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UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL

PPGDR – PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL

DOUTORADO EM DESENVOLVIMENTO REGIONAL

ÁREA DE CONCENTRAÇÃO: GESTÃO DE ORGANIZAÇÕES E DO


DESENVOLVIMENTO

LINHA DE PESQUISA: POLÍTICAS PÚBLICAS E GESTÃO SOCIAL

RENEO PEDRO PREDIGER

DADOS ABERTOS COMO INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA EM MUNICÍPIOS


BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS

IJUÍ

2020
RENEO PEDRO PREDIGER

DADOS ABERTOS COMO INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA EM MUNICÍPIOS


BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS

Tese apresentada ao Programa de Pós-


Graduação em Desenvolvimento Regional, na
linha de pesquisa Políticas Públicas e Gestão
Social, da Universidade Regional do Noroeste
do Estado do Rio Grande do Sul, como
requisito parcial para obtenção do título de
Doutor em Desenvolvimento Regional.

Orientador: Professor Dr. Sérgio Luís


Allebrandt

IJUÍ – RS

2020
Catalogação na Publicação

P923d
Prediger, Reneo Pedro.
Dados abertos como indutores da transparência em municípios brasileiros:
um estudo a partir de municípios gaúchos / Reneo Pedro Prediger. – Ijuí,
2020.
272 f. ; il. ; 30 cm.

Tese (doutorado) – Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio


Grande do Sul (Campus Ijuí). Desenvolvimento Regional.

“Orientador: Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt ”.

1. Transparência Pública. 2. Participação cidadã. 3. Colaboração cidadã.


4. Governo aberto. 5. Dados abertos. I. Allebrandt, Sérgio Luís. II. Título.

CDU: 321.7

Ginamara de Oliveira Lima


CRB 10/1204
Para minha mãe, Citônia

Para Juçara (in memoriam)

Para meus filhos Pedro, Priscila e Paula


AGRADECIMENTOS

À Isa pelo permanente incentivo, ajuda, compreensão, paciência e carinho demonstrados desde
antes da realização deste trabalho.

Aos meus filhos Pedro, Priscila e Paula pelo apoio e torcida para a conclusão desta tese.

Ao professor Sérgio Luís Allebrandt, amigo, colega e orientador deste e de muitos outros
trabalhos, pelo incentivo, pelos conselhos e ensinamentos e pela confiança na capacidade e no
trabalho de seus orientandos.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes) e à Universidade


Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (Unijui) pela concessão de bolsas que
permitiram um caminhar mais tranquilo durante toda a realização do curso de doutorado.

À Universidade Federal da Fronteira Sul (UFFS) pela concessão de afastamento das atividades,
o que propiciou a disponibilidade de tempo, fundamental para uma tarefa como esta.

Às amigas e colegas Denize, Iara e Tatiane pela amizade e por continuarem “trabalhando”,
mantendo a tradição da sala.

A todos os professores, técnicos-administrativos e servidores terceirizados da UFFS, campus


Cerro Largo, em especial os amigos Edemar, Ivann, Bruno, Lauren, Márcio, Sandro e Sheila
por toda a ajuda prestada e pelo estabelecimento das condições necessárias ao trabalho de todos.

A todos os professores da UNIJUI, em especial os que atuam no Programa de Pós-Graduação


em Desenvolvimento Regional (PPGDR), pelas aulas ministradas e pelos ensinamentos que
contribuíram, certamente, para o meu desenvolvimento.

Ao professor Airton Müeller pelos debates e conversas quase diárias e que resultaram em muitas
ideias e trabalhos realizados em conjunto.
A todos os técnicos-administrativos da UNIJUI, em especial a Kátia, Elisa e Jaciele que
exercem suas atividades no Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento Regional
(PPGDR), que representam a segurança e eficiência necessárias ao trabalho de todos nós.

Aos colegas da turma 2016 do Doutorado em Desenvolvimento Regional, pelos momentos de


convívio e pelas aulas e trabalhos em conjunto.

Às amigas Roseli e Taciana, colegas de sala, pela elaboração conjunta de trabalhos, projetos e
eventos, além das viagens e compartilhamento de experiências.

Aos entrevistados que cederam seus conhecimentos e experiências, além de seus tempos em
agendas geralmente complicadas.

Ao amigo Evandro Blume pelo apoio técnico em vários momentos deste percurso.

Aos amigos Luiz Weber, Paulo Poma e Jesildo Moura de Lima pelo inestimável auxílio no
agendamento de entrevistas.

A todos que de alguma forma contribuíram para que este trabalho fosse concretizado.

Foi um privilégio realizar este curso e desenvolver este trabalho. Não seria possível sem o apoio
de cada um e de todos, também daqueles não citados nestes agradecimentos.
RESUMO

Esta tese trata dos Dados Governamentais Abertos em nível municipal, tema associado à
transparência pública, a participação e a colaboração dos cidadãos. O movimento de dados
abertos, surgido em 2007, tem obtido adeptos principalmente a nível de governo nacional.
Existem poucas evidências mostrando a associação de municípios, principalmente no Brasil, a
esta atividade. O trabalho objetiva identificar e analisar os fatores políticos, burocráticos e
tecnológicos que dificultam ou impedem a disponibilização de dados abertos municipais. A
investigação emprega metodologia qualitativa de análise permeada com instrumentos
quantitativos que contribuem para a caracterização estrutural, e espacial, dos municípios
gaúchos, principalmente. Os municípios do Estado do Rio Grande do Sul constituíram o locus
deste estudo. O trabalho contextualiza, em um primeiro momento, os regimes democráticos no
mundo moderno e os modelos pelos quais podem ser observados. Apresenta, também, a
transparência pública e participação cidadã como atributos fundamentais dos regimes
democráticos. Ainda neste tema a transparência é também abordada enquanto política pública
e a legislação Brasileira que a regulamenta. Os Dados Governamentais Abertos são
particularmente importantes nos Governos Abertos, filosofia de governos baseada na
transparência pública, participação e colaboração dos cidadãos. Os dados abertos podem
contribuir para uma abordagem diferente sobre os dados públicos podendo resultar em visões
que acrescentam qualidade e efetividade aos processos de transparência. A construção destas
visões pressupõe tanto a participação quanto a colaboração da sociedade visto que são os
próprios cidadãos quem as elaboram. O trabalho, na sequência, exibe o panorama, internacional
e brasileiro, em relação ao oferecimento e uso de Dados Governamentais Abertos. São
facilmente percebidas as atuações dos governos nacionais e regionais, além de algumas cidades
de maior porte. No Brasil os exemplos são menos numerosos. O elo mais frágil tem sido a
participação e colaboração da sociedade, principalmente na produção de aplicativos. Foram
observados, por um lado, o tratamento dispensado pelos 497 municípios à transparência
pública, por meio de seus portais da transparência, e a percepção de atores sociais em relação
ao tema da transparência pública, participação e colaboração dos cidadãos, governos e dados
abertos. As dificuldades dos municípios estão localizadas nas limitações de suas estruturas
governamentais e na ausência de qualquer organização da área responsável pelo tratamento da
informação. Os motivos principais, entretanto, estão relacionados à ausência de legislação
específica e ao desconhecimento do assunto.

Palavras-chaves: Transparência Pública; Participação cidadã; colaboração cidadã; Governo


aberto; Dados abertos.
ABSTRACT

This thesis is about municipal level Open Government Data, subject associated with public
transparency, citizen participation and collaboration. The open data movement, appeared in
2007, has gained adherents mainly at national government level. There is little evidence
showing the municipality's association, mainly in Brazil, with this activity. The work aims to
identify and analyze the political, bureaucratic and technological factors that hinder or prevent
the availability of municipal open data. The investigation uses quantitative analysis
methodology permeated with quantitative instruments that contribute to the structural and
spatial characterization of the municipalities of Rio Grande do Sul, mainly. The municipalities
of the State of Rio Grande do Sul constituted the locus of this study. The work contextualizes,
initially, the democratic regimes in the modern world and the models by which they can be
observed. It also presents public transparency and citizen participation as fundamental attributes
of democratic regimes. Still on this topic, transparency is also addressed as a public policy and
the Brazilian legislation that regulates it. Open Government Data is particularly important in
Open Governments, government philosophy based on public transparency, citizen participation
and collaboration. Open data can contribute to a different approach on public data and can result
in visions that increases quality and effectiveness to transparency processes. These visions’
construction presupposes both the participation and collaboration of society since is the citizen
themselves who elaborate them. The work, following that, shows the overview, international
and Brazilian, about Open Government Data offer and use. It is easy to notice the actions of
national and regional governments, as well as some larger cities. In Brazil, the examples are
less numerous. The weakest link has been society participation and collaboration, mainly in
applications production. It was observed, on the one hand, that the 497 municipalities’ treatment
of public transparency, through their transparency portals, and the social actors' perception in
relation to the issue of public transparency, citizen participation and collaboration, governments
and open data. The difficulties of the municipalities are in their governmental structure
limitations and in the absence of any organization in the field responsible for information
processing. The main reasons, however, are related to the absence of specific legislation and
the lack of knowledge on the subject.

Key-words: Public Transparency; citizen participation; citizen collaboration; open


Government; open Data.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Figura 1 Hermenêutica de Profundidade (HP) – Etapas a serem cumpridas............................ 26


Figura 2 Evolução da democracia - 1800 a 2018 ..................................................................... 35
Figura 3 População mundial e regimes de governo - 1816 a 2015........................................... 37
Figura 4 Variedades de transparência: eventos e processos ..................................................... 59
Figura 5 Países com legislação de direito à informação - 2019 ............................................... 65
Figura 6 Dados Governamentais Abertos - Elementos ............................................................ 78
Figura 7 Dados abertos, democracia e as interações entre cidadãos e governo ....................... 85
Figura 8 Dados Governamentais Abertos - Atores e relacionamentos ..................................... 86
Figura 9 Elementos de um Governo Aberto ............................................................................. 93
Figura 10 Exemplo de um relatório ........................................................................................ 106
Figura 11 Exemplo de arquivo XML ..................................................................................... 107
Figura 12 Exemplo de arquivo em formato CSV ................................................................... 107
Figura 13 Exemplo de arquivo JSON ..................................................................................... 108
Figura 14 Países e situação do oferecimento de Dados Governamentais Abertos - 2016 ..... 114
Figura 15 Países e evolução positiva no oferecimento de dados abertos – 2013 a 2018 ....... 115
Figura 16 Países e evolução negativa no oferecimento de dados abertos – 2013 a 2018 ...... 116
Figura 17 Aplicações e áreas de atuação – Dados abertos do Governo Britânico - 2019 ...... 128
Figura 18 Barreiras no oferecimento de Dados Governamentais Abertos ............................. 133
Figura 19 Número de municípios gaúchos por períodos de criação....................................... 136
Figura 20 Regiões Geográficas Intermediárias - Estado do Rio Grande do Sul .................... 138
Figura 21 Conselhos Regionais de Desenvolvimentos - Rio Grande do Sul ......................... 139
Figura 22 Habitantes por municípios - Estado do Rio Grande do Sul - 2019 ........................ 141
Figura 23 Área territorial municipal nas Regiões Geográficas Intermediárias - 2018 ........... 143
Figura 24 Municípios gaúchos com dados abertos - 2019 ..................................................... 155
Figura 25 Municípios selecionados para a pesquisa............................................................... 159
LISTA DE QUADROS

Quadro 1 Ondas de democratização e ondas reversas de democratização - 1828 a 1990 ........ 33


Quadro 2 Países e população em regimes democráticos e não democráticos .......................... 38
Quadro 3 Modelos de democracia ............................................................................................ 40
Quadro 4 A transparência e suas características segundo diversos autores ............................. 76
Quadro 5 Acesso à informação na legislação Brasileira .......................................................... 77
Quadro 6 Príncipios e recomendações para Dados Governamentais Abertos....................... 112
Quadro 7 Falhas no desenvolvimento de aplicativos cívicos ................................................. 134
Quadro 8 Os municípios gaúchos e as TICs ........................................................................... 157
Quadro 9 Roteiros de entrevistas em profundidade................................................................ 165
Quadro 10 Categorias de análise ............................................................................................ 166
Quadro 11 Categorias e critérios de análise .......................................................................... 169
Quadro 12 As percepções sobre transparência pública, participação e colaboração dos
cidadãos .................................................................................................................................. 213
Quadro 13 As percepções sobre governos e dados abertos .................................................... 214
Quadro 14 Barreiras e dificuldades nos municípios gaúchos para a adoção de dados abertos
................................................................................................................................................ 215
LISTA DE TABELAS

Tabela 1 Democracias em países do mundo - 2002 e 2018...................................................... 34


Tabela 2 Portais de dados abertos. Estados, capitais e Distrito Federal. 2020 ....................... 124
Tabela 3 Cidades e pontuação – ODI - 2018 .......................................................................... 125
Tabela 4 Aplicativos disponíveis nos portais de dados abertos Brasileiros - 2019 ................ 130
Tabela 5 Regiões de influência das cidades - 2007 - Cidades por nível e subnível no Brasil e
no Estado do Rio Grande do Sul ............................................................................................ 137
Tabela 6 Municipios por Coredes e Regiões Geográficas Intermediárias.............................. 140
Tabela 7 Municípios por faixa populacional e Região Geográfica Intermediária - 2019 ...... 142
Tabela 8 Serviços oferecidos pela internet – Prefeituras gaúchas - 2019 .............................. 147
Tabela 9 Desenvolvimento dos portais municipais - 2019 ..................................................... 147
Tabela 10 Ferramentas empregadas para transparência nos municípios - 2019..................... 149
Tabela 11 Origem dos Portais da Transparência nos municípios gaúchos - 2019 ................. 150
Tabela 12 Ferramentas oferecidas para participação – Prefeituras gaúchas - 2019 ............... 152
Tabela 13 Conhecimento sobre dados abertos - 2019 ............................................................ 153
Tabela 14 Entrevistados por cidade – 2018 e 2019 ................................................................ 162
Tabela 15 Entrevistados por atividade - 2018 e 2019 ............................................................ 163
Tabela 16 Categorias de entrevistados ................................................................................... 163
Tabela 17 Entrevistados por partido político - 2018 e 2019................................................... 164
ABREVIATURAS E SIGLAS

API - Application Programming Interface


CAQDAS - Computer-aided qualitative data analysis software
CGU - Controladoria Geral da União
Coredes - Conselhos Regionais de Desenvolvimento
CPD - Centro de Processamento de Dados
CSP - Center for Systemic Peace
CSV - Comma Separated Values
DA - Dados Abertos
DAPP - Diretoria de Análise de Políticas Públicas
DGA - Dados Governamentais Abertos
FGV - Fundação Getúlio Vargas
GA - Governos Abertos
HP - Hermenêutica de Profundidade
HTML - HyperText Markup Language
IBGE - Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
IDC - International Data Company
INDA - Infraestrutura Nacional de Dados Abertos
JSON - JavaScript Object Notation
LAI - Lei de Acesso à Informação
MPOG - Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão
OCDE - Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico
OD4D - Open Data para o Desenvolvimento de rede
ODH - Open Data Handbook
ODI - Open Data Index
ODIN - Open Data Inventory
OEA - Organização dos Estados Americanos
ONU - Organização das Nações Unidas
PPP - Projetos Políticos Pedagógicos
SGML - Standard Generalized Markup Language
SPSS - Statistical Package for the Social Sciences
TCLE - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TI - Tecnologia de Informação
TICs - Tecnologias de Informação e Comunicação
URL - Uniform Resource Locator
V-Dem - Variedades de Democracia
XML - eXtensible Markup Language
SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................... 17
2 DEMOCRACIA, TRANSPARÊNCIA E ACESSO À INFORMAÇÃO ........................ 32
2.1 A DEMOCRACIA E SUAS FORMAS ............................................................................. 39
2.1.1 A democracia direta ...................................................................................................... 40
2.1.2 A democracia representativa ........................................................................................ 42
2.1.3 As democracias participativa e deliberativa ............................................................... 47
2.2 A TRANSPARÊNCIA COMO UM ATRIBUTO FUNDAMENTAL DA DEMOCRACIA
.................................................................................................................................................. 53
2.2.1 A transparência e suas manifestações .......................................................................... 58
2.2.2 A transparência como política pública ........................................................................ 62
2.2.3 O acesso à informação e a legislação brasileira .......................................................... 68
2.3 DEMOCRACIA E TRANSPARÊNCIA EM SÍNTESE .................................................... 74
3 DADOS ABERTOS, DEMOCRACIA E GOVERNOS ABERTOS ............................... 78
3.1 DADOS ABERTOS E DEMOCRACIA ............................................................................ 84
3.2 DADOS ABERTOS E GOVERNOS ABERTOS .............................................................. 89
3.3 CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS DOS DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS
.................................................................................................................................................. 96
3.4 A CARTA INTERNACIONAL DE DADOS ABERTOS ............................................... 100
3.5 A PUBLICAÇÃO DE DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS .............................. 102
3.6 UTILIZAÇÃO DE DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS ................................... 108
3.7 DEMOCRACIA E DADOS ABERTOS EM SÍNTESE .................................................. 111
4 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NA ESFERA LOCAL ............................. 113
4.1 DADOS MUNICIPAIS ABERTOS NO CONTEXTO INTERNACIONAL .................. 117
4.2 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NO BRASIL.............................................. 121
4.2.1 Dados municipais abertos no contexto nacional ....................................................... 123
4.3 A UTILIZAÇÃO E OS IMPACTOS DOS DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS
................................................................................................................................................ 126
4.4 BARREIRAS E DIFICULDADES PARA OS DADOS GOVERNAMENTAIS
ABERTOS .............................................................................................................................. 132
5 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NOS MUNICÍPIOS GAÚCHOS ........... 136
5.1 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS E SUAS REGIÕES GEOGRÁFICAS ........................... 137
5.2 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS E SUAS CARACTERÍSTICAS .................................... 141
5.3 OS MUNICÍPIOS E SEUS PORTAIS NA INTERNET.................................................. 143
5.3.1 A estrutura de TI e os Sistemas de Informação ........................................................ 145
5.3.2 O portal municipal na internet ................................................................................... 146
5.3.3 A transparência pública e o portal da transparência............................................... 148
5.3.4 A participação cidadã.................................................................................................. 151
5.3.5 Os dados abertos .......................................................................................................... 153
5.4 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS EM SÍNTESE ................................................................ 156
6 TRANSPARÊNCIA, PARTICIPAÇÃO E DADOS ABERTOS: ANÁLISE A PARTIR
DA PERCEPÇÃO DE AGENTES PÚBLICOS, TÉCNICOS E ATORES SOCIAIS ... 158
6.1 OS SUJEITOS, A COLETA E A ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA ................ 158
6.1.1 O Universo e os locus da Pesquisa.............................................................................. 158
6.1.2 As entrevistas em profundidade ................................................................................. 162
6.1.3 As categorias de análise............................................................................................... 165
6.2 A TRANSPARÊNCIA MUNICIPAL E SEUS CONTEXTOS ....................................... 169
6.3 A PERCEPÇÃO DOS ENTREVISTADOS À LUZ DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE
................................................................................................................................................ 172
6.3.1 A transparência pública .............................................................................................. 172
6.3.2 A participação dos cidadãos ....................................................................................... 180
6.3.3 A colaboração dos cidadãos ........................................................................................ 190
6.3.4 Governo aberto ............................................................................................................ 194
6.3.5 Dados abertos ............................................................................................................... 196
6.4 BARREIRAS E DIFICULDADES NOS MUNICÍPIOS GAÚCHOS ............................ 200
6.4.1 Os municípios e a Tecnologia de Informação ........................................................... 201
6.4.2 A visão das empresas ................................................................................................... 206
6.4.3 A legislação ................................................................................................................... 207
6.4.4 Os usuários de dados abertos ..................................................................................... 209
6.5 RAZÕES PARA O NÃO OFERECIMENTO DE DADOS ABERTOS ......................... 212
7 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 218
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 229
APÊNDICE A – ESTRUTURA DE TI, SOFTWARES E DADOS ABERTOS NOS
MUNICÍPIOS ....................................................................................................................... 244
APÊNDICE B – DADOS ABERTOS NOS CURSOS SUPERIORES EM
COMPUTAÇÃO ................................................................................................................... 256
APÊNDICE C – ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - PREFEITOS
MUNICIPAIS ....................................................................................................................... 261
APÊNDICE D - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA –
VEREADORES .................................................................................................................... 263
APÊNDICE E - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA -
SERVIDORES PÚBLICOS ................................................................................................. 265
APÊNDICE F - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA -
PROMOTORES PÚBLICOS .............................................................................................. 267
APÊNDICE G - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - CONSELHOS
MUNICIPAIS E REGIONAIS ............................................................................................ 269
APÊNDICE H - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - EMPRESAS
DE SOFTWARE ................................................................................................................... 271
17

1 INTRODUÇÃO

Esta tese tem como objeto de estudo os Dados Governamentais Abertos em nível municipal,
tema associado à transparência pública, a participação e a colaboração dos cidadãos. É objetivo
deste trabalho identificar e analisar os fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que
dificultam ou impedem a disponibilização de dados abertos em municípios do Estado do Rio
Grande do Sul.

O ser humano sempre registrou informações. Desde as pinturas rupestres, aos alfabetos atuais,
o homem procurou registrar os fatos significativos de sua existência. Se nos tempos pré-
históricos o suporte era as paredes das cavernas, hoje empregam-se toda a sorte de
equipamentos eletrônicos para tais registros. As Tecnologias de Informação e Comunicação
(TICs), que compreendem os recursos tecnológicos para captura, armazenamento,
processamento e disseminação de informações, são viabilizadoras da etapa mais mensurável da
história, tanto pelo volume de informações disponíveis quanto pelo crescimento acelerado e
rapidez com que é possível obter e compartilhar estas informações (LÓPEZ; SAGOL, 2012).

Algumas estimativas apontavam, em 2012, para a geração diária de 2,5 exabytes1 de dados
(BARNES, 2013; MCAFEE; BRYNJOLFSSON, 2012). Outro relatório, disponibilizado pela
empresa de consultoria Racounter (2019), estima que, em 2025, 463 exabytes de dados serão
gerados diariamente no mundo. Um terceiro documento, produzido pela International Data
Company (IDC), citado por Marr (2019), aponta que o volume de dados criados, capturados ou
replicados atingiu a 18 zettabytes2. É importante ressaltar, ainda, que 90% deste total foi
registrado apenas nos dois últimos anos. Esta quantidade de dados é tão significativa que uma
nova área de estudos, denominada de big data, foi criada com o objetivo de explorar todo o
potencial nas mais diversas áreas da atividade humana. A sociedade, assim, cada vez mais
produz, consome e é regida por dados. A vida dos indivíduos, e das organizações, é permeada
por dados (GARCIA, 2014).

Nas instituições públicas, sejam da administração direta ou indireta, independente do poder


(Executivo, Legislativo ou Judiciário) e da instância (Federal, Estadual ou Municipal) que

1
1 Exabyte (EB) corresponde a 1018 bytes.
2
1 Zettabyte (ZB) corresponde a 1021 bytes.
18

representam, o panorama é bastante semelhante. As Administrações Públicas são produtoras e


depositárias de uma massa significativa de dados que se relacionam com a vida cotidiana da
comunidade, do estado ou da nação (ROSA, 2012). Estes dados, relativos às ocorrências
pessoais, trabalhistas, financeiras, estatísticas, ambientais, climáticas, de transportes,
geográficas, culturais, científicas, dentre outras, são geralmente armazenados em bancos de
dados, editores de textos, planilhas eletrônicas, imagens, áudios, vídeos e mapas, quando não
em papel.

O desenvolvimento das TICs, já incluídas aqui as imensas possibilidades de comunicação


decorrentes da internet, trouxeram alguns conceitos novos aplicados à administração pública.
A ideia de governo eletrônico, muitas vezes apresentado como e-government ou governo
digital, tem inspirado políticos, pesquisadores e administradores públicos a empregarem estes
termos como sinônimos de transparência e salto de qualidade no ato de governar (ANJOS;
EZEQUIEL, 2011; MARTINUZZO, 2007). Por outro lado, verifica-se uma simples
transposição de formas. Os mesmos serviços obtidos presencialmente são agora prestados por
meio das TICs, evidentemente que com maior disponibilidade e acessibilidade (GARCIA,
2014). A espetacularização, muitas vezes proporcionada pelo emprego do neologismo e-
government, pode ser assim ilustrada:

Seguindo os passos da iniciativa privada, que investiu fortemente em tecnologia da


informação, também os governos de todo o mundo têm concentrado esforços no
desenvolvimento de políticas e definições de padrões de comunicação, bem como no
uso das novas tecnologias para facilitar o relacionamento com seus diferentes
públicos. No Brasil não foi diferente. Especialistas em gestão pública elegeram o
“Governo Virtual” como um instrumento de superação do subdesenvolvimento, de
redução de custos, de transparência, de oferta de informações e melhores serviços à
sociedade. Como uma nova forma de os governos se apresentarem, a virtual, o
Governo Eletrônico (e-Gov) passou a ser indicativo de prestação de serviços públicos
por meio da Internet. (ANJOS; EZEQUIEL, 2011, p. 60)

As promessas de maior eficiência e eficácia não se concretizaram. Martinuzzo (2007, p. 301)


coloca que “Na realidade, na maioria dos casos até agora, e na melhor das hipóteses, o que
aconteceu e continua acontecendo é somente uma potencialização e melhoria no fornecimento
e no aproveitamento dos serviços de interesse público”. De uma forma geral sobressai a
impressão de que o serviço público fornece produtos a serem adquiridos pelo cidadão numa
relação cliente-fornecedor nas transações governamentais (ANJOS; EZEQUIEL, 2011). Um
incremento de qualidade dos serviços prestados pelos entes públicos e, principalmente, um
alargamento da transparência governamental, com uma maior e mais completa disseminação
19

de informações, não estão tirando o esperado proveito dos recursos das Tecnologias de
Informação e Comunicação (TIC).

A Constituição Brasileira de 1988 e as leis da responsabilidade fiscal, da transparência e do


acesso à informação, aparentemente, pouco modificaram este panorama. Estes instrumentos
legais claramente impulsionam e incentivam o uso das Tecnologias de Informação e
Comunicação, de forma mais específica a internet, como mecanismo para promoção da
transparência na administração pública e no acesso à informação por qualquer cidadão
(BRASIL, 1988, 2000, 2009, 2011a). Contudo, sob o ponto de vista da participação popular,
do controle e da gestão social, do emprego efetivo das possibilidades de comunicação entre o
poder público e os cidadãos muito pouco tem acontecido. Poucos entes da federação, sejam eles
municipais, estaduais ou o próprio governo federal, tem ido além do cumprimento do dever, ao
obedecer estritamente a legislação (ABDALA; TORRES, 2016; PINHO, 2008).

A informação é fundamental para o exercício da transparência governamental. Os portais


governamentais, tanto por iniciativa do próprio ente público quanto por efeito da legislação
relativa à transparência, geralmente apresentam grande volume de informações de natureza
contábil, fiscal e financeira. Entretanto, além de estarem publicadas em formatos que dificultam
a reutilização, é o “governo quem decide o que e como será visto” (VAZ; RIBEIRO;
MATHEUS, 2011, p. 45). São relatórios padronizados, com linguajar técnico, onde é necessário
saber ler e interpretar adequadamente as informações apresentadas. Sabe-se também que, em
qualquer comunidade, não são muitos os capazes para tal atividade. Como diz Gisele Craveiro,
entrevistada por Issa (2013, p. 62), “em lugar de serem os portais da transparência, são os
portais de opacidade”.

Atingir os objetivos da legislação estabelecida, desta forma, exige mais do que simplesmente
tornar públicos um conjunto de relatórios e oferecer mecanismos para acessá-los. Não se pode
imaginar que apenas aqueles com algum tipo de formação específica, nas áreas contábeis e
administrativas, possam compreendê-los. Não se pode conceber, também, que apenas o poder
público seja capaz de produzir informações sobre si mesmo. É fundamental, assim, que a
linguagem e os formatos empregados na apresentação destas informações sejam adequadas e
compreensíveis a qualquer cidadão. Não basta replicar o acesso ao mesmo instrumento
tecnológico usado pelos servidores públicos, na execução de suas atividades técnicas, para o
público em geral e afirmar que, desta forma, se está sendo transparente.
20

O simples acesso à informação, tal como apresentada, não é o suficiente para a transparência
governamental (RIBEIRO; ALMEIDA, 2011). As administrações públicas mantém sob sua
guarda uma grande massa de dados e informações não compartilhadas ou tratadas e
disseminadas parcialmente, incorretamente ou, até mesmo, tendenciosas (GARCIA, 2014;
ROSA, 2012). O tratamento destes dados, a produção de informações, pode ser diferente em
diferentes instituições públicas. A necessidade dos cidadãos, organizados ou não, também
podem não ser as mesmas. Assim o elemento em comum e que pode atender a diferentes
capacidades e expectativas são os dados brutos produzidos, mantidos e armazenados pelo poder
público. A transparência poderia ser abordada, deste modo, por meio da disponibilização destes
dados configurando os chamados Dados Governamentais Abertos (VAZ; RIBEIRO;
MATHEUS, 2011).

O impulso ao movimento de dados abertos é recente. De acordo com a Open Knowledge


International (2017a) “Dados abertos são dados que podem ser livremente usados, reutilizados
e redistribuídos por qualquer pessoa - sujeitos, no máximo, à exigência de atribuição da fonte e
compartilhamento pelas mesmas regras”. A Open Knowledge International (2017a) detalha esta
definição ao apresentar que os dados devem estar disponíveis de forma integral, com fácil
acesso, para qualquer finalidade, preferencialmente possíveis de serem baixados pela internet e
passíveis de modificação ou combinação com outros conjuntos de dados. A ideia de reutilização
e redistribuição não deve sofrer qualquer tipo de discriminação contra pessoas, grupos ou
organizações. “É parte integrante do conceito que, à sociedade, seja garantido acesso aos dados
primários, de forma que o interessado possa combiná-los, cruzá-los e, enfim, produzir novas
informações e aplicações, colaborando com o governo na geração de conhecimento social a
partir das bases governamentais” (AGUNE; FILHO; BOLLIGER, 2009, p. 8)

O movimento para abertura de dados é voltado, principalmente, à atuação governamental. Está,


normalmente, associado ao conceito de Governo Aberto e, enquanto este último evidencia a
busca pela transparência, os dados abertos podem se constituir em um caminho para a
concretização desta transparência (SILVA et al., 2014). Gorman (2009, p. 9, tradução nossa)
coloca que “os governos podem disponibilizar informações por meio de relatórios, mapas e
gráficos, mas também podem disponibilizá-las como dados”.

A informação é um bem público. De acordo com Gorman (2009, p. 9, tradução nossa) “Na
economia, o conceito de bem público descreve uma situação na qual o consumo de um bem ou
21

serviço por um indivíduo não reduz a disponibilidade do bem ou serviço para outro”. À
inteligência das administrações públicas junta-se a inteligência coletiva para produzir
conhecimento, filtrá-lo, melhorá-lo e atualizá-lo (LÓPEZ; SAGOL, 2012). Silva (2010, p. 123)
reforça dizendo que “O conceito de dados governamentais abertos, portanto, se relaciona com
o entendimento de que a maneira como os governos disponibilizam suas informações deve
permitir que a inteligência coletiva crie melhores formas de trabalhá-las do que os próprios
governos poderiam fazer”.

A política de dados abertos no Brasil pode ser observada a partir do ano de 2011 quando,
juntamente com outros 7 países, tornou-se membro fundador da Open Government Partnership
(OGP). No mesmo ano foi aprovada a Lei de Acesso à Informação (LAI) (Lei nº 12.527/2011).
Além destas ações também podem ser citadas a instituição da Infraestrutura Nacional de Dados
Abertos (INDA)3, a criação do Portal de Dados Abertos do governo federal4 e a definição de
padrões oficiais de interoperabilidade, definindo, dentre outros, a forma de intercâmbio de
dados entre sistemas (FGV, 2015). É bastante visível o fato de que o Poder Executivo Federal
está em um nível mais avançado em relação aos Estados e Municípios pois, em relação a estes
últimos, somente podem ser verificadas poucas e pontuais iniciativas (ISSA, 2013).

Uma pesquisa realizada pelo Projeto Democracia Digital (FGV, 2015), da FGV, envolveu o
exame dos portais do governo federal, dos estados, das prefeituras das capitais brasileiras e dos
34 municípios acima de 400 mil habitantes, totalizando 88 governos. A intenção foi investigar
a disponibilização de dados abertos, seja por meio de um portal específico, do portal da
transparência ou do portal do próprio ente público. O resultado apontou que aproximadamente
70% dos Estados possui dados abertos em algum dos três portais pesquisados. Nas capitais este
percentual é de 55,5% e nos municípios de grande porte é de 44,1%. A pesquisa apresenta ainda
resultados bem menos animadores se forem considerados apenas os dados abertos localizados
em portais específicos.

3
Compreende a política nacional para dados abertos estabelecida em abril de 2012. Pode ser acessada em
https://www.governoeletronico.gov.br/eixos-de-atuacao/cidadao/dados-abertos/inda-infraestrutura-nacional-de-
dados-abertos
4
Portal onde são apresentados os dados abertos de ministérios, secretarias e outros entes públicos. Pode ser
acessado em http://dados.gov.br/. Reúne, atualmente, 7298 conjuntos de dados.
22

Existem poucas evidências de que os demais municípios brasileiros, aqueles com população
inferior a 400 mil habitantes, disponibilizem dados abertos. Alguns trabalhos ilustram a
atividade em um ou outro município, geralmente as mesmas capitais estaduais ou aqueles de
grande porte. De qualquer forma o que se observa, naqueles que apresentam, são conjuntos de
dados pouco numerosos e com atualização irregular. Estes municípios “estão seguindo uma
tendência mundial (de disponibilização de bases de dados on-line) sem ter claramente definido
o objetivo e a motivação institucional deste movimento” (REIS; ARAÚJO; SAMPAIO, 2015,
p. 21).

Estes dois últimos elementos, tanto a pesquisa realizada pelo Projeto Democracia Digital
quanto a evidência de que pouquíssimos municípios disponibilizam dados de forma aberta,
provocam a seguinte questão: por que os municípios, principalmente por parte dos poderes
executivos, não disponibilizam, ou o fazem de forma muito tímida, suas informações segundo
a iniciativa de dados abertos? Concha e Naser (2012, p. 10, tradução nossa) apontam para alguns
fatores que direcionam pesquisas nesta área:

Parece fácil colocá-lo em prática, mas engloba uma série de complexidades, tanto
técnicas quanto de gestão, bem como uma mudança nas regulamentações vigentes e,
sobretudo, envolve a necessidade de uma vontade política para realizá-la. Sabemos
que, em suma, este último geralmente é o gargalo mais difícil de resolver.

Esta pesquisa nasceu, assim, deste questionamento e dos encaminhamentos. propostos. O


estudo foi desenvolvido, para responder à seguinte pergunta: Quais são e em que medida os
fatores políticos, burocráticos e tecnológicos interferem na disponibilização de dados
municipais abertos.

O objetivo principal do trabalho, na tentativa de resposta ao questionamento, foi estabelecido


como identificar e analisar os fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que dificultam ou
impedem a disponibilização de dados abertos municipais. Esta intenção foi detalhada por um
conjunto de objetivos secundários os quais, cumulativamente, pretenderam dar conta do
questionamento formulado: a) caracterizar os dados abertos governamentais no contexto
municipal, identificando possibilidades de sua aplicação na promoção da transparência pública,
da participação, do controle social e da cidadania; b) mapear e analisar o marco legal existente;
c) verificar se, e como, os municípios disponibilizam dados abertos; d) verificar e analisar a
percepção dos diversos atores (públicos, privados e da sociedade civil) em relação à
transparência pública, participação, colaboração e à disponibilização de dados abertos
23

municipais; e e) identificar as dificuldades apresentadas pelos municípios e que contribuem


para o atual estado da transparência pública e para o não oferecimento de Dados
Governamentais Abertos.

A abertura de dados governamentais ganhou impulso a partir de encontro realizado em


Sebastopol, Califórnia, em dezembro de 2007, quando foram definidos os princípios que regem
o movimento (CHIGNARD, 2013). Apesar de constituir-se em um conceito recente há um
número considerável de Estados5 que disponibilizam, de alguma forma, seus dados abertamente
na internet. O movimento na escala municipal, por outro lado, é incipiente. Este estudo, ao
analisar os governos municipais e seus dados, parte da necessidade de que o modelo de dados
abertos seja universal. Apenas no Brasil são 5570 municípios e uma infinidade de dados e
informações escondidos em alguma gaveta ou arquivo de dados do serviço público (CONCHA;
NASER, 2012).

Os estudos que abordam o tema, já realizados por diversos pesquisadores, apresentam, via de
regra, duas características semelhantes. Em alguns casos analisam a atuação dos governos a
nível federal, estadual ou de municípios de grande porte e, em outros, abordam o assunto por
meio de critérios técnicos, puramente conceituais, não considerando um conjunto restrito de
atores e dimensões que produzem e podem se beneficiar ou contribuir para a produção de
conhecimento a partir de dados públicos abertos. Este trabalho pretende seguir nesta última
direção, procurando identificar e analisar, além dos elementos conceituais, os fatores políticos,
burocráticos e tecnológicos que impõe barreiras ao oferecimento de dados abertos nos
municípios brasileiros. Pretende, ainda, explorar os potenciais empregos dos dados municipais
abertos tanto pelos próprios agentes públicos quantos pelos cidadãos, individualmente ou
associados em algum tipo de instituição.

Para Alves-Mazzotti (1998) o debate atual nas Ciências Sociais apresenta três paradigmas: o
construtivismo social, influenciado pelas correntes filosóficas da fenomenologia e do
relativismo; o pós-positivismo, com preferência por modelos experimentais e quase-
experimentais com teste de hipóteses, com vistas a formular teorias explicativas de relações
causais; e a teoria crítica, que enfatiza o papel da ciência na transformação da sociedade e cuja

5
O índice global de dados abertos (GLOBAL OPEN DATA INDEX, 2016) apresenta relação com 94 países com
alguma forma de disponibilização de dados abertos.
24

abordagem é essencialmente relacional, já que procura investigar o que ocorre nos grupos e
instituições relacionando as ações humanas com a cultura e as estruturas sociais e políticas,
visando compreender como as redes de poder são produzidas, mediadas e transformadas
(ALLEBRANDT, 2007). Este estudo inscreve-se neste último paradigma.

De acordo com Godoy (1995), ao contrário das pesquisas quantitativas que trabalham
fundamentalmente com informações obtidas por medições ou contagens e que empregam
ferramentas estatísticas, as pesquisas qualitativas envolvem "a obtenção de dados descritivos
sobre pessoas, lugares e processos interativos pelo contato direto do pesquisador com a situação
estudada, procurando compreender os fenômenos segundo a perspectiva dos sujeitos, ou seja,
dos participantes da situação em estudo". Segundo Goldenberg (2004) "os dados qualitativos
consistem em descrições detalhadas de situações com o objetivo de compreender os indivíduos
em seus próprios termos". Ainda, segundo Goldenberg (2004), o fato dos dados não serem
passiveis de padronização obriga "o pesquisador a ter flexibilidade e criatividade no momento
de coletá-los e analisá-los".

A Hermenêutica de Profundidade (HP), opção metodológica adotada neste trabalho, foi


desenvolvida pelo britânico John B. Thompson (1995) e se constitui como importante
referencial teórico-metodológico para o desenvolvimento de investigações sociais, pautadas em
uma metodologia qualitativa e interpretativa, já que inclui formas de análise complementares
entre si, partes de um processo interpretativo complexo. A proposta de Thompson contempla
uma perspectiva metodológica menos descritiva e mais analítica, interpretativa, em que a
racionalidade argumentativa tem um papel preponderante. A Hermenêutica de Profundidade
parte do pressuposto que o “objeto de análise é uma construção simbólica significativa, que
exige uma interpretação (THOMPSON, 1995, p. 355). Assim, a interpretação tem papel central
para o entendimento do objeto a ser estudo pelo cientista social. Nessa orientação, a
interpretação construída pelo pesquisador em relação aos fenômenos sociais a que se dedica –
necessariamente relacionados à dimensão cultural e política – deve se dar em um contexto de
argumentação de sua validade diante de todas as outras interpretações possíveis. A construção
teórico-metodológica de Thompson possui interfaces com a hermenêutica de Paul Ricoeur e de
Wilhem Dilthey, com a hermenêutica filosófica de Hans-Georg Gadamer e com a teoria crítica
de Habermas, e a partir dessas ideias surge uma metodologia de interpretação de formas
simbólicas, sejam escritas ou faladas, e a análise de como essas formas influenciam e de como
são influenciadas pela sociedade.
25

Nesse contexto, para entender-se a Hermenêutica de Profundidade que lança seu olhar
principalmente sobre a maneira como as formas simbólicas são produzidas, transformadas e
transmitidas na sociedade, um dos elementos prioritários a serem conhecidos são justamente as
formas simbólicas: “fenômenos significativos que são tanto produzidos como recebidos por
pessoas situadas em contextos específicos”, (THOMPSON, 1995, p. 23), ou ainda “amplo
espectro de ações e falas, imagens e textos, que são produzidos por sujeitos e reconhecidos por
eles e outros como construtos significativos (THOMPSON, 1995), sendo que sob essa
perspectiva, não somente textos, imagens e falas podem ser interpretadas, mas também
opiniões, crenças, juízos, atitudes, ideologias e formas de dominação.

Diante disso, a Hermenêutica de Profundidade assume que a análise social já é uma


interpretação por parte dos atores que vivem a realidade, ou seja, os fenômenos e os
acontecimentos já estão carregados de uma pré-interpretação realizada pelos atores que os
vivenciam. Assim, o cientista social, recorrerá a uma reinterpretação para entender e explicar a
realidade, o que exige dele uma ampla imersão nas condições metodológicas necessárias para
interpretar o que já está interpretado.

