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não sobre seu valor de representação~ Com base nesses estu.

'dos, passou-se a considerar a execuçao de uma ação O Ponto


nevráloico
t,
de toda performa •
nce, que se estrutura , .
com 6ase
em um fazer e não no ato de rep~esentar. Sem du~1da, as ope-
rações performativas de produçao e transformaçao cênica d
' . l d e
situações são as maiores resp~nsave1s pe o esvio paulatino
-- das exigências da represen~açao enquanto ~rocesso _centrado
na ilusão e no traçado ficc10nal, em proveito da açao cênic
[ real e do acontecimento instantâ neo e não repetível. Esse des~
vio determina outro tipo de ender~ amento ao receptor, trans-
fi do (5 ã élo u ramente :specula em@coraj a ~
i.2~er~c~eE.çiõ~e~s~s~e~
ns~o~r~ia~1~:.::º::.:r...:.m
:.:.:.:
e1:.:o_:d::.:o~m~e.:.ra.u=:l~h:;:o~e::....m~e~elj_ências
imersivas próprias às novas tecnolo~ias. Segundo Féral, ess;-
°rrrutação cênica define uma ruptura epistemológica de tal or-
dem que é necessário adotar a expressão _teatr.g_p~format ~
para qualificá-la.

TEATROS PERFORMATIVOS

Féral enumera uma série de grupos e criadores que assumem


as práticas diversificadas do teatro performativo, entre os
quais inclui Jan Lauwers, Gilles Maheu, Robert Lepage, Guy
Cassiers, Heiner Goebbels, Frank Castorf, Marianne Weems,
o Wooster ·Group e a Societas Raffaello Sanzio.
No caso da cena brasileira, os espetáculos do Teatro da
Vertigem constituem um campo fértil de produção dessa tea-
tralidade performativa. Não apenas porque o grupo escolhe
espaços não convencionais para suas apresentações, mas es-
pecialmente porque desenvolve sua teatralidade com base na
ocupação desses lugares a partir de vetores de movimento e
de corporeidade dos atores. Valendo-se de recursos dª_Qer- _
fo rmance, do cinema e da ar uitetura cria dramaturgias mar-
.. cadas 2-or um poderas ibridi~<2)le g~ ~ j e tadq_p_or__,,
absoluta necessidade dos espaços e da turbulência temática,
· associaqa~ que_stões candentes-da atualidade brasileira.
- A natureza dos espãçospuóliê:õs es-colhidos para as apre-
sentações, com carga simbólica e política explícita - uma igreja
para Paraíso Perdido, um hospital para O Livro de ]ó (1995), um
TEATR A LID ADES CONTE MPO RANEAS 127

presídi o para Apocalipse 1, 11 (2000), as margens e o leito de


um ri o para BR-3 (2006) - e a agressiva ocupação desses luga-
res, nos desvãos mais íntimos e nas dimensões m ais perigosas,
com m arcações de movimentos expandidos em largura, pro -
fun d idad e e altura, e um desem penho gu e agride o espectador
pela violenta exposição COlJ)__o ral do ator, mantido nos limites de
1~ ência _f!s ica e psíqu ica, d-ão aos espetácÜlos a contu ndê ncia
Teêventos de r isco, de fo rmalização instável, quase fluxos pro- -
cessuais de performatividade, inacabados e atualizados a p a ~
Oõs vetores referidos, de ocupação espacial e fisicalidade.
-~ par disso, ainda que a defi nição da escritura cên ica de
Araújo aco n teça a posteriori, e fun cione como u m a espécie de'
ed ição das contribuições individu ais, é indisfarçável sua marca
fort e no transbo rd am ento b arroco da cena, excessiva na m o-
vim entação ascen dente, em espiral, n a composição distorcida
das fi gu ras/pe rsonagens, paradoxalmente infiltradas de reali-
dad e e alegoria, no resgate da ex12ressividade integral dos cor-
~ ten d idos até o limite, e _Qotencializados no 112.ovimeni:;
~ o acele rado e convulso, uma espécie de coralidad·e ci-
nética q ue arrasta o espectador e o envolve no desconforto d e
UITicor po a corpo real.- Talvez a teatralidade do Vertigem se
deva, em parte, à habilidade d e compor essas traj etórias físicas
e metafóricas, que desestabilizam o espectador.
Um bom exemplo é Apocalipse 1, 11, trabalh o qu e associa
a situação brasileira d e violência e exclusão social a um imagi-
nári o apocalíptico, especialme nte o do livro bíblico de João. O
espetáculo oscilava ent re a apresentação de figuras alegóricas,
com o Talidomida d o Brasil e o Anjo Poderoso, e a exibição de
cen as de uma brutalidade desconcertante, que à prim eira vista
parec iam mais um recurso de reprodução d o real. No entan-
to, u m observador atento percebia uma alteração de estat uto
nessas breves interve nções d e realidade. Pois a impressão que
se tin ha era que os criadores procurava~ a r frag_m ~
.~ e real ao Jecido teatr,al que s~ apresen t~
A sofrida experiência d o elenco e a exposição de sua in-
timidade em estados extremos, em q ue os corpos pareciam
m anifestar 't..esfudo ae guerra urba11Õ;)funcionava como frag-
m ento do horror da vida pública brasileira das últimas d éca -
das. Era como se a violên cia dessa teatralidade espetacular, às
,...
12~ TEAT RALIDAOES CONTEMPORANEAs

vezes próxima do monstruoso, abrisse frest


.d as Par .
Ção de sintomas dessa rea l1 ade. O que defi . ª a Infilt
n1a O ra.
da experiência com alguns dos processos ma. . Parente
is radica. sco
formance contemporanea, pelo enfrentainent d Is da Pe
A

