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Violência Conjugal
Violência Conjugal
Moura 215
RESUMO
A violência conjugal é algo histórico que significa ação executada sem cuidado ou uso de força excessiva a
fim de causar danos ao parceiro. Objetivou-se, por meio da correlação e regressão, verificar a relação das
formas de legitimações da violência conjugal com a autoestima, satisfação com a vida e personalidade.
Participaram 305 respondentes da população geral, a maioria do sexo feminino (63%), com idades entre 18
e 62 anos (M = 28,45, DP = 10,65), residentes da Paraíba (88,9%). Foram usadas a Escala de Crenças de
Violência Conjugal, a Escala de Autoestima de Rosenberg, Inventário de Personalidade de Dez Itens e a
Escala de Satisfação com a Vida, analisados no IBM SPSS Statistics 21. Os resultados indicaram a correla-
ção negativa entre os fatores legitimação da violência e autoestima, assim como também com os fatores de
personalidade. E, por fim, a regressão indicou que os fatores pessoais predizem as crenças de legitimação
da violência conjugal.
Palavras-chave: Violência Conjugal; Autoestima; Personalidade; Satisfação com a Vida.
ABSTRACT
Conjugal violence is something historic that means action taken without care or use of excessive force to
cause damage to the partner. The objective is through correlation and regression, verify the relation of
forms of legitimation of violence, with self-esteem, life satisfaction and personality. 305 respondents par-
ticipated in the general population, mostly female (63%) aged between 18 and 62 years (M = 28.45, SD =
10.65), residents of Paraíba (88.9%). We used Beliefs in Couple Violence Scale, Rosenberg Self-Esteem Scale, Ten
Item Personality Inventory and Life Satisfaction Scale, analyzed in IBM SPSS Statistics 21. The results indicated a
negative correlation between the factors legitimizing violence and self-esteem, as well as with personality
factors. And finally, the regression indicated that personal factors predict the beliefs of legitimizing conjugal
violence.
Keywords: Conjugal Violence; Self-Esteem;Personality; Life Satisfaction.
1
Universidade Federal da Paraíba; tamyres.tomaz@hotmail.com
2
Universidade Federal da Paraíba; Carlosepimentel@bol.com.br
3
Universidade Estadual do Vale do Acaraú; giovannabarroca@gmail.com
ach, 1981; Mendes & Claúdio, 2010). Segundo que inocenta o agente agressor, aceitando que ele
os estudos de Warburton e Anderson (2015), na não teve a intenção de causar danos graves (Cari-
maioria dos casos, a fonte de disseminação de tais dade & Machado, 2006; Félix, 2012).
crenças é a própria família. As causas externas e fora do controle emo-
As crenças fortalecidas por uma popula- cional, como o desemprego, o consumo de álcool
ção violenta podem levar o indivíduo a comporta- e outras drogas, também podem desencadear atos
mentos violentos e agressivos (Anderson & Bush- violentos pela sua ação desinibidora (uso de subs-
man, 2002; Warburton & Anderson, 2015). Nesse tâncias) (Caridade & Machado, 2006; Day et al,
sentido, as crenças fundadas nos papéis de gêne- 2003; Félix, 2012; Hamberger & Hastings, 1986).
ro, no conservadorismo sexual e na tolerância e O uso dessas substâncias facilita a agressão (por
aceitação da violência interpessoal fazem com que exemplo, provocação, frustração, sinais agressivos)
mulheres cedam às pressões dos seus companhei- (Warburton & Anderson, 2015) de tal modo que a
ros, devido à concepção subordinada (Caridade & violência passa a ser justificável para a sociedade,
Machado, 2006; Félix, 2012; Nascimento, 2015; atribuindo a culpa nos estímulos externos (Félix,
Worden & Carlson, 2005). 2012; Hamberger & Hastings, 1986).
