectiva da comunicação nas relações sociais, cuja categoria central é a linguagem,
Leontiev ocupa-se das relações práticas que o homem desenvolve no mundo cuja
categoria primária de análise é a atividade, relacionada com objetos e instrumentos.
Ressalva que, para Vygotsky, a relação interindividual não pode ser entendida numa
perspectiva estreita e, portanto, não exclui o social, uma vez que em todos os seus
trabalhos é enfatizada a importância da apropriação, pelo indivíduo, da experiência
histórico-social, ou seja, dos conhecimentos produzidos historicamente e já existentes
objetivamente no mundo no qual o indivíduo vive (LURIA, 2006). Para Dimitri
Leontiev (2005), o que se convencionou chamar de diferenças entre as bases das duas
teorias deve-se mais a uma questão de enfoque, momento histórico e interpretação
posterior do que a conceitos geradores, pois todos os conceitos chaves da teoria da
atividade encontram-se na mesma gênese da Psicologia Histórico-Cultural. O autor
destaca que:
Todos os processos, funções e estruturas do homem emergem, se
desenvolvem e se convertem em atividade relacionada com os objetos
que vinculam o homem ao mundo; todos os processos e funções
16
mentais do homem são derivadas de atividades externas, por meio da
retenção da estrutura reduzida da atividade externa (LEONTIEV, D.,
2005: 33).
Uma atividade prática real, concreta, só se realiza por meio das ações que a
constituem. A ação é um processo que corresponde à noção do resultado que será
alcançado. Assim como a atividade se relaciona com o objeto/motivo, as ações
relacionam-se com os objetivos. Cada ação, por sua vez, realiza-se por meio de
diferentes operações, que dependem das condições de execução da ação ou, dito de
outro modo, das possibilidades do contexto e dos instrumentos por meio dos quais é
realizada.
17
desse papel. Mas esta atividade também está incluída em um sistema de relações com
outras atividades, ou seja: no meu caso como pesquisadora, com meu trabalho
acadêmico na universidade – as teorias aprendidas e o trabalho de dissertação – e
minhas experiências anteriores como coordenadora e professora de cursos de extensão.
Quanto à diretora, interagem, com suas experiências anteriores, as outras atividades do
contexto escolar, tais como: as necessidades da escola, a relação com as outras
participantes da equipe diretiva, com os pais e os alunos, que formam a comunidade
escolar, e também com a Secretaria Municipal de Educação (SME-SP), cujos decretos e
normas sintetizam as orientações do sistema educacional e as transmitem para as
escolas. No interior dessas relações estão as regras que regulam a atividade e a divisão
do trabalho. Para Leontiev, os objetivos das ações devem corresponder à meta a ser
alcançada – nesta pesquisa os objetivos das ações e operações nas entrevistas e nas
reuniões.
18
Engeström sugere que a Teoria da Atividade pode ser resumida em cinco
princípios:
1) um sistema de atividade, mediado por um artefato e orientado para o objeto; visto em
suas relações de rede com outros sistemas, é assumido como unidade primária de
análise;
2) a multivocalidade do sistema com múltiplos pontos de vista, tradições e interesses;
3) a historicidade, os problemas e potenciais do sistema, que só podem ser
compreendidos com base na própria história.
4) o papel central da contradição como fontes de mudança e desenvolvimento; e
5) a possibilidade de transformações expansivas no sistema: os sistemas assumem forma
e são transformados em longos períodos de tempo.
Engeström (1987), com base nas discussões de Leontiev (1977; 1978), que por
sua vez está apoiado nas discussões de Marx e Engels (1845-46/2007), salienta as
contradições na atividade como fundamentais para que transformações ocorram e se
alcance o resultado desejado. Segundo Engeström, a contradição básica presente em
qualquer atividade humana é um choque entre as ações individuais e os sistemas de
atividade da sociedade em que os sujeitos estão inseridos. Em outras palavras, as
contradições estão relacionadas aos contextos sócio-histórico-culturais nos quais os
sujeitos participam. Por exemplo, no caso desta pesquisa, diretora e pesquisadora
trazem para a atividade significados sobre seus papéis, sócio-historicamente construídos
a partir de suas próprias experiências individuais.
7
O conceito de ZPD será discutido em outra seção.
19
participantes – e o nível coletivo – os significados compartilhados nas interações. Todo
esse movimento é resultado da mediação. Nesse sentido, as intervenções possibilitam as
transformações e inovações no sistema coletivo. Como salienta Engeström (1999 b), a
atividade “é alcançada pela negociação, pela orquestração, pela luta constante entre as
diferentes metas e perspectivas de seus participantes”.
Tais conceitos são fundamentais para esta pesquisa que, como já apontado, está
inserida no paradigma da pesquisa crítica, em que se busca não apenas entender a
realidade, mas transformá-la. Organizada como pesquisa colaborativa, esta investigação
focaliza a interação entre a pesquisadora e a diretora no compartilhamento de sentidos e
produção de novos significados sobre direção escolar. Discute, portanto, aprendizagem
e desenvolvimento quanto a novos papéis de direção. Assim, este trabalho foi
organizado preocupando-se com a organização de espaços de colaboração e reflexão
crítica para que os participantes pudessem tomar consciência de suas ações, entendê-las
em seu contexto e na sua história, e transformá-las à luz de novos conhecimentos.
20
premissas do pensamento histórico-dialético marxista (MARX e ENGELS, 1845-
46/2007) e no monismo de Espinoza. Para Vygotsky, a consciência, como uma
característica específica da espécie humana, emerge e se desenvolve a partir da
mediação, ou seja, das relações que o indivíduo estabelece com os outros indivíduos e o
meio. Não existe, portanto, fora de um contexto sócio-histórico, em que a linguagem
assume um papel fundamental.
21
disto deve-se situar a experiência social a de outras pessoas, que
constitui um importante componente do comportamento do homem.
Disponho não apenas das conexões que se fecham na minha
experiência particular (...), mas também das numerosas conexões que
foram estabelecidas nas experiências de outras pessoas (...) por fim ...
o homem adapta ativamente o meio a si mesmo” (VYGOTSKY,
1925/2004: 65).
22
portanto, sociais (WERTSCH, 1991, apud WERTSCH e SMOLKA, 1993/1999).
23
sucessivamente. Uma vez interiorizadas, essas funções superiores se transformam em
“ferramentas mentais” que regulam a atividade do sujeito e possibilitam ao indivíduo
atuar sobre o ambiente de forma controlada e organizada e voluntária (VYGOTSKY,
1930/2004, LEONTIEV, D., 2005).
24
científicos ao discutir o contexto escolar, salientando o fato de estes últimos serem
produzidos em colaboração sistemática entre o professor e a criança. Em consequência
dessa colaboração, o indivíduo torna-se capaz de se envolver em atividade
desenvolvimental consciente e volitivamente, ao invés de só espontaneamente. Para
explicitar essa relação, Vygotsky introduziu o conceito de ZPD (zone of proximal
development ou zona proximal de desenvolvimento), discutido pelo próprio autor de
diferentes formas (VYGOTSKY, 1934/2001: 244-311; 1926/2004b: 480 et seq.) e
interpretada por pesquisadores pós vygotskianos também diferentemente. A partir da
constatação de que “O que hoje a criança faz com auxílio poderá fazer amanhã por
conta própria” (VYGOTSKY, 1927/2004: 480), o autor salienta que “o
desenvolvimento decorrente da colaboração (...) é a fonte do surgimento de todas as
propriedades especificamente humanas da consciência” (VYGOTSKY, 1934/2001:
331).
25
[Vygotsky] praticou conscienciosamente a metodologia do
instrumento-e-resultado: descobriu a unidade de estudo “psicológica”
caracteristicamente humana, que, já se sabe, não é unidade psicológica
nenhuma, mas uma unidade sócio-histórica; ele descobriu a unidade
(aprendizagem e desenvolvimento). Pois a ZDP nada mais é do que a
unidade psicológica (...) da história (...) e, portanto, o lugar da
atividade revolucionária.
Com base nessas discussões, a ZPD pode ser entendida como uma zona de
possibilidades, um espaço de troca, em que os sentidos dos participantes podem ser
colocados em negociação, em busca da produção de novos significados compartilhados,
que, por sua vez, geram novos sentidos, num movimento incessante. Esse movimento
teria a capacidade de transformar estruturas (MAGALHÃES, 2009p; NEWMAN &
HOLZMAN, 1993/2002). Esse conceito traz enormes implicações para o processo de
ensino-aprendizagem, não só de crianças como do ser humano de forma geral. Segundo
Newman e Holzman, para ser coerente com o pensamento dialético marxista de
Vygotsky, a ZPD deve ser encarada como uma unidade revolucionária, uma vez que
Vygotsky, como marxista, entendia que “a atividade de produzir é inseparável do
produto” (NEWMAN e HOLZMAN, 1993/2002: 90). Nesse sentido, defendem que a
“revolucionária descoberta monista de Vygotsky, radicalmente sintetizada indivíduo-
em-sociedade-na-história é a expressão sociológica da ZPD”. (ibid., p. 90) Assim, mais
do que um fator a se observar no modo como cada pessoa aprende, a ZPD pode ajudar
também a investigar como coletivos de pessoas aprendem.
Como aponta Daniels (2003: 82), Engeström (1987: 174) discute a ZPD dentro
de uma perspectiva “coletivista” ou “societal”, em que é definida como a distância entre
as ações cotidianas do indivíduo e a forma historicamente nova da atividade que pode
ser coletivamente gerada. Segundo Engeström (1999: 180), ZPD seria o espaço de
transformação radical potencial do sistema de atividade, alcançável pelas resoluções das
contradições, ou seja, seria um processo articulador da história da atividade e sua
projeção futura. Em suas palavras: “As tensões relacionadas ao agrupamento de ações e
vozes oferecem uma janela na emergente ZDP do sistema de atividade local” (ibid., p.
180). De acordo com qualquer uma das definições, os conceitos de mediação, ZPD e
colaboração estão estreitamente relacionados no processo de desenvolvimento humano.
26
também de conflitos, em que as participantes compartilham a produção do
conhecimento por meio de sentidos e significados construídos e “em que as mediações
sociais são “pré-requisito” (instrumento) e “produto” (desenvolvimento)
(MAGALHÃES, 2009p, grifos da autora). Esse conceito me possibilita entender se e
como os espaços de troca e discussão entre os participantes foram organizados e se, de
fato, possibilitaram o desenvolvimento e a transformação dos envolvidos; se a relação
que se estabeleceu entre diretora e pesquisadora deu-se por meio de “ZPD mútuas que
foram criadas” (JOHN-STEINER, 2000), promovendo aprendizagem para ambas; e,
ainda, se e como essa aprendizagem se reflete no contexto imediato.
27
Na mesma direção, Bakhtin discute a consciência humana no arcabouço teórico
da filosofia da linguagem. Para ele, a consciência só pode se desenvolver se encontrar
um material concreto, flexível, veiculado pelo corpo (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV,
1929-1930/2006). Esse material é o signo, a palavra, que pode ser utilizada tanto como
signo exterior ou também como signo interior. A própria consciência surge e se afirma
como realidade mediante a encarnação material em signos e somente no processo de
interação social. Nessa direção, Bakhtin postula que não existe um abismo entre
atividade psíquica interior e sua expressão. Tudo o que ocorre no psiquismo pode
tornar-se material para a expressão da atividade psíquica, uma vez que tudo pode
adquirir um valor semiótico e, assim, tornar-se expressivo. Estes signos, as palavras, são
intrinsecamente sociais, na medida em que emergem nas relações do indivíduo com os
outros e estão impregnados de conteúdo ideológico (semiótico). Assim, “os signos são o
alimento da consciência individual, sua lógica e suas leis”
(BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 1929-1930/2006: 36).
Dessa maneira, para Bakhtin, é na linguagem e pela linguagem, na interação e
evolução constante entre os diversos enunciados proferidos pelos falantes em diversas
situações de comunicação, que o homem se constitui. A enunciação é entendida como
uma unidade significativa da língua, escrita ou oral, que comporta outras vozes além da
voz do enunciador, não existindo fora de um contexto sócio-histórico. A tensão entre os
diversos enunciados é o que Bakhtin chamará de relações dialógicas. A idéia de
dialogia é fundamental nos escritos de Bakhtin sobre os processos mentais e sociais
humanos e diz respeito a como uma ou mais vozes entram em contato. Dito de outra
maneira, só podemos entender qualquer enunciação, na relação com as outras
enunciações (WERTSCH e SMOLKA, 1993). Isso significa que a palavra utilizada e
pronunciada por um indivíduo já carrega, em si, índices de valor, ou seja, crenças,
modos de pensar, idéias que despontam numa determinada sociedade e são absorvidas
pela comunicação cotidiana (BAKHTIN/VOLOCHÍNOV, 1929-1930/2006). Em seu
processo de vida, os indivíduos estão sempre imersos numa corrente de comunicação,
nossos enunciados comunicam com outros: respondem, refutam, complementam. Nesse
sentido, nossas palavras carregam outras “vozes”, por meio das palavras que já foram
pronunciadas por outros. Esse movimento se dá, não apenas em relação ao falante
imediato, mas também, a discursos que já foram proferidos ou a outros que ainda o
serão.
28
Neste sentido é sempre heterogêneo, pois comporta pelo menos duas vozes: a do falante
e aquela em oposição a que se construiu (FIORIN, 2006). Bakhtin/Volochínov (1929-
1930/2006) aponta que o indivíduo, ao proferir um enunciado, preocupa-se não apenas
com o objeto do discurso, mas também com todos os outros discursos à sua volta. Essas
relações dialógicas podem ser entendidas como um conflito de vozes, que lutam na
enunciação e mostram pontos de vista e possibilidades semânticas, numa influência
recíproca. Os participantes da interação assumem atitudes avaliativas e acabam por
expressá-las tanto por meio de expressões orais quanto gestuais ou de entonação da voz.
Para compreender como se dá a apreensão da palavra do outro, do discurso alheio que
habita em nós, Bakhtin (1934-35/1998) faz uma distinção entre discurso internamente
persuasivo e discurso de autoridade.
29
Para Vygotsky, o sentido e o significado são duas faces do signo. Os significados estão
dados, fazem parte do social. Mas na apreensão individual, o significado da palavra não
é estável, constante ou imutável, dado de uma vez por todas. Quando um indivíduo
apreende o significado de uma palavra, o trabalho com ela apenas se inicia, pois o
significado evolui na cooperação entre os indivíduos. Uma palavra, um signo, contém
tanto o sentido (pessoal) como o significado (social) em constante tensão dialética. O
significado é a parte estável do signo.
30
direção de entender como determinados termos como gestão, participação, cidadania,
qualidade, entre outros, despontam com maior ou menor força numa determinada
sociedade e num contexto como o escolar, e começam a fazer parte do discurso das
participantes. Na medida em que estas palavras trazem conceitos historicamente
construídos, é necessário aprofundar quais os sentidos que as participantes construíram
para esses conceitos. Entendendo que, numa perspectiva vygotskiana, a aprendizagem e
o desenvolvimento ocorrem quando se internaliza um conceito na relação com o outro, a
internalização acontece nas significações constituídas no processo de interação, às quais
o sujeito confere um sentido pessoal.
No período final dos anos 1980 e na década de 1990, começou-se a discutir, nos
meios científicos e acadêmicos, de que maneira as novas formas de entender o mundo
impactavam as ciências humanas de maneira geral. Nesse movimento, questionou-se
como os paradigmas de pesquisa e de construção de conhecimento, ainda muito
centrados num modelo positivista, afetavam a L.A. e que impactos trariam para uma
forma de fazer pesquisa de natureza aplicada num quadro crítico. Para Signorini
(1998/2004: 8) “novos e diversificados focos de interesse e novos grupos de
31
pesquisadores trabalhando na área favoreceram a expansão e a consolidação de uma
base multidisciplinar na constituição dos procedimentos de investigação próprios do
campo aplicado”, o que, por sua vez, possibilitou a emergência de um caráter
transdisciplinar.
Essas discussões têm apontado cada vez mais para uma L.A. que, mais do que
“aplicada” está “implicada” (ROJO, 2006), ou seja, um campo de estudos “implicado”
com o social, desmascarando uma concepção asséptica e ingênua da ciência e do
conhecimento. Essa L.A. transdisciplinar tenta “criar inteligibilidades para problemas
sociais em que a linguagem tem papel central (MOITA LOPES, 2006a: 14) e cuja
característica essencial é o “envolvimento em uma reflexão contínua sobre si mesma:
um campo que se repensa insistentemente” (ibid., p. 17). Para esse movimento, são
necessárias teorizações que dialoguem com o mundo contemporâneo, com as práticas
sociais, com desenhos de pesquisa que considerem diretamente os interesses daqueles
que trabalham e agem no contexto de aplicação.
Por seu caráter multi e transdiciplinar, a L.A. é um campo fecundo para o estudo
de problemas que necessitam da contribuição de várias disciplinas para lançar luz para
as questões em foco. Este é o caso de uma pesquisa que se preocupa com a formação de
educadores, mais especialmente com a formação de diretores. Para o entendimento
desta problemática são convocadas as contribuições de várias disciplinas, tais como: a
psicologia, a educação, a legislação, entre outras. A abordagem adotada nesta pesquisa
exige, ainda, uma discussão sobre os princípios do que se convencionou chamar de
32
pesquisa crítica de colaboração: a centralidade da linguagem, os conceitos de
colaboração e a reflexão crítica.
Tal como vem sendo discutida por Magalhães e colaboradores desde 1990, a
pesquisa crítica de colaboração pode ser considerada como um método de pesquisa
desenvolvido no contexto escolar, situado num paradigma crítico e inserido no campo
interdisciplinar da Linguística Aplicada, mais especificamente, da Linguística Aplicada
Crítica. Esse tipo de metodologia tem algumas especificidades que a distingue das
demais pesquisas em Ciências Sociais: por sua intenção de intervenção comprometida
com a transformação social; pela centralidade que a linguagem ocupa em sua condução;
pelo tipo de relacionamento entre os participantes. Agrega pesquisa e formação e cria a
possibilidade dos participantes (incluindo os pesquisadores) aprenderem, por meio da
participação coletiva na condução da pesquisa, e estarem comprometidos com a
produção de conhecimentos significativos e com a transformação das práticas em foco,
visando à superação das condições sociais de desigualdade em todas as suas
manifestações: pobreza, autoritarismo, preconceito, violência, etc.
(...) este tipo de pesquisa tem sido utilizada como lócus de discussão,
para repensar as necessidades de seu contexto específico, isto é, a
cultura tradicional que dita as regras que organizam os papéis da
equipe diretiva, de professor e de alunos. Mais ainda, espaços para que
a escola, como um todo, discutisse, questionasse e, realmente,
trabalhasse, contra a alienação e individualidade que, em geral,
embasa toda a organização escolar, bem como com os problemas que
hoje se colocam como resultado de novas organizações sócio-
histórico-culturais (e.g., a violência, o desânimo, a certeza da falência
e os péssimos resultados de avaliações locais, nacionais e
internacionais). Em suma, uma metodologia que organizasse os
projetos de pesquisa e de extensão como “pré-requisito e produto,
ferramenta e resultado do estudo”, de forma a possibilitar
aprendizagem e desenvolvimento a todos os participantes.
33
bem como desenvolverem uma prática sistemática de análise e interpretação dos
discursos, com o objetivo de transformar suas ações à luz de outras informações. Nesse
tipo de pesquisa os conceitos de reflexão crítica e colaboração são fundamentais.
