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CAPITULO 15 O LUGAR DA CULTURA ESCRITA NA EDUCAGAO DA INFANCIA Regina Aparecida Marques de Souza Suely Amaral Mello 1. Para um inicio de conversa... Afinal, devemos ou nao alfabetizar as criancas na Educagao Infantil? NAO! E antes de discutir porque nao, queremos dizer que ndo usaremos neste capitulo nem alfabetizacao e nem letramento para nos referir a escrita e isso por uma razdo simples: letramento, ainda que se refira a insergao da pessoa no universo da cultura escrita, de fato lembra letra; alfabetizacao, ainda que se refira ao dominio da leitura e da escrita, lembra alfabeto. Vamos falar aqui em cultura escrita e em apropriagio da cultura escrita. Faz dife- renga usar um termo ou outro? Pensamos que a mesma diferenga que ha entre chamar a crianca da Educagao Infantil de crianga ou aluno... faz toda a diferenga quando queremos e precisamos rever a maneira como encaramos nossas criancas e como as ensinamos a ler e escrever. Dividimos este capitulo em dois momentos: no primeiro, buscamos en- tender, a partir da teoria histérico-cultural, a escrita como um instrumento cultural e seu papel na constitui¢ao de uma educagao de qualidade, apon- tando diretrizes para a apresentagao da cultura escrita numa perspectiva histérico-cultural. A partir dai, langamos um olhar critico 4 maneira como vemos a escrita tratada na escola hoje, de um modo geral. Num segundo momento, buscamos articular as diretrizes da teoria histérico-cultural com 4s praticas de convivéncia das criangas com a escrita. Para isso vamos apre- sentar algumas possibilidades de agao, dentre elas algumas das que estio Presentes na Pedagogia Freinet praticada no Brasil e algumas das que cons- tituem prdticas do Movimento da Escola Moderna portuguesa. Antes de iniciar propriamente essa discussdo, queremos deixar claro que A cultura escrita NAO ¢ a atividade mais importante da Educagao Infantil. A brincadeira de papeis sociais, a investigagao ¢ o conhecimento do mundo, a &xpresso das criangas por meio das tantas outras linguagens ~ como o de- Senho, a fala, o movimento, a musica, 0 gesto~, 0 ouvir € 0 contar pas 4telacdo com os adultos e as outras criangas sao cruciais como atividades {Ue promoyem o desenvolvimento humano na infancia. No entanto, acultura mo ae oe escrita é parte do conjunto da cultura com que a crianga Convive desde nasce e, como tal, nao deve ser negada as criangas pequenas, § i entretanto, buscar a forma adequada de apresentar a cultura escrita pai an criangas desde pequenininhas de modo a criar nelas a necessidade de ic e escrever. Em outras palavras, buscar como inserir 0 mundo da eects, universo da pequena infancia (FARIA; MELLO, 2012) . Queremos discutir a apresentagdo da cultura escrita para as criangas na Educagtio Infantil entendendo que a cultura escrita nao é um conjunto de Tetrinhas mas, sim, um instrumento cultural complexo que os seres humanos criaram para registrar fatos, comunicar informagoes, ideias e sentimentos aos outros, expressar opinides, fatos, informagdes, sentimentos e ideias, E entendemos que precisamos fazer isso sem retirar das criangas o di- reito a viver a infancia brincando e convivendo com o mundo ao seu redor, quer dizer, podemos apresentar a cultura escrita para as criangas na Educagio Infantil sem que a escola da infancia vire escola — escolarizagao — e sem fazer com que as criangas virem escolares enquanto ainda estdo na Educagio Infantil, isso porque as fungdes psiquicas superiores que as criangas precisam ter desenvolvidas para se apropriar da escrita se forma e se desenvolvem jus- tamente na idade pré-escolar, enquanto as criangas brincam. Por exemplo, a fungdo simbélica da consciéncia, ou seja, a capacidade de usar um objeto para representar outro que é essencial para a escrita, pois a escrita é representa 0 nome do objeto e o nome do objeto representa o préprio objeto real. A fungao simbélica da consciéncia é formada e desenvolvida na brincadeira de faz de conta quando a crianga vai aprendendo a usar um objeto existente para subs- tituir ou representar um objeto necessario 4 brincadeira e que ela ndo tem a mao, conforme discutimos no capitulo 11. Outro exemplo de fungao psiquica superior necessaria 4 apropriagao da escrita € o controle da vontade: nao es- crevemos 0 préprio nome pela metade porque temos vontade de fazer outta coisa, nem um bilhete, nem um lembrete. Quando surge a vontade de fazet outra coisa em meio a escrita, precisamos controlar esta vontade & terminat a escrita antes de fazer o que nos atrai. Essa percepgao do “eu quer ” neste momento eu nao posso”, a crianga aprende enquanto brinca com pape!s sociais aprende as regras do papel social e deve se comportar conforme i