You are on page 1of 19
Li ‘DESCOBERTAS, ~ ACIDENTAIS EM 4 CIEN \CIAS zz ROYS TON M Ri OBERTS @., | 7 : , NANT meet = PREFACIO Durante meu primeiro ano de pés-graduacao, em 1940, deparei-me com o que o professor Roberts chama "pseudo-se- rendipidade" pela primeira vez. Eu estava trabalhando em um Pprojeto do tempo da guerra, a sintese do cloreto de vinila (para fabricagao de PVC, policloreto de vinila, atualmente o plastico mais utilizado do mundo). Naquele tempo, o cloreto de vinila era produzido industrialmente adicionando-se Acido cloridrico a acetileno, Estudei um procedimento alternativo — no qual dicloreto de etileno passava por um tubo aquecido. Todo o cloreto de vinila sintetizado hoje em dia é feito por esse método. Originariamente, eu purificava o dicloreto de etileno ape- nas por destilagao, mas um dia tentei uma etapa adicional de purificagdo antes da destilagdo; percebi que a producdo de cloreto de vinila entao se processou mais rapidamente e a uma temperatura mais baixa. Mas esse resultado nado era sempre reproduzivel de um dia para outro. Era exasperante! Finalmen- te, descobri a verdade. Essa variabilidade era resultante, primeiramente, da etapa adicional de purificagao, que removia um inibidor da reagdo desejada e, segundo, de um nao plane- Jado (e inesperado) vazamento de ar no equipamento, que permitiu a entrada de oxigénio, um catalisador para a reagao desejada. Assim, a remocao serendiptica de um inibidore a adicgdo de tracos de oxigénio produziram um fenémeno de tremenda importancia para a industria, Desde 1940, eu tenho realizado freqientes descobertas serendipticas. Certamente, tais descobertas dependem de uma mente preparada. 13 Este livro, escrito pelo professor Ro relato fascinante da serendipidade em dedicacgao humana. Foi escrito de uma fo; que possa ser entendido e apreciado por nenhum conhecimento técnico. yston Roberts, éu diversos campos ia rma clarae direta, tal aqueles com Pouco oy : Penso que este livro é muito oportuno, Sua leitura perm. te-nos fazer perceber como o avango cientifico nao pode ae planejado. Quando remetemos uma Solicitagao a uma agéncia financeira, baseamo-nos no conhecimento atual, nao nodes. | conhecido. Contudo, a ciéncia mais interessante ainda esta | por ser descoberta no mundo desconhecido. Como se vai do conhecido para o desconhecido? O melhor caminho, na minha opiniao, € apoiar aqueles que ja o fizeram antes. As muitas descobertas, sejam por serendipidade ou por concepgao, geral- mente sao feitas pelas mesmas pessoas. Este excelente livro deve ser lido por pessoas de todas as idades. Entretanto, sua leitura sera particularmente util para aqueles em estagios iniciais de suas carreiras. Quando somos jovens, queremos que todo o conhecimento se adapte as — vigentes ("o dogma da época"). Felizmente, nao € sempre aes forma que as coisas acontecem no mundo real. Sir Derek H. R. Barton INTRODUG AG O que o velcro, @ penicilina, os raios X, © teflon, a dinamite © os pergaminhos do Mar Morto tém em comum? Serenctipiacte! Essas coisas tio diversas foram descobertas por acicente, come o foram centenas de outras que fazem do cotidiano algo mais conve niente, agradavel, saudavel ou interessante, Todas vieram ate nos como resultado da serendipidade — a dadiva de encontrar coisas valiosas ou apraziveis que nao procuravamos, ou “a faculdade de realizar descobertas afortunadas ¢ tnesperadas por acaso” (defini ges de dicionario). Apalavra serendipidade’™ fot cunhada por awe uma Carla ao seu amigo Sir Horace Mann, em 1754. ficou impressionado por um conto de fadas que lera sobre as aventuras de “Os tés principes de Serendip” (ou Screndib, aim meme antiga para 9 Ceilao, agora conhecido como Set MARA), que “estavans sempre fazendo