Em regra, o primeiro passo metodológico do cientista social é chamado de Interpretação da


Doxa, ou Hermenêutica da vida cotidiana, entendido como um olhar sobre a forma como os
sujeitos entendem a sua realidade para então interpretar as crenças, opiniões e compreensões
que são partilhadas e sustentadas pelos agentes sociais. Thompson chama essa etapa de
momento etnográfico, um momento onde se valerá para entender os sujeitos, como percebem a
sua realidade, quais são suas crenças, opiniões, senso comum, enfim, a compreensão que os
atores têm da sua realidade. A Interpretação da Doxa é importante e indispensável e, segundo
Thompson, não levar em conta a Doxa é desconsiderar a dimensão de que os fenômenos sociais
já estão colocados e interpretados pelas pessoas nas dinâmicas de suas vidas muito antes da
chegada do pesquisador (THOMPSON, 1995). Para entender a vida cotidiana, o cientista social
pode desenvolver entrevistas, observações participantes, conversas narrativas formais e/ou
informais e outros tipos de técnicas etnográficas que ajudem a entender como as formas
simbólicas são interpretadas e compreendidas nos contextos cotidianos.

Após a Interpretação da Doxa – que deve ser entendido como um ponto de partida, e não como
um fim - Thompson sugere outras três fases que, embora colocadas como etapas a serem
cumpridas e que possuem uma ideia de ligação e complementaridade, não são necessariamente
26

etapas cronológicas pré-definidas. A forma como as etapas deverão ser cumpridas pode ser
definida conforme o contexto, os objetivos da análise e o espírito crítico do pesquisador, sendo
que muitas vezes poderá haver a necessidade de se voltar e complementar uma análise que por
algum momento tenha se dado como finalizada. Ir além é o que diferencia a Hermenêutica da
Profundidade (THOMPSON, 1995). Na ilustração da Figura nº 1 é possível visualizar as
relações entre as fases e possíveis técnicas a serem utilizadas para a compreensão da realidade
em cada uma delas.

Figura 1 Hermenêutica de Profundidade (HP) – Etapas a serem cumpridas

Fonte: (PREDIGER; SCHERER; ALLEBRANDT, 2018)

A Hermenêutica de Profundidade representa um referencial dentro do qual diversos métodos,


instrumentos e procedimentos de análise, interpretações e busca de entendimentos podem ser
inter-relacionados. Buscar o contexto, a historicidade, a relação com o espaço, com o tempo, a
cultura, as ideologias, entender as posições, percepções, os discursos, tornam-se possíveis por
meio da utilização desse método (PREDIGER; SCHERER; ALLEBRANDT, 2018).

A Análise Sócio Histórica, para Prediger, Scherer e Allebrandt (2018, p. 5), parte

desse pressuposto - de que as formas simbólicas não ocorrem no vazio, mas num
espaço social e histórico especifico, e que também estão em um contexto político
27

específico – o objetivo da fase de análise sócio histórica é reconstruir as condições


sociais e históricas de produção, alteração, interpretação, apreensão, inter-relação
entre gerações, recepção e aceitação ou contestação dessas formas simbólicas.
Objetiva-se, mais que conhecer e interpretar, entender os contextos relacionados com
toda e qualquer forma simbólica relacionada com o objeto de análise.

Para Thompson (1995) esta fase compreende quatro níveis de análise:

− As situações espaço-temporais, que consideram o recorte de tempo e espaço em que as


formas simbólicas prevalecem;

− Os campos de interação social que compreendem um espaço de posições e conjunto de


trajetórias;

− As Instituições Sociais que refletem os conjuntos de regras, recursos e relações que se


formam dentro dos campos de interação social; e

− Estrutura social: refere-se às desigualdades e assimetrias que se dão no conjunto de


instituições sociais.

A etapa da análise formal ou discursiva pressupõe a possibilidade de emprego de diversas


abordagens, métodos, técnicas e instrumentos para sua condução. O emprego destas abordagens
considera que as formas simbólicas “são produtos contextualizados e algo mais, pois são
produtos que em decorrência da sua estrutura tem capacidade e objetivo de dizer algo sobre
alguma coisa a alguém” (PREDIGER; SCHERER; ALLEBRANDT, 2018, p. 6). São diversos
métodos e técnicas à disposição do pesquisador para a realização desta etapa. Uma delas é a
Análise de Conteúdo tal como apresentada por Bardin (2011). O método, para sua condução,
considera um conjunto de fases que partem da organização da análise e que seguem com a
codificação, a categorização e encerra com o tratamento dos resultados, inferência e a
interpretação dos resultados. As entrevistas em profundidade, com os diversos sujeitos da
pesquisa, foram objeto de análise segundo tal perspectiva.

A última fase, no referencial teórico proposto por Thompson (1995) é a


Interpretação/Reinterpretação. O pesquisador, principalmente por síntese e reconstrução,
propõe sentidos e alternativas possíveis, baseado nos elementos obtidos nas duas outras fases.
Neste trabalho pretende-se apontar motivos, dificuldades, alternativas, modelos, planos ou
28

estratégias que, por um lado dificultam ou inibem e, por outro, resultem em possibilidades
concretas de oferecimentos de dados abertos nos municípios.

Diversos instrumentos foram utilizados para a realização da pesquisa. Um primeiro grupo, que
inclui questionários on-line e observações in loco, foram submetidos à totalidade das
administrações municipais do Estado do Rio Grande do Sul. Um segundo expediente
compreendeu a realização de entrevistas em profundidade em 8 municípios. De um lado foram
entrevistados integrantes dos governos municipais em diversas funções: prefeitos, vice-
prefeitos, presidentes de câmaras de vereadores, vereadores, servidores comissionados e
servidores públicos efetivos. Além destes membros dos governos foram também considerados
representantes, principalmente os presidentes, dos Conselhos Municipais e dos Conselhos
Regionais de Desenvolvimento. Ainda, com a intenção de construir uma interpretação
abrangente e adequada em relação ao tema, foram também entrevistados Promotores Públicos
que atuam em casos de improbidade administrativas e gestores e analistas de sistemas que
trabalham em empresas desenvolvedoras de software para a administração pública municipal.

Apesar do estudo ser caracterizado como qualitativo, algumas análises e caracterizações foram
suportadas por dados quantitativos. Estes dados, alguns primários construídos em levantamento
de informações e nos questionários semiestruturados e outros secundários, obtidos em diversas
instituições, principalmente o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), foram
objeto de manipulação estatística com o suporte de softwares adequados como o Statistical
Package for the Social Sciences6 (SPSS), o Excel7 e o R8 em combinação com o R Studio9.
Estes instrumentos estatísticos, fundamentalmente descritivos, foram empregados na
caracterização do tema em análise e dos municípios abrangidos.

O trabalho exigiu, também, a elaboração de mapas de forma a caracterizar adequadamente os


espaços e os recortes geográficos. A construção destes mapas, com toda a gama de detalhes

6
O Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) é um software para tratamento estatístico de dados
desenvolvido e disponibilizado pela DMSS, subsidiária da IBM. Mais informações podem ser obtidas em
https://www.dmss.com.br/index.html
7
O Excel é uma planilha eletrônica produzida e disponibilizada pela Microsoft e que incluí funcionalidades para
tratamento estatístico de dados. Mais informações podem ser obtidas em https://www.microsoft.com
8
O R é um software livre que compreende uma linguagem e ambiente para computação estatística e gráficos. Mais
informações podem ser obtidas em https://cran.r-project.org/
9
O R Studio é um ambiente visual e constitui-se em uma interface simples para utilização do R. Mais informações
podem ser obtidas em https://rstudio.com/
29

necessários, foi realizada com o emprego de ferramentas computacionais específicas,


principalmente o ArcGis10.

No que se refere ao processo de análise das entrevistas, a mesma não foi realizada de forma
independente da condução da pesquisa, já que aspectos como o tipo de transcrição de entrevistas
a ser realizado (se integral, parcial, utilizando códigos etc.) é parte integrante do processo de
análise. Como se trata de uma abordagem essencialmente qualitativa, a natureza da análise é
circular e iterativa. É comum voltar aos dados várias vezes. Ao mesmo tempo em que vão sendo
ouvidas as gravações de entrevistas e/ou lidas transcrições, os questionários e os documentos,
vão se anotando características e aspectos de interesse que se realçam. Em suma, e
principalmente em função da metodologia adotada, os dados foram trabalhados durante um
longo período, voltando a eles várias vezes, buscando padrões e os significados dos mesmos.

Para o processo de análise dos documentos coletados e das entrevistas realizadas foi utilizado
o software NVivo11. Este software é normalmente empregado em análises textuais e permite a
codificação de palavras ou segmentos do texto em categorias ou grupos além de produzir um
conjunto bastante amplo de relatórios para auxílio ao pesquisador. Pode propiciar, desta forma,
suporte adequado ao pesquisador nas diversas fases previstas na Hermenêutica de Profundidade
e, de modo particular, na Análise Formal onde foi empregada a Análise de Conteúdo em suas
três etapas: a organização da análise, a codificação e a categorização e o tratamento dos
resultados, inferência e a interpretação dos resultados.

A tese está organizada, além desta introdução, em cinco capítulos, mais as considerações finais,
as referências bibliográficas e os apêndices que acrescentam alguns formulários utilizados na
pesquisa.

Os dois primeiros capítulos, após esta introdução, recuperam os fundamentos teóricos que
norteiam este trabalho. No capítulo 2 são discutidas as formas elementares da democracia, ao

10
O ArcGis é um ambiente, desktop e online, voltado a elaboração de mapas e análises espaciais. Mais informações
podem ser obtidas em https://www.esri.com.
11
O NVivo é um software para análise de dados produzido pela QSR International e desenvolvido para auxílio em
pesquisas qualitativas. Mais informações podem ser obtidas em https://www.qsrinternational.com/
30

longo da história e também nos dias atuais. Este capítulo traz, ainda, a importância e as formas
pelas quais um dos principais atributos da democracia, a transparência pública, se manifesta.

O terceiro capítulo apresenta os conceitos os aspectos históricos, os princípios e as


características tanto dos denominados Governos Abertos quanto do movimento, iniciado em
2007, relacionado aos Dados Governamentais Abertos. O primeiro, embora se constitua apenas
como uma filosofia de governo, traz como seus elementos fundamentais a transparência
pública, a participação e a colaboração dos cidadãos. Os dados abertos pavimentam uma série
de possibilidades para que estes elementos se concretizem.

O capítulo 4 apresenta um panorama da transparência pública, no Brasil, e do movimento de


Dados Governamentais Abertos tanto a nível nacional quanto no contexto internacional. O
capítulo mostra as experiências, as dificuldades e os impactos proporcionados pelo uso e pelas
aplicações desenvolvidas para reutilização dos dados governamentais.

No quinto capítulo o foco concentra-se nos municípios do Estado do Rio Grande do Sul. O
propósito é, a partir de suas características geográficas e populacionais, exibir a forma como
obtém os instrumentos que compões seus portais na internet bem como os recursos disponíveis
para tanto. Estes portais compreendem todo o tratamento dispendido pela grande maioria dos
municípios em relação à transparência pública e a participação dos cidadãos. Este capítulo
mostra, ainda, as acanhadas iniciativas para a disponibilização de Dados Governamentais
Abertos.

O último capítulo apresenta a percepção demonstrada por diversos atores sociais em relação ao
tema específico da pesquisa e também vinculadas aos fundamentos conceituais que o sustentam.
Estas percepções são interpretadas à luz de um conjunto de categorias e critérios de análises, as
quais incluem a transparência pública, a participação e a colaboração dos cidadãos e os
elementos relacionados aos Governos Abertos e Dados Governamentais Abertos. O capítulo
incorpora, também, os diversos motivos, ou razões, para o não oferecimento de dados abertos
pelos poderes executivos dos municípios gaúchos.

A última parte deste trabalho é constituída pelas considerações finais onde apresenta-se uma
síntese final do trabalho, com a recuperação de alguns elementos fundamentais para a
compreensão da democracia, transparência, participação e dados abertos e, de forma
31

propositiva, são consideradas algumas alternativas para o futuro do movimento de dados


abertos, principalmente no Brasil, em nível municipal.
32

2 DEMOCRACIA, TRANSPARÊNCIA E ACESSO À INFORMAÇÃO

“Pode o mundo inteiro ser democrático?”. Esta questão norteou trabalho desenvolvido por
Larry Diamond em artigo publicado no ano de 2003 (DIAMOND, 2003, p. 9). Para o autor a
resposta poderia ser positiva e independeria do nível cultural, história e grau de pobreza da
população. Diamond esboça uma resposta dizendo:

Se o mundo inteiro vai tornar-se democrático, então as democracias de hoje devem


continuar a ser democráticas, e em muitos casos isso significa que devem ser
governadas com mais precisão. Enfatizei a nova atitude de sobriedade e realismo da
população, mesmo naquelas democracias que não estão funcionando bem. As pessoas
conhecem as outras alternativas e não gostam delas. Eles ainda apoiam a democracia.
[...] No entanto, a democracia em escala global nunca foi tão imaginável e alcançável.
A história provou ser a melhor forma de governo. Culturalmente, é cada vez mais
valorizada universalmente. (DIAMOND, 2003, p. 37–38) (Tradução nossa)

Entretanto, a partir da distribuição das democracias pelas diversas regiões do mundo e de fatores
que contribuem para a democratização dos Estados ou para a resistência daqueles países não
democráticos, o autor ressalva:

Mas continuarão a fazê-lo por uma década ou duas, se uma nova geração - sem
experiência direta nos custos e falsas ilusões de um governo autoritário - encontrar-se
sem educação, sem emprego, sem justiça e praticamente sem esperanças? A
democracia só será mantida se continuar a ser o menos ruim dos sistemas. Se a
deterioração for severa e for mantida por um longo período de tempo, alguma nova
alternativa aparecerá [...] O triunfo total da democracia no mundo está, portanto, longe
de ser inevitável. Uma onda reversa de rupturas democráticas não pode ser descartada.
(DIAMOND, 2003, p. 37–38) (Tradução nossa)

Diamond faz referências ao comportamento passado dos regimes democráticos pelo mundo
como forma de alerta para suas possibilidades no futuro. A democracia somente atingiu uma
dimensão significativa durante o desenrolar do século XX e, mesmo assim, sem uma trajetória
de desenvolvimento constante e crescente. Huntington ilustra estes fenômenos em sua obra
clássica, “A terceira onda: a democratização no final do século XX”. Para o autor

uma onda de democratização é um grupo de transições de regimes não democráticos


para democráticos, que ocorrem em um período de tempo específico e que
significativamente são mais numerosas do que as transições na direção oposta durante
tal período. Uma onda normalmente envolve também liberalização ou democratização
parcial nos sistemas políticos que não se tornam completamente democráticos.
(HUNTINGTON, 1994, p. 23).

O quadro nº 1 reflete estas idas e vindas, ou ondas, da distribuição da democracia até o ano de
1990. O que Huntington procura mostrar é, inicialmente, o fato de que estas ondas de
33

democratização não significam movimentos repentinos e de curta duração, mas sim que
constituem períodos da história em que os movimentos, em uma direção ou outra, ocorreram.
Huntington também ressalva que a cada onda corresponde uma contra onda onde se verificaram
reversões no processo democrático.

Quadro 1 Ondas de democratização e ondas reversas de democratização - 1828 a 1990


Movimento Período Mudanças (número de países)
Primeira onda democrática 1828 - 1926 +33
Primeira onda reversa 1922 - 1942 -22
Segunda onda democrática 1943 - 1962 +40
Segunda onda reversa 1958 - 1975 -22
Terceira onda democrática 1974 - +33
Fonte: Elaborado pelo autor, a partir de (HUNTINGTON, 1994)

Huntington, sobre as ondas de democratização e, principalmente, sobre os processos de


reversões coloca que “De certo modo, as ondas democráticas e as ondas reversas, sugerem um
padrão do tipo dois passos à frente e um passo atrás. Até hoje, cada onda reversa eliminou
algumas, mas nem todas as transições para a democracia da onda democrática anterior”
(HUNTINGTON, 1994, p. 35). Neste sentido o próprio autor adverte, na época em que o livro
foi lançado, para a possibilidade de uma terceira contra onda. Lührmann (2019) e Fukuyama
(2015), agora olhando para o contexto atual, destacam movimentos em diversos países do
mundo, chamando a atenção para uma possível terceira onda de reversão democrática.

Passadas quase duas décadas do estudo de Diamond, citado inicialmente, o mundo, obviamente,
mudou. Diamond baseou suas análises em dados disponibilizados pela Freedom House12. Esta
mesma organização disponibilizou para o ano de 2017 dados relativos a 195 países. A tabela nº
1 compara estas informações com o ano de 2002, último ano apresentado por Diamond em seu
artigo. Estes dados parecem confirmar algumas das conclusões de Diamond visto que, embora
sejam números bastante semelhantes, o número de países democráticos em 2017 diminuiu em
relação ao ano de 2002.

12
A Freedom House, de acordo com o seu portal na internet, implementa programas que apoiam os defensores dos
direitos humanos e da democracia em seus esforços para promover o governo aberto, defender os direitos humanos,
fortalecer a sociedade civil e facilitar o livre fluxo de informações e ideias. Fundada em 1941, com escritórios em
diversos locais, publica informações relacionadas, principalmente, com a liberdade e a democracia. Pode ser
acessada em http://freedomhouse.org.
34

Tabela 1 Democracias em países do mundo - 2002 e 2018


Ano Número de países Democracias13 Percentual
2002 193 121 62,7%
2017 195 116 59,5%
Fonte: Elaborada pelo autor - Dados obtidos em (DIAMOND, 2003; FREEDOM HOUSE, 2019)

A evolução do número de países democráticos pode ser acompanhada por meio de dados
produzidos por dois projetos dedicados ao estudo e mensuração de regimes democráticos. O
primeiro é o projeto Polity IV mantido pelo Center for Systemic Peace (CSP)14. O conjunto de
dados do projeto Polity IV considera os principais Estados independentes, com população igual
ou superior a 500.000 habitantes, durante o período de 1800 a 2018. O projeto monitora
constantemente as características do regime em todos os principais países e “prevê um espectro
de autoridade governante que se estende de autocracias totalmente institucionalizadas através
de regimes de autoridade mistos, ou incoerentes, (denominados "anocracias") para democracias
plenamente institucionalizadas.” (CSP, 2019)

O segundo projeto é denominado Variedades de Democracia (V-Dem) e é mantido pelo


instituto de mesmo nome15. O projeto qualifica-se como “uma nova abordagem para conceituar
e medir a democracia”. (V-DEM, 2019) Consta em seu portal que o conjunto de dados
disponibilizados pelo projeto é

multidimensional e desagregado que reflete a complexidade do conceito de


democracia como um sistema de regras que vai além da simples presença de eleições.
O projeto V-DEM distingue entre cinco princípios de alto nível da democracia:
eleitoral, liberal, participativo, deliberativa e igualitária, e recolhe dados para medir
esses princípios. (V-DEM, 2019)

13
A Freedom House trabalha, em suas pesquisas, com o conceito de democracia eleitoral.
14
O CSP foi fundado em 1997 e monitora continuamente o comportamento político em cada um dos principais
Estados do mundo, ou seja, todos aqueles com populações atuais maiores que 500.000 pessoas (167 países em
2014) e disponibiliza informações sobre questões emergentes e condições persistentes relacionadas aos problemas
de violência política e "fracasso do Estado". Pode ser acessado em hrrp://www.systemicpeace.org
15
O Instituto V-DEM é um Instituto de pesquisa independente e sede do projeto V-Dem e está baseado no
Departamento de Ciência Política da Universidade de Gotemburgo, Suécia. Pode ser acessado em https://www.v-
dem.net
35

Os cinco princípios citados são combinados para a construção de um índice que caracteriza o
regime de um país em 4 níveis distintos: Autocracias fechadas, Autocracias eleitorais,
Democracias eleitorais e Democracias liberais.

O gráfico da figura nº 2 foi elaborado a partir dos dados fornecidos por ambos os projetos, com
alguns ajustes e transformações. No primeiro caso, com os dados do projeto Polity IV, o número
de países anocráticos foi adicionado ao número de países autocráticos totalizando o que está
referenciado como países não democráticos. Já para os dados do projeto V-Dem o número de
autocracias fechadas e o número de autocracias eleitorais foram somados e formaram, no
gráfico, o número de países não democráticos. Também o número de democracias eleitorais e
o número de democracias liberais foram somados e resultaram no número de democracias.

Figura 2 Evolução da democracia - 1800 a 2018

Fonte: Elaborado pelo autor - Dados obtidos em Polity IV (CSP, 2019) e V-Dem (V-DEM, 2019)

Os dados obtidos nos dois projetos abordam o mesmo fenômeno de formas e metodologias
diversas, principalmente àquelas relativas aos métodos para definir se um determinado país é
ou não democrático ou o quão democrático é um país. Outras duas diferenças, que não
interferem no processo de interpretação, são mais visíveis. A primeira é relativa ao período
apurado. Enquanto o projeto Polity IV fornece dados para um período que inicia em 1800 o
projeto V-Dem apresenta 1900 como ano inicial. A outra diferença é relativa ao número de
36

países pesquisados. Até o ano de 1900 o projeto Polity IV considerou, no maior caso, 59 países.
No ano de 1900 pesquisou 54 países contra 113 do projeto V-Dem. Nos últimos 5 anos, a partir
de 2014, o número de países tem se mantido constantes (166 países no projeto Polity IV e 179
no projeto V-Dem).

Os resultados, entretanto, aparentam muitas semelhanças. Há um crescimento no número de


países democráticos em contraposição a governos não democráticos. No caso do projeto Polity
IV o ponto onde o número de democracias supera o de não democracias ocorre no ano de 2001.
Na pesquisa conduzida pelo projeto Variedades de Democracia o momento em que ocorre a
superação acontece no ano de 2002, embora no ano de 2001 os números de países democráticos
e não democráticos sejam iguais.

Chama a atenção a proximidade apresentada pelos dados dos dois projetos em relação ao
número de democracias. Graficamente tem-se a impressão de linhas sobrepostas, com poucos
períodos onde estes dados mostram uma divergência um pouco maior. Os dados divergem de
forma acentuada quando referentes ao número de não democracias. Há uma diferença maior até
próximo ao ano de 1980 quando, inclusive, as linhas apresentam comportamentos diferente. O
número de países não democráticos, registrados pelo projeto Polity IV, estão em linha
ascendente enquanto que os do projeto V-Dem já apresentam tendência de queda. A partir de
1977, entretanto, o comportamento dos números é semelhante permanecendo apenas a
diferença oriunda do número de países pesquisados em cada um dos projetos.

Finalmente, para efeitos de comparação inclusive com os números obtidos na Freedom House,
as informações obtidas no projeto Polity IV, relativas ao ano de 2018, representam um conjunto
de 166 nações, das quais 99 são democracias. Neste ano o projeto contabiliza 67 paises não
democráticos sendo 21 autocracias e 46 anocracias. O projeto V-Dem, em contrapartida,
totaliza 179 países sendo 99 democracias e 80 autocracias.

Uma característica bastante frequente nos regimes retratados até aqui, principalmente as
democracias, é o fato de terem uma duração que não lhes permitam estabilidade e consolidação.
Com base nos dados disponibilizados pelo projeto Polity IV (CSP, 2019), das 99 democracias
atuais, 60 nações (60,6%) obtiveram este status de 1990 para cá. Em outras palavras estas
democracias tem menos de 30 anos de duração. Este comportamento, que compreende
mudanças frequentes no regime político, pode ser ressaltado pela observação de que desde 1800
37

(ano inicial de coleta de informações pelo projeto Polity) houve 124 avanços de Autocracias
para Anocracias e 75 avanços de Anocracias para Democracias. Pelo lado oposto observam-se
94 retrocessos de Democracias para Anocracias e 187 retrocessos de Anocracias para
Autocracias.

Uma forma diferente de abordagem é proporcionada por Max Roser em trabalho de compilação
de dados e informações sobre democracia (ROSER, 2019). Os dados produzidos pelos projetos
Polity IV e V-Dem são relativos a países, não importando as eventuais diferenças entre eles,
principalmente populacional. O gráfico da figura nº 3 exibe, para o período de 1816 a 2015, o
número de pessoas em relação ao tipo de regime em que vivem em seus respectivos países.

Figura 3 População mundial e regimes de governo - 1816 a 2015

Fonte: Our World in data (ROSER, 2019). Adaptado pelo autor.

Roser buscou informações em diversas fontes. A população de cada país até o ano de 1950 foi
acessada em Gapminder16. Após esta data Roser usou dados populacionais das Nações Unidas.
Os dados referentes ao regime político foram obtidos no projeto Polity IV e isto permite

16
O site Gapminder oferece dados e indicadores referentes a diversos temas e locais. Pode ser acessado em
https://www.gapminder.org/data/
38

comparabilidade com os dados apresentados anteriormente. O quadro nº 2 detalha as


informações para alguns períodos, complementando o gráfico da figura nº 3.

Quadro 2 Países e população em regimes democráticos e não democráticos


Democracias Não Democracias
Ano Número de países População Número de países População
Número de pessoas Número de pessoas
1816 1 9.243.738 30 530.119.128
1973 36 1.436.526.971 100 2.020.384.659
2015 96 4.101.291.986 70 2.944.639.660
Fonte: Elaborado pelo autor. Dados obtidos no projeto Polity IV (CSP, 2019) e Our World in Data (ROSER, 2019)

A escolha dos períodos foi determinada pela intenção de comparação dos dados com as
informações apresentadas até agora. Em 1816, ano inicial dos números apresentados por Roser
(2019), o número de habitantes no único país considerado democrático era aproximadamente
60 vezes menor que os habitantes de países não democráticos. Em 2015, último ano
disponibilizado por Roser, este quadro transformou-se completamente, tanto em relação ao
número de países quanto à população residente em cada um dos grupos de países. A maior parte
da população mundial, quase 56% em 2015, vivia sob um regime democrático.

O ano de 1973 coincide com a véspera da terceira onda de democratização. Neste ano, de
acordo com Huntington (1994), haviam 30 nações democráticas e 92 não democráticas. Embora
estes números não sejam exatamente iguais, também não constituem diferenças significativas.
Neste período, de 1973 a 2015, a população que vive sob democracia aumentou em 185% contra
um aumento de apenas 45% na população dos países não democráticos. O número de países
democráticos aumentou quase três vezes neste período, em contraposição ao decréscimo de 30
países não democráticos.

Pode-se, baseado nos dados até aqui apresentados, dar uma resposta à indagação de Diamond
(2003). O mundo, pelo menos até este momento da história, não se tornou inteiramente
democrático. Independente do conceito e da forma de democracia que se considere ainda restam
muitas nações e muita gente vivendo fora de democracias. Olhando novamente para Lührmann
(2019) e Fukuyama (2015) existem possibilidades, neste momento, de novos retrocessos. A
democracia está, portanto, longe de ser um valor universal.
39

2.1 A DEMOCRACIA E SUAS FORMAS

Uma das poucas características em comum destes 99 países consiste no fato de terem sido
considerados democráticos no ano de 2018 (CSP, 2019; V-DEM, 2019). De outra forma estão
situados em todos os continentes, ocupam áreas geográficas de tamanhos diversos, possuem
história, população e capacidade econômica distintas e seus governos, seguidamente,
implementam projetos e ações muito diferentes entre si. Neste emaranhado cultural como cada
nação entende o que é a democracia? Dizendo diferente, é a mesma democracia? Ou ainda,
pode-se conceituar a democracia? Held ilustra com clareza este contexto:

Primeiro, quase todos hoje em dia dizem que são democratas, não importando se
adotam uma visão de esquerda, de centro ou de direita. Regimes políticos de todos os
tipos, por exemplo na Europa Ocidental, no bloco Oriental e na América Latina,
afirmam ser democracias. Contudo, os discursos e ações de cada um destes regimes é
radicalmente diferente dos demais. A democracia parece emprestar uma “aura de
legitimidade” à vida política moderna: regras, leis, políticas e decisões parecem
justificadas e apropriadas quanto são “democráticas”. (HELD, 1987, p. 1)

Arblaster, debatendo questões relacionadas à definição de democracia, coloca:

Democracia é o que W. B. Gallie batizou uma vez de “conceito essencialmente


contestável”. É uma ideia inerentemente discutível e mutável. Tal como “liberdade”,
“igualdade”, “justiça”, “direitos humanos” e assim por diante “democracia” é um
termo que, apesar do seu significado conciso, significará sempre para muitos um
princípio político ou ideal bem-amado, e só por essa razão nunca conseguirá alcançar
uma significação universal única. [...] A democracia é uma das ideias mais duráveis
em política, e no século XX tornou-se uma das mais fundamentais. Não é provável
que perca este caráter fundamental, mas também não é provável que o seu significado
se torne estático ou fixo. (ARBLASTER, 1988, p. 16)

Nobre (2004, p. 21), discorrendo sobre Democracia, coloca que o “sentido do termo parece
fluído e escorregadio”. Todos estes países que agora são, ou foram, considerados democráticos
não implementaram suas democracias da mesma forma e com as mesmas características. Por
esta razão pode fazer sentido referir-se, não a um único, mas a diferentes modelos, ou tipos, de
democracia. Estes países adotam formatos diversos e empregam soluções distintas para muitas
questões, principalmente a representação. São formas diferentes de representação (majoritário,
proporcional ou misto), sistemas partidários, a periodicidade das eleições e as restrições ao
sufrágio universal. Embora todos remetam ao termo “democracia”, podem representar correntes
de pensamento e concepções políticas diversas bem como visões e compreensões teóricas
distintas. (CABRAL NETO, 1997).
40

São muitos os termos utilizados por diversos autores e teóricos para caracterizar os tipos de
democracia, muito possivelmente as mesmas democracias. Held (1987), explica que,
dependendo do rigor com que se queira analisar as semelhanças, ou diferenças, os modelos
podem ser agrupados de um modo ou outro de forma a poder perceber, ou desprezar, detalhes
de cada um deles. Para Held (1987), ainda, existe um relacionamento muito forte entre muitos
dos modelos apresentados ao argumentar sobre variações teóricas e padrões de influência entre
eles. O quadro nº 3 mostra um apanhado destas diversas classificações.

Quadro 3 Modelos de democracia


Autor Modelos
Barrueto e Navia (2013) Minimalista, Procedimental, Maximalista e Resultadista
Bresser-Pereira (2005) Republicana, Participativa e Deliberativa
Grigoli (2014) Elitista, Liberal pluralista, Participativa e Deliberativa
Habermas (1995) Republicana, Liberal e Deliberativa
Held (1987) Clássica, Desenvolvimentista, Direta, Elitista, Pluralista, Legal e Participativa
Lijphart (2012) Majoritárias e Consensuais
Lüchmann (2012) Liberal, Participativa, Associativa e Deliberativa
Nobre (2004) Elitista, Pluralista, Legal e Participativa
O’Donnell (1991) Delegativa e Representativa
Fonte: Elaborado pelo autor.

É evidente que esta lista é bastante limitada e outros autores poderiam ser acrescentados. Muito
possivelmente haveria uma nova profusão de termos para catalogar e caracterizar o tipo de
democracia praticado, tanto no presente quanto em toda a história deste regime.

2.1.1 A democracia direta

As origens da democracia remontam à Grécia antiga. A mais conhecida foi aquela posta em
prática em Atenas onde foi instaurada por volta do século V a.C. (BOBBIO, 1997a; HELD,
1987). Para Loraux (1979, p. 13) “Nas origens, a democracia é ruptura”. A autora cita Heródoto
para continuar

Atenas estava, então, em pleno crescimento. Isto bem prova que, não só um caso
isolado, mas em todo lugar, a igualdade entre cidadãos é uma coisa preciosa:
governados pelos tiranos, os atenienses não eram superiores na guerra a nenhum dos
povos que habitavam à sua volta; libertos dos tiranos, eles, ao contrário, passaram, de
muito, para o primeiro lugar. Isto prova que, na servidão, eles se conduziam,
voluntariamente, como covardes, pensando que trabalhavam para um senhor,
enquanto, uma vez liberados, cada um encontrava seu próprio interesse em cumprir
sua tarefa com zelo. (Heródoto (V, 78) apud LORAUX, 1979, p. 13)
41

A democracia é uma das formas de governo que se contrapõe, principalmente, a aristocracia e


a monarquia (ARBLASTER, 1988; BOBBIO, 1997a). Para Bobbio (1997a) essas formas
representam “o governo de muitos, de poucos e de um só” respectivamente. A expressão
“governo de muitos”, que sempre caracterizou a democracia, tem a ver com a etimologia do
termo, originário da palavra grega demokratia, onde demos tem o significado de povo e kratos
está relacionado ao termo poder (SARTORI, 2009).

A expressão “governo do povo, pelo povo e para o povo” tem sua origem, evidentemente, no
significado resultante da junção destas duas palavras gregas com a contribuição do Presidente
Americano Abraham Lincoln (MELO; MIKUSKA, 2015). A força destas palavras perde
sentido, contudo, quando simplificadas para meros processos eleitorais. “Trata-se não somente
de como um governo é eleito mas também de como se governa e, sobretudo, para quem se
governa” (SUÁREZ-IÑIGUEZ, 2005, p. 40).

Os princípios fundamentais da democracia de Atenas estão representados nas palavras


Isonomía, Isegoría e Isotimia. O termo Isonomia, primeiro e mais significativo destes
princípios, é formado pelas partículas isos (igualdade) y nomos (lei). Pode referir-se, num
primeiro momento, a igualdade de todos perante a lei. Outra interpretação, entretanto, pode
trazer como significado uma igualdade de direitos políticos de todos os cidadãos consagrada na
lei (MOLINA, 2015). Molina complementa:

É a própria existência da democracia que designa a ruptura, o escândalo que permite


que todos, sem distinguir títulos, nascimento, hierarquia nem posses, possam ingressar
ao campo da decisão política e tomar a palavra para expressar suas opiniões (doxai).
Isonomía compreende o próprio governo democrático. (MOLINA, 2015, p. 4,
tradução nossa)

A democracia em Atenas também instituiu o princípio da Isegoria, que representa a


possibilidade de que qualquer um, sem diferenciação social, possa manifestar-se nas
assembleias. Significa não apenas o uso da palavra, mas o fato de que “a palavra do último vale
tanto quanto à do primeiro”. Assim a democracia é revolucionária porque reconhece o direito e
impõe a condição de que os homens possam constituir um mundo comum (MOLINA, 2015, p.
12). Finalmente, por Isotimia entende-se a igual probabilidade de que qualquer um possa ocupar
os cargos públicos mediante sorteio. Este princípio é, talvez, o mais radical da democracia
Ateniense e que, nos tempos modernos, não encontrou replicação (MOLINA, 2015).
42

A democracia de Atenas era direta. Como diz Arblaster (1988, p. 39) “a democracia e o debate
aberto eram inseparáveis“. As decisões eram tomadas diretamente pelos cidadãos, ou pelo
menos, por um conjunto de cidadãos aptos a participar dos processos decisórios. De qualquer
forma não existiam representantes, pois:

Em sua forma histórica, a democracia dos antigos, expressa na experiência ateniense,


era uma democracia direta que se realizava num espaço restrito - a cidade/Estado
grega. Ela, a democracia, se processava por intermédio de um sistema de assembleias,
às quais era atribuído o poder de tomar todas as decisões políticas. O comparecimento
à assembleia era teoricamente permitido a todo cidadão, não havia burocracia e o
governo era exercido pelo povo. (CABRAL NETO, 1997, p. 288)

Um cidadão com plenos direitos, para os Atenienses, era uma pessoa do sexo masculino, adulta
e livre. Isto significava a exclusão das mulheres, crianças e jovens, escravos e estrangeiros.
Mesmo não havendo uma discriminação por motivos econômicos ou patrimoniais, apenas uma
pequena parcela participava das assembleias. Em outras palavras, se no presente existe um
considerável esforço por uma maior participação dos cidadãos, nos tempos da Grécia antiga a
participação, ou possibilidade dela, também era limitada (HELD, 1987).

O caráter direto da democracia Ateniense ocorria nas chamadas assembleias, ou ecclesia, as


quais eram em torno de 40 em cada ano. Existiam, entretanto, outros organismos que realizavam
atividades relacionadas à administração ou controle das coisas comunitárias. Para o
preenchimento destes a representação era o recurso empregado. De forma diversa dos tempos
atuais estes representantes, com exceção das funções militares, eram escolhidos por sorteio. A
preocupação, já naquela época, com a perpetuação nos cargos públicos e com o exercício
efetivo da cidadania (HELD, 1987).

2.1.2 A democracia representativa

A população das cidades gregas era, evidentemente, pequena em relação ao tamanho atual das
cidades e, principalmente, dos países. É muito simples de imaginar as dificuldades operacionais
para a prática dos mesmos métodos empregados em Atenas. O número de pessoas aptas a
participar, no tempo presente, é exponencialmente maior. A escolha de representantes dos
cidadãos, para a tomada de decisão e execução das funções de governo, proporcionou a
viabilidade de um governo popular nos tempos modernos (BOBBIO, 1994; CABRAL NETO,
1997).
43

Para Markoff (2013, p. 20) a “história da democracia nunca foi continua ou simples”. A
democracia Ateniense durou pouco menos de 200 anos e até a extraordinária expansão
verificada no século XX foram poucos os momentos da história da humanidade em que foi
empregada. No intermédio destes períodos, de concreto, as democracias romana, inglesa,
americana e francesa. Estas duas últimas inaugurando o que convencionou chamar de as
primeiras experiências da moderna democracia (BOBBIO, 1997a; HELD, 1987).

A democracia moderna nasceu representativa (ARBLASTER, 1988; CABRAL NETO, 1997).


O povo não participa, diretamente, do processo de tomada de decisão. Ele escolhe, entretanto,
representantes que tomam tais decisões. Bobbio (1986, p. 24) acrescenta:

A democracia moderna, nascida como democracia representativa em contraposição à


democracia dos antigos, deveria ser caracterizada pela representação política, isto é,
por uma forma de representação na qual o representante, sendo chamado a perseguir
os interesses da nação, não pode estar sujeito a um mandato vinculado.

Em grande parte das democracias o conceito de “governo do povo, pelo povo e para o povo”
passou a significar, tão somente, a escolha, em eleições periódicas, dos representantes. Estes
processos, via de regra, resultaram na criação de elites políticas que competem regularmente
pela preferência dos cidadãos. “Desde este ponto de vista a condição mínima para a existência
de uma democracia é que os governantes sejam selecionados pelo conjunto do povo, mediante
eleições livres, sinceras e realmente competitivas” (REY, 1992, p. 7).

Mill identifica alguns dos princípios que reforçam a teoria do governo representativo. Dentre
eles a diversidade econômica da sociedade, a soberania popular e a igualdade política dos
cidadãos e o princípio da proporcionalidade como parte ideal da democracia representativa. O
voto, para Mill, é a principal condição da institucionalidade democrática (MILL, 1981).

Ao contrário das cidades Gregas a democracia moderna considera, além dos cidadãos e da
sociedade, a existência de estrutura institucional e administrativa que é denominada de Estado.
A democracia, deste modo, diz respeito ao relacionamento entre a sociedade (os cidadãos) e o
Estado. Assim a soberania popular está delegada às instituições governamentais que exercem a
autoridade em nome do povo, caracterizado como a quase totalidade dos cidadãos, sem
exclusões por razões de gênero e classe social.
44

O Austríaco, naturalizado norte-americano, Joseph Schumpeter foi um dos teóricos dedicados


à construção de um conceito de democracia realista desprezando, por um lado, a participação
popular, enquanto interpreta a democracia limitada ao parlamento e ao mercado, encarando-a
apenas como método.

Schumpeter rejeita a chamada doutrina clássica da democracia, principalmente as


considerações de Rousseau, pois a considera idealista e uma utopia. Para ele não é viável a
democracia direta pois não há um estágio comum e semelhante entre as pessoas, na sociedade.
Assim defende uma teoria elitista da democracia pela competição entre elites as quais disputam
o voto popular com o objetivo de obter o poder.

Schumpeter entende que a democracia é apenas um método para escolha de lideranças


encarregadas da tomada de decisões e exercício do poder. Assim é um simples procedimento
pois “o método democrático é o arranjo institucional para se chegar a certas decisões políticas
que realizam o bem comum, cabendo ao próprio povo decidir, através da eleição de indivíduos
que se reúnem para cumprir-lhe a vontade” (SCHUMPETTER, 1961, p. 300). Para Schumpeter,
então, a democracia existe onde existem diversos grupos competindo entre si pela conquista do
poder e resume-se ao processo eleitoral, como resultado de simples agregação de preferência,
preconceitos e decisões pré-existentes.