Essas crenças também contribuem para Além disso, vários pesquisadores (Carida-
legitimar a violência, aceitando que o comporta- de & Machado, 2006; Lynch & Graham-Bermann,
mento da vítima foi a causa da agressão, ou seja, 2000; Warburton & Anderson, 2015) destacam
culpa-se a própria vítima por descumprimento dos de- que a autoestima também contribui para uma pre-
veres (Félix, 2012; Warburton & Anderson, 2015). disposição para agredir, assim como se submeter
Como exemplo para ações embasadas nessa cren- a um relacionamento abusivo. Warburton e An-
ça, o comportamento adúltero pode ser utilizado derson (2015) destacam que parceiras de homens
como justificativa para reações violentas (Caridade agressivos têm menor autoestima. Essa submissão
& Machado, 2006; Félix, 2012). ao parceiro agressor tem contribuído para a dete-
No entanto, essas crenças podem ser se- rioração da qualidade de vida (Vianna, Bomfim &
xistas, já que várias pesquisas (Anderson & Bush- Chicone, 2006).
man, 2002; Caridade & Machado, 2006; Day, et Autoestima e violência conjugal
al. 2003; Félix, 2012; Worden & Carlson, 2005) A avaliação pessoal das vítimas de vio-
mostram que o sexo feminino possui maior pro- lência tem maior inclinação a uma autopercepção
babilidade de ser a vítima. Além disso, quanto mais desvalorizada, falta de esperança e sentimento de
idade a mulher possuir, mais vulnerável se torna impotência, fazendo com que elas se posicionem
e, consequentemente, tem níveis mais elevados como pessoas sem poder e direitos, além de apre-
de medo da violência (Pimentel, Gunther & Bla- sentar problemas no desenvolvimento da intimi-
ck, 2012). Enquanto o sexo masculino apresen- dade e sexualidade (Caridade & Machado, 2006;
ta maior concordância e predisposição ao uso da Félix, 2012; Lynch & Graham-Bermann, 2000).
violência, sendo também agente violentador, com Baumeister, Boden e Smart (1996) e Egan
consequências mais graves (Anderson & Bush- (2009) ressaltam que os estudos mais tradicionais,
man, 2002; Day et al,. 2003; Félix, 2012; Waiselfisz, nas ciências sociais e psicológicas, em relação à
2015; Warburton & Anderson , 2015; Worden & autoestima direcionam a baixa autoestima e senti-
Carlson, 2005). mentos de inadequação ou frustação como carac-
Caridade e Machado (2006) têm outra terísticas proeminentes da maioria dos agressores.
visão em seus estudos, afirmando que as trocas Ou seja, a autoestima apresenta caráter dual, que é
mútuas de violência entre homens e mulheres tor- aversivo para todos os indivíduos, pois contribui
nam a violência banalizada. Até mesmo quando significativamente na violência (Baumeister et al.,
a intimidação do parceiro, mostrada por meio do 1996).
ciúme, representa uma demonstração de cuidado e A autoestima está ligada à integralida-
amor, tal fato também contribui para a banalização de de sentimentos e pensamentos do indivíduo,
tel et al., 2014), também é um fator presente nas 2005). Entretanto, quando as vítimas conseguem
relações de violência, em que se relaciona tanto abandonar a relação conjugal, entram em um pro-
de forma positiva quanto negativa (Barlett & An- cesso de quebra familiar, culpa, racionalização da
derson, 2012), o que torna difícil diferenciar em situação e, nesste período, é comum muitas vezes
qual dos polos a agressão poderá ser engatilhada. o abandono e o retorno ao relacionamento, até
Ademais, a abertura a experiências guarda relação um dia quebrar esse vínculo emocional (Day et al.,
direta com a agressão física (Barllet & Anderson, 2003; Worden & Carlson, 2005; Felix, 2012). É
2012), já que diz respeito tanto a flexibilidades de nesse período que os indivíduos pautam seus inte-
pensamentos abertos a novas experiências quanto resses na busca pela autonomia (Ham-Rowbottom
(no polo oposto) à tradição, algo já definido (Pi- et al., 2005).
mentel et al., 2014). Essas características aparecem As vítimas, quando afastadas do parceiro
como último traço em vítimas de violência, tendo agressor, conseguem estar satisfeitas com trabalho,
em vista que quanto mais o indivíduo estiver ten- saúde ou família, potencializando o bem-estar psi-
dendo ao polo tradicional, mais difícil será ele sair cológico e a autonomia (Ham-Rowbottom et al.,
de uma relação abusiva (Pinto, Varela & Vinhal, 2005). Esse bem-estar subjetivo é constituído de
2012). Isso se torna um ciclo vicioso, no qual não afetos positivos (prazer), negativos (desprazer) e
se quebra a aliança conjugal para sair da relação também emocionais, representados pelos julga-
abusiva e, também, não se está satisfeito com a mentos cognitivos (são os aspectos racionais ou
continuação dessa relação (Day et al., 2003). Se- intelectuais da satisfação com a vida) (Gouveia et
gundo Félix (2012), as vítimas apresentam baixa al., 2005).