deseobertas, por acicentes ¢ sagaciade, de eomas que cles nao estavam procurande...” Walpole usou o terme para descrever algunas de suas proprias descobertas acidentais A palayra fol recentemente redescoberta e esti sencdo usaca com srescente frequéncia, (Ela nado aparece nas ectigdes ce T9NF ou 1959 de um conhecido dictonarto de liga thglesa, apacecende Mas de 1974 © posteriores © CNL OULEOS GICLEE IOs Alitais), A matoria das pessoas que foram abengoadas pelt serencdt Pidade nao relutan cn adiitir a sua Boa sorte. Longe de se defenderens quanto ao Papel que O doasa LeEpresertou eH sts * Ch nota da adugae, (p12) descobertas, elas geralmente ficam ansiosas por descreye.; Elas entendem, eu acredito, que a serendipidade nao dimty _ seus devidos créditos pelas descobertas. Pasteur,.que fez avangal em quimica, microbiologia e medicina, reconheceu isso ¢ o expreg’ sou sucintamente: “No campo da observagéo, o acaso favor “4 apenas a mente preparada”. Mas, recentemente, 0 prémio Nobe| Paul Flory, na ocasido do recebimento da medalha Priestley,a mai, alta honra dada pela Sociedade Americana de Quimica, disse; a Invengdes significativas nao séo meros acidentes. A visio errénea [de que elas 0 séo] é amplamente aceita, de tal forma que a comunidade cientifica e técnica, infelizmente, tem feito pouco para dispersé-la, A casualidade geralmente tem a sua Parte, nao se pode negar, mas uma invencao é muito mais do que pregaca crenca popular de ser algo que surge subitamente do nada, Profundidade e amplitude de conhecimento sao pré-requisitos virtuais. A menos que a mente esteja totalmente repleta de antemao, a fagulha proverbial do génio, se ela se manifestar, provavelmente nao encontraré nada para incendiar. Essas declaragées de Pasteur e Flory mostram que eles entenderam o que Walpole quis dizer quando descreveu a seren @ipidade como descobertas feitas “por acidente e sagacidade”. Eu cunhei 0 termo pseudo-serendipidade para descrever @escobertas acidentais de meios para atingir um fim procura- do, em contraste com o significado (verdadeiro) de serendipidade, que descreve descobertas acidentais de coisas nao procuradas. Por exemplo, Charles Goodyear descobriu o processo ds vulcanizacao da borracha quando acidentalmente “ap " um pedaco de borracha misturada com enxofre sobre um forn' quente. Por muitos anos, Goodyear teve a obsessao de a' aa uma maneira de tornar a borracha util. Por ter Sait : acidente que o levou ao processo bem-sucedido que er ptiot procurara, chamo a isso uma descoberta pseudo-sere™ invel” Por outro lado, George deMestral nao tinha Pps pichos tar o velcro quando procurou saber porque alguns ¢ se prendiam tao fortemente a sua roupa. sult Acredito que muitos dos acidentes fortuitos uF reradas & nas descobertas descritas neste livro devam a faz delas men pseudo-serendipticas, o que nao necessariamen stincéo entre importantes. Em alguns exemplos, aponto a 16 BB + duas classificagdes; em outras ocasiées voc’ pode decidir uma descoberta foi serendiptica ou pseudo-serendiptica, ‘Em qualquer dos casos € uma descoberta digna de nosso interesse € admiragao. : Nossas histérias comegam com um dos primeiros exem- plos registrados de pseudo-serendipidade. No século Ill a.C., Arquimedes estava procurando um meio de detectar a presen- ca de um metal de base na coroa de ouro feita para seu rel. Encontrou a resposta em uma observagaéo acidental feita nos balnedrios ptiblicos de Siracusa, que o fez sair correndo de onde estava, gritando “Eurecal” Tais incidentes oportunos aconteceram a milhares de indivi- duos, mas possivelmente a maioria nao reagiu tao dramaticamente como Arquimedes. Todos nés lucramos quando descobertas vie- ram desses acidentes. Neste livro eu narro algumas