Professional Documents
Culture Documents
Luiz Pacheco, Leitor de José Cardoso Pires o Antimarialvismo Libertino
Luiz Pacheco, Leitor de José Cardoso Pires o Antimarialvismo Libertino
Rui Sousa
Edição electrónica
URL: https://journals.openedition.org/atlante/18985
DOI: 10.4000/atlante.18985
ISSN: 2426-394X
Editora
Université de Lille – Laboratoire CECILLE ULR 4074
Refêrencia eletrónica
Rui Sousa, «Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino», Atlante [Online],
16 | 2022, posto online no dia 01 dezembro 2022, consultado o 28 março 2023. URL: http://
journals.openedition.org/atlante/18985 ; DOI: https://doi.org/10.4000/atlante.18985
Rui Sousa
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 2
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 3
necessária para a transformação dos valores sociais, acabou também por ceder, não
deixando espaço para procedimentos alternativos. O percurso histórico da cultura
portuguesa seguiu um rumo excêntrico, permanecendo, em pleno século XX, sujeito a
atitudes mentais demasiado alinhadas com os interesses das classes dominantes. É essa
a ameaça potencial que se identifica nos representantes de uma outra visão, contrária
ao predomínio de hábitos ancestrais que colocam o trabalho braçal no centro de toda a
vida de uma comunidade.
Cardoso Pires parte do essencial desta dicotomia para identificar os marginalizados
homens de espírito com a categoria do libertino, exemplo maior de um desejo de
emancipação face ao cenário generalizado de escravatura cultural. Deste modo, a
amplitude intelectual atribuída por Bacelar à camada minoritária da população
portuguesa é, em Cardoso Pires, num contexto no qual a ditadura salazarista agravara o
peso da tradição marialva, um sintoma de desejo indomável de liberdade.
Representando um ambiente pleno de abjeção, a vivência quotidiana dos portugueses
subjugados pela ideologia marialva aponta para um triunfo extemporâneo de valores
medievais e, com eles, de uma uniforme aversão ao exercício autónomo dos prazeres
corporais e à liberdade do pensamento. Por contraste, o olhar libertino corresponde a
uma espécie de atualização crítica, cuja pertinência passa por interromper o jugo de
uma única perceção da História, ultrapassada se comparada com os pontos de vista
privilegiados no resto das sociedades europeias7. Nesta medida, além de designar uma
forma específica de o indivíduo gerir a sua existência particular, sobretudo no que à
interação entre sexos respeita, a libertinagem aponta para uma questão muito mais
abrangente, proporcionando as condições adequadas ao debate em torno das diferentes
formas de conceber a natureza humana e o exercício da liberdade individual e coletiva.
Estamos num quadro em que o ponto de vista libertino se assume como o mais moderno
e ativo mecanismo de desenvolvimento intelectual de um povo, dado que proporciona
as condições necessárias a uma desconstrução gradual das grandes mitologias
instaladas, forçando a erosão da suposição de uniformidade privilegiada por uma
sociedade estagnada e segura da validade eterna dos seus valores. A ação libertina,
impondo a presença do indivíduo concreto e do seu recurso a ângulos de observação
singulares, introduz a perceção da historicidade dos códigos culturais de uma
determinada comunidade e o desejo de abertura a outros pontos de vista,
potencialmente relevantes para o combate político.
Cardoso Pires exprime o problema do seguinte modo:
A formação libertina, formação liberal, apenas pode ter hoje actualidade na medida
em que a inactualidade da ordem provinciana continua instalada no nosso século,
mesmo que submetida a adaptações de recurso. Aqui, nesta ponta da Europa, as
actualizações de superfície a que o Portugal Velho se viu forçado pouco ou nada
perturbaram as estruturas mentais e sociais dos dirigentes, porque o País não
dispunha de um corpo de Pensamento que lhe desse unidade. Subdoutrina, sim,
tinha. Decalcada da Carta del Lavoro de Mussolini e das teses da Action Française, a
ideologia do Estado Novo (de Salazar) era breviário passadista redigido ao gosto
autocrático8.