34
familiar – que não será aqui discutida), bem como os papéis que os participantes
assumem em cada uma delas (ibid., p. 101). Esses padrões variam quanto a: intensidade
de colaboração, duração, processos interacionais envolvidos e objetivos. A autora
adverte, ainda, que tais padrões não são hierárquicos e muitas vezes a colaboração
começa com um padrão e termina com outro.
35
possibilitam aos participantes distanciamento, reflexão e autocompreensão, em relação
aos seus próprios discursos, e a relação destes com a prática efetiva que desenvolvem.
Na negociação e resolução desses conflitos está a possibilidade de desenvolvimento e
aprendizagem, ou seja, a produção compartilhada de novas compreensões e
possibilidades de ação.
36
marcada pela avaliação das práticas, segundo as normas da teoria e nas situações em
que ela tem lugar é comum se observar tentativas de aplicar conhecimentos teóricos,
mesmo sem uma compreensão real sobre eles.
Com base na discussão de Freire (1970), Smyth (1992) aponta que o processo
reflexivo se desenvolve a partir de quatro ações de linguagem, que estão estreitamente
relacionadas e não são hierárquicas: descrever (o que faço?); informar (o que agir
deste modo significa? ou qual a fundamentação teórica da minha ação?); confrontar (a
que interesses servem minhas ações?); reconstruir (como posso agir de forma
diferente?). Estas ações como já dito, estão relacionadas e a separação é apenas
metodológica/didática. Todavia, saliento que as ações do descrever e do informar estão
relacionadas ao microcontexto de ação, diferentemente das ações do confrontar e do
reconstruir.
37
injustiças e preconceitos. A compreensão de suas práticas, dialeticamente relacionadas
com o resultado das três ações anteriores, pode proporcionar ao sujeito a possibilidade
de reconstruir sua ação, intervindo de forma mais produtiva no contexto escolar. O
momento de reconstruir sua ação coloca-se quando o participante se pergunta: como
posso agir de modo diferente? É o momento de emancipação de si mesmo e da
possibilidade de se tornar um agente de transformação.
38
interconectado.
39
7) CONSOLIDAR – consiste em olhar para a situação e para as práticas
implementadas e pensar prospectivamente sobre elas, para imaginar novas
possibilidades em estágios futuros.
40
humano, nos processos de aprendizagem e desenvolvimento, a concepção de linguagem
adotada nesta pesquisa será retomada e articulada com as teorias linguísticas que
sustentam a análise e a discussão dos resultados.
O objetivo desta seção é discutir, com base no quadro teórico exposto, as teorias
linguísticas que orientam a análise de dados neste trabalho. Para isso, inicio
apresentando a concepção de linguagem adotada na pesquisa. Retomo alguns
pressupostos do pensamento de Bakhtin e Vygotsky, discutidos também por autores
pós-vygotskianos: Newman & Holzman, 1993/2002; Wertsch & Smolka, 1993,
entremeando essas discussões com a de outros autores: Liberali (1999), Kerbrat-
Orecchioni (2006), Pontecorvo (2005), Orsolini (2005), Mackay (2001), Brookfield &
Preskill (2005), Magalhães e Fidalgo (2007) que contribuem para expandir o tópico em
debate. A seguir, apresento brevemente as categorias propostas por Bronckart
(1997/2007): o plano geral, os conteúdos temáticos; os tipos de discurso, mais
especialmente o discurso interativo pertencente ao eixo do expor; e as sequências,
retomadas de Adam (1992 apud BRONCKART, 1997/2007) e reconceitualizadas pelo
autor (narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa e dialogal), enfatizando a sequência
argumentativa e, por último, os mecanismos enunciativos. Encerro a discussão apontando
como esses conceitos contribuem para esta pesquisa.
Wertsch & Smolka (1993/1999: 127, 128, 133) discutem, a partir do conceito de
dialogia de Bakhtin, como são apresentadas as várias maneiras pelas quais as vozes
entram em contato e contribuem para uma compreensão ativa da palavra do outro: a)
interação face-a-face com alternância de turnos; b) utilização de palavras e/ou
41
expressões de outra voz; c) repetição da voz do outro; d) referência às elocuções do
outro; d) pressuposição silenciosa da fala do outro; e e) reação responsiva a elas. Esse
entrelaçamento de vozes, presente nos enunciados, propicia a geração de novos
significados e funcionam como recursos de pensamento, pois qualquer texto (oral ou
escrito) possui duas funções básicas “comunicar significados adequadamente e criar
novos significados” (LOTMAN, 1988: 34, apud WERTSCH & SMOLKA, 1993/1999:
133). Nos textos em que a função dialógica predomina, “cada voz tomará os enunciados
das outras vozes como estratégias de pensamento (...) essas enunciações são vistas
como propiciadoras de um movimento em forma de negociação e geração de
significado” (WERTSCH & SMOLKA, 1993/1999: 136).
Retomando, mais uma vez, que um dos objetivos desta pesquisa é investigar o
processo de produção de novos significados compartilhados sobre direção escolar a
partir de um processo de colaboração desenvolvido entre uma pesquisadora e a diretora,
a noção de dialogia contribui para a compreensão dos dados. É essencial para que se
entenda como as participantes trazem, para os seus discursos, outras vozes e como, ao
longo do trabalho desenvolvido, ocorreu ou não a apreensão da palavra do outro e o
compartilhamento de significados na interação que desenvolvem durante o trabalho.
42
comportamentos, ou seja, não são independentes um do outro.
43
marcam um não desenvolvimento são: repetir, confirmar, referir-se a uma experiência
pessoal.
44
provoca uma argumentação mais profunda e produz análises mais acuradas do
problema.
Nessa direção, Brookfield & Preskill (2005) pontuam que, na troca interativa, a
discussão é a construída com diversas experiências e interpretações dos participantes
sobre o objeto da discussão. Embora o coordenador da discussão tenha responsabilidade
por guiá-la, nenhuma pessoa sozinha controla a direção da discussão completamente.
Boas discussões são imprevisíveis e surpreendentes, na medida em que revelam tanto
aspectos sobre os participantes como sobre o tema em debate, que iluminam e para o
qual abrem novas perspectivas. Porém, os autores também apontam que, mesmo quando
45
as discussões têm um bom começo, devido à variedade de circunstâncias presentes na
situação de interação, elas podem conduzir a um bloqueio coletivo.
Para eles, a questão central é verificar quais as condições que inibem o diálogo e
quais as medidas que podem ser tomadas para superar essas inibições. Nessa direção, os
autores discutem a função das perguntas no desenvolvimento do raciocínio e apontam
que os diversos tipos de perguntas possuem funções específicas na conversação e que
colaboram para o aprofundamento dos sentidos declarados e para a construção de novos
significados compartilhados. No quadro abaixo, retomo algumas categorias de
perguntas propostas pelos autores:
46
categorias principais: as perguntas abertas, que estimulam o interlocutor a formular uma
resposta; as perguntas fechadas, que em geral esperam um tipo de resposta específica ou
monossilábica; e as perguntas contraproducentes que não têm utilidade na enunciação.
47
aprofundam as razões apresentadas e em geral podem conduzir o participante a justificar
suas escolhas.
2. Perguntas que pedem por mais evidências ou clarificação: São questões que
permitem aos participantes expandir as idéias para serem entendidas tanto para si
mesmos como pelos outros e têm a função de aprofundar o entendimento do objeto
em foco (explica melhor...., qual...., quais......, o que.....);
3. Perguntas que pedem explicação: São perguntas que exigem uma justificativa –
provocam o pensamento e a resolução de problemas (como... ?, por que...?, para
que... ?;
4. Perguntas síntese que resumem o que foi discutido: são perguntas que pedem uma
síntese do que foi discutido e exigem uma abstração: (quais as conclusões ...?);
48
Nessa direção, cada novo texto empírico contribui para a transformação histórica
permanente.
49
Essa distinção aponta para os dois eixos descritos no quadro a seguir: O eixo do
narrar e o eixo do expor. O narrar refere-se ao mundo que deve ser avaliado ou
interpretado. O expor refere-se à interpretação dos conteúdos temáticos à luz de critérios
de validade. Por outro lado, nas operações de explicitação da relação dos parâmetros da
ação de linguagem em curso, temos o texto implicado e o texto autônomo. O texto é
implicado por meio de referências explícitas aos parâmetros da ação de linguagem. Isso
se dá por referências dêiticas a esses mesmos parâmetros e requer conhecimento das
condições de produção nas quais o texto se insere.
O Discurso interativo
O mundo do expor implicado realiza-se num discurso interativo, em que se faz
necessário o conhecimento prévio dos parâmetros da situação. Este tipo de discurso tem
o formato de diálogo ou monólogo marcado com as seguintes características
linguísticas:
• Frases interrogativas, imperativas, exclamativas;
• Sistema temporal que exprime a relação que é colocada entre o momento dos
acontecimentos verbalizados no texto e o momento da tomada da palavra na
interação (presente, pretérito perfeito e futuro perifrástico);
• Unidades que se referem a objetos acessíveis aos interagentes, ou ao espaço tempo:
dêiticos espaciais (Estou aqui.) e temporais (Agora não vou.); aos interactantes (Isto
é seu?);
50
• nomes próprios, verbos, pronomes e adjetivos em 1ª. e 2ª. pessoas do singular e
plural (referindo-se diretamente aos protagonistas da interação verbal);
• expressão do tipo “a gente” ou “você” (em lugar de “nós”);
• auxiliares (poder, querer, dever, ser preciso).
A organização sequencial
Uma outra característica pode ser observada no interior do plano geral de um
texto e constitui elemento essencial para análise, considerando-se sua forma de
desenvolvimento. É a organização sequencial ou prototípica do conteúdo temático que
se constitui ingrediente da infraestrutura dos textos. São modelos abstratos em que os
produtores de texto se apoiam e que permitem aos produtores de textos organizarem
suas ações de linguagem (BRONCKART, 1997/2007: 217). Baseado na situação da
ação de linguagem, o produtor faz uso das estruturações linguísticas convencionais,
orientado pelo objetivo que busca alcançar e pelas representações que tem do
destinatário. As sequências textuais, retomadas de Adam (1992) e reconceitualizadas
por Bronckart (1997/2004) são modos de planificação da linguagem dentro do plano
geral do texto (narrativa, descritiva, argumentativa, explicativa e dialogal) e outros
modos de planificação que podem ser combinadas em um mesmo texto. De relevância
para esta pesquisa destacamos a sequência argumentativa, considerando especialmente
os elementos enunciativos que a caracteriza.
Sequência argumentativa
A sequência argumentativa é importante nesta pesquisa e está relacionada aos
tipos de perguntas e à maneira como um argumento é elaborado.
51
2) fase de apresentação dos argumentos – elementos que orientam para uma conclusão
provável que podem ser apoiados por regras gerais, lugares comuns, etc.;
4) fase de conclusão (ou de nova tese) em que – faz-se uma integração dos
argumentos e contra argumentos; (grifos do autor)
Essas fases, segundo Bronckart (1997/2007: 227), podem ser realizadas de modo
simplificado, deixando implícitas outras fases, ou, de modo complexo, com fases
múltiplas.
Contribuindo para esta discussão, Mosca (2004) pontua que a argumentação está
presente em toda e qualquer atividade discursiva, e nesta perspectiva, argumentar
significa considerar o outro como capaz de reagir e interagir diante das idéias, teses que
lhes são apresentadas num movimento dialógico. Neste sentido, aprender a argumentar
52
é também aprender a pensar e a ler os discursos à nossa volta com maior profundidade.
Argumentar também é “integrar-se no universo do outro”, ou seja conseguir o que se
deseja de cooperativo e construtivo, buscando, traduzindo nossa verdade dentro da
verdade do outro” (ABREU, 2006: 10).
Esses conceitos são importantes para este trabalho para entender os argumentos
que expressam os sentidos da diretora e da pesquisadora durante toda a pesquisa e é no
conjunto das premissas apresentadas durante a interação que se percebe a construção do
argumento de cada um dos participantes. Tais conceitos estão, também, relacionados
com os tipos de perguntas produzidas na troca interativa que se estabeleceu entre
diretora e pesquisadora.
Os Mecanismos enunciativos
Os mecanismos enunciativos constituem o nível mais visível de organização do
texto e propiciam sua coerência pragmática: esclarecem os posicionamentos
enunciativos (instâncias que assumem o que é enunciado no texto); expressam as
diversas avaliações (julgamentos, opiniões, sentimentos) sobre alguns aspectos do
conteúdo temático; e as vozes, integrantes dessa camada, assumem a responsabilidade
pelo enunciado. A importância deste item está em permitir analisar os dados buscando
compreender como as participantes (diretora e pesquisadora) assumem a
responsabilidade de seus atos enunciativos.
53
propõe quatro funções de modalização, a saber: lógicas, deônticas, apreciativas e
pragmáticas. Bronckart & Machado (2004) discutem essas funções e denominam como
relações predicativas. Distinguem as relações predicativas diretas (asserções neutras,
sem metaverbos) das indiretas, que são classificadas de acordo com o metaverbo que as
precede. São eles:
• valor deôntico (dever, ser preciso, etc.), que explicita os determinantes externos do agir;
• valor pragmático (querer, tentar, buscar, procurar, etc.), que explicita as intenções do
agente;
• valor psicológico (pensar, acreditar, considerar, etc.), que explicita os recursos
cognitivos do agente;
• valor epistêmico (ser verdade, poder, etc.), que explicita o grau de verdade ou certeza
objetiva sobre o predicado;
• valor apreciativo (gostar, apreciar, etc.), que explicita a posição subjetiva do agente em
relação ao predicado.
54
CAPÍTULO 2
FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA
O que pode ser buscado nos mestres do marxismo não é a
solução da questão, e nem mesmo uma hipótese de trabalho
(porque estas são obtidas sobre a base da própria ciência), mas
o método de construção. [...] Eu quero aprender, a partir do
método de Marx, como construir uma ciência, como conduzir a
investigação da mente (VYGOTSKY, 1927/2004).
8
Tradução minha. No original: “Theoretical change in social sciences often occurs when the domain
assumptions or infrastructure of theory are dissonant with shared sentiments and interests”.
55
científico: o técnico, o prático e o emancipatório. O interesse técnico procura entender a
realidade empírica e busca maneiras de controlar o meio através do trabalho, ou seja, do
agir instrumental. O interesse prático, por sua vez, diz respeito à influência da atividade
cultural e histórica nas relações entre indivíduos em sua vida social. Finalmente, o
interesse emancipatório é compreendido por Habermas como a ligação entre os saberes
teórico e prático na busca de valores éticos na atividade humana. Pautados na discussão
habermasiana, Bredo e Feinberg (1982) observam que são três os paradigmas que
norteiam os tipos de pesquisas desenvolvidas academicamente: o Positivismo, o
Interpretativismo e o Crítico. De acordo com a filosofia positivista, o método científico,
emprestado das ciências naturais, assume a separação entre o sujeito e o objeto de
conhecimento. A base do conhecimento científico é, nessa visão, constituída por fatos
da experiência sensorial e que são pensados como indubitáveis, podendo ser
relacionados e explicados por leis gerais, ou padrões de leis integradas em sistemas
teóricos coerentes. No ideal do positivismo há uma busca de um conhecimento válido,
verdadeiro e comprovado, que pode ser replicado, independente do contexto: o ideal de
um “verdadeiro” saber positivista é ser cientificamente comprovado, em uma dada
teoria que pode ser aplicável a “todos os mundos sociais concretamente desiguais”
(RIZZINI et al., 1999: 38). Deste ponto de vista, não há diferença metodológica entre
estudar pessoas ou fenômenos sociais e estudar fenômenos naturais. Esse paradigma ou
modelo imperou nas ciências sociais até aproximadamente a década de 1960, e
encontrou oposição no interpretativismo e nas abordagens qualitativas, que propunham
uma abertura nas concepções e entendimentos de pessoas e grupos que eram estudados
(BREDO e FEINBERG, 1982: 4 et seq.).
56
particular, constituído por um conjunto de termos e conceitos. O conhecimento é gerado
considerando-se as convenções adotadas por uma determinada comunidade científica. A
pesquisa realizada dentro de um paradigma interpretativista tem como função essencial
a possibilidade de encontrar sentidos atribuídos, pelos agentes, à realidade investigada,
para explicar essa realidade. Nessa perspectiva, existe um envolvimento entre “o
conhecedor” e “o conhecimento”, ou seja, entre o sujeito que conhece e o objeto da
investigação (BREDO e FEINBERG, 1982).
Rizzini et al. (1999) apontam que, nas ciências humanas e sociais, as primeiras
iniciativas para a criação de metodologias de pesquisa dirigidas para a resolução de
problemas sociais e organizacionais surgiram na década de 1940 com Kurt Lewin. Teve
lugar, então, a pesquisa denominada participativa, definida pelas autoras como “um
9
Tradução minha. No original: “For the critical theorist, knowledge must be seen in the context of its
constitution in potential contribution to social evolution, where social evolution is conceived of in terms of the
possibility for progressive material and symbolic emancipation. This view places knowledge in a societal and
historical-developmental perspective that highlights its repressive or emancipatory potentials”.
57
método, uma estratégia de pesquisa, concebida a partir dos problemas vividos pela
população pesquisada, com a participação de grupos sociais diretamente envolvidos na
problemática e em todo processo de conhecer e transformar a realidade” (RIZZINI et
al., 1999: 38). Nessa abordagem espera-se uma mudança de comportamento dos
envolvidos: pesquisadores e participantes são chamados a serem co-autores, tanto no
diagnóstico como na criação de alternativas para a realidade discutida, e o grupo, na sua
totalidade, é responsável pela análise dos resultados obtidos e pela possível re-
elaboração.
10
A Teoria Crítica será discutida a seguir.
58
pesquisa adotado neste trabalho bem como para entender em que paradigma esta
pesquisa está situada e como ela focaliza o papel dos participantes. Como já apontei, a
PCCol tem algumas especificidades que a distingue das demais metodologias de
pesquisa em Ciências Sociais: por sua intenção de intervenção comprometida com a
transformação social; pela centralidade que a linguagem ocupa em sua condução; pelo
tipo de relacionamento entre os participantes. Agrega pesquisa e formação e cria a
possibilidade dos participantes (incluindo os pesquisadores) aprenderem, por meio da
participação coletiva na condução da pesquisa, e estarem comprometidos com a
produção de conhecimentos significativos e com a transformação das práticas em foco,
visando à superação das condições sociais de desigualdade em todas as suas
manifestações: pobreza, autoritarismo, preconceito, violência, etc. Defino-a a seguir.
Nessa direção, optei pela PCCol, pois entendo, como propõe Magalhães
59
(2009p), que este tipo de pesquisa é ao mesmo tempo instrumento e resultado num
contexto de formação crítica, ou seja, ao mesmo tempo em que procura entender, busca
uma transformação da realidade. Ao mesmo tempo em que possibilita que os
participantes explicitem seus sentidos, pretende oportunizar a construção e
compartilhamento de novos significados, gerando transformações no objeto da
atividade.
Assim, durante todo o desenvolvimento do estudo, preocupei-me em agir como
pesquisadora com foco não apenas nos conceitos que trazia, mas considerando
prioritárias as necessidades do contexto em foco. Neste sentido, a todo momento
procedia a uma análise crítica de minhas ações para compreender quais espaços de
aprendizagem e desenvolvimento mútuo estava criando. Em outras palavras, procurei
levar em conta o interesse de todos os envolvidos, além de criar espaços de produção de
conhecimento em que ambas (a diretora e eu) pudéssemos “ter vez e voz para colocar
[nossas] experiências, necessidades e sobre os sentidos que [atribuíamos] a estas
necessidades” (MAGALHÃES, 1998a /2007).
