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PODER JUDICIÁRIO

TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO

Registro: 2016.0000856114

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação nº


0000284-82.2012.8.26.0488, da Comarca de Queluz, em que são apelantes MARIO
FABRI FILHO (E OUTROS(AS)) e MARCIO LUIZ DOS SANTOS, são apelados
PREFEITURA MUNICIPAL DE QUELUZ e MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE
SÃO PAULO.

ACORDAM, em sessão permanente e virtual da 12ª Câmara de Direito Público


do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão: Deram provimento ao
recurso. V. U., de conformidade com o voto do relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Desembargadores JOSÉ LUIZ GERMANO


(Presidente), OSVALDO DE OLIVEIRA E VENICIO SALLES.

São Paulo, 23 de novembro de 2016.

José Luiz Germano


Relator
Assinatura Eletrônica
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Voto nº: 27.6561 vcg físico


Apelação nº: 0.000.284-82.2012.8.26.0488
Apelantes: Mário Fabri Filho e Outro
Apelados: Prefeitura Municipal de Queluz e Ministério Público
do Estado de São Paulo
Comarca: Queluz
Juiz: Daniel Otero Pereira da Costa

APELAÇÃO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. IMPROBIDADE


ADMINISTRATIVA. Ajuizamento da ação civil pública por ato
de improbidade administrativa. Concessão de permissão de uso de
bem público sem prévia licitação. Desnecessidade de formalização
de procedimento licitatório, tendo em vista a precariedade e
mesmo a discricionariedade do ato administrativo. Precedentes do
TJSP. Inexistente no caso em tela o prejuízo ao erário, o que seria
pressuposto para subsunção do art. 10 da lei de improbidade.

RECURSO DE APELAÇÃO PROVIDO

Trata-se de recurso de apelação interposto


pelos réus contra a sentença de fls. 200/204, proferida em
23.09.2015, cujo relatório se adota, que, nos autos da ação
civil pública por ato de improbidade administrativa julgou
procedente a demanda para condenar os requeridos Mário Fabri
Filho e Márcio Luiz dos Santos ao pagamento de uma multa
civil, no importe de R$ 2.000,00, cada, resolvendo o feito,
com base no art. 269, I, do CPC.
Apelam os réus alegando, em síntese, que: i)
a r. sentença é nula, pois falta prova nos autos do domínio
público do imóvel; ii) ausência de má-fé ( não comprovação de
violação ao dever de moralidade administrativa); iii)
ausência de dolo e de dano ao erário.
O recurso de apelação foi recebido em ambos
os efeitos (fls. 226).
As contrarrazões foram apresentadas apenas
1 21.09.2016
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pelo Ministério Público do Estado de São Paulo a fls.


228/231.
A D. Procuradoria Geral de Justiça, instada a
se manifestar, emitiu parecer pelo provimento do apelo, pois
entende que em se tratando de permissão de uso de bem
público, que configura ato administrativo discricionário e
precário, não há necessidade de procedimento licitatório.
As partes não se opuseram ao julgamento por
sessão virtual permanente.

É o relatório.

Inicialmente, com relação à preliminar de


nulidade da r. sentença, por falta de comprovação do domínio
público do bem, esta não merece ser acolhida.
Consoante se verifica a fls. 81/82 do apenso,
ofício expedido pelo tabelião de registro de imóveis consta
que "foi encontrada uma área denominada "Fogueteiro", em nome
da Prefeitura Municipal de Queluz”.
Como se isso não bastasse, é fato
incontroverso nos autos que se tratava de área pública. Todos
os envolvidos tinham pleno conhecimento disso.
Dessa forma, afasta-se a preliminar de
nulidade arguida pelos réus.
Com relação ao mérito propriamente dito, o
recurso comporta provimento.
Versa a presente demanda sobre ação civil
pública ajuizada pelo Ministério Público do Estado de São
Paulo em face de Mário Fabri Filho e Márcio Luiz dos Santos
porque o primeiro, na qualidade de prefeito municipal, no dia
09 de março de 2004 firmou com o segundo um termo de
permissão de uso de área pública, situada no bairro de
Fogueteiro (zona rural do Município), para que o se
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construísse um quiosque e nele exercesse atividade comercial,


sem prévia licitação.
Considerando tal conduta, alega o Ministério
Público que os réus praticaram ato de improbidade
administrativa, descrito no art. 10, VIII, da Lei 8.429/92,
uma vez que consideradas as circunstâncias do caso concreto,
evidenciou-se a indevida dispensa de processo licitatório.
Aqui, necessário abrir um parêntese para
esclarecer que o art. 10 estabelece os atos de improbidade
que causam dano ao erário, sendo certo que as hipóteses
elencadas no art. 10 são as únicas que admitem o elemento
subjetivo culpa para configuração do ato ímprobo. Assim
sendo, de todo despicienda a alegação do apelante no sentido
de que não houve má-fé ou dolo por parte dos réus.

Voltando ao cerne da questão, importante


salientar que há muito tempo a doutrina e a jurisprudência se
dividem acerca da necessidade ou não de prévia licitação para
os casos que envolvem mera permissão de uso de bem público. A
configuração do ato de improbidade administrativa no caso em
tela depende da solução desta controvérsia jurídica e não da
má-fé ou dolo, como equivocadamente alegaram os apelantes
baseando-se em jurisprudência fundadas no art. 11 da Lei de
Improbidade.

A bem da verdade, antigamente, entendia este


Relator que em se tratando de autorização/permissão de uso de
bem público havia necessidade de licitação. Porém, revendo
meu posicionamento anterior, acredito, s.m.j, ter sido
extremamente rigoroso naquela oportunidade, como mais abaixo
explico.