A competição pelo voto é o único momento destinado à soberania popular. De outro modo,
para Schumpeter, resta pouco espaço para a participação democrática. Esta, segundo ele, deve
ficar restrita ao sufrágio, o qual inclusive, deve constituir-se no mínimo necessário para
manutenção da máquina eleitoral. O conjunto de cidadãos, para Schumpeter, é desinformado,
desinteressado, alienado e apático, sem capacidade de observação e interpretação adequadas
em relação às questões políticas. (SCHUMPETTER, 1961)

O raciocínio de Schumpeter é decorrente da crítica que faz à ideia de se chegar ao bem comum
e à chamada soberania ou vontade popular. Não existe um bem comum verdadeiro pois não
existe uma consciência coletiva e um valor atribuído a este bem. Assim não pode existir também
uma vontade popular. Para Schumpeter o que existe é simplesmente a vontade da maioria.
(SCHUMPETTER, 1961)
45

Robert Dahl é outro teórico que também compreende a democracia como um arranjo para
tomada de decisões políticas a partir da competição pelo voto dos eleitores. Dahl, divergindo
de Schumpeter, considera que a participação tem papel significativo na tomada de decisão
política. Esta participação, entretanto, não considera a atuação dos indivíduos e sim sua inserção
nas associações políticas. Os cidadãos, desta forma, participam por meio das instituições e
nunca fora delas. (DAHL, 1997)

Dahl considera a democracia sob duas visões. Como ele mesmo apresenta “usamos a palavra
democracia tanto para nos referirmos a um objetivo ou ideal como a uma realidade que é apenas
uma consecução parcial desse objetivo” (DAHL, 2001, p. 97). Para o autor não existem
instâncias reais de democracia e sim o que ele denomina de “poliarquia”, o que consiste nos
modelos empíricos existentes nos diversos países. Assim Dahl diferencia a democracia,
referenciada em termos normativos e que considera utópica, das poliarquias quando se refere à
prática democrática com a existência de múltiplos centros de poder na sociedade. (DAHL,
1997)

Para Dahl a democracia requer um governo responsivo em relação ao povo. Os líderes que
exercem um mandato que lhes foi confiado são responsáveis pela efetivação da expectativa das
pessoas. Os governantes não possuem direitos sobre os governados. Possuem, por outro lado,
deveres. Na democracia os cidadãos devem ser capazes, e ter oportunidades, de formular e
manifestar suas preferências e receber tratamento igualitário por parte das estruturas
institucionais e administrativas do Estado. Para que estas oportunidades possam ser exercidas
Dahl (2001, p. 99–100) considera necessárias as seguintes condições institucionais:

a) Funcionários eleitos. O controle das decisões do governo sobre a política é investido


constitucionalmente a funcionários eleitos pelos cidadãos.

b) Eleições livres, justas e frequentes. Funcionários eleitos são escolhidos em eleições


frequentes e justas em que a coerção é relativamente incomum.

c) Liberdade de expressão. Os cidadãos têm o direito de se expressar sem o risco de sérias


punições em questões políticas amplamente definidas, incluindo a crítica aos
funcionários, ao governo, ao regime, à ordem socioeconômica e à ideologia
prevalecente.
46

d) Fontes de informação diversificadas. Os cidadãos têm o direito de buscar fontes de


informação diversificadas e independentes de outros cidadãos, especialistas, jornais,
revistas, livros, telecomunicações e afins.

e) Autonomia para associações. Para obter seus vários direitos, até mesmo os necessários
para o funcionamento eficaz das instituições políticas democráticas, os cidadãos
também têm o direito de formar associações ou organizações relativamente
independentes, corno também partidos políticos e grupos de interesses.

f) Cidadania inclusiva. A nenhum adulto com residência permanente no país e sujeito a


suas leis podem ser negados os direitos disponíveis para os outros e necessários às cinco
instituições políticas anteriormente listadas. Entre esses direitos, estão o direito de votar
para a escolha dos funcionários em eleições livres e justas; de se candidatar para os
postos eletivos; de livre expressão; de formar e participar organizações políticas
independentes; de ter acesso a fontes de informação independentes; e de ter direitos a
outras liberdades e oportunidades que sejam necessárias para o bom funcionamento das
instituições políticas da democracia em grande escala.

O conceito de poliarquia é adaptável e pode ser aplicável a análises de modelos democráticos.


Os direitos dos cidadãos podem, metodologicamente, serem objetos de mensuração. Os dados
apresentados no início deste capítulo são oriundos de análises semelhantes.

Dahl ainda trabalha uma classificação dos regimes políticos, a partir de duas dimensões: a
inclusão, ou a participação dos cidadãos, e a competição que pode ser caracterizada também
como a oposição ou contestação. Esta competição reflete as disputas de poder na sociedade. As
poliarquias, desta forma, constituem regimes com disputas de poder e participação política
ampliada. Os demais casos, para Dahl, ou constituem oligarquias (quando existe competição,
mas com baixa participação) ou constituem hegemonias (inclusivas quando da existência de
ampla participação, mas contestação tímidas e fechadas quando não se verificam nem
participação nem oposição). (DAHL, 2001)
47

2.1.3 As democracias participativa e deliberativa

A participação dos cidadãos é um dos elementos centrais quando se analisa a democracia. Se,
na Grécia antiga, os cidadãos aptos participavam diretamente em todos os debates e tomada de
decisões, na democracia representativa permitiu-se ao povo apenas o instrumento do voto como
momento de participação ao escolher seus representantes. Algumas correntes, notadamente
Shumpeter (1961), Dahl (2001) e Sartori (2000) afirmam categoricamente a inconveniência de
se permitir maior envolvimento dos cidadãos. Pateman (1992, p. 10) , inclusive, coloca que “[a
participação] não apenas tem um papel menor, como nas teorias democráticas atuais um dado
predominante é a ênfase colocada nos perigos inerentes à ampla participação popular em
política”.

Para outros teóricos, como Rousseau, John Stuart Mill e Cole, a democracia não pode estar
limitada à seleção de líderes políticos ou uma simples competição entre as elites. Como na
democracia Ateniense, a participação dos cidadãos nas decisões do cotidiano é estimulada.
Pateman (1992, p. 35) considera Rousseau “o teórico por excelência da participação”. A autora
argumenta que, nas teorias de Rousseau, a participação não tem apenas uma função
complementar aos arranjos institucionais como também estimula um inter-relacionamento
contínuo entre os indivíduos e o funcionamento das instituições e ainda a sensação de
pertencimento à comunidade decorrente desta integração.

Para Rousseau a participação tem caráter educativo. Como coloca Pateman (1992, p. 38):

O sistema ideal de Rousseau é concebido para desenvolver uma ação responsável,


individual, social e política como resultado do processo participativo. Durante este
processo o indivíduo aprende que a palavra “cada” aplica-se a ele mesmo; o que vale
dizer que ele tem que levar em consideração assuntos bem mais abrangentes do que
os seus próprios e imediatos interesses privados, caso queira a cooperação dos outros;
e ele aprende que o interesse público e o privado encontram-se ligados. A lógica do
sistema participativo é tal que o indivíduo vê-se “forçado” a deliberar de acordo com
o seu senso de justiça, de acordo com o que Rousseau chama de “vontade constante”,
pois seus concidadãos podem sempre resistir à implementação de demandas não-
equitativas. Como resultado de sua participação na tomada de decisões, o indivíduo é
ensinado a distinguir entre seus próprios impulsos e desejos, aprendendo a ser tanto
um cidadão público quanto privado.

Rousseau também entende que a participação está vinculada com a ideia de liberdade, presente
em seus estudos. Como as leis são prescritas pelos próprios indivíduos estes devem então
48

obedecer a si mesmos. A liberdade de todos, a vontade geral, somente poderá ser assegurada
por lei construída através do processo participativo (PATEMAN, 1992).

Pateman (1992, p. 45) entende que J. S. Mill, em um primeiro momento, reforça as teorias de
Rousseau acerca do papel educativo e integrador da participação na vida pública. “Quando o
indivíduo se ocupa somente de seus assuntos privados, argumenta, e não participa das questões
públicas, sua autoestima é afetada, assim como permanecem sem desenvolvimento suas
capacidades para uma ação pública responsável”.

Mill, entretanto, foi além ao considerar como inócuas a participação eleitoral se o indivíduo não
está apto a participar em nível local. É neste nível que acontece o real efeito educativo da
participação. As questões locais são aquelas que interferem diretamente com as pessoas. Mill
acrescenta que é “somente praticando o governo popular em pequena escala que o povo terá
alguma possibilidade de aprender a exercitá-lo em maior escala” (Mill apud PATEMAN, 1992,
p. 46).

Por outro lado, Mill e Rousseau tem visões diferentes sobre a igualdade política dos cidadãos e
da necessidade destes também se constituírem em legisladores. Rousseau entendia que as
diferenças sociais e culturais não deveriam conduzir à desigualdade política enquanto Mill
acreditava que as funções deveriam ser preenchidas por pessoas sábias, melhores e com boa
educação (PATEMAN, 1992) .

Ao discorrer sobre os estudos de Cole, Pateman relata as dificuldades impostas pelas formas de
representação existentes. No estudo das associações Cole afirma que a representação ignora o
conceito de função, de forma que o representante representa o indivíduo em todos propósitos e
ocasiões. Ainda, para o autor, esta representação deveria ter uma função bem definida. Um
segundo problema está relacionado ao fato de que o eleitor não faz escolhas reais e muito menos
controla seus representantes. O papel do cidadão, no sistema representativo, acaba ao escolher
seu representante (PATEMAN, 1992).

Como J. S. Mill e Rousseau, Cole, de acordo com Pateman, também destacou a importância da
função educativa da participação. “Como Mill, Cole sustentava que seria apenas pela
participação a nível local e em associações locais que o indivíduo poderia aprender democracia”
49

(PATEMAN, 1992, p. 55) A grandeza do Estado moderno justificava a capacitação do cidadão


a participar nas áreas políticas alternativas da sociedade.

Cole também dedicou atenção à questão da igualdade política, a qual, segundo ele, dependia
substancialmente da igualdade econômica. Continuando, a igualdade advinda do direito de voto
não implicava em uma igualdade política real. O sufrágio universal, para Cole, era somente
formal e escondia a imensa desigualdade de poder político e poderiam ser fatais para qualquer
democracia (PATEMAN, 1992).

Pateman (1992, p. 61) finaliza dizendo que “para que exista uma forma de governo democrática
é necessária a existência de uma sociedade participativa, isto é, uma sociedade onde todos os
sistemas políticos tenham sido democratizados e onde a socialização por meio da participação
pode ocorrer em todas as áreas”. Isto implica, ainda de acordo com Pateman, que

pode-se caracterizar o modelo participativo como aquele onde se exige o input


máximo (a participação) e onde o output inclui não apenas as políticas (decisões) mas
também o desenvolvimento das capacidades sociais e políticas de cada indivíduo, de
forma que existe um “feedback” do output para o input. (PATEMAN, 1992, p. 62)

Um passo adiante nas teorias democráticas, já que pressupõe a participação dos cidadãos, é a
teoria da democracia deliberativa. Habermas, Cohen e Rawls são apontados como os teóricos
principais no desenvolvimento deste conceito (AVRITZER, 2000; LUCHMANN, 2002;
MIGUEL, 2005). O ponto fundamental, como coloca Avritzer, é a forma como as decisões
são tomadas, superando um “modelo decisionístico de deliberação” (AVRITZER, 2000, p. 27).
Luchmann (2002, p. 1) complementa “Trata-se de um conceito que está fundamentalmente
ancorado na ideia de que a legitimidade das decisões e ações políticas deriva da deliberação
pública da coletividade de cidadãos livres e iguais”. Para Miguel (2005, p. 8) a democracia
deliberativa

aparece hoje como a principal inspiração crítica às democracias realmente existentes.


Seu ideal é que as decisões políticas sejam fruto de uma ampla discussão, na qual
todos tenham condições de participar em igualdade, apresentando argumentos
racionais, e ao fim da qual haja consenso.

Habermas desenvolve sua teoria a partir dos modelos normativos que ele denomina de
concepções “Liberal” e “Republicana” de democracia (HABERMAS, 1995). Habermas
50

considera também dois outros conceitos desenvolvidos ao longo de sua obra: a esfera pública e
a teoria da ação comunicativa. O conceito de esfera ou espaço público, para Habermas

é um fenômeno social elementar, do mesmo modo que a ação, o ator, o grupo ou a


coletividade; porém, ele não é arrolado entre os conceitos tradicionais elaborados para
descrever a ordem social. A esfera pública não pode ser entendida como uma
instituição, nem como uma organização, pois, ela não constitui uma estrutura
normativa capaz de diferenciar entre competências e papéis, nem regula o modo de
pertença a uma organização, etc. Tampouco ela constitui um sistema, pois, mesmo
que seja possível delinear seus limites internos, exteriormente ela se caracteriza
através de horizontes abertos, permeáveis se deslocáveis. A esfera pública pode ser
descrita como uma rede adequada para a comunicação de conteúdos, tomadas de
posição e opiniões; nela os fluxos comunicacionais são filtrados e sintetizados, a ponto
de se condensarem em opiniões públicas enfeixadas em temas específicos. Do mesmo
modo que o mundo da vida tomado globalmente, a esfera pública se reproduz através
do agir comunicativo, implicando apenas o domínio de uma linguagem natural; ela
está em sintonia com a compreensibilidade geral da prática comunicativa cotidiana.”
(HABERMAS, 1997, p. 92)

Para Avritzer o conceito de esfera pública

tem, desde sua origem, algumas das suas características centrais ligadas ao debate
democrático contemporâneo: a primeira delas é a ideia de um espaço para interação
face-a-face diferenciado do Estado. Nesse espaço, os indivíduos interagem uns com
os outros, debatem as decisões tomadas pela autoridade política, debatem o conteúdo
moral das diferentes das diferentes relações existentes ao nível da sociedade e
apresentam demandas em relação ao Estado. Os indivíduos no interior de uma esfera
pública democrática discutem e deliberam sobre questões políticas, adotam estratégias
para tornar a autoridade política sensível às suas deliberações. Nesse sentido o
conceito de publicidade estabelece uma dinâmica no interior da política que não é
movida nem por interesses particularistas nem pela tentativa de concentrar poder com
o objetivo de dominar outros indivíduos. Pelo contrário, a ideia aqui presente é de que
o uso público da razão estabelece uma relação entre participação e argumentação
pública. (AVRITZER, 2000, p. 36)

Deste modo a esfera pública independe do Estado e consiste no espaço, até mesmo virtual, onde
ocorre a participação, a interação e a prática discursiva dos sujeitos e onde qualquer tema, ou
reinvindicação, pode ser incorporado à agenda de discussões e deliberações. Esta última,
principalmente, norteada pelo caráter racional da argumentação. Sobre as instâncias destes
espaços públicos Habermas complementa dizendo que:

Quanto mais elas se desligam de sua presença física, integrando também, por
exemplo, a presença virtual de leitores situados em lugares distantes, de ouvintes ou
espectadores, o que é possível através da mídia, tanto mais clara se toma a abstração
que acompanha a passagem da estrutura espacial das interações simples para a
generalização da esfera pública. (HABERMAS, 1997, p. 93)

Habermas, ao desenvolver a sua teoria da ação comunicativa, considerou-a como uma forma
de contraposição à ação estratégica e à ação instrumental. Como diz Araújo:
51

O ponto central é o paradigma da comunicação, da intersubjetividade, da ação


comunicativa, contraposta à ação estratégica. Ambas constituem um novo tipo de
racionalidade, a comunicativa. A TAC demanda uma teoria da sociedade em que o
sistema (dinheiro e poder, âmbito da ação estratégica) coloniza o mundo da vida
(âmbito de um saber compartilhado, pano-de-fundo para a ação comunicativa,
intersubjetiva, capaz de conduzir ao entendimento e ao acordo). (ARAÚJO, 2010, on-
line)

A Teoria da Ação Comunicativa considera, como objetivo inicial, mostrar diferenças


conceituais entre a racionalidade comunicativa e a racionalidade instrumental e cognitiva.
Considera também defender um conceito de sociedade a partir dos paradigmas do mundo da
vida e o de sistema. Finalmente delinear uma teoria da modernidade que dê conta das novas
patologias sociais como decorrência da submissão da ação comunicativa aos imperativos do
sistema (ARAÚJO, 2010).

Araújo (2010, on-line), ao tratar dos conceitos básicos referentes à Teoria da Ação
Comunicativa, coloca num primeiro momento que “Nas expressões linguísticas há um saber e
nas ações dirigidas por um fim (teleológicas) há um saber implícito. Uma afirmação comunica
algo e uma ação visa um fim, isso significa que nelas se usa um saber confiável, vinculado a
uma racionalidade” e acrescenta a título de conclusão “Essa razão comunicativa permite o
consenso, pois não se vê coagida nem impelida apenas pelo ponto de vista inicial de cada
participante. Eles irão trocar convicções que asseguram a unidade do mundo objetivo e a
intersubjetividade do contexto em que vivem.”

Retornando à comparação com os modelos Liberal e Republicano de democracias, Habermas


apresenta o modelo de democracia Deliberativa, ou procedimental, como ele mesmo coloca:

A teoria do discurso, que associa ao processo democrático conotações normativas


mais fortes do que o modelo liberal, porém mais fracas que o modelo republicano,
toma elementos de ambos e os articula de uma forma nova e distinta. Coincidindo
com o modelo republicano, ela concede um lugar central ao processo político de
formação da opinião e da vontade comum, mas sem entender como algo secundário a
estruturação em termos de Estado de Direito. Em vez disso, a teoria do discurso
entende os direitos fundamentais e os princípios do Estado de Direito como uma
resposta consequente à questão de como institucionalizar os exigentes pressupostos
comunicativos do processo democrático. A teoria do discurso não faz a realização de
uma política deliberativa depender de uma cidadania coletivamente capaz de ação,
mas sim da institucionalização dos correspondentes procedimentos e pressupostos
comunicativos. Essa teoria já não opera com o conceito de um todo social centrado
no Estado, que pudéssemos representar como um sujeito em grande escala com ação
voltada para metas. Ela tampouco localiza esse todo em um sistema de normas
constitucionais que regulem o equilíbrio de poder e o compromisso de interesses de
modo inconsciente mais ou menos automático, conforme o modelo de troca mercantil.
(HABERMAS, 1995, p. 47)
52

Joshua Cohen também voltou sua atenção à democracia deliberativa. Para Held (1987, p. 34)
Cohen “apresentou aquela que é provavelmente a primeira formulação explícita do cerne dessa
corrente teórica.” Cohen parte de alguns pressupostos sobre a democracia e a forma como é
conduzida. A política democrática implica na deliberação pública sobre o bem comum e requer
alguma igualdade manifesta entre os cidadãos. Significa também estar em conformidade com a
identidade e os interesses dos cidadãos (COHEN, 2007).

Para Cohen (2007, p. 131–132) a democracia deliberativa apresenta algumas características


principais: a) Uma democracia deliberativa é uma associação contínua e independente, com
duração indeterminada; b) Os membros compartilham o compromisso de coordenar suas
atividades dentro das instituições que tornam possível a deliberação e cumprir as regras que
estabelecem por meio da deliberação. Para eles, a livre discussão entre iguais é a base da
legitimidade; c) Uma democracia deliberativa é uma associação pluralista. Os membros diferem
em preferências, convicções e ideais ligados à condução de suas vidas. Por outro lado,
compartilham o compromisso com a resolução deliberativa de problemas de escolha coletiva;
d) É importante, para os membros da associação, que os fins da sua associação não sejam apenas
o resultado das suas deliberações, mas também que sejam apresentados como tal e e) Os
membros reconhecem-se mutuamente com capacidades deliberativas, ou seja, as capacidades
necessárias para entrar no intercâmbio público de razões e para atuar segundo o resultado de tal
deliberação.

O procedimento deliberativo, para Cohen, deve considerar a necessidade de definição de uma


agenda, que se proponham soluções alternativas, e suas razões, aos problemas incorporados à
agenda e do estabelecimento de uma alternativa como resultado. Cohen prossegue afirmando
que “os resultados são democraticamente legítimos se e somente se são derivados de acordos
livres e argumentativos entre iguais” (COHEN, 2007, p. 132–133). Em primeiro lugar a
deliberação ideal é livre, isto é, os participantes se vinculam apenas ao resultado, e às pré-
condições, de sua deliberação além de considerar que quando uma decisão específica foi
alcançada através de sua deliberação é uma razão suficiente para agir de acordo com ela.

Cohen prossegue dizendo que a deliberação ideal deve ser fundamentada, sendo que as partes
devem declarar suas razões ao apresentar, defender ou criticar propostas. Para reforçar esta ideia
Cohen (2007, p. 133) cita Habermas que diz “somente se exerce a força do melhor argumento”.
Também, na deliberação ideal, os participantes são formal e substantivamente iguais. São
53

formalmente iguais quando as regras que regulam o procedimento não distinguem entre
indivíduos e são substantivamente iguais quando a distribuição de poder e recursos não interfere
nas oportunidades de contribuição à deliberação. Finalmente, para Cohen, a deliberação ideal
busca um consenso racionalmente motivado. Isto é, encontrar razões que sejam persuasivas
para todos aqueles comprometidos a agir segundo os resultados de uma avaliação livre e
fundamentada de alternativas entre indivíduos iguais (COHEN, 2007).

Cohen apresenta, então, a sua compreensão acerca da democracia deliberativa:

A deliberação centra, portanto, o debate sobre o bem comum. E as concepções


relevantes do bem comum não incluem simplesmente interesses e preferências prévias
à deliberação. Pelo contrário, os interesses, objetivos e ideais que incluem o bem
comum são aqueles que sobrevivem à deliberação, interesses aos quais, após a
reflexão pública, achamos legítimo apelar para fazer reivindicações de recursos
sociais. [...] Assim, a partir do ideal formal de uma democracia deliberativa, chegamos
ao ideal mais substantivo de uma associação que é regulada pela deliberação, voltada
para o bem comum e que respeita a autonomia dos membros. (COHEN, 2007, p. 135–
6)

A democracia deliberativa constitui-se, portanto, em um modelo de democracia onde se busca


a construção de consensos nas decisões que afetam a sociedade. Os cidadãos, para tanto, devem
ser livres e iguais. Isto requer, obviamente, a participação popular e define a importância dos
cidadãos neste processo. É preciso ressaltar, contudo, que os limites entre a democracia
participativa e a democracia deliberativa são quase imperceptíveis. Afinal, deliberar implica
participar de forma ativa dos processos decisórios na esfera pública.

2.2 A TRANSPARÊNCIA COMO UM ATRIBUTO FUNDAMENTAL DA DEMOCRACIA

A palavra transparência tem origem no latim medieval, a partir do adjetivo transparens-entis


De acordo com o dicionário Houaiss (2009) transparente é aquele que deixa passar a luz e ver
nitidamente o que está por trás. “Note-se desde já que transparente não se diz do corpo que
exibe integralmente ao olhar, mas do corpo que não impede que o olhar passe através dele e
vislumbre outros corpos que, caso fosse opaco, esconderia”. (GOMES; AMORIM; ALMADA,
2015, p. 1) Para Schauer a transparência, muito mais do que uma simples propriedade física,
tem um emprego mais significativo como uma metáfora, uma analogia. Assim, “entendemos
que ser transparente é a capacidade de ser observado sem distorções”. (SCHAUER, 2014, p.
86)
54

Bobbio (1997b, p. 10), ao analisar o futuro da democracia, afirma que “Pode-se definir a
democracia das maneiras as mais diversas, mas não existe definição que possa deixar de incluir
em seus conotativos a visibilidade ou transparência do poder”. Em uma nação democrática não
apenas as decisões, mas também suas razões, devem estar à vista de todos. Assim, para Bobbio
(1997b, p. 83, grifos do autor), um “dos lugares-comuns de todos os velhos e novos discursos
sobre a democracia consiste em afirmar que ela é o governo do poder visível. Que pertença à
natureza da democracia o fato de que nada pode permanecer confinado no espaço do
mistério”. Um poder opaco, salienta Bobbio, não é uma democracia.

A democracia, em contraposição aos estados absolutos, trouxe como uma de suas promessas a
transparência do poder. As decisões deixariam de serem tomadas em locais e momentos
distantes dos cidadãos, no segredo dos gabinetes. Loraux, sobre a transparência na democracia
Ateniense, acrescenta:

Mas o que, mais que tudo, caracteriza a democracia direta de Atenas é, para tomar
emprestada uma expressão de Jean-Pierre Vernant, a “plena publicidade da vida
política”: a circulação da palavra no seio da assembleia de cidadãos; a obrigação, para
os magistrados, de prestar contas de seu cargo diante do povo; a escritura das leis, de
todas as leis, de todos os decretos, a fim de que qualquer um, até mesmo o primeiro
que apareça, possa informar-se das decisões do “démos” soberano. (LORAUX, 1979,
p. 15, grifos da autora)

A democracia moderna trouxe consigo uma estrutura estatal não existente nos tempos de
Atenas. Naqueles tempos tanto o Estado como suas instituições eram incipientes, sem nenhuma
relação com a complexidade do aparelho Estatal contemporâneo. Mesmo assim era
fundamental para o exercício da Isonomia e da Isegoria o conhecimento pleno, por todos os
cidadãos, dos assuntos públicos e comuns.

A democracia representativa tirou do cidadão à prerrogativa de, diretamente, decidir sobres os


temas de interesse de todos. Sobre a representação política Bobbio cita Schtnitt o qual diz que:

A representação apenas pode ocorrer na esfera do público. Não existe nenhuma


representação que se desenvolva em segredo ou a portas fechadas...Um parlamento
tem um caráter representativo apenas enquanto se acredita que a sua atividade própria
seja pública. Sessões secretas, acordos e decisões secretas de qualquer comitê podem
ser muito significativos e importantes, mas não podem jamais ter um caráter
representativo (Schtnitt apud BOBBIO, 1997b, p. 87)

O papel do cidadão resume-se, então, à simples escolha de líderes políticos para representá-lo.
No entanto, e independente das considerações de Schumpeter que ignora a participação popular
55

em função da disparidade social e intelectual, o processo eleitoral requer conhecimento e


esclarecimento adequado. Como o cidadão pode escolher seus líderes sem que estes exibam
suas ações prévias e sejam transparentes quanto aos seus atos e intenções. Se para Schumpeter
os cidadãos são desinformados, desinteressados, alienados e apáticos (SCHUMPETTER,
1961), muito provavelmente isto se dá pela falta de educação democrática onde um dos
subsídios elementares é a transparência do Estado e seus governantes. É provável, também, que
os cidadãos não tenham as informações adequadas para avaliar o desemprenho de seus líderes.
O desempenho passado de um governante deveria afetar suas chances de reeleição. (CHEIBUB;
PRZEWORSKI, 1997)

Robert Dahl aponta o acesso à informação como instituição fundamental da democracia.


Segundo ele uma democracia em grande escala exige, dentre outros requisitos, fontes de
informação diversificadas (DAHL, 2001). E, embora não se possa dizer que transparência e
acesso à informação sejam sinônimos é certo que a informação é um instrumento da
transparência. Dahl reforça a necessidade de transparência ao afirmar que “a operação do
governo deve ser suficientemente aberta para a visão do público e simples o bastante em sua
essência para que os cidadãos entendam prontamente o que ele faz e como está agindo” (DAHL,
2001, p. 143–144). Se não houver o entendimento sobre o que o governo fez e está fazendo não
há a possibilidade de responsabilização dos líderes políticos, principalmente nos períodos
eleitorais (DAHL, 2001). Para Dahl, a questão de por que a democracia exige a existência de
fontes alternativas e independentes de informação, pode ser respondida da seguinte forma:

Como a liberdade de expressão, diversos critérios democráticos básicos exigem que


fontes de informação alternativas e relativamente independentes estejam disponíveis
para as pessoas. Pense na necessidade de compreensão esclarecida. Como os cidadãos
podem adquirir a informação de que precisam para entender as questões se o governo
controla todas as fontes importantes de informação? Ou, por exemplo, se apenas um
grupo goza do monopólio de fornecer a informação? Portanto, os cidadãos devem ter
acesso a fontes de informação que não estejam sob o controle do governo ou que sejam
dominadas por qualquer grupo ou ponto de vista. Pense ainda sobre a participação
efetiva e a influência no planejamento público. Como poderiam os cidadãos participar
realmente da vida política se toda a informação que pudessem adquirir fosse
proporcionada por uma única fonte - o governo, digamos - ou, por exemplo, um único
partido, uma só facção ou um único interesse? (DAHL, 2001, p. 111)

Manin, sobre os governos representativos, ressalta a liberdade de opinião política. A formação


de opinião requer acesso à informação política. As decisões governamentais, e seus caminhos,
devem ser tornados públicos. Quando estas questões ocorrem em segredo os meios que os
56

cidadãos dispõem para elaboração de opinião em matéria política são muito frágeis. (MANIN,
1995)

A participação dos cidadãos nos assuntos públicos, principalmente quando está incluído em
processo deliberativos, imprime um significado ainda mais expressivo para a transparência do
Estado e dos governos. A “corrente participacionista”, para Miguel (2005, p. 27), considera que
todas as pessoas tem condições de entender e de ter papel ativo nas discussões dos assuntos
públicos mesmo que esta população se mostre apática, desinformada e desinteressada. A apatia
é “somente um efeito da ausência de oportunidades e do desestímulo estrutural” (MIGUEL,
2005, p. 27). Luchmann (2002), sobre transparência pública, acrescenta que a deliberação
requer cidadãos capazes de formular juízos informados e racionais.

A falta de transparência nos assuntos públicos contribui para um incremento da assimetria


informacional. Os recursos de informação, que normalmente estão disponíveis para um
pequeno contingente de pessoas, nos processos de deliberação requerem igual oportunidade de
acesso para todos os cidadãos participantes. Nos processos dialógicos, característicos da
democracia deliberativa, as informações precisam estar ao alcance de todos os envolvidos. A
informação disponibilizada de forma compreensível é um elemento fundamental nos debates e
na formulação de consensos. (ANGÉLICO; CARVALHO TEIXEIRA, 2012)

Sobre este mesmo tema Cunha Filho acrescenta:

Neste modelo teórico, a transparência, por viabilizar um fluxo de informações sobre


os atos estatais, exerce um papel central. Deliberação e informação estão imbricadas
em um processo circular: se por um lado a deliberação tem como objetivo aumentar a
troca de informações, e com isso moldar e transformar as preferências das pessoas,
por outro a informação é um requisito para que o processo de deliberação seja possível
desde o início, pois não é possível deliberar sem acesso amplo e contínuo a
informações que abasteçam a capacidade dos participantes em argumentar, persuadir,
convencer e transformar opiniões, inclusive as suas próprias. Deliberação pode ser
pensada como um processo iterativo e reflexivo que é alimentado por um fluxo
constante de informações. A transparência pública, assim, permite o surgimento de
uma forma mais qualificada de democracia, marcada pela interação entre Estado e
sociedade. (CUNHA FILHO, 2018, p. 882)

A capacidade de participação, segundo Stiglitz (1999), é minada pela ausência ou redução da


quantidade de informações disponíveis para o cidadão ocasionadas pela cultura do sigilo
existente no Estado e em seus governantes. Quem está no governo normalmente é detentor de
57

uma maior quantidade e melhor qualidade da informação. Stiglitz argumenta, em favor de maior
empoderamento dos cidadãos e de incentivo à participação ao afirmar que:

Muitas vezes falamos de governo ser responsável, responsável perante o povo. Mas
para que seja alcançada uma supervisão democrática eficaz, então os eleitores têm de
ser informados: têm de saber que ações alternativas estavam disponíveis e quais
poderiam ter sido os resultados. (STIGLITZ, 1999, p. 7, tradução nossa)

James Madison, nos encaminhamentos referentes à primeira emenda da Constituição dos


Estados Unidos da América, justificava a necessidade de liberdade de expressão e de
informação com “Um povo que quer ser seus próprios governadores deve armar-se com o poder
que o conhecimento dá. Um governo popular sem informação popular ou os meios de adquiri-
lo é apenas um prólogo a uma farsa ou a uma tragédia ou talvez ambos” (James Madison apud
STIGLITZ, 1999, p. 5, tradução nossa). Sobre os segredos impostos aos cidadãos, nas
democracias, Stiglitz acrescenta “este segredo é corrosivo: é antitético aos valores democráticos
e mina os processos democráticos. Baseia-se numa desconfiança entre os governantes e os
governados; e, ao mesmo tempo, agrava essa desconfiança” (STIGLITZ, 1999, p. 1)

Para Bobbio a democracia é um regime cujas expectativas ainda restam por serem efetivadas.
A transparência pública é apenas uma delas:

Desde quando a democracia foi elevada à condição de melhor forma de governo


possível (ou da menos má), o ponto de vista a partir do qual os regimes democráticos
passaram a ser avaliados é o das promessas não cumpridas. A democracia não cumpriu
a promessa do autogoverno. Não cumpriu a promessa da igualdade não apenas formal,
mas também substancial. Terá cumprido a promessa de debelar o poder invisível?
(BOBBIO, 1997b, p. 100)

Duas questões são fundamentais neste processo e são apresentadas por López-Ayllon: a
democracia somente será exercida na sua plenitude quando de parte dos cidadãos, por um lado,
houver a demanda por informação e prestação de contas e por outro, funcionários políticos
convencidos da necessidade de entregá-las. (LÓPEZ-AYLLÓN, 2006) O Comitê Nolan no
Reino Unido, citado por Heald (Nolan, apud HEALD, 2006, p. 25), formulou sete princípios
da vida pública os quais deveriam ser inerentes a qualquer pessoa no serviço público:
“altruísmo, integridade, objetividade, responsabilidade, abertura, honestidade e liderança”.
Embora não listado de forma explicita, o termo “abertura”, para Heald, tem um sentido muito
próximo ao termo “transparência”.
58

A transparência é uma relação que envolve três elementos. Em primeiro lugar qual servidor
político, organização ou instituição está envolvida ou tem domínio sobre um processo,
documentos ou informações. Em segundo lugar quais atividades, procedimentos, documentos
ou informações devem ser transparentes ou, em outras palavras, não podem permanecer sob
segredo. Finalmente, o cidadão, organizações e instituições que demandam e têm o direito de
obter tais informações. É preciso analisar, então, como materializar a transparência pública e
sob que contextos ela deve acontecer como uma forma de política pública.

2.2.1 A transparência e suas manifestações

Naessens classifica a transparência como um atributo, ou qualidade, de uma pessoa ou


instituição. Esta característica permite conhecimento mais qualificado sobre determinado
assunto o que aumentaria a capacidade, por parte de uma pessoa qualquer, de compreensão,
vigilância e comunicação. Nas atividades de governo, de forma específica, a transparência
constitui-se em um valor ético de cada agente público. (NAESSENS, 2010)

Sobre transparência pode-se apresentar, incialmente, três elementos a ela incorporados: em


primeiro lugar é um atributo, característica que toda pessoa ou organização apresenta; em
segundo a posse de informações claras e precisas faz com que o assunto seja claramente
compreendido e, em terceiro lugar, a realização de qualquer pessoa enquanto cidadão requer a
capacidade de compreensão, vigilância e comunicação. (NAESSENS, 2010)

Batista apresenta, com termos distintos, aproximadamente as mesmas questões. Para a autora
os problemas relacionados à transparência pública concentram-se em três dimensões: as
dimensões física, intelectual e comunicacional. Quando existem dificuldades em acessar
fisicamente a informação as questões referem-se à dimensão física. A dimensão intelectual está
associada às dificuldades relativas à compreensão intelectual das informações. Finalmente a
falta de eficácia na comunicação entre o Estado e os cidadãos, e até o excesso de informação,
compreendem a dimensão comunicacional. (BATISTA, 2010)

O professor David Heald, da Universidade de Glasgow, tem dedicado esforço em estudos


relacionados à transparência, principalmente no setor público. Ele estabelece diversas formas
sob as quais a transparência pode ser analisada. A primeira delas está associada às direções da
transparência que podem ser tanto no sentido vertical quanto no sentido horizontal. No primeiro
59

caso, a transparência vertical pode se dar tanto para cima quanto para baixo. Heald considera a
transparência no sentido ascendente quando algum agente, superior hierarquicamente, pode
observar a conduta, o comportamento, as ações e os resultados produzidos por subordinados.
No sentido contrário, para baixo ou descendente, ocorre quando alguém, subordinado ou
governado, pode observar os mesmos elementos de seus superiores, ou governantes. (HEALD,
2006)

Heald coloca também que horizontalmente a transparência pode ocorrer para fora e para dentro.
A transparência para fora ocorre quando, em qualquer organização ou instituição, se pode
visualizar o que está acontecendo no seu exterior. Esta capacidade, de acordo com Heald, é
importante para a capacidade de entender o contexto em que esta organização ou instituição
está inserida e, também, para acompanhamento de seus pares. O sentido inverso, a transparência
para dentro, ocorre quando qualquer pessoa, em ambiente exterior a uma organização ou
instituição, pode observá-la e monitorá-la. (HEALD, 2006)

Heald considera ainda outras formas para análise das questões envolvendo a transparência. Com
relação às suas variedades o professor apresenta a distinção entre transparência de eventos e
transparência de processos, como ilustrado na figura nº 4.

Figura 4 Variedades de transparência: eventos e processos

Fonte: Adaptado pelo autor a partir de (HEALD, 2006)

A figura nº 4 apresenta os eventos, representados por retângulos, e os processos, representados


por elipses. Em contextos de produção de serviço público, segundo Heald, os processos de
transformação atuam sobre as entradas (os insumos) produzindo as saídas correspondentes.
Estas, por meio de processos de ligação, podem constituir-se em resultados. Os eventos, ainda,
constituem pontos, ou estados, visíveis externamente e, normalmente, possíveis de serem
mensurados. Já os processos não podem ser medidos do mesmo modo que os eventos mas,
quando existem informações, podem ser descritos (HEALD, 2006). David Heald apresenta um
exemplo que pode facilitar a compreensão em relação aos eventos, pois
60

os sistemas tradicionais de despesa pública concentraram-se, em grande medida, em


insumos. Nos últimos anos, foram feitos enormes esforços para medir as saídas de
serviço público, embora essas tentativas de medição sejam controversas e a distinção
entre saídas e resultados nem sempre receba atenção suficiente. Em termos de
cuidados de saúde, as saídas são geralmente avaliadas por meio de proxies tal como
os níveis de atividade (por exemplo, o número de operações de tipos específicos) que
são mensuráveis a nível do provedor. Esforços significativos estão sendo realizados
para criar sistemas de monitorização de medidas de produção inferidas a partir de
proxies. Os resultados (por exemplo, melhora do estado de saúde) são difíceis de
medir; mudanças, sejam melhorias ou deteriorações, são afetadas por muitos fatores
além da prestação de cuidados de saúde (por exemplo, estilo de vida e renda). Para
que o foco seja exclusivamente na transparência dos eventos, as entradas, saídas e
resultados têm de gerar medições suficientemente aceitáveis para manter a atenção
política focada em questões de desempenho e não no próprio sistema de
medição.(HEALD, 2006, p. 31, tradução nossa)

A atenção é concentrada, normalmente, na transparência dos eventos, deixando os processos,


em grande parte, inexplorados. No setor privado, diz Heald, os processos de transformação
podem ser tratados como caixas pretas pois, normalmente, o foco reside na comercialização das
saídas. Com os recursos alocados no setor público, entretanto, os processos de transformação
se tornam politizados. Embora a transparência destes processos seja desejável Heald adverte
que “a transparência do processo pode, por vezes, ser prejudicial à eficiência e eficácia, porque
consome diretamente recursos e porque induz comportamento defensivo face ao que é
percebido como vigilância opressiva” (HEALD, 2006, p. 31, tradução nossa).

Heald também sugere desagregar a transparência dos processos em seus componentes


processuais e operacionais. O componente processual refere-se às regras, normas e
regulamentos adotados. O componente operacional, por seu turno, compreende a aplicação
destas regras em casos específicos. (HEALD, 2006)

A transparência também pode ser classificada em relação ao momento em que ela ocorre. Heald,
neste sentido, fala em transparência em retrospecto e transparência em tempo real. A
transparência em retrospecto diz respeito a acontecimentos ou fatos passados, já ocorridos. Esta
situação enquadra-se, normalmente, nos episódios característicos de prestação de contas. A
transparência em tempo real, por sua vez, significa que as ações são continuamente exibidas
permitindo um acompanhamento e vigilância constante. (HEALD, 2006)

O último critério utilizado por Heald, na sua abordagem sobre transparência, está associado à
efetividade das ações e instrumentos empregados. O autor especifica a existência de uma
transparência nominal e de uma transparência efetiva. Estes dois contextos, para Heald,
61

representam pontos no caminho da transparência em organizações sendo o espaço entre eles


definido como “ilusão de transparência” (HEALD, 2006, p. 34). Uma transparência não efetiva
caracteriza o que, nas palavras de Trzesniak (1998, p. 164), “não é a realidade, mas uma
expressão incompleta de uma parte dela”. Esta forma de transparência possui um caráter apenas
formal no sentido de que o objetivo é o cumprimento de obrigações ou para fins exclusivos de
publicidade. Heald acrescenta que esta sensação ilusória é derivada da, em muitos casos,
existência de índices (quando mensurados) crescentes de transparência e, no entanto, a realidade
apresentar-se de forma muito diferente. Tomando novamente as palavras de Trzesniak (1998,
p. 164) a “verdade final está sempre com o sistema ou o processo”. No outro extremo, como
apresentado por Heald (2006, p. 35), “para que a transparência seja eficaz, deve haver
receptores capazes de processar, digerir e usar as informações”. Não se deve alocar o foco desta
expressão em “receptores capazes” e sim na informação adequada a ser processada, debatida e
empregada nos processos de acompanhamento, avaliação, participação e deliberação.

Berrones analisa a transparência pública identificando em suas ocorrências três dimensões: uma
dimensão técnica, associada à complexidade dos processos necessários à sua implementação;
uma dimensão política, como favorecedora do diálogo entre governantes e governados e, em
terceiro lugar, uma dimensão institucional, que definem a transparência como uma política
pública. Assim, para que as informações não sejam ocultadas dos cidadãos, os espaços públicos
devem imprimir às suas iniciativas de transparência características de acessibilidade, evidência,
visibilidade e publicidade. (BERRONES, 2016a)

Podem ser apresentadas distintas visões relativas à transparência pública. A primeira, mais
tradicional, é aquela que se confunde com o princípio da publicidade (VAZ; RIBEIRO;
MATHEUS, 2011). Uma referência pode ser obtida na Constituição Federal de 1988 (BRASIL,
1988) no seu artigo 37. A legislação complementar prevê que as informações governamentais
sejam divulgadas para a sociedade. Para diversos pesquisadores muitas das ações tidas pelos
governantes como ações que visam a transparência nada mais são do que a busca pelo
espetáculo (ABDALA; TORRES, 2016; ANJOS; EZEQUIEL, 2011).