Em virtude disso, segundo Cardoso Pires, a presença da libertinagem na cultura
portuguesa encontrava-se confinada aos momentos em que se seguiu a via de uma
“moral das Explorações”, a mesma que torna perfeitamente compreensível a densidade
amoral de Fernão Mendes Pinto e, em termos europeus, a de um dos seus assinaláveis
irmãos de espírito: o ambíguo explorador dos limites do ser humano que foi Giacomo
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 4
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 5
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 6
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 7
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 8
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 9
ter sido um libertino do interior, isto é, um libertino que, português, se deixou ficar
por cá. Resultado: não foi queimado em efígie, mas morreu aos quarenta (que é m/
conta, ai Jasus!) enquanto os outros atingiam provectas idades… 21
Como esta carta deixa ver, o seu prefácio não era exatamente um enaltecimento de
Sade, mas uma forma de se intrometer no debate votado ao antilibertinismo lusitano,
inaugurado pela obra de Pires e que poderia ser potenciada22. Ao acentuar a ausência de
Sade nas considerações de Cardoso Pires, em função da preferência por Laclos – e, neste
prefácio, Pacheco não deixa de evidenciar que se sente também mais próximo do perfil
de Valmont, em termos de conduta pessoal –, Pacheco preocupa-se não exatamente
com uma aproximação efetiva à via sadeana mas com a necessidade de o tema ser
discutido em todas as suas facetas. É a pluralidade da tradição libertina, e as diferentes
escalas da sua relação com os saberes estabelecidos, que se afirma como foco da
discussão.
Sade constitui, deste modo, um pretexto não apenas para expor o essencial das suas
leituras do libertino, em diálogo com a obra de José Cardoso Pires, mas também para
exprimir a complexidade da controvérsia suscitada pelo problema da dissidência
libertina, sobretudo quando exacerbada e conduzida a extremos quase inconcebíveis.
Precisamente por isso, o seu caso teria sempre de constar num estudo votado a
descrever e a contestar os esteios fundamentais da ideologia marialva, na medida em
que a sua ação intelectual corresponde a uma demonstração dos focos de iluminação e
de sombra resultantes do ambiente das Luzes.
Pacheco não ignora que A Filosofia na Alcova tem uma forte componente de transgressão
sexual, ocupando-se da descrição de um modelo educativo divergente, que tem na
intelectualização da lógica subjacente ao desejo totalmente desprovido de limites e na
consequente exploração desabrida das práticas sexuais um dos seus esteios. A
sexualidade feroz desenvolvida por Sade em atos e sobretudo através de incontáveis
exercícios de elaboração literária constitui uma faceta nobre e indispensável de um
projeto muito mais amplo, adequado à exploração dos modos pelos quais o indivíduo
interroga o seu acesso ao conhecimento, o organiza discursivamente e o transmite no
diálogo com outros corpos e sobretudo outros produtores de discurso.
Neste aspeto, Pacheco coincide com Cardoso Pires na crítica aos arquétipos de Don Juan
e do homme à femmes, considerados por ambos deturpações de uma sexualidade
emancipada e, por isso mesmo, totalmente distinta das preocupações libertinas. Assim,
se para Cardoso Pires os perfis libertino, donjuanesco e devasso espelham “três figuras
independentes, três comportamentos e, evidentemente, três morais diferenciadas” 23,
para Pacheco também é em função da divergência face à mera devassidão sexual que se
conquista a ética singular do libertino24. Para um verdadeiro libertino, a vivência
curiosa da sexualidade nunca corresponde a uma entrega gratuita ao mecânico
usufruto dos corpos alheios, desprovidos de identidade e, portanto, de desafio. Está em
causa, portanto, uma dimensão do erotismo que converte o encontro sexual num
diálogo com o outro, em vista do qual o acesso ao prazer é também uma conquista
gradual de conhecimento. É nesse ponto, de resto, que Pacheco mais se distancia de
Sade. Ao propor no encontro com o outro, através do exercício cúmplice das potências
físicas, o acesso a algo mais, Pacheco também recusa validar o jogo erótico como fonte
de agressão ou de rebaixamento daqueles com os quais se cruza.