dessas descobertas — algumas fantdsticas, algumas quase triviais — desde os tempos antigos até a atualidade. De maneira geral, tentel descrever as descobertas utilizando termos que o leitor comum entenda. Algumas, entretanto, requerem terminologia técnica ou cientifica, ou entdo os cientistas julgariam essas histérias despro- vidas de sentido. Da mesma maneira, o néo-cientista acharla ininteligiveis outras, se escritas em termos técnicos precisos. Es- pero, também, que professores € estudantes de todos os nfveis — do primério até a universidade — achem essas histérias titeis para o enriquecimento de palestras e debates. Em alguns casos, portan- to, explicagdes ou dados adicionais sao dados em férmulas ¢€ figuras. Para aqueles que possam querer informagées ou conhect- mentos adicionais, referéncias sao fornecidas no apéndice. Além disso, um suplemento técnico contendo equagées € formulas qui- micas adicionais pode ser pedido mediante requisicao a editora. Para cada um dos exemplos aqui descritos, devem existir outras centenas que eu desconhego. Espero que este livro te um estimulo para que vocé, tendo se deparado com Secen 7 Pidade em sua prépria experiéncia, ou sabendo de outros au © fizeram, traga suas histérias ao meu conhecimento para que eu possa incluf-las em futuras edigdes deste livro. es, pois a serendipidade éum Deverd haver futuras edig6' dias! Processo continuo — acontece todos os CAPITULO 1 ARQUIMEDES — O PRIMEIRO STREAKER* Arquimedes, 0 matematico grego, viveu em Siracusa no século III a.C. Ele é conhecido por contribuigdes tais como a invengao da alavanca; 0 "parafuso de Arquimedes" (que ainda é usado no Egito para elevar as Aguas do Nilo para irrigagao); ea leide hidrostatica, algumas vezes chamada de "principio de Arquimedes". Foi ele que saiu correndo nu dos balnedrios publicos pelas ruas de Siracusa gritando "Eureca, eurecal"; "Encontrei". © que Arquimedes havia encontrado? O que tanto o entusiasmou que ele se esqueceu de vestir as roupas antes de ir para sua casa? Para responder a essa pergunta precisamos entender o que Arquimedes tinha em mente quando fol ao balnedrio naquele dia. Hierdo, o rei de Siracusa, wm amigo intimo e talvez até um parente de Arquimedes, tinha incumbi- do um ourives de fazer uma coroa de ouro puro para sl, Quando recebeu sua coroa ja pronta, 0 rei teve dtividas se 0 ourives havia utilizado todo o ouro em sua confecgdo. Nao poderia o ourives ter substituido uma parte do ouro por um metal menos valioso, prata ou cobre, guardando para sioouro que nao foi usado? — * A palavra streaker, que nao tem tradugio direla, significa "pesson que S° despo em publico, com o objetivo de chocar'.(NT) 19 st se conhecia como tmisturaro our a Prata e ao co) BSaas nristunas, ou [yas, rete a rica cor do oure me: auando quantilades signifleativas de outros metats POragay, Ouro puro é chamado “oure 24 quilates", OU Ld Quilatos é feita de 58% ce oure e 48% de outer el ¢ normahnente usada em joalheria © se parec © OUT PLD, bre sho 880 Ineor A liga de ‘O08 Metals: © multo com © pei Nierdo chamou seu amigo Arquimedes e conflou ao Aameso matenxitico a tarefa de descobrir se a coroa era real. mente de ouro puro ¢ se continha todo o metal Precioso que o rel dera ao ourives, A andlise quimica estava longe de ser tao avangada quanto a matematica no séoulo Hl ac., e Arquime. des era, atinal, um engenhelro e matemético muito astuto, Arquimedes havia, antes, desenvolvido formulas mate. maticas para volumes de sdlidos regulares, como esferas e cilindres, Ele pereebeu que, se pudesse determinar o volume da corea de Hierao, seria capag de dizer se a coroa era de ouro puro ou de uma mistura de ouro com outros metals, Quando viu a agua transbordar ao entrar na