Fuentes (2009) e Vaz, Ribeiro e Matheus (2011) apresentam uma segunda visão em relação à
transparência. Ela pode ser comparada ao conceito de accountability que se refere, de maneira
geral, à prestação de contas e a responsabilização das decisões e ações dos agentes públicos.
62

Pode também ser vinculada a ideia de governança e de controle social sobre o estado (VIEIRA,
2005).

Uma terceira possibilidade é o olhar sobre transparência com o sentido de openness. O termo
pode ser interpretado como a abertura para o fornecimento de informação e entendida como o
fornecimento livre e universal de informações para os cidadãos (VAZ; RIBEIRO; MATHEUS,
2011) O conceito está associado à informação disponível e às facilidades existentes para acessá-
las. “O governo não deve apenas promover a transparência pela disponibilidade das
informações, mas deve proporcionar que estas informações cheguem aos cidadãos e sejam
compreendidas” (VAZ; RIBEIRO; MATHEUS, 2011, p. 52)

A estas três formas de se olhar a transparência Vaz, Ribeiro e Matheus (VAZ; RIBEIRO;
MATHEUS, 2011) acrescentam a transparência como sinônimo de dados abertos. Para o W3C
Brasil (W3C BRASIL, 2017) os dados governamentais abertos promovem maior transparência
porque as “informações do setor público abertas e acessíveis melhoram a transparência, pois as
partes interessadas podem usá-las de maneira adequada ao seu propósito, obtendo uma ideia
melhor do governo”.

2.2.2 A transparência como política pública

Pode-se entender a democracia como um conjunto de regras para a decisão de como governar
com a participação e a intervenção dos cidadãos. Na democracia o exercício do poder não é
perpétuo e deveria estar sob vigilância e sujeito a sanções que impeçam abusos, arbitrariedades
e, eventualmente, a recondução dos governantes. A transparência pública pode constituir-se em
um conjunto destas regras e instrumentos, visto que as ações de transparência não podem
depender exclusivamente do espirito ético, e da boa vontade, dos agentes públicos. De outra
forma, é fundamental que a transparência pública seja vista como uma política de Estado.
Bobbio justifica

[...] existe sempre uma diferença entre autocracia e democracia, já que naquela o
segredo de estado é uma regra e nesta uma exceção regulada por leis que não lhe
permitem uma extensão indébita. Não me detenho aqui nem mesmo sobre um outro
problema que entretanto mereceria alguma reflexão, qual seja, o problema do
reaparecimento dos arcana imperii sob a forma do governo dos técnicos ou da
tecnocracia: o tecnocrata é depositário de conhecimentos que não são acessíveis à
massa e que, caso o fossem, não seriam sequer compreendidos pela maior parte ou
então, no mínimo, a maior parte (isto é, os sujeitos do poder democrático) não poderia
63

dar qualquer contribuição útil à discussão a que eventualmente fosse chamada. [...] O
que distingue o poder democrático do poder autocrátíco é que apenas o primeiro, por
meio da livre crítica e da liceidade de expressão dos diversos pontos de vista, pode
desenvolver em si mesmo os anticorpos e consentir formas de "desocultamento"
(BOBBIO, 1997b, p. 101)

São muitos os atores, políticos e sociais, envolvidos nos processos de construção da


transparência. As interações entre estes atores, que influenciam as práticas de transparência, são
complexas e seguem regras formais e informais, rotinas e culturas organizacionais diversas,
costumes individuais ou coletivos e, de maneira facilitadora, as opções e a variedade de
tecnologias disponíveis e que estão em permanente evolução. (MEIJER, 2013) Deste modo se
as ações de transparências forem resultado de políticas públicas, institucionalizadas no Estado,
a zona de influência das mesmas será correspondente ao Estado como um todo e não apenas
seus agentes. (NAESSENS, 2010)

A transparência pública é resultante de processos que

combinam relações tensas entre opacidade e publicidade; sigilo e notícias, súditos e


cidadãos; claro-escuro e luzes; centralismo burocrático e liberdades individuais e
coletivas; privilégios e igualdade que explicam como o poder público é projetado e
implementado com a intervenção de atores, agências, estratégias, tempos e objetivos
específicos. Estas dicotomias têm sido e estão presentes em diferentes graus de
impacto no caminho que leva ao reforço da transparência como política pública. Isso
significa que a democratização do poder por causa de sua distribuição, abertura e
acessibilidade não são ações ou processos mecânicos, mas fazem parte de lutas,
pressões, demandas e respostas que se combinam para dar vida ao avanço das
sociedades modernas. (BERRONES, 2016b, p. 200, tradução nossa)

Esta passagem resume, com clareza, o caminho da transparência pública ao longo da história
mundial. A exemplo da democracia, foi apenas no século XX17 que um número crescente de
países estabeleceu leis e procedimentos regulamentando o direito e o acesso às informações
públicas. A expansão da democracia motivou o florescimento de demandas com objetivos de
controle, fiscalização, participação, governança e, em última análise, a própria cidadania. De
outro lado, embora não tenha produzido efeitos imediatos, um dos primeiros estímulos para que
as nações reconheçam e definam politicamente o direito à informação foi dado pela
Organização das Nações Unidas (ONU), em 1946, quando aprovou a Resolução 59 onde consta
que “a liberdade de informação constitui um direito humano fundamental e a pedra de toque de
todas as liberdades a que se dedica a ONU”. (MENDEL, 2009, p. 17) Esta declaração foi

17
A Suécia, em 1766, foi o primeiro país a criar legislação específica em relação ao acesso à informação. É preciso
notar, entretanto, que a Suécia, na época, era uma monarquia.
64

ratificada, dois anos mais tarde, pela Declaração Universal dos Direitos Humanos. (MENDEL,
2009)

Uma série de tratados e acordos internacionais têm, em suas pautas, referências e estímulos à
liberdade e acesso à informação. Podem ser listados, em ordem cronológica, a Convenção
Europeia de Direitos Humanos (1953), o Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos
(1966), a Carta Africana dos Direitos Humanos e dos Povos (1986), a Convenção Americana
sobre Direitos Humanos (1992), a Declaração Interamericana de Princípios de Liberdade de
Expressão (2000), a Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção (2005) e a Declaração
de Atlanta e Plano de Ação para o Avanço do Direito de Acesso à Informação (2008).
(MENDEL, 2009)

O século XX, além do extraordinário avanço da democracia em todo o mundo, exibe uma
segunda característica que é fundamental tanto no crescimento das demandas por informação
pública quanto no aumento no número de nações a reconhecer este direito e disponibilizar estas
informações: o também extraordinário desenvolvimento das tecnologias de informação e
comunicação. O acesso à informação, como forma prática de viabilizar processos e ações de
transparência, representa “um dos mais rápidos processos de disseminação global de uma
legislação”. (BARCELOS, 2012, p. 6)

O programa Global Right to Information Rating18 relaciona 128 nações com algum tipo de
política ou legislação específica relacionada à transparência pública (RTI RATING, 2019). Por
se tratarem de nações soberanas não se observa, evidentemente, um mesmo nível de alcance e
profundidade entre estes instrumentos legais. A implementação, por outro lado, deixa a desejar
em quase todos estes países. “Sem a plena implementação, as leis têm pouca chance de
sucesso”. (TRANSPARENCY INTERNATIONAL, 2019)

O mapa da figura nº 5 apresenta os 128 países e seus estágios em relação à legislação sobre
acesso à informação. A classificação global mede o estágio do quadro jurídico para o direito de

18
O programa Global Right to Information Rating é um programa fundado pela Access Info Europe (AIE) e pelo
Centre for Law and Democracy (CLD). A ideia central por trás da classificação dos direitos à informação é fornecer
aos defensores destes direitos, reformadores, legisladores e outros uma ferramenta confiável para avaliar
comparativamente a força geral de um quadro jurídico para o direito à informação. A classificação indica os pontos
fortes e fracos do quadro jurídico, e fornece um meio útil para identificar áreas que precisam de melhorias. (RTI
RATING, 2019)
65

acesso às informações detidas pelas autoridades públicas com base em 61 indicadores discretos
- cada um dos quais analisa uma característica particular de uma das sete categorias principais:
Direito de Acesso, Escopo, Procedimento de Solicitação, Exceções e Recusas, Recursos,
Sanções e Proteções, e Medidas Promocionais. O mapa mostra uma dispersão do desempenho
dos países em todas as 5 faixas. Na primeira estão 6 países os quais obtiveram, no máximo, 50
pontos ou 33% dos indicadores avaliados. Nas faixas intermediárias, com pontuação de 51 a
75, de 76 a 100 e de 101 a 125 pontos estão, respectivamente, 38, 44 e 32 países. Finalmente, a
faixa com pontuação mais alta, de 126 ao máximo de 150 pontos, contém apenas 8 países. (RTI
RATING, 2019)

Figura 5 Países com legislação de direito à informação - 2019

Fonte: (RTI RATING, 2019)

A Suécia, em 1766, foi o primeiro país a definir legislação para o acesso à informação. De
acordo com o programa Global Right to Information Rating somente em 1951 o segundo país,
a Finlândia, estabeleceu legislação para o tema. Na sequência os Estados Unidos da América,
em 1966. Consolidando os dados do programa, até o final do século XX, apenas 32 países
haviam estabelecido a sua legislação específica. Este número corresponde a 25% do grupo de
nações que atualmente possuem algum tipo de legislação em relação ao acesso à informação.
Isto mostra que o estabelecimento de políticas oficiais é um movimento recente, característico
do século XXI. (RTI RATING, 2019)
66

Outra iniciativa para acompanhamento e monitorização das políticas de acesso à informação


nos países é o projeto The Right to Information: Good Law and Practice19. Embora seus dados
não estejam no mesmo nível de atualização do Global Right to Information Rating, é possível
identificar o tipo de instrumento legal nas nações monitoradas. De forma geral a grande maioria
criou leis ordinárias cujo título genérico poderia ser Lei de Acesso à Informação ou, em inglês,
Freedom of Information Act. É preciso destacar, entretanto, que 82 países também definiram
elementos relacionados à transparência ou acesso à informação em suas constituições.
(RIGHT2INFO, 2019)

A Organização dos Estados Americanos (OEA) elaborou um modelo de lei de acesso à


informação. A intenção é a de facilitar a seus Estados membros o processo de construção de
políticas próprias. O texto do modelo traz, em seus 73 artigos, as definições, procedimentos e
garantias que devem estar presentes nas leis a serem produzidas. Além do modelo da lei,
propriamente dito, o trabalho da OEA apresenta algumas orientações gerais sobre as quais o
modelo foi elaborado. Estas orientações são:

• O acesso à informação é um direito humano fundamental e condição para a democracia;

• O direito de acesso se aplica a toda informação em posse de órgãos públicos;

• O princípio de máxima divulgação da informação é a base do direito de acesso;

• As exceções devem ser estabelecidas de maneira clara, em lei;

• Os órgãos públicos devem divulgar informação regular e proativamente, de modo


acessível e compreensível;

• As leis devem garantir recursos administrativos e judiciais para os casos de negativa ou


obstrução do direito de acesso;

19
A organização reúne informações sobre o marco constitucional e legal para o direito de acesso à informação,
bem como jurisprudência de mais de 80 países, organizada e analisada por tópico. Pode ser acessada em
https://www.right2info.org/.
67

• A pessoa que negue ou obstrua intencionalmente o exercício do direito de acesso deve


ser sancionada e

• A adoção de medidas para promover, implementar e assegurar o direito de acesso à


informação. (ORGANIZAÇÃO DOS ESTADOS AMERICANOS, 2010)

Nesta mesma direção, porém mais atualizada, a Organização Não Governamental Article 19,
sediada na Inglaterra, a partir de uma série de elementos, dentre os quais declarações
internacionais, costumes e expectativas diversas, estabeleceu um conjunto de padrões que
devem embasar a legislação sobre direito a informação. São 9 princípios cujo objetivo é prover
subsídios para a elaboração e acompanhamento de instrumentos legais de apoio ao direito à
informação e à transparência pública. (ARTICLE 19, 2016) São eles:

a) Máxima divulgação - A legislação sobre liberdade de informação deve ser guiada pelo
princípio da máxima divulgação.

b) Obrigação de publicar - Os órgãos públicos devem ter a obrigação de publicar informações


essenciais.

c) Promoção de um governo aberto - Os órgãos públicos precisam promover ativamente a


abertura do governo.

d) Limitação da abrangência das exceções - As exceções devem ser clara e restritamente


definidas e sujeitas a rigorosos testes de “dano” e “interesse público”.

e) Procedimentos que facilitem o acesso - Os pedidos de informação devem ser processados


com rapidez e justiça, com a possibilidade de um exame independente em caso de recusa.

f) Custos - As pessoas não devem ser impedidas de fazer pedidos de informação em razão
dos altos custos envolvidos.

g) Reuniões abertas - As reuniões de órgãos públicos devem ser abertas ao público.


68

h) A divulgação tem precedência - As leis que não estejam de acordo com o princípio da
máxima divulgação devem ser revisadas ou revogadas.

i) Proteção para os denunciantes - Os indivíduos que trazem à público informações sobre atos
ilícitos – os denunciantes – precisam ser protegidos.

Alguns destes princípios não estão relacionados apenas como orientações ao estabelecimento
de legislação. A ideia de Governo Aberto e reuniões abertas, por exemplo, considera o direito
de acesso à informação como somente um dos pontos fundamentais em seus conceitos.
Governo Aberto pressupõe governos baseados não apenas na transparência, mas também, e
principalmente, na participação e na colaboração dos cidadãos.

2.2.3 O acesso à informação e a legislação brasileira

O Brasil, em quase toda a sua história, praticamente não incluiu o acesso à informação em seu
ordenamento jurídico. Existem muitas explicações para tal contexto, pois, quando o País não
estava sob algum tipo de ditadura, a forma de administração pública, patrimonialista e
burocrática, não permitiram o florescimento de qualquer iniciativa de estímulo à transparência
pública. (LOPES, 2007)

A atual Constituição da República Federativa do Brasil (BRASIL, 1988), promulgada em 1988,


incluiu, no seu ordenamento, diversas referências relacionadas à transparência e ao acesso à
informação na e da Administração Pública. Elementos contidos no inciso XXXIII do artigo 5º,
no inciso II do § 3º do artigo 37 e no § 2º do artigo 216, os quais remetem ao direito para
obtenção de informações, particulares ou públicas, serviram como base e inspiração para a
construção de um conjunto de instrumentos legais específicos.

Alguns instrumentos foram criados, após a promulgação da Constituição Federal de 1988, com
o propósito de organizar e disciplinar o acesso e a guarda de informações. São exemplos a lei
nº 8.159, de 8 de janeiro de 1991 e a lei nº 11.111 de 5 de maio de 2005. Estas leis, entretanto,
não fazem referência ao emprego das Tecnologias de Informação e Comunicação. A primeira
dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados (BRASIL, 1991), e o segundo
instrumento legal, a lei nº 11.111 de 5 de maio de 2005 (BRASIL, 2005a), regulamenta alguns
dispositivos constitucionais relacionados ao acesso à documentos públicos. Em ambos os casos,
69

senão totalmente, existiram disposições relacionadas ao acesso destes documentos que foram
revogadas pela Lei nº 12.527, de 2011.

A Lei nº 9.755 (BRASIL, 1998), de 16 de dezembro de 1998, foi uma das primeiras iniciativas
legais para promoção da transparência e do acesso à informação. Ela dispõe sobre a divulgação
de dados pelo Tribunal de Contas da União na internet. Estes dados abrangiam todos os entes
da federação, autarquias e outras entidades e compreendiam as operações de receita e despesa,
do orçamento, dos balancetes, das compras e dos contratos. O prazo para divulgação deste rol
de informações era condizente com a época e com a operacionalidade definida pela lei, não
sendo inferiores, contudo, a 30 dias. É preciso observar que esta lei atribuía ao Tribunal de
Contas da União os encargos para a divulgação destas informações. Os demais integrantes da
federação, os municípios, os estados, o distrito federal e o governo federal não eram
responsabilizados diretamente.

Outra iniciativa do governo federal foi a Lei nº 10.683 de 28 de maio de 2003. O objetivo básico
do instrumento jurídico foi a definição da estrutura governamental. Nesta nova estrutura,
entretanto, está presente a criação do cargo de Ministro de Estado do Controle e da
Transparência e, afeto a este, o Conselho da Transparência Pública e Combate a Corrupção.
Esse órgão elaborou o esboço de uma lei de acesso à informação cujos resultados, contudo,
somente apareceriam algum tempo depois. (BRASIL, 2003)

No ano de 2005 o Decreto nº 5.482, de 30 de junho, "dispõe sobre a divulgação de dados e


informações pelos órgãos e entidades da administração pública federal, por meio da rede
mundial de computadores - internet" (BRASIL, 2005b). Este decreto faz referência ao portal da
transparência do poder executivo federal o qual deve veicular dados e informações detalhadas
sobre a execução financeira e orçamentária da união. Deve abranger as despesas, receitas,
operações de transferências e de crédito realizadas pelos órgãos e entidades federais.
Acrescenta, em relação à lei nº 9.755, a obrigatoriedade que todos estes órgãos e entidades
também mantenham, em seus sítios na internet, portais de transparência específicos.

Os parâmetros atuais, que regulam a transparência na administração pública, foram


estabelecidos a partir do ano 2000 por meio da lei complementar nº 101 de 4 de maio de 2000
(BRASIL, 2000) a qual foi alterada pela lei complementar nº 131 de 27 de maio de 2009
(BRASIL, 2009). A chamada Lei de Responsabilidade Fiscal "estabeleceu normas de finanças
70

públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal". Uma seção específica foi dedicada
à transparência fiscal trazendo a obrigatoriedade de disponibilizar, em tempo real, informações
sobre a execução financeira e orçamentária. Para registro e aplicação neste trabalho podem ser
destacados os artigos 48 e 48-A os quais relacionam os instrumentos de gestão financeira e
orçamentária que devem estar à disposição da sociedade por meios eletrônicos de acesso
público.

Art. 48. São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla
divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos
e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer
prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão
Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos.

Parágrafo único. A transparência será assegurada também mediante incentivo à


participação popular e realização de audiências públicas, durante os processos de
elaboração e de discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e orçamentos.

I – incentivo à participação popular e realização de audiências públicas, durante os


processos de elaboração e discussão dos planos, lei de diretrizes orçamentárias e
orçamentos; (Incluído pela Lei Complementar nº 131, de 2009).

II – liberação ao pleno conhecimento e acompanhamento da sociedade, em tempo real,


de informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e financeira, em meios
eletrônicos de acesso público;

III – adoção de sistema integrado de administração financeira e controle, que atenda


a padrão mínimo de qualidade estabelecido pelo Poder Executivo da União e ao
disposto no art. 48-A.

Art. 48-A. Para os fins a que se refere o inciso II do parágrafo único do art. 48, os
entes da Federação disponibilizarão a qualquer pessoa física ou jurídica o acesso a
informações referentes a:

I – quanto à despesa: todos os atos praticados pelas unidades gestoras no decorrer da


execução da despesa, no momento de sua realização, com a disponibilização mínima
dos dados referentes ao número do correspondente processo, ao bem fornecido ou ao
serviço prestado, à pessoa física ou jurídica beneficiária do pagamento e, quando for
o caso, ao procedimento licitatório realizado;

II – quanto à receita: o lançamento e o recebimento de toda a receita das unidades


gestoras, inclusive referente a recursos extraordinários. (BRASIL, 2009)

O decreto nº 7.185 de 27 de maio de 2010 (BRASIL, 2010) atende o disposto no inciso III do
parágrafo único do artigo 48 da Lei Complementar nº 101 e define padrão mínimo de qualidade
do sistema integrado de administração financeira e controle no âmbito de cada ente da
federação. Este decreto, no seu artigo 2º, define que o sistema integrado "deverá permitir a
71

liberação em tempo real das informações pormenorizadas sobre a execução orçamentária e


financeira das unidades gestoras" abrangendo, inclusive, todas as entidades da administração
direta, as autarquias, as fundações, os fundos e as empresas estatais dependentes. Ainda, para o
decreto, as soluções de tecnologia de informação devem disponibilizar as informações, em meio
eletrônico que possibilite amplo acesso público, até o primeiro dia útil subsequente à data do
registro contábil. O inciso III do parágrafo 2º do artigo 2º define que o meio eletrônico
referenciado é a Internet, sem exigências de cadastramento de usuários ou utilização de senhas
para acesso.

Nas ferramentas do sistema voltados à disponibilização em meio eletrônico devem ser


"aplicadas soluções tecnológicas que visem simplificar processos e procedimentos de
atendimento ao cidadão e propiciar melhores condições para o compartilhamento das
informações" (BRASIL, 2010) além de atender ao conjunto de recomendações para
acessibilidade e padronização dos sítios e portais do governo brasileiro. Acrescenta o decreto,
constituindo-se em pontos específicos importantes, os requisitos tecnológicos que compõe o
padrão mínimo de qualidade:

I - disponibilizar ao cidadão informações de todos os Poderes e órgãos do ente da


Federação de modo consolidado;

II - permitir o armazenamento, a importação e a exportação de dados; e

III - possuir mecanismos que possibilitem a integridade, confiabilidade e


disponibilidade da informação registrada e exportada. (BRASIL, 2010)

Finalmente a lei nº 12.527, de 18 de novembro de 2011, denominada de Lei do Acesso à


Informação (BRASIL, 2011a). Esta lei disciplina os procedimentos a serem observados pela
União, Estados, Distrito Federal e Municípios para garantir o acesso à informação previsto em
diversos momentos da Constituição Federal. Alguns dos objetivos desta lei procuram
complementar a cultura da transparência e do uso das Tecnologias de Informação e
Comunicação já previstas nas leis complementares 101 e 131. O inciso V do artigo 3º, contudo,
acrescenta um objetivo importante que é o "desenvolvimento do controle social da
administração pública" (BRASIL, 2011a).

Com relação às tecnologias de informação e comunicação a lei faz referências, de forma


explicita, aos sítios oficiais do ente público na internet e define:
72

§ 3o Os sítios de que trata o § 2o deverão, na forma de regulamento, atender, entre


outros, aos seguintes requisitos:

I - conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à informação de


forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão;

II - possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos, inclusive


abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise
das informações;

III - possibilitar o acesso automatizado por sistemas externos em formatos abertos,


estruturados e legíveis por máquina;

IV - divulgar em detalhes os formatos utilizados para estruturação da informação;

V - garantir a autenticidade e a integridade das informações disponíveis para acesso;

VI - manter atualizadas as informações disponíveis para acesso;

VII - indicar local e instruções que permitam ao interessado comunicar-se, por via
eletrônica ou telefônica, com o órgão ou entidade detentora do sítio; e

VIII - adotar as medidas necessárias para garantir a acessibilidade de conteúdo para


pessoas com deficiência. (BRASIL, 2011a)

Tanto as leis complementares 101 e 131 quanto a lei 12.527, complementadas com o decreto
7.185, estabelecem claramente os elementos que devem ser contemplados nos recursos
oferecidos pela administração pública, seja da União, dos Estados, do Distrito Federal ou dos
Municípios, bem como de suas autarquias, fundações ou empresas estatais, ao cidadão. Desta
forma podem se constituir em parâmetros para avaliação dos portais de transparência e de
acesso à informação de cada ente público.

Estes instrumentos legais, combinados, permitem comportamentos distintos por parte da gestão
pública. Por um lado, um comportamento ativo ao divulgar espontaneamente, ou por força da
lei, as informações de sua competência e por outro uma atitude passiva atendendo às
solicitações dos cidadãos. De qualquer forma fica evidente que a informação, ou os dados que
a compõe, ressalvando-se as exceções previstas nas próprias leis, não são de propriedade ou de
uso exclusivo do poder público ou de seus administradores.

Cabe ressaltar, por fim, o constante no artigo 5º da lei 12.527 (BRASIL, 2011a) quando
estabelece que "É dever do Estado garantir o direito de acesso à informação, que será
73

franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em


linguagem de fácil compreensão". A intenção, claramente, é permitir que todos,
independentemente de área de conhecimento, formação ou atuação profissional, sejam capazes
de compreender a informação disponibilizada.

No contexto da legislação apresentada, este trabalho relaciona-se à obtenção de dados em


formatos outros que não apenas informações dispostas em formato textual. No conjunto de
instrumentos legais citados anteriormente encontram-se referências explicitas à possibilidade
de manipulação, por ferramentas computacionais diversas, dos dados de responsabilidade do
ente público. O Decreto nº 7.185, ao regulamentar a Lei Complementar 101, no inciso II do
artigo 4º estabelece que o sistema deve "permitir o armazenamento, a importação e a exportação
de dados;" (BRASIL, 2010). Por sua vez a Lei nº 12.527, no artigo 8º, § 3o, incisos II e II
definem, respectivamente, que o portal deve "possibilitar a gravação de relatórios em diversos
formatos eletrônicos, inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e textos, de
modo a facilitar a análise das informações;" (BRASIL, 2011a) e "possibilitar o acesso
automatizado por sistemas externos em formatos abertos, estruturados e legíveis por máquina"
(BRASIL, 2011a). A própria legislação, ao referenciar esta possibilidade, cria a expectativa de
que os dados do ente público possam ter visões alternativas. As possibilidades de
enriquecimento do debate público são significativas.

O ordenamento jurídico em relação à disponibilização de dados abertos, após a vigência da Lei


de Acesso à Informação, não contempla todas as esferas governamentais. Os instrumentos
existentes são específicos a um determinado poder e, por consequência, não têm influência nas
administrações municipais de um modo geral. As primeiras normativas adotadas pelo Governo
Federal, por exemplo, passaram a vigorar no ano seguinte à Lei de Acesso à Informação.
Inicialmente com a Instrução Normativa, n° 4 de 13 de abril de 2012 (MPOG, 2012) que institui
a Infraestrutura Nacional de Dados Abertos (INDA) e o Decreto nº 7.724 de 16 de maio de 2012
(BRASIL, 2012) que regulamenta a Lei Nº 12.527, de 18 de novembro de 2011. Este último,
embora faça referência à Lei de Acesso à Informação, somente atua no âmbito do Governo
federal.

Os dois últimos instrumentos legais são mais recentes. O primeiro deles é o Decreto nº 8.777
de 11 de maio de 2016 (BRASIL, 2016) e que institui a Política de Dados Abertos do Poder
Executivo federal. Este decreto, a exemplo dos mencionados acima, também tem abrangência
74

restrita ao Governo Federal, embora trate especificamente do tema em estudo, os dados abertos
governamentais. Este decreto foi regulamentado e complementado com a Resolução nº 3, de 13
de outubro de 2017 (COMITÊ GESTOR - INDA, 2017) a qual aprova as normas sobre
elaboração e publicação de Planos de Dados Abertos.

O conjunto de instrumentos legais, apresentados anteriormente, apenas norteiam os entes


públicos no sentido de definir claramente o que deve ser tornado público e como devem ser os
processos para que isto aconteça. A transparência pública, na legislação, é um objetivo claro,
mas que não pode ser alcançado apenas com o cumprimento da lei. De todo modo, não se trata
unicamente da quantidade de informação disponibilizada, mas principalmente da forma de sua
apresentação, de maneira a atingir um público amplo. Ribeiro (2009, p. 7) continua:

Deve-se propor que o cidadão possa conhecer suas estruturas e suas decisões. Deve
haver uma diminuição da opacidade administrativa. O governo não deve apenas
promover a transparência pela disponibilidade das informações, mas deve
proporcionar que estas informações cheguem aos cidadãos e sejam compreendidas.
Por exemplo, o orçamento e a prestação de contas podem ser disponibilizados
integralmente no Portal eletrônico do órgão público. Pela facilidade do acesso via
Internet, em tese, qualquer cidadão pode verificar. Contudo, será que o cidadão médio
consegue entender os termos técnicos presentes nestes documentos? Esse órgão não
será totalmente transparente, pois dispõe os dados, mas não há a compreensão destes
por seu público-alvo, ou seja, a sociedade como um todo. O Poder Público mesmo
que disponibilize seus dados em um portal não será mais transparente se as
informações forem difíceis de encontrar ou não sejam atualizados constantemente.

Atingir os objetivos da legislação estabelecida, desta forma, exige mais do que simplesmente
tornar públicos os dados e oferecer mecanismos para acessá-los. Não se pode imaginar que
apenas aqueles com algum tipo de formação específica, nas áreas contábeis e administrativas,
possam compreendê-los. É fundamental, assim, que a linguagem e os formatos empregados na
apresentação destas informações sejam adequados e compreensíveis a quem não é técnico. Não
basta replicar o acesso ao mesmo instrumento tecnológico usado pelos servidores públicos, na
execução de suas atividades técnicas, para o público em geral e afirmar que, desta forma, se
está sendo transparente.

2.3 DEMOCRACIA E TRANSPARÊNCIA EM SÍNTESE

A democracia, enquanto regime de governo, pode ser encontrada na maior parte dos países do
mundo. Apesar deste fato foi apenas no século XX que alcançou tamanha abrangência e, mesmo
assim, em diversas séries de avanços e retrocessos. Em cada uma destas ondas, positivas ou
75

negativas, restavam mais e mais países democráticos. Estas democracias, em comum,


apresentam a característica da representatividade. A democracia direta, que em tempos remotos
incluía o universo dos cidadãos legalmente reconhecidos, deu lugar, na atualidade, à
democracia representativa onde uma pequena parte dos cidadãos é eleita para debater e decidir
sobre os assuntos da comunidade, seja a nível nacional, estadual ou municipal.

As democracias não são iguais. A tradicional definição de “governo do povo, pelo povo e para
o povo” resume-se, na prática, ao simples ato de votar em eleições periódicas para a escolha de
diversos cargos, em diversos níveis de governo. Muitos pesquisadores, entre eles Schumpeter,
apregoam ser este o único momento e oportunidade para a participação dos cidadãos. Outros
teóricos, como Rousseau e Habermas, entendem que a democracia só se concretiza com o
envolvimento dos cidadãos. Para o primeiro estudioso a participação é educativa pois estimula
um maior relacionamento e integração entre os cidadãos e as instituições. Já, para Habermas,
os processos deliberativos públicos conduzem à legitimação das decisões e ações políticas.

A democracia necessita que suas instituições, e seus governantes, sejam transparentes. De todos
os atributos e características dos regimes democráticos a transparência é fundamental para a
formação da opinião pública. O conhecimento que o cidadão possui sobre as organizações
governamentais, seus funcionários, e a classe política como um todo, é um ponto fundamental
na escolha de seus representantes, ou de sua participação nos processos públicos e deliberativos.

Diversos autores tem se dedicado ao estudo da transparência, de suas características e suas


formas de manifestação. Estes elementos permitem observar a transparência em função de suas
dimensões, de suas direções, de seus componentes e de sua cronologia. O quadro nº 4 exibe
estes autores e os pontos mais significativos em seus estudos.
76

Quadro 4 A transparência e suas características segundo diversos autores


Autor Característica Descrição
Dimensão física Relacionada às dificuldades em acessar fisicamente a informação
BATISTA, Dimensão intelectual Dificuldades relativas à compreensão intelectual das informações
2010 Dimensão Relacionadas à falta de eficácia na comunicação entre o Estado e os
comunicacional cidadãos, e até o excesso de informação
Dimensão técnica Complexidade dos processos necessários à implementação da
transparência
BERRONES, Dimensão política Relaciona-se ao favorecimento do diálogo entre governantes e
2016a governados
Dimensão Definem a transparência como uma política pública
institucional
Sentido ascendente Ocorre quando algum agente, superior hierarquicamente, pode
observar a conduta, o comportamento, as ações e os resultados
produzidos por subordinados
Sentido descendente Ocorre quando alguém, subordinado ou governado, pode observar
os mesmos elementos de seus superiores, ou governantes
Para fora Ocorre quando, em qualquer organização ou instituição, se pode
visualizar o que está acontecendo no seu exterior
Para dentro Ocorre quando qualquer pessoa, em ambiente exterior a uma
organização ou instituição, pode observá-la e monitorá-la
Transparência de Os eventos constituem pontos, ou estados, visíveis externamente e,
eventos normalmente, possíveis de serem mensurados
Transparência de os processos de transformação atuam sobre as entradas (os insumos)
processos produzindo as saídas correspondentes. Estes não podem ser medidos
do mesmo modo que os eventos, mas quando existem informações,
podem ser descritos
Componentes Compreendem as regras, normas e regulamentos adotados
HEALD, 2006 processuais
Componentes Aplicação destas regras em casos específicos
operacionais
Transparência em Acontecimentos ou fatos passados, já ocorridos. Esta situação
retrospecto enquadra-se, normalmente, nos episódios característicos de
prestação de contas
Transparência em As ações são continuamente exibidas permitindo um
tempo real acompanhamento e vigilância constante
Transparência Possui um caráter apenas formal no sentido de que o objetivo é o
nominal cumprimento de obrigações ou para fins exclusivos de publicidade

Transparência efetiva Para que a transparência seja eficaz, deve haver receptores capazes
de processar, digerir e usar as informações. Compreende a
informação adequada a ser processada, debatida e empregada nos
processos de acompanhamento, avaliação, participação e
deliberação
Atributo Característica que toda pessoa ou organização apresenta
Posse de informações Imprescindível para que o assunto seja claramente compreendido
NAESSENS, claras e precisas
2010 Realização de É necessário o desenvolvimento da capacidade de compreensão,
qualquer pessoa vigilância e comunicação
enquanto cidadão
Fonte: Elaborado pelo autor

O acesso à informação é a forma mais comum para a implementação de políticas públicas em


relação à transparência pública. O Brasil, seguindo o exemplo de diversos países, estabeleceu,
principalmente no século XXI, um conjunto de instrumentos, explicitados no quadro nº 5, que
77

normatizam tanto as obrigações dos diversos entes públicos, quanto os direitos dos cidadãos
em relação ao acesso à informação. A mais significativa destas medidas é a Lei nº 12.527 de
2011 que regula o acesso à informação, e abrange “os órgãos públicos integrantes da
administração direta dos Poderes Executivo, Legislativo, incluindo as Cortes de Contas, e
Judiciário e do Ministério Público bem como as autarquias, as fundações públicas, as empresas
públicas, as sociedades de economia mista e demais entidades controladas direta ou
indiretamente pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios” (BRASIL, 2011a).

Quadro 5 Acesso à informação na legislação Brasileira


Instrumento legal Objetivo
Constituição Federal Direito para obtenção de informações, particulares ou públicas (inciso XXXIII do
artigo 5º, no inciso II do § 3º do artigo 37 e no § 2º do artigo 216)
Lei nº 8.159 (1991) Dispõe sobre a política nacional de arquivos públicos e privados
Lei nº 11.111 (2005) Regulamenta alguns dispositivos constitucionais relacionados ao acesso à documentos
públicos
Lei nº 9.755 (1998) Dispõe sobre a divulgação de dados referentes a todos os entes da federação pelo
Tribunal de Contas da União na internet
Lei nº 10.683 (2003) Criação do cargo de Ministro de Estado do Controle e da Transparência e, afeto a este,
o Conselho da Transparência Pública e Combate a Corrupção
Decreto nº 5.482 Dispõe sobre a divulgação de dados e informações pelos órgãos e entidades da
(2005) administração pública federal, por meio da rede mundial de computadores - internet
Lei complementar nº Estabeleceu normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão
101 (2000) fiscal. Trouxe a obrigatoriedade de disponibilizar, em tempo real, informações sobre
Lei complementar nº a execução financeira e orçamentária
131 (2009)
Decreto nº 7.185 de 27 Atende o disposto no inciso III do parágrafo único do artigo 48 da Lei Complementar
de maio de 2010 nº 101 e define padrão mínimo de qualidade do sistema integrado de administração
financeira e controle no âmbito de cada ente da federação
Lei nº 12.527 (2011) Disciplina os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal
e Municípios para garantir o acesso à informação previsto em diversos momentos da
Constituição Federal
Fonte: Elaborado pelo autor
78

3 DADOS ABERTOS, DEMOCRACIA E GOVERNOS ABERTOS

O Estado moderno, por meio de sua estrutura política e administrativa, constitui-se num dos
grandes produtores e depositários dos dados existentes. As ações e atividades estatais
produzem, recebem, manipulam e disseminam informações de e para a sociedade. Esta grande
quantidade de dados, que é gerada diariamente, está armazenada em formatos relacionais, como
planilhas eletrônicas e bancos de dados, em formatos de textos, por meio de editores ou
visualizadores de textos, ou mesmo na forma de audiovisuais com o armazenamento de sons e
imagens. (POSSAMAI, 2016)

Estes conjuntos de dados, retidos no emaranhado dos sistemas de informações das instituições
governamentais, nem sempre são tratados adequadamente e, via de regra, não são
compartilhados, nem com a sociedade e nem mesmo com outros órgãos da administração
pública. De forma adicional é frequente o fato de que dois ou mais órgãos públicos usem as
mesmas informações sem qualquer estratégia em comum, ocasionando redundância e
duplicação desnecessária de esforços e recursos. (POSSAMAI, 2016; WEERAKKODY et al.,
2017)

Figura 6 Dados Governamentais Abertos - Elementos

Fonte: Adaptado de (GONZALEZ-ZAPATA; HEEKS, 2015)

Gorman (2009) reafirma a ideia de que dados e informações são bens públicos. O Estado,
representando a sociedade, não é seu proprietário exclusivo. Para este autor a utilização de
79

dados pelo Estado não os inutiliza para o uso do restante da sociedade e do próprio governo.
Estes dados, deste modo, podem ser abertos e disponibilizados para que a sociedade possa
reutilizá-los. A inclusão do contexto governamental à ideia de dados abertos resulta em três
elementos fundantes dos chamados Dados Governamentais Abertos (DGA), como pode-se
observar na figura nº 6.

Um dado, como definido por Setzer (2001), é “uma sequência de símbolos quantificados ou
quantificáveis”. Deste modo, para o autor, textos, números, figuras, imagens, sons gravados e
animações são considerados dados. Todos, ainda de acordo com Setzer, podem ser
quantificados. O autor acrescenta:

Com essa definição, um dado é necessariamente uma entidade matemática e, desta


forma, é puramente sintático. Isto significa que os dados podem ser totalmente
descritos através de representações formais, estruturais. Sendo ainda quantificados ou
quantificáveis, eles podem obviamente ser armazenados em um computador e
processados por ele. (SETZER, 2001)

Neste trabalho, até o momento, tem-se usado de forma indiscriminada os termos “dados” e
“informações” como possuindo o mesmo significado. Setzer define informação como uma
abstração que representa alguma coisa para uma pessoa. A informação é representada na forma
de dados e, como tal, pode ser processada. Assim quando alguém recebe um conjunto de dados
há a tentativa de atribuir significado interpretando-os como informação. Uma informação
consiste de dados os quais constituem sua representação simbólica. Um texto, por exemplo, é
formado por caracteres (letras e algarismos) e sinais gráficos. Ao ser lido por uma pessoa pode
transmitir informações, desde que seja compreendido. (SETZER, 2001)

Uma forma de efetivação da transparência pública dá-se por meio do acesso à informação.
Baseado nos conceitos apresentados, o que as instituições governamentais oferecem, na
verdade, são conjuntos de dados já processados os quais podem significar, para um cidadão,
uma informação concreta e compreendida. De outra forma pode não despertar em quem acessa
estes dados nenhum entendimento e compreensão.

A Open Definition define que o termo “Aberto” significa “que qualquer pessoa pode acessar
livremente, usar, modificar e compartilhar para qualquer finalidade (sujeito, no máximo, a
preservação da proveniência e manutenção da abertura)” (OPEN DEFINITION, 2017). O
conceito é empregado de forma muito intensa no denominado Movimento pelo Software Livre.
80

É adotado também para outras formas de criação, além do software. O Open Access, que visa à
formação de repositórios de literatura científica disponíveis de forma gratuita, e o sistema de
licenças Creative Commons, orientado ao compartilhamento e a reutilização de materiais e
trabalhos de artistas e autores são exemplos de abertura ao conhecimento (POSSAMAI, 2016).

O conceito de Dados Abertos (DA), desta forma, implica que “Dados abertos são dados que
podem ser livremente usados, reutilizados e redistribuídos por qualquer pessoa, sujeitos, no
máximo, à exigência de atribuição da fonte e compartilhamento pelas mesmas regras” (OPEN
KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017a). Estes dados podem ser disponibilizados por
qualquer organização seja pública, privada, social, e/ou sem fins lucrativos.

O terceiro elemento fundante diz respeito ao Governo, de uma forma geral, e a partir do qual
podem ser feitas três associações. A primeira, como já mencionado anteriormente, diz respeito
aos dados governamentais. Com um olhar superficial, de imediato, podem-se distinguir duas
categorias de dados públicos. Esta categorização relaciona-se ao sigilo das informações, que
pode determinar a publicização dos mesmos para todos os cidadãos. A legislação,
especialmente a que regula o acesso à informação, estipula categorias e critérios para o acesso
restrito de parte delas incluindo questões de privacidade, segurança e controle. A abertura dos
dados públicos, segundo o seu movimento, deve naturalmente respeitar estas restrições.

Um segundo relacionamento é estabelecido pelo conceito e significados dos Governos Abertos


(GA). Um Governo Aberto, que será abordado mais adiante, neste capítulo, consiste na adoção
de princípios baseados na transparência pública, na participação e na colaboração dos cidadãos.
Estes três elementos estão intimamente associados ao conceito e às práticas relacionadas aos
Dados Abertos. Finalmente, da intersecção dos três elementos, constituem os denominados
Dados Governamentais Abertos.

