You are on page 1of 21

Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação

XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

EXTREMA-DIREITA, MÍDIAS DIGITAIS E ESTETIZAÇÃO DA


POLÍTICA: o que deixamos de ver?
FAR RIGHT, DIGITAL MEDIA AND AESTHETIZATION OF
POLITICS: what did we miss?

Afonso de Albuquerque 1
Rodrigo Quinan2

Resumo: O avanço global da extrema-direita – em especial no Brasil e nos Estados Unidos – pegou os analistas
desprevenidos. Por que isso aconteceu? O texto sugere que isso se deveu a uma falha fatal da teoria. Orientada
por uma visão distorcida, que tomava as mídias digitais como naturalmente benignas, ela tomou por dado que o
ativismo político em rede seria necessariamente emancipador. Além disso, ela promoveu uma perspectiva sobre
o ativismo que destacava o seu caráter estético em detrimento do estratégico, além de ignorar a dimensão
histórica das mídias sociais e seu uso político. Tomamos a análise dos memes políticos como um exemplo
privilegiado dessa tendência. Alternativamente, sugerimos que as mídias digitais foram, desde sua origem, um
terreno fértil para o ativismo de extrema-direita e que os memes – enquanto formato comunicacional – foram
forjados em fóruns nos quais esses agentes eram predominantes.

Palavras-Chave: Extrema-Direita, estetização da política, mídias digitais, memes políticos

Abstract: The global rise of the far right - especially in Brazil and the United States - caught analysts off guard.
Why did this happen? The text suggests that this was due to a fatal flaw in the theory. Guided by a distorted
view, which took digital media as naturally benign, it took for granted that political network activism would
necessarily be emancipatory. In addition, it promoted a perspective on activism that highlighted its aesthetic
character at the expense of the strategic. It also ignored the historical dimension of social media and its
political use. We take the analysis of political memes as a prime example of this trend. Alternatively, we suggest
that digital media were, since their origin, a breeding ground for extreme right-wing activism and that memes -
as a communicational format - were forged in forums in which these agents were prevalent.

Keywords: Far right, aestheticization of politics, digital media, political memes

1
Professor do PPGCOM- UFF, Doutor em Comunicação – UFRJ – afonsoalbuquerque@id.uff.br
2
Doutorando pelo PPGCOM-UFF. Mestre pelo PPGCOM-UFF. rodrigoquinan@id.uff.br

1
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

Introdução
Uma das grandes tragédias da vida é o assassinato de
uma bela teoria por uma gangue de fatos brutais
(Benjamin Franklin)

A pandemia de COVID-19 teve um impacto terrível sobre a sociedade brasileira. Mais


de 12 milhões pessoas ficaram doentes até o momento em que este artigo foi escrito e, dentre
elas mais de 300 mil morreram. Atividades econômicas foram suspensas e o desemprego se
alastrou pela sociedade. Muitos desses problemas também ocorreram em outros países, cujas
taxas de mortalidade per capita foram até maiores que as brasileiras. No Brasil, porém, os
efeitos da pandemia foram agravados por um segundo mal, geralmente referido como
infodemia. Em termos gerais, o termo se refere à difusão de desinformação em escala
epidêmica. Assim como a COVID-19, a infodemia é um fenômeno global. Contudo, ela atinge
o Brasil de maneira particularmente grave, mais, até do que a própria epidemia. Não apenas o
número de pessoas atingidas pela infodemia é gigantesco, mas ela afeta instituições centrais do
país, como a própria Presidência da República, que patrocina tratamentos não ortodoxos para
o tratamento da doença. De modo ainda mais notável, o Conselho Federal de Medicina –
encarregado de normatizar o exercício da profissão em território nacional se recusou a condenar
essa prática. O avanço das forças obscurantistas penetrou fundo no tecido social brasileiro.
Esse fenômeno se deu sob os olhos dos pesquisadores brasileiros e, a despeito disso, passou
desapercebido pela enorme maioria deles. Por que isso ocorreu?
Esse texto apresenta uma revisão crítica da produção acadêmica recente no campo da
comunicação política, com especial destaque para os artigos que enfocam o uso das mídias
sociais como instrumento de mobilização política. Em linhas gerais, sugerimos que as
pesquisas brasileiras se caracterizam, em sua maior parte, por diversas deficiências. Dentre
elas, destacamos: 1) premissas questionáveis, como a noção de que a internet é, por natureza,
um instrumento progressista, a serviço do esclarecimento; 2) limitação do foco da análise,
geralmente privilegiando iniciativas situadas no chamado “campo progressista” em detrimento
de seus adversários; 3) pouca atenção à infraestrutura sociotécnica – as plataformas de mídias
sociais – e o modo como ela condiciona/limita a atuação dos agentes sociais; 4) ingenuidade
sociológica, que se traduz na ênfase na dimensão “criativa” e “espontânea” da atuação desses
agentes, em detrimento da influência exercida por forças sociais organizadoras e
normatizadoras do discurso nas mídias sociais; 5) superficialidade analítica, traduzida na
ênfase na dimensão estética do fenômeno, em detrimento da sociológica. Considerados em seu

2
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

conjunto, esses fatores ajudam a explicar como e porque a literatura acadêmica falhou em
detectar a emergência da extrema-direita organizada em rede.
Em particular, o texto enfoca o estudo dos memes políticos. Sugerimos aqui que, não
raro, as pesquisas sobre memes políticos fetichizam o seu objeto, na medida em que ignoram
elementos cruciais do contexto social da sua produção e distribuição. Esforços para definir os
memes como um “gênero” comunicativo não raro perdem de vista que eles são promovidos
por agentes concretos, bem como as relações que esses agentes estabelecem uns com os outros.
Ao fazê-lo, eles perdem de vista a dimensão propriamente pragmática do fenômeno. Se memes
servem como ferramentas políticas, como eles funcionam? Que impacto concreto têm sobre o
mundo? O corolário de tudo isso é que os estudos sobre memes se perdem em meio a uma
estetização de seu objeto e da superficialidade no trato dele.
Além disso, não obstante o conteúdo veiculado pelos memes seja passível de
apropriações progressistas, os memes se apresentam como um recurso privilegiado para
discursos reacionários e obscurantistas. Isso acontece por diversos motivos. Do ponto de vista
cognitivo, os memes se afiguram como um dispositivo particularmente hostil à reflexão e ao
posicionamento crítico, visto que os sujeitos que se engajam na sua distribuição desempenham
um papel fundamentalmente passivo e de conformidade individual à lógica do coletivo (do
contrário não seriam “memes). Em seu processo de difusão, os memes ajudam a consolidar a
lógica das bolhas, imunes ao diálogo e à crítica. Esse ambiente é particularmente propício à
extrema-direita. Um elemento adicional diz respeito à influência da cultura da “trolagem”
(trolling), que fornece o substrato do formato “meme”. Um aspecto fundamental do problema
é o papel que fóruns como 4-Chan e outros tiveram no desenvolvimento do formato. Nos
Estados Unidos, esses fóruns tiveram um papel fundamental na estruturação do fenômeno do
alt-right. Dessa forma, a pesquisa brasileira sobre os memes perde de vista aspectos
fundamentais do fenômeno que pretende investigar.