60
final desse ano, concluí o Curso de Pedagogia na USP, optando pela habilitação em
Orientação Educacional. É importante destacar que, nessa ocasião, as funções do
orientador educacional não contemplavam questões de caráter pedagógico. Com o
intuito de completar minha formação, iniciei no ano seguinte a habilitação em
Supervisão Escolar. Em 1984, assumi a orientação educacional da escola onde havia
estudado, tendo como responsabilidade a organização e a implementação desse serviço
no ensino fundamental; e em 1987 fui convidada para assumir a coordenação geral e
pedagógica desse segmento do ensino fundamental. Em 1996, como decorrência de uma
avaliação institucional, juntamente com duas outras coordenadoras assumimos a
coordenação geral da escola, numa experiência de direção compartilhada.
61
entremeada aos depoimentos, havia a explicitação das concepções que sustentavam esse
trabalho, destacando os fundamentos filosóficos, o quadro teórico e o papel central da
linguagem como instrumento e resultado dessas transformações. No auditório, fui
também contagiada por um entusiasmo e por uma imediata sensação de identidade com
as idéias expostas. Assim, posso afirmar que, ao participar do evento Ação Cidadã, as
minhas questões pareciam ter encontrado um método, uma perspectiva teórica e um
encaminhamento.
Diante dessa situação, conversei com a diretora e expliquei que, caso ingressasse
no mestrado stritu senso na área educacional, gostaria de desenvolver uma pesquisa
investigando o papel do diretor escolar. A essa altura, já havia feito minha adesão à
perspectiva metodológica da PCCol e expus, brevemente, os objetivos iniciais deste tipo
de pesquisa, a metodologia e os procedimentos.
62
que atendem crianças de 4 a 6 anos no município de São Paulo). A Educação Infantil é
parte integrante da Educação Básica e é uma das áreas educacionais cuja demanda tem
sido crescente.11 A Secretaria Municipal da Educação possui 469 EMEIs, divididas em
13 coordenadorias responsáveis pelas orientações técnicas e pedagógicas. A EMEI em
questão está localizada no bairro Cidade Tiradentes e pertence à Coordenadoria de
Guaianases. Nesta região existem 30 EMEIs, que atendem, diretamente, 38.368
crianças. Abaixo descrevo a caracterização do bairro e sua população
Cidade Tiradentes possui, portanto, uma população estimada em 220 mil habitantes
que estão, de certa forma, separados por dois níveis de pobreza: há 71 equipamentos na cidade
formal e 3 na informal; a renda média do chefe de família varia de 500 a 1200 reais na Cidade
Formal e de 200 a 500 na Informal; o analfabetismo vai de 0 a 10% na Cidade Formal, ao
passo que, na Informal, o índice fica entre 10 e 20%. As áreas ocupadas pela população da
Cidade Informal são lacunas deixadas na construção dos prédios da Cohab; ocupações nas
bordas dos conjuntos e, também, resultado de expansão da mancha urbana.
11
Dados obtidos a partir do Sistema de informações gerais da Secretaria Municipal de Educação. Disponível em:
<http://portaleducacao.prefeitura.sp.gov.br/WebModuleSme/itemMenuPaginaConteudoUsuarioAction.do?service=Pa
ginaItemMenuConteudoDelegate&actionType=mostrar&idPaginaItemMenuConteudo=4855>. Acesso em 22 de
janeiro de 2008.
12
As informações foram extraídas do site da Prefeitura do Município de São Paulo. Disponível em:
<http://portal.prefeitura.sp.gov.br/subprefeituras/spct/dados/historico/0001> Acesso em 22 de janeiro de 2008.
63
necessidades básicas da população. Muitas pessoas vieram para Cidade Tiradentes em busca
da realização do sonho da casa própria, embora boa parte tenha se deslocado a contragosto,
na ausência de uma outra opção de moradia. Por não terem encontrado, no local, uma infra-
estrutura adequada às suas necessidades, aliado ao fato de que a região oferece escassas
oportunidades de trabalho, seus habitantes reconhecem Cidade Tiradentes como bairro
dormitório e de passagem e não de destino.”
64
enquanto a assistente e a coordenadora são participantes secundárias, uma vez que no
momento em que a escola se reorganizava com a chegada da diretora, não foi possível
organizar reuniões sistemáticas com a presença simultânea das quatro participantes13.
Diretora (Valéria*): tem formação inicial em História pela PUC-SP. Foi professora do
Ensino Fundamental II por 10 anos, assistente de direção de uma Escola Municipal de
Ensino Fundamental II (quinta a oitava série) por 5 anos e diretora nomeada de um
Centro de Educação Unificada (C.E.U.) por 4 anos. Desde janeiro de 2007 é diretora
efetiva nesta EMEI.
65
com a diretora e com as participantes secundárias, bem como em observações de
eventos que envolviam a comunidade escolar. Todas as reuniões e entrevistas foram
audiogravadas, transcritas e compartilhadas com a equipe técnica. Algumas das
entrevistas foram semi-estruturadas, na medida em que tiveram o apoio de questionários
previamente elaborados por mim, a pesquisadora.
Quadro 2.1. Visão geral dos instrumentos de produção dos dados e sua utilização
Instrumento de
Ocorrências Objetivos
produção de dados
Entrevistas com a
8
diretora As entrevistas foram organizadas com diversos
Entrevista com a objetivos dependendo da época em que ocorreram:
2
Coordenadora aprofundar as concepções dos participantes,
aprofundar conceitos discutidos,
Entrevista com a proporcionar espaços de reflexão
2
Assistente técnica
15
**Não foram analisados
66
Quadro 2.2 - Artefatos utilizados em mediação explícita
Artefatos Ocorrências Objetivos
¾ Entrevistas
¾ Observação de:
67
A equipe diretiva me permitiu que assistisse a essas reuniões com o objetivo de
conhecer, de forma mais detalhada, os contextos de atuação das participantes; verificar a
relação entre o prescrito planejado e o que efetivamente ocorria; e oferecer subsídios
para as discussões.
¾ Reuniões reflexivas.
¾ Documentos Oficiais.
É importante deixar claro que durante a pesquisa, muitas vezes foram utilizados
mais de um instrumento no mesmo encontro. Por exemplo, no dia 22 de maio de 2007,
iniciei observando a reunião de pais. Depois, conforme havia combinado com a diretora,
fiz uma entrevista semiestruturada com pais e professores, com o objetivo de verificar
qual a compreensão que eles tiveram dos assuntos discutidos na reunião. Os dados das
entrevistas com pais e funcionários foram transcritos, disponibilizados para a direção,
mas não analisados.
Descrevo a seguir os artefatos de mediação explícita.
68
¾ Tabela de ações (em anexo).
Construí este artefato, atendendo à solicitação da diretora para colaborar com ela
na construção de um plano. O critério que orientou a seleção dos temas que constam na
tabela foram aqueles que a diretora considerava importante priorizar na condução da
escola, colhidos nas entrevistas e reuniões realizadas ao longo de 2007, quais sejam: a
participação dos pais, alunos e equipe técnica; formação de agentes e professores. O
objetivo da tabela foi orientar a reflexão sobre os espaços criados e orientar um plano de
ação para a concretização das intenções explicitadas.16
O critério que orientou a minha escolha dos excertos foi o foco nas ações
desenvolvidas pela diretora em relação às várias tarefas do diretor escolar, que
constavam das transcrições de nossas reuniões. Durante o jogo, foram acrescentadas
também papeletas com as ações desenvolvidas por ela durante a semana anterior a
reunião. A diretora teve como tarefa categorizar as ações representadas nos excertos e
depois reorganizar as categorias para incluir as ações desenvolvidas por ela durante a
semana.
69
o artefato foi, posteriormente, nomeado por nós de “Jogo de Papéis”. A utilização deste
artefato marcou um salto na pesquisa.
Como já apontei, meu primeiro contato com a Valéria foi como colega em um
curso sobre gestão escolar (COGEAE). Logo que propus desenvolver uma pesquisa de
campo na escola em que ela estaria assumindo como diretora efetiva no ano seguinte,
interessou-se por participar, mas ressaltou que precisaria inicialmente conhecer os
outros componentes da equipe, para que estes também pudessem opinar sobre aderir ou
não ao projeto. A equipe que se formaria seria totalmente nova, pois os participantes
ainda não se conheciam, o que tornava a situação ainda mais interessante.
Conversei com Valéria durante as férias, por telefone e por e-mail e combinamos
uma data (28 de janeiro de 2007), em que fui conhecer a escola e a equipe diretiva,
composta por ela, uma coordenadora pedagógica (C. P.) e uma assistente técnica (A.
T.). Nesse meu primeiro contato com toda a equipe expliquei, em linhas gerais, quais
eram os objetivos da pesquisa, as perguntas iniciais e esclareci a metodologia. As três
mostraram-se interessadas e receptivas, mas deixei que elas ficassem à vontade para
aderir ou não à proposta. Novamente por e-mail, veio a confirmação de que elas
estavam dispostas a participar.
70
Certamente, devido ao meu trajeto profissional, eu já trazia para a pesquisa os
meus sentidos do que é ser diretor. Por outro lado, meu sentido inicial sobre o meu
próprio papel era o de entender o que era ser diretor escolar num contexto específico e
aprofundar a compreensão de como este papel se desenvolvia e de como a “gestão”
estava acontecendo naquela realidade. Chegando, porém, à escola onde se realizaria a
pesquisa, meus sentidos se interpuseram entre o ideal e a realidade, materializada num
contexto completamente novo, desconhecido. Também fiquei extremamente impactada
com a dinâmica da escola pública, com as inúmeras tarefas que a diretora tinha que
realizar, com os problemas de toda ordem que enfrentava (falta de material, falta de
pessoal administrativo, ausência de funcionários afastados por licença médica, prazos e
exigências legais a cumprir, etc.).
71
lista com excertos de entrevistas que focalizaram ações desenvolvidas pela diretora
durante 2007. A minha lista e a dela foram usadas no “Jogo de Papéis”.
Passo, agora, a apresentar a linha do tempo constituída dos eventos desta
pesquisa. O Quadro 2.3 abaixo dá uma noção geral dos momentos em que estive na
escola pesquisada e dos eventos de que participei. São destacadas com realce cinza as
atividades efetivamente analisadas.
Observação da reunião de
23/03/07 13/05/08 Reunião com a diretora
Professores.
Observação da eleição do novo
“Conselho de Escola”,
20/04/07 13/06/08 Reunião com a equipe
Reunião com a equipe diretiva
Entrevista com pais
Reunião com a diretora e a
27/04/07 16/06/08 Reunião com a diretora
assistente
Observação da reunião de pais
22/05/07
Entrevista com a diretora
Observação da reunião da equipe
1/06/07
técnica
Observação do Conselho de
15/06/07 Escola
Reunião com a equipe técnica.
18
O quadro completo com todos os encontros e os objetivos de cada um deles encontra-se em anexo.
72
Quadro 2.4 - Visão geral dos encontros analisados durante a pesquisa
Evento/
Datas Conteúdo Temático Objetivos Planejados da Ação de pesquisa
Encontro
Organização administrativa Investigar as concepções iniciais da diretora e
burocrática; da CP em relação ao seu papel na escola, à
Relacionamento profissional; gestão escolar, às teorias pedagógicas; e suas
Entrevista expectativas em relação à direção e à
09/03/07 Consciência profissional /
com a diretora formação da equipe.
exigências da função;
Formação de educadores; Conhecer as necessidades da diretora.
Conselho de classe. Aprofundar alguns conceitos já discutidos
Papéis da equipe diretiva; Investigar o relacionamento de teoria e
Entrevista Concepções de gestão; prática: discussão das teorias, verificando a
com a diretora
27/04/07 Organização do trabalho; relação entre o prescrito declarado e o
e
Projeto Político-Pedagógico; efetivamente vivido.
assistente
Participação da comunidade
Aprofundar o entendimento entre as ações
declaradas e a realização.
Participação;
Reunião de Compreender como foi organizada a reunião
Conceito de Gestão;
pais. de pais.
Informes para os pais.
22/05/07 Investigar a relação entre a intenção e a
efetiva participação dos pais.
Dificuldades inerentes á função
Entrevista Discutir o planejamento das atividades na
com a diretora Discussão sobre elaboração de um escola.
plano de ações
Avaliação da diretora: organização
administrativa da escola,
conquistas da equipe, dificuldades
Reunião com enfrentadas durante o ano.
21/09/07 Retomar o trabalho de pesquisa.
a diretora Avaliação da pesquisadora:
andamento da pesquisa.
Solicitação da diretora de
colaboração num plano de ação.
Ações de 2008; Focalizar e organizar o planejamento da
Reunião com continuidade do trabalho.
09/01/08 necessidades da escola/direção,
a diretora
plano de ação. Apresentação da “Tabela de ações”
Discutir a tabela e introduzir outro
instrumento. “Jogo de Papéis” 19
Reunião com Avaliação e discussão das ações
22/02/08 Refletir sobre as várias tarefas
a diretora realizadas em 2007.
desempenhadas pela diretora.
Planejar a continuidade do trabalho.
Plano de ação; Refletir sobre intenções e ações.
Reunião com
11/04/08 Áreas prioritárias de atuação da Avaliar o trabalho para a seleção de novas
a diretora
direção. ações.
Reunião de professores;
Reunião com
13/05/08 Projeto pedagógico; Refletir e aprofundar as discussões iniciadas.
a diretora
Ações da direção.
Trabalho com a comunidade;
Reunião com
16/06/8 Trabalho com os professores. Aprofundar os conceitos discutidos.
a diretora
Organização da equipe diretiva.
19
Para este “jogo” foram utilizados excertos de entrevistas anteriores, identificados com data e turno e
impressos em pequenos papéis. De posse dos papéis a diretora tinha que categorizá-los. Este jogo foi
inspirado no instrumento “fotografando a escola”, elaborado por Ninin (2006) e usado em cursos de
formação de educadores (Diretores e gestores).
73
Explicação das transcrições:
(nono) = hipótese do que se ouviu: Então como (é) que isto fica?
(...) = recorte efetuado pela pesquisadora Ontem eu fiz muitas coisas (...) a mais
importante foi
74
exemplificadas a seguir.
• Plano geral do texto
75
Este primeiro conjunto de informações permite, como já dito, visualizar algumas
das preocupações, sentidos e representações dos participantes: quem são, de onde vêm,
que sentidos atribuem a seu(s) papel(éis), algumas de suas prioridades.
Projeto político pedagógico (PPP) como Papel da direção em relação à articulação da equipe;
instrumento de mediação necessidade de plano de ação
• As modalizações
76
Quadro 2.8 - Modalizações: tipos, conceituação, características linguísticas e exemplos
Características
Tipos Explicação Exemplos na pesquisa
linguísticas
Avaliação de alguns advérbios e VAL6: (((os pais começaram a ))).
elementos do conteúdo orações reclamar, eles resolveram pôr os
temático, apoiada em impessoais que professores pra cobrir esse horário que
valores, nas opiniões e nas indicam seria o pós aula, ou seria as duas aulas
regras constitutivas do obrigatoriedade; complementares. Então aqueles
mundo social, apresentando uso de verbos professores que estavam lá de eventuais,
os elementos do conteúdo auxiliares, ou eles pegaram essas aulas, então eles estão
como sendo do domínio do metaverbos tais no lugar dos oficineiros, ou seja, pra
direito, da obrigação social como: dever, ser Prefeitura fazer isso ela tinha que ter
e/ou da conformidade com preciso, ter que, contratado mais professores, e ela não
deônticas
(personagem, grupo, tais como ser feita desde o início do ano, eles tinham
instituição) em relação às verdade, garantido que em abril chegaria, nós já
ações de que é agente, e poder, etc.; estamos no final de maio e não chega
atribuem a esse agente:
intenções, razões (causas,
restrições), ou ainda,
capacidades de ação
(BRONCKART,
1997/2007)
Avaliação de alguns marcadas (.) VAL4:_ (.), e pra nós é importante o
aspectos do conteúdo preferivelmente uniforme, principalmente numa região
temático, procedente do por adjetivos, carente como essa.(.) Que os pais, o que
mundo subjetivo da voz advérbios ou acontece? Eles acabam trazendo as
Apreciativas
que é fonte desse orações crianças com roupinhas boas, que são
julgamento, apresentando-os adverbiais ou geralmente as melhores que eles têm, pra
como benéficos, infelizes predicativas. escola, que eles rolam no parque, que eles
estranhos, do ponto de brincam, que eles sujam de tinta, e o que
vista da entidade era pra ser feito não pode, infelizmente
avaliadora(BRONCKART, não chegou ainda.
1997/2007)
77
• Análise de Turnos
A análise qualitativa dos turnos foi realizada a fim de compreender o padrão de
colaboração que se estabeleceu durante a pesquisa, para entender como e se os espaços
de discussão favorecerem a aprendizagem e desenvolvimento das participantes e se os
sentidos declarados puderam ser compartilhados Para isso, categorias de análise
específicas foram criadas baseadas nos textos de Pontecorvo (2005), Wertsch & Smolka
(1993/1999), Bakhtin (1986 apud Wertsch & Smolka, 1993/1999), Brookfield &
Preskill (2005) e Kerbrat-Orecchioni (1996/2006). Baseio-me também na categoria
“avanço da fala do outro” desenvolvida por Dellova (2009) para instituir novas
categorias que podem identificar se os comentários ou perguntas das participantes
colaboram ou não para o desenvolvimento da discussão:
1. Avanço da fala do outro: quando um participante expande sua fala trazendo novos
elementos e complementando o que foi dito pelo outro, mostrando que há um
desenvolvimento no raciocínio ou aprofundamento da discussão
2. Não avanço da fala do outro: quando não há desenvolvimento e/ou há uma pausa ou
bloqueio no raciocínio/ ou mesmo quando a discussão não evolui.
O quadro, a seguir, sintetiza as categorias utilizadas.
78
• Tipos de perguntas
79
impossibilitá-la. Com ocorrência marcante nesta pesquisa, esses comentários foram
categorizados conforme apresentado no Quadro 2.11, a seguir.
80
seguintes classes de verbos:
a) Verbos de estado: que remetem a processos estáveis, excluindo qualquer forma de
mudança: saber, ser bonito, etc.
b) Verbos de atividade: que remetem a processos dinâmicos durativos (que implicam
numa certa duração) e não resultativos (que não implicam resultados): escrever, nadar,
subir, etc.
c) Verbos de realização: que remetem a processos dinâmicos, durativos e resultativos:
correr (uma maratona), fumar (um cigarro); este tipo de verbos exige a presença de um
complemento para o resultado.
d) Verbos de acabamento: que remetem a processos dinâmicos, não durativos e
resultativos: cair, chegar, etc.
b) Verbos que indicam uma atividade física (V.A.F.): subir, acompanhar, sentar;
c) Verbos que indicam uma Atividade Mental (V.A.M.): pensar, discutir, planejar,
articular, organizar, participar. No entanto, como um dos objetivos desta pesquisa
é verificar se houve ou não possibilidade dos participantes desenvolverem uma
reflexão crítica, para que essa se efetive é importante considerar o complemento que
81
acompanha o verbo e o comprometimento do sujeito da enunciação e, portanto é
preciso considerar a responsabilização enunciativa.