regras. Por isso, enquanto é princesa, nfio pode falar palavrao; enquanto © énibus, néio pode abandoné-lo com os passageiros no meio da TU SP prias criangas participantes da brincadeira chamartio a atengao par e oe ties nos papeis. Da mesma forma, o planejamento necessirio : a "a8 desisben oa ~ nao tratamos aqui de cépia! — é aprendida no PO pel como do que brincar, com que objetos, quem fica 2° P spymaster ye, como Se desenvolve a brincadeira, dao lugar na escrita crever 0 qUE quero dizer, como vou comegar. Tudo isso porque escrever nao pode se tornar al; rque “a professora mandou”. Partimos do pressuposto de que queremos e podemos formar crian as serem leitoras € produtoras de texto € nao copiadoras e repetidoras. Podemos formar criangas que vio ler e entender 0 que leem ld no ensino fundamental e por isso vao ter sucesso na escola de ensino fundamental, médio e superior. Do ponto de vista da teoria historico-cultural, esse processo comega ld no ber- gitio quando apresentamos os livros como objetos para serem manipulados, olhados e mordidos pelos bebés. Como lembra Caetano Veloso, “Os livros so objetos transcendentes, mas podemos amé-los com amor tactil”. a0 para quem vou IgO que a crianca faz 2. Nossa patria iletrada Para dimensionarmos a importancia do tema que vamos discutir aqui, queremos trazer alguns dados que nos parecem essenciais para definir o en- yolvimento e a atitude militante que nosso pais — “de muitas humanidades nessa provincia mais bonita da terra”, como diz Darcy Ribeiro*® — espera de nés, professoras e professores. Nossa patria iletrada fez, desde o inicio de sua histéria, uma op¢ao por manter a maior parte de seus habitantes fora da escola (COLISTETE, 2017). Pesquisa recente deste autor mostrou que 0 desempenho do Brasil na implantagao de um sistema educacional foi “espantosamente ruim e de- cepcionante”, mesmo quando comparado a paises semelhantes do ponto de vista da historia, da estrutura social e econémica do continente americano. Segundo o professor, se houvesse um prémio para a capacidade de deixar ctiangas fora da escola, o Brasil mereceria recebé-lo. Enquanto em 1830, nos Estados Unidos, 50% das criangas entre 5 e 14 anos estava na escola, em 1870, no Brasil, sé 6% dos meninos e meninas estavam na escola. Em 1920 ~ 50 anos depois -, México, Colémbia & Guatemala tinham a 20¢e 25% das criangas na escola, enquanto no Brasil, tinhamos apenas 15%, Em 1900, 05 Estados Unidos tinham mais de 90% das criangas em idade ma Na escola. Esse percentual, nds s6 atingiriamos 100 anos depois, na virada Para o século XXI. O argumento tradicional para Por escolas ~ é desmentido pela pesquisa justificar esse atraso —a falta de demanda_ de Colistete que mostra numerosos rasilero-sere-completa-e oy si VOT anidotom ze see-bsabe a Série O Povo Brasileiro. Di : . abaixo-assinados pedindo por escolas no aa meg alguns inclusive indicando que eram analfabetos os pais que aie vam, escolas Baw. filhos. O problema parece ter sido a centralizagao oe dos impostos ¢ das decises no Brasil, que rejeita a participago local. i: Mas se essa foi uma forma inicial e duradoura de exclusiio da maiorig de suas criangas do sistema educacional brasileiro, certamente nao foi a ‘nica. Conforme afirma a professora Marisa Meira (2012, p. 75): Em principio expressa na falta de oportunidades de acesso 4 escola de grandes contingentes de criangas, especialmente nas regides mais pobres do pais, e, mais adiante, em elevados niveis de evasio e Tepe- téncia, atualmente ela se revela de modo mais sutil, embora nao menos violento: a permanéncia nas escolas por longos periodos de tempo de criangas ¢ jovens que nunca chegam a se apropriar de fato dos con. tetidos escolares. E os nimeros sao alarmantes. Pesquisa*! que ja dura mais de dez anos sobre o dominio da habilidade de leitura, escrita e matematica entre os bra- sileiros com idade entre 15 e 64 anos revela que no periodo de 2000-2010 houve um aumento de 30 milhdes no ntimero de brasileiros com ensino su- perior e médio. No entanto, somente 62% das pessoas com nivel superior e 35% das pessoas com nivel médio podem ser consideradas plenamente alfabetizadas — e o que assunta ainda mais é que os nimeros pioraram em relacdo ao inicio da pesquisa. E, importante lembrar para dimensionarmos 0 significado desses nimeros, quem nao sabe ler — ler no no sentido de falar em voz alta os sons grafados no papel; mas ler no sentido de compreender, “pegar”, “sacar”, “perceber” a intengao de comunicagiio do autor do texto -, nao aprende gramatica, matematica, historia, ciéncias. 