1. Uma bela teoria


“Repentinamente, tudo parecia possível; o mundo não estava condenado ao cinismo
político e o cumprimento burocrático de modos de viver absurdos. Os sintomas de uma
nova era revolucionária, uma era de revoluções que buscavam explorar o sentido da
vida, antes que tomar o Estado, eram aparentes em toda parte, da Islândia para a

3
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

Tunísia, do Wikileaks ao Anonymous e, logo, de Atenas até Madri e daí a Nova Iorque”
(CASTELLS. 2015: xv)

Faz menos de uma década desde que Castells escreveu essas palavras. O futuro parecia,
então, promissor, com possibilidades quase ilimitadas. Militantes ocupavam as ruas, em
grandes números, e desafiavam as autoridades. Diferentemente do passado, a coordenação das
ações não se fazia de cima para baixo. Ao contrário, ela se pautava num modelo igualitário e
compreensivo de tomada de decisão, que abarcava pautas distintas – e em certos casos
contraditórias. Bennett e Segerberg (2013) deram a esse modelo de ação o nome de “lógica da
ação conectiva”, em oposição ao velho modelo de “ação coletiva”. Para eles, enquanto a lógica
da ação coletiva implicaria em altos níveis de coordenação e em um esforço de construção de
identidade coletiva, a lógica da ação conectiva se basearia no compartilhamento de modelos
mais personalizados.
Tanto Castells quanto Bennett e Segerberg identificam o mesmo fator como
potencializando esse novo modelo de ação política: as mídias sociais. Ao fazê-lo, eles se
incluem numa estabelecida tradição que tomou por dado a ideia de que a internet teria um
impacto predominantemente positivo sobre a vida social e política. Longe de se basear no
resultado da observação empírica sobre o impacto da internet na vida social, essa perspectiva
traduziu um conjunto de perspectivas que se apresentaram como dominantes desde a origem
das mídias digitais. No Brasil, a obra de Pierre Lévy se tornou particularmente influente sobre
o potencial da internet de agir como instrumento de desestabilização das antigas hierarquias
comunicacionais. Ela promoveria a “liberação” do polo do emissor, na medida em que cada
indivíduo teria o potencial de se converter numa mídia em si mesmo. A internet consagraria
um modelo de comunicação todos-todos, em substituição ao modelo um-todos da mídia
tradicional, impressa ou eletrônica. O impacto geral desse processo seria o surgimento de uma
inteligência coletiva, que marcaria o advento de uma etapa inteiramente nova da humanidade
(LÉVY, 1993, 1999).
A obra de Richard Jenkins, posterior à de Levy, obteve uma influência ainda mais
global. Sua noção de cultura da convergência atualiza o conceito de inteligência coletiva para
um novo estágio de desenvolvimento tecnológico das mídias digitais (JENKINS, 2006). O
novo contexto não apenas se configura como uma oportunidade para o desenvolvimento de
produtos transmídia, como oferece um campo fértil para que os usuários das mídias não apenas

4
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

se transformem em produtores de conteúdo, como também possam distribuí-lo. Jenkins deu a


esse fenômeno o nome de “cultura participativa” (existe alguma cultura que não o seja?).
Tão popular quanto suas obras tenham se tornado, Lévy e Jenkins são apenas
divulgadores de ideias que se originaram em outra parte. Tal como acontece com inúmeros
outros conceitos, o discurso que associava a internet a um novo paradigma civilizatório foi
forjado por instituições situadas fora do campo acadêmico, alinhado a um discurso neoliberal
mais abrangente. A lógica que preside a substituição de “átomos por bits” (NEGROPONTE,
1995) é a mesma por detrás do processo do capitalismo financeiro de escala global. A produção
material perde espaço para a circulação de informação. Instituições como o think tank Progress
and Freedom Foundation (PFF), ligado ao Partido Republicano dos Estados Unidos tiveram
um papel fundamental nesse processo. Textos como “Cyberspace and the American Dream: A
Magna Carta for the Knowledge Age”, publicados pela PFF, ajudaram a sistematizar premissas
que ganharam status de fato para analistas posteriores (MOSCO, 2005).
Nessa lógica, a realidade virtual se torna a realidade. O ciberespaço se apresenta como
a forma superior do espaço, a cibercultura se transforma no único referencial para a cultura.
Não menos importante, o discurso que se tornou dominante sobre a internet assumiu um claro
caráter antinstitucional e antipolítico. O corolário da “liberação do polo do emissor” é a
libertação do indivíduo frente a toda forma de hierarquia e, em última análise, do Estado
(MOSCO, 2005).
A agenda da pesquisa acadêmica logo se viu influenciada por esse tipo de premissas.
Um exemplo pioneiro se deu no campo das pesquisas sobre o impacto da internet na
reestruturação dos partidos políticos. A principal linha de investigação, aqui, disse respeito
dizia respeito tanto ao âmbito da competição interpartidária quanto o das relações
intrapartidárias. No primeiro caso, tornou-se popular a hipótese da equalização da competição.
O argumento, por trás dela é que a internet baratearia a comunicação política e, por esse motivo,
permitiria aos partidos menores melhores condições para concorrer com as legendas mais
estabelecidas. A hipótese rival – de que a política de sempre prevaleceria e a internet não
abalaria o equilíbrio do jogo ficou conhecida como hipótese da normalização. No segundo
caso, as pesquisas consideravam a possibilidade de que a internet abalaria a distribuição de
poder no interior do partido, dando maior poder aos cidadãos comuns frente às hierarquias
partidárias. Em ambos os casos, partiu-se da ideia de que a internet tinha o potencial – a ser
verificado – de transformar inteiramente o conjunto de práticas políticas. Chama a atenção o