Possamai consolida estes elementos e apresenta uma definição para Dados Governamentais
Abertos, dizendo que

são os dados públicos, produzidos pelas atividades estatais (Executivo, Legislativo e


Judiciário), disponíveis de maneira gratuita e proativa, sem a necessidade de prévia
requisição, para que qualquer indivíduo ou entidade possa não apenas os ler ou
acompanhar, mas também os descarregar (download), (re)utilizar e (re)distribuir em
forma de novos projetos (conteúdos, sítios, aplicativos, etc.), estando sujeitos a, no
máximo, créditos de autoria. (POSSAMAI, 2016, p. 17)
81

Os pontos mais importantes associados a esta definição são:

Disponibilidade e Acesso: os dados devem estar disponíveis como um todo e sob


custo não maior que um custo razoável de reprodução, preferencialmente possíveis de
serem baixados pela internet. Os dados devem também estar disponíveis de uma forma
conveniente e modificável.

Reutilização e Redistribuição: os dados devem ser fornecidos sob termos que


permitam a reutilização e a redistribuição, inclusive a combinação com outros
conjuntos de dados.

Participação Universal: todos devem ser capazes de usar, reutilizar e redistribuir -


não deve haver discriminação contra áreas de atuação ou contra pessoas ou grupos.
Por exemplo, restrições de uso ‘não-comercial’ que impediriam o uso ‘comercial’, ou
restrições de uso para certos fins (ex.: somente educativos) excluem determinados
dados do conceito de ‘abertos’. (OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017a)
(Grifos do autor)

Um conceito associado a estes elementos é o da interoperabilidade. Para o Open Data Handbook


(ODH), portal que reúne conceitos, exemplos e possiblidades envolvendo dados abertos,
(OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017a) “Interoperabilidade significa a
capacidade de diversos sistemas e organizações trabalharem juntos (interoperar). Neste caso,
trata-se da capacidade de interoperar - ou combinar - diferentes conjuntos de dados”. Em
decorrência desta capacidade não apenas a sociedade como também o próprio poder público
pode ser beneficiado.

O objetivo da abertura de dados é que a sociedade pode tirar proveito destes dados. Um
pressuposto importante é que o ente público que os mantém eventualmente não sabe, não pode,
não quer ou não tem a capacidade de analisá-los. Colocá-los à disposição da sociedade faz com
qualquer pessoa ou organização possa construir sobre eles novas ideias que resultem em novos
dados, conhecimentos ou serviços (CONCHA; NASER, 2012). Ramírez-Alujas (2011)
complementa que os impulsos ao movimento de dados abertos, por um lado, promovem a
inovação pois os dados públicos são catalisadores de novas aplicações e serviços e, por outro,
devolvem aos cidadãos seus próprios dados e informações sobre as ações governamentais
aumentando, desta forma, a transparência pública. Os dados públicos abertos podem ser
considerados como um instrumento para a transparência, a participação e a colaboração,
elementos fundamentais dos governos abertos.

Concha e Naser (2012) apresentam uma relação de benefícios, tanto para os cidadãos, quanto
para o próprio poder público resultantes da adoção de política de abertura de dados:
82

− Maior confiança no governo;

− A participação no desenho e na execução de programas, políticas e serviços pode


assegurar melhores resultados pelo menor custo;

− Tornar a população parte do processo pode fazer com que as decisões adotadas sejam
percebidas como legítimas e, assim, elevar os níveis de aceitação ao governo;

− Assegurar a equidade de acesso na formulação de políticas públicas;

− Fomentar a inovação e novas atividades econômicas;

− Melhorar a eficácia das políticas públicas por serem mais específicas e atenderem às
necessidades dos cidadãos.

Alguns benefícios adicionais, principalmente para o poder público, são apontados pelo
Observatorio Regional de la Sociedad de la Información de Castilla y León (ORSI, 2010):

− A administração pública também é beneficiada pois os cidadãos participam ativamente


na melhoria do serviço público com sugestões, propostas e, principalmente, com
conteúdo gerados por eles mesmos;

− A exposição dos dados públicos aumenta a qualidade e integridade dos mesmos já que
podem ser contrastados pelos cidadãos e por outras organizações;

− Aumenta a transparência entre os diferentes níveis e órgãos governamentais;

− Pode diminuir a carga de trabalho dos funcionários públicos pela colaboração entre os
mesmos e a comunidade;

− Permite que os responsáveis políticos estejam mais vinculados e próximos às


preocupações e interesses dos cidadãos.
83

Uma outra visão pode ser apresentada a partir dos conceitos defendidos pela comunidade de
software livre aplicados aos dados governamentais. A ideia é a de que os cidadãos possam usar
livremente os dados públicos colhidos e divulgados pelos governos. Do mesmo modo que na
filosofia Open Source, do software livre, os cidadãos podem contribuir para o desenvolvimento
do próprio conjunto de dados. O valor dos dados está no seu processamento e, por meio de sua
abertura, permite diferentes perspectivas contribuindo para o debate democrático (REIS;
ARAÚJO; SAMPAIO, 2015).

Os Dados Governamentais Abertos podem ser analisados sob diferentes prismas, de acordo
com Gonzales-Zapata e Heeks (2015): Burocrática, Tecnológica, Política e Econômica. Sob o
ponto de vista burocrático concebe-se os DGA como parte das escolhas políticas do governo,
de forma que possam resultar em prestação de serviços públicos além de melhor manipulação
dos dados do setor público. Esta busca por maior eficiência no tratamento dos dados pode,
ainda, contribuir na redução de custos e em maior qualidade dos processos internos, como por
exemplo a formação de políticas públicas.

A perspectiva tecnológica concebe os DGA como possibilidade de inovações tecnológicas. A


disponibilização e utilização de dados públicos produz um contexto de mudanças,
principalmente no design dos formatos, processos e padrões usados para o tratamento destes
dados. Estas mudanças podem fornecer melhorias na infraestrutura de dados do próprio
governo, com maior precisão, completude e atualização, permitindo que sejam acessados e
utilizados de forma mais fácil, além de viabilizar a integração com outros conjuntos de dados.
(GONZALEZ-ZAPATA; HEEKS, 2015)

No campo político Dados Governamentais Abertos estão intensamente associados às ideias de


Governo Aberto. Os DGA constituem um direito fundamental de forma que todos possam ter
acesso a dados do setor público. As esperanças, nestes processos, residem na possibilidade de
melhor governança, melhor transparência e prestação de contas, bem como maior participação
dos cidadãos na formulação de políticas e nas decisões públicas. A perspectiva econômica,
finalmente, está associada às possibilidades de incremento das atividades econômicas a partir
das ações desempenhadas pela iniciativa privada e que resultem na criação de novos produtos
e serviços os quais podem ser explorados economicamente. (GONZALEZ-ZAPATA; HEEKS,
2015)
84

3.1 DADOS ABERTOS E DEMOCRACIA

A democracia é um conceito dinâmico e, dependendo de quem e do ponto em que se faz a


observação, pode ter significados diferentes. Estas múltiplas definições, entretanto, trazem um
elemento em comum e que é fundamental à sua estabilidade: a transparência que os governantes
imprimem às suas ações. O acesso à informação, neste sentido, pode também ser potencializado
por meio de Dados Governamentais Abertos.

Ruijer, Grimmelikhuijsen e Meijer (2017) analisam as necessidades de informação e o papel


de cada ator nas diferentes formas de democracia. Os autores apresentam a ideia de democracia
monitorizada a qual, de maneira geral, corresponde às mesmas concepções da democracia
representativa. O pressuposto básico é que um mandato é concedido ao governo e a forma como
este governo se conduz é monitorizada pelos cidadãos. A responsabilidade dos cidadãos é a de
estar vigilante e bem informado. Ainda segundo os mesmos autores (RUIJER;
GRIMMELIKHUIJSEN; MEIJER, 2017, p. 46, tradução nossa) “os cidadãos estão conscientes
de que precisam estar atentos à política, mas podem permitir que instituições intermediárias
desempenhem o papel mais importante. A mídia, neste contexto, atua como um alarme de
incêndio”. Ao governo cabe divulgar informações, tanto de maneira pró ativa, quanto de
maneira passiva por meio de respostas à pedidos específicos. A plataforma de dados abertos
deve fornecer dados de forma que os cidadãos, ou seus intermediários, consigam produzir
informações que conduzam a um exame adequado do desempenho do governo.

No ponto de vista da democracia participativa a ênfase, para Ruijer, Grimmelikhuijsen e Meijer


(2017), é colocada na ação e na colaboração dos cidadãos. Neste modelo, além de
proporcionarem um mandato ao governo, os cidadãos se envolvem e colaboram na solução de
problemas, na produção de serviços públicos e na implementação de políticas públicas. Os
cidadãos, desta forma, podem constituir-se em parceiros do governo e necessitam, além dos
dados públicos, de oportunidades de cocriação e colaboração com o governo. Os dados abertos
“podem facilitar a interação e colaboração com organizações governamentais, oferecendo um
ambiente colaborativo e permitindo a participação em esforços coletivos de tomada de decisão
sobre os problemas públicos” (RUIJER; GRIMMELIKHUIJSEN; MEIJER, 2017, p. 47,
tradução nossa).
85

Na democracia deliberativa incorpora-se o debate aberto para a busca de soluções coletivas.


Assim, ao invés do simples ato de votar, os processos deliberativos são vistos como o
mecanismo central para as decisões políticas. Deste modo as possibilidades de obtenção de
informações sob ângulos distintos são extremamente necessárias. Os dados abertos, além das
TIC´s reforçam estas alternativas (RUIJER; GRIMMELIKHUIJSEN; MEIJER, 2017)

Figura 7 Dados abertos, democracia e as interações entre cidadãos e governo

Fonte: Adaptado de (RUIJER; GRIMMELIKHUIJSEN; MEIJER, 2017)

A figura nº 7 ilustra o relacionamento e a interação entre governo e os cidadãos, atores deste


sistema. Para Ruijer, Grimmelikhuijsen e Meijer (2017, p. 48, tradução nossa) “a plataforma
de dados abertos é a ferramenta mediadora, que permite o acesso aos dados (monitorização),
permitindo a interação com cidadãos individuais, jornalistas ou grupos de cidadãos
(deliberação) e oferecendo oportunidades de colaboração ou ação (participação)”. Um
problema público qualquer, formulado pela comunidade ou pelo governo, pode ser analisado
por qualquer um dos atores, individualmente. Pode também resultar num objeto com
significado coletivo a partir das interações entre os cidadãos e o poder público. A mediação
destas interações pode ser viabilizada por meio das plataformas de dados abertos. O resultado
de tais interações, não deve ser olhado apenas do ponto de vista material pela solução do
problema em questão. A questão principal, como colocam Ruijer, Grimmelikhuijsen e Meijer,
é

uma compreensão potencialmente compartilhada de uma visão crítica (monitorial),


debates públicos (deliberativo) ou ação coletiva (participativa). Note-se também que
os três resultados podem fazer parte do mesmo processo e uma combinação de
resultados é possível também. Além disso, os sistemas de atividade estão em constante
movimento. Afinal, a tecnologia e as necessidades do usuário não são estáticas, mas
podem ser um processo único sobre uma única questão ou decisão, bem como um
86

processo reflexivo contínuo entre os cidadãos e entre cidadãos e administradores


públicos. (RUIJER; GRIMMELIKHUIJSEN; MEIJER, 2017, p. 48, tradução nossa)

A figura20 nº 8 resume os conceitos, objetivos, princípios e benefícios dos Dados


Governamentais Abertos e ilustra, sob outro ângulo, como os dados abertos podem envolver a
comunidade e o governo em processos de deliberação, participação e de colaboração. Para
Verdier (apud TABOR, 2014), a abertura e compartilhamento de dados públicos não deve ser
vista como um fim em si mesma, mas sim como alavancas que podem servir a uma democracia
mais completa, à inovação e crescimento e à uma ação pública mais eficiente.

Figura 8 Dados Governamentais Abertos - Atores e relacionamentos

Fonte: Adaptado de (TABOR, 2014)

São dois grupos de atores que interagem e compartilham dos dados e de seus resultados. Por
um lado, evidentemente, o governo com todas as suas instituições (Administração direta,

20
A figura acompanha alguns comentários feitos por Henri Verdier, especialista digital, ele foi o diretor de
tecnologia do estado francês de 2015 a 2018. Os comentários são uma resposta à entrevista concedida por Evelyn
Ruppert, socióloga Britânica, sobre a política de dados abertos no Reino Unido.
87

indireta e empresas públicas), em todos os seus níveis (Federal, Estadual e Municipal) e em


todos os seus poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário). O segundo grupo de atores
representa a sociedade. São os cidadãos atuando individualmente, organizados em grupos ou
em associações além das empresas privadas de todos os portes e natureza. Nestes dois grupos
de atores não é possível distinguir, com clareza, quem beneficia e quem é beneficiado.

O Governo é quem disponibiliza os dados pelos quais tem responsabilidade. Em boa parte dos
casos são dados já estruturados e que são mantidos pelos sistemas informatizados empregados
pelo ente público. Por outro lado, estas mesmas instituições possuem dados armazenados em
locais diversos (nos computadores e arquivos dos servidores públicos) e em meios diversos
como planilhas eletrônicas, editores de textos e imagens além de material na forma de áudios e
vídeos. É preciso destacar ainda que, não raro, muita informação ainda é armazenada
exclusivamente em papel. É possível imaginar, a partir deste contexto, as dificuldades que
podem ser encontradas para o processo de seleção, preparação, documentação e
disponibilização destes dados.

A comunidade desempenha diversos papéis neste processo. Dados abertos, como já


apresentado, são dados brutos e, como tal, geralmente não conduzem a significados e
interpretações imediatas. A utilização destes dados pressupõe que sejam processados e, muitas
vezes, integrados com outros conjuntos de dados pelo uso de aplicativos computacionais já
existentes (planilhas eletrônicas, por exemplo) ou pelo desenvolvimento de novas aplicações,
por parte da própria comunidade. A intenção destas novas aplicações é a produção de novas
alternativas de apresentação dos dados governamentais, de forma diferente ou inovadora,
daquelas produzidas pelo próprio governo. Estes produtos são colocados à disposição da
comunidade como um todo, na esperança de que as informações resultantes possam ser
interpretadas e assimiladas por um número maior de cidadãos. Verdier (apud TABOR, 2014)
acrescenta que o “compartilhamento de dados permitirá a construção de gestos genuínos de
intercâmbio democrático, para despertar a contribuição informada do cidadão para as decisões
públicas. A abertura de dados deve conduzir a uma abertura da decisão pública em si”.

As características e princípios que definem a abertura de dados governamentais compreendem


um conjunto de elementos de ordem técnica, econômica, legal e, principalmente, social. O livre
compartilhamento de dados fomenta uma maior transparência pública, participação e
88

colaboração dos cidadãos podendo resultar em maior controle social sobre as administrações
públicas.

Para Janssen, Charalabidis e Zuiderwijk (2012) são vários os benefícios que podem ser obtidos
pela abertura de dados governamentais e, para os autores, compõe três grupos distintos. O
primeiro grupo é de ordem político e social e agrega questões relacionadas à transparência
pública, democracia e promoção da cidadania. O segundo grupo, de benefícios econômicos,
abrange o estímulo à inovação, a geração de novos produtos e serviços e uma maior integração
entre governos e sociedade. O último grupo, por fim, relaciona-se a benefícios operacionais e
técnicos e pode apresentar uma maior cooperação entre governos e sociedade, pela melhoria de
processos e pela utilização de conhecimento e capacidade coletiva.

O conjunto de benefícios e encargos decorrentes da disponibilização de dados abertos abrange


e interliga diferentes agentes da sociedade, constituindo o que se convencionou denominar de
ecossistema de dados abertos (ALBANO; REINHARD; ARAÚJO, 2017; DELOITTE LLP,
2012; FREITAS et al., 2018; GORMAN, 2009; LINDERS, 2012; UBALDI, 2013). Ubaldi
(2013) especifica três grupos de atores que integram este ecossistema:

− Produtores de dados: São as organizações, tanto do setor privado quanto do setor


público, principalmente. Os Dados Abertos Governamentais podem ser
disponibilizados em todas as esferas de governo (Executivo, Legislativo e Judiciário) e
em todos os níveis (Federal, Estadual e Municipal). A administração indireta, com as
empresas públicas, universidades, fundações, institutos, etc. também compõe este
grupo.

− Intermediários: Também chamados de infomediários, intermediam o consumo dos


dados disponibilizados pelos produtores de dados. Os meios de comunicação, a
sociedade civil e os desenvolvedores de softwares agregam valor e sentido aos dados
brutos. Podem ainda, ao empregar diferentes meios e linguagens, atingir camadas
populacionais excluídas e criar uma cultura de apreço aos dados públicos.

− Usuários: Todos aqueles que, de alguma forma, consomem e se beneficiam dos dados e
informações disponíveis a partir da abertura dos dados governamentais. O cidadão
comum é o componente mais evidente deste grupo. De qualquer forma também os
89

produtores de dados e intermediários na produção de novos dados e informações podem


também ser considerados como usuários.

Esta atividade de uso ou desenvolvimento de novas ferramentas computacionais para


processamento dos Dados Governamentais Abertos identifica, dentro da comunidade, a
necessidade de incorporação de uma categoria de cidadãos com afinidades e qualificação no
uso dos aplicativos já existentes, bem como daqueles aptos a desenvolver novas aplicações,
normalmente denominados de programadores de computadores. No contexto dos Dados
Abertos estas pessoas são identificadas como intermediários de dados.

Schrock e Shaffer (2017, p. 2) definem intermediários de dados como “atores que traduzem,
usam ou mediam a comunicação usando dados produzidos por ou para o governo”. O propósito
de tais mediações é democratizante pois, claramente, há uma preocupação com o acesso e
auxilio a análise dos dados disponíveis. Compreendem cidadãos atuando individualmente,
empresas privadas em busca de retribuição econômica além de startups cívicas formadas a partir
de oportunidades surgidas pela disponibilização de dados governamentais. Estes
intermediários, na quase totalidade das vezes, empregam novas maneiras para processamento
dos dados e conectam entidades, principalmente em relação ao governo, que nunca tiveram
qualquer contacto. (SCHROCK; SHAFFER, 2017)

Muitos dos resultados destas novas visões sobre os dados, principalmente quando integrados
com outros conjuntos de dados da própria comunidade, podem também retornar ao governo.
Os dados governamentais podem ser enriquecidos com o tratamento dispensado pela
comunidade. Os processos de inovação desencadeados com o uso de dados abertos podem
resultar em novos e mais eficientes serviços públicos.

3.2 DADOS ABERTOS E GOVERNOS ABERTOS

Uma das primeiras referências à ideia de Governo Aberto (em inglês Open Government) foi
apresentada por Chapman e Hunt (1987) ao debaterem diversas questões relacionadas à
segredos de governo e à abertura do setor público no Reino Unido, com o objetivo de reduzir a
opacidade. O parlamento Inglês já debatia o assunto em 1993 ao receber documento do Duque
de Lancaster (1993, p. 1) que na sua introdução apresentava:
90

Um governo aberto é parte de uma democracia efetiva. Os cidadãos devem ter acesso
adequado à informação e análises em que se baseiam os negócios do governo.
Ministros e funcionários públicos tem o dever de explicar suas políticas, decisões e
ações ao público. (Tradução nossa)

Concretamente, entretanto, o termo ganhou força a partir da campanha eleitoral21 e da posse de


Barack Obama na Presidência dos Estados Unidos da América. Uma de suas primeiras ações
foi a emissão de memorando em 21 de janeiro de 2009. Este comunicado, dirigido aos órgãos
governamentais americanos, estabeleceu orientações sobre transparência e governo aberto na
administração pública federal americana (ALDERETE, 2016; OBAMA, 2009). A expressão
Governo Aberto empregada por Obama foi construída a partir de três pilares: a transparência,
a participação e a colaboração. A intenção era a manutenção de um diálogo permanente com a
sociedade, fornecendo toda a informação possível tanto para a avaliação da atuação
governamental quanto para a elaboração de propostas cidadãs (ALDERETE, 2016).

No memorando, o Presidente Obama apresentava a sua visão sobre transparência, participação


e colaboração, elementos fundamentais para a abertura em seu governo:

O governo deve ser transparente. A transparência promove a responsabilização e


fornece informações aos cidadãos sobre o que o seu Governo está a fazer. As
informações mantidas pelo Governo Federal são um bem nacional. A minha
administração tomará as medidas adequadas, coerentes com a lei e a política, para
divulgar rapidamente informações em formas que o público pode facilmente encontrar
e utilizar. Os departamentos e agências executivas devem aproveitar as novas
tecnologias para colocar informações sobre suas operações e decisões on-line e
prontamente disponíveis ao público. Os departamentos e agências executivas também
devem solicitar feedback público para identificar informações de maior uso ao
público.

O governo deve ser participativo. O envolvimento público reforça a eficácia do


Governo e melhora a qualidade das suas decisões. O conhecimento é amplamente
disperso na sociedade, e os funcionários públicos se beneficiam de ter acesso a esse
conhecimento disperso. Os departamentos e agências executivas devem oferecer aos
americanos maiores oportunidades de participar na formulação de políticas e fornecer
ao seu governo os benefícios de sua experiência coletiva e informações. Os
departamentos e agências executivas também devem solicitar informações públicas
sobre como podemos aumentar e melhorar as oportunidades de participação pública
no Governo.

O governo deve ser colaborativo. A colaboração envolve ativamente os americanos


no trabalho de seu governo. Departamentos e agências executivas devem usar
ferramentas, métodos e sistemas inovadores para cooperar entre si, em todos os níveis
de governo e com organizações sem fins lucrativos, empresas e indivíduos no setor
privado. Os departamentos e agências executivas devem solicitar feedback público

21
A campanha eleitoral de Barack Obama foi fortemente baseada no uso das TICs e na interação com os eleitores
por meio das redes sociais e da internet.
91

para avaliar e melhorar seu nível de colaboração e identificar novas oportunidades de


cooperação. (OBAMA, 2009, tradução nossa)

Muitas outras nações seguiram esta política de Governo Aberto. Em 2011 foi constituída a
Parceria para Governo Aberto (Open Government Partnership) (OPEN GOVERNMENT
PARTNERSHIP, 2017) que, de acordo com Possamai (2016, p. 10) consiste em

uma iniciativa internacional que pretende difundir e incentivar práticas


governamentais relacionadas à transparência e ao acesso à informação pública, à
prestação de contas e responsabilização, à participação social e à ampla utilização das
novas tecnologias por governos e cidadãos para promover a inovação e fortalecer a
governança.

Calderón e Lorenzo (2010, p. 11) também apresentam uma definição para Governo Aberto:

Governo Aberto é aquele que realiza um diálogo permanente com os cidadãos, com o
objetivo de ouvir o que dizem e solicitam, que toma decisões baseadas em suas
necessidades e preferências, que facilita a colaboração destes mesmos cidadãos e
funcionários no desenvolvimento dos serviços que presta e que comunica tudo o que
decide e faz de uma forma aberta e transparente. (Tradução nossa)

Oszlak (2014, p. 7) reforça a definição e acrescenta o papel fundamental das Tecnologias de


Informação e Comunicação (TICs) neste processo:

Pode se afirmar que um Governo Aberto contém uma relação de mão dupla entre a
cidadania e o Estado, possibilitada pela disponibilidade e emprego das TICs que
facilitam múltiplas interações entre os atores sociais e estatais, as quais se traduzem
em vínculos mais transparentes, participativos e colaborativos. (Tradução nossa)

Por fim Cruz-Rubio (2015, p. 51), ao apresentar a sua definição, a caracteriza como um
paradigma em construção:

Uma filosofia político administrativa, um novo paradigma ou modelo de interação


política que – baseado firmemente nos valores e princípios de transparência, da
democracia participativa e empoderamento cidadão, na prestação de contas, nos dados
abertos e no emprego dos avanços tecnológicos, e na organização de governos que
promovem a colaboração e interação – constitui-se como uma forma e/ou estratégia
para o desenho, implementação, controle e valorização de políticas públicas e para
processos de modernização administrativa, tornando o cidadão o centro da atenção e
de prioridades, oferecendo assim uma alternativa para a gestão das coisas públicas.
(Tradução nossa)

Um dos elementos presentes nas diversas definições é a decisiva participação das TICs no
processo. O que há de novo nas ações propostas por Barack Obama, em relação ao debate que
ocorria na Inglaterra, é o aproveitamento das TICs, e da internet, para a interação entre governo
92

e sociedade. O pressuposto, segundo Alderete (2016), é que estas tecnologias, como nunca antes
na história da humanidade, permitem:

a) Uma grande capacidade e velocidade de comunicação, processamento,


criação e recriação de informações de todos os tipos (voz, imagem, dados,
vídeo, sons);

b) Conectar usuários situados a grandes distâncias sem restrições de horários.


(Tradução nossa)

Neste sentido, os termos Governo Aberto, Governo Eletrônico, e-Governo, Governo 2.0, ou
outros neologismos que descrevem o uso das tecnologias digitais, para muitos pesquisadores,
são sinônimos. Oszlak (2016, p. 32), por sua vez, compara conceitualmente estes elementos e
delimita suas diferenças fundamentais:

Se admitirmos que um [Governo Aberto] GA poderia sê-lo sem contar


necessariamente com o auxílio da informática e, simetricamente, um [Governo
Eletrônico] GE poderia não ser necessariamente aberto, estaríamos considerando tipos
de gestão governamental que guardam uma relação nula entre si. Por outro lado, se
considerarmos que as TICs são um auxiliar inestimável de um GA, o GE seria um
componente indispensável do primeiro. De outro modo o GA seria um fim enquanto
o GE seria um meio ou, em qualquer caso, um deles. Nenhum destes juízos implica
uma relação de subalternidade entre um e outro. Ambos se propõe melhorar o
desempenho do setor público, simplificar sua gestão e facilitar a vinculação entre
estado e cidadania. Se existe alguma diferença fundamental entre GA e GE é que,
enquanto o GE aspira um efetivo manejo tecnológico da gestão estatal, o GA está
realizando tímidos avanços para a instauração de um modelo de organização social
onde a velha matriz estadocêntrica está se transmutando em uma matriz sóciocêntrica.
(Tradução nossa)

O conceito apresentado não corresponde a uma simples questão de reforma da burocracia estatal
mas mostra que o Governo Aberto está relacionado à mudança da democracia representativa
em direção à uma democracia participativa (CALDERÓN, 2012; OSZLAK, 2016). Ainda “o
governo aberto transcende o governo eletrônico em um aspecto crucial: enquanto o governo
eletrônico é uma questão de gestão, o governo aberto é uma questão de poder” (OSZLAK, 2016,
p. 34).

Quando se fala em Governo Aberto, contudo, faz-se referência a um conjunto de princípios


relacionados à melhoria dos níveis de transparência, à tornar mais fácil e simples a participação
cidadã e no favorecimento da geração de espaços de colaboração entre os diversos atores para
concepção conjunta e coprodução de valor público (RAMÍREZ-ALUJAS, 2012). Todas as
definições coincidem no estabelecimento de uma relação mais estreita entre o estado e os
93

cidadãos onde, além da transparência, a participação e a colaboração agregam duas dimensões


fundamentais ao conceito (CONCHA; NASER, 2012). A figura nº 9 apresenta todos estes
elementos.

Figura 9 Elementos de um Governo Aberto

Fonte: Adaptado de (TRIVIÑO, 2016)

Para Tristão (2002, p. 1) a transparência é “a democratização do acesso às informações, em


contraposição ao sigilo das mesmas”. De forma geral pode-se colocar que um governo
transparente é aquele que franqueia a informação pública e dá a conhecer tudo o que faz, fez e
fará (REIS; ARAÚJO; SAMPAIO, 2015). A disponibilização e uso de Dados Governamentais
Abertos, desta forma, pode resultar em maior quantidade e qualidade de informações sobre o
Governo bem como contribuir para a educação democrática no sentido de que é papel do
cidadão a monitorização das políticas públicas.

Governos Abertos também podem ser pensados pela ótica da gestão social, que caracteriza-se
pelo comando da razão comunicativa, pelo agir comunicativo; enfatiza a ação gerencial
dialógica, participativa; o processo decisório é exercido por meio dos diferentes sujeitos sociais;
baseada no entendimento mútuo entre os atores/sujeitos, na harmonização interna dos planos
de ação pelos atores; exige a presença do discurso argumentativo sujeito às três pretensões de
validade: veracidade, correção normativa e autenticidade; e a atuação dos atores com base na
cidadania deliberativa (ALLEBRANDT et al., 2016).
94

O conceito de gestão social também está associado à cidadania deliberativa, na qual o processo
participativo de deliberação ocorre baseado essencialmente no entendimento (e não no
convencimento ou negociação) entre as partes e o procedimento da prática da cidadania
deliberativa na Esfera Pública é a participação. O propósito do Interesse Bem Compreendido
(CANÇADO; PEREIRA; TENÓRIO, 2015), pode ser obtido pelo incremento da transparência
e pela existência de dados e informações para construção dos argumentos necessários ao seu
entendimento e convencimento de outros ou de si mesmos. Uma das bases da gestão social é a
tomada de decisão coletiva. A transparência surge como condição necessária para as outras
características, pois o segredo e a assimetria de informação tornam inviável a tomada de decisão
coletiva baseada no entendimento esclarecido (CANÇADO; TENÓRIO; PEREIRA, 2011).

Para Allebrandt e Prediger (2016, p. 6):

A gestão social se funda, assim, na democratização das relações sociais, na construção


da cidadania. Institui, enquanto construção conceitual e enquanto práxis social, um
novo quadro de relações que se estabelecem na sociedade. Na gestão social requer-se
a substituição do enfoque estadocêntrico e/ou mercadocêntrico, por um enfoque
sociocêntrico, onde a sociedade civil aparece como sujeito do processo. Isso requer a
construção de um novo triângulo social, no qual a sociedade civil passa a ocupar uma
posição de destaque, em que a cidadania emerge como protagonista no processo
dessas novas relações. A gestão pública e a gestão do desenvolvimento constituem-se
em locus privilegiado, em espaço público para a prática da gestão social.

Não se pode pensar a gestão social do desenvolvimento local/regional sem articular os conceitos
de participação, cidadania, democracia e descentralização, já que os mesmos estão imbricados
nas práticas sociais desenvolvidas tanto pelos governos como pela sociedade civil. Assim,
desconsiderar um deles ou tomar um pelo outro pode gerar entendimentos parciais
(ALLEBRANDT et al., 2016).

A participação da sociedade no planejamento, nas ações e na avaliação dos governos é uma


forma de aproximação. Garcia (2014, p. 75) coloca que

[...] toda estrutura de informação é uma estrutura de poder. A hierarquia inerente a


qualquer estrutura de poder cria uma pirâmide informacional de forma que os setores
mais distantes da cúpula são ao mesmo tempo os mais alijados de informações e da
tomada de decisões (Tradução nossa).

Deste modo as estratégias que visam o incremento da transparência via disponibilização de


dados para a sociedade também contribuem para uma maior participação da mesma. Garcia
(2014, p. 76) continua dizendo que:
95

A sociedade descobriu a possibilidade de desenvolvimento de projetos colaborativos


em grande escala, baseados na participação de um elevado número de indivíduos e
organizações que atuam em conjunto, porém de maneira descentralizada, para
conseguir um objetivo (Tradução nossa).

A gestão pública participativa deve considerar um novo desenho a partir da universalização das
Tecnologias de Informação e Comunicação entre a população, governo e organizações. Novos
canais de comunicação, bidirecionais e independentes, ultrapassam as barreiras dos meios de
comunicação tradicionais. Garcia (2014, p. 80) complementa:

Quem sabe pela primeira vez a cidadania dispõe de vias de comunicação e diálogo
que lhe permite organizar-se e expressar seus argumentos para poder ser ouvida como
um corpo único por parte das elites governantes, reduzindo as assimetrias
informativas e integrando-a ainda mais na estrutura de poder das sociedades
democráticas (Tradução nossa).

Linders (2012) apresenta uma tipologia dos relacionamentos entre cidadãos e governos
facilitados pelas TICs a partir de revisão da literatura que envolve as coproduções com os
cidadãos, governança colaborativa, parcerias público-privada, ações coletivas, dentre outras. O
resultado deste trabalho foi o agrupamento destes tipos de participação em três categorias:

− Origem no cidadão (Cidadão para Governo) – As ações visam provocar e auxiliar o


governo a ser mais responsivo e efetivo. Os cidadãos influenciam os rumos e objetivos,
aumentam a percepção do governo em relação ao contexto além de auxiliar a execução
de serviços no dia a dia;

− Governo como plataforma (Governo para Cidadão) – O quase inexistente custo


marginal para disseminação de dados e serviços baseados nas TICs capacita o governo
a estender estes serviços e informações para a população. Esta alternativa pode auxiliar
no aumento de produtividade dos cidadãos, na tomada de decisões e no bem-estar
reduzindo a necessidade de intervenção governamental;

− Governe você mesmo (Cidadão para Cidadão) – A auto-organização da sociedade pode


abrir uma série de oportunidades para coproduções que envolvam os cidadãos
apresentando-se como um substituto das tradicionais responsabilidades
governamentais.
96

A participação cidadã nos assuntos públicos é resultado de governos participativos, isto é, que
promovem o direto dos cidadãos de participar ativamente na formulação de políticas públicas
além de contribuir com a administração pública com conhecimento, ideias e experiências. Os
governos devem mobilizar a sociedade para que participação e contribuição ao
desenvolvimento de uma governança mais responsiva (CRUZ-RUBIO, 2015; RAMÍREZ-
ALUJAS, 2012).

Arnstein, citado por Calderón (2012, p. 34) define que a participação cidadã se constitui em um
elemento de redistribuição do poder. Assim, além do começo e do final do processo político o
cidadão pode-se constituir no próprio poder.

3.3 CARACTERÍSTICAS E PRINCÍPIOS DOS DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS

Uma referência frequente e que, possivelmente, marca um dos momentos iniciais do movimento
de dados abertos foi um encontro realizado em Sebastopol, Califórnia, em dezembro de 2007.
O objetivo do encontro foi debater e desenvolver o entendimento de por que os dados abertos
são essenciais. Para os pesquisadores, pensadores e ativistas participantes22 do encontro

a internet é o espaço público do mundo moderno e, por meio dele, os governos tem a
oportunidade de melhor entender as necessidades de seus cidadãos e os cidadãos
podem participar de forma mais completa em seus governos. A informação torna-se
um bem mais valorizado quando é compartilhada e menos valiosa quando é guardada.
Os dados abertos promovem mais debate cívico, melhor bem-estar público e um uso
mais inteligente dos recursos públicos. (TAUBERER, 2017) (Tradução nossa)

No encontro em Sebastopol foram estabelecidos um conjunto de princípios fundamentais para


a abertura dos dados governamentais. O respeito a estes princípios pode tornar os governos
mais efetivos, transparentes e relevantes para a vida dos cidadãos de suas comunidades. O portal
opengovdata.org (TAUBERER, 2017) apresenta os 8 princípios inicialmente estabelecidos:

22
O encontro realizado nos dias 7 e 8 de dezembro de 2007 reuniu cerca de 30 participantes que são oriundos,
principalmente, de movimentos culturais e de software livre. Dentre eles podem ser citados Tim O'Reilly e
Lawrence Lessig. O'Reilly, autor e editor americano, é o criador de muitos movimentos de vanguarda na
computação e na Internet, como exemplos a definição e popularização de expressões como o código aberto e Web
2.0. Lawrence Lessig é professor de Direito da Universidade de Stanford (Califórnia) e fundador da Creative
Commons, padrão de licenças com base na ideia de copyleft e divulgação gratuita de conhecimento. (CHIGNARD,
2013)
97

− Completos - Todos os dados públicos são disponibilizados. Dados públicos são dados
que não se submetem a limitações válidas de privacidade, de segurança ou de privilégio;

− Primários - Os dados são coletados na sua fonte, com o maior nível possível de
granularidade, não estando em formas agregadas ou modificadas;

− Atualizados - Os dados são disponibilizados tão rápido quanto seja necessário para
preservar seu valor;

− Acessíveis - Os dados estão disponíveis para o maior escopo possível de usuários e para
o maior escopo possível de finalidades;

− Legíveis por máquina - Os dados estão razoavelmente estruturados para permitir


processamento automatizado;

− Não-discriminatórios - Os dados estão disponíveis para todos, sem necessidade de


registro para acessá-los;

− Não-proprietários - Os dados são disponibilizados num formato sobre o qual nenhuma


entidade tem controle exclusivo;

− Livres de licenças - Os dados não estão sujeitos a nenhuma forma de direito autoral,
patente, propriedade intelectual ou segredo industrial. Restrições razoáveis de
privacidade, de segurança e de privilégio podem ser permitidas.

A este conjunto inicial outros 7 princípios foram acrescentados pela observação do trabalho
realizado por diversas organizações (TAUBERER, 2017):

− Livres e on-line – A informação não é verdadeiramente pública se não estiver disponível


na internet, encontrável, e sem custos ou, pelo menos, ao custo de reprodução da mesma;

− Permanentes – Os dados devem estar disponíveis indefinidamente, em endereços e


formatos estáveis por tanto tempo quanto possível;
98

− Confiáveis – Os dados devem ser autênticos e íntegros e, sempre que possível,


acompanhados de mecanismos que garantam estas propriedades;

− Dados abertos por padrão – Toda informação pública é considerada apta a ser
disponibilizada a menos que instrumentos legais digam especificamente o contrário;

− Documentados – Os dados devem ser descritos em relação ao seu significado e formato


de forma a torná-los úteis;

− Segurança – Os dados devem ser disponibilizados em formatos que não coloquem em


risco a integridade dos usuários;

− Projetados com participação dos usuários – A comunidade, usuários destes dados,


devem participar do processo de disponibilização dos dados.

O ativista e pesquisador canadense David Eaves, na Conferência para Parlamentares –


Transparência na era digital (EAVES, 2009) apresentou as suas três leis para Dados
Governamentais Abertos:

a. Se o dado não pode ser encontrado e indexado na web, ele não existe. Encontrar
dados abertos unicamente pelo acesso aos portais especializados não é suficiente.
Deve ser possível encontrar dados por meio de ferramentas de buscas na internet
como o Google23 e o Bing24, por exemplo.

b. Se não estiver aberto e disponível em formato compreensível por máquina, ele não
pode ser reaproveitado. Dados abertos são, necessariamente, processados por meio
de programas de computador. Assim devem estar dispostos de forma estruturada e
suas especificações e documentações também deverão ser livremente acessadas.

23
O Google é o site de pesquisa na internet mais utilizado no mundo. É desenvolvido pela empresa de mesmo
nome.
24
O Bing é um site de pesquisa na internet desenvolvido pela Microsoft.
99

c. Se algum dispositivo legal não permitir sua replicação, ele não é útil. Os dados
devem estar sob licença aberta ou não proprietária, do contrário os resultados de seu
processamento não poderão ser compartilhados.

Para Garcia (2014) a simples disponibilização de dados pode não provocar uma melhora
instantânea na gestão pública. O autor faz algumas observações sobre a abertura de dados e
considera importante:

− Oportunidade – Os dados devem estar disponíveis no momento adequado, pelo canal


apropriado;

− Diversidade de opinião – Os indivíduos devem formar um juízo próprio sobre a


problemática em estudo;

− Independência – As opiniões dos indivíduos não devem ser afetadas pelas opiniões dos
demais;

− Competência – Os resultados permitirão desacordo e rivalidade entre ideias;

− Descentralização – Os dados devem permitir que os indivíduos enfoquem sua análise


em problemas locais;

− Economicidade – Um excesso de comunicação implicará em custos de transação que


reduzirão o rendimento do grupo;

− Agregação – Devem existir ferramentas que permitam converter as opiniões e propostas


em ações coletivas.

Estas leis, princípios e recomendações apresentadas tem sofrido algumas considerações em


diversos trabalhos de pesquisa. Estas análises não se dão em relação ao conteúdo, ou a
pertinência, de cada um dos princípios, ou lei, mas sim pela desclassificação sumária de
algumas iniciativas de abertura de dados por um ente público qualquer, por não atender a um
ou mais destes critérios. Neste momento, principalmente pela necessidade evidente de que mais
100

administrações públicas disponibilizem seus dados, é importante uma relativização nestas


análises.

3.4 A CARTA INTERNACIONAL DE DADOS ABERTOS

Um segundo conjunto de princípios foi estabelecido a partir de julho de 2013. Nesta ocasião os
líderes do G825 assinaram a Carta de Dados Abertos do G8 a qual continha uma ideia inicial de
cinco princípios de dados abertos fundamentais. A estes países se somaram outros tantos de
forma que, acompanhados de um grupo de organizações e especialistas, expandiram a proposta
inicial estabelecendo então 6 princípios gerais sobre a abertura de dados governamentais
(OPEN DATA CHARTER, 2020).

− Abertos por padrão. Esta é uma mudança concreta na forma como os governos atuam e
como se relacionam com os cidadãos. Dados abertos por padrão (Open By Default)
significa uma presunção de publicação para todos. Inverte-se todo o processo com a
necessidade de justificativas para dados mantidos fechados, por exemplo, por razões de
segurança ou proteção de dados.

− Oportunos e abrangentes. Dados abertos só são úteis e capazes de gerar valor se forem
relevantes. Tão importante quanto o fornecimento de dados em sua forma original e não
modificados, ou tratados, a obtenção de informações atualizadas rapidamente e de forma
abrangente é fundamental para seu real aproveitamento.

− Acessíveis e utilizáveis. Os dados devem ser facilmente localizáveis e aptos para leitura,
e processamento por máquinas além, é claro, de estarem sob licenças que permitam sua
reutilização.

− Comparáveis e interoperáveis. É necessário explorar o efeito multiplicador dos dados.