3. Compreendendo os equivocos da apresentacao da escrita E 0 que isso tudo tem a ver com a apresentagdo da cultura escrita na Educagao Infantil? Nossa hiptese para explicar 0 “fracasso” da escola bra- sileira é que nao estamos ensinando nossas criangas a ler e a escrever na escola. E isso porque estamos trabalhando com duas concepgées erradas: 4 Concepgao do que é ler e escrever, € a concepgio de como se aprende a let € a escrever. ——____ 31 INAF 2011 © 2012 — Instituto na iltima década, 5 fev, 2012, TEORIA HISTORICO-CULTURAL NA EDUCA conversando com professoras e professores, ‘conver eee eee 203 Por que pensamos que a escola brasilej errada do que seja ler € escrever? Para ilustrar com um exemplo, lembramos que 0 verbo escrever éum verbo bitransitivo, Isso significa que ae escrever, esereveros alguma coisa para alguém. Mas, acompanhando 0 cotidiano day instituigdes de educacio basica via estagios, praticas de ensino, cursos de for- magao continuada, participando de grupos de estudos e pesquisas, percebemos que, nas nossas escolas, escrever é sinénimo de copiar: copiar o que nés, pro- fessoras © professores, mandamos Copiar. Percebemos uma rotina de trabalho sistematico com a escrita, tanto da Educagao Infantil como nos primeiros anos do Ensino F ‘undamental, apoiada no alfabeto exposto acima do quadro de giz, sendo a leitura dessa ordem de letras uma tarefa didria para a memorizagiio, bem como a c6pia repetida quase diariamente no caderno de caligrafia. Dessa forma, escrever para as criangas se torna sinénimo de copiar o que alguém manda, em lugar de ser expressar um desejo, uma intengdo, um senti- mento, uma informacdo para alguém, ou uma memoria para se lembrar depois. Enquanto escrever se torna sinénimo de copiar, ler se torna sinénimo de decodificar simbolos escritos sob a forma de sons, ou seja, traduzir 0 escrito por sons: oralizar 0 texto escrito. E, de fato, ler é compreender a intengiio de comunicagao do autor. A leitura nao envolve sons, mas ideias. Entéio, preci- samos tratar a escrita ndo como grafia de sons, mas como grafia de ideias, de desejos, de sentimentos, de informagées. Se quisermos falar de um jeito mais tedrico, precisamos tratar a escrita como um instrumento cultural complexo que é uma representagio de se- gunda ordem. O que significa isso? A escrita representa a fala (o nome das coisas) e a fala (o nome das coisas) representa as coisas reais: por isso escre- vemos “leao” com uma palavra curta para representar um nome curto (que representa um bicho grande) e escrevemos “passarinho” com uma palavra longa para representar um nome longo que representa uma ave pequena. A escrita é uma representagao (do nome) de uma representagao (do objeto real): uma representagdo de segunda ordem. ; : Mas, para quem 1é e quem escreve, é preciso que a escrita se torne uma Tepresentacao de primeira ordem. O que isso significa? Quando lemos, pre- cisamos ler o real expresso por meio das palavras: as ideias, as informagdes, 0s sentimentos, as intengdes de comunicagao expressas no texto. Nao po- demos captar letras, silabas, nomes; precisamos captar as idsias Sikes NO texto, nosso cérebro precisa ir direto as ideias. Da mesma forma, quan Ff letras ou silabas, escrevemos ideias, &screvemos nao grafamos nomes, sons, Sentimentos, informagdes. ‘GAO INFANTIL: ira trabalha com uma concepgaio 7”-”..._——=—~-_(; Entiio podemos falar basicamente em duas concepgées de eserita:y ntende que a escrita representa 0s sons ~e, nor j-. ma velha concepgao que en eee isso : : cia entre sons . ona escola nos ensinaram a fazer a correspondén' € letras; 9 alfabets esta presente nas salas; 0s crachds costumam . a primeira letra do Tome dag criangas em cor de destaque — ¢ uma concep¢ao que entende que g escritg representa ideias, desejo de expressao. | Quando a escrita € apresentada segundo a velha concepgio, entsinamos as criangas a identificar letras ¢ buscar os sons correspondentes; ensinamos as criangas a oralizar e nao a ler, isto é, a buscar as intengdes de Comunicactig de quem escreveu 0 texto. Partindo da segunda concepeao, ensinamos as criangas a buscar as ideias expressas no texto, a buscar a intengfo de comy. nicagao do autor do texto e ndo a identificar as letras e os sons das palavras do texto, Ao criticar essa concepgao Vigotski (1995) afirma que ao enfatizar a copia e o reconhecimento das letras, acabamos por ensinar as criangas 9 tragado das letras, mas nao ensinamos a linguagem escrita. Afirma, ainda, que essa forma de apresentagao da escrita exige “enorme atengao e esforcos por parte do professor e do aluno, e devido a tal esforgo 0 processo se trans- forma em algo independente, em algo que se basta a si mesmo enquanto a linguagem viva passa a um plano posterior” (VIGOTSKI, 1995, p. 183). Ou seja, ao comegar pelo aspecto técnico e ao dedicar tanto tempo a ele, nos esquecemos da fungao social para a qual a escrita foi criada: nos