5
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

pouco diálogo que essa literatura estabeleceu com uma tradição muito antiga e bem
consolidada de estudos sobre modelos de organização partidária (ALBUQUERQUE &
MARTINS, 2010).
Outro exemplo da mesma lógica diz respeito à análise do modelo de manifestação de
ruas que abre essa seção. Inúmeros trabalhos contemplaram eventos estruturalmente muito
semelhantes ocorridos em partes diversas do mundo: Primavera Árabe, Indignados, Occupy,
Praça Tahrir e, não menos importante, o momento em que “o gigante acordou” no Brasil de
2013. Em todos os casos, trabalhos destacaram o caráter espontâneo desses movimentos, que
não tinham lideranças claras, e interpretaram o fenômeno como significando a emergência de
uma autoridade política que emergia diretamente “das ruas” e abalava os poderes estabelecidos.
Uma bela teoria, sem dúvidas, pelo menos de um ponto de vista poético. Considerada sob um
prisma concreto e pragmático, porém, questões fundamentais deixaram de ser consideradas.
Por exemplo: como é possível produzir uma ação política coordenada sem que alguma
instância de coordenação esteja presente? Olhados friamente, conceitos como “ação conectiva”
parecem uma versão mais sofisticada da teoria da geração espontânea. Ratos nascem da estopa
assim como a ordem surge do caos.
Três consequências decorrem do modelo teórico da ação política espontânea “das ruas”.
Em primeiro lugar, existe o problema pragmático. Uma vez que os protestos ocorram, como
fazer para que as demandas apresentadas produzam resultados concretos? Se as demandas são
dispersas, e enunciadas por agentes não hierarquizados, como fazer para selecionar quais delas
serão privilegiadas?
O segundo problema diz respeito à própria dinâmica interna das manifestações: como
impedir que a agenda do movimento seja capturada por agentes externos, interessados em
manipulá-lo para seus próprios fins? O caso das chamadas Jornadas de Junho de 2013 é
exemplar, a este respeito. Inicialmente convocadas para protestar contra o aumento no preço
do transporte público, elas se tornaram manifestações contra todo o tipo de coisas (“não é
apenas pelos 20 centavos”) até que, finalmente, se convertessem em manifestações contra o
PT. Os responsáveis originais pelas manifestações acreditavam que a força das ruas empurraria
o governo petista “mais para a esquerda”. O resultado obtido foi o oposto disso.
O terceiro problema aponta na direção do populismo. De maneira geral, o populismo
tem sido definido por um conjunto de características que incluem: o apelo ao povo, tido como
virtuoso a priori e única fonte legítima de autoridade política; uma postura de antagonismo

6
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

frente às elites de toda ordem; o desprezo pelas instituições em geral, e ao princípio da


democracia representativa em particular. Nesse modelo, ações de natureza expressiva, nas
quais a vontade do povo se manifesta diretamente – nas ruas, por exemplo – têm muito mais
relevância do que gestos formais como o voto. Cada uma dessas características foi louvada no
discurso dos autores que viram nas manifestações da década de 2010 a semente de um novo
modelo de revolução. As mesmíssimas características que, hoje, definem o populismo e a
extrema-direita como portadoras de uma ameaça existencial à democracia. O que aconteceu
nesse meio tempo?

2. Os fatos brutais
No dia 6 de janeiro de 2021, uma multidão se reuniu na capital do país mais poderoso
do mundo. Naquele dia, os representantes eleitos no ano passado confirmariam, no Capitólio –
a sede do poder Legislativo dos Estados Unidos – a escolha do novo presidente do país. Do
lado de fora, manifestantes se aglomeravam, protestando contra o que lhes parecia ser a
legitimação de uma fraude eleitoral e, em última análise, um golpe de estado. Grupos tão
distintos em suas denominações como Black Conservatives Fund, Tea Party Patriots, Proud
Boys e Moms for America se uniram na Marcha para Salvar a América. Ornados com as cores
dos Estados Unidos e portando bandeiras nacionais, a multidão conseguiu forçar passagem
para dentro do Capitólio, sobrepujando as forças de segurança ali estacionadas. Seguiram-se
cenas caóticas. Os representantes eleitos tiveram que interromper o seu trabalho e foram
evacuados para um lugar mais seguro, enquanto o interior do complexo era ocupado por
manifestantes. Os ativistas se valeram largamente das mídias sociais para organizar suas ações.
Tivessem acontecido em outro tempo e lugar, esses atos teriam sido retratados como a
legítima manifestação popular, expressa pelas “ruas”. Foi isso o que aconteceu na Ucrânia, em
2014, com um resultado mais positivo para os manifestantes: o presidente Viktor Yanukovich
foi afastado do cargo. Semelhanças também podem ser encontradas com as manifestações pelo
impeachment de Dilma Rousseff, no Brasil. Em ambos os casos, bandeiras nacionais foram
apropriadas por grupos de extrema-direita, mídias sociais se transformaram em instrumentos
de coordenação dos manifestantes, e a presença vívida da multidão nas ruas se apresentou como
princípio de autoridade, em contraste com a “frieza” dos procedimentos institucionais. O
caráter “espontâneo” das manifestações foi destacado, e o apelo a organizações sem líderes,

7
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

“anônimas” (Anonymous, QAnon) teve grande importância simbólica. Ainda mais importante,
de um ponto de vista estritamente formal, a tomada do Capitólio (poderíamos chamá-la de
“Occupy Capitólio?”) se parecem muito com aquelas louvadas por Castells e
Bennett/Segerberg.
Não apenas as previsões otimistas desses autores não se confirmaram, como elas se
reverteram totalmente num curto espaço de tempo. A eleição de Donald Trump para a
presidência dos Estados e o referendo que decidiu pela saída do Reino Unido da União
Européia (Brexit), em 2016 representou uma mudança radical nos rumos da pesquisa
acadêmica. Como que por mágica, a promessa da democracia das ruas perdeu todo o seu
encanto. Em seu lugar, uma apreensão generalizada tomou conta da agenda de pesquisa.
Termos como populismo, fake news e polarização política entraram na ordem do dia da
pesquisa acadêmica.
Um novo consenso acadêmico se formou. Ao invés de focar no potencial libertador das
mídias sociais, ele passou a destacar o seu potencial disruptivo. As mídias sociais dão voz e
poder aos extremistas. Elas propiciam as condições para uma crise de autoridade de instituições
fundamentais da sociedade, como as organizações da política representativa, o judiciário, a
mídia, a ciência. Se o poder institucional é perverso, e as verdades múltiplas dos cidadãos são
todas, igualmente válidas, então por que não defender o terraplanismo? Por que seriam as
instituições médicas e científicas dignas de confiança? Por que um divulgador de conteúdo
(pseudo) científico do Youtube seria menos válido do que um cientista cuja competência é
atestada por critérios acadêmicos?
Igualmente, tornou-se patente que a tecnologia não é neutra. Para começar, nas
plataformas de mídias sociais, humanos interagem com “robôs”, artifícios tecnológicos que se
parecem com usuários humanos que ajudam a formar a “opinião pública digital”. Não menos
importante, tornou-se evidente que as plataformas de mídias sociais são empresas (de alcance
global) e que, portanto, adota um modelo comercial de gestão do conteúdo. As mídias sociais
não são uma ágora de alcance global, na qual todos têm igual oportunidade de se expressarem
livremente. Os algoritmos dessas plataformas dão mais ou menos visibilidade a essas
manifestações em função, dentre outros fatores, do engajamento que elas proporcionam. Essa
lógica – premiada com monetarização pelo Youtube – incentivou a produção de conteúdo
polarizador e inflamatório. Finalmente, não se pode esquecer que, como players globais (na