Um número crescente de conjuntos de dados disponibilizados em formatos padrões, e

25
A sigla G-8 corresponde ao grupo dos 8 países mais ricos e influentes do mundo. Fazem parte os Estados Unidos,
Japão, Alemanha, Canadá, França, Itália, Reino Unido e Rússia
101

não proprietários, simplifica o desenvolvimento de aplicações e projetam maiores


possibilidades de relacionamentos entre estes dados.

− Contribuir para uma melhor governança e engajamento dos cidadãos. Os dados abertos
podem permitir que os cidadãos, e mesmo os integrantes dos governos, tenham uma
ideia melhor do que funcionários públicos e políticos estão fazendo.

− Contribuir para o desenvolvimento inclusivo e inovação. Os dados abertos podem


estimular o desenvolvimento econômico inclusivo. Muitas vezes os dados abertos são
olhados apenas como um elemento que melhora o desempenho do governo, mas há uma
gama de possibilidades econômicas que podem ser atingidas a partir do oferecimento
de Dados Governamentais Abertos.

Esta lista de princípios, combinados, pode de acordo com os membros do Open Data Charter
estimular a transparência pública, responsabilizando os governos e melhorando os serviços
públicos. Pode contribuir, também, para o desenvolvimento econômico inclusivo e inovações,
por meio de empreendimentos que sejam rentabilizados pelas suas atividades envolvendo dados
abertos (OPEN DATA CHARTER, 2020).

Estes princípios são compartilhados, atualmente, por 73 governos nacionais e 53 organizações


que trabalham para incrementar a abertura de dados governamentais. Este aumento significativo
no número de países ocorreu a partir do ano de 2016 quando outros governos, nacionais e
subnacionais, e organizações adotaram e endossaram a Carta. É importante ressaltar que o
Brasil não faz parte do grupo de países signatários (OPEN DATA CHARTER, 2020).

De forma geral os princípios estabelecidos na Carta Internacional de Dados Abertos, com


exceção do primeiro, pouco diferem daqueles definidos inicialmente em Sebastopol. Referem-
se a atributos ou qualidades tantos dos dados, individualmente e em seus conjuntos, quanto dos
processos e meios para disponibilizá-los. A recomendação de abertura de dados por padrão,
entretanto, aponta para a definição, e adoção, de políticas positivas atribuindo aos governos um
papel com maior efetividade no contexto dos dados abertos.
102

3.5 A PUBLICAÇÃO DE DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS

A exemplo das ações envolvendo a transparência pública os entes públicos têm, na maior parte
dos casos, disponibilizado dados abertos por meio de portais específicos na internet. Em alguns
casos, quando da não existência de um portal de dados abertos, empregam o portal da
transparência ou seu portal principal para tal função (FGV, 2015). Uma observação que pode
ser feita em tais situações é a de que a localização e o entendimento sobre os dados
disponibilizados podem ser, à primeira vista, mais complexos.

O Brasil iniciou a criação de um portal de dados abertos26 a partir do ano de 2012. Diversas
unidades da federação também possuem o seu portal como é o caso do Estado do Rio Grande
do Sul. O portal funciona como um grande catálogo que facilita a busca e uso de dados
publicados pelos órgãos do governo. Deste modo o portal apenas indexa os conjuntos de dados
disponíveis, centralizando as buscas, e remete para o endereço do órgão que o disponibiliza. No
caso do Governo Brasileiro o portal faz parte da chamada Infraestrutura Nacional de Dados
Abertos instituída pela Instrução Normativa Nº 4 de 12 de abril de 2012 a qual contempla “um
conjunto de padrões, tecnologias, procedimentos e mecanismos de controle necessários para
atender às condições de disseminação e compartilhamento de dados e informações públicas no
modelo de Dados Abertos” (MPOG, 2012). O portal mantém ainda, em formato wiki27, um
conjunto de informações e orientações sobre os conceitos envolvidos28.

Estes portais, normalmente, não hospedam os dados propriamente ditos. Normalmente


apresentam-se como diretórios exibindo links ou instruções para a obtenção dos dados abertos.
Referem-se, também, aos dados abertos disponibilizados como “Conjuntos de Dados”. Para o
portal de dados abertos do Governo Federal “os dados catalogados no portal estão organizados
utilizando as estruturas de conjuntos de dados e recursos. Os conjuntos de dados são as
entidades principais retornadas a partir das buscas. Cada conjunto de dados possui uma

26
http://dados.gov.br/
27
Os sites Wiki adotaram este nome a partir de um dos primeiros sites da internet denominado de WikiWikiWeb
cujas iniciais são idênticas à World Wide Web (WWW) e também a partir da palavra Havaiana Wiki que significa
rápido.
28
http://wiki.dados.gov.br/
103

descrição, um ou mais recursos, e uma série de outros metadados, como periodicidade de


atualização e órgão responsável.” (BRASIL, 2019)

A publicação de dados abertos deve, evidentemente, estar atenta e alinhada às leis e princípios
estabelecidos, além da legislação específica à qual o ente público está submetido. No caso
brasileiro, no âmbito do Governo Federal, a Cartilha Técnica para Publicação de Dados Abertos
(MPOG, 2011) publicada pelo Ministério de Planejamento, Orçamento e Gestão (MPOG)
apresenta uma lista de elementos que devem ser respeitados e/ou observados na publicação de
dados abertos:

1. Os dados devem estar em seu formato mais bruto possível, ou seja, antes de qualquer
cruzamento ou agregação. Mesmo que o órgão ou entidade ache importante e já tenha
publicado alguma visão de agregação desses dados, existe grande valor no dado
desagregado. Dessa forma o órgão ou entidade pode publicar esses dados nas duas
formas;

2. Os dados devem estar em formato aberto, não proprietário, estável e de amplo uso;

3. Não deve existir nenhum instrumento jurídico que impeça sua reutilização e
redistribuição por qualquer parte da sociedade;

4. Para os dados que são estruturados ou estão em planilhas na sua fonte, deve-se preservar
ao máximo a estrutura original;

5. É recomendável a disponibilização dos dados em diversos formatos;

6. Cada conjunto de dados deve possuir um identificador único e persistente, seguindo


uma padronização de URL29. Esse requisito é imprescindível para que esse conjunto de
dados seja referenciável e eventualmente consumido automaticamente por um
aplicativo;

29
URL é uma sigla correspondente a Uniform Resource Locator ou Localizador Uniforme de Recursos. Um URL
identifica um endereço na rede (por exemplo a internet) no qual se localiza algum recurso de informática.
104

7. É recomendável a utilização de considerações semânticas na definição URLs, de forma


que seja possível deduzir o conteúdo de um conjunto de dados apenas lendo seu
identificador;

8. É extremamente desaconselhável a utilização de mecanismos antirrobôs, como


captchas, para acesso aos conjuntos de dados;

9. Considerando que é desejável facilitar a indexação dos dados por motores de busca, uma
importante forma do cidadão encontrar os dados que procura, é recomendável que os
nomes dos arquivos sigam as boas práticas de formação de um slug30;

10. Cada conjunto de dados deve ter informações sobre seus dados e metadados. Deve ser
possível recuperar o significado dos dados;

11. Para conjunto de dados muito grandes, recomenda-se a divisão em conjuntos menores,
permitindo uma fácil manipulação. Recomenda-se fazer a divisão pela dimensão
temporal (ano ou mês), pela dimensão geográfica (estado ou município), ou por outra
dimensão;

12. É desejável que o repositório dos dados possibilite a composição de filtros dentro da
URL, seguindo algum padrão de API31, permitindo que o usuário restrinja o volume dos
dados para aqueles que ele deseja.

Estas recomendações, e apesar de muitas serem de caráter eminentemente técnicas, são


significativas para facilitar o processo de localização, identificação e manipulação destes dados
pela sociedade. Elas podem ser sintetizadas, de acordo com Ferreyra (2012), em um conjunto
de condições relacionadas à portabilidade pois permitem a utilização de diferentes aplicações e
estruturas de informática, por diferentes comunidades e práticas, além de utilização para
propósitos diversos.

30
Slug é parte de um URL que pode ser legível tanto por humanos quanto por computadores, no caso, mecanismos
de buscas. URLs com estas características são denominados de URLs amigáveis.
31
É a sigla para Application Programming Interface. É um conjunto de rotinas e padrões de programação para
acesso a aplicativos de software ou plataforma baseada na web.
105

Um recurso, ou fonte de dados, está associado à forma de acesso aos dados disponibilizados.
Em parte dos portais observados estão disponíveis API’s32, ou webservices33, que podem ser
usados pelos aplicativos que consomem estes dados, para acesso direto às bases onde os dados
estão armazenados. Estes aplicativos, via de regra, apresentam informações em tempo real e
com maior nível de atualização dos dados.

De outro modo a quase totalidade dos portais de dados abertos oferecem seus dados sob forma
de arquivos a serem baixados pela internet. Estes arquivos podem estar em formatos
compatíveis com aplicativos normalmente utilizados, tal como as planilhas eletrônicas, ou em
outros formatos que necessitarão do desenvolvimento de programas específicos para o seu
tratamento.

Um exemplo que não atende aos requisitos estabelecidos são os arquivos em formato PDF34.
Dentre as suas finalidades não está a possibilidade (pelo menos de forma simples e eficiente)
de ser acessado por um programa de computador qualquer de forma que os dados nele
armazenados possam ser extraídos e novos resultados e informações sejam produzidos. Em
outras situações o desenvolvimento de um programa de computador que acesse e extraia dados
de uma planilha eletrônica EXCEL, por exemplo, é totalmente viável e razoavelmente simples.
Este formato, entretanto, é proprietário e exige pagamento de licenças para sua utilização, o que
também implica em quebra dos requisitos fundamentais. Por outro lado, uma planilha
EXCEL35, ou algum outro software semelhante como por exemplo o Libreoffice CALC36, ou
ainda um Sistema Gerenciador de Banco de Dados (usados nos sistemas informatizados das
organizações) podem estruturar e exportar dados em formatos abertos como XML (eXtensible
Markup Language), JSON (JavaScript Object Notation) e CSV (Comma Separated Values), ou

32
API – Application Programming Interface corresponde a um conjunto de rotinas e padrões para acesso a
aplicativos ou plataformas baseadas na internet.
33
Webservices – conjunto de métodos invocados por programas de computador utilizando a tecnologia web. São
usados para transferência de dados permitindo a integração entre sistemas e compatibilidade de aplicações.
34
PDF (Portable Document Format) é um formato de arquivo desenvolvido pela Adobe e com padrões mantidos
pela International Organization of Standardization (ISO). É empregado para exibir e compartilhar documentos de
forma independente do software que os criou.
35
EXCEL – Planilha eletrônica desenvolvida pela Microsoft
36
O LibreOffice CALC – Planilha eletrônica de uso livre o código aberto desenvolvido pela The Document
Foundation, organização sem fins lucrativos. Disponível em https://www.libreoffice.org/
106

ainda API’s (Application Programming Interface) podem ser disponibilizadas de forma que
programas desenvolvidos pelos cidadãos possam ter acesso aos dados governamentais.

Estes diversos formatos para estruturação de dados abertos podem ser melhor compreendidos
por meio de um exemplo hipotético. A figura nº 10 apresenta um relatório extraído de um
conjunto de dados fictícios de uma instituição qualquer.

Figura 10 Exemplo de um relatório


Relação de servidores
Função Setor Salário
Operador Obras 998,00
Professor Educação 2.994,00
Secretário Educação 1.497,00
Fonte: Dados fictícios

O aplicativo que produziu este relatório pode ter obtido os dados sob diferentes formas. Um
primeiro modelo é a estruturação destes dados em formato XML que é derivada de um formato
padrão antigo, denominado de SGML37, e que também deu origem ao HTML38. É totalmente
baseado em texto e tem como objetivo fundamental a simplicidade e expansibilidade para a
representação de informações estruturadas. O XML é um dos formatos mais utilizados para o
compartilhamento de informações estruturadas hoje entre programas e entre computadores,
tanto localmente quanto na internet. (W3C, 2019) A figura nº 11 mostra uma possível
estruturação em XML dos dados apresentados no relatório da figura nº 10.

37
SGML consiste na Linguagem de Marcação Generalizada Padrão (em inglês Standard Generalized Markup
Language) e foi definida pela norma ISO8879. É uma linguagem para definir linguagens de marcação cujo
principal exemplo e a linguagem HTML.
38
HTML (HyperText Markup Language) é uma linguagem de marcação, derivada do padrão SGML, e sobre a
qual são construídos os sites na internet.
107

Figura 11 Exemplo de arquivo XML

Fonte: Elaborado pelo autor (Dados fictícios)

Os arquivos em formato CSV são mais antigos e também foram projetados para troca de dados
entre aplicações distintas. Sua estrutura segue um formato sequencial, linear e sem o emprego
de qualquer tipo de marcador. Cada linha do arquivo corresponde a um registro e, dentro desta,
as colunas são separadas por um carácter qualquer. Normalmente são empregados os caracteres
ponto e vírgula (;), vírgula (,) ou a marca de tabulação (obtida pela tecla TAB do teclado). São
muito úteis para grandes quantidades de dados, mas, devido à sua estruturação, são de difícil
legibilidade por seres humanos e qualquer omissão ou equívoco em uma linha pode impedir a
correta interpretação da mesma. (FERNANDES; CORDEIRO, 2016) A figura nº 12 mostra
uma possível estruturação em formato CSV, usando o ponto e vírgula como separador, dos
dados apresentados no relatório da figura nº 10.

Figura 12 Exemplo de arquivo em formato CSV

Fonte: Elaborado pelo autor (Dados fictícios)

O formato JSON compreende, também, uma formatação de arquivos para troca de dados entre
aplicativos, principalmente na internet. Apresenta muitas semelhanças com o formato XML,
mas sua notação é diferente. Sua principal vantagem reside no fato de que o tamanho dos
108

arquivos gerados é menor em relação aos arquivos XML pois seus marcadores são mais
simples. (FERNANDES; CORDEIRO, 2016) A figura nº 13 mostra uma possível estruturação
em formato JSON dos dados apresentados no relatório da figura nº 10.

Figura 13 Exemplo de arquivo JSON

Fonte: Elaborado pelo autor (Dados fictícios)

Diferentemente dos modelos anteriores, uma API constitui uma forma de comunicação direta e
on-line entre duas aplicações computacionais. De outra forma uma API pressupõe a
disponibilidade de um conjunto de rotinas e padrões estabelecidos por um software para a
utilização das suas funcionalidades por outros softwares. Este conceito, assim, é simplesmente
uma forma de comunicação entre sistemas. Elas permitem a integração entre dois aplicativos,
em que um deles fornece informações e serviços que podem ser utilizados pelo outro, sem a
necessidade de o software que consome a API conhecer detalhes de implementação do software
que fornece os dados. (FERNANDES; CORDEIRO, 2016)

3.6 UTILIZAÇÃO DE DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS

O Governo Basco especifica em seu portal de dados abertos (IREKIA, 2010) que

a informação, da mesma forma que outros insumos ou matérias primas, é um bem que
é necessário processar, em torno do qual se pode criar valor econômico e de cuja
escassez se derivam relações assimétricas de poder. (Tradução nossa).

Davies (2010), por sua vez, complementa dizendo que os dados não são apenas para
desenvolvedores pois qualquer cidadão, com qualquer software que lhe for familiar e adequado
aos objetivos propostos, pode produzir relatórios ou analisar os dados para tomada de decisão.
Para Davies, ainda, os dados abertos provocam mudanças no papel dos atores cívicos ao
109

elaborarem sua própria representação e interpretação dos dados. Finalmente o oferecimento de


dados abertos pode produzir inovações no setor público como resultado do trabalho de
empreendedores sociais e comerciais.

O percurso dos dados governamentais abertos, desde a sua disponibilização até a sua efetiva
apropriação, tanto pela sociedade quanto pelo próprio governo, constitui uma verdadeira cadeia
de valor, com benefícios monetários e econômicos e, principalmente, sociais e de melhorias na
governança dos entes públicos. No primeiro caso porque permitem a geração de renda por meio
da comercialização das análises, resultados e aplicativos desenvolvidos com e para os dados
governamentais, o que não infringe nenhum conceito ou princípio em relação aos dados
governamentais abertos. No aspecto social uma suposição é que contribuem para um auto
empoderamento do cidadão, resultando em um maior engajamento e participação cidadão nos
assuntos públicos. Na área governamental, finalmente, são muitos os benefícios que podem
advir pelo caminho da disponibilização de dados governamentais abertos. O tratamento dos
dados abertos, não apenas pelo próprio governo, pode proporcionar informações distintas
daquelas costumeiramente empregadas como também contribuir para uma nova geração de
servidores públicos além de fomentar a colaboração entre setores distintos do governo
(UBALDI, 2013).

Esta cadeia de valor tem como ponto significativo o processo pelo qual os Dados
Governamentais Abertos são manipulados e processados pela comunidade de usuários. Este
processamento, por um lado, pode ser realizado por meio de aplicativos computacionais de uso
generalizado e já existentes como por exemplo os softwares estatísticos e as planilhas
eletrônicas. Estas situações normalmente buscam responder a questões específicas, em
trabalhos acadêmicos ou de pesquisa, de cidadãos, pesquisadores ou de organizações civis. Os
resultados destas pesquisas, certamente, constituirão relatórios e documentos que serão
apresentados à sociedade podendo contribuir, desta forma, com a melhoria dos processos de
transparência pública ao complementar as informações já disponibilizadas pelos governos.

De outra forma tem-se o desenvolvimento de aplicativos computacionais específicos e que


abordam questões pontuais. A sociedade, ao usar estes aplicativos, pode obter novas
informações ou, até mesmo, visões distintas sobre fatos já apresentados pelo governo. O
desenvolvimento destes aplicativos geralmente é resultado da participação e colaboração de
uma nova parcela da sociedade, denominada de “hackers cívicos”. Os profissionais da área de
110

informática, os elementos da sociedade capazes de programar computadores, são fundamentais


neste processo. É imprescindível, evidentemente, o engajamento destes cidadãos.

A forma como estes aplicativos são apresentados depende do ambiente operacional onde serão
executados. O maior número deles são direcionados aos smartphones, independente de seus
sistemas operacionais, pois atingem um maior contingente de usuários devido à facilidade de
acesso a estes dispositivos. Outra modalidade refere-se à disponibilização de sites na internet
onde, com uma linguagem visual mais aprimorada, permitem maior interatividade e facilidade
de leitura das informações apresentadas. Uma terceira alternativa são os programas para
computadores tradicionais e que, devido às características destes equipamentos, representam
uma parcela muito pequena dos aplicativos disponíveis.

Os Dados Governamentais Abertos podem ser usados para muitas finalidades. Davies
(DAVIES, 2010), ao analisar o portal de dados abertos do Governo da Austrália, apresenta
cinco diferentes processos pelos quais estes dados podem ser submetidos quando obtidos pela
sociedade. Estes processos e os elementos que os constituem, são:

− Dados para fatos – Processos podem pesquisar, navegar e extrair elementos referentes
a fatos específicos;

− Dados para informações – Processos podem manipular dados, analisar estatisticamente,


promover a contextualização e a visualização, além de produzir relatórios envolvendo
um ou mais conjunto de dados;

− Dados para interfaces – Processos podem permitir o acesso e a exploração interativa de


um ou mais conjunto de dados, por meio de diferentes interfaces;

− Dados para dados – Processos podem permitir o download de dados submetidos à


conversão de formatos, filtragens e combinações com outros conjuntos de dados;

− Dados para serviços – Novos serviços, de parte do poder público ou da própria


sociedade, podem ser oferecidos para esta mesma comunidade.
111

A criação destes processos, ou aplicações, são resultado de um modelo de crowdsourcing39 e


ocorrem na própria sociedade. Para Bonina (2015) estas práticas efetivam-se a partir de atores
externos ao poder público (Desenvolvedores de software, organizações da sociedade civil e
empreendedores), individualmente ou consorciados, e também das próprias agências
governamentais, pois a abertura de dados pode contribuir para o surgimento de novas conexões
dentro do próprio governo, antes inexistentes.

Uma terceira forma de criação de valor a partir dos dados abertos dá-se por meio da geração de
alianças entre o governo e os atores externos para a geração de ideias e implementação de
soluções, geralmente materializadas em novos organismos do tipo laboratórios de inovação.
Um exemplo com estas características são os eventos do tipo hackathon ou maratonas de
programação.

3.7 DEMOCRACIA E DADOS ABERTOS EM SÍNTESE

Os portais da transparência constituem a forma tradicional, pela qual, os governos implementam


suas políticas de acesso à informação. Estes instrumentos disponibilizam informações que, via
de regra, são tratadas, consolidadas e apresentadas em linguagem de difícil compreensão para
o cidadão comum. Outra consequência deste modelo é o de tornar complexa, às vezes
impossível, a reutilização destes dados tanto pelos cidadãos quanto por instituições, privadas e
governamentais.

Os Dados Governamentais Abertos representam uma alternativa para que os cidadãos, a


sociedade, as instituições e o próprio governo possam aproveitar estes dados e, sobre eles,
desenvolver ideias, implementar serviços e gerar novos dados e conhecimentos. Estes dados
devem ser disponibilizados gratuitamente, de forma bruta e sem qualquer tipo de tratamento ou
consolidação. Podem, desta forma, serem lidos e descarregados resultando em processos de
reutilização e redistribuição a partir do emprego e desenvolvimento de novos aplicativos
computacionais ou sítios na internet.

39
Palavra inglesa empregada com o significado de contribuição colaborativa ou colaboração coletiva.
112

A disponibilização, o uso e a redistribuição de dados abertos envolvem diversos agentes e


organizações da sociedade:

− Quem produz os dados, normalmente o governo e suas instituições;

− Os intermediários que descarregam estes dados e desenvolvem novas ferramentas para


análise e disseminação das informações; e

− Os usuários que tem acesso a estes novos conhecimentos.

Todos os atores que participam destes processos se envolvem e colaboram na solução de


problemas, na produção de serviços e na implementação de políticas públicas. Estas dinâmicas
são importantíssimas para a democracia e constituem-se, juntamente com a transparência
pública, nos elementos que fundamentam e sustentam os governos abertos.

O movimento para oferecimento de Dados Governamentais Abertos teve início em 2007 e, a


partir de então, diversos ativistas, pesquisadores e organizações estabeleceram princípios e
diretrizes de forma a orientar, regular e incentivar maior participação tanto de entidades
governamentais quanto de ativistas cívicos no oferecimento e na exploração de dados abertos,
respectivamente. Estas orientações podem ser consolidadas em algumas categorias, como
mostra o quadro nº 6.

Quadro 6 Príncipios e recomendações para Dados Governamentais Abertos


Categoria Descrição
Localização e Os dados devem ser localizados facilmente, não apenas por meio dos portais
disponibilização dos específicos, como também pelo uso de buscadores na internet.
dados
Formato dos dados Os dados devem estar dispostos em formatos estruturados, necessariamente
documentados, que possibilitem o seu processamento por meio de programas de
computador. Estes formatos não devem ser de propriedade de nenhuma organização.
Os exemplos mais comuns são dados organizados em arquivos CSV, XML e JSON. Em
outros casos as organizações disponibilizam API´s ou Webservices para acesso direto
ao conjunto de dados.
Qualidade dos dados As instituições governamentais devem adotar a abertura dos dados como política padrão
prevendo-se exceções apenas por questões de sigilo e segurança. Os dados devem ser,
desta forma, completos, primários, sem qualquer tipo de agregação ou seleção e
atualizados.
Liberdade de uso Não deve haver nenhum tipo de limitação, ou restrição, para acesso e uso dos dados
abertos. Devem estar disponíveis para qualquer pessoa e para qualquer finalidade. Deve
ser possível, assim, reutilizar, redistribuir e comercializar os resultados e informações
obtidas com o processamento destes dados.
Fonte: Elaborado pelo autor
113

4 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NA ESFERA LOCAL

Foi no desenrolar do século XX, com a expansão da democracia e do desenvolvimento das


Tecnologias de Comunicação e Informação, que os Estados Nacionais passaram a estabelecer
políticas disciplinando e, principalmente, liberalizando o acesso à informação. Um avanço
ainda mais significativo ocorreu no início do século XXI, notadamente na Europa, muito em
decorrência de critérios e exigências estabelecidas pela União Europeia (FERNÁNDEZ
RAMOS, 2018). A partir da legislação estabelecida os governos passaram a disponibilizar
serviços, normalmente pela internet, para fornecimento de informações tanto de forma ativa
quanto passiva.

Por outro lado, em decorrência de ações e demandas de cidadãos e ativistas cívicos, as


instituições governamentais também tem implementado ações de transparência pública por
meio da disponibilização de Dados Governamentais Abertos. Esta alternativa pressupõe a
participação e a colaboração da sociedade de modo a produzir informações mais simples de
serem assimiladas ou, até mesmo, novos conhecimentos a partir dos dados já utilizados pelo
poder público.

Os diversos níveis de governo (nacional, estadual ou municipal), em grande parte dos países,
desenvolvem ações que lhes concedem transparência em seus atos e, em não tão grande parte
assim, mantém portais específicos para disponibilização de dados abertos. É relativamente
simples obter informações sobre a abrangência e qualidade dos portais relacionados aos
governos regionais e federais, como apresentado na introdução deste trabalho. Para a esfera
local, entretanto, a obtenção de informações estatísticas representa um alto grau de dificuldade.
O número de municipalidades no mundo é um fator que explica tal insucesso. Um segundo
fator é constatação de que não existe uma associação à filosofia de Dados Governamentais
Abertos de forma ampla pelos municípios de qualquer país do mundo.

Algumas instituições produzem instrumentos que permitem acompanhar o estado e a evolução


dos Dados Governamentais Abertos nos diversos níveis de governo e distintos tipos de
organizações públicas. Um destes casos é o Barômetro Open Data produzido pela Fundação
World Wide Web como um trabalho colaborativo da Open Data para o Desenvolvimento de
Rede (OD4D), e
114

[...] tem o objetivo de descobrir a verdadeira prevalência e impacto das iniciativas de


dados abertos em torno do mundo. Ele analisa as tendências globais, e fornece dados
comparativos sobre os países e regiões que utilizam uma metodologia detalhada que
combina dados contextuais, avaliações técnicas e indicadores secundários. (WORLD
WIDE WEB FOUNDATION, 2017)

O barômetro foi produzido, pela primeira vez, no ano de 2013. Outras edições seguiram-se nos
anos de 2015, 2016, 2017 e 2018. A metodologia, com algumas modificações ao longo do
período, considera a avaliação de especialistas, e também dos próprios governos, sobre o
contexto de dados abertos, sua política, implementação e impacto, além da verificação
detalhada sobre a disponibilidade, formato, licenciamento, descoberta e atualidade de 15
diferentes tipos de dados. (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2017, 2018)

A quarta edição foi publicada em 2016 e envolveu 115 países. A figura nº 14 exibe o mapa onde
estes países são mostrados com distinção de cores que correspondem ao índice obtido por cada
nação. Mais significativo, contudo, que um eventual ranqueamento das nações participantes é
a ausência de índices para um número significativo de países. Isto não significa necessariamente
que estes governos não ofereçam Dados Governamentais Abertos, mas que eventualmente, não
estabeleçam políticas que incentivem tal disponibilização.

Figura 14 Países e situação do oferecimento de Dados Governamentais Abertos - 2016

Fonte: Barômetro Open Data (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2017)


115

A quinta edição do indicador, publicada no ano de 2018, denominada de “Edição dos líderes”,
apresenta apenas um conjunto de trinta países. Os resultados, e os países, são divididos em três
grupos. Em um grupo superior estão Canadá, Reino Unido, Austrália, França, Coreia do Sul,
México, Japão e Nova Zelândia. Em um nível intermediário estão Estados Unidos, Alemanha,
Uruguai, Colômbia, Rússia, Brasil, Itália, Índia, Argentina, Ucrânia e Filipinas. No último
grupo estão Chile, Indonésia, África do Sul, Paraguai, China, Costa Rica, Turquia, Panamá,
Guatemala, Arábia Saudita e Serra Leoa. Estas nações, ainda, têm apresentado uma maior
evolução em seus resultados quando comparadas com os demais 85 países avaliados em edições
anteriores (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2018). O estudo mostra, adicionalmente, a
evolução dos países. Àqueles que obtiveram maiores avanços, ao longo dos 5 anos, estão
dispostos no gráfico da figura nº 15.

Figura 15 Países e evolução positiva no oferecimento de dados abertos – 2013 a 2018

Fonte: Barômetro Open Data – Edição dos Líderes (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2018)

No outro extremo encontram-se alguns países que, se não diminuíram os índices de avaliação
obtidos, permaneceram estagnados durante as cinco edições da pesquisa. A figura nº 16
apresenta estes países e as avaliações obtidas. Sobre o Reino Unido verifica-se o fato de que
seu índice em 2018, embora tenha diminuído em relação à 2013, permanece em nível superior
a todos os países apresentados no gráfico da figura nº 15. Sobre os Estados Unidos da América,
além de uma explicação muito próxima à atribuída ao Reino Unido, pesam algumas ações
adotadas pelo governo Trump40 as quais provocaram algumas alterações no relacionamento
envolvendo Dados Governamentais Abertos.

40
Em 2017, quando do início do governo Trump, o site open.whitehouse.gov foi modificado por questões de
segurança. (EAVES; MCGUIRE; CARSON, 2019)
116

Figura 16 Países e evolução negativa no oferecimento de dados abertos – 2013 a 2018

Fonte: Barômetro Open Data – Edição dos Líderes (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2018)

O Brasil situa-se no grupo dos países que exibiram algum nível de progresso pois, entre a
primeira e a última edição do Barômetro Open Data, apresentou uma diferença positiva em seus
indicadores. Na primeira edição, em 2013, o Brasil obteve 35 pontos contra 50 recebidos na
edição de 2017. Apesar desta evolução os resultados intermediários não se mostram tão
animadores visto que em 2014 a avaliação foi de 46 pontos, em 2015 de 52 e em 2016
regredindo para 47 pontos. Esta oscilação, entretanto, é característica de um grande número de
países (WORLD WIDE WEB FOUNDATION, 2017).

Outra instituição que acompanha a evolução dos países é a Open Knowledge International. O
Global Open Data Index é um índice que mede o grau de abertura de 15 conjuntos de dados41
comparando-os com o disposto na definição de dados abertos (OPEN KNOWLEDGE
INTERNATIONAL, 2017b). A edição de 2016 avaliou 94 governos nacionais sendo que
Taiwan, Austrália, Reino Unido, França, Finlândia, Canadá, Noruega e Brasil ocupam as 8
primeiras posições. Um fato a destacar é que, destes países, Taiwan, Finlândia e Noruega sequer
constam da relação produzida pelo Barômetro Open Data. Isto mostra, por um lado, as
diferentes metodologias empregadas pelas instituições, mas também, as dificuldades e o estado
embrionário em que se encontram, tanto os processos de avaliação quanto a disponibilização,
pelos governos, de dados abertos.

41
Estes conjuntos de dados estão relacionados ao orçamento do governo, estatísticas nacionais, compras e
licitações, leis nacionais, limites administrativos, projetos de legislação, qualidade do ar, mapas nacionais, previsão
do tempo, registros de empresas, resultados das eleições, localização, qualidade da água, gastos do governo e
propriedade da terra. (OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017b)
117

4.1 DADOS MUNICIPAIS ABERTOS NO CONTEXTO INTERNACIONAL

Os países do mundo, mesmo aqueles em que seu tamanho geográfico não é significativo,
estabeleceram, ao longo de suas histórias, subdivisões territoriais como forma de descentralizar
e simplificar a administração das coisas públicas (MILL, 1981). Nas democracias isto é
particularmente significativo pois estende, para todos os níveis de governo, as possibilidades
de escolha de seus representantes e do envolvimento e participação dos cidadãos. Bobbio, sobre
a visibilidade e proximidade dos governos, acrescenta:

Ao lado e acima do tema da representação, a teoria do governo democrático


desenvolveu um outro tema estreitamente ligado ao do poder visível: o tema da
descentralização entendida como revalorização da relevância política da periferia com
respeito ao centro. Pode-se interpretar o ideal do governo local como um ideal
inspirado no princípio segundo o qual o poder é tanto mais visível quanto mais
próximo está. De fato, a visibilidade não depende apenas da apresentação em público
de quem está investido do poder, mas também da proximidade espacial entre o
governante e o governado. Mesmo se as comunicações de massa encurtaram as
distâncias entre o eleito e os seus eleitores, o caráter público do parlamento nacional
é indireto, efetuando-se sobretudo através da imprensa, da publicação das atas
parlamentares ou das leis e de outras providências no "Diário Oficial". O caráter
público do governo de um município é mais direto, e é mais direto exatamente porque
é maior a visibilidade dos administradores e das suas decisões. (BOBBIO, 1997b, p.
88)

As funções, as responsabilidades e o status da subdivisão administrativa denominada, no Brasil,


de município podem ser diferentes nos diversos países. As disposições constitucionais de cada
país atribuem aos municípios um conjunto de competências e responsabilidades para a execução
de serviços e estabelecimento de políticas públicas. Um ponto em comum, entretanto, é o fato
de que esta esfera governamental é a mais próxima dos cidadãos que nelas constroem suas
vidas. Esta proximidade, no contexto dos regimes democráticos, torna ainda mais significativas
as ações relacionadas à transparência pública e à participação dos cidadãos.

Contabilizar, no mundo inteiro, o número de governos subnacionais em níveis municipais é


uma tarefa árdua e que demanda considerável esforço de pesquisa. São raras as estatísticas
produzidas por instituições, públicas, privadas ou da sociedade que dedicam alguma atenção a
este fato. Os próprios sítios, na internet, dos governos nacionais dificilmente trazem referência
direta a esta informação.

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) pesquisou, em uma


amostra de 101 países, as estruturas correspondentes aos governos subnacionais. Para a OECD
118

(2016) “um governo subnacional é uma entidade descentralizada eleita através de sufrágio e
que possuí responsabilidades gerais e alguma autonomia no que diz respeito ao orçamento,
pessoal e bens”. Em 100 destes países42, de acordo com a pesquisa para o ano de 2015, foram
encontrados um total de 271.923 governos subnacionais, dos quais 257.428 correspondem ao
nível municipal. Estes números, ainda que parciais, evidenciam outras dificuldades em estudos
relacionados à implementação de serviços, recursos ou políticas públicas nos municípios. Deste
modo as diversas instituições que acompanham o estado e a evolução do oferecimento de dados
abertos, principalmente, geralmente o fazem a nível nacional, estadual ou das capitais regionais.

Muitas das atividades realizadas e controladas pelos municípios produzem dados semelhantes
aos governos estaduais e nacionais. É o caso, por exemplo, do orçamento e sua execução, os
servidores públicos e suas remunerações, dentre outros. Outras iniciativas locais, ao contrário,
geram dados somente existentes ao nível local. O planejamento urbano, na solução de
problemas de trânsito e deslocamento de pessoas, é um exemplo típico desta situação. Dados
abertos, desta forma, não apenas podem contribuir para uma maior transparência públicas como
também oferecer benefícios adicionais aos habitantes das cidades conduzindo para uma melhor
qualidade de vida. (CARRARA et al., 2016)

Este trabalho de pesquisa não localizou estatísticas, envolvendo Dados Governamentais


Abertos, a nível municipal. As pesquisas realizadas por diversos pesquisadores e organizações
concentram em descrever o estado e o progresso de algumas localidades, notadamente as
maiores cidades dos diversos continentes. Um relatório que pode ser destacado foi elaborado
no âmbito do European Data Portal43 e apresenta, em duas partes, a situação em 16 cidades
europeias. Foram avaliadas, num primeiro momento, as cidades de Amsterdã, Barcelona,
Berlim, Copenhague, Londres, Paris, Estocolmo e Viena (CARRARA et al., 2016) e,
posteriormente, as cidades de Dublin, Florença, Gdansk, Ghent, Helsinque, Lisboa, Tessalônica
e Vilnius (BERENDS; CARRARA; VOLLERS, 2017).

42
Os números relativos à Índia, em função de suas magnitudes, foram desconsiderados. Este país apresenta um
total de 250.706 governos subnacionais dos quais 250.671 correspondem aos municípios.
43
O Portal Europeu de Dados Abertos reúne os metadados das informações do setor público disponíveis em portais
de dados públicos em todos os países europeus. As informações relativas ao fornecimento de dados e aos benefícios
da reutilização de dados também estão incluídas. Pode ser acessado em https://www.europeandataportal.eu/
119

Uma característica em comum, embora básica, é que todas estas cidades possuem um portal de
dados abertos. Estes portais, além de publicarem os dados disponíveis, também são utilizados
para divulgação de notícias e eventos e para o relacionamento com os usuários. Estes eventos,
tanto locais quanto nacionais ou internacionais, são organizados para o envolvimento e
conscientização dos usuários, principalmente as universidades e os universitários, bem como o
desenvolvimento de aplicativos que reutilizem os dados disponíveis. (BERENDS; CARRARA;
VOLLERS, 2017; CARRARA et al., 2016)

O início do oferecimento de Dados Governamentais Abertos, em algumas destas cidades


Europeias, foi devido a iniciativas próprias enquanto que, em outras, houve estímulo e
financiamento por parte de projetos específicos da Comunidade Europeia. Boa parte das
cidades, ainda, possuem mecanismos de coordenação à nível nacional e, neste sentido, facilita
a interoperabilidade dos sistemas, compartilha práticas e experiências, além de possibilitar a
superação, de forma mais simplificada, das barreiras que normalmente estão associadas ao
processo de disponibilização de dados abertos, principalmente a barreira técnica. A
coordenação em nível superior é também importante pois pode haver a definição de diretrizes
e abordagens comuns pelos demais entes da administração pública (BERENDS; CARRARA;
VOLLERS, 2017; CARRARA et al., 2016)

As iniciativas de dados abertos nos municípios são muitas vezes parte ou vinculadas a
estratégias mais amplas de cidades digitais ou inteligentes. A cidade de Tessalônica, por
exemplo, implantou postes de iluminação equipados com sensores, os quais fornecem dados
sobre as condições de tráfego e, também, ambientais. Estas tecnologias, relacionas à internet
das coisas (IoT), resultam em uma grande quantidade de dados úteis que podem ser usados para
melhorar a qualidade de vida na cidade e assim impulsionar a disponibilização de dados por
parte do poder público. O gerenciamento de dados precisa ser robusto e focado em estimular a
reutilização desses dados para aproveitar o valor que se encontra dentro deles. (BERENDS;
CARRARA; VOLLERS, 2017; CARRARA et al., 2016)

O Open Data Census, produzido pela Open Knowledge Foundation, apresenta um panorama
referente a cidades da América do Norte. No México, baseado em dados de 2016, são listadas
16 cidades. As melhores avaliações são atribuídas a Monterrey, San Nicolas, Guadalajara, o
Distrito Federal e Puebla. No Canadá são 65 cidades embora o estudo não estabeleça o
ranqueamento entre elas. Nos Estados Unidos da América, com dados do ano de 2018 e ainda
120

não concluído, 266 municípios disponibilizam dados abertos. (OPEN KNOWLEDGE


INTERNATIONAL, 2017c)

Outro trabalho, mais recente, desenvolvido por David Eaves, Ben McGuire e Audrey Carson,
avalia o período de 10 anos desde as primeiras publicações de Dados Governamentais Abertos
nos Estados Unidos da América, Austrália e Nova Zelândia. Os autores destacam que, após um
período inicial onde diversas cidades como Washington (2007), Vancouver (2009), São
Francisco (2009), Nova York (2012) e Chicago (2012) passaram a oferecer dados sob formatos
abertos, e de muitas outras cidades que as seguiram, o estado atual demonstra uma certa
estagnação do seu desenvolvimento. (EAVES; MCGUIRE; CARSON, 2019)

Nos diversos portais do período inicial, principalmente de governos subnacionais, “o principal


objetivo era publicar qualquer coisa, independentemente de ela ser realmente acessada ou não”
(EAVES; MCGUIRE; CARSON, 2019, p. 522, tradução nossa). Este esforço inicial visando
ampliar rapidamente o volume de dados abertos acabou provocando, de forma colateral, a
publicação em formatos não padronizados ou não legíveis por máquinas. A utilização real
destes dados foi afetada em função deste dilema quantidade versus qualidade. Os portais atuais
tem como objetivo principal a maximização do uso, do compartilhamento e das análises sobre
os dados disponíveis.

Para Eaves, Mcguire e Carson (2019) o progresso não acompanhou as expectativas iniciais mas,
por outro lado, muitos casos de sucesso foram constatados. Os atores da sociedade entrevistados
para o trabalho citado acima concordam que a adoção de Dados Governamentais Abertos tem
se espalhado gradualmente, embora de forma irregular, e que alguns benefícios, como por
exemplo uma maior transparência governamental e uma maior eficiência administrativa, foram
produzidos.

Existem algumas referências em relação a municípios na América Latina que possuem ou para
o qual existe alguma intenção ou proposição envolvendo abertura de dados (BONINA, 2015;
DÍAZ et al., 2019; FERNÁNDEZ-RUIZ et al., 2011; GÓMEZ, 2015; HERRERA CÁCERES,
2017; NASER; ROSALES, 2016; OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017c;
PALUMBO, 2014; PATIÑO, 2014; VÁZQUEZ; ZAMORANO, 2017).
121

O trabalho de Nasser e Rosales (2016) apresenta o cenário nos países da América Latina e
Caribe. Relaciona, por um lado, um conjunto de nações onde algumas cidades participam do
movimento para Dados Governamentais Abertos. É o caso da Argentina, Chile, Colômbia,
Costa Rica, Equador, Guatemala, México, Peru e Uruguai. Em alguns casos são,
principalmente, as capitais e grandes cidades. Em outros há uma relação maior de municípios.
Já em outros países, como a Bolívia, El Salvador, Honduras, Nicarágua, Panamá, Paraguai e
República Dominicana, nenhuma municipalidade foi identificada como integrante deste
movimento.