qualidade de vida e redução do bem-estar, além de
apresentarem desmotivação para a mudança. Ou Método
seja, a personalidade também é um fator relaciona- Participantes
do com o bem-estar do indivíduo, em que quanto A amostra foi composta por 305 parti-
mais se avalia os eventos de forma positiva, maior cipantes da população geral, sendo a maioria do
a satisfação com a vida (Woyciekoski, Natividade sexo feminino (63%), com idades entre 18 a 62
& Hutz, 2014). anos (M =28,45, DP =10,65), residentes na Paraíba
(88,9%), concentrando-se na cidade de João Pessoa
Satisfação com a vida e a violência conjugal (64,6%), que se autodeclararam brancos (44,9%),
Esse julgamento da satisfação com a vida solteiros (72,8%), heterossexuais (86,6%), com
dependerá dos diferentes domínios específicos da ensino superior incompleto (58,4%) e renda entre
vida do indivíduo, levando em consideração in- 1 e 3 salários mínimos (38%). A maioria afirma
teresses e valores (Gouveia, Barbosa, Andrade & estar em um relacionamento amoroso (68,89%),
Carneiro, 2005). O processo de avaliação dos com- não sendo vítimas de violência (88,8%), sem his-
ponentes cognitivos baseia-se em um conjunto de tórico familiar de violência conjugal (50,5%) e sem
critérios próprios que busca entender a satisfação quaisquer denúncias de violência conjugal dos
a partir da situação experienciada (Diener, Em- companheiros(as) (97%).
mons, Larsen & Griffin, 1985).
É durante essa fase de avaliação que uma Instrumento
resposta imediata é produzida, ativando um gatilho A Escala de Crenças de Violência Conju-
situacional baseado na influência das cognições e gal (ECVC), validada por Félix (2012), composta
sentimentos (Warbuton & Anderson, 2015). Após por 15 itens e 3 fatores, descritos: Legitimação e
toda essa avaliação cognitiva da situação, as víti- Banalização da Pequena Violência (α = 0,86) (por
mas de violência conjugal que tentam sair do meio exemplo: “Dar uma bofetada a/ao parceiro quan-
enfrentam muitos desafios diante dos recursos do se está aborrecido ou irritado é normal, é uma
limitados e das condições estruturais e psicológi- coisa sem gravidade”); Legitimação da Violência
cas (Ham-Rowbottom, Gordon, Jarvis & Novaco, por Descumprimento dos Deveres/Expectativas
O fator de legitimação e banalização da pequena fação com a vida e autoestima) mostraram uma
violência apresentou o maior grau de discordân- concordância de acordo com as médias expostas
cia, com média =1,60 e desvio padrão = 0,83. A na Tabela 3.
legitimação da violência por descumprimento dos Em seguida, foi verificada a correlação
deveres/expectativas do(a) parceiro(a) apresentou (unicaudal) entre os fatores de crenças de legitima-
média =1,78 e desvio padrão = 0,81. No caso da ção da violência conjugal com a autoestima, satisfa-
legitimação da violência por causas externas, foi ção com a vida e com os fatores de personalidade,
obtida a média de 1,98 e desvio padrão de 0,89. com toda a amostra, visando a conhecer as relações
Ademais, os outros fatores (personalidade, satis- entre esses construtos, descritos na Tabela 2.
Tabela 2. Correlações entre os fatores de legitimação da violência (banalização, descumprimento com os deveres e causas
externas), satisfação com a vida, autoestima e os fatores de personalidade (extroversão, agradabilidade, conscienciosidade, esta-
bilidade emocional e abertura a experiências).