8
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

maior parte dos casos sediados nos Estados Unidos), as plataformas também têm (e são
influenciadas por) interesses políticos.
Finalmente, o ideal romântico dos movimentos sem líderes e hierarquias sofreu um
duro golpe. Ficou claro que não é porque você não saiba quem são os líderes que eles não
existem. Movimentos “espontâneos” recebem aporte financeiro de agentes organizadores, seja
em um veio neoliberal, seja no campo da extrema-direita.
Numa virada dramática, as mesmas instituições que eram alvo das críticas e
desconfianças por parte dos defensores da democracia das ruas se tornaram o bastião da
civilidade política. Nada ilustra melhor esse processo do que a atenção dedicada ao fenômeno
da fake news a partir de 2017. Trata-se de um caso espantoso de promoção de uma perspectiva
acadêmica em escala industrial (e apressada) e âmbito global. Sob muitos aspectos, o artigo
“Social Media and the Fake News in the 2016 Election” merece o crédito como pedra
fundamental desse esforço analítico. O seu impacto bibliográfico é imenso. À época em que
esse texto é escrito, ele conta com mais de quatro mil citações. O artigo foi escrito por
economistas e publicado numa revista de economia – uma ilustração do princípio do
“imperialismo econômico”, isto é, a proeminência da economia como campo que se sobrepõe
aos demais (LAZEAR, 2000), uma característica da lógica acadêmica em tempos neoliberais.
O que é particularmente fascinante no artigo é que seus autores Allcott e Gentzkow (2017) em
momento algum definem o que é fake news. Ao invés disso, eles dão um tratamento puramente
empírico ao termo, e o fazem de forma terceirizada (outra característica da pesquisa
contemporânea): fake news são aquilo que as agências de fact checking dizem que são.
Duas consequências importantes derivam dessa virada epistêmica. Por um lado, toda a
tradição – estabelecida ao longo de décadas – que lidava com a notícia a partir da perspectiva
da construção social da realidade viu-se soterrada de um só golpe. Isso não aconteceu porque
uma perspectiva nova se provou mais adequada, em diálogo com ela. A perspectiva do fake
news simplesmente deu um “reset” no debate anterior, e começou do zero. Se existem notícias
falsas, haverão de existir as verdadeiras (pois do contrário não existiria um parâmetro de
comparação). Por outro lado, a agenda dos fake news tem importantes consequências políticas.
Quais notícias recebem o status de true news? As notícias produzidas pela mídia corporativa.
Seu status quase nunca é questionado pelas agências de fact-checking. Outras fontes –
incluindo políticos – têm suas afirmações verificadas e classificadas em gradientes de
falsidade. Em nome do combate às fake news, um complexo sistema de verdade corporativa

9
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

foi estruturado, envolvendo instituições da mídia tradicional, plataformas de mídias sociais,


fundações, agências de fact-checking, dentre outras. Embora esse sistema se legitime em
oposição às forças da extrema direita anti-institucional, ele tem o poder de penalizar todos os
agentes que se afastam da ortodoxia neoliberal.
Em resumo, diante do rápido avanço das forças de extrema-direita, a agenda dominante
da pesquisa em comunicação política refluiu para uma lógica de “controle de danos”. Na
prática, isso significou naturalizar as instituições centrais da ordem neoliberal como
garantidoras de estabilidade política.

3. “Os memes são nossos amigos”


A pesquisa sobre o uso político dos memes ilustra de modo particularmente expressivo
os limites que impediram a literatura acadêmica brasileira de compreender adequadamente os
avanços da extrema-direita no Brasil. Dito de forma simples, o termo meme se refere a duas
coisas bastante diferentes entre si. De um lado, ele se refere a um artefato cultural específico,
moldado a partir de certas circunstâncias tecnológicas propiciadas pelo advento das mídias
digitais. De outro lado, ele se refere a um corpo teórico que se propõe a entender o modo como
as ideias circulam. Esse corpo teórico por vezes recebe o nome de memética. A tradição de
estudos sobre memética se origina da pesquisa do biólogo evolucionista Richard Dawkins. Em
termos muito simples, o meme é a versão cultural do gene. Enquanto o gene é a unidade
fundamental da reprodução dos seres vivos, o meme seria uma unidade fundamental de
reprodução da cultura. Do mesmo modo como a evolução dos vivos se basearia numa disputa
entre genes egoístas, a evolução da cultura se pautaria numa disputa entre memes (Dawkins,
1976).
A corrente dominante de pensamento sobre os memes da internet mistura elementos da
memética com o modelo de cultura participativa de Jenkins – a referência central, aqui, é a
obra de Shifman (2014). Essa combinação é um dos principais fatores que explica a debilidade
analítica dessa corrente, e sua incapacidade em dar conta do uso privilegiado dos memes pela
extrema-direita. Comecemos pela memética. Trata-se de uma teoria sobre a cultura produzida
a partir da perspectiva da biologia (evolucionista), e inúmeros problemas se seguem daí.
Consideraremos dois deles. Em primeiro lugar, manifesta-se, aqui, um exemplo de
imperialismo metodológico, similar ao imperialismo econômico mencionado acima. Algo
similar ocorre aqui. Uma imensa tradição acadêmica se desenvolveu em torno do conceito de

10
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

cultura, em disciplinas como a sociologia e a antropologia. A memética não dialoga com essa
tradição. A consequência disso é que a agenda do debate é ditada por prioridades do
evolucionismo: que ideias são capazes de se reproduzir? Todas as demais questões (oriundas
das ciências humanas) são desconsideradas. O segundo problema de certo modo decorre do
primeiro: a perspectiva da história natural elimina a possibilidade de se considerar os memes
do ponto de vista da sua historicidade. A existência dos memes é tomada como um dado, e a
agência humana é considerada como um aspecto secundário da questão. Torna-se, assim,
impossível, à luz da teoria memética, questionar os memes à luz de uma perspectiva estratégica.
Os problemas derivados da perspectiva da cultura participativa são de outra ordem.
Coerentemente com suas premissas, essa perspectiva tende a destacar o aspecto positivo do
aparato meme, tomado a priori como um instrumento a serviço do esclarecimento e do
empoderamento de setores marginalizados da sociedade. Um exemplo particularmente
expressivo disso é fornecido pela coletânea “A cultura dos memes” (CHAGAS, 2020). O livro
não apresenta um conjunto representativo da produção internacional sobre os memes,
naturalmente, mas constitui um esforço de curadoria, estruturado a partir de certos princípios.
A razão para isso é que a disponibilidade de literatura em português tende a influenciar
consideravelmente os rumos do debate acadêmico no Brasil, ao menos no campo da
comunicação. Por conta do nosso tema, focamos aqui nos artigos que compõe a parte 2 do
livro, que trata da relação entre memes e política. Nos referimos, aqui, às edições originais dos
textos coletados, e não à versão em português publicada no livro. Fazemos isso porque
acreditamos que a data da publicação original é um dado relevante para entender o estado do
debate em que eles originalmente se situavam.
O que o conjunto dos textos que compõem essa seção nos indicam? Em primeiro lugar,
com exceção de um texto, todos os demais descrevem os memes de maneira positiva a priori.
Os memes são nossos amigos. Dentre eles, o texto de Milner (2020) é o que apresenta maior
linha de continuidade com o argumento geral apresentado por Bennett e Seberberg (2013) e
por Castells (2015). Ao analisar o caso de Occupy Wall Street, Milner (2013) sustenta que a
mídia participativa teve um papel crucial na organização das ações dos manifestantes. Ela não
apenas teria servido como instrumento de construção de uma agenda comum, como também
atuado como instrumento de negociação de conflitos. O recurso ao humor e às formas altamente
reconhecíveis oriundas da cultura pop. O grau de positividade que Zuckerman (2013) atribui
aos memes pode ser depreendido do exemplo que abre sua introdução: um homem comemora