esque- cemos que a escrita foi criada para responder a necessidade de registro, de expresso e comunicagao com o outro distante no tempo e no espago. A segunda concepgao equivocada diz respeito a como se entende que as criangas aprendem a ler e a escrever. A velha concep¢ao defendia—e defende ainda hoje — que as criangas aprendem de tanto ver, ouvir e copiar. E, pot isso, observamos as criangas copiando inumeras vezes e ao longo do ano as letras do alfabeto, circulando as vogais, repetindo os numerais, copiando 0s cabegalhos, decorando a sequéncia do alfabeto e dos numerais, copiando ¢ memorizando familias silabicas, formando palavras com silabas da mesma familia - “Ivo viu a uva” —, obscurecendo a linguagem escrita como tal. Quando apresentamos a escrita para as criancas comegando pelo aspecto técnico — isto é, pela técnica de escrever e dedicamos tanto tempo # seu treino, deixamos de lado a fungao social para a qual a escrita foi criada: n05 aE aescrita foi criada para responder a necessidade de ee ee © comunicagao com 0 outro distante no tempo ¢ nO wet ee herein ue a acontecer no ensino fundamen! sun propria iniitiva: the ehega de fora de ate rawr em # aquisigo de um hébito téonico” (VIGOTSKE ook a ‘ecnico” (VIGOTSKI, 1995, p. 183). O-CULTURAL N, ORIA HISTORIC! IA EDUCAGAO, Use wversando com professoras e professores GAO INFANTIL ee 205 4, Formando criangas leitoras e autoras Para a teoria hist6rico-cultural, que entende a escrita mento cultural complexo, 0 processo como as criangas a como um instru- escrever € outro. E para discutir esse Pprocesso, eee seers ers teses da teoria histérico-cultural. Meremos apresentar algumas Aprender significa ser capaz de teproduzir 0 uso do obj Aprendemos quando somos capazes de \duzii ee ai as i Teproduzir 0 uso do objeto, so edo social para a qual ele foi criado: um pente ae reldgio, um computador, um garfo, um copo, um texto escrito, Para se apropriar de um objeto ou fendmeno, ha que se efetuar a atividade correspondente que ¢ concretizada no objeto ou fe- némeno considerado” (LEONTIEY, 1978, p. 321). Aprendemos 0 uso de um objeto — como a escrita, por exemplo—com os outros, quando os outros usam esses objetos socialmente, quer dizer, de verdade, como objetos culturais auténticos. No caso da es- crita, quando os outros leem, por exemplo, para se informar de verdade sobre algo ou leem uma histéria para as criancas e quando escrevem um bilhete para alguém, uma lista para se lembrar do que fazer. 3. Aprender nao resulta de um processo mecanico, mas implica em dominio do objeto: saber usar o objeto na circunstincia correta. Por isso nao cabe falar em treino, mas em apropriagdo, dominio de um objeto cultural que traz consigo uma capacidade. 4. Aprender é um ato complexo que exige a presenga do sujeito por inteiro: 0 corpo fisico, a mente e a emogao (quer dizer, a vontade, 0 afeto). Isso significa que quando aprendemos alguma coisa nos transformamos. Aprender é resultado de um processo intenso que envolve muito mais que treino, muito mais que a mao e muito mais que a mao e a cabega. Aprender envolve o querer por parte do sujeito que aprende. Essa é uma novidade na compreensao do processo de aprendizagem: quem aprende a ler e a escrever niio é um objeto no processo, mas um. sujeito que precisa estar envolvido na atividade, precisa estar necessitado da escrita, precisa entender para que se escreve e para que se Ié; precisa querer aprender a ler ¢ escrever atribuindo & leitura e a escrita um sentido coerente com seu significado social. Em outras palavras, aprende a ler e escrever quem entende para que se 1é e se escreve © quer ler e ee Como afirma Vigotski (1995), 4 Jeitura e a escrita precisa se sane 206 a uma necessidade vital da crianga. E isso nao se confunde com 7 presso que os adultos fazem sobre a crianga para que ela aprenda a ler letras e sflabas ou palavras e textos oralizando 0 que lé ¢ 4 escrever copiando. ANECESSIDADE da leitura e da escrita para expressar-se e para oo. nhecer as ideias dos outros est no inicio do processo que leva a apropriagao da cultura escrita. Na escola, portanto, a primeira tarefa das professoras © profes- sores no processo de apresentar a escrita para as criangas é criar nelas a NECESSIDADE DE LER E ESCREVER. ; Como fazemos isso? Quando apresentamos a escrita para as criangas de modo a criar nelas a necessidade de escrever algo para alguém — com a intengao de se comunicar, expressar, de contar coisas, de expressar uma opiniao, um fato — e de ler compreendendo a intengdo de comunicagiio do autor: uma ideia, um sentimento, um fato, uma informagiio. Conforme a lei genética geral do desenvolvimento humano”, aquilo que vivemos coletiva- mente, socialmente, vai sendo internalizado sob a forma