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Guerra Posição
Guerra Posição
Volume 3 - Caderno13
§ 8. A concepção crociana da política-paixão exclui os partidos, já que não se pode
pensar numa “paixão” organizada e permanente: a paixão permanente é uma condição
de orgasmo e de espasmo, que determina incapacidade para agir. Exclui os partidos e
exclui todo “plano” de ação concertado antecipadamente. Todavia, os partidos existem
e planos de ação são elaborados, aplicados e freqüentemente realizados em notável
medida; há, portanto, um “vício” na concepção de Croce. Nem vale dizer que, se os
partidos existem, isto não tem grande importância “teórica”, já que no momento da ação
o “partido” que atua não é o mesmo “partido” que existia antes; em parte, isto pode ser
verdadeiro, mas, entre os dois “partidos”, as coincidências são tantas que, na realidade,
pode-se dizer que se trata do mesmo organismo. Mas a concepção, para ser válida,
deveria poder ser aplicada também à “guerra” e, portanto, explicar a existência dos
exércitos permanentes, das academias militares, dos corpos de oficiais. Também a guerra
em ato é “paixão”, a mais intensa e febril, é um momento da vida política, é a
continuação, sob outras formas, de uma determinada política; é necessário, portanto,
explicar como a “paixão” pode se tornar “dever” moral, e não dever de moral política,
mas de ética.
Sobre os “planos políticos” ligados aos partidos como formações permanentes, cabe
lembrar o que Moltke dizia dos planos militares, ou seja, que eles não podem ser
elaborados e fixados previamente em todos os seus detalhes, mas só em seu núcleo e
esboço central, tendo em vista que as particularidades da ação dependem, em certa
medida, dos movimentos do adversário. A paixão manifesta-se precisamente nas
particularidades, mas não parece que o princípio de Moltke seja tal que justifique a
concepção de Croce: de qualquer modo, restaria por explicar o gênero de “paixão” do
Estado-Maior que elaborou o plano de modo frio e “desapaixonado”.
§ 139. Conflito entre Estado e Igreja como categoria histórica eterna. Consultar a
este respeito o capítulo correspondente de Croce, em seu livro sobre a política [118].
Pode-se acrescentar que, num determinado sentido, o conflito entre “Estado e Igreja”
simboliza o conflito entre qualquer sistema de idéias cristalizadas, que representam uma
fase ultrapassada da História, e as necessidades práticas atuais. Luta entre conservação e
revolução, etc., entre o que foi pensado e o novo pensamento, entre o velho que não quer
morrer e o novo que quer viver, etc.
Volume 3, Caderno 7 (miscelâneos)
§ 16. Guerra de posição e guerra manobrada ou frontal. Deve-se examinar se a
famosa teoria de Bronstein sobre a permanência do movimento não é o reflexo político
da teoria da guerra manobrada (recordar observação do general dos cossacos, Krasnov),
em última análise o reflexo das condições gerais — econômicas, culturais, sociais — de
um país em que os quadros da vida nacional são embrionários e fracos e não se podem
tornar “trincheira ou fortaleza”. Neste caso, seria possível dizer que Bronstein, que
aparece como um “ocidentalista”, era, ao contrário, um cosmopolita, isto é,
superficialmente nacional e superficialmente ocidentalista ou europeu. Em contraposição,
Ilitch era profundamente nacional e profundamente europeu. Bronstein recorda, em suas
memórias, terem-lhe dito que sua teoria se revelara boa ... quinze anos depois, e responde
ao epigrama com outro epigrama [122]. Na realidade, sua teoria, como tal, não era boa
nem quinze anos antes nem quinze anos depois: como sucede com os obstinados, dos
quais fala Guicciardini, ele adivinhou no atacado, isto é, teve razão na previsão prática
mais geral; como se se previsse que uma menina de quatro anos irá se tornar mãe e,
quando isto ocorre, vinte anos depois, se diz: “adivinhei”, mas sem recordar que, quando
a menina tinha quatro anos, se tentara estuprá-la, na certeza de que se tornaria mãe.
Parece-me que Ilitch havia compreendido a necessidade de uma mudança da guerra
manobrada, aplicada vitoriosamente no Oriente em 1917, para a guerra de posição, que
era a única possível no Ocidente, onde, como observa Krasnov, num breve espaço de
tempo os exércitos podiam acumular quantidades enormes de munição, onde os quadros
sociais eram por si sós ainda capazes de se tornarem trincheiras municiadíssimas. Parece-
me este o significado da fórmula da “frente única”, que corresponde à concepção de uma
só frente da Entente sob o comando único de Foch [123]. Só que Ilitch não teve tempo
de aprofundar sua fórmula, mesmo considerando que ele só podia aprofundá-la
teoricamente, quando, ao contrário, a tarefa fundamental era nacional, isto é, exigia um
reconhecimento do terreno e uma fixação dos elementos de trincheira e de fortaleza
representados pelos elementos de sociedade civil, etc. No Oriente, o Estado era tudo, a
sociedade civil era primitiva e gelatinosa; no Ocidente, havia entre o Estado e a sociedade
civil uma relação apropriada e, ao oscilar o Estado, podia-se imediatamente reconhecer
uma robusta estrutura da sociedade civil. O Estado era apenas uma trincheira avançada,
por trás da qual se situava uma robusta cadeia de fortalezas e casamatas; em medida
diversa de Estado para Estado, é claro, mas exatamente isto exigia um acurado
reconhecimento de caráter nacional.
A teoria de Bronstein pode ser comparada à teoria de certos sindicalistas franceses
sobre a greve geral e à teoria de Rosa no opúsculo traduzido por Alessandri: o opúsculo
de Rosa e a teoria de Rosa, de resto, influenciaram os sindicalistas franceses, como se
depreende de determinados artigos de Rosmer sobre a Alemanha na Vie Ouvrière
(primeira série em formato menor): procede também, em parte, da teoria da
espontaneidade [124].