Sobre o instituto das permissões, importante


trazer à baila seu conceito, como nos ensina Maria Sylvia

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Zanella Di Pietro:

"Permissão, em sentido amplo, designa o


ato administrativo unilateral,
discricionário e precário, gratuito ou
oneroso, pelo qual a Administração
Pública faculta ao particular a execução
de serviço público ou a utilização
privativa de bem público. O seu objeto é
a utilização privativa de bem público
por particular." (Direito
Administrativo, Maria Sylvia Zanela Di
Pietro, 18ª edição)

Com efeito, pelo próprio conceito do


instituto, a permissão de uso de bem público prescinde de
prévio procedimento licitatório, pois trata de ato
administrativo discricionário e precário, salvo os casos em
que legislação específica o exigir.

Nesse sentido é a posição do ilustre jurista


Hely Lopes Meirelles:

"A permissão de uso de bem público, como


ato unilateral precário e trivial de
administração, é normalmente deferida
independentemente de lei autorizativa e
de licitação, mas nada impede que a
legislação da entidade competente
imponha requisitos e condições para sua
formação ou revogação." (Direito
Administrativo Brasileiro, 10ª edição,
São Paulo, Ed. Revista dos Tribunais,
1984)

Apelação nº 0000284-82.2012.8.26.0488 -Voto nº 5


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Como muito bem salientado pela Procuradoria


Geral de Justiça, em seu parecer de fls. 235/243, o instituto
da permissão de uso de bem público é, de certa forma,
desconhecido do direito, visto que não existe regra
constitucional sobre ele e na legislação federal, as menções
ao instituto são esparsas e muitas vezes imprecisas ou pouco
técnicas. A Constituição Federal faz menção somente às
concessões e permissões de serviço público, institutos
disciplinados, na legislação federal, pela Lei 8.987/95, mas
que são completamente distintos do instituto aqui tratado.

Nem se alegue que o art. 2º, da Lei 8.666/93


se aplica para a hipótese vertente no presente caso. Parece-
me evidente que ao incluir a permissão entre os ajustes que,
quando contratados com terceiros, serão necessariamente
precedidos de licitação, esta se refere à permissão de
serviço público, mormente porque pressupõe a existência de um
contrato. Nesse sentido, inclusive, é a posição da ilustre
doutrinadora, Maria Sylvia Zanella de Pietro:

"É verdade que a Lei nº 8.666/93, no


art. 2º, inclui a permissão entre os
ajustes que, quando contratados com
terceiros, serão necessariamente
precedidos de licitação. Tem-se, no
entanto, que entender a norma em seus
devidos termos. Em primeiro lugar, deve-
se atentar para o fato de que a
Constituição Federal, no art. 175,
parágrafo único, I, refere-se à
permissão de serviço público como
contrato; talvez por isso se justifique
a norma do art. 2º da Lei nº 8.666/93.
Em segundo lugar, deve-se considerar
também que este dispositivo, ao
mencionar os vários tipos de ajustes em
que a licitação é obrigatória,
acrescenta a expressão quando
contratados com terceiros, o que faz

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supor a existência de um contrato."


(Direito Administrativo, Maria Sylvia
Zanela Di Pietro, 18ª edição)

Assim sendo, entendo que a permissão de uso


de bem público estabelecida de forma precária e sem prazo de
duração, fica excluída da Lei de Licitações, tendo em vista a
sua natureza jurídica de precariedade e discricionariedade,
razão pela qual absolvo os réus do ato de improbidade contra
eles imputado.

Sobre a desnecessidade de licitação em casos


deste jaez, já se pronunciou esta 12ª Câmara de Direito
Público e este E. Tribunal de Justiça, in verbis:

"IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. Julgamento


antecipado da lide. Cerceamento de
defesa não configurado. Uso de espaços
(boxes), no Centro Popular de Compras,
por vendedores ambulantes. Desnecessária
licitação para a distribuição dos
espaços. Permissões de uso concedidas
pelo Município. Previsão em decreto, que
regulamentou o uso do prédio. Ato
administrativo unilateral,
discricionário e precário. Escolha dos
particulares por sorteio. Critério de
escolha objetivo, que não favoreceu uns
em detrimento de outros particulares.
Interesse público nas atividades
desenvolvidas pelos ambulantes, que não
se confundem com serviço público,
hipótese que demandaria prévia
licitação. Respeito aos princípios da
legalidade, impessoalidade e moralidade.
Demanda improcedente. Recurso
não provido." (APELAÇÃO N°
994.09.357984-0, 12ª Câmara de Direito
Público, Desembargador Relator Edson
Ferreira, julgado em 22.09.2010) (g.n.)

"APELAÇÃO CÍVEL - Ação Civil Pública.


Concessão de permissão de uso de bem
público sem prévia licitação.
Desnecessidade de formalização de
procedimento licitatório na espécie,
dada a precariedade do ato - improbidade
administrativa não configurada. Sentença
de improcedência mantida. Recurso do

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Ministério Público a que se nega


provimento. (APELAÇÃO CÍVEL N°
404.982.5/4-00, 9ª Câmara de Direito
Público, Desembargador Relator Oswaldo
Luiz Palu, julgado em 24.03.2010) (g.n.)

Ademais, o art. 10 da Lei 8.429/92 tem como


pressuposto o prejuízo causado ao Poder Público e, no caso
sub judice, ele não existe, pois a construção do quiosque se
deu às expensas do permissionário e há notícia nos autos de
que a área era um grande depósito de lixo e havia interesse
em urbanizá-la. Logo, não houve prejuízo, mas um
melhoramento.

Ante o exposto, é dado provimento ao recurso


de apelação para julgar improcedentes os pedidos.

JOSÉ LUIZ GERMANO


RELATOR

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