banheira, percebeu que o volume da agua excedente era exatamente igual ao volume da parte submersa de seu corpo. Entao ele viu uma maneira de encontrar o volume de qualquer sdlido irregu- lar, quer fosse este seu pé ou uma coroa. Logo, se colocasse a corea dentro de um recipiente chelo de agua, poderia medir 0 volume de agua que se derramou, Este seria igual ao volume da coroa. Suponhamos que Hleréo tivesse dado ao ourives ra - cubo de ouro puro que pesasse exatamente 2 quilos. ria arestas de tal cubo mediriam assim 4,3 cm e seu volume se 10 de 80 cm’, Se o ourives tivesse feito a coroa com todo eee e nenhum outro metal, a coroa pesaria 2 quilos € seu vforma i seria o mesmo do cubo original, 80 cm", porém com a do ouro & diferente. Se tivesse feito a coroa com apenas ae erates por e substituido o quilo restante por um peso Igua' A volume exemplo, a coroa de liga pesaria dois quilos, mas seria diferente. set coroa, encontrarlar™. | ximadamente @ me ' 20 > | Se se pudesse medir o volume da mais de 80 cm’, pois a prata tem apro. da densidade do oure. A densidade é uma medida do peso por unidade de volume de uma substancia. O ouro tem uma densidade maior que a de qualquer outro metal comum: sua densidade é de 19,3 gramas por ‘em; a densidade da prata € de 10.5 gramas por ‘em ciibico, e a do cobre € menor ainda, 8,9 gramas por cm’. Uma corea de dois quilos feita com 50% de ouro e 50% de prata teria assim um volume de 147 cm’. Depois que Arquimedes fez sua descoberta acidental nos balnedrias puiblicos, um problema como medir o volume da nova coroa de Hierao tornou-se simples, bastava afunda-la na Agua e medir o volume da agua deslocada. Quando o rei viu que esse volume foi consideravelmente maior do que deveria ter sido para uma coroa feita de ouro puro, o ourives desonesto recebeu sua senten¢ga imediata na forma de execugao. O que foi uma descoberta fortuita para Arquimedes (serendipidade!) nao foi tao fortuita para 0 ourives. jptica de um método para Assim, essa descoberta serendip! sélido foi a causa do medir o volume de qualquer objeto i entusiasmo que levou Arquimedes a salt correndo do balneario pas para tras. sem perceber que deixara suas rou a CAPITULO 2 COLOMBO DESCOBRE UM NOVO MUNDO Todos sabem que Colombo partiu para encontrar tina nova rota para o Oriente navegando para 0 oeste ao inves de ir para o leste e encontrou nao o Oriente, mas um Novo Mundo, as Américas. Essa descoberta foi realmente acidental, de certa forma fortuita, mas foi serendiptica? Ha diversos elementos acidentais na saga de Colombo que nao sao tao conhecidos quanto sua famosa viagem. Cris- tévao Colombo nasceu em Génova por volta de 1446 Foi educado em Pavia em matematica e ciéncias naturais. incluin- do astronomia nautica. De acordo com uma biografia escrita por seu filho Fernando, da primeira vez que Colombo foi para o mar tinha aproximadamente 15 anos e possivelmente visitow a Inglaterra, a Irlanda e a Islandia, bem como a Grécia, Portu- gale a Espanha. Em Portugal, conheceu e€ casou-se coma filha de um capitéo que servia a Henrique, 0 Navegador, que adhd primeiro a explorar o Atlantico a oeste da Europa © da Africa Baseando-se no estudo dos mapas de seu sogro e dos de outros marinheiros, ele desenvolveu um desejo instigante de cn trar uma nova rota para as riquezas do Oriente, navegt! para oeste. O explorador moderno Thor Heyerdahl ac na we Colombo também sabia sobre as cartas escritas quatre ae© a antes ao Vaticano pelos padres escandinavos na Organ lo terras encontradas navegando-se mais alew que Colombo percebeu que uma expedigéo tao ambiciosa quanto a que ele propés requerla um patrocinio real. Ele perseguiu vigorosamente esse apolo dos monarcas relnantes em Portugal, Espanha, Franga € Inglaterra. Henrique Vil da Inglaterra recusou os pedidos, mas Isabella € Ferdinando da Espanha nado 0 fizeram. Como conseqiiéncla, muito do Novo Mundo foi para os espanhdis em vez de ir para os ingleses. Outro elemento de acaso na descoberta do Novo Mundo por Colombo foi sua avaliacao incorreta do tamanho do mun- do, Embora cresse corretamente que 0 mundo fosse uma esfera, ele estimou seu tamanho muito abaixo do real e achou que o continente asidtico fosse maior € mais proximo da Espanha do que era na realidade. Ele baseou suas estimativas segundo o melhor globo disponivel na época. Contudo, o cria- dor do globo, Martin Behaim, usou a circunferéncia de Ptolomeu para a Terra, a qual era 25% menor do que o valor verdadeiro. (O globo de Behaim ainda existe; ele se encontra agora em um museu em Nuremberg, na Alemanha) Apos navegar aproximadamente 5000 quilémetros, Colombo pensou que perdera de alguma forma o Japao e que as ilhas que encontrara pertencessem as {ndias Orientais (dai ter denomi- ) ao sul do Japao, ainda que nado seus nativos de "indios" essas ilhas estivessem na verdade a muitos milhares de quild- metros a oeste. de Colombo do Novo Mundo foi um enho enfatizado a importancia algum evento em we desco- Mas a descoberta exemplo de serendipidade? Eu t da sagacidade para transformar berta serendiplica. Embora Colombo fosse wm Intrépido explorador, ele nao foi sdbio o suficiente para reconhecer © significado de sua Pa ober. Morreu acreditando que encontrara nova areas ‘ viente em ve: » um novo continente, Nem tampouco sufrulu de suas descobertas (a manelra que esperara one ebeu louvor © aclamagao temporaria de seus pa- magnih espanhois; mas quando a objetivo de rywecas lie, eas do Oriente para sie SCUs patrons naa se materta de eaaane gloria durou pouco & morredt eoma tim fomeny : Orke any jada Ele esperara enoou lay Unt pota mais CHF Gt pare i lente © suas riquezas, © lol ieapag de aprovelkir o que conto de fato Colombo percebeu que uma expedig’o tio ambiciosa uanto a que ele propés requeria um patrocinio real. Ele rseguiu vigorosamente esse apoio dos monareas reinantes em Portugal. Espanha, Franga e Inglaterra, Henrique VII da Inglaterra recusou os pedidos, mas Isabella e Ferdinando da Espanha nao o fizeram. Como conseqiiéncia, muito do Novo Mundo foi para os espanhéis em vez de ir para os ingleses. Outro elemento de acaso na descoberta do Novo Mundo por Colombo foi sua avaliagao incorreta do tamanho do mun- do. Embora cresse corretamente que o mundo fosse uma esfera, ele estimou seu tamanho muito abaixo do real e achou que o continente asiitico fosse maior e mais préximo da Espanha do que era na realidade. Ele baseou suas estimativas segundo o melhor globo disponivel na época. Contudo, o eria- dor do globo, Martin Behaim, usou a circunferéneia de Ptolomeu para a Terra, a qual era 25% menor do que o valor verdadeiro. (O globo de Behaim ainda existe; ele se encontra agora em um museu em Nuremberg, na Alemanha) Apos navegar aproximadamente 5000 quilémetros, Colombo pensou que perdera de alguma forma o Japao e que as ilhas que encontrara pertencessem as {ndias Orientais (dai ter denomi- nado seus nativos de “indios" ) ao sul do Japao, ainda que essas ilhas estivessem na verdade a muitos milhares de quil6- metros a oeste. Mas a descoberta de Colombo do Novo Mundo foi um exemplo de serendipidade? Eu tenho enfatizado a importancia da sagacidade para transformar algum evento em uma desco- berta serendiptica. Embora Colombo fosse um intrépido explorador, ele nao foi sdbio o suficiente para reconhecer 0 significado de sua descoberta, Morreu acreditando que encontrara novas areas do Oriente em vez de um novo continente. Nem tampouco Usufruiu de suas descobertas da maneira que