de fungdes internas, Quando usamos a cultura escrita — nao as letras, as silabas, mas os textos ~ para comunicar, para registrar e nos lembrar depois, para expressar um desejo, uma ideia, uma intengdo ou quando lemos para saber uma informagio, conhecer uma ideia, um ponto de vista ou um sentimento expresso pelo autor do texto, ensinamos as criangas o sentido social da escrita e vamos criando nelas a necessidade de ler e escrever elas proprias. Quando as criangas par- ticipam ativamente desse processo, ou seja, quando escrevemos o texto que elas ditam e quando lemos para elas buscarem a informago, imaginarem, perceberem a ideia do autor — em outras palavras quando utilizamos a escrita como um objeto cultural que tem uma fungiio na sociedade — as criangas vio compreendendo a fungao social da escrita e criando para si a necessidade de ler e escrever coisas para serem lidas. 5. Praticas com a cultura escrita Temos alguns exemplos de insergao da crianga pequena no mundo da cultura escrita na perspectiva Por nés apontada neste capitulo: um desses exemplos é a pedagogia estruturada por Celestin Freinetna Franga a partir dos anos 1920, a partir de um projeto de escola popular, moderna e democratica. All genética do desenvolvimento humano afi ‘pensamento, por exemplo, ou uma capaci ‘que internalzamos ima que antes de ser Interna a o psiquica como a fala ® fade, habilidade ou apti ana, na nga pela ido 6 externa ¢ vivda coletvamente, 0 que significa ORIAHISTORICO-CULTURAL NA EDUCACAO INF) rpersando ‘com professoras e professores “ANTIL: overs reer See 207 No interior do conjunto de principios € fundamentos sobre Os quai trutura seu ideario pedagégico, destacamos alguns procedi quais se es- por ele ~ técnicas Freinet — para promover o envolvimento dre ny 9s quenas com a escrita: © jornal da turma, a correspondéncia ae eyes livro da vida, 0 jornal mural, 0 estudo do meio — atividades 14 4 —— ‘com as criangas a partir dos 3 anos, 844 desenvolvidas __O jomal da turma registra para 0 grupo as noticias contadas pelas criangas na toda de conversa que inicia o dia. As noticias ou novidades rela- tadas pelas criangas séio Tegistradas no quadro de giz pela professora ou pro- fessor sob o olhar das criangas, sempre indicando a nome do autor da noticia, Ao final da roda, as noticias sao lidas para o grupo que escolhe uma para publicagdo. E tarefa do adulto — professor ou professora — reproduzir para cada crianga do grupo a noticia eleita para o jornal. No encontro seguinte, 0 adulto 16 para e com o grupo 0 texto que agora as criangas tém a mao e cada crianga ilustra sua pagina que vai compor o jornal da turma. Com ajuda do crachd - também feito sob o olhar e com a participagaio das criangas, sem destaque de silaba nenhuma — cada um registra seu nome na pagina do jornal agora ilustrada. Ao final de um tempo, todas as criangas ter’o sido autoras de uma noticia e o jornal entao é finalizado com capa e informagoes da turma. E pode ser levado para casa, enviado aos correspondentes, guardado na bi- blioteca da sala. A correspondéncia interescolar envolve duas turmas de escolas dife- rentes e preferencialmente de cidades, estados e mesmo paises diferentes. 0 texto é composto pelas criangas, registrado pelo adulto, lido para as criangas, tefeito de acordo com as sugestées das criangas e, finalmente, ¢ ilustrado pelo grupo. As cartas podem se apresentar como longas folhas enroladas como um pergaminho, dobradas como uma sanfona ou outras formas, se- gundo as sugestdes do grupo. O importante ¢ que o texto seja produzido e refeito pelas criangas e que tenha efetivamente um receptor que, por sua vez, respondera a carta estabelecendo assim uma troca de informagGes sobre a vida na escola, a cidade ou regio em que a escola se encontra. Tanto as cattas recebidas como as cépias das cartas enviadas — em tamanho grande ¢ ilustradas — devem ser afixadas na parede da sala de modo que as criangas Possam se reportar a elas sempre que quiserem. te i Hee eas adagidess O livro da vida registra, ao final de cada dia, as ee iar tacadas pelas criangas. Novamente, 0 texto ¢ delas - bats jain do livz0 adulto. Novamente, as criangas se revezam para ilustrar & p da vida a cada dia. Como a correspondéncia, 0 liv ro da vida tem apenas um 208 coe exemplar, dife com os relatos : Q jornal mural esti ituacées vividas na tu! as situagdes Vivi Dee aca beni: een .s: “eu parabenizo”, “eu critico’ na parede da sala com as inscrigde: P © “eu pro. ho”. Na Educagaio Infantil, a forma privilegiada do registro das Criangas ¢ pon se a registrar a mensagem com a escrita, o desenho e 0 adulto se prop fi ; Sempre eriangas quiserem. O Jornal mural requer uma sesso Semanal do grupo que ent leia para a leitura € discusstio das