Portanto, para a análise dos dados desta pesquisa, podemos considerar também o
objeto da frase, ou seja, a transitividade do verbo. Na teoria da atividade, podemos
considerar que os objetivos “das ações”, como correspondentes à meta a serem atingidas
se complexificam. Isto pode indicar que a reflexão do participante se aprofundou,
incluindo elementos que antes não estavam presentes e emergiram na enunciação, ou
seja, são incorporados elementos da realidade para os quais o indivíduo havia dirigido
sua atenção de forma voluntária.
CATEGORIAS EXEMPLOS
VAL15: Então, a semana passada nós conseguimos sentar, (V. A. F). acho que
uma hora, nós três, eu, ela e a Cleonice e acabamos falando (V. A. F).inclusive só
da questão da demanda e a gente tinha que gastar (V.A.MT) esse dinheiro do
(V.A.MT) PTRF, porque essa verba é uma verba que.. ta sendo repassada (V.A.MT)desde o
e ano passado, e o, assim, o que a gente está ouvindo (V. A. F)., é que o Secretário
(V. A. F). da Educação ta falando (V. A. F).é que as escolas não estão precisando desse
dinheiro, porque não estão gastando, e nós. precisamos do dinheiro, né? Então o
que nós sentamos (V. A. F). pra fazer, priorizar o que a gente ia gastar
(V.A.MT)mesmo, né?(.)
VAL137: Andamos(V. A. F). o dia inteiro,(.) Compramos(V.A.MT) papelaria,
mas era mais brinquedo, né?(.) Compramos(V.A.MT) tudo o que eles tinham
pedido. Carrinho, hominho
(V.A.M) VAL78: Então já é uma vantagem, eu tenho a perspectiva de que agora a gente
comece a se organizar, a planejar, a pensar assim conjuntamente nos objetivos que
a gente tem com relação a.. trabalho. Porque a gente tá muito na prática, né?
Valéria4 eu tinha pensado assim, ó, primeiro conversar com eles como eles estão
se organizando dentro do trabalho.(.) E fazer uma reflexão” com eles sobre a
*(VAMR) questão dos intervalos, qual o papel deles, no horário dos intervalos, né. ?
OBS Aqui, por exemplo., o que torna o verbo “pensar” reflexivo é o fato de ela
“ter pensado” e agora estar falando desse “pensar”
82
Quadro 2.13 – Síntese dos Principais Elementos da Pesquisa
CATEGORIAS DE ANÁLISE
OBJETIVOS FUNDAMENTAÇÃO
PERGUNTAS FOCOS TEÓRICOS PARA
DAS TEÓRICA PARA
DE ANÁLISE DA
PERGUNTAS DE DISCUSSÃO DOS
PESQUISA MATERIALIDADE
PESQUISA RESULTADOS
LINGUÍSTICA
1. Quais os
sentidos
Teorias sobre gestão escolar;
declarados e os
significados Vygotsky: concepções de
Investigar a Conteúdo Temático, ensino-aprendizagem/
compartilhados influência da história
sobre direção Escolhas lexicais e desenvolvimento; linguagem e
e da cultura escolar, Responsabilização consciência; sentido e
escolar pelos bem como das teorias
participantes: Enunciativa (análise de significado;
que embasam as
diretora e dêiticos e da implicação dos Bakhtin: Relações dialógicas;
concepções das
pesquisadora participantes. participantes no seu discurso). Bronckart: na análise de textos/
externa? Há discursos;
transformação? Tipos de verbos
Teoria da Atividade Leontiev,
Qual(is)? O que
Engeström, Daniels;
caracteriza essa
transformação?
2. Como Investigar se e como Teorias de ensino-
pesquisadora e o tipo de interação aprendizagem enfocando
diretora desenvolvida especialmente
interagem na ajuda a conduzir ZPD e mediação;
construção de ambas as Kerbrat-Orecchioni: análise da
novos transformações no Análise dos turnos e conversação;
significados processo de Responsabilização enunciativa
sobre direção Pontecorvo;
construção e (Tipos de discurso, tipos de perguntas,
escolar? Há Brookfield & Preskill;
compartilhamento de tipos de comentários ).
transformação? significados e como Bronckart: na análise de textos/
Qual(is)? O que essas compreensões discursos;
caracteriza essa se desenvolvem Bakhtin: Relações dialógicas;
transformação? levando em conta o Teoria da atividade Leontiev,
contexto interacional. Engeström, Daniels.
Além disso, Valéria, a diretora que fez parte da pesquisa teve acesso a todos os
dados, bem como também esteve presente na minha apresentação no 4º Forum LACE,
organizado pelo LAEL/PUC–SP, em junho de 2008. As outras participantes da pesquisa
também tiveram acesso e receberam suas entrevistas e participações transcritas e
impressas.
83
listados no Quadro 2.14, a seguir, recebi inúmeras contribuições (questionamento e
sugestões dos participantes) que enriqueceram esse trabalho.
84
CAPÍTULO 3 – DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
85
3.1. Primeiro Momento: Levantando as necessidades dos
participantes e aprofundando o conhecimento do contexto
específico de ação.
Trazendo os meus sentidos construídos sobre o que é ser diretor e também sobre
o que seria desenvolver uma pesquisa colaborativa, meu sentido inicial sobre o meu
próprio papel era o de entender e aprofundar a compreensão de como se desenvolve o
papel do diretor escolar naquela realidade, na complexidade daquele contexto
específico. Nessa direção, começo a interagir com Valéria e a propor alguns
encaminhamentos, o que sugere que eu pensava ser esse o meu papel. A diretora, por
sua vez, vai direcionando nossas discussões para alguns temas recorrentes, os quais
utilizo, aqui, para discutir como se deu o compartilhamento de sentidos e significados
sobre direção escolar e que revelam sua interpretação de nosso trabalho conjunto –
colaborar na solução de problemas. Divido, pois, esta seção em quatro subtemas, que
foram o foco de nossas discussões:
86
a) Sentidos e significados sobre o papel da direção na organização da participação da
comunidade e no fortalecimento do conselho de escola;
b) Sentidos e significados sobre o papel da direção na formação dos profissionais na
escola;
c) Sentidos e significados sobre o papel da direção na organização burocrática e
administrativa da escola;
d) Sentidos e significados sobre o papel da direção no planejamento das ações na
escola.
Os resultados obtidos nesta seção estão apoiados no levantamento do conteúdo
temático das reuniões iniciais e na análise das escolhas lexicais (verbos, substantivos,
operadores e modalizações) – em negrito ou sublinhadas nos excertos selecionados.
Nesta seção, estão destacadas em cinza todas as conjugações do verbo “fazer”, devido à
sua grande incidência no discurso da diretora neste primeiro momento, o que revela que,
para ela, “ser diretora” tem como primeiro sentido “fazer”, “executar” ações na escola.
Inicio destacando exemplos das preocupações da diretora em relação aos temas
supracitados.
87
um dos sentidos que atribui ao seu papel é o de trabalhar de forma compartilhada com a
equipe.
88
sugerindo que “eles” ainda não se constituíam como participantes efetivos das ações da
escola.
Por outro lado, sua ação sugere que, como diretora, considera fundamental o
envolvimento dos pais nos conselhos e na fiscalização do uso dos recursos, garantindo a
transparência na condução da escola. Como discutido por Lücka ou b? (2006) e Libâneo
(2004), esse aspecto, previsto no Artigo 33, Parágrafo 4 do Regimento escolar (cf.
Regimento), embora necessário, não é suficiente para a efetivação plena da participação.
Valéria parece acreditar que se os pais “perceberem” que a APM e o Conselho tomam
as decisões sobre a escola, eles ficarão mais próximos e não reclamarão (“E pra eles
perceberem que depois reclamam:” ah, não gostei disso, não gostei daquilo mas então
a gente convidou”).
Naquele momento, o papel dos pais ainda é, sob o ponto de vista da diretora, um
papel fiscalizador, não deliberador. Nesse sentido, a reflexão sobre a participação dos
pais assume um caráter de reflexão prática. No entanto, naquele momento, eu –
pesquisadora – ainda em processo de me apoderar dos pressupostos da PCCol, não
aprofundei as respostas nem questionei a forma como essa participação estava sendo
organizada.
89
VAL29: E aí ontem eu estava falando com ela isso. Eu falei: “Áurea!!! A gente tem a
proposta de trabalhar a questão dos valores com as crianças. E com os
funcionários? E com os professores, por exemplo?”(...). mas não tirando a
responsabilidade, é tanta coisa que vem na cabeça da gente pra fazer e a gente
acaba meio fazendo conforme é possível mesmo, por isso que a gente fala que
não dá conta do que a gente tem que fazer, nós não estamos dando conta
mesmo, e a gente sente essa angústia aqui dentro que não tá dando conta de
tudo isso que precisa fazer.
90
um todo precisa refletir continuamente sobre seus fins e objetivos e verificar a coerência
com a prática, o que aponta para a necessidade de uma formação constante de seus
membros. Os questionamentos da diretora sugerem que ela está preocupada com esse
assunto e busca levantar necessidades mais amplas. Porém, nota-se também o registro
de uma insatisfação frequente naquele momento da pesquisa: “nós não estamos dando
conta mesmo, e a gente sente essa angústia aqui dentro que não tá dando conta de
tudo isso que precisa fazer”.
Minha pergunta (ELV39) sugere que, com base no que discuti no Capítulo
Teórico, eu busco o entendimento mais amplo da função do diretor, para o que observo
tanto por meio das declarações da diretora, quanto por conta da minha própria
observação do cotidiano da escola. Em resposta, Valéria declara que a Secretaria da
Educação tem uma proposta para o diretor agir como gestor (VAL40), não devendo,
portanto, priorizar apenas a parte administrativa. Mas, em seguida, sua fala revela uma
contradição entre o discurso oficial e a realidade vivida. Essa contradição está marcada
pelo operador “mas aí” no turno VAL40. Ao responder minha pergunta que pede mais
esclarecimentos sobre “sua função”, a diretora explica que embora não precise fazer
tudo, pessoalmente, é a responsável pelo gerenciamento de tudo, na medida em que
91
precisa “saber” o que está “assinando”. Na sequência, na mesma reunião, direciono a
pergunta para o sentido de gestão que ela própria construiu.
92
claramente estabelecidos, especialmente em sua relação dialética com a prática e com as
necessidades que verificava em seu contexto de ação.
93
Recorte 7 (27 de abril de 2007)
VAL9: ((a secretária voltou de licença ))Voltou, voltou e aí, éeee e, aí assim, já fiquei um
pouco mais tranquila. Então essa semana já consigo sentar lá com as professoras,
conversar um pouquinho com elas em horário de jornada, consegui subir, conversar lá
em cima, ter um contato mais direto com as professoras. Acompanhar a reforma
(..)consegui chamar a presidente e o vice-presidente da APM para conversar com
eles, tal.. Então eu consegui fazer algumas coisas, mais para lado da direção
mesmo em vez de ser secretária, né? Aí fiquei mais assim tranquila. Mas ainda tem
umas coisas que eu quero e não consigo fazer.
ELV8: Agora, você já esquematizou essas suas intenções num plano?..., como é que elas se
relacionam com o projeto pedagógico?
Ao relatar a ampla relação de seu trabalho como gestora, descreve as ações que
desenvolveu com a volta da secretária (VAL8), destacando ações relacionadas à
manutenção do patrimônio “Acompanhar a reforma no parque(...)”; relacionadas aos
professores (“já consigo sentar lá com as professoras consegui subir, conversar lá em
cima”); e aos pais (“consegui chamar a presidente e o vice-presidente da APM para
conversar com eles”). Isto colabora para a interpretação de que um sentido que Valéria
atribui ao seu papel é o de articular ações em relação a todos os temas, como parece
confirmar a declaração “Então eu consegui fazer algumas coisas, mais para lado da
direção mesmo, em vez de ser secretária, né?”. No entanto, os verbos utilizados,
classificados nesta pesquisa como verbos que remetem a uma atividade material , ou
uma atividade física subir acompanhar sentar (sublinhados) parecem sugerir que o
papel do diretor estava, naquele momento, fortemente atrelado ao sentido de executor de
várias ações práticas.
94
Recorte 8 (27 de abril de 2007)
VAL12: Eu tenho assim, ando um pouco preocupada de estar fazendo dos meus meios os
objetivos, entendeu? De estar confundindo as coisas. (..) mas ainda... os objetivos...
que a gente precisa estar relacionando com os objetivos da unidade que o caso no..
no caso do.PPP.. isso é uma coisa que eu não consegui sentar para sabe, para
delinear, porque era inclusive o objetivo daquela minha.... daquele meu projetinho
inicial. Entendeu. Então não consegui fazer isso ainda. To preocupada com isso.
ELV11: Mas você tem em mente quais são os objetivos do..PPP?
VAL13: Então,.... também tem isso, né? (...) É... eu lendo, o que eu sei..é(..) mas eu ainda
acho que a gente vai ter que sentar pra ver, é é definir o PPP direitinho. Isso nós
não conseguimos fazer..
ELV12: Vocês na nesta questão..não estão conseguindo sentar...?
VAL14: Então, a semana passada nós conseguimos sentar, (..), nós três, eu, ela ((a
coordenadora pedagógica)) e a Cleonice e acabamos falando inclusive só da
questão da demanda e a gente tinha que gastar esse dinheiro do PTRF, (...) Então o
que nós sentamos pra fazer, priorizar o que a gente ia gastar mesmo, né? Como que
a gente ia fazer isso, aí a semana passada eu e a Cleonice saímos um dia, essa
semana a Áurea também saiu e nós compramos muitaaaaas coisas. Você precisa
ver nossa brinquedoteca como está. Tá lindona!
95
universidade e tendo participado de vários contextos de formação insistia na
importância da discussão e apropriação do Projeto Político Pedagógico da Escola como
uma das formas de desenvolver e analisar as ações e relacionar teoria e prática.
(GARRIDO, 2008; VASCONCELLOS; 1999; PADILHA, 2006; GADOTTI, 1994/
2008, eg.), Valéria estava preocupada em resolver os problemas que se apresentavam na
prática. Isto também pode ser evidenciado em seu discurso pela utilização dos verbos de
ação, especialmente pelo uso do verbo “fazer”, contraposto às minhas escolhas lexicais
relacionadas ao “planejar”.
96
Recorte 10 (21 de setembro de 2007)
Val48 – Eu queria estar mais próxima, principalmente com relação ao pedagógico. Eu
queria estar mais próxima(..),Acabo fazendo o que é mais urgente antes do que é
mais importante. Entendeu?
ELV49: Dá exemplo de coisas que são urgentes?
VAL49: Por exemplo, eu tenho que fazer processo de verba, eu tenho que estar fazendo
pagamento, eu tenho que estar fazendo vida funcional, eu tenho que atender
solicitação de coordenadoria, eu tenho reunião de convocação.
(..)
VAL52 : (....) e eu sei das minhas responsabilidades(..)Porque eu respondo por isso, então
tem algumas coisas assim, agora esses urgentes, não que esses urgentes não sejam
importantes, são importantes, mas eu tenho uma outra prioridade na minha cabeça,
mas que eu não estou conseguindo dar conta.
ELV53: O que ?
VAL53: Acompanhar o projeto político pedagógico por exemplo.. a formação
97
atribuições do diretor, das dificuldades concretas enfrentadas e observadas.
Inicialmente, eu acreditava que meu papel era colaborar com a diretora para organizar a
escola e utilizar o PPP como instrumento. Porém, durante este primeiro momento, nas
interações que desenvolvemos, bem como nas oportunidades que tive de observar o
cotidiano da escola naquela realidade específica, fui tomando consciência
(VYGOTSKY, 1930/2004) das reais necessidades. Dessa forma fui reconstruindo os
sentidos que atribuía ao meu próprio papel naquele atividade e na responsabilidade de
colaborar com a diretora para organizar uma forma de encaminhar as necessidades que
ela constatava. Nessa direção, os enunciados que ela proferia em resposta às minhas
perguntas e intervenções, funcionaram como estratégia de pensamento para mim
(WERTSCH e SMOLKA, 1993/1999) e pude perceber que as ações de pesquisa não
estavam repercutindo na prática concreta da diretora.
98
Observe-se, no turno ELV58, a forma como retomo nossas diferentes
perspectivas “eu tava (...) insistindo no projeto político pedagógico aí você tem
apontado as questões da rotina e do cotidiano, que de alguma maneira tem impedido
isso” e termino o meu turno com uma pergunta que pede mais evidências sobre as
necessidades da diretora “(...) o que você sente ainda de necessidade?”. Esta pergunta
sugere que, naquele momento, estou reelaborando meus próprios sentidos sobre o meu
papel na atividade.
Todo este diálogo sugere, também, que naquele momento há uma aproximação
de objetos na atividade, na medida em que houve um compartilhamento de sentidos
sobre as necessidades daquela realidade específica e do papel do diretor em planejar e
organizar as necessidades constatadas. Houve, pois, a possibilidade de criarmos uma
ZPD mútua (JOHN-STEINER, 2000), em que pudemos aprender uma com a outra.
99
Se Valéria se apoia em meus enunciados para fazer avançar a própria reflexão,
deve-se registrar que eu também me apoio nos enunciados dela para reformular minha
compreensão da necessidade que ela estava priorizando, naquele momento e reoganizo
as ações de pesquisa. A resposta de Valéria espelhando meus enunciados no turno
VAL60 “você já pôs isso no papel” e “porque é um outro olhar”, bem como todos os
temas que pudemos compartilhar, foi o que nos orientou na etapa seguinte. Nesse
sentido, retrospectivamente, revejo as minhas ações e a meta que pretendia alcançar
(ENGESTRÖM , 1999).
Assim, foi a partir de sua solicitação que criei instrumentos que materializaram o
compartilhamento de significados, utilizando os temas mais recorrentes para a diretora,
construindo uma “Tabela de Ações” e elaborando o “Jogo de Papéis”. A construção
desses artefatos já representa o resultado do compartilhamento de significados desse
primeiro momento de nossa participação e sua importância para o salto qualitativo
revelado a seguir. Antes de discutir este segundo momento da atividade, apresento um
quadro que resume os principais conteúdos temáticos que permearam nossas reuniões, e
que revelam as preocupações da diretora neste primeiro momento. No Quadro 3.1 estão
assinaladas as declarações que se repetiram naquele momento da pesquisa. As
modalizações deônticas e pragmáticas estão realçadas em cinza, a escolha pronominal
em itálico, e as declarações recorrentes negritadas.
Quadro 3.1 – Conteúdos Temáticos: preocupações da diretora no Primeiro Momento da
Pesquisa
Pais e alunos Organização da Organização
Funcionários Professores
comunidade equipe administrativa
(1)VAL18:.. então eu (4)VAL23: é, eu (2)VAL 28 – (..) Isso (3)VAL19 – (..) mas V al49 – Por
quero envolver mais os tenho, eu tenho que inclusive eu tava ainda tem algumas exemplo, eu tenho
pais, quero que estar, assim, eu acho conversando com a falhas, a questão do que fazer processo
participem mais do que eu tenho que Áurea, falei “oh trabalho, mais... do de verba, eu tenho
conselho. E um dos estar favorecendo os Áurea eu acho que a diálogo mais que estar fazendo
nossos objetivos é que as encontros, eu tenho gente vai precisar próximo com os pagamento, eu
crianças também que muitas vezes fazer uma formação professores eu tenho que estar
participem do Conselho estar mesmo que com eles”, (..) mas ainda não estou fazendo vida
(..) intimando algumas não tirando a conseguindo fazer, funcional, eu tenho
coisas, e agora... responsabilidade, é eu vou lá, converso que atender
9 de março de 2007 Durante esse período tanta coisa que vem com elas, mas eu sei solicitação de
acho que não foi na cabeça da gente que isso é coordenadoria, eu
possível, mas eu pra fazer e a gente esporádico, não tem tenho reunião de
tenho que estar acaba meio fazendo nenhum efeito mais convocação.
articulando essa conforme é possível (..)...
equipe. mesmo, por isso que porque eu não dou
a gente fala que não conta de tudo o 21 de setembro
27 de abril de 2007 dá conta do que a que tem pra 2007
gente tem que fazer, fazer...(.)
nós não estamos
dando conta mesmo, 22 de maio de 2007
e a gente sente essa
angústia aqui dentro
que não tá dando
conta de tudo isso
que precisa fazer.