11
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

o sucesso da Primavera Árabe, versão Egito, com um cartaz no qual se lê: “Obrigado,
Facebook”. Zuckerman apresenta, no texto, uma sequência daquilo que chamou de “teoria dos
gatos fofos”. Ao apelar para imagens simples e apelativas, a internet se constituiria em um
poderoso instrumento de mobilização política, já que permitiria aos netizens atingir pessoas
com resistência a mensagens políticas de cunho mais formal, além de driblar instrumentos de
censura pautados nelas. Tay (2014) igualmente insiste no poder empoderador do humor, com
base no conceito de LOLitics – uma combinação de memes da internet e humor político. O
potencial revolucionário do humor presente nos memes é a base também do texto de Rentschler
e Thrift (2015). O seu foco específico recai sobre o potencial que esse formato apresenta do
ponto de vista da luta feminista. Segundo elas, esse formato, aliado ao potencial de distribuição
das plataformas de mídias sociais ofereceria novas oportunidades para a crítica feminista.
O único texto que destoa, no tom e no objeto, do conjunto representado no livro de
Chagas é o artigo de Philips (2012). Dentre todos é o único que não foca suas energias na
qualidade dos memes em si; ao contrário, critica o tratamento deletério dedicado a eles pelas
mídias tradicionais. Os memes e a cultura digital responsável por eles seria objeto de um
processo de pânico moral. O que torna a leitura do texto particularmente instigante, em 2021,
são os personagens envolvidos na trama. A grande mídia é representada aqui pela Fox News e
a mídia alternativa perseguida por ela é o forum /b/ do 4chan, dedicado ao politicamente
incorreto e trolagem. Ambos os agentes desempenharam um papel de proa no suporte ao
mandato do presidente Donald Trump, e sua campanha derrotada à reeleição, em 2020 (o 4chan
é o ambiente no qual se originou o movimento negacionista e conspiracionista QAnon). A
convergência entre esses dois atores em torno de uma agenda de direita radical e negacionista
provavelmente seria inimaginável quando o texto foi originalmente escrito. Contudo, chama a
atenção que não tenha sido chamada a atenção para o fenômeno em um livro publicado em
2020. Seria cabível sugerir, a partir desse exemplo, que os memes não são necessariamente
nossos amigos. Mas por que deixar a dura realidade atrapalhar uma teoria tão bela?
Seria injusto cobrar dos autores citados a responsabilidade por antecipar em suas
análises o que muito poucos ou ninguém foi capaz de fazer. É imperioso, contudo, submeter
suas obras a um rigoroso escrutínio, considerando que as brilhantes promessas de futuro que
elas desenhavam provaram o seu fracasso nos últimos anos. Olhadas com o devido
distanciamento, as práticas louvadas por esses autores como inovadoras e progressistas por
esses autores são agora vistas como portadoras de uma ameaça existencial à democracia.

12
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

Termos como populismo e comportamento anti-institucional estão hoje na agenda do dia (de
atores políticos, e da pesquisa acadêmica) das ameaças que se apresentam hoje à democracia
liberal.
O que eles deixaram de ver? O primeiro aspecto a se destacar é que esses autores não
ignoraram de todo esses problemas. Milner, por exemplo, atenta para as possíveis apropriações
populistas dos formatos cuja eficácia ele louva, mas descarta a sua importância no final das
contas. O mesmo se dá para considerações sobre a superficialidade política da cultura pop e
sua incapacidade de servir de esteio para ações coordenadas de médio/longo prazo. O caso de
Zuckermann é ainda mais interessante. Como ele mesmo observa, sua teoria dos “gatos fofos”
se originou de uma pesquisa financiada pela Fundação Open Society, em 2007. O objetivo da
iniciativa era propor ferramentas digitais e plataformas voltadas para ativistas. Em outras
palavras, Zuckerman simultaneamente defende a existência de uma cultura política
participativa, pautada na ação espontânea de ativistas e de uma iniciativa financiada por uma
instituição do mainstream neoliberal no sentido de fomentar esse tipo de ação. Nenhuma
contradição é observada, aí.
O que fica de fora desse tipo de abordagem? Em primeiro lugar, existe a questão da
agência. Três fatores contribuem para isso. A teoria da memética incentiva a olhar os memes
como entidades de direito próprio. Ao lado disso, o modelo de ação conectiva e cultura
participativa faz a organização social derivar de um processo de geração espontânea. Tal
premissa é inteiramente consistente com as premissas mais amplas do neoliberalismo. “A
sociedade não existe”, dizia Margareth Thatcher. Finalmente, os memes são por vezes
considerados como um gênero comunicativo de direito próprio (WIGGINS & BOWERS,
2014). O que ocorre, aqui, é um processo de fetichização, que resulta da desconsideração do
contexto social concreto em que os memes são forjados e compartilhados. Esse processo de
fetichização ignora os elementos fundamentais da economia política dos memes, tais como o
papel que as mídias sociais desempenham como agentes de distribuição e regulamentação de
mensagens públicas em escala global. Quando um manifestante levanta um cartaz que diz
“obrigado Facebook”, isso não diz tanto sobre o poder político das multidões quanto sobre o
poder político de plataformas capitalistas com escopo de atuação global.
Em segundo lugar, existe a questão do poder. A perspectiva idílica sobre os memes
apenas é capaz de perceber o poder naquilo a que os militantes (tidos a priori como
progressistas) se opõem. O processo de produção e compartilhamento de memes é suposto

13
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

ocorrer num vácuo político, no qual nenhum outro interesse (além do combate às formas
injustas do poder) pode existir. De outro modo, as ações dos manifestantes deixariam de ser
espontâneas. Por esse motivo, essa perspectiva se torna incapaz de dar conta da possibilidade
de que atores dotados de agendas muito específicas sejam capazes de se misturarem a esses
agentes e conduzi-los na direção de seus próprios interesses. Alguns desses agentes são
claramente identificáveis (como a Fundação Open Society, no exemplo citado acima). Outros
negam ativamente qualquer elemento identitário, e se apresentam como grupos anônimos.
Ilustram esse segundo tipo os grupos Anonymous e QAnon, ambos forjados no ambiente do
4Chan. Não é porque você não sabe quem é o líder que não existe nenhum.
Finalmente, existe a questão da história. Não surpreende que uma perspectiva fundada
na perspectiva evolucionista da história natural seja hostil ao olhar da história social. O
neoliberalismo provê uma base alternativa para o mesmo processo. Ele também promove um
olhar que se propõe transcendente à história – basta pensar na tese do “fim da história”, de
Francis Fukuyama. Não espanta, portanto, que essa corrente analítica seja incapaz de – ou não
tenha qualquer interesse em – situar o contexto de produção histórica dos memes, isto é, os
fóruns que ajudaram a padronizar sua linguagem, seus canais de distribuição, e os valores
sociais que cercaram o seu desenvolvimento como formato. Ao invés disso, ela apresenta os
memes como mais um produto de geração espontânea, o tipo de magia que a “cultura
participativa” proporciona.
Por desconsiderar esses elementos, essa vertente da literatura acadêmica se torna inútil
para dar conta do modo como os memes se tornaram parte inerente da cultura da extrema-
direita contemporânea. Se quisermos entender o modo como isso ocorre, temos que explorar
uma perspectiva diferente. Esse ponto será melhor desenvolvido na próxima seção.