esperara. Ele recebeu louvor e aclamagao temporaria de seus pa- tronos espanhdis; mas quando o objetivo de riquezas nagnificas do Oriente para si e seus patronos nao se materia- ae Sua gloria durou pouco e morreu como um homem ° Gipontado, Ele esperara encontrar uma rota mais curta para riente e suas riquezas, e foi iIncapaz de aproveitar o que €Ncontrou de fato. 2B i A boa sorte que talves permita-nos Justifiear a classifica. gdo da descoberta de Colombo como serendiptica 6 o desenvolvimento da clvillzagio no Novo Mundo, que velo muito depois da descoberta acidental pelo explorador. CAPITULO 3 UM INDIO ENFERMO DESCOBRE O QUININO a, que é dificil discernir ordo com wma historia a do vice-rel do Peru, fol curada de makiria A origem do quinine é tao obseurs o que ¢ lenda eo que é realldade, De ac amplamente acelta na Europa, & espos conhecida como condessa de Chinchon, quando tomou uma essénela obtida a partir da casca de wma arvore peruana; a condessa ficou tao Impresslonada com a sua cura que levou um pouce destas cascas quando voltou a Espanha em 1638, introduzindo assim 0 Wso do quinino na oe Por essa razio, 0 botanico sueco Lineu em 1742 dew cas me de ‘Cinchona” ao género de drvores das quals essas oe eee foram obtidas. Entretanto, existem dots nett ten} arn denominagdo, Em primelro lugar, embora Lie Gaanas ae ido a intengado de honrar a condessa de Chinchon A. Em se a oat ele o escreveu errado, omitindo © pritneiro a: cae jo lugar, a condessa nunca teve maticla realmen morrey cn eee cascas de quina para a Espanta, mas Espanha rtagena, na Colémbla, no camlnho de volta a 0 Primeiro registro seguro do uso de qulatae ba cue «ta Malarig 1630 nut 3 inisslondrios Jesuuitas em Lina, por volta de Medicinal, a sie disso o nome “eanca Jesuita® fol daca a caso velinente ee ee 100 anos antes de Linew Prova 4prenderam nee Hadrian poder saber aa certo se om fe tte 008 Casca Ca, ndios sobre ax propriedades autaularicas oitudo, uma antiga lenda relate wa Hertocie P plauaivel sobre a descoberta acidental das propriedades cura. tivas da casea de quina A tenda se refere a um indio que, fervendo de febre, estava pontido en uma alta floresta andina, Varias especies de quina (chamada pelos indlos de quina-quina) crescem nas eneostas Umidas e quentes das montanhas dos Andes, desde a Cotdmbia até a Bolivia, em elevagdes acima de 1500 metros, Ao tropegar por entre as arvores, ele encontrou uma poga de agua estaygnada e jogousse ao chao a margem da poga para Deber de sua agua tria, O simples provar f€-lo perceber que a agua anarga estava Infectada com a casca das drvores quia quina que ali cercavam, e que se pensava ser verienosa. Pensando mais no alivio de sua sede e febre abrasadores do que em possiveis efeitos posteriores letais, ele matou a sede Para sua surpresa ele néio morreu; na verdade sua febre baixou ¢ ele conseguiu encontrar seu caminho de volta a st" vila natal com forga renovada, Contou a histéria de sua cura mllagrosa aos amigos e parentes, e valendo-se disso eles pas: saram a usar esséneias da casea da drvore quina-quind pa curar a terrivel febre, A febre era causada pela malaria es composto que a casca continha era o quinino. A noticia descoberta difindiu-se pela populagéio nativa e pode ten iI. gado aos missiondrios jesuitas nos primdrdios do século X’ ies ' lenda, se verdadeira, confirma que mesmo em sociedt peuikivas 8 “sagaeldade" pode instigar o raciocinlo sobre i ae! rs red ts tt ents para produzir uma descoberta de proporgoes i CAS, tat ide 4? Mesmo que a autenticidade dessa lenda en! part re pices Ser verificada, coisas como essas tém a col ve eagente. Alguns dos resultados foram fortulto aut! Hesse CSO, Mas multas vezes o resultado era a morte vi nel Prejuizo A