22 de maio de 2007
100
3.2 Segundo momento da Atividade: A introdução dos artefatos de
mediação explícita.
Esta seção está organizada para discutir a introdução dos artefatos de mediação
explícita e descrever as modificações que eles trouxeram nos sentidos que atribuíamos à
função do diretor, considerando os temas anteriormente apresentados. Discuto
inicialmente os artefatos, procurando demonstrar como eles já se constituem como
resultado de um compartilhamento de sentidos.
101
Quadro 3.2 - Tabela de Ações - visão simplificada
TEMAS PERGUNTAS
(emergentes (para criação de oportunidades de participação da Ação Ação Ação
durante o primeiro equipe diretiva, dos pais e alunos, dos professores 1 2 3
momento) e dos funcionários)
Tal intenção de minha parte sugere que compartilhei as suas declarações sobre
como de fato, “agia” e do que constituem também tarefas importantes de seu papel.
Durante o jogo, foram acrescentadas papeletas com as ações desenvolvidas pela diretora
102
durante aquela semana (18 a 22 de fevereiro de 2008). Apresento, abaixo, um exemplo
de uma papeleta organizada por mim e de outra organizada por Valéria. Esclareço que a
classificação entre parênteses na última linha de cada papeleta representa as categorias
construídas pela diretora durante a tarefa realizada.
22/04: Val6: Porque eu falei também com os pais do (...) pra eles perceberem que é o
conselho e a APM que toma as decisões da escola, pra eles se tocarem disso. Nessa sexta
feira, por exemplo, nós vamos ter uma reunião da APM pra agenda a festa junina (...). Mas
então a gente convida também, agora vamos fazer os cartazes pra divulgar as demais pra ver
se a gente tem uma divulgação maior dos pais” (Participação da comunidade).
Da mesma forma que a “Tabela de Ações” não poderia ter sido organizada sem
o conhecimento das necessidades específicas declaradas pela diretora, a confecção do
“Jogo de Papéis” foi a materialização de experiências vividas por nós durante 2007,
resultado, portanto, do compartilhamento de experiências e das interações que
proporcionaram desenvolvimento. Desta forma, também fui tomando consciência das
diversas tarefas do diretor e a própria construção do artefato sugere que compreendi que
uma atividade concreta (Formação de Diretor) não pode ser idealizada nem entendida
fora das relações com outras atividades do sistema e da realidade em que está inserida,
não podendo ser excluída dessas relações (LEONTIEV, 1977/1978). Isto significa que
estávamos discutindo a formação em serviço de um de um diretor real, concreto: “sua
ação e suas condições materiais de existência tanto as que ele já encontrou prontas,
103
como aquelas engendradas por sua própria ação” (MARX & ENGELS, 1845-
46/2007). Ao organizar o “Jogo de Papéis”, eu pretendia oportunizar que a diretora “se
vizualizasse” nas várias tarefas que, efetivamente, tinha realizado. Eu me baseava em
alguns pressupostos da reflexão crítica discutidos, que apontam como fundamental os
indivíduos se distanciarem de suas ações cotidianas e evitarem um juízo apressado de
valor que compromete a reorganização de ações futuras (SMYTH, 1992).
104
Recorte 13 (9 de janeiro de 2008)
ELV3: (...) você faz umas questões recorrentes: Você diz que você gostaria de
trabalhar(#) agentes escolares...
VAL4::. Com as agentes escolares
..
ELV4: Que você....gostaria de trabalhar com o Projeto pedagógico....que você gostaria de
estar mais perto das as professoras,...
VAL5: Isto eu já falei acho que umas 500 vezes
ELV5: (...) Então a minha hipótese é assim... minha hipótese é que se você não organizar
um plano, colocar suas intenções num plano, você não vai conseguir fazer isto que
você está querendo. Não que você não esteja fazendo nada, porque eu estou vendo
aqui esta reforma.
VAL6: (...) Era até legal eu colocar alguma coisa no papel...eu já tinha que ter me
organizado (...)Também, com esta bagunça [reforma, falta de funcionários] não dá
para fazer mais nada, eu estou fazendo o que é possível. Eu já me livrei de 2
processos...(( Alguém chama a diretora para fazer matrícula))
105
que a diretora era a única responsável pelas mais diferentes tarefas, fato que gerou
inúmeras interrupções em nossa reunião como mostra o excerto abaixo.
106
No turno VAL93, ao responder minha pergunta sobre como ela categorizara os
excertos, a primeira classificação a que ela se refere é “participação da comunidade”.
Este fato, reforçado pelo pronome oblíquo em 1ª pessoa “pra mim” e pela avaliação
expressa pelo adjetivo “pendente”, contribui para a interpretação de que esse era
realmente um tema importante para a diretora. No turno 95 ela inicia a avaliação da
qualidade da ação que fora desenvolvida: “eu queria uma coisa melhor”.
Observe-se que minha escolha lexical no turno 97 (“Você acha que você
conversar...?”) também influencia para que Valéria busque seus recursos cognitivos
(BRONCKART & MACHADO, 2004). Em sua resposta, a diretora aprofunda a
107
reflexão (neste excerto, marcada pela expressão modalizadora “eu acho”): compara as
conquistas que teve, distinguindo o que é concreto do que é intenção e indica que a
participação dos pais é ainda uma intenção (“eu acho que isso só vai ser uma coisa
concreta quando eu tiver os pais aqui dentro participando da escola. Pra mim isso é
uma tentativa. Um canal. Mas, não é o que eu queria. O que eu quero é além disso.
Agora, esse ano eu vou começar tudo de novo”). Nota-se, também, o jogo das
conjugações verbais entre o presente (“é”), o pretérito imperfeito (“queria”) e,
novamente o presente (“eu quero”), jogo este que sugere uma avaliação concreta das
ações passadas na sua relação com as intenções iniciais, concluindo com uma
modalização pragmática: “o que eu quero vai além disso” e com uma nova intenção
(“Agora, esse ano eu vou começar tudo de novo”). Aproveitando a reflexão da diretora,
no turno 98, faço uma pergunta que, explicitamente pede que ela analise a ação
desenvolvida, (“E o que você aprendeu...?”). Sua resposta, no turno 112, traz indícios
de que repensa, agora, esse tema numa nova perspectiva: chama para si a
responsabilidade na condução de uma nova tentativa (“Eu acho que eu preciso fazer
mais”) e começa a refletir sobre o “como” desenvolve a ação (“Ou, a forma que eu
estou fazendo não está correta”).
Alguns turnos adiante, nosso foco cai sobre a questão do planejamento das ações
na escola. É um momento relevante, pois mostra a importância da mediação explícita:
quando o instrumento e o resultado se evidenciam.
108
VAL148: O maior é esse. ((parte administrativa cotidiana))
ELV133: E o menor?
VAL149: O menor deve ser o de formação!
ELV134: Então vamos contar mesmo. Quantas ações estão aqui no...
VAL150: Vixi, o menor é o planejamento.
109
APM?
VAL159: É da APM e a de adiantamento bancário. É essa daqui.
ELV140: Tá bom. Teria como não fazer essa parte?
VAL160: Teria. Tem diretor que não faz.
ELV141: Não?
VAL161: Mas, se eu não fizer eu inviabilizo um monte de coisa na escola. Entendeu? Por
exemplo, a gente tá querendo comprar mais brinquedos pra brinquedoteca. Eu
estava falando hoje de manhã para a Áurea Áurea acabou o dinheiro e não deu
pra comprar brinquedo pra brinquedoteca. O ano passado a gente comprou
bastante, mas eles gastam, né. E aí, é claro que a gente gastou bastante dinheiro
com a reforma, né. Aí ela falou: e aí Valéria, agora o que a gente faz? Eu falei: e
livro? Tá precisando de livro pra sala de leitura também. Se eu não fizer isso (((a
pilha intitulada questões Financeiras” o acerto de verbas)),eu não dou esse
suporte para as professoras trabalharem, entendeu?
110
enquanto o instrumento psicológico tem uma orientação para a psique e para o
comportamento do próprio sujeito. Mas a inclusão do instrumento no processo provoca
a atividade de toda uma série de funções novas relacionadas com a utilização do
instrumento e seu manejo. É importante salientar, como apontam Wertsch e Smolka
(1993/1999), que a incorporação desses recursos à ação humana, incluindo a ação
mental, não torna a ação simplesmente mais eficiente, quantitativamente, mas resulta,
inevitavelmente, em uma transformação qualitativamente criativa.
Dessa forma, entendo que esses artefatos podem ser considerados instrumentos-
e-resultados (NEWMAN e HOLZMAN, 1993/2002), na medida em que, com sua
utilização, ao reorganizar as papeletas e comparar com suas atribuições, na e pela
interação, Valéria e eu estávamos, ambas, reorganizando e reformulando as tarefas do
diretor escolar, refletindo sobre as possíveis ações, compartilhando e produzindo novos
significados.
111
No excerto acima, no turno VAL197, ao refletir sobre as conclusões extraídas da
tarefa proposta, a diretora constata que “faz quase tudo”, o que, como aponta, é da
competência de um diretor escolar. Sua escolha lexical ainda revela uma ênfase no
“fazer”; porém, reavalia a forma como está desenvolvendo suas atribuições para
melhorar a escola: reconhece que tem coisas mais importantes mas que não consegue
fazer porque enfatiza o cotidiano da escola (“e tem que melhorar algumas coisas. Tem
algumas coisas que são mais importantes. (...) e eu acabo direcionando mais tempo
com o que é cotidiano”). No turno seguinte (198), Val levanta a hipótese de que
“planejar” pode ajudá-la a se “organizar”, dando indícios de que o sentido que eu
trazia sobre o trabalho do diretor estava sendo compartilhado naquele momento.
112
Recorte 20 (22 de fevereiro de 2008)
VAL28: ((lendo a tabela de ações)) Olha, que tipo de ações são organizadas
sistematicamente dentro da escola para que a equipe possa participar efetivamente?
Puxa, de professores isso me deu um tilte porque é assim: A gente conversa em
reunião pedagógica. No dia a dia assim, nos projetos eu não consegui o ano passado
estar conversando com elas. E aí eu percebi que as situações que a gente tinha para
conversar eram muito poucas, né. E aí eu comecei a pensar em quais situações eu
poderia cavar esse ano pra estar tendo esse canal com os professores. Porque assim,
olha, com os funcionários, por exemplo, quando eu preciso...
Como já apontado neste trabalho, a internalização não é uma mera cópia, mas a
transformação e a reorganização das estruturas mentais a partir das (novas) informações
recebidas e da relação com os conhecimentos já existentes. Apontei acima, com
exemplos da reunião, como o uso de artefatos procurou organizar um contexto que
criasse a possibilidade da diretora se ver como um outro (BAKHTIN, 1929-1930/2006;
VYGOTSKY, 1925/2004: 82), de modo a reavaliar as suas intenções a as suas ações.
Essa reunião marcou um salto qualitativo na atividade de Formação de Diretor.
113
tornou-se possível pela mediação desses elementos, isto é, pela internalização ou
apropriação dos instrumentos culturais e da interação social.
114
que a gente não conhecia ainda e tal. Mas assim, eu acho que a comunidade precisa
conhecer exatamente qual é a nossa proposta. E nós passamos pra eles na reunião de
pais.(..). Talvez isso não tenha sido suficiente.
Observa-se, nas respostas de Valéria, que ela levanta uma hipótese para o
desconhecimento dos pais, sugerindo que o fato possa ter origem na ausência deles no
momento da elaboração do projeto pedagógico da escola (“Talvez porque eles não
participaram da elaboração do projeto pedagógico”). Isso sugere que a reflexão
desencadeada oportunizou que ela analisasse a participação dos pais sob um outro
ângulo, não aceitando mais uma prática consagrada (ENGESTRÖM, 1999), ou seja,
reuniões que “passam” o conteúdo para os pais, e apenas “convidam para eles
participarem” (cf. Recorte 2, 22 de maio de 2007), como ficou evidenciado nos
registros das primeiras reuniões.
115
intensificado a partir do meio da pesquisa. Porém, deve-se destacar que as declarações
da diretora nesse momento da investigação revelam, também, uma avaliação articulada,
considerando tanto o PPP como a realidade da escola, o que não seria possível no início
do trabalho.
116
No excerto abaixo, em que a diretora reavalia os espaços e as expectativas sobre
a participação, é significativo que ela assuma a formação como uma dimensão
necessária (turno VAL19).
Nota-se, aqui, que as ações atribuídas aos pais nesta síntese (questionar, criticar,
sugerir) indicam finalidades que vão além da organização da escola, da resolução de
problemas práticos e incluem um compromisso com a aprendizagem dos alunos. Além
117
disso, as escolhas lexicais para se referir aos pais sugerem que a diretora agora lhes
atribui, efetivamente, um papel ativo na construção da escola: eles passam a ser
“sujeitos”, não “receptores”. Assim, a divisão de papéis em sua relação com os pais, ao
menos no discurso, se transformou, na medida em que o papel deles, agora, não é mais
o de fiscalizar, nem são “convidados”, como discutido anteriormente (cf. Recorte 2, 22
de maio de 2007). Dessa forma aparece, no discurso da diretora, uma transformação no
que diz respeito à divisão de papéis dos pais na comunidade escolar e aos sentidos que
atribui ao seu próprio papel em encaminhar as necessidades constatadas.
118
reuniões de planejamento dos professores. Eles enfocaram bastante, inclusive com
ações diferenciadas das do ano passado (...): separação de lixo, por exemplo.
Compramos os baldes pra separação de lixo, que já tinha o ano passado, mas tentar
focar mais isso, fazer com que isso na prática se torne efetivo. E pra isso a gente
precisa da participação deles também. E pra eles participarem eles precisam
saber o que é. Então, essas coisas e a questão dos valores, valores positivos,
valores negativos.
ELV32 (...)
VAL32: Então, aí eu queria tirar deles o que são valores, entendeu? São valores morais?
Daqui eu queria tirar inclusive a questão da postura profissional.
ELV33: Mas você está trabalhando esses valores ligados ao PPP? ou não?
VAL33: Ligados ao PPP. Porque é assim, isso aqui está dentro do nosso projeto (...)
119
ELV42: Tá. Mas, os valores que estão no PPP os quais você gostaria que eles se
pautassem, só estão escritos os positivos. E por que você falou dos negativos?
VAL42: Então, por quê? Porque é justamente isso que a gente vê no dia-a-dia. Falta de
respeito um com o outro, um não quer colaborar com o outro. Ah, não vou
fazer isso porque não me mandaram. Só faço se me mandarem...
120
Observe-se no turno VAL9, que ela parece estar descrevendo (SMYTH, 1992)
sua ação em um movimento reflexivo: utiliza o discurso citado (turnos 9, 10, 12), o que
parece sugerir que ela pretende que eu acompanhe detalhadamente a situação em foco,
ao mesmo tempo em que procura olhar o fato com certo distanciamento. Para isso,
recupera a voz da professora e a dela própria no evento que está sendo descrito. Além
disso, encontra-se, também, no turno, uma referência à coordenadora pedagógica
(“Áurea”), o que sugere uma ação conjunta. Ou seja, a equipe diretiva está se
constituindo enquanto grupo colaborativo. O excerto abaixo mostra uma outra mudança
importante.
Recorte 27 (13 de maio de 2008)
ELV13: Sabe o que eu estou observando Valéria? É a primeira vez que você fala assim... dá
uma importância nas nossas entrevistas e ocupa o tempo pra falar de um
acompanhamento que você fez com professor.
VAL13: Pois é, né.
ELV14: O que mudou?
VAL14: Pois é, o que mudou? Eu acho que assim, eu tenho conversado mais com eles,
subido mais, eu acho que o que mudou já foi o início que foi o acompanhamento
com o planejamento. Então, pra mim está mais fácil acompanhar o trabalho na sala
porque agora eu sei qual é a proposta de trabalho deles, então isso pra mim já mudou
bastante.(...) Então, agora eu acho que está mais claro. Também tem Elvira, eu acho
que a questão da gente se sentir um pouco mais segura com relação ao
relacionamento com os próprios professores. A gente recebe críticas, a gente recebeu
críticas no geral, no final do ano nas avaliações nós tivemos críticas, uma delas era a
falta do meu acompanhamento pedagógico. Mas, a gente observa que tem um
apoio dos professores. No geral, eu entendo que é assim, a gente tem o
reconhecimento dos professores ao nosso trabalho. Não só dos professores, mas da
comunidade também. Até mesmo da diretoria.
121
Recorte 9 (22 de maio de 2007)
VAL19: (...) a questão do trabalho, mais... do diálogo mais próximo com os professores eu
ainda não estou conseguindo fazer, eu vou lá, converso com elas, mas eu sei que
isso é esporádico, não tem nenhum efeito mais...
ELV18: Mas como você conversa?
VAL 20: É, eu vou lá em cima, dou uma palavrinha. (...) mas eu sei que tá precário, assim
como os funcionários também né, porque eu não dou conta de tudo o que tem pra
fazer(.)
Observa-se também que minha pergunta, no turno ELV13 (recorte 27, acima),
sugere mudança no meu modo de agir formativamente com a diretora: reconheço uma
transformação no desenvolvimento dela e trago o fato para discutir em nossa reunião.
Ou seja, faço uma intervenção no sentido de marcar essa ocorrência.
122
pouquinho melhor”), fato que lhe proporciona uma posição mais confortável, porque
mais próxima de uma atuação pedagógica. Essa maior adequação às suas funções é
confirmada quando Valéria trata mais especificamente das questões de ordem
administrativa. Ao mesmo tempo em que assume que algumas tarefas administrativas
precisam ser executadas mesmo que, oficialmente, não sejam de sua competência (“E
você não tem ninguém aqui na secretaria a gente tem que fazer, não tem jeito”),
refere-se à sua preocupação com o cumprimento de prazos, impostos pelo sistema
institucional, utilizando a expressão “menos neurótica”. Tais escolhas lexicais permitem
considerar que houve um redimensionamento das suas diferentes tarefas dentro do papel
de diretora de escola.
123
ano, são inclusive, estão ainda no que eu pretendia o ano passado. A maior
participação da comunidade, (...) O fortalecimento da equipe técnica, (...) A
participação efetiva das crianças, dos representantes de sala,(...). A participação
da comunidade. Um maior comprometimento por parte dos funcionários da
equipe de apoio (...) inclusive a formação deles. Então, tudo isso são coisas que eu
tinha intenção de fazer, mas ainda não estava claro pra mim o que era
necessário. Algumas coisas que a gente tem como prioridade, até mesmo pessoal
que é a questão de estabelecer relações democráticas dentro da escola. Mas, isso é
uma coisa assim... Agora, esse ano mudou, por quê? Porque eu consegui saber
qual era a realidade onde eu estava e planejar. Então, eu acho que, por exemplo,
nesse sentido a pesquisa me ajudou bastante.