4. Os memes e a estetização da política


Eis a estetização da política, como a pratica o fascismo.
O comunismo responde com a politização da arte
(BENJAMIN, 1994).

Nos últimos anos, pesquisadores começaram a prestar mais atenção no modo como a
extrema-direita se apropriou do espaço digital – e dos memes em particular, como recurso de
organização. Mesmo autores que tomavam por dado o caráter emancipador, progressista do
espaço digital e dos memes aderiram a esse olhar. O que aconteceu? Foram os memes

14
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

sequestrados do seu nascedouro progressista e convertidos ao credo da extrema-direita? Nada


estaria mais longe da verdade. Uma perspectiva que considere o formato meme do ponto de
vista da sua historicidade sugere algo bem diferente: os memes não são produtos espontâneos
da cultura participativa, mas foram forjados em ambientes sociais específicos, os mesmos que
deram origem ao fenômeno do alt-right.
Desde os seus primórdios, antes da web comercial, a cultura digital se tornou um terreno
fértil para a causa conservadora. Isso não aconteceu por acaso, dado que homens brancos de
classe média (e anglófonos) foram o alvo prioritário que as empresas responsáveis pelos
primeiros videogames e microcomputadores, na virada das décadas de 1970 e 1980
(LAMERICHS, et al; 2018; SALTER, BLODGETT; 2017). Foi em ambientes quase
inteiramente masculinos que os primeiros esboços de uma cultura geek se formaram (CONDIS,
2018). Os homens que moldaram essa cultura constituíam um grupo muito particular no
universo masculino. Associados à aptidão intelectual, antes que física, eles representavam uma
parcela com baixo prestígio no universo masculino. A revolução digital não apagou os traumas
que esses homens experimentaram na socialização adolescente, mas lhes deu o meio de
constituir um novo status. Nos limites desse novo mundo, eles tinham o poder de definir as
regras do jogo. Os games, em especial, apresentavam a eles a oportunidade de experimentar
aspectos de uma experiência hiper masculina, com corpos hipertrofiados, muita violência,
fantasias e sentidos estimulados. Essa experiência, contudo, contrastava vivamente com a do
seu cotidiano. Não é de se espantar, portanto, que o novo ambiente digital tenha se tornado um
terreno fértil para uma cultura do ressentimento. Esse elemento de ressentimento fica muito
explícito no título do livro de Angela Nagle (2017) – Kill All Normies – uma das primeiras
autoras a dar a devida atenção ao fenômeno. E, como apontado por diversos autores o
ressentimento é uma das bases psicológicas na qual se sustenta a extrema-direita.
Com bastante frequência, os homens que fizeram do ambiente digital a base para a
construção de uma nova identidade (geek) reproduziam as dinâmicas de discriminação das
quais eram vítimas no mundo offline. Muito diferente dos amáveis personagens da série retrô
Freaks and Geeks (situada nos anos 1980), da NBC (1999), vítimas dos valentões (bullies)
adolescentes, eles viram a oportunidade de se converterem, eles mesmos nos valentões do seu
novo universo. Este universo rapidamente estabeleceu seu principal antagonista: as mulheres.
A cultura digital é progenitora de um novo tipo de misoginia, pautada em um gatekeeping
masculinista que se aproveita do anonimato para difundir assédios que vão de xingamentos a

15
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

ameaças de morte, em mais um exemplo de politização de um ressentimento geek. Se a


pesquisa liberal focou a atenção nos safe spaces, glorificando uma cultura de campus que
protegeria identidades frágeis nas câmaras de eco, os verdadeiro safe spaces foram os tantos
espaços masculinos fundados no ciberespaço, prontos para agressivamente fechar às portas
para a presença feminina outsider. Comunidades relacionadas a temas vistos tradicionalmente
masculinos notavelmente registraram escárnio em relação a presença de mulheres (NAGLE,
2017).
O caso mais notável de gatekeeping hostil à presença feminina foi o #GamerGate. Ele
ocorreu em 2014, quando a desenvolvedora de games independentes Zoe Quinn foi falsamente
acusada de ter relações sexuais com Nathan Grayson, repórter do site Kotaku, sob intenção de
ganhar reviews positivos para o seu recém-lançado jogo Depression Quest. Gamers ressentiam
o jogo, uma história sobre doença mental com jogabilidade baseada em texto, como ameaça a
identidade gamer viril exemplificada pelos violentos jogos que tradicionalmente dominam a
indústria. Quinn sofreu inúmeras ameaças de estupro e morte, em um movimento que começou
nos chans e logo se espalhou por várias mídias sociais. Defensoras como a crítica feminista
Anita Sarkeesian, a atriz Felicia Day e outra desenvolvedora Brianna Wu também
imediatamente sofreram ataques. Dados pessoais (como telefones) das vítimas e mesmo
íntimos (fotos de nudez de Quinn) foram disponibilizados no ciberespaço. Quem se opunha à
trolagem era deslegitimado como SJW (social justice warrior), termo oriundo do Twitter
notavelmente usado para deslegitimar pautas progressistas, inclusivas e feministas.
O #GamerGate tem sido analisado como percussor essencial da organização do
movimento alt-right que resultou na eleição de Trump, dois anos depois (BEZIO, 2018),
repercutindo em novos movimentos de direita pelo mundo. Ele configura uma agressiva
postura reacionária de conservadores a feminização do mainstream, com nichos masculinos
que se entendem como herdeiros de tais culturas digitais se organizando para violentamente se
opor a uma cultura de massa feminina que chega à web quando esta se torna mais acessível.
Com espaços como os chans já aparelhados entornos da causa neoconservadora após o
#Gamergate (DEFAURE, 2020) bastaram outras agendas políticas como a oposição
xenofóbica de imigrantes, a homofobia e o ataque ao politicamente correto para toda a angústia
masculinista digital se tornar um movimento político organizado.
O ambiente digital também se revelou bastante fértil para grupos supremacistas raciais.
A falta de qualquer tipo de moderação do espaço digital, então marginal e apenas casualmente