satide Para aquele que encontrava uma subs! natural potente pela prinetra vez. nao POS-ESCRITO we O tratame, amento da mal ; Ou ag wn CO oe oo ‘Sucedido de um composto quimico contr’ fn 0 one (sobre a histéria da tutrodugao de ance “8 Ha Europa e do transplante da quina da we se Para o Budeste d, vo des a Asta, Veja o capitulo 2 do livre « Ja com quinino fol ° » Halado no apéudiee), A wihatinet ativicaitinalinen da eames da qiiina, 0 quintno, 66 fol taolada ent LAZO (pedon qutimtens Nrancowes Merre Joseph Pelletier & done Blenaine Caven fon) a formula quinoa nie era conhentda con vertegn até N08 6 a afitese laboratorial a6 fol realizada en 1944, Hare tun telato de uma deseoberta aerendiptiod que surgin de wine tontativa Ingenua da alntetizar o qiuiniio en 156, veja o capitulo LS que conte a histéria de Willlain Perkin 6 a tnalve,) A inaliria ainda é a doenga letal de major difusio no mundo, apesar de nos ttinos anos ela vir sendo quage total: Mente ollminada nos palses desenvolvidos, pelo controle de Pernilongon com tnsetleldas (o pardsiia da maléria 6 tansint tido do sangue tnfectado de una villina para outras pessoas através de certas variedades de pernilongos). Contudo, a maliria matou meals pessoas do que todas as Buerraa de que ae tem registro ao longo da histérla; nfo 6e pode *uperestinar o valor dos Inseticidas 6 das drogas que podem controlar essa terrivel doonga. Os tio enfatizados danos que o8 Inseticidas causam aos pissaros 6 a alguns outros aplinals deverlam ser contra. balangados pela consideragfio das varias milhares de vidas humanas que J4 foram salvas pelo uso de Inseticidas, espectal- mente em vista dos novos Inseticidas que nfo causam prejulzo 0 melo ambiente, como faziam alguns dos mais antigos. O quinino tem sido um fator importante na politica Mundial. Em virtude da falta de acesso a quina na América do Sul, as drvores foram cultivadas em outras dreas do mundo, hotadamente nas {ndias Orientals Holandesas. Durante a Pri- melra Guerra Mundial, a Alemanha sofreu um corte no Suprimento de quinino que a levou a um malor esforgo para Produzir um substituto sintético. Um dos mals bem sucedidos 1 @ atabrina, ou quinacrina, Na Segunda Guerra Mundial, os Estados Unidos estavam lutando em Areas que eram focos de Perntlongo de malaria (tals como o norte da Africae as florestas das thas do Pacifico Sul) e os Japoneses tinham o controle das Plantacdes de quina, Os Estados Unidos precisavam, por esse Motlvo, desenvolver drogas sintéticas contra malaria que fos- em efetivas, No norte da Afiea, norleamerieanos capliraran woulda dow Hallanos que conalgo levavent pililas que, suspellavane, eran de ime droga antinalarioas eases pililas eran brancas, ao passo que a atabrina era amarelo brilhante, Av pilulas eapturadas foram levadas aos Batados Unidos para culdadona andlise, Deacobriiese que eran de clorequina, oulra droga antimaldrion que fora desenvolvida no mesmo laboratrio ale mAo que a atabrina, ¢ reglatrada sob a mesa patente alemh, Teates farmacoldgioos na cloroquina mostraran que essa dro ga era des veges mals ofloas que a quinaerina na mesina dosagem, Unha poucos efoltos colaterals 6 era branca, Nessa época, as forgas norlo-amoricanas no Paciiieo usa: vam a quinacrina, que era forneelda como atabrina pela companhia Winthrop, tna fila) americana da compantita ale: mA que desenvolvera a droga, Gntrotanto, eles nao estavam tomando suas pfilulas de quinacrina regularmente, A famosa propaganda de rédio Japonesa, "Rosa do Téquio", havin cou vencido ow amerteanos de que nao ad suas poles tornar-ac: au amarelas (correto), como também a droga tornd-los-la Amnpo- tentes (Incorreto). Como reaultado, olea nfo estavam tonne as pilulas, ¢ quando as tropas americanas chegaram 