Observa-se no excerto acima (turno Val 2) que Valéria retoma cada um dos
temas que foram discutidos em nossas reuniões: “A maior participação da
comunidade, (...) O fortalecimento da equipe técnica, (...) A participação efetiva das
crianças, dos representantes de sala,(...). A participação da comunidade. Um maior
comprometimento por parte dos funcionários da equipe de apoio (...) inclusive a
formação deles”. Isto confirma a interpretação de que estes eram realmente os temas
importantes para ela no papel que estava desenvolvendo. Observa-se também, no
mesmo turno, a declaração “Agora, esse ano mudou, por quê? Porque eu consegui
saber qual era a realidade onde eu estava e planejar”(...), que sugere que tanto a
mudança como as conquistas nesse período são situações constatadas, como sugere o
uso do tempo verbal (pretérito) usado em relação ao planejamento. No excerto abaixo
focalizo, nas declarações da diretora, as referências a esse processo.
124
lembro dos papeizinhos, as ações, tal, pra gente pensar no que foi feito no ano
anterior e o que estava faltando. E nós observamos que o ano de 2007 foi um ano
basicamente voltado para essa questão mais administrativa. E eu estava falhando
muito no acompanhamento pedagógico. Então, esse ano eu tenho esse foco maior no
pedagógico(...).
Por último, podemos apontar também que Valéria faz referência explícitas às
“perguntas” e à “tabela” “Veja bem, é diferente você pegar segmentos, vários
segmentos da escola e pensar em quais ações eu teria que ter em cima desses
segmentos pra dar uma cara diferenciada pra escola. Então, a própria formatação das
sugestões que você me deu e daquelas atividades que você me deu me ajudou bastante,
eu acho, na elaboração do planejamento”.
125
no planejamento de suas ações. Observa-se também um aumento de verbos ligados à
reflexão (refletir, planejar, entre outros) e uma diminuição de verbos que remetem a
uma ação física representados pelo fazer, frequentes no início da pesquisa.
Transformações no modo como a diretora se relaciona com suas atribuições
institucionais também podem se revelar quando, no discurso, ela deixa de usar
modalizações deônticas referentes a prescrições oficiais ou socialmente compartilhadas
e passa a chamar para si a responsabilidade das ações desenvolvidas na escola.
126
Quadro 3.3 - Visão geral das preocupações da diretora no final deste segundo momento da
pesquisa
127
perspectiva da dialogia bakhtiniana, analisa como esta relação se desenvolveu ao longo
do tempo e como, no movimento interacional, os discursos das participantes refratam e
refletem a realidade exterior, se reorganizam, se re-elaboram, possibilitando o
compartilhamento de novos significados. Ou seja, procura entender como “cada voz
tomará os enunciados das outras vozes como estratégias de pensamento, e imersas na
corrente comunicacional estas enunciações serão propiciadoras de um movimento em
forma de negociação e geração de significado” (BAKHTIN, 1929-30/2006;
WERTSCH & SMOLKA, 1993/1999). E como esse movimento faz mover o objeto na
atividade Formação de Diretor (ENGESTRÖM , 1999).
1. Quantidade de turnos;
2. Tipos de turno (avanço na fala do outro, não avanço na fala do outro);
3. Tipos de perguntas e/ou comentários da pesquisadora (negritados na discussão);
4. Escolhas lexicais (verbos, operadores, modalizadores, marcas de pessoa).
180
7000
160
6000
140
120 5000
100
4000
80
3000
60
40 2000
20
1000
0
9 de março de 2007 27 de abril de 2007 22 de maio de 2007 22 de fevereiro de 2008 11 de abril de 2008 16 de junho de 2008
0
9 de março de 2007 27 de abril de 2007 22 de maio de 2007 22 de fevereiro de 2008 11 de abril de 2008 16 de junho de 2008
Diretora Pesquisadora
Diretora Pesquisadora
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possibilitaram aprender mais sobre aquela realidade específica, o que possibilitou a
ambas um aprofundamento dos sentidos levantados.
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material, né? Só que cada
Nova interrupção _ toca o telefone e a diretora atende)
ELV11: ... outra coisa também. Os nomes não ficarão expostos (...)
Val12: Claro, claro. Isso aí tudo certo.
ELV12: Então..
VAL13: Então deixa só eu terminar de te contar do caso da Luiza ((secretária})..: (..).
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Recorte 33 (9 de março de 2007)
VAL18: ... então eu quero envolver mais os pais, quero que participem mais do conselho.
E.um dos nossos objetivos é que as crianças também participem do Conselho(..)Então
esses a gente quer estar pelo menos assim..a a Áurea[C.P] está fazendo um trabalho...
Cada sala vai ter um nome.(..)Isso é um passo pra gente começar a trabalhar com eles
o representante da sala(..).
ELV15: Hum
VAL19: Entendeu?.,(..) que a gente quer fazer?Que tenha um representante de sala, e que
desses... que sejam eleitos, e que desses representantes eles façam parte do Conselho,
(..)
ElV16: Então, veja se eu estou entendendo... esse trabalho é para envolver esses pais através
das crianças?(..)
VAL20: têm tudo a ver Precisa saber como chamar os pais
ELV17:. Talvez se gerássemos as expectativas neles, das crianças convidarem os pais para
lerem os cartazes sobre os Conselhos, os professores contarem o quanto é importante
os conselhos, talvez seja uma possibilidade.....
VAL21: É. Sabe o ponto de dificuldade que eu acho que talvez a gente vá sentir é... por conta
da formação política dos professores.
ELV18: Hummm, Por que?
VAL22: Por que eu acho que muitos professores também não têm noção da importância que
tem conselho na unidade. Então isso é uma coisa que também precisava ser trabalhada.
ELV19:.. Então talvez fosse o caso, né? Você discutir com os professores....a importância disso.
..
VAL25: É, deixa a Áurea [C.P] chegar porque a gente tenta falar, porque hoje a gente não tem
quase horário coletivo com os professores, entendeu? (..)Olha, nós temos que fazer. E
fazer de qualquer jeito
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formação política dos professores”. Novamente, minha pergunta que pede explicação
faz avançar o entendimento da situação, gerando um avanço no objeto da discussão em
foco.
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eu ter conversado com você” seguida da constatação de ausência de reflexão nesse
sentido – “eu não tinha pensado”. Tais escolhas lexicais – a modalização apreciativa e o
verbo “pensado” no pretérito – parecem colaborar para a interpretação de que a
interação que se desenvolvia permitia a identificação de necessidades de ambas em
conhecer melhor a realidade e que naquele momento estávamos estabelecendo um lócus
de colaboração (MAGALHÃES E FIDALGO, 2007) e iniciando um percurso
colaborativo em que novos significados poderiam ser construídos. Observa-se também o
jogo que se estabelece entre o eu e o Você. Se, por um lado, isso que indica que naquele
momento não havia ainda um “nós” durante a interação, por outro lado estávamos
“engajadas” (KERBRAT-ORECCHIONI, 2006): eu pude ouvi-la e ela pôde me ouvir,
o que possibilitou que a diretora se ouvisse de uma outra perspectiva, ou seja, que
pudesse ser também o outro para si mesma. (VYGOTSKY, 1924-1930/2004;
BAKHTIN, 1929-30/2006). Neste sentido uma ZPD mútua estava se formando (JOHN-
STEINER, 2000).
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desenvolver. Numa perspectiva materialista histórica (MARX e ENGELS, 1845-
46/2007; VYGOTSKY, 1927/2004) e com base em pesquisas que estão embasadas
nesse quadro teórico (e.g., ENGESTRÖM, 1999; MAGALHÃES, 2009p), é
fundamental que se estabeleça o conflito para que, ao tentar resolvê-lo, os participantes
possam alcançar novas compreensões. Como bem salienta Pontecorvo (2005), um dos
meios de estabelecer o conflito produtivo é fazer perguntas ou contrapor-se
argumentando.
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objetivos, entendeu? De estar confundindo as coisas. Na realidade eu estou
tentando é.... é... facilitar o trabalho dos professores, tal, mas ainda... os objetivos...
que a gente precisa estar relacionando com os objetivos da unidade que o caso no..
no caso do.PPP.. isso é uma coisa que eu não consegui sentar para sabe, para
delinear, porque era inclusive o objetivo daquela minha.... daquele meu projetinho
inicial. Entendeu. Então não consegui fazer isso ainda. To preocupada com isso.
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Recorte 36 (27 de abril de 2007)
ELV11: Mas você tem em mente quais são os objetivos do..PPP?
VAL13: Então,.... também tem isso, né? (...) É... eu lendo, o que eu sei..é(..)mas eu ainda
acho que a gente vai ter que sentar pra ver, é é definir o PPP direitinho. Isso nós
não conseguimos fazer..
ELV12: Vocês na nesta questão..não estão conseguindo sentar?
VAL14: Então, a semana passada nós conseguimos sentar, (..), nós três,eu, ela((a
coordenadora pedagógica)) e a Cleonice e acabamos falando inclusive só da
questão da demanda(...) Então o que nós sentamos pra fazer, priorizar o que a
gente ia gastar mesmo, né? Como que a gente ia fazer isso, aí a semana passada eu
e a Cleonice saímos um dia, essa semana a Áurea também saiu e nós compramos
muitaaaaas coisas. Você precisa ver nossa brinquedoteca como está. Tá
lindona!(resposta é desenvolvimento
No turno ELV11 faço outra pergunta indutiva, que obtém, como resposta,
outra negativa (VAL 13) Isso nós não conseguimos fazer. Contrariamente a todos os
pressupostos da PCCol, insisto na investigação sobre o PPP e na articulação da equipe,
como mostra o excerto abaixo:
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objetivos, eu tenho alguns objetivos que são pessoais, né? Até profissionais
pessoais, entendeu? Mas não é isso que eu quero para unidade. Para unidade eu
preciso construir junto com elas.
ELV20: Agora, lembra só qual é que é seu papel.
VAL23: é, eu tenho, eu tenho que estar, assim, eu acho que eu tenho que estar favorecendo
os encontros, eu tenho que muitas vezes estar mesmo que intimando algumas
coisas, e agora... Durante esse período acho que não foi possível, mas eu tenho que
estar articulando essa equipe..
ELV21: Ou talvez você ter um plano pra você. Com as suas ações pra essa articulação. Não
sei.....
VAL24: Ta certo. Certíssima. (silêncio)...
ELV22: deixa eu mostrar uma coisa para você
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articuladora da equipe (“é, eu tenho, eu tenho que estar, assim, eu acho que eu tenho
que estar favorecendo os encontros, eu tenho que muitas vezes estar mesmo que
intimando algumas coisas, e agora (...)”, no entanto, a modalização deôntica negritada
sugere que isto ainda se configura como um determinante externo. Sugere que, no caso,
isto se deu pela própria condução da entrevista por mim.
Os dados apresentados sugerem que a forma como conduzi esta parte da reunião
não possibilitou às participantes, incluindo a mim própria, refletir e “entender as
necessidades e sobre os sentidos que atribuem a estas necessidades” (MAGALHÃES,
1998, 2006). Nesta direção, não houve uma negociação de agendas e o que se
estabeleceu foi um conflito entre nossas perspectivas para analisar a situação. Este
conflito revela contradições mais amplas, ligadas aos contextos sociais de que
participávamos, bem como as aprendizagens que estávamos desenvolvendo ao
desempenhar nossos papéis. Como já discutido, as contradições e conflitos no
desenrolar de uma atividade podem se constituir num fator que levará ao
desenvolvimento e às transformações, na medida em que os envolvidos estarão
negociando pontos de vista e buscando novas compreensões das discussões em foco. A
pesquisa crítica de colaboração é uma pesquisa produzida com as pessoas e, como
aponta John-Steiner (2000, p. 82) – envolve “intensidade emocional” e uma “bastante
desconfortável zona de ação”, que precisa da atenção dos pesquisadores ao lidar com
essas questões (MAGALHÃES, 2009p). Assim. a forma que encontrei para encaminhar
o conflito foi com a exposição de uma teoria, como veremos a seguir:
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O excerto acima sugere minha nova tentativa de introduzir uma teoria em nossa
discussão, mas procurando evitar abordar diretamente o PPP e buscando outro suporte
para a discussão. Pode-se observar, também, a minha insistência na elaboração de um
plano e na tentativa de articular as demandas que a diretora estava relatando com uma
visão mais ampla. O excerto também sugere um sentido que eu tinha construído para a
articulação teoria e prática: trazer “teorias para iluminar as questões em jogo”.
No entanto, com tal atitude eu não possibilitei que o conflito fosse enfocado e
trabalhado, uma vez que para que isso aconteça é necessário que sejam reconhecidas e
questionadas contradições entre o objeto da atividade, instrumentos, ações dos
participantes, regras que embasam as relações e a qualidade da divisão do trabalho, o
que não se deu naquele momento (ENGESTRÖM , 1999, MAGALHÃES, 2009p).
Também se observa, na seleção apresentada, que a forma como interajo com ela
neste primeiro momento se realiza por meio de perguntas indutivas, sugestão de ação e
comentários. Embora este tipo de intervenção de minha parte possa ter proporcionado
oportunidade de expansão em recolocações em alguns momentos, por outro lado, parece
indicar que naquele momento eu, ainda estava em processo de me apoderar dos
pressupostos da PCCol. Ainda apresento uma visão tradicional da divisão de papéis na
atividade, em que o pesquisador pergunta, ou dá sugestões, e ao participante cabe seguir
ou contestar. Assim, já com base na Teoria da Atividade Sócio-Histórico-Cultural, que
supõe a compreensão das necessidades dos participantes, o entendimento de seus
motivos em agir, a construção coletiva do objeto da atividade em investigação, do
porquê das escolhas feitas, das regras que organizam os contextos específicos em foco,
dos papéis dos participantes na divisão de trabalho, e com base nas diversas vozes
presentes em todos os outros enunciados bem como nas oportunidades que tive de
observar a complexidade da dinâmica da escola, entendo que para intervir è preciso
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conhecer. Como discutido por Bakhtin (1929-1930/2006: 137), “compreender a
enunciação de outrem significa orientar-se em relação a ela”. Assim faço uma reflexão
sobre o meu papel na atividade, o que possibilitou uma tomada de consciência de minha
parte. É o que sugere o trecho abaixo, extraído da reunião de 22 de maio de 2007, no
intervalo entre uma e outra reunião de pais com professores, para a qual eu havia sido
convidada. Naquele momento a diretora me relata que havia conversado em reunião
com a equipe (CP e Assistente) sobre a minha presença na escola naquela data. E é a
diretora quem introduz o tema “Projeto Pedagógico”
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Recorte 40 (22 de maio de 2007)
VAL29: Elvira uma das coisas que a gente está atrás e falhando que é a questão do PPP.(..).
mas não tirando a responsabilidade, é tanta coisa que vem na cabeça da gente pra
fazer e a gente acaba meio fazendo conforme é possível mesmo, por isso que a
gente fala que não dá conta do que a gente tem que fazer, nós não estamos
dando conta mesmo, e a gente sente essa angústia aqui dentro que não tá dando
conta de tudo isso que precisa fazer.
ELV30: Vocês têm assim daqui até o final de junho quantos encontros com os pais,
quantos com os professores, tem uma noção de todo o trabalho que vai demandar
com (..) ... você fez um mapa mesmo de tudo e o que cada um desses eventos
vai exigir de preparação?
VAL30: Não, eu tenho quais os exemplos, então por exemplo, que nem hoje eu estou
falando na reunião de pais olha no dia 16, dia 16 nós vamos ter um encontro com
vocês, que uma coisa que a gente precisa elaborar mais, que ta aí, tá batendo na
porta e aí a gente vai ter encontro com esses pais nós temos que ter uma.. temos
uma proposta de trabalho. Tenho conversado com os pais do Conselho, pais da
APM que a gente quer sugestões de assuntos de interesse deles, mais ainda não
tivemos nenhum retorno. Nós temos isso, temos a festa junina, temos reunião,
nós temos mesmo, agora o que fazer em cada item ainda eu não elenquei e não
me organizei pra isso.
Observa-se, no turno VAL29 (“Uma coisa que a gente está falhando é a questão
do PPP”), marcada pelo verbo “falhando”, a preocupação da diretora em relação ao
PPP. Em seguida, Valéria parece se justificar relatando as dificuldades que vem
enfrentando naquele momento da organização da escola (“mas não tirando a
responsabilidade, é tanta coisa que vem na cabeça da gente pra fazer (...) por isso que
a gente fala que não dá conta do que a gente tem que fazer, nós não estamos dando
conta mesmo, e a gente sente essa angústia aqui dentro que não tá dando conta de
tudo isso que precisa fazer”. Observa-se que o substantivo “angústia” caracteriza uma
situação que parece ser permanente e tem uma força na asserção da diretora, reforçada
pela expressão “aqui dentro”.
Talvez por este motivo, na sequência, utilizo uma pergunta fechada, mas que
já aponta para uma ação concreta, o que sugere que eu tenha percebido que naquele
momento as necessidades de Valéria eram diferentes das minhas e reconheço que ela
estava tendo dificuldade em estabelecer prioridades em relação às várias necessidades
constatadas. Esta mudança em minha postura durante a interação sugere que levo em
conta o princípio da alteridade, discutido por Ninin (2006a) e procuro colocar-me no
lugar da diretora. Ao reconhecer sua “angústia”, procuro uma outra forma de colaborar
com ela, por meio de sugestões. Também não pude deixar de refletir a sobre a
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responsabilidade que eu possa ter sobre este conflito expresso por ela, o que novamente
me faz rever minha postura e a qualidade de minhas intervenções.
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Recorte 41 (21 de setembro de 2007)
ELV58: Por que na verdade eu tava, insistindo, insistindo no projeto político pedagógico aí
você tem apontado as questões da rotina e do cotidiano, que de alguma maneira
tem impedido isso. Então, a minha pergunta é assim, desse tempo que você
viveu(..),o, o que você sente de necessidade?
VAL58: Eu acho que o projeto pedagógico é muito importante, porque o projeto que está no
papel não condiz com o projeto que é realizado na prática aqui, eu acho que a gente
precisa regularizar isso, é também o momento de nós sentarmos com os professores pra
rever algumas coisas, mas eu sinto que as coisas estão caminhando. O que ta faltando,
ta faltando a gente esquematizar isso, por no papel e mandar pra frente
ELV59: Você toparia que eu mandasse algumas perguntas por e-mail pra você me responder e
devolver?
VAL59: Pode mandar. Eu quero que você me ajude a organizar um plano
ELV60: ta bom, combinado. Eu queria fazer umas perguntas agora só pra fechar.(..), Quando eu
estive ausente esse tempo, você falou, “ah, nós estamos sentindo falta das suas
intervenções”. Em que sentido você acha que elas ajudaram ou não ajudaram. (..)
VAL60: Olha, algumas vezes, você perguntou “ você já pos isso no papel”?, Algumas
sugestões que às vezes você me dá, as sugestões de leitura, porque eu esse ano foi
zero em termos de estudo né, eu sinto muita falta disso, sugestões de formas de
encaminhamento, “ olha, e se você fizesse dessa forma tal”, eu acho isso importante,
porque é um outro olhar, você não está no meio do furacão, você está aqui dentro
quando você vem, mas você não está no meio do furacão, não tem esse envolvimento
que a gente tem, é diferente a sua posição, então essas sugestões eu acho que são
importantes, esse olhar diferenciado
Observa-se que termino o meu turno (ELV58) com uma pergunta que pede mais
evidências sobre as reais necessidades da diretora “o que você sente ainda de
necessidade?”. Tal colocação faz evoluir nossa interação e a diretora reafirma que o
projeto pedagógico é muito importante, mas que “está faltando é esquematizar e pôr no
papel”. No turno ELV60, utilizo tal declaração para fazer avançar nossa discussão, por
meio de uma pergunta fechada e induzir a uma proposta concreta “Você toparia que eu
mandasse algumas perguntas por e-mail”? Esta pergunta sugere que eu estou fazendo
uma tentativa de “combinar a agenda de forma conjunta”, característica da PCCol. Tal
proposta é aceita pela diretora imediatamente, como sugere o verbo no presente “eu
quero que você me ajude a elaborar um plano”, no turno VAL59.