Em Don Juan, no homme à femmes ou no pinga amor, criticados por Cardoso Pires e por
Pacheco, o problema reside sobretudo no facto de encararem a prática sexual como
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 10
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 11
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 12
de acordo com este filósofo, seria para que, à medida que a apologia da liberdade se
consolida, fosse também aberto o caminho para a diluição de saberes coletivos
indispensáveis à manutenção da ordem comunitária e para a consequente queda da
noção de Verdade:
During the three hundred years since the Enlightenment, we have made life difficult
for ourselves precisely in the domains of knowledge and truth. Having to a large
extent dismissed any faith in revealed or absolute knowledge, how can we distinguish
the true from the untrue? And while we seek empirical or pragmatic means to do so,
another question, both larger and more precise, looms before us. Can we decide if
there are any forms of knowledge, true or untrue, that for some reason we should not
know?31
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 13
NOTAS
1. Esta publicação foi financiada por fundos nacionais através da FCT – Fundação para a Ciência e
a Tecnologia, I. P., no âmbito do Projeto UIDP/00077/2020.
2. Para uma apresentação pormenorizada da polémica envolvendo as edições da chancela de
Ribeiro de Mello, a Afrodite, veja-se: Pedro Piedade MARQUES, Editor Contra. Fernando Ribeiro de
Mello e a Afrodite, Lisboa, Montag, 2015. Tendo em conta o assunto de que este texto se ocupa,
veja-se a contextualização da presença de Sade em Portugal, na qual se dá conta da quase
inexistência de receção da obra do autor até à edição de Diálogo Entre um Padre e Um Moribundo
preparada por Luiz Pacheco em 1959 e se comenta amplamente toda a polémica relacionada com
a edição de A Filosofia na Alcova (Aníbal FERNANDES e P. P. MARQUES, Portugal em Sade, Sade em
Portugal; [seguido de] “O Affaire Sade” de Lisboa, Lisboa, Montag, 2017, 2ª ed.).
3. Luiz Pacheco (1925-2008) foi um dos mais ativos, controversos e independentes escritores
portugueses do século XX. Próximo do contexto amplo das vanguardas literárias e artísticas em
Portugal, em particular no contexto das manifestações surrealistas e abjecionistas, essa filiação
exprime-se na chancela Contraponto, que foi mantendo ao longo da vida e na qual publicou
autores como Apollinaire, Raul Leal, Mário Cesariny, António Maria Lisboa, Manuel de Lima,
Natália Correia, Herberto Helder, Virgílio Martinho, entre muitos outros, além de muitas das suas
obras. Uma parte importante da sua produção corresponde a textos de crítica literária e cultural
dispersa nos jornais e parcialmente recolhida em volume, contando-se ainda importantes
recolhas de narrativas curtas, caso do emblemático Exercícios de Estilo, e uma vasta e diversificada
produção autobiográfica, com diários, correspondência, entre outros. Para uma abordagem mais
ampla à vida e obra do autor, ver: João Pedro GEORGE, Puta que os Pariu! A Biografia de Luiz Pacheco,
Lisboa, Tinta-da-China, 2016, 4ª ed.; Sofia SANTOS, Luiz Pacheco: um projecto moderno crítico-
ficcional, tese de mestrado apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2009; Rui
SOUSA, Do libertino: revisões de um conceito através do caso de Luiz Pacheco, tese de doutoramento
apresentada à Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, 2019.