mensagens. No Movimento da Beas Moderna portuguesa ha esse mesmo movimento e essa assembleia ¢ inada Conselho. Seen do meio se assemelha 4 metodologia de trabalho por projetos, discutida no capitulo 16. O produto desse proceso, no entanto, € outta opor. tunidade de convivéncia com a cultura escrita nao apenas no processo de in. vestigagiio — leitura pelo adulto, manuseio de textos escritos sejam eles jomais, revistas, enciclopédias, dos temas de interesse do grupo, mas também na pro- dugiio escrita de um album com a sintese das aprendizagens das criangas sobre o tema. Novamente, o texto é das criangas e a escrita do adulto, sem a preocu- pacdo de esgotar o tema. O album, como o jornal da turma, serd produzido de modo a que cada crianga tenha o seu exemplar com 0 texto coletivo distribuido em algumas paginas e cada uma delas ilustrada e assinada pela crianca. Da mesma forma que no jornal da turma, ao final, se faz uma capa com ilustracio da crianga e com informagées sobre a turma e o nome do album. Estas sao algumas das técnicas que envolvem as criangas com a cultura escrita e favorecem a atribuigao de um sentido a escrita que cria nas criangas a necessidade e 0 desejo de escrever e ler, elas préprias e mesmo as con- digdes para uma apropriagao ativa da atitude leitora e produtora de textos. No Movimento da Escola Moderna portuguesa, a sala da Educagao Infantil também mostra que é possivel uma pratica que respeita a crianga eae plena na infancia. A cultura escrita é valorizada a partir registro ee criangas tém dentro e fora da escola: necessidades i: ae coma Su tod vividas e necessidades de isis i oa e temas de interesse das criangas — ampliados - = apa te sala, as produgdes das criangas contam @ historia ha nee = ee a0 ambiente valorizando o trabalho da erianga. N40 Instrumento: re fae © sequéncia de nuimeros para serem decoradas- s de pilotagem d: : : . ative dades, mapa de ose @ ago educativa, tais como: plano 6° inventarios, lista de projetos, quadro semanél rentemente do jornal da turma que cada crianga Produz g 2 de cada crianga da turma. : ula as criangas a registrarem suas avaliaggeg . rma e seus conflitos. Trés envelopes sig disposta a 7 Bae JsTORICO-CULTURAL NA EDUCAGAO INFANTIL: professoras e professores 208 -ORIAH! Te yersaneo com i he distribuigao de tarefas, mapa das tardes de animagao cultural, didrio de farna, regras de Vida, sto manipulados por adulto ¢ eriangas toando a ssorita uma linguagem de expressiio em que as criangas pequenas vio sendo inseridas pouco @ pouco, mas sempre testemunhando os adultos utilizarem a escrita € AOS poucos também se iniciando nesse uso como instrumento cultural auténtico: por isso, nao se treina a escrita, nao se simula a escrita de cartas que nunca sero enviadas, niio se copia cabegalho, Todos os dias as atividades iniciam com a chegada das criangas na sala uma delas, que é escolhida na reunido de Conselho como presidente da semana, lembra as outras criangas de registrarem suas presengas no mapa de presenga. Esse instrumento de pilotagem é organizado pela pessoa adulta como um grande cartaz com os nomes das criangas na coluna vertical e os dias do més marcados na horizontal. Este quadro é preenchido diariamente pelas criangas marcando suas presengas ou auséncias, além de finais de semana e feriados. Assim, as criangas jd chegam a sala envolvidas numa ati- vidade sob sua responsabilidade que envolve reconhecimento de seu nome e uso de um cédigo (para marcar presenga, auséncia ou dias sem escola). Nesse uso diario, as criangas passam a reconhecer os nomes dos colegas da turma e mais tarde a ler esses nomes em outras situagdes. Os inventarios (Figura 1) s&io quadros organizados pela professora ¢ pelo grupo de criangas a partir do levantamento conjunto do material dis- ponivel na sala, na biblioteca da escola, na drea externa — quadros que au- xiliam o reconhecimento dos materiais presentes na escola e possibilitam as criancas — também elas — propor usos para o material. Com a lista dos nomes dos materiais escritos pela professora e com a ilustragao pelas criangas, esses inventarios podem ser “lidos” pelas criangas. A partir desses inventarios ¢ possivel planejar com 0 grupo as atividades possiveis que vao compor 0 mapa de atividades. Novamente é feito um cartaz organizado pela professora com os nomes das criangas na coluna vertical e os nomes das atividades possiveis listadas pelo grupo na linha superior. Nesse mapa, as criangas pla- nejam atividades de livre escolha colocando um circulo no que querem fazer. Preenchem o circulo ao terminar a atividade. Uma vez por més se voltam Para o mapa para avaliar sua participagao. “O envolvimento no planeamento © avaliagdio dos processos de aprendizagem promovem agencia (agency) © responsabilidade” (FOLQUE, 2012, p. 41)- Nesse processo, ainda, as Ctiangas convivem com os nomes dos colegas da turma e os nomes das ati- Vidades listadas na linha superior do cartaz que podem ser “lidos” por meio das ilustragdes feitas pelas eriangas proximo ao nome de cada atividade, Este um exemplo de atividade em que as criangas assumem a gestio do tempo, 210 © que nos faz lembrar que esses instrumentos de pilotagem no Fespondem apenas ao uso da escrita como objeto cultural auténtico, mas se inserem num projeto maior de construgdo de uma escola democratica pela educagao de atitudes auténomas e organizagao pratica que cria comunidades de apren. dizagem “onde as criangas sao valorizadas e apoiadas a arriscar e¢ a esticar (strech) o seu poder de aprendizagem (FOLQUE, 2012, p. 41). Figura 1 - Inventério Fonte: CRUZ et al. (2015). © quadro semanal de distribuigao de tarefas (Figura 2), propde @ oF ganizagao das atividades do dia a dia da semana de trabalho, direcionando quem ira ajudar a servir o lanche, mudar o calendario, desenhar 0 simbolo que indica o tempo no mapa do tempo, ajudar a arrumar a biblioteca, entre outras agdes que vao surgindo no decorrer dos dias, | — inHISTORICO a rea cM Po CULTURAL NA EDUCAGAO INFANTIL: fessoras e professores ee aut Figura 2— Quadro semanal de distribuigio de tarefas Fonte: SOUZA, 2016. __ Omapa das tardes de animagio cultural (Figura 3) éum cartaz pequeno, | dividido pelos dias da semana € cada dia tem designada uma atividade cul- | tural diferente que a turma deverd realizar em um tempo determinado pelo Proprio grupo (culinéria, escuta de histérias, ginéstica, passeios). 212 eee Fonte: FOLQUE, 2012. O diario de turma (Figura 4) traz quatro agGes para registro do grupo; gostei, nao gostei, fizemos e queremos fazer. Nesses espa¢os cada crianga re- gistra desenhando ou se arriscando nas primeiras tentativas de escrita~ senao com a ajuda do adulto — seu desejo de comunicacio ao grupo. O quadro é, mais tarde, lido e discutido com o grupo. Muitos desses registros dao origem as regras de vida: os combinados da turma. Figura 4 — Diario da turma A Poniela baleu-me D(Db.D0 ee oy fits Fonte: FOLQUE (2012). Uma vez discutidos os problemas ¢ sugeridas as solugées, esses combi- nados so registrados por meio de texto — escrito pelo adulto e expresso pels RIA HISTORICO-CULTURAL NA EDUCAG; TeOF sando com professoras e professores conversance Soe “AO INFANTIL: eee 213 criangas ~ €m papel, ilustrados pelas crian das criangas para orientar a convivéncia d Todos esses instrumentos de Pilotagem sao €xpostos na sala com as marcas da turma: desenhos de autoria e textos de autoria. Nao se encontram desenhos estereotipados, pinturas de adultos nas Paredes. A identidade da turma esté na decoragao e na organizacio do i ali frequentam, aprendem e desenvolvem em interagdo com a cultura mais elaborada, Assim, a cultura escrita est4 um fardo que entristece as criang: da pesquisa, da descoberta, da convivéncia com os outros todos diferentes entre sie com a cultura em sua multiplici idade. Convivendo com adultos que leem e escrevem, “sem querer querendo” as criangas vio entrando nesse mundo escrito. Gas € afixados na Parede, na altura lo grupo, 6. Algumas consideragées para finalizar nossa conversa e continuar nossas investigagdes Entendemos que, a partir do que viemos discutindo, podemos pensar a apresentagdo da cultura escrita para as criangas pequenas em dois mo- mentos distintos, mas articulados. Num primeiro momento, promovemos a convivéncia das criangas pequenas com a cultura escrita. Isto acontece quando organizamos uma biblioteca na sala com histérias infantis, revista para criangas®, livros didaticos de geografia, historia e ciéncias do ensino fundamental e médio, assim como enciclopédias que possam ser utilizados nas pesquisas sobre temas de interesse das criangas (e que nés adultos lemos Para elas), quando fazemos a leitura regular de artigos de jomal de temas de interesse das criangas (em geral, a segdo de ciéncias), quando organizamos Painéis ou afixamos posters na altura das criangas com informagdes cienti- ficas, quando lemos regularmente historias infantis; quando as familias leem Para as criangas livros enviados semanalmente pela escola; enfim, quando a leitura se tora um habito para as criangas muito tempo antes de saberem ler. Da mesma forma, deve acontecer com a escrita. Muito antes de aprenderem @ escrever, as criangas podem ser autoras de texto e com isso aprender que €screvemos o nosso desejo de expressao: quando registramos com elas a ‘otina planejada conjuntamente para o dia; quando registramos as histérias 8 nossos passeios, as coisas que acontecem no dia a dia da escola e que 2 ne hoe 33“ ARevista Gidnca Hoje das