4 pels Guiné, dentro de duas semanas 05% dos soldados contrairan malaria. grain al” Nos que trabalhdvamos naquela época no prog eae 18 timalérico do governo no Comité do Poaquisas Méd on que Universidade de Ilinols fomos avisados do ocorrido eer ” fichssemos finpressionados com a importAncla do NO com to. Fomos avisadoa de que era plor ter mil fuaile nnitares maléria do que mil mortos (pensando em termos ml mutes dot porque era necessdrio mals peasoal para culdar dos que 4 Pot por volta dessa mesma época que soubor age cloroquina era melhor que a atabrina em termoa ad oul © 0 fato de nho causar amarelamen $e vantagem. to era visto Jo4 usa’ Extetia un rumor de que os Itallanos catavelt ye oat eloroquina no norte da Africa em ves da atabrind Pol jv alembes haviain indicado que ac Joroquina era men “qa sixo @ HWe © aoeln of alembes a deram a seus colleges do Eixe cfg Taene com a atabrina para #1 préprios, Os alemées éram bons quiml- cos, mas ndo tho bons farmacologistas, entretanto, Quando os testes farmacolégicos americanos mostraram que a cloroquina era uma droga excelente, nosso programa antimaldrico deu a ela alta prioridade. Como quimico recém- doutorado participando do programa, fol-me solicitado wir novo método de s{ntese da cloroquina. Obté-la na forma pv.a pelo processo aleméo era um problema, talvez isso fosse urna outra razdo pela qual os alemaes preferiram a atabrina. Eu ainda me lembro vividamente da emogdo que senti quando vi alguns bonitos cristals brancos separarem-se de uma solugdo fervente num experimento critico. Tals cristais cram de um composto Intermediarlo na sintese da cloroquina. Antes mesmo de eu obter um grama de cloroquina, o professor Charles C. Price (meu diretor de pesquisa) e eu estavamos em um trem para Buffalo para conversar com quimicos de uma fébrica sobre a adaptacdo de nossa sintese para produgao em larga escala, de maneira a poder suprir a droga para as forgas armadas. O processo fol tao bem-sucedido que o professor Price e eu Tegistramos patentes (em nome do governo america- no), € ele fol usado para preparar algumas toneladas de cloroquina antes do fim da Segunda Guerra Mundial. nan outra oportunidade, todo o nosso grupo de pesquisas rado Sy ane (por volta de uma diizia de estudantes de douto- dla ¢ 7 pe2-doutorado e o professor Price) trabalhou em turnos. Suprir a te, para fazer quantidades suficientes da droga para Mento, Na hospital no qual testes clinicos estavam em anda- 80 final d 's haviamos recebido um telefonema de Nova lorque. tes, cotave ma tarde de sexta-felra, nos avisando que pacien- CStavam at Sedo testados com a droga € suas reservas ®88umimog nando. Eu ainda tremo diante dos riscos que Ta cum com uma aparelhagem !mprovisada que montamos Prir nossa cota até segunda: felra. Subatan trong era apenas uma das milhares de novas un, te Sintetizadas © testadas durante e depois da Se- atting | Sait Mundial, Ela e mals alguns dos outros be, Viet, ts SIntétlcos foram usados nas guerras da Coréia € Ae due ae de serem utilizadas por varlos anos, perce- "8 estavam menos efetivos — aparentemente >. o Mohagens de parasitas da malaria desenvolveram resisténcia a essas drogas, Pelo fato de esse tipo de resisténeia nao se desenvolver contra o quinino, a droga natural manteve sua importaneia na batatha contra a maliria, Por fim, um outro (e um tanto Jocoso) pés-escrito: Al gueéem disse que os ingleses dominaram pollticamente a Indie por tanto tempo por causa do habito Inglés de beber gin-ténica diariamente. A ténica era o quinino, ¢ 1sso livrou os Ingleses da maldigdo da maldria, enquanto muitos dos stiditos indianos que nao gostavam dessa bebida Inglesa, sofreram da febre eda debilitagdo causadas pela malaria,

You might also like