4. O conceito de Abjecionismo, associado ou não às especificidades da manifestação do
Surrealismo em Portugal, tem proporcionado amplo debate nos últimos anos, no qual o autor
destas linhas participou ativamente. Remete-se portanto para a dissertação de doutoramento:
R. SOUSA, Do libertino, op. cit.
5. José BACELAR, Polémica e Abstenção, Lisboa, Seara Nova, 1939, p. 7.
6. Ibid., p. 38.
7. Numa das mais certeiras leituras críticas da opção de Cardoso Pires pela estrutura trans-
histórica, no âmbito de uma reflexão destinada a sublinhar as lacunas culturais do seu tempo,
Cunha Leão atenta num aspeto que ajuda a reforçar a ideia de que a introdução do libertino choca
com os hábitos culturais vigentes em Portugal. Na medida em que, no sentido que lhes é dado, os
termos transcendem o espaço restrito da cultura portuguesa para se converterem em “constantes
históricas de tipo humano”, formas de compreender a condição humana e os seus interesses em
diferentes momentos do percurso histórico, o facto de o libertino ser um produto europeu, com
uma vasta tradição crítica, contrasta com o facto de o marialva ser uma deformação tipicamente
lusitana do representante da doxa. (Cf. Cunha LEÃO, “O livro da semana: Cartilha de Marialva ou
Barca do Inferno?”, Diário de Notícias, 16 de março de 1966, pp. 11-17. De resto, o próprio Cardoso
Pires contribuíra para essa leitura. Numa entrevista à Seara Nova, em novembro de 1963, classifica
a sua obra como um estudo sociológico, na esteira da valorização do perfil de Fernão Mendes
Pinto por contraste com a grande maioria dos outros autores portugueses (Ver: J. Cardoso PIRES,
“Temos palavras a mais para esconderem ideias a menos”, Seara Nova, nº 179, Novembro 1963,
pp. 188-189); também em outra entrevista, de janeiro de 1964, explicita a dupla propriedade do
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 14
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 15
25. Embora a sua perspetiva seja distinta da de Cardoso Pires e da de Pacheco, e, quanto a nós,
muito mais superficial, na medida em que reduz a libertinagem a um jogo sexual desprovido de
emoção e de reconhecimento sensível do outro, Roger Vailland descreve adequadamente esse
aspeto: “O libertino reserva a ternura à parceira que após muitas lutas mostrou ser adversário
digno dele e a quem pode proclamar sua igual. Conquistou ela a sua estima e o seu respeito, e ele
elevou-a à categoria de cúmplice. […] A ternura que nasce da estima recíproca em que se têm dois
libertinos é de uma espécie muito particular. Mais ainda que dos laços da cumplicidade, é feita da
mútua piedade de dois seres igualmente conscientes do gratuito, da inutilidade fundamental do
jogo a que consagram as suas existências” (Roger VAILLAND, op. cit., p. 19). Interpretamos a ideia
de que a ação libertina é conscientemente um jogo inútil à luz das conceções desenvolvidas por
Bataille, sobretudo no que respeita ao contraponto entre a produtividade gregária e a livre
despesa de energias de que deriva a parte maldita (cf. Georges BATAILLE, A Parte Maldita [Precedido
de] Noção de Despesa, trad. Miguel Serras PEREIRA, Lisboa, Fim de Século, 2005).
26. Jean DEPRUN, « Sade Philosophe », in Marquis de SADE, Œuvres, vol. I, ed. Michel DELON,
Paris, Gallimard, pp. LXII-LXIX. Deprun defende que, ao dirigir a sua leitura para o domínio da
ética, Sade exacerba as suas tendências desviantes, revelando os mais obscuros traços da
conceção libertina de Homem e de Sociedade. Segundo a sua perspetiva, esse excesso herético de
Sade reside em três conceitos fundamentais: o “isolisme”, em virtude do qual se faz a apologia do
sujeito solitário, exclusivamente focado nos seus interesses e, sobretudo, no modo como pode
agredir os demais; o “intensivisme”, do qual deriva a apologia das sensações extremas, vividas em
situações de violência e de crime; e o “antiphysisme”, fonte da ideia de que a Natureza é
essencialmente malévola, devendo portanto o indivíduo corresponder-lhe através de uma vida
dedicada à perversão e à corrupção dos outros (ibid., pp. LXIV-LXVI). A este respeito, deve ainda
acentuar-se que, na complexa leitura de Fernando Guerreiro, Sade ocupa um papel decisivo na
delineação do conceito de “romance-catástrofe”, dado que o Marquês compreende a verdade
sobre a vida, em geral, e a História humana, em particular, como um produto essencialmente
catastrófico e monstruoso que o conduz ao projeto de narrar a verdadeira História humana,
descrevendo casos verosimilhantes nos quais a exemplaridade se consegue pelo excesso daquilo
que poderia ter acontecido ou terá mesmo acontecido, apesar de ignorado pela retórica oficial
(Fernando GUERREIRO, Monstros Felizes: La Fontaine, Diderot, Sade, Marat, Lisboa, Colibri, 2000, pp.