16
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

mencionado na mídia de massa, atraiu grupos extremistas, cuja atuação se via limitada pelas
legislações vigentes. Não é de surpreender, portanto, que eles tenham se aproveitado do
potencial extraordinário que o novo ambiente proporcionava para a liberdade de expressão.
Relatos de presença de grupos arianos no ciberespaço vem desde a BBS, um espaço percussor
a Internet (WINTER, 2019). Com o lançamento da Web comercial em 1993, grupos
supremacistas logo se agilizaram para organizar espaços, com o site Stormfront, fundado por
integrantes do Ku Klux Klan do Alabama, sendo lançado em 1996, servindo como grande
percussor da cultura chan (e de grupos terroristas por trás da invasão do Capitório, como o The
Proud Boys) da década seguinte. Com conexões mais rápidas, no chamado período da Web 2.0
após a virada do milênio, diversas outras plataformas da extrema-direita apareceram, como o
InfoWars, The Daily Stormer e o Breitbart; teorias da conspiração, negacionismos e
movimentos como o terraplanismo voltavam das margens para ganhar força; figuras
ultrareacionárias como Alex Jones, Steve Bannon e Milo Yiannopoulos ascendiam de
excêntricos da Internet para importantes cabos eleitorais de figuras de extrema-direita. Não
apenas em plataformas próprias, mas também em espaços amplos como o Facebook, o Twitter,
o YouTube, o Reddit e os chans.
Os diversos grupos da extrema-direita eram dotados de sofisticado expertise no espaço
digital, além de pertencerem a demográficos com melhor condição financeira do que os
minoritários, assim dispondo de melhor tecnologia para manipulá-lo (SCHRADIE, 2019). As
tímidas tentativas de regulação feitas pelo Big Tech eram burladas com uma elaborada
estratégia comunicativa que tinha o humor como artifício principal: através do détournement
(NAGEL, 2019), forma de desafiar ideias hegemônicas através do absurdismo, o humor da
extrema-direita circulou memes que normalizavam discursos de ódio contra mulheres,
imigrantes e grupos étnicos. Escondendo-se através de referências internas de memes de
Senhor dos Anéis – o #orcposting comparava imigrantes aos invasores interdimensionais da
série, os grupos sucessivamente usaram a lógica mercadológica, superficial e de rápida
reprodução dos memes para configurar um complexo discurso de double talking, uma forma
de obscurantismo que estrategicamente se posiciona em duas frentes: para os órgãos
reguladores, “apenas uma piada”, para os próprios grupos de extrema-direita, uma nova
reverberação para discursos de ódio antes omitidos pelo mainstream. O caso de Pepe The Frog,
é exemplar, a este respeito. Originalmente uma piada apolítica – ele é, no final das contas, um
sapo desenhado no Paint – ele se tornou um símbolo do movimento alt-right. Sua importância

17
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

como símbolo extremista pode ser medida pelo fato de a Liga Anti-Difamação tê-lo incluído
como um símbolo de ódio, ao lado da suástica, da bandeira confederada e da cruz em chamas
da Ku Klux Klan.
Referências estéticas desempenharam um papel fundamental como demarcadores de
fronteiras no ambiente digital. O confuso layout, da board 4chan (2003), pode afastar usuários
comuns, mas é atraente para demográficos familiares ao modelo que evoca os primeiros anos
da Internet, em uma estética que valoriza o imaginário do “quando cheguei aqui, tudo era
mato”, um gatekeeping favorável a uma cultura formada por usuários de longa data. Camadas
e camadas de convenções linguísticas e simbólicas permitem separar os “iniciados” dos
demais, e ajudam a consolidar dinâmicas de autoridade nesse espaço. Referências da cultura
pop desempenham um papel fundamental na legitimação simbólica desse ethos. Nenhuma,
talvez, tenha tido tanto impacto como a metáfora da pílula vermelha, oriunda da trilogia Matrix,
de ficção científica. Ao tomar a pílula vermelha o protagonista abandona as ilusões do mundo
“falso” da experiência do mundo sensível para descobri-la no mundo digital – ironicamente, o
inverso do que ocorre no enredo do filme.
Os memes se apresentam como operadores centrais dessa dinâmica, graças aos artifícios
da “cultura participativa”. Ela apaga todos os traços de autoria e liderança por detrás dos
produtos da cultura digital e, portanto, dão a eles um caráter “radicalmente democrático” e
“espontâneo”. Não menos importante, a sua “ambiguidade humorística” é particularmente
relevante para a agenda da extrema-direita. Muito antes dos agentes progressistas, ela fez da
“brincadeira política” (CHAGAS, 2020b) o seu modus operandi. O humor é um dos principais
recursos que permite o double talking operar. Não é por acaso que humoristas de direita como
Danilo Gentilli tenham desempenhado um papel tão vocal na cena política brasileira recente,
com a bandeira do “politicamente incorreto” (SPONHOLZ & CHRISTOFOLETTI; 2018). A
identificação de potenciais emancipadores e progressistas no uso do humor político julga o
iceberg apenas pelo que ele deixa ver, acima da linha da água.
Igualmente relevante nesse sentido é a estetização do tosco: ao remeter a um
imaginário, desorganizado e desregulado período saudoso da Web 1.0, o 4chan posiciona o
anonimato ofensivo, inconsequente e odioso como contraponto essencial à internet
mainstream, para eles contaminada por políticas liberais que restringem a linguagem
inadequada e o discurso de ódio. A estética sobrevive fora do 4chan, com suas práticas e
conteúdos chegando de forma adaptada a espaços mais povoados (ZUÑIGA, MICHALSKA,

18
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

ROMMELE; 2020) como o Twitter (fundamental, por exemplo, no Trumpismo e no


Bolsonarismo), o Facebook (com grupos fechados igualmente pouco regulados em relação a
páginas públicas), o Reddit (que em nome da liberdade de expressão, deixou no ar o reduto
racista r/The_Donald, mais importante espaço de organização da sua eleição - (FIELTZ,
THURSTON; 2019) - ), fora redes privadas como o WhatsApp e o Telegram. A extrema-direita
também tem expertise para criar suas próprias alternativas, como o 8chan, nova casa para
supremacistas, pedófilos e conspiracionistas após ajustes na regulação do 4chan;
TheDonald.win, nova casa do The_Donald após, em 2020, enfim ser banido pelo Reddit e a
nova rede Gab (ZHOU, et al; 2018).
Enquanto a esquerda se viu limitada a discursos culturais em sites como o Tumblr
(violentamente vandalizado por trolls do 4chan em 2014) e ativismos do mundo real que iam
de estéreis flashmobs à perigosas movimentações sem líderes como a Primavera Árabe, a nova
direita usufruiu de ilimitadas possibilidades do espaço digital para o ativismo ultraconservador.
Se o #Occupy em 2012 pouco mudou o futuro do mercado de ações, a passeada do Unite the
Right rally em Charlottesville, 2017, representou a maior organização de grupos supremacistas
em décadas, reunindo ao ar livre grupos neonazistas, neoconfederados, do Ku Klux Klan e
paramilitares armados.