Força e direção da correlação
1.Banalização
2.Descumprimento 0,78**
3.Causas externas 0,58** 0,64**
4.Satisfação com a vida -0,07 0,00 -0,04
5. Autoestima -0,12 *
-0,15**
-0,18** -0,24**
6. Extroversão 0,05 0,02 0,02 0,17** -0,05
7. Agradabilidade -0,09 *
0,07 0,06 0,18 **
-0,02 0,17**
8.Conscienciosidade -0,08 0,06 0,01 0,32** -0,09* 0,05 0,21**
9.Estabilidade emocional -0,14** -0,01 0,01 0,17** -0,05 -0,04 0,40** 0,29**
10. Abertura a experiências -0,16** -0,06 -0,10* 0,27** 0,03 0,23** 0,27** 0,30** 0,21**
1 2 3 4 5 6 7 8 9
** p < 0,01; * p < 0,05
Identificou-se que a autoestima foi cor- pectativas do(a) parceiro(a) e a legitimação da vio-
relacionada negativamente com todos os fatores lência pela sua atribuição a causas externas obtive-
das crenças de legitimação da violência. Tam- ram, consequentemente (r = -0,12; p < 0,05), (r =
bém foi verificado que a legitimação e banali- -0,13; p < 0,01) e (r = -0,16; p < 0,01), magnitudes
zação da pequena violência, a legitimação da fracas, porém estatisticamente significativas. Isso
violência por descumprimento dos deveres/ex- significa dizer que quanto mais se aumenta a auto-
estima, menor é a concordância com os fatores de a legitimação da violência pela sua atribuição
crença de legitimação da violência. a causas externas (r = -0,10; p < 0,05). Neste
Nesse sentido, também foi encontrado fator, verificam-se pessoas com flexibilidades
que os fatores das crenças de legitimação da vio- de pensamentos com menor tendência a acei-
lência foram negativamente correlacionados com tar que a violência seja causada pelos estímulos
os fatores de personalidade. Especificamente, externos. No entanto, os fatores das crenças de
identificou-se que o fator legitimação e banalização legitimação da violência não foram correlacio-
da pequena violência relacionou-se com a estabili- nados com a satisfação com a vida, ou seja, não
dade emocional (r = -0,14; p < 0,01), a abertura a apresentaram estatisticamente critérios de signi-
experiências (r = -0,16; p < 0,01) e a agradabilidade ficância (p > 0,05).
(r = -0,09; p < 0,05). Quanto mais se aceita que a Em seguida, buscou-se averiguar a exis-
violência é algo “natural” e de trocas mútuas entre tência de correlações (unicaudais) entre os fato-
os casais, menos se tem pessoas com traços mais res das crenças de legitimação da violência com
acentuados nos polos de estáveis emocionalmente, autoestima, satisfação com a vida e com os fato-
flexíveis e agradáveis, respectivamente. res de personalidade, utilizando apenas a amos-
Além disso, foi verificado que abertura tra específica de pessoas que sofreram violência
a experiências também se correlacionou com conjugal. Ver Tabela 3.
Tabela 3. Correlações entre os fatores de legitimação da violência (banalização, descumprimento com os deveres e causas
externas), satisfação com a vida, autoestima e os fatores de personalidade (extroversão, agradabilidade, conscienciosidade, esta-
bilidade emocional e abertura a experiências, com a população específica.
Força e direção da correlação
1.Banalização
2.Descumprimento 0,78**
3.Causas externas 0,49** 0,61**
4.Satisfação com a vida -0,05 -0,17 0,05
5.Autoestima -0,37 *
-0,34 *
-0,19 -0,14
6.Extroversão 0,05 0,16 0,01 -0,08 0,13
7.Agradabilidade -0,10 -0,17 0,20 -0,13 -0,14 0,21
8.Conscienciosidade -0,09 -0,2 0,33 *
-0,24 0,23 -0,09 -0,27
9.Estabilidade emocional -0,15 -0,26 -0,14 0,05 0,22 -0,38 **
-0,28 0,39**
10.Abertura a
experiências -0,46** -0,34** -0,04 0,22 -0,28** -0,33** -0,35* 0,33** 0,20
1 2 3 4 5 6 7 8 9
** p < 0,01; * p < 0,05
Logo na primeira análise, usou-se a auto- lidade obtendo, nestas análises, valores significa-
estima como variável dependente (VD) e os fato- tivos, como se pode observar na Tabela 4. Com
res das crenças de legitimação da violência (bana- isso, a legitimação e a banalização da pequena vio-
lização, descumprimento com os deveres e causas lência são explicados pela autoestima (β=-0, 12),
externas e os fatores de personalidades) como va- abertura a experiências (β = - 0,13) e estabilidade
riáveis independentes (VIs), mas não foi verificada emocional (������������������������������������
����������������������������������
=- 0, 11). Todos obedeceram o cri-
nenhuma relação estatisticamente significativa. Na tério de marginalmente significativos a nível de p
segunda análise, definiu-se a personalidade e os fa- < 0,07. Esses fatores explicam conjuntamente 5%
tores de violência predizendo a autoestima, o que (R² ajustado) a variância total.