O Open Data Census apresenta uma segunda visão sobre alguns destes países. Na Argentina,
com informações de 2017, são listados 37 municípios onde se destacam, de acordo com o
estudo, a capital Buenos Aires e as cidades de Córdoba, Rio Segundo e Bahia Blanca. No
Equador são apresentadas, além da capital Quito, os municípios de Cuenca, Guayaquil, Loja e
Milagro. No Uruguai, por fim, com dados de 2016, 19 localidades são mostradas, com ênfase
para Montevideo, a capital do país. (OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL, 2017c)

4.2 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NO BRASIL

A Constituição Brasileira de 1988 (BRASIL, 1988) foi inovadora em muitos aspectos. Um


deles, embora aparentemente simples, foi a definição explícita dos entes federativos, integrando
os municípios a esta categoria. Não se trata de uma simples questão de prestígio e sim o fato de
que a própria Carta Magna, complementada em muitas oportunidades pela legislação
infraconstitucional, atribuiu aos municípios ampla autonomia política, administrativa e, ainda
que relativa, financeira.

O Brasil conta atualmente com 5.570 municípios. Segundo as estimativas populacionais para
o ano de 2019 (IBGE, 2019), quase a metade dos municípios (44,02%) tem menos de 10.000
habitantes. Cigolini e Cachatori (2012) e Magalhães (2007) ao abordarem o processo de criação
de municípios nos últimos trinta anos, mostram que grande parte destes pequenos municípios
são resultado da divisão de outros municípios, também com pequeno número de habitantes.

Uma pesquisa realizada pelo Ministério Público Federal (2016), nos anos de 2015 e 2016,
identificou portais da transparência em 5.568 prefeituras municipais o que, praticamente,
equivale ao total de municípios existente no Brasil. Sob este ângulo a Lei Complementar
122

131/2009 (BRASIL, 2009) e Lei de Acesso à Informação (BRASIL, 2011a) cumpriram


integralmente seus objetivos. A comparação entre o período anterior à legislação citada e o de
2015 em diante mostra, por um lado, que os portais de transparência já existentes apresentavam
problemas semelhantes aos atuais e, principalmente, nem todos os municípios possuíam o seu
portal. (JORNAL ESTADO DE MINAS, 2013; MICHENER; CONTRERAS; NISKIER, 2018;
PRADO; GARCIA LOUREIRO, 2006; TRIBUNA DO NORTE, 2012)

Os portais municipais da transparência têm sido estudados sob diversas óticas. Uma delas,
talvez a que predomine entre as demais, é essencialmente quantitativa sendo que as
metodologias empregadas conduzem à construção de índices de transparência e às categorias
onde estes índices se enquadram. Exemplos deste viés são à Escala Brasil Transparente (CGU,
2018), da Controladoria Geral da União, e o Ranking Nacional da Transparência
(MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, 2016), produzido pelo Ministério Público Federal. Estas
pesquisas, entretanto, procuram basicamente verificar o cumprimento da legislação e o
atendimento a questões eminentemente técnicas. Assim podem-se visualizar relatórios e artigos
enaltecendo os excelentes índices obtidos pelos entes públicos.

Outros trabalhos empregam metodologias diferentes, às vezes quantitativas e às vezes


qualitativas, ao avaliarem os portais da transparência. (CEOLIN; ALMEIDA; ALVES, 2015;
COELHO et al., 2018; FIGUEIREDO, VANUZA DA SILVA; GAZONI, 2016; GAMA, 2017;
LUCIANO; WIEDENHÖFT; PINHEIRO DOS SANTOS, 2018; NOCETI, 2019) Estes e
outros trabalhos, via de regra, examinam estes portais fundamentalmente sob o ponto de vista
de uma ferramenta na web, isto é, o grau de acessibilidade, usabilidade, de facilidade de acesso
e outros elementos além do alinhamento dos portais ao cumprimento da legislação. Outros
pesquisadores consideram elementos mais qualitativos sem a preocupação do atendimento às
exigências legais. O espírito presente nas ideias de transparência pública, o uso efetivo das
informações e a compreensão das informações presentes são as principais qualidades, ou
defeitos, dos portais municipais da transparência. (ABDALA; TORRES, 2016; COELHO et
al., 2018; COPETTI; LIBARDONI, 2018)

Os resultados destas pesquisas são, na maioria dos casos, coincidentes. Existem dificuldades de
localização e navegação. Além dos fatores tecnológicos associados às buscas nos portais da
transparência somam-se como dificuldades relacionadas à linguagem e termos empregados nos
portais. Somente estão familiarizados àqueles que, ou trabalham em áreas afins, ou os
123

empregam cotidianamente. Observa-se, adicionalmente, que quando se consegue localizar as


informações desejadas elas, nem sempre, são compreensíveis e podem ser interpretadas
adequadamente pelos cidadãos.

A maior preocupação dos administradores municipais tem sido o estrito cumprimento da


legislação. De acordo com Coelho (COELHO et al., 2018) a transparência significa ir além dos
instrumentos legais, de forma a permitir que os cidadãos possam monitorar e avaliar as ações
dos governos.

4.2.1 Dados municipais abertos no contexto nacional

O Brasil iniciou a criação de um portal de dados abertos a partir do ano de 2012. O portal
(BRASIL, 2019) funciona como um grande catálogo que facilita a busca e uso de dados
publicados pelos órgãos do governo. O portal indexa os conjuntos de dados disponíveis,
centralizando as buscas, e remete para o endereço do órgão que o disponibiliza. No caso do
governo brasileiro o portal faz parte da chamada Infraestrutura Nacional de Dados Abertos,
instituída pela Instrução Normativa nº 4 de 12 de abril de 2012, a qual contempla “um conjunto
de padrões, tecnologias, procedimentos e mecanismos de controle necessários para atender às
condições de disseminação e compartilhamento de dados e informações públicas no modelo de
Dados Abertos” (MPOG, 2012).

O portal apresenta, atualmente, 7.226 conjuntos de dados, oferecidos por 169 órgãos e
instituições ligados tanto ao poder público federal quanto aos demais níveis e esferas de
governos. O Banco Central do Brasil, com 3.104 conjuntos, está no topo desta relação, com
uma distância muito grande dos demais. Estes conjuntos estão distribuídos, pelo menos, em 20
grupos distintos sendo governo e política, saúde, educação, agricultura, economia e Finanças e
meio ambiente os mais populares. O portal oferece, ainda, 32 aplicativos que atuam sobre
alguns dos dados disponíveis no portal sendo a maior parte oferecida pela Câmara dos
Deputados (10), Ministério do Planejamento (6), Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (4) e Ministério da Saúde (3). (BRASIL, 2019)

O cenário nos demais níveis de governo, pelo menos no poder executivo, não é muito promissor.
Uma busca, realizada a partir dos portais principais e dos portais da transparência, abrangendo
o Distrito Federal, os estados e suas capitais, na tentativa de localização do respectivo portal de
124

dados abertos ou, até mesmo, da simples disponibilização de dados abertos, mostra que
praticamente a metade destas unidades federativas não disponibilizam dados abertos, conforme
ilustrado na tabela nº 2.

Tabela 2 Portais de dados abertos. Estados, capitais e Distrito Federal. 2020


Unidades da federação Número Dados abertos %
Estados e Distrito Federal 27 16 55,56
Capitais estaduais 26 11 42,31
Total 53 27 50,94
Fonte: Elaborada pelo autor

Uma informação complementar aos dados apresentados na tabela é o fato de que são
praticamente iguais aos observados pelo autor em novembro de 2018. A única diferença é a
cidade de Macapá, capital do Amapá, que integrou o grupo neste período. Os conjuntos de
dados oferecidos, nestes 27 portais, também permanecem praticamente os mesmos. O estado
do Rio Grande do Sul, por exemplo, passou de 1104 para 1142 conjuntos de dados. Os demais,
de um modo geral, indicam a disponibilidade de um número inferior a uma centena de
conjuntos. Embora não se possa mensurar o número total de conjuntos de dados existentes,
incluindo os não disponibilizados, em cada um destes governos os números apresentados nos
portais são pouco significativos, mesmo naqueles mencionados como destaques.

Algumas das capitais estaduais como Belo Horizonte, Natal, Porto Alegre, Rio de Janeiro,
Salvador, São Paulo, mais a capital federal (Brasília) e a cidade de Uberlândia, em Minas
Gerais, fizeram parte de estudo desenvolvido no âmbito da Open Knowledge Brasil, Open
Knowledge International e Diretoria de Análise de Políticas Públicas (DAPP) da Fundação
Getúlio Vargas (FGV). A pesquisa, executada com a participação de voluntários nestas cidades,
procurou responder à pergunta “como os governos publicam dados abertos?”. Nesta direção
foram avaliadas a existência e a forma como estão disponíveis dados nas categorias de
orçamento público, gastos públicos, compras públicas, resultados eleitorais, registros de
empresas, propriedade da terra, mapas da cidade, limites administrativos, localizações,
estatísticas socioeconômicas, atividade legislativa, leis da cidade, qualidade do ar e da água,
escolas públicas, transporte público e estatísticas de criminalidade. Deve-se salientar que nem
todos estes grupos são de competência exclusiva dos governos municipais, mas foram incluídos
por estarem afeitos às cidades. (RUEDIGER; MAZZOTTE, 2018)
125

A tabela nº 3 mostra os resultados obtidos para as 8 cidades. O índice “% open” demonstra o


percentual dos conjuntos de dados avaliados que atende a todos os critérios da metodologia
empregada na pesquisa e relacionadas ao Open Data Index (ODI). O estudo avaliou 17 bases
de dados em cada cidade totalizando 136 bases de dados em 17 categorias. Destas 136 foram
identificadas 34 bases, que correspondem a 25%, como totalmente abertas.

Tabela 3 Cidades e pontuação – ODI - 2018


Cidade % open
São Paulo 47%
Belo Horizonte 35%
Rio de Janeiro 29%
Brasília 29%
Porto Alegre 23%
Uberlândia 17%
Natal 11%
Salvador 5%
Fonte: (RUEDIGER; MAZZOTTE, 2018)

Dentre os gargalos apresentados dois tipos sobressaíram: a usabilidade dos dados e o processo
de acesso aos dados, com dificuldades de localização e omissão ou ausência de licenças de que
os dados estejam em domínio público, principalmente nas dimensões propriedade da terra,
registro de empresas, qualidade do ar e qualidade da água. Em relação à usabilidade dos dados,
ou capacidade de transformá-los em informação, os problemas mais comuns foram dados
incompletos, desatualizados, em formatos não abertos e dificuldades gerais de trabalhar com
estes dados. No segundo grupo de problemas estão dados com acesso restrito, dificuldades de
localização, impossibilidade de download da base completa e licença não transparente.
(RUEDIGER; MAZZOTTE, 2018)

Para a cidade de São Paulo, detentora do maior índice, o número de bases de dados que atende
a todos os critérios do Open Data Index não atinge à metade. Em números absolutos apenas
“oito dos 17 datasets avaliados para São Paulo atendem a todos os critérios da metodologia,
mas não necessariamente apresentam todas as características”. (RUEDIGER; MAZZOTTE,
2018, p. 43) Nas demais cidades o raciocínio deve ser similar. Isto mostra, entretanto, que
apesar do pequeno número de conjuntos de dados em avaliação muito ainda falta para que os
princípios estabelecidos sejam atendidos. É o caso da cidade de Natal, por exemplo, onde
somente dois conjuntos de dados foram considerados abertos sendo que nenhum deles foi
fornecido pela administração municipal.
126

Existem poucas evidências de que os demais municípios brasileiros, afora as capitais e outros
com grande número de habitantes, disponibilizem dados abertos. Alguns trabalhos ilustram a
atividade em um ou outro município, geralmente as mesmas capitais estaduais ou aqueles de
grande porte. De qualquer forma o que se observa, naqueles que apresentam dados abertos, são
conjuntos de dados pouco numerosos e com atualização irregular. Estes municípios “estão
seguindo uma tendência mundial (de disponibilização de bases de dados on-line) sem ter
claramente definido o objetivo e a motivação institucional deste movimento” (REIS; ARAÚJO;
SAMPAIO, 2015).

4.3 A UTILIZAÇÃO E OS IMPACTOS DOS DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS

O esforço para disponibilização de dados abertos somente adquire significado uma vez que
estes dados sejam utilizados pelos cidadãos e pela sociedade. Um dos desafios, em primeiro
lugar, é a publicação de dados abertos por parte da administração pública o que somente tem
sentido quando um segundo obstáculo, relacionado ao aproveitamento e consumo destes dados,
é superado. A sociedade, deste modo, precisa ser mobilizada e incentivada a conhecer e
compreender, num primeiro momento, e participar nos processos de reutilização dos Dados
Governamentais Abertos.

O impacto que os dados abertos podem provocar, tanto para a sociedade quanto para o governo,
ocorrem, em uma análise imediata, a partir e ao redor dos aplicativos desenvolvidos e análises
promovidas pelos intermediários de dados. A partir dos aplicativos e análises por que é desta
forma que o cidadão comum pode ser beneficiado e ter acesso diferenciado às informações
governamentais. Ao redor dos aplicativos e análises por que as ações de participação e
colaboração dos intermediários de dados resulta em processos inclusivos de atores, e cidadãos,
que normalmente estão alijados dos processos democráticos.

Berends, Carrara e Vollers (2017) definem três formas pelas quais os impactos produzidos pela
disponibilização e uso dos dados abertos podem ser analisados. Os benefícios das políticas de
dados abertos podem ser significativos nas áreas políticas, sociais ou econômicas. Nas duas
primeiras áreas, políticas e sociais, este impacto pode ser um tanto difícil de ser quantificado.
No aspecto social, por exemplo, o uso de dados abertos contribui para a inclusão de grupos
marginalizados na elaboração de políticas e acesso a novos ou melhores serviços
governamentais.
127

Na área política, por seu turno, tem-se a presunção de eficiência, de responsabilidade


administrativa e prestação de contas melhores e mais confiáveis. Relatos de servidores públicos
apontam para melhoria da infraestrutura e da qualidade dos dados nos diferentes níveis de
governo. Assim os dados que os governos detêm e produzem tornam-se melhores e mais
confiáveis sendo oferecidos tanto aos cidadãos quanto para consumo dentro governo.
(BERENDS et al., 2017; BERENDS; CARRARA; VOLLERS, 2017)

Existem estimativas relacionadas aos impactos no campo econômico. Shaw (2018) relaciona
algumas delas:

− Em 2013, a consultoria McKinsey estimava em US$ 3 trilhões anuais o valor potencial


dos dados abertos globais. Na mesma direção, mas para o período de 2016 a 2020, na
União Europeia, está estimado em 325 bilhões de Euros.

− Previsões indicam a criação de 100.000 empregos relacionados à disponibilização e uso


de dados abertos na Europa até 2020.

− Estima-se que a redução de custos para a administração pública na União Europeia, até
2020, seja da ordem de 1.7 bilhões de Euros.

− Os projetos de dados abertos envolvendo a área de transporte, para Londres, tem um


valor estimado em 115 milhões de Libras anuais.

Pode-se observar que os valores monetários apresentados são significativos. Estes, por si só,
consistem em um incentivo muito grande para uma maior participação e envolvimento,
principalmente, de empreendedores e empresas.

O desenvolvimento e a exploração de aplicações computacionais, além das análises pontuais


que se podem realizar sobre os dados, é o modo pelo qual os Dados Governamentais Abertos
podem atender a todas as expectativas que neles são depositadas. Determinar e relacionar os
aplicativos já desenvolvidos, entretanto, é uma tarefa que, embora seja objeto de alguns estudos,
não apresenta referências bibliográficas que as consolidem. Desta forma serão relatados alguns
trabalhos, nacionais e internacionais, que expõe aplicações desenvolvidas sobre dados abertos.
128

Em nível internacional dois exemplos foram escolhidos para ilustrar, principalmente, o número
de aplicativos, sob quais plataformas operam e sobre quais dados atuam. O primeiro é o portal
de dados abertos da União Europeia. Assim como a maioria dos portais de dados abertos, este
portal relaciona aplicativos, de diversas origens e desenvolvedores e que atuam sobre diversas
fontes de dados. Dos 110 aplicativos apresentados 96 são aplicações que são executadas na
web, 12 são aplicativos para smartphones e 2 são programas para computadores tradicionais.
(EU OPEN DATA PORTAL, 2019)

O Linked Data Center (2019) apresenta, em um estudo de caso, aproximadamente 400


aplicações que usam dados abertos do governo Britânico. O gráfico da figura nº 17 exibe a
distribuição destas aplicações nas diversas áreas de atuação. A exemplo dos valores monetários
apresentados acima, predominam as aplicações relacionadas ao transporte público.

Figura 17 Aplicações e áreas de atuação – Dados abertos do Governo Britânico - 2019

Fonte:(LINKED DATA CENTER, 2019)

O mesmo sitio na internet (LINKED DATA CENTER, 2019) exibe, em destaque, 4 destas
aplicações:
129

− Illustreet - Esta aplicação web fornece informações sobre localização de imóveis, para
compra ou aluguel, em qualquer lugar na Inglaterra. A aplicação exibe, sobre um mapa
interativo, as carências, estatísticas criminais, informações sobre educação, meio
ambiente e transporte além de dados censitários relacionados ao local pesquisado. A
página web da aplicação pode ser acessada em https://illustreets.com/.

− Commutable Careers – Aplicação que exibe os empregos disponíveis em uma


determinada região combinando com a disponibilidade e facilidade de acesso por meio
de transporte público. Pode ser acessado em http://yourcommute.co.uk/.

− CrashMap – O site usa dados coletados pela polícia sobre acidentes de trânsito que
ocorrem em estradas britânicas, compilados em um formato fácil de usar mostrando
cada incidente em um mapa. É o único mapa on-line atualizado do banco de dados de
acidentes do Reino Unido e contém mais de um milhão de incidentes. Pode ser acessado
em https://www.crashmap.co.uk/.

− JustPark – A aplicação, disponível tanto na web quanto em smartphones, permite que


motoristas encontrem, de maneira fácil, estacionamento em qualquer lugar do Reino
Unido. Adicionalmente apresenta atrações e curiosidades, como estações, hotéis e as
distâncias a pé correspondentes a esses locais. Pode ser acessado em
https://www.justpark.com/.

No Brasil, somente uma parte dos 28 portais de dados abertos observados44 apresentam, de
forma complementar, aplicativos desenvolvidos, sejam pelo próprio ente público, sejam por
terceiros. A tabela nº 4 resume estas ocorrências.

44
O portal do Distrito Federal, de 15 Estados Brasileiros e de 11 capitais estaduais, conforme o disposto na tabela
nº 1, além do portal de dados abertos do Governo Federal.
130

Tabela 4 Aplicativos disponíveis nos portais de dados abertos Brasileiros - 2019


Portal Aplicativos Outros
Governo Federal 32
Estado do Espírito Santo 11 API´s
Estado do Piauí 5 Webservices
Estado do Rio de Janeiro 1
Estado do Rio Grande do Sul 8
Município de Palmas - TO 4 Webservices
Município do Recife -PE 6
Município do Rio de Janeiro - RJ 5245
Município de Vitória - ES 49 API´s
Fonte: Elaborado pelo autor.

O número de aplicações apresentadas na tabela é aquele declarado pelo respectivo portal. Estas
aplicações, eventualmente, podem não estar disponíveis ou, dependendo da forma como sejam
analisadas, não utilizam dados abertos de acordo com os conceitos e princípios estabelecidos.
Das 32 aplicações relacionadas no portal de dados abertos do Governo Federal (BRASIL, 2019)
nem todas acessam, exclusivamente, os dados disponíveis no próprio portal. Por exemplo:

− Reputação S.A. - Aplicativo para smartphones que, a partir do Cadastro Nacional de


Reclamações Fundamentadas, traz diversas informações sobre as empresas em formato
ilustrativo e intuitivo. Desenvolvido por terceiros.

− Reclamações BR - Aplicativo para smartphones que, a partir do Cadastro Nacional de


Reclamações Fundamentadas, apresenta as informações mais relevantes sobre os grupos
empresariais e uma lista de empresas de cada grupo, incluindo seu CNPJ, Nome
Fantasia e número de reclamações. Desenvolvido por terceiros.

− Para onde foi o meu dinheiro - Aplicativo para smartphones que, a partir do Despesas
diretas do Executivo Federal, demonstra de uma forma gráfica e interativa como
orçamento foi executado, na esfera federal e no estado de São Paulo. Desenvolvido por
terceiros.

− Onde Acontece - Aplicativo para smartphones que, a partir das ocorrências criminais no
estado do Rio Grande do Sul e da malha geométrica dos municípios brasileiros, estimula
a divulgação de dados sobre segurança pública dos estados, município e do país para

45
Este é o número de aplicações declaradas no portal. Existe uma certa dificuldade em classificar as aplicações
listadas neste portal como aplicações que empregam dados abertos.
131

permitir a comparação entre regiões através da análise de índices de ocorrência de crime.


Desenvolvido por terceiros.

− Siga seu vereador - Aplicativo para web que, a partir das votações dos Vereadores da
Câmara Municipal de São Paulo, o site tem como objetivo criar uma plataforma de linha
do tempo com as ações realizadas pelos atuais vereadores. Desenvolvido por terceiros
em um hackathon.

− Basômetro - O Basômetro é uma ferramenta interativa que permite medir o apoio dos
parlamentares ao governo e acompanhar como eles se posicionaram nas votações
legislativas. Desenvolvido por terceiros em um hackathon.

A Prefeitura Municipal do Recife, em seu portal de dados abertos (PREFEITURA DO RECIFE,


2020), oferece 6 aplicativos. Quatro deles, todos desenvolvidos por terceiros, são apresentados
a seguir:

− SetaBus – O aplicativo para smartphone, que utiliza dados de roteiros culturais, turismo
e lazer, é destinado para aqueles cidadãos que tem dificuldade em saber quais são os
pontos de ônibus que seus ônibus param.

− VaiChover! Recife - O aplicativo para smartphone, que utiliza dados de roteiros


culturais, turismo e lazer, alerta a população sobre mudanças climáticas. Entre os
serviços disponibilizados pelo App estão os alertas de chuvas fortes, que poderão ser
consultados através dos dispositivos móveis.

− FreeDA - O aplicativo para smartphone, que utiliza dados de roteiros culturais, turismo
e lazer, contribui com a segurança da mulher em espaços públicos.

− Cidadão Recifense – O aplicativo para smartphone, que utiliza dados de calendário de


vacinação, censo escolar, despesas orçamentárias, rede de educação municipal e rede de
saúde municipal, possibilita um maior acompanhamento do poder público, pela
visualização e controle do orçamento, acessar serviços de localização e visualização de
detalhes das unidades de saúde, clínicas e hospitais próximas ao cidadão.
132

Alguns estudos apresentam números adicionais relacionados aos aplicativos desenvolvidos e


disponibilizados aos cidadãos. Silva e Kerr Pinheiro analisaram 129 aplicativos sendo que, após
exclusão de alguns cuja execução resultou na ocorrência de erros, restaram 83 aplicativos que
foram classificados em “três grandes tipos de aplicativos: os jogos, que possuem uma temática
específica e não demandam de atualizações, os aplicativos que utilizam DGA e os aplicativos
que não utilizam DGA” (SILVA; KERR PINHEIRO, 2019, p. 41). Para as autoras os
aplicativos que utilizam DGA, correspondente a 36% da amostra, estão distribuídos entre as
categorias: Economia e emprego, Cidadania e Justiça, Educação, Turismo, Ciência e
Tecnologia, Governo, Defesa e Segurança.

Um segundo trabalho foi desenvolvido por Moreira (2015). O autor trabalhou a partir dos
aplicativos disponíveis no portal de dados abertos do Governo Brasileiro. Os números
apresentados no trabalho são praticamente os mesmos observados atualmente o que mostra uma
certa estagnação no desenvolvimento de novas aplicações.

4.4 BARREIRAS E DIFICULDADES PARA OS DADOS GOVERNAMENTAIS ABERTOS

O progresso, tanto na disponibilização quanto no uso de Dados Governamentais Abertos,


principalmente os originários de governos locais, tem experimentado níveis menores do que o
esperado pela comunidade de dados abertos (EAVES; MCGUIRE; CARSON, 2019). Alguns
estudos tem relacionado este padrão de crescimento a um conjunto de barreiras e dificuldades
que se apresentam às administrações públicas e à sociedade como um todo. Embora os
conceitos e os princípios que norteiam os Dados Governamentais Abertos sejam os mesmos,
sejam governos nacionais ou locais, são nas cidades em que estes obstáculos se manifestam de
forma mais significativa (BERENDS; CARRARA; VOLLERS, 2017).

Para um relatório produzido no âmbito da União Europeia, analisando os dados abertos, foram
realizadas entrevistas em profundidade com representantes das equipes encarregadas de dados
abertos nas cidades de Dublin, Florença, Gdansk, Ghent, Helsinque, Lisboa, Tessalônica e
Vilnius. Estas entrevistas apontaram motivos que estes especialistas entendiam como causas
deste vagaroso e irregular avanço. A figura nº 18 exibe gráfico elaborado pelos autores do
trabalho categorizando e ordenando estas barreiras.
133

Figura 18 Barreiras no oferecimento de Dados Governamentais Abertos

Fonte: Adaptado de (BERENDS; CARRARA; VOLLERS, 2017)

As dificuldades de ordem técnica foram as mais mencionadas nas respostas das cidades. As
maiores preocupações estão relacionadas à qualidade e atualização dos dados que podem
resultar em conjuntos de dados não corretos e incompletos. Na maioria dos casos os processos
envolvendo disponibilização de dados abertos são realizados manualmente e, deste modo,
sujeitos à qualificação, habilidade e disponibilidade dos servidores encarregados. Um ponto
significativo é a impossibilidade dos atuais sistemas administrativos das administrações
públicas destas localidades não permitirem exportação de dados em formatos abertos e, assim,
tornar este processo automático.

A segunda barreira diz respeito ao conhecimento e conscientização, dos governos e dos


cidadãos, complementadas pelos aspectos jurídicos, sobre o movimento dos Dados
Governamentais Abertos. Nas cidades incluídas no relatório citado, as dificuldades são devidas
tanto ao convencimento dos servidores públicos para divulgação de dados quanto dos cidadãos
sobre o valor representado pelos dados abertos. Outro trabalho, abordando o conhecimento de
cidadãos Colombianos sobre dados abertos, mostram que o baixo nível de conhecimento
observado é mais comum do que se costuma pensar (SAID-HUNG; VALENCIA COBOS;
CANCINO BORBÓN, 2019a).
134

As dificuldades referentes aos aspectos organizacionais das administrações públicas também


foram lembradas. Os governos, notadamente os de níveis locais, possuem limitações
relacionadas à qualificação e capacidade dos recursos humanos existentes e, conjuntamente, na
estrutura tecnológica disponível, conjugada à ausência de sinergia e interoperabilidade entre
setores distintos.

As barreiras de ordem financeiras e políticas foram citadas por poucas cidades. Ao contrário de
outras regiões do mundo, como a América Latina, na Europa há ampla gama de financiamento
tanto a nível nacional como da Comunidade Europeia, para suporte às atividades envolvendo
dados abertos (BERENDS; CARRARA; VOLLERS, 2017).

O desenvolvimento de aplicativos também enfrenta alguns desafios. Para Lee, Almirall e


Wareham (2016, p. 83, tradução nossa) a “adoção, o impacto e a criação de valor de aplicativos
desenvolvidos por meio de dados cívicos abertos foi muito menor do que o previsto”. Estes
autores citam ainda o fato de que nenhum dos aplicativos já desenvolvidos para uso de dados
abertos atingiu a lista dos 100 mais acessados nas lojas de aplicativos.

Algumas razões, na visão dos pesquisadores, podem ser de responsabilidade tanto dos
desenvolvedores quanto dos governos, ou mais especificamente, das agências que coordenam
as atividades envolvendo Dados Governamentais Abertos. O quadro nº 7 resume estes motivos.

Quadro 7 Falhas no desenvolvimento de aplicativos cívicos


Responsabilidade Falha
Desenvolvedores Uso excessivo de conjuntos de dados populares.
Superlotação, com inúmeros aplicativos semelhantes no mesmo espaço de solução
Aplicativos de desenvolvedores com interesses e demografia homogêneos
Aplicativos pré-existentes ajustados para inclusão em concursos de codificação
Governo Prêmio em dinheiro simbólico, insuficiente para operações de aplicativos sustentáveis
de longo prazo
Dados publicados sem alterações comparativas nos serviços da cidade
Adoção limitada e apoio por parte dos governos, com o envolvimento da cidade
terminando na publicação de dados
Resistência à transparência de dados por parte das administrações públicas
Fonte: Adaptado de (LEE; ALMIRALL; WAREHAM, 2016)

A realização de concursos, ou hackathons, constitui-se em uma das principais alternativas para


a motivação e o desenvolvimento de aplicações. Os organizadores, de um modo geral,
entendiam que o prêmio em dinheiro seria um forte motivador para os desenvolvedores. Esta
forma não se mostrou suficiente em função de que, na maioria das vezes, o desenvolvimento
135

de um aplicativo traz consigo uma série de necessidades adicionais relacionadas à sua


manutenção e atualização durante a sua vida útil. O valor simbólico atribuído aos vencedores
destes concursos não considerava estes encargos. (LEE; ALMIRALL; WAREHAM, 2016)

As cidades, por seu turno, pouco fizeram para a divulgação destes aplicativos. Basta ver o
exemplo dos portais brasileiros de dados abertos, citados anteriormente, onde um número muito
pequeno apresenta algumas aplicações. As lojas de aplicativos, adicionalmente, não estruturam
suas categorias para a ordenação destes aplicativos dificultando as buscas por parte dos
cidadãos.

A gestão de iniciativas de dados abertos, incluindo os concursos, foi delegada, geralmente, às


áreas tecnológicas da administração responsáveis pela inovação ou tecnologias de informação.
Os demais setores governamentais, em reflexo à pequena interação com a unidade gestora de
dados abertos, não foram incluídos no processo. Os investimentos foram concentrados em um
único setor bem como as prioridades da maior parte da administração foram desconsideradas.
(LEE; ALMIRALL; WAREHAM, 2016)
136

5 TRANSPARÊNCIA E DADOS ABERTOS NOS MUNICÍPIOS GAÚCHOS

O Estado do Rio Grande do Sul conta, atualmente, com 497 municípios. Este número
corresponde a 8,9% dos municípios Brasileiros e, no Brasil, somente os Estados de Minas
gerais, com 853 municípios, e São Paulo, com 645 municípios, suplantam o estado gaúcho
(IBGE, 2018a). O gráfico da figura nº 19 apresenta o número de municípios do Estado do Rio
Grande do Sul agrupados, em função da data de criação, em diversos períodos ao longo de sua
história.

Figura 19 Número de municípios gaúchos por períodos de criação

Fonte: Adaptado de (SIEDENBERG; BÜTTENBENDER; ALLEBRANDT, 2011)

A evolução do número de municípios, lenta nas fases iniciais, acelerou-se de maneira


exponencial na segunda metade do século XX. Até o ano de 1950 existiam apenas 92
municípios no Estado do Rio Grande do Sul. Este número corresponde a menos de um quinto
dos municípios atualmente existentes. O período seguinte, até o ano de 1975, registra a criação
de 140 novos municípios, quase atingindo a metade do número atual. Os vinte e um anos
seguintes, principalmente em função de novas regras e parâmetros para a criação de municípios,
apresenta um crescimento impressionante ultrapassando o dobro do que havia até 1975. Nos
cinco anos posteriores a 1996 um último grupo com 29 municípios foram criados no Estado.
137

Em 2013, finalmente, a emancipação de Pinto Bandeira cujo processo esteve envolto com
questões judicias durante algum tempo (MUNICÍPIO DE PINTO BANDEIRA, 2017).

5.1 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS E SUAS REGIÕES GEOGRÁFICAS

Existem, no Estado do Rio Grande do Sul, inúmeras formas pelas quais os municípios podem
ser agrupados regionalmente. Basta citar os critérios de regionalização que podem ser
observados em diferentes Secretárias de Estado como a Secretária de Educação e a Secretaria
da Saúde, com suas coordenadorias e a Secretaria de Planejamento com suas Regiões
Funcionais Programáticas. A estes modelos somam-se os de natureza mais genérica como os
produzidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e aquele nascido a partir
da organização da Sociedade como os Conselhos Regionais de Desenvolvimento (Coredes).

O IBGE publicou em 2007 o estudo Região de Influência das Cidades onde caracteriza a
hierarquia dos centros urbanos e a delimitação das regiões de influência associadas a cada uma
destas cidades (IBGE, 2007). Este estudo do IBGE tipifica e enquadra os centros urbanos
brasileiros de acordo com a tabela nº 5.

Tabela 5 Regiões de influência das cidades - 2007 - Cidades por nível e subnível no
Brasil e no Estado do Rio Grande do Sul
Nível Subnível Cidades no Brasil Cidades no Rio Grande
do Sul
Metrópoles Grande metrópole nacional 1 -
Metrópole nacional 2 -
Metrópole 9 1
Capital regional A 11 -
B 20 3
C 39 3
Centro sub-regional A 85 8
B 79 3
Centro de zona A 192 26
B 364 38
Centro local 4473 415
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados em (IBGE, 2007)

Recentemente o IBGE (2017) revisou e atualizou as unidades do território brasileiro,


estabelecendo nova denominação dos recortes regionais e das localidades que os integram.
Assim, para cada unidade da federação, foram estabelecidas as Regiões Geográficas
Intermediárias e Regiões Geográficas Imediatas. As primeiras “correspondem a uma escala
intermediária entre as Unidades da Federação e as Regiões Geográficas Imediatas.
138

Preferencialmente, buscou-se a delimitação das Regiões Geográficas Intermediárias com a


inclusão de Metrópoles ou Capitais Regionais” (IBGE, 2017, p. 19). Para as Regiões
Geográficas Imediatas um dos pontos de partida foi também a Região de Influência das Cidades
(IBGE, 2007), onde cada Região Geográfica Imediata, contivesse ao menos um Centro de Zona
B, além de outros critérios. Para o estado do Rio Grande do Sul a nova organização regional
proposta pelo IBGE (2017) apresenta 8 Regiões Geográficas Intermediárias e 43 Regiões
Geográficas Imediatas. A nomenclatura adotada para estas regiões foi estabelecida “a partir do
polo de maior hierarquia urbana” (IBGE, 2017, p. 34). O mapa apresentando as Regiões
Geográficas Intermediárias está exposto na figura nº 20.

Figura 20 Regiões Geográficas Intermediárias - Estado do Rio Grande do Sul

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de malhas digitais obtidas em (IBGE, 2015)

Os Coredes foram instituídos pela Lei Estadual n° 10.283, de 17 de outubro de 1994, e


regulamentados pelo Decreto n° 35.764, de 28 de dezembro de 1994 (ALLEBRANDT, 2010).
139

O processo inicial de instalação dos Coredes foi concluído em 1996, quanto então existiam 22
conselhos regionais. Uma série de movimentos e ajustes entre os municípios levou, no ano de
2011, aos 28 Coredes atuais (BÜTTENBENDER; SIEDENBERG; ALLEBRANDT, 2011). O
mapa na figura nº 21 exibe estas subdivisões.

Figura 21 Conselhos Regionais de Desenvolvimentos - Rio Grande do Sul

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de malhas digitais obtidas em (IBGE, 2015)

Os dois modelos de regionalização, tanto as Regiões Geográficas Intermediárias quanto os


Coredes, importantes no desenrolar deste trabalho, foram desenvolvidos em momentos e
contextos distintos e por instituições diferentes. A tabela nº 6 mostra, sob dois ângulos diversos,
o número de municípios que formam cada uma das dimensões.

A coincidência mais significativa diz respeito à Região Geográfica Intermediária de Ijuí e os


Coredes Celeiro, Fronteira Noroeste, Missões e Noroeste Colonial. Os 77 municípios desta
região geográfica são os mesmos municípios que formam estes quatro Coredes. As demais
regiões geográficas são formadas por municípios integrantes de Coredes que também
compreendem outras regiões geográficas.

Sob o ponto de vista dos Coredes a grande maioria insere-se integralmente dento de uma única
região geográfica. Os que fogem a esta regra são o Corede Alto da Serra do Botucaraí,
Campanha, Central, Fronteira Oeste, Sul, Vale do Caí, Vale do Rio Pardo e Vale do Taquari.
Em cada um destes Coredes, entretanto, a esmagadora maioria dos municípios permanecem
numa mesma região geográfica.
140

Tabela 6 Municipios por Coredes e Regiões Geográficas Intermediárias

Regiões Geográficas Intermediárias


Caxias Passo Porto Santa Cruz do Santa
Coredes Ijuí Pelotas Uruguaiana Total
do Sul Fundo Alegre Sul - Lajeado Maria
Alto da Serra do
14 2 16
Botucaraí
Alto Jacuí 14 14
Campanha 5 2 7
Campos de Cima da
10 10
Serra
Celeiro 21 21
Central 1 18 19
Centro Sul 17 17
Fronteira Noroeste 20 20
Fronteira Oeste 3 10 13
Hortênsias 7 7
Jacui Centro 7 7
Litoral 21 21
Médio Alto Uruguai 23 23
Metropolitano Delta
10 10
do Jacuí
Missões 25 25
Nordeste 19 19
Noroeste Colonial 11 11
Norte 32 32
Paranhana Encosta
10 10
da Serra
Produção 23 23
Rio da Várzea 17 17
Serra 32 32
Sul 19 2 1 22
Vale do Caí 4 15 19
Vale do Jaguari 9 9
Vale do Rio dos
14 14
Sinos
Vale do Rio Pardo 1 22 23
Vale do Taquari 1 1 34 36
Total 54 77 144 24 90 58 40 10 497
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos em (IBGE, 2017; SIEDENBERG; BÜTTENBENDER;
ALLEBRANDT, 2011)
141

5.2 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS E SUAS CARACTERÍSTICAS

O Estado do Rio Grande do Sul é formado, predominantemente, por pequenos municípios.


Chega-se a esta conclusão ao olhar tanto para as extensões territoriais quanto para o tamanho
populacional de seus municípios. O mapa exposto na figura nº 22 ilustra ambos os aspectos.

Figura 22 Habitantes por municípios - Estado do Rio Grande do Sul - 2019

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de malhas digitais obtidas em (IBGE, 2015) e estimativas populacionais do
IBGE (2019)

Na menor faixa populacional, até 5.000 habitantes, encontram-se 231 municípios. Distribuem-
se em todas as regiões, mas predominam, de forma muito nítida, na metade superior do Estado.
Podem ser observados, inclusive, diversos grupos de pequenos municípios lado a lado. A
segunda faixa, maiores do que 5.000 e menores que 10.000 habitantes, compreende 99
municípios e apresenta um contexto bastante semelhante, com menor intensidade, entretanto.
As duas faixas seguintes, de acima de 20.000 e 50.000 habitantes, contém municípios em todas
as regiões do Estado. Estes municípios chamam a atenção, sobretudo, na metade sul. Isto é
devido, contudo, à maior área territorial ocupada por estas localidades. Finalmente, na última
categoria, os dois maiores municípios do Estado: Caxias do Sul e Porto Alegre. A tabela nº 7
demonstra esta distribuição populacional nas faixas estabelecidas e nas Regiões Geográficas
Intermediárias.
142

Tabela 7 Municípios por faixa populacional e Região Geográfica Intermediária - 2019

Região Geográfica Intermediária


Santa Cruz
Número de Passo Porto Santa
Caxias do Sul Ijuí Pelotas do Sul - Uruguaiana Total
habitantes Fundo Alegre Maria
Lajeado
Até 5.000 28 38 93 4 19 29 18 2 231
De 5.001 a
7 22 25 7 18 10 9 1 99
10.000
De 10.001 a
4 10 13 2 15 7 7 58
20.000
De 20.001 a
11 4 9 7 18 9 3 3 64
50.000
De 50.001 a
3 3 4 4 19 3 3 4 43
500.000
Mais de 500.000 1 1 2
Total 54 77 144 24 90 58 40 10 497
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos em (IBGE, 2017, 2019)

Sob o aspecto territorial é conveniente deslocar o foco para a metade Sul do Estado pois são
nas regiões ali localizadas que se encontram um maior número de grandes municípios. O gráfico
da figura nº 23 apresenta, além da área territorial média em cada região geográfica, o tamanho
dos municípios de acordo com as Regiões Geográficas Intermediárias. O gráfico permite
também um comparativo entre as diferentes regiões.

As regiões se enquadram em dois blocos distintos. Em um lado, aquelas formadas quase que
exclusivamente por municípios com extensão territorial pequena. É o caso das regiões de Caixas
do Sul, Ijuí, Passo Fundo, Porto Alegre e Santa Cruz do Sul – Lajeado. Nestas regiões,
conforme mostram as caixas achatadas no gráfico, não existem grandes diferenças entre os
municípios, apesar da existência de valores atípicos em algumas cidades. Estas mesmas regiões
possuem, ainda, outra característica em comum. As médias aritméticas das áreas municipais,
representadas pelos pontos em vermelho no gráfico, situam-se, quando não no limite superior,
acima do intervalo interquartil.

As três regiões restantes apresentam um comportamento inverso. Seus municípios são maiores,
não apresentam valores fora do normal e suas médias aritméticas encontram-se bastante
próximos à mediana. Observa-se, adicionalmente, que nestas regiões as diferenças entre as
áreas municipais são maiores.
143

Figura 23 Área territorial municipal nas Regiões Geográficas Intermediárias - 2018

Fonte: Elaborado pelo autor a partir de dados obtidos em (IBGE, 2017, 2018b)

5.3 OS MUNICÍPIOS E SEUS PORTAIS NA INTERNET

Os municípios no Estado do Rio Grande do Sul, quando examinados sob a ótica da


transparência pública e das condições, tanto do portal municipal quanto do portal de
transparência, encontram-se em situações bastante semelhantes aos municípios do restante do
país. Alguns estudos (BITTENCOURT; RECK, 2018; BORTULINI, 2016; BROCCO et al.,
2018; KLEIN, 2018; VISENTINI; SANTOS, 2019) realizados em municípios gaúchos
permitem esta inferência. Os municípios do Rio Grande do Sul estão sujeitos à mesma
legislação e submetem-se às mesmas ações de fiscalização e controle por parte dos Tribunais
de Contas e Ministério Público.