Na sequência (ELV60), minha pergunta pede mais evidências “em que medida
estas intervenções colaboraram?” e indica que eu também queria mais elementos para
orientar a minha ação futura, ou seja, procurava encontrar caminhos para uma ação
conjunta e uma maneira de compartilhar e expandir nossos próprios entendimentos em
busca de garantir um empreendimento colaborativo (JOHN-STEINER, 2000). Fazia,
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pois, uma tentativa de agir com responsividade, possibilitando que diferentes visões e
necessidades fossem explicitadas (NININ, 2006a). Valéria, ao respondê-la, me dá
elementos que resumem como ela via minhas intervenções: sugestões e formas de
encaminhamento. Observa-se a declaração no turno “eu acho isso importante, porque
é um outro olhar” completadas com a declaração final “esse olhar diferenciado”,
apontam para o papel do pesquisadora como o outro (BAKHTIN, 1929-30/2006;
VYGOTSKY, 1925/2004).
ELV16: minha sugestão é que você comece por esta... eu vou mandar esta tabela por e-
mail, porque aí você vai escrevendo e vai abrindo
VAL16: Então amanhã talvez eu consiga fazer isto..eu gostei desta planilha
ELV17: Eu fiz esta planilha também com o foco nas quatro áreas pra você avaliar o
ano.. a gente pensar, podemos mudar... por exemplo...
VAL17: ta. Nas quatro áreas
ELV18: isto: eu fui pegando o que você falou... que você pediu....Foco na participação
dos pais
Val 18 Hum hum
Pais professores e alunos (juntas)
ELV19: “Que tipo de situações são organizadas sistematicamente na escola para que a
equipe possa participar efetivamente”Qual é o tipo de participação esperada”.
VAL 23 Eu acho que eu posso pensar assim.. se eu colocar no papel uma ação... uma ação
para cada segmento...para mim já é lucro... uma ação e eu mais ou menos vendo..
eu já tenho uma idéia.. eu vou sentar. vou pegar estas planilhas direitinho... vou
mudar.
Após minha sugestão explicitada (ELV16), que aponta para uma ação concreta
(“eu vou mandar esta tabela por e-mail, porque aí você vai escrevendo e vai
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abrindo”), a diretora emite sua avaliação positiva, VAL16:” eu gostei da tabela”,
sinalizando que posso continuar a explicação do artefato. No turno ELV:17 “Eu fiz esta
planilha também com o foco nas quatro áreas pra você avaliar o ano.. a gente pensar,
podemos mudar... por exemplo”, observa-se que o jogo entre “eu fiz” e “para você avaliar
o ano, podemos mudar” sugere uma nova divisão de papéis na atividade. Na
continuidade da discussão (turno ELV18: isto: eu fui pegando o que você falou.. que
você pediu....Foco na participação dos pais), eu procuro explicitar os critérios em que
me pautei para construir a tabela.
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Recorte 44 (22 de fevereiro de 2008)
ELV175: Então, vamos pra frente, nesse caso. Na verdade Valéria a gente meio que
retomou todas as áreas em que você trabalha. Você concorda? E comparamos com
o que você tinha que fazer. Que conclusão você tira disso?
VAL197: Eu faço quase tudo. Tudo que é da minha competência eu faço e tem que melhorar
algumas coisas. Tem algumas coisas que são mais importantes. E eu acabo
dando... Não que eu dou prioridade, mas eu acabo direcionando mais tempo com
aquilo que é mais cotidiano e diminuindo o tempo com aquilo que eu acho mais
importante.”
ELV176: Tá. Dos três exercícios que a gente fez, só pra sintetizar, quais são as áreas onde,
agora, você quer investir, pegando os três(exercícios ) Nós fizemos três exercícios,
certo? Quais as áreas agora onde você vai (#...)
VAL198: Elvira, se eu conseguir me planejar melhor talvez eu consiga diminuir o tempo
que eu gasto com essas coisas aqui((administrativo cotidiano)). Não é.. isso aqui
faz parte das minhas atribuições, e é também porque isso aqui a gente tem um
pressão em cima, direto pra estar fazendo, não é? Talvez por isso que eu fique
muito tempo nisso. Então, eu preciso me organizar mais, melhor
ELV177: Essa organização envolve o que que prioridades que já tinham sido discutidas?
Quais? Tem aqui(pilha de excertos) e os que você mesma fez(lista de ações da
semana)).
VAL199: É isso mesmo. Eu preciso me planejar, dividir melhor o trabalho pra eu
conseguir dar conta de acompanhar melhor essa parte pedagógica. Eu acho
que é uma coisa que falta. A parte pedagógica. Melhorar a comunicação da escola
e, eu acho que inclusive através dessa comunicação eu vou conseguir chegar
mais próximo da minha comunidade, que eu não estou conseguindo chegar.
No turno 197, Valéria inicia uma avaliação da forma como tem conduzido suas
atribuições, mas repetindo uma avaliação já expressa. Em seguida (ELV176), reformulo
a pergunta, pedindo mais evidências sobre em que áreas ela vai investir, o que sugere
que procuro colaborar para o avanço da reflexão e a focalização de uma ação concreta.
Novamente há um desenvolvimento na reflexão: a diretora inclui novos elementos e
pondera sobre a necessidade de planejamento, avaliando a sua realidade concreta “isso
aqui faz parte das minhas atribuições, e é também porque isso aqui a gente tem um
pressão em cima, direto pra estar fazendo, não é?” E conclui: “eu preciso me
organizar, mais e melhor”.
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Os exemplos acima discutidos foram selecionados para exemplificar momentos
em que há uma mudança no padrão interacional. Apoiada no quadro teórico da TASCH,
entendo que estes momentos não foram estanques. Ao longo da pesquisa, o
compartilhamento de significados me possibilitou conhecer mais a realidade e formular
questões que favorecessem a reflexão, gerando a possibilidade de aprendizagem e
desenvolvimento. Neste sentido, minhas intervenções foram se tornando mais
“exigentes” (PONTECORVO, 2006), o que favoreceu o aprofundamento das
compreensões, dos pensamentos e das avaliações sobre o que estava em discussão; a
emergência de diferentes pontos de vista, além de oportunizar a aprendizagem para
ambas (BROOKFIELD & PRESKILL, 2005). Por outro lado, foram também mais
colaborativas, sugerindo que durante a pesquisa eu fui aprendendo a perguntar, como
mostra o excerto abaixo.
Assim, no turno ElV25, minha pergunta, que pede mais evidências (“o que você
já colocou em prática?) possibilita o aprofundamento da reflexão da diretora no turno
seguinte. A seguir, faço uma pergunta que pede por explicação ou justificativa
(ELV27). Novamente há um desenvolvimento na interação e Valéria responde trazendo
147
um outro conceito – “gestão democrática” – que merece ser investigado. Em seguida,
peço mais esclarecimentos sobre o que é “gestão democrática”, o que novamente gera
uma expansão.
O excerto se inicia com o meu pedido para que ela fale sobre as ações que
desenvolveu em 2007. Motivada pela minha pergunta, a resposta de Valéria (turno
VAL2) sugere que, durante a atividade, as interações que desenvolvemos
proporcionaram possibilidades de aprendizagens mútuas, as quais possibilitaram a
construção de um objeto compartilhado. Materializada nos artefatos produzidos, a
mediação possibilitou a articulação entre intenções e ações tanto da pesquisadora,
quanto da diretora, o que provocou um avanço na atividade Formação de Diretor. Esta
interpretação pode ser corroborada, primeiramente, pela declaração “Então, eu tinha
que primeiro conhecer a realidade, foi mais ou menos isso que a gente foi fazendo o
ano passado” em que o dêitico “a gente” sugere que este foi um empreendimento
conjunto (JOHN-STEINER, 2000) e também pela constatação “Agora, esse ano
mudou, por quê? Porque eu consegui saber qual era a realidade onde eu estava e
planejar”(...). nesse sentido a pesquisa me ajudou bastante”.
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Recorte 47 (16 de junho de 2008)
ELV3: Por quê? Como te ajudou?
VAL3: Então, é assim, a gente sabe o que tem que fazer, sempre. Não é que a gente não
sabe, a gente sabe o que tem que fazer. Mas, às vezes, a gente vai se atropelando pelo
cotidiano do dia-a-dia, pelo que a gente tem que fazer de mais urgente. O que tem
que fazer, tem que ser feito, o que tem que ser entregue e a gente acaba deixando
outras coisas de lado.
ELV4: E nesse sentido, nessa diferença que você está apontando, como que a pesquisa ti
ajudou?
VAL4: Então, por exemplo, no começo desse ano você chegou e me deu lá umas questões, e
a gente... Foi um momento que mesmo dentro da correria, foi um momento de eu
pensar no que eu já tinha feito e o que eu achava que era necessário eu fazer ainda.
Você me ajudou com algumas perguntas e até mesmo aquela tabelinha que você
me deu pra fazer. Me ajudou bastante.
ELV5: Ajudou no quê? (05’06)
VAL5: Pra eu organizar minha reflexão sobre o planejamento.(..). E aquelas reflexões que
a gente fez também. Eu lembro dos papeizinhos, as ações, tal, pra gente pensar no
que foi feito no ano anterior e o que estava faltando. E nós observamos que o ano de
2007 foi um ano basicamente voltado para essa questão mais administrativa. E eu
estava falhando muito no acompanhamento pedagógico. Então, esse ano eu tenho
esse foco maior no pedagógico(...)..
No turno ELV3, faço uma pergunta que solicita uma explicação “Por quê?,
Como?”, a que a diretora responde com uma avaliação positiva, mas que não responde
totalmente a questão. Buscando fazer avançar a reflexão, no turno ELV4 reformulo a
pergunta e peço mais esclarecimentos sobre como a pesquisa colaborou. Observe-se, na
resposta de Valéria (turno VAL4), o jogo entre “a gente”, “você” e “eu”, que revela
uma divisão de papéis mais igualitária, como podemos observar pela colocação
pronominal na declaração a seguir “Foi um momento que mesmo dentro da correria, foi
um momento de eu pensar no que eu já tinha feito e o que eu achava que era
necessário eu fazer ainda”. Valéria revela, em seu discurso, o processo de
internalização/externalização, tal como discutido por Vygotsky, na medida em que se
pode observar, no mesmo turno, a referência às “perguntas” e à “tabela”. Sua
avaliação aponta para a linguagem como instrumento de mediação na discussão, bem
como artefato organizador na resolução dos conflitos. Sugere, pois, que a ação mediada
por instrumentos possibilitou a reflexão dos participantes sobre suas ações, criando ZPD
como instrumento-e-resultado no compartilhamento dos significados, o que moveu o
objeto da atividade no sistema e transformou-o em produto, em resultado
(MAGALHÃES, 2009p).
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Pode-se, inclusive, compreender que todo esse movimento foi resultado da
mediação mútua, que possibilitou que, dialeticamente, relacionássemos nossos sentidos
pessoais (individuais) que trouxéssemos para a interação com o nível coletivo – os
significados compartilhados nas interações. É nesta direção que aponto que as
participantes produzem conhecimento por meio do compartilhamento de sentidos e
significados em mediações sociais, que são “pré-requisito” (instrumento) e “produto”
(desenvolvimento) (MAGALHÃES, 2009p). Defendo, novamente, o uso de artefatos. A
“Tabela de Ações” e o “Jogo de Papéis” foram produtos do compartilhamento, mas
possibilitaram, cada um a seu modo, transformações refletidas, ou seja, reorganização
das estruturas mentais a partir das (novas) informações compartilhadas e das relações
que se estabelecem com os conhecimentos já existentes no indivíduo.
150
para focalizar as necessidades. Neste sentido, cada reunião se constituiu num elo, numa
cadeia de enunciados, que, interagindo com a consciência individual, a partir do social
(BAKHTIN, 1929-30/2006), foi paulatinamente transformando tanto as relações entre
nós como do objeto em foco.
151
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Logo que cheguei à EMEI, percebi que não era o momento de trabalhar com a
equipe, pois a diretora acabara de assumir seu cargo efetivo e nosso conhecimento
anterior poderia gerar um desequilíbrio numa equipe que ainda não se conhecia. Além, é
claro, das várias necessidades que a reorganização da escola demandava. Hoje, pelos
mesmos motivos, também me questiono sobre a adequação do momento em que iniciei
a pesquisa, tanto em relação à minha constituição e preparação enquanto pesquisadora
crítica colaborativa, como em relação ao momento da diretora, que havia recém
assumido a escola. Percebo, cada vez mais claramente, a enorme responsabilidade de
desenvolver uma pesquisa que se pauta na intervenção: o quanto é necessário cuidar da
relação com os participantes, bem como aprofundar o entendimento do contexto
específico, para evitar interpretações equivocadas ou superficiais. Além disso, a
153
transparência nos erros e acertos da pesquisa é fundamental. Neste sentido, procurei
dividir com a diretora algumas das minhas dúvidas durante o percurso e, durante o
trajeto, fui abandonando concepções pré-estabelecidas a respeito de pesquisa,
aprendizagem e desenvolvimento.
Acredito que a relação que se estabeleceu entre nós foi uma relação construída,
forjada no respeito mútuo, na negociação dos acertos e desacertos da pesquisa. Esta
relação nos permitiu aprender juntas sobre as tarefas do diretor escolar, em como
articular teoria e prática, bem como a compartilhar as necessidades daquele contexto e a
buscar, conjuntamente, as maneiras de atuar perante as demandas que se apresentavam.
Isto é, fomos ressignificando tanto o papel do diretor como nossos próprios papéis na
Atividade. Construímos, juntas, artefatos que foram significativos para o
desenvolvimento da Atividade Formação de Diretor em serviço, artefatos estes que
foram produto da mediação mútua, resultados de uma produção conjunta. A introdução
desses artefatos, por um lado, sugere como já apontei, que eu havia reorganizado alguns
154
dos sentidos que atribuía ao meu papel. Mas me surpreendi – e muito – com a
repercussão que eles tiveram no desenvolvimento da pesquisa. Quando os estava
elaborando, tinha plena consciência de que eles poderiam me auxiliar na investigação
que desenvolvia, mas somente no processo de utilização é que confirmei a função da
linguagem para a organização do pensamento (Vygotsky) – meu e da diretora.
Interessante foi verificar o quanto eles colaboraram para que Valéria organizasse
a sua própria reflexão em relação às ações que pretendia desenvolver na escola. Sua
reflexão sistematizada ofereceu a possibilidade de uma reorganização das prioridades e
das ações que pretendia encaminhar. Estas transformações se traduzem em seu discurso
no planejamento de suas ações na escola, modificando, em parte, o sentido que atribuía
ao papel do outro (pai, professor, funcionário, etc.), o que sugere que, durante o
percurso, a diretora ressignificou, também, o sentido que atribuía a seu próprio papel na
condução da escola. Quanto a mim, pude verificar a importância dos vários tipos de
mediação e também pude reorganizar os meus próprios sentidos sobre direção escolar e
aprofundar as necessidades e características particulares sobre o processo de formação
de educadores em serviço.
Assim, acredito que esta pesquisa trouxe contribuições também por se tratar de
uma colaboração de longo prazo. Quanto a mim, esta experiência proporcionou a
oportunidade de aprender a como conduzir uma pesquisa colaborativa e a como
organizar perguntas e intervenções de maneira que esta “organização linguística”
favoreça a reflexão dos envolvidos e abandone um discurso cristalizado assumindo o
compromisso real de transformação na ação. Nesta direção, embora esta pesquisa tenha
me proporcionado desenvolvimento e aprendizagem em trabalhar com o outro,
reconheço que há ainda muito que aprender. Há muito que aprimorar em relação ao meu
aprendizado como pesquisadora. Este é um caminho que apenas se inicia para mim.
155
acreditando cada vez mais na importância da linguagem para a constituição e mudança
das práticas humanas. Percebo, ao encerrar esta pesquisa que muito ainda precisa ser
estudado e investigado tanto em relação ao papel do diretor como articulador da equipe,
quanto em relação os cursos de formação para esses profissionais. Também tenho
convicção de que estas páginas revelam apenas momentos e alguns aspectos das tarefas
do diretor. Fiz questão de acentuar as várias áreas de atuação desse profissional e
mostrar como cada uma delas exige aprendizagens específicas, seja na relação
interpessoal para atingir a liderança com sua equipe, seja nos aspectos específicos
administrativos burocráticos que se descuidados geram prejuízos a escola, seja em
relação ao conhecimento pedagógico, necessário para uma coordenação adequada da
escola. Isso aponta também para a importância da constituição de uma equipe diretiva
coesa, que se forja no compartilhamento de responsabilidades e reflexões.
156
propostos. Por este motivo, fui procurar entender tanto os verbos como os
complementos que os acompanhavam, que sugerem uma relação entre a reflexão e a
focalização dos objetivos das ações declarados no discurso, ou seja, sugerem que, à
medida que a reflexão se aprofunda, o alvo do verbo torna-se mais específico.
Interessei-me por esta descoberta, que considerei importante especialmente em
contextos de formação. Da mesma maneira percebi uma relação entre os tipos de
perguntas e a possibilidade de expansão e desenvolvimento de um discurso comum.
Nesta direção, em discussões futuras, também gostaria de aprofundar a relação entre
perguntas que veiculam um determinado argumento e a co-construção conjunta.
Outra descoberta importante neste trabalho foi a importância dos instrumentos e
artefatos de mediação. Apesar de ter discutido a matéria neste estudo, também gostaria
de investigar mais profundamente o papel dos artefatos mediacionais, especialmente
aqueles que são co-construídos, de modo a entender e, talvez, sistematizar como eles
contribuem para a mudança do padrão mediacional e para a produção de novos
significados. Todas essas questões trazem contribuições às pesquisas com formação de
educadores desenvolvidas no Grupo de Pesquisa LACE.
157
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168
Anexos
ANEXO 1 - ROTEIRO DA ENTREVISTA INICIAL
(enviado por e-mail em 06/02/07)
2
ANEXO 2 -TABELA DE AÇÕES
FOCO Foco na criação de oportunidades de participação:da equipe diretiva, dos pais :professores e alunos e funcionários Ação 1 Ação 2 Ação 3
Que tipo de situações são organizadas sistematicamente na escola para que a equipe possa participar efetivamente?
Equipe diretiva
1
ANEXO 3 - JOGO DOS PAPÉIS
Este artefato foi usado na reunião de 22 de fevereiro de 2008 e a tarefa foi realizada
em três etapas descritas a seguir.