117-124).
27. L. PACHECO, “O Sade Aqui entre Nós”, op. cit., p. 19.
28. Ibid., p. 15.
29. Ibid., p. 21.
30. Cf. Roger SHATTUCK, Forbidden Knowledge: From Prometheus to Pornography, New York,
St. Martin’s Press, 1996.
31. Ibid., p. 9.
RESUMOS
Em 1966, na edição portuguesa de A Filosofia na Alcova, do Marquês de Sade, Luiz Pacheco publicou
o texto “O Sade Aqui entre Nós”, um dos mais provocatórios documentos de denúncia das
interpretações da obscenidade e da marginalidade veiculadas pelo regime do Estado Novo. Nesse
texto, Pacheco parte da figura de Sade para desenvolver uma teoria da libertinagem em torno da
qual se relacionam muitos dos aspetos essenciais para uma adequada compreensão da sua obra. É
Atlante, 16 | 2022
Luiz Pacheco, leitor de José Cardoso Pires: o antimarialvismo libertino 16
a partir do contraponto entre a teoria da libertinagem proposta pelo autor e a doxa veiculada
pelo regime totalitário português, e em diálogo com as categorias definidas por José Cardoso
Pires, na obra A Cartilha do Marialva (1960), que procuro expor a noção de aintimarialvismo
libertino.
En 1966, dans l'édition portugaise de La philosophie dans le boudoir, du Marquis de Sade, Luiz
Pacheco publie le texte « O Sade Aqui entre Nós » (« Sade ici entre nous »), un document
extrêmement provocateur dénonçant la conception de l’obscénité et de la marginalité selon le
régime de l’Estado Novo. Dans ce texte, Pacheco utilise la figure de Sade pour développer une
théorie du libertinage qui recèle un grand nombre d’aspects essentiels pour la compréhension de
son œuvre. À travers la confrontation entre la théorie du libertinage proposée par l’auteur et la
doxa véhiculée par le régime totalitaire portugais, et à l’aune des catégories définies par José
Cardoso Pires, dans son œuvre A Cartilha do Marialva (1960), je cherche à élucider la notion de
« antimarialvismo libertin ».
In 1966, in the Portuguese edition of La philosophie dans le boudoir, by the Marquis de Sade, Luiz
Pacheco published the text “O Sade Aqui entre Nós” (“Sade here between us”), an extremely
provocative document denouncing the conception of obscenity and marginality according to the
“Estado Novo” regime. In this text, Pacheco uses the figure of Sade to develop a theory of
libertinism that contains a great number of essential aspects for an adequate understanding of
his work. Through the confrontation between the theory of libertinism proposed by the author
and the doxa conveyed by the Portuguese totalitarian regime, and in dialogue with the categories
defined by José Cardoso Pires, in the work A Cartilha do Marialva (1960), I analyse here the
notion of “libertine aintimarialvismo”.
ÍNDICE
Mots-clés: libertinage, Sade, Luiz Pacheco, marialvismo, José Cardoso Pires
Palavras-chave: libertinagem, Sade, Luiz Pacheco, marialvismo, José Cardoso Pires
Keywords: libertinage, Sade, Luiz Pacheco, marialvismo, José Cardoso Pires
AUTOR
RUI SOUSA
Universidade de Lisboa, Faculdade de Letras, Centro de Literaturas e Culturas Lusófonas e
Europeias
Atlante, 16 | 2022