também não apresentou significância. A legitimação da violência por descum-
Na terceira análise, os fatores das crenças primento dos deveres/expectativas do(a) parceiro
de legitimação da violência foram caracterizados (a) explicou apenas 2% (R² ajustado) da variância
como variáveis dependentes e como variáveis pre- total, pela autoestima (β = - 0,15), a nível de p <
ditoras, com a autoestima e os fatores de persona- 0,07, ou seja, apenas a autoestima prediz este fator
Também foi visto que a abertura à ex- preditor ou gatilho para o comportamento agressivo.
periência foi correlacionada negativamente com Por outro lado, a estrutura da personalidade ou a au-
legitimação e banalização da pequena violência e toestima sozinhas não exercem tal função de agente
a legitimação da violência por descumprimento regulador da agressão, mas, associadas a outros es-
dos deveres/expectativas do(a) parceiro(a), nas tímulos situacionais e ambientais, exercerão papel
duas populações, sendo que com magnitude mais fundamental para uma predisposição para agredir
acentuada (moderada) em vítimas de violência. (Gleason, Jensen-Campbell, & Richardson, 2004;
Esses achados corroboram Pinto, Varela e Vinhal, Warburton & Anderson, 2015).
(2012), reafirmando que as vítimas de violência
que têm mais tendência ao polo tradicional ten- Considerações finais
dem a permanecer mais em um relacionamento É sabido que existem muitos dados a res-
com violência (Pinto, Varela & Vinhal, 2012). peito da violência doméstica na literatura global
Não obstante, esses resultados são coeren- e também são realizadas diversas campanhas em
tes com os achados de Barllet e Anderson (2012), prol da defesa da saúde e do bem-estar das vítimas
explicando que esse fator prediz a agressão, inde- de violência, que em sua maioria são mulheres.
pendentemente de ter sofrido a agressão ou não, Entretanto, há escassez de estudos na literatura
pois a abertura a experiências é relacionada, de brasileira sobre a satisfação com a vida e a vio-
forma indireta e direta, com a violência, sendo que lência conjugal, bem como colaborações de víti-
esse fator é também considerado um perpetuador mas de violência nesse processo de identificação
da violência conjugal, tanto para homens quanto de aspectos que colaboram para a prevenção da
para mulheres (Ulloa, Hammett, O’Neal, Lydston violência conjugal.
& Aramburo, 2016). A pesquisa, neste sentido, ratificou o GAM
Ademais, a agradabilidade é correlacionada (Anderson & Bushman, 2002; Warburton & Ander-
de maneira negativa com a legitimação e banalização son, 2015), demonstrando que os fatores pessoais
da pequena violência. Indivíduos mais agradáveis (autoestima e personalidade) têm relação e predi-
podem ser menos propensos a agredir seus pares ção com a legitimação das crenças sobre a violên-
(Jensen-Campbell & Richardson, 2004; Pimentel et cia. Contudo, a rota ou trajetória interna (satisfação
al., 2014), ou seja, quanto mais agradáveis, menos com a vida) não demonstrou relacionamento, o que
se propaga essa crença de que é necessário usar da precisa ser verificado em estudo posterior.
violência para se obter o objetivo esperado entre os De fato, não se mediu a violência direta-
cônjuges. No entanto, esse fator não demonstrou mente no presente estudo e, sim, as crenças de legiti-
predição nos achados do presente estudo, como a mação. Outros estudos nesse sentido são importan-
literatura explana (Barllet & Anderson, 2012; Glea- tes para suprir as limitações deste. Seria importante
son, Jensen-Campbell & Richardson, 2004). que este estudo fosse replicado em outras regiões do
Além disso, a conscienciosidade está cor- Brasil. Deste modo, poder-se-ia melhor entender as
relacionada positivamente com o fator legitimação relações verificadas e, consequentemente, melhor
da violência atribuição a causas externas, nas amos- prevenir a violência entre parceiros íntimos.
tras específicas, sendo congruente com estudo de
Pinto,Varela e Vinhal (2012), em que há maior predo- Referências
minância desse fator em vítimas de violência. Entre-
tanto, foi oposto aos resultados de Barllet e Ander- Anderson, C. A. & Bushman, B. J. (2002). Human
son (2012), que mostram uma correlação negativa aggression. Annual Review of Psychology, 53(1), 27-
relacionada com atitudes em relação à violência. 51.
Essas correlações encontradas neste estudo,
embasadas em outros pesquisadores, sinalizam o que Barlett, C. P. & Anderson, C. A. (2012). Direct and
Anderson e Bushman (2002) mostram, afirmando indirect relations between the big 5 personality
que a personalidade e a autoestima funcionam como traits and aggressive behavior. Personality and Indi-
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