,. . o os 1·1 . r.
resistência fisICa e emoc10nal dos atores pela 1111tes d
_ ,. . . , respost e
va às questoes pohtICas e soc1a1s da atualidade br . ª. agressj.
ecialmente, pe1a d1·1 mçao
. - do estatuto ficcion as1le1ra
. 1 Era e 'de, es.
a.
que nesses momentos de mtensa fisicalidade e a t vi ente
u oexp 1•
~, a representação entrava em colapso, interceptada
W 1 tos reais . de energia
• desses vanos, . SUJeitos.
.
°~
Çào,
pe1os circ Ut-.
É inevitável especular sobre a possível diluição d
O st
to da representação nessa situação de turbulência e ~tu.
express1v
P01s parece claro que um teatro de v1vencias e situaç ~ , ª·
• • A

- oes publi-
cas nao pretende apenas representar alguma coisa que nã
teja ali. A impressão que se tem é de uma tentativa de esc~ es-
.._do território específico da reprodução da realidade par~;-
. a anexação dela, ou melhor, ensaiar sua presentação,
vel sem mediações. Nesse movimento, o que parece evidente
é a dificuldade de dar forma estética a uma realidade traumá-
tica, a um estado público que está além das possibilidades de
representação, e por isso entra em cena como resíduo, como
presença performativa na teatralidade, indicando algo que
Eão pode ser totalmente recuperado pela simbolização.
De certa forma, faz parte do mesmo processo o último tra-
balho do Teatro da Vertigem, BR-3, apresentado no rio Tietê,
em São Paulo. O primeiro objetivo do projeto foi investigar
possíveis identidades brasileiras com base na pesquisa e@
@?nos de exce ã-...__ m que a ideia de brasilidade fosse posta
em xeque. Brasilândia, bairro da periferia de São Paulo, Bra-
sília, a capital do país, e Brasileia, localizada na fronteira do
Acre com a Bolívia, a despeito de apresentar~
dical de nacionalidade, "BR': são locais de(identidade msta~: -
em que a ideia de rertencimento nacion~ o__s.e suste~tª· :
me1u1u
A partir de exaustiva pesquisa de camp~, que ·nten-
uma viagem de quatro mil quilômetros pelo pais, e um 1 do
so processo de workshops do elenco, o dramaturgo Bernar 's ge-
c.
Carvalho propôs um roteiro em que a saga 1am1 ia~- ~ l de tre )
rações entrelaçava os lugares inventariados em un~ dro por
,.,.-; --- - - : - --. -~ niza
@ ~~~~~~s,~ ~oraf~ act_~~-e g~ogx~~~ protago
TEATRALIDADES CONTEMPO RÃNEAS 129

Jonas, sua mãe e seus filhos. O texto parte da construção de


Brasília, em 1959, passa pelas décadas de 1980 e 1990 em Bra-
silândia, chega a Brasileia no início do século xx, e retorna a
Brasília para fechar o ciclo de busca do pai ausente, associado
à procura frustrada da identidade.
Essa trama de lugares compõe uma ~maturnia ex12an-
dida pela estratégia de proliferação de cenas, personagens e
a~ em(vári~ , com ramificações semelhantes aos
afluentes do rio em que se abriga. No leito e nas margens do
Tietê, o encenador Antonio Araújo, auxiliado por edição de
]uz e amplificação sonora de sons e vozes dos atores, recorta
enquadramentos cinematográficos na tentativa de concentrar
assentido~ dispersos do espectador, exposto ao odor do rio _
pÕ!uído, a~ ânsito ruidoso das marginais e às ilhu~~JDi-_
metrópole paulistana. - - --
Teatralidade e perlÕm-iãtividade encontram-se nesse es-
paço movediço e instável em que Araújo cria uma espécie
dr l J I ~ Brasília associada ao monumental e aos via-
dutos, Brasilândia abrigada sob as pontes e Brasileia disper-
sa nas margens são es_eaços heterodoxos,(!Qíçados a conviver, ·
no mesmo leito-estrada, e absolu~e outros em relação às
oaa3es reãis a que-se referem e g_~ . Filtrados pelo
o1fiar Coletivo e deformados por essa modalidade contempo-
rânea de teatralidade, performativa e fragmentária, tornam-se
lugares de "desvio': irreconhecíveis em sua identidade origi-
3 mas propostos ao espectador como uma expenenciãrã=-f)
dica! de mergulho e reconhecimento de sua cidade e seu_2,aís.

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