Criangas, publicada pela Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciéncia (SBPC) & ome ‘emplo dessas pubicagdes braseras. z. 214 Ihes chamam a atengdo, quando registramos os acontecimentos de ao final do periodo, quando produzimos historias coletivas, Teg’ nossas presengas; enfim, quando usamos a escrita coletivamente gistrar coisas para nos lembrar, comunicar aos outros, expressar 1 timentos e vivéncias. Com este primeiro movimento, que pode e deve ser extensivamente vivido na Educagao Infantil — e também no ensino fundamental NAS sérieg iniciais, caso as criangas nado o tenham vivido anteriormente — as crian formam para si a necessidade de ler e escrever € as fungdes psiquicas supe. riores para que possam fazer elas proprias as leituras e a escrita que, nesse momento, os adultos fazem por elas. E esta é condigao essencial Para as criangas apreenderem a escrita como instrumento cultural complexe, isto é, tornarem-se verdadeiras leitoras e autoras de texto, pois ao ouvirem textos lidos por nés, adultos, elas aprendem a buscar as informagées, as Sequéncias das historias, enfim, a mensagem do que lemos para elas. Num segundo momento, e isso deve ser deixado para o ensino funda- mental, tendo j4 formado para si a necessidade de ler e escrever e sabendo para que se lé se escreve, podemos apresentar o aspecto técnico da escrita. Desta forma, inverte-se 0 processo de apresentacao da escrita presente na escola hoje. Em lugar de comegarmos. pela apresentagéio das letras, come- gamos pelo texto. Para as leituras, todos os textos que tragam informagio, histérias, conhecimento de interesse do grupo. Para a escrita, os textos das criangas — seja individual ou coletivo, sempre de autoria das criangas. De modo que elas aprendam que lemos o que mundo inteiro escreve, mas quando escrevemos, escrevemos o desejo da gente. Ao apresentar aqui nossa leitura da teoria histérico-cultural pensando a apropriagao da escrita pela crianga entre 0 ¢ 10 anos, defendemos, pois, a ideia de que até agora temos contaminado, Por assim dizer, a Educacao Infantil com as tarefas tipicas do ensino fundamental e que, de agora em diante, frente aos novos conhecimentos sobre 0 processo de desenvolvimento das criangas, ~se de fazer o inverso: deixar ontaminar o ensino fundamental com atis que julgamos tipicas da Educagao Infantil — ainda que, muitas. nao estejam mais contempladas na : Falamos das atividad cada dia istramos Para re. 0880s sen. } } } j i i \ } | 1 ! 1 ORICO-CULTURAL NA EDUCAGAO INFANTIL: ‘com professoras € professores oe ee 215 qgoRIAHIS o Fpwersande 9 de expressao precisa ser exercitado € cultivado por meio de milti linge 7 pas a ser escrito. miltiplas procedendo des' ‘orma, a escrita pode ser rt . s iniciais do ensino fundamental ae eee eae apie aa ye colocam a lingua viva em segundo plano. Como lembra Vigats (1995), da mesma forma que a linguagem oral € apropriada pela crianga sem grandes esforgos, @ partir da necessidade de se comunicar com os outros — necessidade ye ¢ criada nela ao viver numa sociedade que fala —, a escrita pode ser igual- mente apropriada sem grandes esforgos. Mas, para isso, a escrita precisa se formar uma necessidade da crianga que vive numa sociedade que 1é e escreve. Jsso implica que na escola, nés, professoras e professores, escrevamos textos de autoria, nao copiemos. A escrita precisa ser apresentada nao como um ato motor mas como uma atividade cultural complexa, considerando o uso social para o qual foi criada. Quando a crianga convive com situagdes reais de leitura e escrita, na escola ou em casa, ela cria para si a necessidade da escrita. E, quando no inicio do processo de aquisicao da escrita esta a necessidade da crianga de escrever, a escrita fara sentido para ela. Nesse caso, a escrita nao the chegara de fora como uma imposigao do outro. Quando cultivamos nas criangas 0 desejo de expressao, quando criamos nelas a necessidade da es- crita e quando utilizamos a escrita considerando sempre sua fungao social, estaremos respondendo ao apelo de Vigotski (1995) para que ensinemos as criangas a linguagem escrita e nao as letras. Apresentando a escrita como um instramento de comunicacdo ¢ a leitura como instrumento de informagao ¢ deleite, poderemos possibilitar a elas o prazer de que fala Manguel (1997, P- 18-19), ao relatar sua descoberta da leitura: desei série’ inteiramente novo, de consistiam mais apenas no que meus olhos m ouvir, minha lingua podia saborear, m sentir, mas no que 0 Eu podia ler. [...] Foi como adquirir um sentido tal forma que as coisas nao podiam ver, meus ouvidos podia n meu nariz podia cheirar € meus dedos podial meu corpo todo podia decifrar, traduzir, dar voz, ler.

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