1ª ETAPA
A partir dos excertos das entrevistas realizadas durante 2007, selecionadas por mim e que
estavam, recortadas em tiras de papel e embaralhadas, diretora precisaria lê-las e separá-las
segundo um critério que ela própria estabelecesse. Depois a diretora deveria encontrar uma
categoria para essas “papeletas.e nomeá-las”. O destaque no fim da papeleta foi a categoria
que a diretora deu para as mesmas. Mostro abaixo exemplos de papeletas organizadas por
mim. Na página 5 deste anexo estão as papeletas escritas pela diretora a
1/06 Diretora - (com relação a secretária)hoje eu até deixei um bilhetinho lá: porque as fichas não estão
atualizadas? (Organização administrativa)
27 de abril VAL23: é, eu tenho, eu tenho que estar, assim, eu acho que eu tenho que estar favorecendo os
encontros, eu tenho que muitas vezes estar mesmo que intimando algumas coisas, e agora ... Durante esse
período acho que não foi possível, mas eu tenho que estar articulando essa ...(relação da equipe técnica)
VAL22: Mas eu também não quero fazer isso sozinha, entendeu? Eu não quero fazer isso sozinha, então
assim, claro que eu fico pensando, nas coisas que eu tenho ... mas eu não quero fazer isso sozinha, eu quero
fazer junto com elas. Não ...quero falar..é chegar pra você e dizer, não, mas eu já defini quais os objetivos,
eu tenho alguns objetivos que são pessoais, né? Até profissionais pessoais, entendeu? Mas não é isso que eu
quero para unidade. Para unidade eu preciso construir junto com elas. (relação da equipe técnica)
1/07 Val1 - Na sexta feira eu adverti o seu Fernando por conta daquela ocorrência lá do pai lá, do pai, eu fiz
aquela advertência pra ele e na hora em que eu estava conversando com ele, ele citou a questão da Elaine.
(Organização administrativa).
1/07 Val4 – Assim como também é mais fácil você fazer de conta que não vê e ficar e quieto, assim é mais
fácil com os agentes, é mais fácil com o professor, como a questão da abonada, né, professor também faz
isso, que é a questão da falta deles, que eles tão resistindo porque não quer, não quer, no dia da paralisação
eles querem ter abono, e assim, seria irresponsabilidade funcional minha, só pra começar e eu quero
esclarecer isso com vocês, eu dispensar 600 alunos da escola um dia, pra todo mundo abonar, seria
irresponsabilidade funcional, sem dizer nas outras irresponsabilidades que seriam, por isso que eu não
concordo com o abono, e por isso que eu não vou abonar, entendeu? Então, assim, como que eu vou falar
depois, olha, a gente tem dispensado criança, eu tenho sentido muito isso, isso ta me incomodando também
1
que é a gente dispensar por causa de professor que sai, por causa disso, por causa que vai no médico, por
causa de Apropen, tudo isso me incomoda, a gente está dispensando muito as crianças. A Márcia que é uma
professora frequente, já recebi ligações de que, Ah, mas ela falta muito essa professora, ela falta muito
porque ela ta doente, não tem... aí eu explico, explico, explico, mas assim, isso por que essa comunidade, eu
vou falar pra vocês, é boa, porque se fosse lá na José da SILVA, todos esses casos já tinham batido lá na
supervisão(..). Por que que que você está dispensando essas crianças, agora, eu dispensar 600 alunos pros
professores irem pra uma paralisação? (Formação)
1/07 Val – Então eu quero estar justificando pra vocês isso eu vou falar pra elas novamente na reunião
pedagógica que eu acho que precisa estar colocando isso, porque ...(..)– É, que é aquela questão da formação
política que a gente tinha também pensado com as professoras, não é? Que entra a questão ética, que entra.
(Formação)
Val agora os agente escolares acho que é urgente a gente começar a pensar no que que vai fazer com eles.
Bom!! E a LUISA!? O que que a gente faz com essa moça? Ela vai entrar de férias a semana eu vem. Hoje
eu peguei um prontuário de uma criança, nem... as professoras entregaram todas aquelas fichinhas de
atualização de cadastro? Acho que não né Áurea, depois a gente precisa cobrar das professoras e pensar.
(Formação/organização administrativa)
Val – Você está conseguindo acompanhar o serviço dela Cleonice. (Relação da equipe Técnica)
VAL11: Então Elvira, você sabe que eu estou assim preocupada, eu to lendo aquele livro lá do Libâneo, né?
Val12 Eu tenho assim, ando um pouco preocupada de estar fazendo dos meus meios os objetivos, entendeu?
De estar confundindo as coisas. Na realidade eu estou tentando é.... é... facilitar o trabalho dos professores,
tal, mas ainda... os objetivos... que a gente precisa estar relacionando com os objetivos da unidade que.o
caso no .. no caso do .PPP.. isso é uma coisa que eu não consegui sentar para sabe, para delinear, porque era
inclusive o objetivo daquela minha.... daquele meu projetinho inicial. Entendeu. Então não consegui fazer
isso ainda. To preocupada com isso.
ELV6: Mas você tem em mente quais são os objetivos do ..PPP?.
VAL13: Então,.... também tem isso, né? (...) É... eu lendo, o que eu sei..é ... do PPP do ano passado, que a
Áurea estava trabalhando, era a questão dos valores.. ...Né? com as crianças, mas eu acho que precisa ir um
pouquinho além disso, aí eu tenho conversado um pouco ... assim, eu converso bastante com a Áurea, dá pra
gente...., mesmo que seja na loucura, assim, de não sentar pra... mas é assim.. . é. Outro dia tava falando pra
ela. – Áurea! Os professores já fizeram um planejamento? Mas a Áurea ta fazendo um. Um... ela ta fazendo
um caminho inverso. Ela ta tentando desconstruir aqueles aqueles ..hábitos que as professoras tinham antes.
Que é o de fazer um planejamento . proforma.., só pra por no papel e entregar pra gente e construir com elas
uma proposta de trabalho pra depois fazer esse tal desse planejamento. (Formação)
Val40 Aí oooOOO Elvira só pra terminar o assunto do escritório de contabilidade. Aí que eu fiz, eu chamei,
eu liguei pra uma diretora , ´´é que ..de é de uma EMEF uma ... ela me deu esse telefone desse escritório
porque eu estava quase louca de impostos e declarações que tinha que fazer para Receita Federal e eu não
tinha feito porque eu não sabia que era pra fazer. Porque quem tinha que estar falando isso pra gente era a
2
coordenadoria, eu nunca fiz isso sozinha, e deixei de entregar RAIS DIC ... vou ter que pagar multa por
causa disso. Aí as minhas companheiras de estrada. (Organização administrativa)
Val(..)Que a gente conseguiu comprar o data show né? Um suor, mas nós conseguimos comprar o data
show. Data show, telão e uma caixinha de som.
VAL50: Qual a finalidade para gente estar usando esse data show? Né? . Então a princípio nós vamos estar
colocando na sala de vídeo, né? Para estar exibindo filmes, mas não é só esse objetivo, aliás, uma das coisas
que ...tanto eu quanto a Áurea, ela concorda comigo. Esse acesso de utilização dos vídeos dos DVDs é por as
crianças sentadas pra só ficar vendo, não é? Nós não queremos isso, porque nós estamos criando cidadãos
passivos como ... como a televisão quer mesmo, né? Então isso a gente não quer mesmo. Nós queremos estar
colocando data show inclusive para eles estarem utilizando na sala de informática e estarem criando e
...vendo aquilo que eles estão criando. Então, assim, a gente tem uma proposta pedagógica com esse
equipamento, não é? Não é assim sem nada. (Conquistas)
VAL112:– Como se ..como se e eu mordesse, porque acho que, por conta talvez da minha postura ser um
pouco diferente da Maria que era a outra diretora que era mais assim, mais tranquila, né? Que nem, ontem, a
hora que eu saí, eu falei, Ò amanhã não tem horário de banco.
Nutricionista: Muita escola tem self service mas não tem projeto. Tem que tem a colaboração dos
professores conversando sobre o que vai ser servido. Vocês tem projeto. A única coisa que falta aqui é o
quadro.
Val: então eu também estava conversando com as professoras esta semana sobre a questão do intervalo e das
refeições da gente estar trabalhando um pouco mais com eles éé a forma a forma de usar o talheres é.. e o
que comer, né então eu estava conversando com elas hoje PEA e saiu até umas sugestão da gente alternar os
intervalos e ter mais a presença do professore ali. Né? (Conquistas)
VAL: que é adequado ao self service, então nós conseguimos as talheres ... a semana passada, que nós íamos,
nós tínhamos pedido as talheres, as crianças ... com a colher, ... então, por que é assim, oh, eu tinha pedido,
eu pedi pra eles substituírem os garfos que já estavam mais usados, porque estavam desagradáveis aqueles
pratos, ... pratos plásticos, pedi pra eles .trazerem .. as cumbuquinhas, pra sobremesa, porque as crianças
comiam as sobremesas na mão né?(...) E as crianças já estão comendo com garfo e faca, ai assim ..sem
nenhuma dificuldade porque na casa deles devem comer com garfo.Algumas crianças é que falam, ah, na
minha casa não usa isso. Porque ninguém come com garfo e faca na casa, todo mundo come de colher, e aí
também é uma forma da criança estar levando isso pra casa, quem sabe mudar os hábitos da família. Mas as
mães estão gostando viu.... ( Conquistas/Participação da comunidade)
VAL: Andamos o dia inteiro, depois chegamos aqui às 6 horas da tarde pra descarregar os dois carros
lotados. Você não tem noção como veio aquela caçamba. A caçamba dela lotada, a frente lotada, o meu porta
mala lotado e a traseira do meu carro, a parte de passageiro lotado. Nossa!!! Brinquedo de coisa pra escola,
tudo. Compramos papelaria, mas era mais brinquedo, né? (Conquistas)
VAL13:... um dos nossos objetivos é que as crianças participem do Conselho. Provavelmente serão as
crianças do 3º estágio que são os maiorzinhos né? Que já têm um pouquinho mais de maturidade, de 5 a 6,
né. Tem uns de 6 anos já completos de 6 a 7. Então esses a gente quer estar pelo menos assim..a Áurea está
fazendo um trabalho. (Participação da comunidade)
3
Val30 – É, é isso que eu quero. Que pelo menos tivéssemos uma maior participação da comunidade. Pelo
menos, né. E eu queria que isso viesse não de minha pessoa. Uma postura minha, ou então da Áurea que eu
acho que quem mais está próxima assim, mas assim de toda a escola. Então nós fizemos uma coisa. Nós
temos, 2 no calendário, dois dias que nós temos que repor, que nós fizemos ponte. Agora em abril, que é a
semana santa e a outra ponte que tem..., ah, não me lembro de cabeça, essas coisas. (Participação da
comunidade)
Val37 – Então eu acho que dava pra gente estar fazendo disso, mas eu preciso, veja bem os projetos em
horários coletivos dos professores que é o espaço maior que a gente tem para formação deles, dentro da
unidade é uma coisa que é direcionada pela coordenação pedagógica e eu não posso passar por cima dela.
Entendeu? E eu não quero passar. Porque é uma atribuição dela, então a gente tem que sentar junto.
Val 38 – É, é e a gente nem sentou pra fazer isso, você sabe. (Formação)
Interrupção: Funcionária entra com alunos machucado. Caiu no pátio, cortou a boca. É necessário levar para
o Pronto Socorro. A diretora é quem levará. Série de providencias práticas tem inicio: ligar para os pais,
localizar a ficha etc. (Rotina )
Val - Então, agora nós temos, nós estamos com ... ontem eles liberaram 60 vagas, nós temos 80 vagas . Nos
limpamos as listas de espera , a s professoras..que elas estão reclamando que as salas estão muito cheias e eu
to chamando, liberam 60 vagas, mas elas estão reclamando por que? Porque na realidade a coordenadoria
impôs para gente que tinha que ser salas de 40. Por isso que ... dá é puxado 40 alunos,... eu também
concordo. Agora tem ausências, tem ausências. Então a gente conta com isso. E elas estavam falando... então
na realidade nós temos 780 vagas. Nós temos agora matriculados.700. (Organização administrativa)
V - Eu acho que o projeto pedagógico é muito importante, porque o projeto que está no papel não condiz
com o projeto que é realizado na prática aqui, eu acho que a gente precisa regularizar isso, é também o
momento de nós sentarmos com os professores pra rever algumas coisas, mas eu sinto que as coisas estão
caminhando. O que ta faltando, ta faltando a gente esquematizar isso, por no papel e mandar pra frente.
(Formação)
Mostrando o painel onde fez a prestção de contas. Este painel está no mural, na entrada principal da
escola, passagem obrigatória de todos os responsáveis pelas crianças, diariamente.
Val: A prestação de contas aqui da APM, da caixinha, que entra dos pais deu, eu já pedi pra tirar esse vaso
daqui, senão não dá pra por .... fiz a prestação de contas também dessa verba do PTRF, fiz as prioridades ....
em reunião, as notas, cópias das notas. (Participação da comunidade)
VAL: Então, essa reunião agora é de pais com os professores, mas dentre esses informes, a gente ainda
dentro da nossa proposta de trabalho, a questão da participação deles, né? Então, porque que eu falei também
dessas contas? Pra eles perceberem que é o Conselho de Escola e a APM que tomam as decisões pra escola,
pra eles se tocarem disso, e nessa sexta-feira, por exemplo, nós vamos ter reunião de APM e de Conselho pra
organizar a festa junina, não é só isso que nós vamos ter, mas é uma das pautas mais importantes. E pra eles
perceberem que depois reclamam:” ah, não gostei disso, não gostei daquilo”, mas então a gente convidou
também agora vamos fazer os cartazes pra divulgar as reuniões, pra ver se a gente tem uma participação
maior dos pais, mas eu acho que eles têm vindo, tá devagarzinho mas . (Participação da comunidade)
4
2ª ETAPA
A partir da lista de ações que a diretora escreveu e foram realizadas naquela semana (18 a
22 de fevereiro de 2008), Valéria deveria reorganizar as categorias iniciais, acrescentando o
que ela havia realizado e estava expresso na sua lista.
Li DOCs (( diário oficial e documentos)). Li e destaquei pontos importantes. (Parte administrativa cotidiana)
Esclareci pontos importantes do nosso trabalho com os funcionários. (Organização para o início do ano)
Passamos informes da 1ª semana para os agentes escolares. (Organização para o início do ano)
5
3ª. ETAPA
A terceira etapa da tarefa foi comparar os papéis dos exercícios anteriores com as
atribuições do diretor escolar, extraídas do Regimento Escolar da Secretária da Educação
Municipal. O objetivo dessa terceira etapa não era detalhar o texto legal, nem discuti-lo
exaustivamente, mas utilizá-lo nesse momento como mais um instrumento que pudesse
possibilitar que a diretora tivesse uma visão geral do que é esperado de sua função.20
Capítulo II
Da Equipe Escolar
Art. 28- A Equipe Escolar das Escolas Públicas Municipais é constituída por:
I - Equipe Técnica - da qual fazem parte o Diretor de Escola, o Assistente do Diretor de
Escola e os Coordenadores Pedagógicos;
II - Equipe Docente - da qual fazem parte os Professores em regência de classe, os
Professores Substitutos, os Professores Readaptados, os Monitores de Educação de
Adultos e os Professores Orientadores de Sala de Leitura;
III - Equipe Auxiliar da Ação Educativa - da qual fazem parte o Auxiliar de Direção,
Auxiliar Técnico de Educação, o Secretário de Escola (Encarregado de Secretaria),
Auxiliar Administrativo de Ensino, Oficial de Administração Geral, Auxiliar de Secretaria,
Inspetores de Alunos, Agentes Escolares e Vigias.
20
O excerto do texto foi retirado da Internet do site :
http://paisonline.homestead.com/files/SMEREGESCOLAR.doc; em 18 de fevereiro de 2008. Posteriormente
foi comparado com outras fontes, revelando pequenas alterações, não pertinentes para essa pesquisa .
6
Art. 29- Os direitos e deveres de todos os que fazem parte da equipe escolar estão
estabelecidos nos princípios gerais deste Regimento e demais dispositivos legais vigentes,
assegurada a equidade para todos.
Parágrafo Único- Todos terão direito de requerer ou representar, pedir reconsideração e
recorrer nas formas previstas pela legislação em vigor.
Seção I
Da Equipe Técnica
Subseção I
Do Diretor de Escola
Art. 31 - São competências do Diretor de Escola, além de outras que lhe forem delegadas,
respeitada a legislação pertinente:
I - Cumprir e/ou assegurar o cumprimento das disposições legais e das diretrizes da
Política Educacional da Secretaria Municipal de Educação;
II - Coordenar a utilização do espaço fisico da Unidade Escolar no que diz respeito a:
a) ao atendimento e acomodação da demanda, inclusive à criação e supressão de classes;
b) aos turnos de funcionamento;
c) à distribuição de classe por turno.
III - Encaminhar, na sua área de competência, os recursos e processos, bem como
petições, representações ou ofícios dirigidos a qualquer autoridade e/ou remetê-los
devidamente informados a quem de direito, nos prazos legais, quando for o caso;
IV - Autorizar a matrícula e transferência dos alunos;
V - Aplicar as penalidades de acordo com as normas estatuárias, bem como as previstas
nas normas disciplinares da escola, elaboradas pelo Conselho de Escola e descritas no
Plano Escolar, assegurada ampla defesa aos acusados;
VI- Encaminhar mensalmente ao Conselho de Escola prestação de contas sobre aplicação
dos recursos financeiros;
VII - Apurar ou fazer apurar irregularidades de que venha a tomar conhecimento no
âmbito da escola, comunicando e prestando informações sobre as mesmas ao Conselho de
Escola;
7
VIII - Assinar, juntamente com o Secretário de Escola, todos os documentos relativos à
vida escolar dos alunos expedidos pela unidade;
IX - Conferir diplomas e certificados de conclusão de curso;
X - Dar exercício a servidores nomeados ou designados para prestar serviços na escola;
XI- Decidir, nos casos de absoluta necessidade de serviço, sobre a impossibilidade de gozo
de férias regulamentares não usufruí das no exercício correspondente, por servidores com
férias não previstas no calendário escolar;
XII- Controlar a frequência diária dos servidores, atestar a frequência mensal, bem como
responder pelas folhas de frequência e pagamento do pessoal;
XIII - Autorizar a retirada do servidor durante o expediente;
XIV-Delegar atribuições, quando se fizer necessário;
8
d) fornecimento de dados, informações e outros indicadores aos órgãos centrais,
respondendo por sua fidedignidade e atualização;
e) comunicação às autoridades competentes e ao Conselho de Escola dos casos de doença
contagiosa e irregularidades graves ocorridas na escola;
f) adoção de medidas de emergência em situações não previstas neste Regimento,
comunicando-as, de imediato, à Delegacia Regional de Educação, ouvindo o Conselho de
Escola, quando possível, ou ao seu “ad referendum”;
VIII - Garantir a circulação e o acesso de toda a informação de interesse à comunidade e
ao conjunto de servidores e educandos da escola;
IX - Coordenar o processo de escolha e atribuição de classes, aulas e turnos;
X - Organizar o horário de trabalho da Equipe Escolar, de acordo com as normas
previstas neste Regimento e legislação pertinente, ouvidos os interessados;
IX - Decidir, junto à Equipe Técnica, sobre recursos interpostos pelos alunos ou seus
responsáveis, relativos à verificação do rendimento escolar, ouvido(s) o(s) professor(es)
envolvido(s).
Art. 33 - A substituição do Diretor de Escola, nos seus eventuais impedimentos legais por
período igual ou inferior a 30 (trinta) dias, será feita automaticamente pelo Assistente de
Diretor e, na ausência e impedimento legal deste, por qualquer educador da unidade,
indicado pelo Diretor, desde que devidamente habilitado, na forma da legislação em vigor.
Parágrafo Único - Nos impedimentos legais por período superior a 30(trinta) dias, o
Conselho de Escola elegerá o Diretor Substituto, obedecidas as exigências legais, de
acordo com o Artigo 14 deste Regimento.