Conclusão
Poucos foram os que, no meio acadêmico, exploraram a ligação entre cultura digital e
política de extrema-direita – no Brasil há que se reconhecer o pioneirismo de Alves (2019). De
modo geral, as perspectivas dominantes sobre o tema permaneceram prisioneiras das
expectativas sobre a mídia digital forjadas a partir do credo neoliberal. Ao apostar na tese do
fim da história e nos discursos triunfalistas sobre o potencial emancipador dos ativistas
individuais em rede, tais análises perderam de vista as condições que possibilitaram a
emergência da extrema-direita e o modo como as mídias sociais serviram a esse propósito.
Lições históricas foram esquecidas, e pagou-se um alto preço por isso. As mídias digitais não
foram tabula rasa. As lições do passado permanecem válidas: a estetização da política não são,
em nenhum cenário, o caminho para políticas progressistas. Ontem, como hoje, permanecem
como o ambiente perfeito no qual prospera o fascismo.

19
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

Referências

ALBUQUERQUE, A & MARTINS, A Figueirola. Apontamentos para uma análise dos partidos na web.
Texto apresentado no XIX Encontro da Compós, PUC-RIO, Rio de Janeiro. 2010
ALLCOTT, H, & GENTZKOW, M. Social Media and Fake News in the 2016 Election. Journal of Economic
Perspectives 31(2): 211-236. 2017
ALVES, Marcelo. “#VaiPra Cuba: A Gênese Das Redes De Direita no Facebook”. Curitiba: Appris. 2019.
BENJAMIN, Walter. A obra de arte na era de sua reprodutibilidade técnica. In: Magia e técnica, arte e política
– Obras escolhidas; v. 1. São Paulo: Brasiliense, 1994, p. 165-196. 1994
BENNETT, L & SEGERBERG, A. The Logic of Connective Action. Digital Media and the Personalization
of Contentious Politics. Cambridge: Cambridge University Press. 2013
BEZIO, Kristin. Ctrl-Alt-Del: GamerGate as a precursor to the rise of the alt-right. Leadership 0(0) 1-11.
2018
CASTELLS, Manuel. Networks of Outrage and Hope: Social Movements in the Internet Age. Londres, Polity,
2nd ed. 2015
CHAGAS, Viktor (org.). A Cultura dos Memes. Salvador: Edufba. 2020a.
CHAGAS, Viktor. Dolce Farmene: a retórica da brincadeira política. XXIX Encontro Anual da Compós,
Universidade Federal de Mato Grosso do Sul, Campo Grande. 2020b.
CONDIS, Megan. Gaming Masculinity: Trolls, Fake Geeks and the Gendered Battle for Online Culture.
University of Iowa Press. 2018
DAWKINS, Richard. The selfish gene. Cambridge: Oxford University Press. 1976
DEFAURE, Maxime. The “Great Meme War”: the Alt-Right and its Multifarious Enemies. New
Perspectives on the Anglophone World. 10. 2020
FIELTZ, M; THURSTON, N. Post-Digital Cultures of the Alt-right: Online Actions and Offline
Consequences in Europe and the US. Edition Politik, 71. 2019
JENKINS, Henry. Cultura da Convergência. São Paulo: Aleph. 2006
LAMERICHS, N; et al. Elite Male Bodies: The Circulation of alt-right memes and the framing of politicians
on Social Media. Participations: Journal of Audience & Reception Studies 15(1). 2018
LAZEAR, Edward P. Economic Imperialism. The Quarterly Journal of Economics 115(1): 99-146. 2000.
LÉVY, Pierre. As tecnologias da inteligência. São Paulo, Editora 34. 1993
LÉVY, Pierre. Cibercultura. São Paulo, Editora 34. 1999
MILNER, Ryan. Pop Polyvocality: Internet Memes, Public Participation, and the Occupy Wall Street
Movement. International Journal of Communication 7: 2357-2390. 2013
MOSCO, Vincent. The Digital Sublime. Myth, Power, and Cyberspace Boston: MIT Press. 2005
NEGROPONTE, Nicholas. A Vida Digital. São Paulo, Companhia das Letras. 1995
NAGLE, Angela. Kill All Normies. Zero Books. 2017
NAGEL, Kelly Williams. Make America Meme Again: The Rhetoric of the Alt-Right, Quarterly Journal of
Speech, DOI: 10.1080/00335630.2020.1744818. 2020

20
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação
XXX Encontro Anual da Compós, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo - SP, 27 a 30 de julho de 2021

PHILIPS, Whitney. The House that Fox Built: Anonymous, Spectacle, and Cycles of Amplification.
Television and New Media 14(6): 494-509. 2012.
RENTSCHLER, C. A. & THRIFT, S. C. Doing feminism in the network. Networked laugher and the “Binders
full of women” meme. Feminist Theory 16(3): 329-359. 2015.
SALTER, A; BLODGETT, B. Toxic Geek Masculinity in Media: Sexism, Trolling and Identity Policing.
2017
SCHRADIE, Jen. The Revolution That Wasn’t: How Digital Activism Favors Conservatives. Harvard
University Press. 2019.
SHIFMAN, Limor. Memes in the Digital Culture. Boston: MIT Press. 2014
SPONHOLZ, L; CHRISTOFOLETTI, R. From preachers to comedians: Ideal types of hate speakers in
Brazil. Global Media and Communication. Vol 15, Issue 1. 2019
TAY, Geniesa. Binders full of LOLitics: Political humor, internet memes, and play in the 2012 Presidential
Election (and beyond). European Journal of Humor Research 2(4): 46-73. 2014
WIGGINS, B. E. & BOWERS, G. Memes as genre: A structuration analysis of memescape. New Media &
Society 17(11): 186-1906. 2015.
WINTER, Aaron. ‘Online Hate: From the Far-Right to the ‘Alt-Right’, and from the Margins to the
Mainstream’. In Lumsden, Karen & Emily Harmer (eds.). Online Othering: Exploring violence and
discrimination on the web. London: Palgrave p.39-64. 2019
ZHOU, Y.; Dredze, M.; BRONIATOWSKI, D. A.; ADLER, W. D. Gab: The Alt-Right Media Platform
Disponível em: http://www.cs.jhu.edu/~mdredze/publications/2018_sbpbrims_gab.pdf. 2018.
ZUÑIGA, H. G. MICHALSKA, K. K; RÖMMELE, A. Populism in the era of Twitter: How social meddia
contextualized new insights into an old phenomenon. New Media & Society. Vol 22 (4) 585-594. 2020
ZUCKERMAN, E. Cute Cats to the Rescue? Participatory Media and Political Expression. In Allen,
Danielle & Light, Jennifer Youth, New Media and Political Participation. Boston: MIT Press, p. 131–154. 2014

21
www.compos.org.br
www.compos.org.br/anais_encontros.php

https://proceedings.science/p/130162?lang=pt-br
Powered by TCPDF (www.tcpdf.org)

You might also like