Uma explicação para tal conjuntura pode ser buscada a partir de fatores da estrutura, da
organização e dos recursos empregados pelos municípios, principalmente àqueles relacionados
às Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs), servidores públicos, fornecedores e
prestadores de serviços de informática e softwares empregados, tanto nas atividades internas da
administração municipal, quanto os utilizados para os portais municipais, notadamente o portal
da transparência. A investigação relativa a estas informações foi realizada por meio de dois
instrumentos distintos: a verificação direta dos portais municipais na internet e dos portais da
144

transparência dos 497 municípios gaúchos (em abril de 2019) e o envio de questionário para os
gabinetes dos Prefeitos Municipais de todas as localidades do Estado.

Um dos elementos observados nos portais municipais foi o conjunto de funcionalidades,


recursos ou possibilidades oferecidas aos cidadãos que os incentivem e instrumentalizem à
participação e a obtenção de serviços públicos. Os cidadãos podem, além de informar-se,
intervir na administração, na construção e na avaliação de políticas públicas ou no simples ato
de debater sobre assuntos que dizem respeito à comunidade.

Associado ao ponto anterior, a pesquisa procurou verificar se estes portais empregam, ao menos
de forma adicional, uma linguagem capaz de ser assimilada por quem não seja técnico ou
qualificado a compreender os termos e padrões comuns a área fiscal, financeira e contábil.
Também foi importante observar a organização destes portais no que se refere à localização e
apresentação das informações exigidas pelas leis referenciadas no capítulo 2. Assim o acesso
aos portais, por meio da navegação em todo o seu conteúdo, proporcionou uma visão geral,
relativa ao cumprimento da legislação e dos elementos relacionados à transparência pública e
participação popular.

Um terceiro ponto de investigação está relacionado à obtenção de dados em formatos outros


que não apenas informações dispostas em formato textual. No conjunto de instrumentos legais
citados anteriormente encontram-se referências explicitas à possibilidade de manipulação, por
ferramentas computacionais diversas, dos dados de responsabilidade do ente público. O Decreto
nº 7.185, ao regulamentar a Lei Complementar 101, no inciso II do artigo 4º estabelece que o
sistema deve "permitir o armazenamento, a importação e a exportação de dados;" (BRASIL,
2010). Por sua vez a Lei nº 12.527, no artigo 8º, § 3º, incisos II e III, define, respectivamente,
que o portal deve "possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos,
inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto, de modo a facilitar a análise
das informações;" e "possibilitar o acesso automatizado por sistemas externos em formatos
abertos, estruturados e legíveis por máquina" (BRASIL, 2011a).

As respostas para estas questões foram procuradas a partir do site oficial do município e do
portal da transparência. De um modo geral os problemas, ou as virtudes, dos portais são quase
que comuns a todos ou, pelo menos, à maioria deles. Se pode verificar, em todos os municípios,
a divisão das responsabilidades de desenvolvimento do portal municipal e do sistema integrado
145

de administração financeira e controle, onde se encontram as funcionalidades que atendem ao


chamado portal da transparência.

O segundo instrumento consistiu de um questionário46 on-line, cujo endereço de acesso,


individual para cada município, foi enviado por e-mail. O questionário, com suas questões
dispostas no apêndice A, foi respondido por 162 prefeituras municipais embora nem todas o
fizeram de forma completa. As questões submetidas estavam relacionadas à estrutura e
organização das atividades de Tecnologia de Informação (TI), aos sistemas de informação
utilizados pela Prefeitura Municipal, aos diversos portais na internet e às ações relacionadas à
transparência pública, participação popular e oferecimento de dados abertos.

Os resultados e as informações obtidas em ambos os instrumentos de pesquisa serão


apresentados de forma consolidada, em cinco tópicos que abordarão a estrutura interna da
Prefeitura Municipal em relação à tecnologias e sistemas de informação, os portais municipais,
suas origens e os serviços oferecidos pelo município por meio da internet, a percepção dos
administradores em relação às ações de transparência pública e participação popular e,
finalmente, o oferecimento de Dados Governamentais Abertos.

5.3.1 A estrutura de TI e os Sistemas de Informação

Nas respostas ao questionário submetido, 48 prefeituras mostraram a forma como a área de


Tecnologia de Informação está organizada. Em 27 destas cidades o pessoal técnico responsável
pela área de TI está alocado a uma unidade específica. Este órgão, chamado de Centro de
Processamento de Dados (CPD), Departamento de Informática, Departamento de Tecnologia
da Informação, ou outro nome semelhante, é quem desempenha as atividades de manutenção
dos equipamentos, instalação e configuração de softwares além do suporte técnico aos demais
servidores públicos. Estas unidades, na sua quase totalidade, estão alocadas à Secretaria de
Administração.

De outro lado, em 21 Prefeituras Municipais que responderam à questão, as atividades


relacionadas às TIC´s estão dispersas em diversas secretarias ou órgãos do município. Embora

46
O questionário foi elaborado com o auxílio do software Limesurvey, hospedado em servidor contratado para tal
finalidade e com domínio próprio (http://www.reneo.com.br). O Limesurvey pode ser obtido em
https://www.limesurvey.org.
146

o índice de resposta ao questionário não permita nenhuma forma de inferência, este fato pode
ser muito mais comum do que inicialmente se possa concluir. Um estudo desenvolvido por
Brandi e Silva (2018), comparando governança municipal de TI entre municípios Brasileiros e
Portugueses, mostra que 70% dos gestores municipais desconhecem, ou não adotam, qualquer
modelo de governança.

Somente dois dos municípios respondentes relataram o desenvolvimento de softwares por


servidores municipais alocados a esta função. Este número, ressalta-se novamente que não se
pode fazer qualquer ilação categórica, também aponta para o fato de que, usualmente, os
municípios adquirem softwares de terceiros. Além de 37, dos 48, municípios terem especificado
esta alternativa, as observações referentes às origens dos portais municipais, descritas adiante,
permitem esta suposição.

A aquisição de softwares, também, aparenta não seguir qualquer tipo de política ou estratégia
nas prefeituras dos municípios gaúchos. Algumas prefeituras declararam um único fornecedor
para todos os sistemas adquiridos, enquanto outras apresentam uma espécie de “Torre de Babel”
onde cada sistema é fornecido por empresa diferente. Isto permite supor, ainda, a quase que
completa falta de integração e interoperabilidade entre estes softwares. É necessário lembrar,
ainda, que a lógica de aquisição por parte de entes públicos deve seguir os procedimentos
definidos na legislação específica (BRASIL, 2011b), onde via de regra, o critério preponderante
é o menor preço.

5.3.2 O portal municipal na internet

Todos os 497 municípios do Estado do Rio Grande do Sul possuem um sitio oficial na internet
onde divulgam sua estrutura física e administrativa, seus contatos, suas ações e seus eventos.
Em muitas localidades este portal também é usado para o oferecimento de serviços aos
cidadãos. No questionário enviado às prefeituras, 44 delas apontaram alguns serviços que
podem ser realizados ou encaminhados por meio do site municipal. A tabela nº 8 exibe alguns
destes serviços e o número de prefeituras que os oferecem.
147

Tabela 8 Serviços oferecidos pela internet – Prefeituras gaúchas - 2019


Serviços disponibilizados pela internet aos cidadãos Número de portais municipais
Acompanhamento escolar 1
Agenda de projetos 5
Agendamento de consultas 1
Licitações 36
Matricula escolar 1
Ouvidoria 27
Segunda via de boletos (IPTU, ISS, etc.) 14
Solicitação de serviços 18
Fonte: Elaborado pelo autor

Embora os números não representem a totalidade das prefeituras, as maiores incidências foram
obtidas por serviços como ouvidoria e licitações, sobre os quais recaem algumas exigências
legais e que impelem ao seu oferecimento. Na sequência estão as solicitações de serviços aos
órgãos municipais, tais como as solicitações de obras e reparos por parte da municipalidade, e
àqueles associados aos sistemas utilizados internamente, principalmente os relacionados à
tributação municipal, onde é possível a emissão de boletos de pagamento, certidões negativas
e obtenção de documentos.

O desenvolvimento destes portais foi realizado por inúmeras empresas e, em grande parte dos
casos, por servidores da própria administração municipal. Em 41 municípios, entretanto, não
foi possível este reconhecimento, pela ausência de identificação do desenvolvedor no portal e
também no código fonte da página principal. A tabela nº 9 apresenta o resultado da observação
direta nos 497 portais municipais.

Tabela 9 Desenvolvimento dos portais municipais - 2019


Desenvolvedor Número de portais
Servidores públicos municipais 80
Empresa A 45
Empresa B 20
Empresa C 20
Empresa D 19
Empresa E 15
Empresa F 11
Empresa G 11
Outras empresas (107) 235
Sem identificação 41
Total 497
Fonte: Elaborado pelo autor

Em 80 municípios, aproximadamente 16% do total analisado, o desenvolvimento do portal foi


realizado por equipes da própria prefeitura. É um número significativo de municípios, o qual é
explicável pela baixa complexidade técnica envolvida no processo de desenvolvimento da
148

maioria destes portais. Não se investigou a existência, em todas as prefeituras municipais, de


pessoal técnico qualificado em desenvolvimento de software ou páginas na internet, mas em
muitos casos, as observações apontaram o desenvolvimento do portal municipal por servidor
público de forma individual e empregando recursos direcionados à pessoas com pouco
conhecimento e experiência no desenvolvimento de aplicativos computacionais, como o
Joomla47 e o Wordpress48.

A iniciativa privada, em número de 114 empresas, forneceu para as demais 376 localidades.
Esta pulverização é ilustrada pelo fato de que 56 empresas fornecem para apenas uma prefeitura
e outras 22 empresas fornecem para dois municípios. No outro extremo sete destas empresas
devem ser destacadas por concentrarem o desenvolvimento do portal para 141 municípios.
Apenas uma delas forneceu para 45 Prefeituras o que representa quase 10% do total.

Sobre os portais municipais WEGNER, SCHRÖEDER e HOFF afirmam que

[...] os portais analisados, de forma geral, possuem recursos tecnológicos adequados


e boa navegabilidade, todavia carecem de melhorias quanto ao aspecto da
comunicação e da disponibilização de informações, bem como no que diz respeito à
interatividade e à transparência, ao passo que privilegiam ainda um modelo
government-to-citizen, ou seja, meramente o governo como emissor e a sociedade
como receptora passiva. (WEGNER; SCHRÖEDER; HOFF, 2015, p. 218)

A maioria dos portais tem problemas de organização. Estes problemas não se relacionam apenas
aos aspectos referentes ao layout, a acessibilidade, responsividade ou qualquer outro elemento
que caracterize tecnicamente a ferramenta "portal". Referem-se, também, à organização dos
menus, aos links inexistentes ou incorretos, à nomenclatura dos elementos e à eventual confusão
com termos duplicados ou nominados incorretamente.

5.3.3 A transparência pública e o portal da transparência

De que formas os municípios podem ser mais transparentes? Quais os instrumentos que podem
ser empregados para se possa avançar além dos expedientes legais? O questionário submetido

47
O Joomla é um sistema de gerenciamento de conteúdo (CMS), que permite a criação de sites e aplicativos on-
line. Pode ser obtido em https://www.joomla.org/
48
O WordPress é um projeto de código aberto que pode ser usado para criação de sites, blogs ou aplicativos. Pode
ser obtido em https://br.wordpress.org/
149

aos municípios apresentou algumas alternativas, as quais foram selecionadas por 38 prefeituras
respondentes. As que se sobressaem estão apresentadas na tabela nº 10.

Tabela 10 Ferramentas empregadas para transparência nos municípios - 2019


Ferramentas para transparência Número de municípios
Emissoras de rádio 27
Jornais 31
Portal da transparência 35
Portal municipal 30
Redes sociais 28
Serviço de Informações ao Cidadão (LAI) 17
Televisão 4
Fonte: Elaborado pelo autor

Dois destes instrumentos estão diretamente associados às Leis de Responsabilidade Fiscal


(BRASIL, 2000), de Transparência (BRASIL, 2009) e de Acesso à informação (BRASIL,
2011a). O Portal da Transparência e o Serviço de Informações ao Cidadão deveria ser escolhas
óbvias e obrigatórias, mas, mesmo assim, nem todos as assinalaram. As emissoras de rádio,
jornais e televisão são mídias tradicionais e que são empregadas, tradicionalmente, para tornar
público os atos das administrações municipais, o que geralmente significa pura e simples
publicidade. Não houve a verificação, entretanto, para quais ações, com qual linguagem e com
que nível de detalhamento estas notícias são veiculadas.

O portal municipal e as redes sociais são elementos novos no caminho para a transparência
pública. As observações aos portais mostram que o emprego desta alternativa está direcionado
a mera publicidade. O uso das redes sociais, embora o questionário não as tenha discriminado,
é uma alternativa cada vez mais frequente. Estas ferramentas permitem tanto a manifestação do
poder público quanto as dos cidadãos. A questão que surge é de que forma este diálogo é
conduzido ou mediado pela administração municipal e quais as ações que dele resultam.

O portal da transparência é uma exigência legal. Todos os municípios possuem o seu portal,
mas, em função da estrutura e recursos disponíveis, pouquíssimos o desenvolvem. A
observação dos 497 portais de transparência no poder executivo dos municípios do Estado do
Rio Grande do Sul mostra um cenário fortemente concentrado. São apenas 22 empresas
fornecendo para 494 municípios e somente três municípios desenvolvem as próprias
ferramentas. A tabela nº 11 apresenta esta distribuição, exibindo as empresas que fornecem para
mais do que 10 municípios. A concentração é evidente, pois somente 12 empresas são
fornecedoras de portais da transparência para 465 municípios, que correspondem a quase 94%
150

das localidades analisadas. A tabela permite observar, ainda, que uma única empresa está
presente em quase um quarto dos municípios do Estado do Rio Grande do Sul. Esta empresa
juntamente com as três que a seguem desenvolvem os portais de transparência de 308
prefeituras ou 62% dos municípios.

Tabela 11 Origem dos Portais da Transparência nos municípios gaúchos - 2019


Empresa Municípios Percentual
Empresa A 112 22,5%
Empresa B 81 16,3%
Empresa C 72 14,5%
Empresa D 43 8,7%
Empresa E 25 5,0%
Empresa F 24 4,8%
Empresa G 23 4,6%
Empresa H 23 4,6%
Empresa I 23 4,6%
Empresa J 15 3,0%
Empresa K 13 2,6%
Empresa L 11 2,2%
Outras empresas (10) 29 5,8%
Desenvolvimento interno 3 0,6%
Total 497 100%
Fonte: Elaborado pelo autor

Uma constatação imediata é o fato de que os portais da transparência são idênticos em alguns
grupos de municípios. Este fato permite supor que suas funcionalidades e qualidades bem como
suas dificuldades e defeitos, são comuns a diversos municípios. De qualquer forma todos
oferecem praticamente as mesmas funções. Os portais apresentam informações em tempo real
e são relativamente abrangentes em termos do conjunto de informações disponibilizadas. A
grande dificuldade, entretanto, é que por se tratar de uma extensão do mesmo sistema
empregado na administração financeira e fiscal da prefeitura municipal, utiliza uma linguagem
e termos excessivamente técnicos. Não se verificam evidências de qualquer iniciativa que
contemple àquele cidadão não qualificado tecnicamente para esta área do conhecimento.

O padrão, em todos os portais, é a apresentação das informações em páginas HTML49 ou em


formato PDF50. A legislação, entretanto, especifica que os sistemas devem produzir
informações em formatos que possam ser manipulados por outros softwares, sejam de uso
genérico como planilhas eletrônicas e editores de texto, sejam desenvolvidos especialmente

49
HTML – Hyper Text Markup Language. Linguagem de marcação empregada para a construção de páginas na
internet.
50
PDF – Portable Document Format.
151

para alguma análise em particular. Alguns portais permitem, adicionalmente, a exportação em


XML51, o que poderia facilitar o processamento destas informações por outros softwares
desenvolvidos por terceiros. Não anexam, contudo, qualquer documentação ou especificação
dos arquivos gerados, o que, de certa maneira, atrapalha a produção de qualquer aplicação
específica.

As questões envolvendo a transparência pública também podem ser atendidas por meio de
ferramentas relacionadas à Lei de Acesso à Informação (BRASIL, 2011a). As administrações
públicas implantaram portais na internet para viabilizar os pedidos, os atendimentos e os
controles das solicitações de informações. Os números disponíveis são relativos à 34 Prefeituras
municipais que, em resposta ao questionário submetido, informaram a origem deste portal.
Cinco municípios declararam o desenvolvimento desta ferramenta por técnicos da própria
administração enquanto os outros 29 informaram a aquisição deste software.

Um detalhe adicional sobre os portais da LAI consiste da não coincidência entre as empresas
fornecedoras deste portal e àquelas que forneceram os portais da transparência. Embora a
amostra não seja representativa, em 20 prefeituras os fornecedores não foram os mesmos. É
evidente que ambas as ferramentas possuem requisitos distintos e, desta forma, não precisam
estar integradas. Por outro lado, isto aponta para um número grande e distinto de fornecedores
de softwares para uma mesma prefeitura municipal.

5.3.4 A participação cidadã

Na observação dos portais municipais e da transparência também houve a tentativa de


identificação de iniciativas para a participação dos cidadãos. De um modo geral, as
possibilidades oferecidas para tanto quase que inexistem. Pode-se afirmar que todos os sites
apresentam um formulário para a solicitação de informações, provavelmente devido à exigência
legal da Lei de Acesso à Informação (BRASIL, 2011a). Também a quase totalidade dos portais
incluí algum tipo de formulário para contato com o poder público ou a ouvidoria existente.
Outras ferramentas específicas, como enquetes, por exemplo, foram observadas em poucos
municípios.

51
XML - eXtensible Markup Language
152

No questionário enviado aos municípios, 36 prefeituras relataram a forma pela qual permitem
e incentivam a participação dos cidadãos. A tabela nº 12 apresenta a síntese das alternativas
apontadas.

Tabela 12 Ferramentas oferecidas para participação – Prefeituras gaúchas - 2019


Serviços disponibilizados pela internet aos cidadãos Número de portais municipais
Emissoras de rádio 17
Enquete de projetos 2
Jornais 17
Ouvidoria 27
Pesquisa de opinião 8
Portal da transparência 25
Portal municipal 24
Redes sociais 31
Serviço de Informações ao Cidadão (LAI) 16
Televisão 4
Fonte: Elaborado pelo autor

O emprego das redes sociais foi o item assinalado por um maior número de prefeituras. Não
houve, no questionário, a discriminação individual das diversas redes existentes e nem
investigações, ou análises, do conteúdo dos diálogos realizados nestes instrumentos. O próximo
capítulo, entretanto, incluirá análises produzidas a partir da percepção dos agentes públicos
sobre a importância e efetividade das redes sociais nos processos de participação e transparência
pública.

A ouvidoria municipal é o segundo item mais escolhido nas respostas ao questionário. Este
instrumento não faz parte das obrigações definidas nas Leis de Transparência (BRASIL, 2009)
e de Acesso à Informação (BRASIL, 2011a) e só recentemente passou a ser obrigatório para
todos os entes públicos, em qualquer nível e esfera governamental. A Lei nº 13.460 disciplina
a “participação, proteção e defesa dos direitos do usuário dos serviços públicos da
administração pública” (BRASIL, 2017). Embora a participação faça parte dos objetivos da lei,
os serviços de ouvidoria tradicionalmente existem para reclamações ou denúncias envolvendo
fatos específicos.

As enquetes e pesquisas de opinião caracterizam, de fato, mecanismos para a participação


popular. Foram poucas as prefeituras, entretanto, que declararam o uso destas alternativas, o
que está alinhado às observações realizadas sobre os portais municipais na internet. São muito
poucas as possibilidades de que os debates sobre projetos e políticas públicas ocorram com o
emprego destas formas de participação.
153

Os dois últimos grupos constituem alternativas onde os municípios possuem pouco poder de
escolha. As ferramentas definidas nas Leis de transparência (BRASIL, 2009) e de Acesso à
informação (BRASIL, 2011a), além do próprio portal municipal, são apontadas por muitos
municípios mas, não incorporam funcionalidades voltadas à participação popular. São citadas,
por fim, àquelas mídias tradicionais como emissoras de rádio, televisão e jornais. Estas mídias
caracterizam, contudo, formas de comunicação unidirecionais onde, praticamente, não existem
possibilidades de interação, com exceção, talvez, do rádio onde, eventualmente, os cidadãos
podem se manifestar.

5.3.5 Os dados abertos

O menor índice de respostas, no questionário enviado aos municípios, foi ao grupo de questões
relacionadas ao tema dados abertos. A primeira questão indagava o nível de conhecimento do
respondente sobre o assunto. As respostas são apresentadas na tabela nº 13.

Tabela 13 Conhecimento sobre dados abertos - 2019


Nível de conhecimento Número de respostas
Não conhece 16
Conhece superficialmente 10
Conhece profundamente 3
Total 29
Fonte: Elaborado pelo autor

Os números mostram, num primeiro momento, o grau de desconhecimento em relação ao tema


pois, mais da metade dos respondentes (55,2%) disseram não ter conhecimento algum sobre
dados abertos. Embora a resposta “Conhece superficialmente” não apresente nenhuma
graduação intermediária, quando somada com a primeira alternativa representam a quase
totalidade das respostas. O baixo nível de conhecimento pode ser confirmado com o número de
respondentes à terceira alternativa onde afirmam possuir conhecimento profundo sobre o
assunto. Estes mesmos respondentes também relataram o oferecimento de dados abertos por
parte da Prefeitura Municipal em que trabalha. Este fato, contudo, não foi confirmado em uma
observação direta ao portal municipal e ao portal da transparência.

A questão sobre o oferecimento de dados abertos foi respondida por 21 municípios. Em 15


deles a resposta foi negativa, embora 4 municípios apontaram que o assunto está na agenda de
discussões. As seis prefeituras restantes responderam afirmativamente e disponibilizam dados
154

abertos em seus portais municipais e da transparência. Esta informação foi confrontada com as
observações diretas realizadas aos portais municipais sendo que, em nenhuma destas
localidades, foi encontrada qualquer referência ao tema dados abertos.

As questões apresentadas acima e as respectivas respostas, principalmente a quantidade delas,


impedem conclusões imediatas, mas pode-se supor uma imprecisão em relação aos conceitos
que envolvem os Dados Governamentais Abertos. Embora os portais de transparência destes
municípios permitam a exportação de dados, até em formatos abertos, diversos princípios não
são respeitados, principalmente os que se referem à granularidade e ao fato de que estes dados
já se encontram processados.

A observação realizada sobre os portais, municipal e da transparência, na tentativa de


localização de portais específicos de dados abertos, ou de outros locais que os disponibilizem,
resultou em quase que completa negação. Mesmo assim três situações distintas foram
encontradas. A primeira delas, e que abrange a quase totalidade do Estado, é a mesma descrita
anteriormente. Os municípios possuem tão somente o portal da transparência onde, na melhor
das hipóteses, pode-se, após a realização de uma consulta qualquer, exportar estes dados para
formatos que permitem a sua reutilização. É preciso salientar, novamente, que estas
funcionalidades não podem ser confundidas com os Dados Governamentais Abertos.

O segundo grupo de municípios, em número de 23, cujo portal da transparência tem origem no
mesmo fornecedor, permitem o acesso às suas bases de dados por meio de uma API52. Estes
municípios não implantaram um portal específico para dados abertos e nem há um destaque
expressivo para esta possibilidade, mas, o conceito e os princípios que regem os dados abertos
são, geralmente, respeitados. Por outro lado, não foram realizados testes, com o
desenvolvimento de aplicações, de acesso a esta API e nem foram localizadas estatísticas de
uso da mesma. Estes municípios53, juntamente com a localização da sede da empresa que
fornece o portal da transparência, estão ilustrados na figura nº 24.

52
API – Application Programming Interface corresponde a um conjunto de rotinas e padrões para acesso a
aplicativos ou plataformas baseadas na internet.
53
Os 23 municípios são: Ajuricaba, Almirante Tamandaré do Sul, Camargo, Casca, Caseiros, Colorado, David
Canabarro, Gentil, Guabiju, Itapuca, Montauri, Nicolau Vergueiro, Nova Alvorada, Nova Araçá, Paraí, Protásio
Alves, Santo Antônio do Palma, São Domingos do Sul, São Jorge, São Valentim do Sul, União da Serra, Vanini e
Vila Maria.
155

Figura 24 Municípios gaúchos com dados abertos - 2019

Fonte: Elaborado pelo autor. Malhas digitais obtidas em (IBGE, 2015)

Três destes municípios responderam o questionário encaminhado. Não se manifestaram,


entretanto, sobre o oferecimento de dados abertos. Este fato, desta forma, não parece ter sido
intencional e, aparentemente, trata-se de uma simples coincidência. O mapa da figura nº 24
mostra claramente a proximidade dos municípios clientes com a sede da empresa. Este e muitos
outros aspectos conduziram o processo licitatório para aquisição destes softwares. A empresa,
quando entrevistada, declarou ser de sua iniciativa esta funcionalidade oferecendo-a juntamente
com os demais recursos existentes.

O último grupo compreende apenas dois municípios. As prefeituras municipais de Porto Alegre
e Pelotas mantém um portal específico e disponibilizam dados governamentais abertos. O portal
de dados abertos da cidade de Porto Alegre disponibiliza 33 conjuntos de dados originários de
diversos órgãos, secretarias e empresas municipais, nas áreas de administração e finanças,
mobilidade, saúde, serviços urbanos, meio ambiente, indústria e comércio e educação. O portal
está sob a responsabilidade da Secretaria Municipal de Transparência e Controladoria.

O portal de dados abertos do município de Pelotas, no momento da realização deste trabalho,


estava em manutenção e, deste modo, não foi possível qualquer consideração sobre o mesmo.
156

Este fato indica, pelo menos, a intenção para a disponibilização de dados abertos e o
funcionamento efetivo do portal, pelo menos no passado.

Foram poucas as respostas dos municípios quando questionados das razões do não oferecimento
de Dados Governamentais Abertos. As mais comuns estão relacionadas à motivos já abordados
anteriormente: o desconhecimento do assunto e a disponibilidade de estrutura e recursos
humanos qualificados para tal atividade. A questão envolvendo os recursos humanos é,
possivelmente, o mais difícil de ser superado em função do tamanho dos municípios e das
limitações financeiras a que normalmente estão submetidos.

5.4 OS MUNICÍPIOS GAÚCHOS EM SÍNTESE

O Rio Grande do Sul é dividido em 497 municípios. São, na sua maioria, municípios com
pequena extensão territorial, população reduzida e localizados na metade norte do Estado.
Aproximadamente 55% dos municípios gaúchos situam-se nas regiões geográficas
intermediárias de Caxias do Sul, Ijuí e Passo Fundo. Nestas três regiões no mínimo a metade
de seus integrantes tem até 5.000 habitantes. Este fato é mais significativo na região geográfica
intermediária de Passo Fundo onde quase 65% das localidades não atingem este número de
habitantes.

Uma segunda característica da maior parte dos municípios gaúchos é a pequena extensão
territorial. Esta particularidade, aliada à população reduzida, produz reflexos nas estruturas
administrativas dos municípios afetando, notadamente, as atividades relacionadas às
Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs). Os municípios empregam poucos
servidores públicos e têm dificuldade de acesso à fornecedores e prestadores de serviços de
informática. São poucas as alternativas para desenvolvimento e aquisição de softwares tanto os
utilizados nas atividades internas da administração municipal, como àqueles empregados nos
portais municipais, notadamente o portal da transparência.

O quadro nº 8 exibe distintos cenários nos municípios do Estado do Rio Grande do Sul. Estes
elementos foram obtidos com o emprego de dois instrumentos distintos. O primeiro foi um
questionário on-line enviado às 497 administrações municipais e respondido por,
aproximadamente, um terço destas prefeituras. O segundo instrumento consistiu na observação
157

direta, tanto dos portais municipais quanto dos portais da transparência, em cada um dos
municípios.

Quadro 8 Os municípios gaúchos e as TICs


Estrutura municipal Descrição
A estrutura de TI Alguns municípios possuem uma unidade que centraliza as atividades de
informática. Em outros a estrutura de TI se repete em diversas secretarias ou
unidades administrativas. Em todo caso não se verificam políticas voltadas à
governança da área de TI.
Sistemas de Informação Os municípios, praticamente, não desenvolvem softwares. Adquirem
softwares de terceiros, sendo que, na maior parte dos casos, de empresas
diferentes resultando em problemas de interoperabilidade.
O portal municipal na internet Usado para divulgação da estrutura física e administrativa, dos contatos, das
ações e dos eventos realizados pelos municípios. O portal, em boa parte dos
municípios, também é usado para o oferecimento de serviços aos cidadãos.
Em 80 municípios gaúchos os portais foram desenvolvidos por servidores
públicos.
Em 41 municípios não foi possível localizar a procedência da ferramenta.
Os portais dos demais municípios foram desenvolvidos por 114 empresas
distintas.
A transparência pública Os municípios empregam diversos instrumentos para ações de transparência:
as mídias tradicionais (emissoras de rádio e jornais), mídias digitais (redes
sociais) e as ferramentas determinadas pela legislação (Portal da transparência
e Serviço de Informações ao Cidadão)
O portal da transparência Somente três municípios desenvolveram o portal da transparência. Os demais
adquiriram de empresas especializadas. São apenas 22 empresas atuando
nestes 494 municípios. Uma destas empresas fornece o seu produto para 112
municípios.
O portal da transparência geralmente está vinculado aos demais sistemas
administrativos. Como consequência utilizam linguagem e termos
excessivamente técnicos.
A participação cidadã Os portais municipais não oferecem possibilidades para participação dos
cidadãos.
Alguns municípios declaram empregar as redes sociais para atividades
participativas. Por outro lado, em função da ausência de recursos humanos,
não monitoram e nem encaminham as interações dos cidadãos.
Os municípios usam os serviços de ouvidoria para participação dos cidadãos.
Os dados abertos O conhecimento sobre dados abertos é praticamente nulo.
Poucos municípios oferecem dados abertos. Um grupo de 23 localidades que
disponibilizam API para acesso aos dados brutos, com origem no mesmo
fornecedor, não tem ciência deste fato.
Somente dois municípios possuem um portal de dados abertos.
Fonte: Elaborado pelo autor
158

6 TRANSPARÊNCIA, PARTICIPAÇÃO E DADOS ABERTOS: ANÁLISE A PARTIR


DA PERCEPÇÃO DE AGENTES PÚBLICOS, TÉCNICOS E ATORES SOCIAIS

Esta pesquisa buscou identificar as razões, principalmente àquelas de ordem política,


administrativa e tecnológicas, pelas quais tão poucos municípios oferecem acesso a seus dados
de forma aberta. Para compreender os processos que implicam na disponibilização de dados
públicos, na transparência governamental e na participação cidadã, a pesquisa teve por locus
diferentes espaços públicos, diferentes sujeitos e diversos instrumentos de pesquisa como uma
tentativa de captar distintas visões e facetas relacionadas ao tema em foco.

6.1 OS SUJEITOS, A COLETA E A ANÁLISE DOS DADOS DA PESQUISA

Este trabalho de pesquisa, embora tenha a pretensão de que seus resultados possam ser também
considerados em todos os municípios Brasileiros, esteve circunscrito ao Estado do Rio Grande
do Sul. As justificativas são, evidentemente, aquelas normalmente utilizadas nas situações em
que os recursos são extremamente escassos. No caso específico desta pesquisa o recurso mais
limitado está relacionado à figura do autor, executor individual do projeto.

Mesmo com este recorte, reduzido em relação ao território nacional, foi necessário a condução
de um processo de amostragem, a qual, mesmo não sendo probabilista, procurou abranger
diversas localidades, com características diversas e, principalmente, a identificação de pessoas
em cargos ou funções alinhadas às questões levantadas pelo projeto de pesquisa.

Esta seção, desta forma, descreve este processo de escolha das localidades e a caracterização
das pessoas entrevistadas. Apresenta, ainda, além das categorias e critérios de análise
empregadas e definidas a partir dos fundamentos teóricos apresentados nos capítulos iniciais
deste trabalho, a forma pela qual as análises destas entrevistas foram conduzidas.

6.1.1 O Universo e os locus da Pesquisa

Para a realização da pesquisa, tanto a aplicação das entrevistas em profundidade quanto dos
questionários on-line, foram considerados cenários distintos e relacionados com o tema em
questão. Desta forma os municípios do Estado do Rio Grande do Sul, as empresas
desenvolvedoras de software para a área pública, os Conselhos Regionais de Desenvolvimento
159

e as instituições de ensino superior, por meio de seus cursos de graduação, compreendem os


locais para identificação e contato com os sujeitos de pesquisa.

a) Municípios do Estado do Rio Grande do Sul

O Estado do Rio Grande do Sul, dividido territorialmente em 497 municípios, foi a área
geográfica delimitada para o trabalho de pesquisa. Considerou-se que a realização de entrevistas
em profundidade, envolvendo diversos atores, em todas estas localidades era uma tarefa
impossível de ser realizada no contexto deste trabalho. A realização das entrevistas em
profundidade, envolvendo os Prefeitos Municipais, Presidentes de Câmaras de Vereadores,
Servidores municipais e representantes do Ministério Público, exigiram a constituição de um
espaço amostral o qual, pelas características da pesquisa, foi não probabilístico e intencional.

O critério inicial neste processo de escolha dos municípios foi a definição de estratos, ou grupos,
de municípios. Empregou-se, para esta finalidade, as formas de regionalização descritas
anteriormente. Os dois critérios iniciais foram as Regiões Geográficas Intermediárias e as
Regiões de Influência das Cidades, ambas estabelecidas pelo IBGE e, adicionalmente, os
Conselhos Regionais de Desenvolvimento.

Figura 25 Municípios selecionados para a pesquisa

Fonte: Elaborado pelo autor. Malhas digitais obtidas em (IBGE, 2015)


160

Dentre os municípios polos de todas as 43 Regiões Geográficas Intermediárias 10 foram


selecionados para a composição da amostra. A escolha destas 10 localidades foi baseada nas
Regiões de Influência das Cidades (IBGE, 2007) de forma que ao menos uma Capital regional
B, uma Capital regional C, um Centro sub-regional A, um Centro sub-regional B, um Centro
de zona A e um Centro de zona B fossem escolhidos. A capital gaúcha (Porto Alegre,
enquadrada como Metrópole) não foi considerada em função das suas características próprias e
por já ter sido abordada em estudos sobre o tema (FGV, 2015). Finalmente, em acréscimo a
estes critérios, procurou-se incluir municípios de forma que mais regiões do Estado fossem
abrangidas, a partir do recorte regional estabelecido pelos Conselhos Regionais de
Desenvolvimento (Coredes). Desta forma os dez municípios selecionados pertencem a oito
Coredes distintos. Estes municípios, apresentados no mapa da figura nº 25, são Cerro Largo,
Cruz Alta, Ijuí, Passo Fundo, Santa Rosa, Sant'Ana do Livramento, Santo Ângelo, São Borja,
Torres e Vacaria.

Em dois dos dez municípios selecionados, Sant’Ana do Livramento e Vacaria, as tentativas


para agendamento de entrevistas não obtiveram sucesso, razão pela qual foram
desconsiderados. Nos outros 8 municípios foram realizadas 48 entrevistas envolvendo prefeitos
e vice-prefeitos municipais, vereadores, secretários municipais, assessores de comunicação,
servidores públicos, conselheiros municipais e regionais e promotores públicos. Estes últimos,
mesmo que não estejam associados diretamente aos governos municipais, foram incluídos em
função do trabalho que executam, principalmente na área de improbidade administrativa.

b) Empresas desenvolvedoras de software

No universo das localidades gaúchas, excetuando-se a capital do estado e alguns outros


municípios, os softwares que implementam os sistemas de informação do poder público
normalmente são adquiridos de empresas especializadas nesta atividade. A observação dos
portais da transparência dos municípios na internet apontou a existência de, pelo menos, 2254
empresas distribuindo seus produtos nas prefeituras gaúchas.

54
Algumas prefeituras contam com equipes próprias de desenvolvimento de software enquanto que em outras não
foi possível identificar a origem das aplicações.
161

Das solicitações de entrevistas enviadas às 10 empresas que atendem um maior número de


localidades, além de duas empresas públicas vinculadas às prefeituras de seus municípios,
ocorreram poucos retornos positivos. Assim somente quatro empresas de softwares foram
entrevistadas, três delas da iniciativa privada e uma empresa do setor público.

c) Utilizadores de dados abertos

Podem ser caracterizados como utilizadores de dados abertos, conforme Davies (2010), os
cidadãos com seus softwares, seus objetivos e as parcerias necessárias para manipulação e
análise dos dados. Um locus de pesquisa que remeta a todos os cidadãos, entretanto, é
demasiadamente amplo e genérico e, portanto, precisou ser definido de forma mais específica.
Este trabalho, deste modo, considerou como uma classe de utilizadores a representação da
sociedade civil nos diversos conselhos municipais, principalmente os Conselhos Municipais e
Regionais de Desenvolvimento, como fonte para percepção das possibilidades de participação,
colaboração e gestão social decorrentes da disponibilização de dados abertos. Estes Conselhos
estão localizados nos municípios incluídos no espaço amostral referenciado anteriormente.

Um segundo grupo de utilizadores compreende àqueles que podem produzir diferentes análises
e resultados a partir dos dados disponíveis. Normalmente denominados como hackers cívicos
os programadores de computadores podem desenvolver programas, páginas da web e
aplicativos para finalidades específicas. Nesta pesquisa, contudo, não foram incluídos os
programadores enquanto pessoas físicas, mas os cursos superiores de graduação que os
qualificam. Assim, analisou-se os Projetos Políticos Pedagógicos (PPP) de cursos superiores na
área de computação (principalmente nas modalidades de Sistemas de Informação e Ciência da
Computação), além de entrevistar, por meio de questionário on-line, os coordenadores destes
cursos, de forma a perceber o eventual potencial de uso de dados abertos em um futuro próximo.

No estado do Rio Grande do Sul estão em atividade, segundo informações constantes no sistema
de registro (MEC, 2018) do Ministério da Educação, 37 cursos de Sistemas de Informação e
33 cursos de Ciência da Computação. Em buscas iniciadas nos portais na internet das
instituições de ensino superior gaúchas houve a tentativa de localização de cursos na área
pretendida além da disponibilidade, para acesso e download, do respectivo Projeto Político
Pedagógico destes cursos. Resultaram, neste processo, um curso de Análise e Desenvolvimento
162

de Sistemas, 13 cursos de Ciência da Computação, um curso de Engenharia de Software, 4


cursos de Sistemas de Informação e 2 cursos de Tecnologia em Sistemas para Internet.

Com relação ao questionário submetido aos Coordenadores de Cursos na área de computação


foram enviados 61 convites via e-mail. Este convite foi aceito por 29 coordenadores dos quais
5 responderam o questionário de forma completa e os demais o responderam parcialmente, mas,
mesmo assim, foram considerados nas análises. A cópia deste questionário está disposta no
apêndice B.

6.1.2 As entrevistas em profundidade

No período transcorrido entre outubro de 2018 e agosto de 2019 foram realizadas 48 entrevistas
envolvendo 55 pessoas. A tabela nº 14 detalha o número de entrevistados em cada um dos
municípios. A tabela exibe seis novos municípios, além daqueles selecionados para a pesquisa
e ilustrados no mapa da figura nº 25. Nestes novos municípios estão localizadas empresas de
software (Frederico Westphalen, Marau, Porto Alegre e Três de Maio) e a Presidência de
Coredes que atuem em cidades não escolhidas originalmente (Porto Vera Cruz e Rolador).

Tabela 14 Entrevistados por cidade – 2018 e 2019

Cidade Número de entrevistados


Cerro Largo 5
Cruz Alta 5
Frederico Westphalen 1
Ijuí 10
Marau 2
Passo Fundo 4
Porto Alegre 2
Porto Vera Cruz 1
Rolador 1
Santa Rosa 4
Santo Ângelo 6
São Borja 5
Torres 6
Três de Maio 3
Total 55
Fonte: Elaborado pelo autor
163

A tabela nº 15 detalha as atividades desempenhadas pelos 55 entrevistados. Em todos os 8


municípios selecionados houve a participação dos poderes executivos e legislativos. As demais
atividades não tiveram representantes em todas as cidades.

Tabela 15 Entrevistados por atividade - 2018 e 2019

Atividade Número de entrevistados


Prefeito 7
Vice-Prefeito 1
Presidente Câmara Vereadores 7
Vereador 1
Secretário Municipal 2
Assessor de Comunicação 4
Servidor Público - Efetivo 9
Servidor Público - Comissionado 2
Promotor Público 4
Conselheiro - Comudes 4
Conselheiro - Coredes 6
Analistas de Sistemas 8
Total 55
Fonte: Elaborado pelo autor

Estas atividades, para efeitos de análise, foram agrupadas em 6 categorias, como mostra a tabela
nº 16. Um menor número de categorias, com um maior número de integrantes em cada uma,
contribui para o processo de análise e permite referir-se aos entrevistados de forma anônima,
sem identificá-los. Serão referidos, deste modo, pela sigla e por um número atribuído
aleatoriamente dentro da categoria.

Tabela 16 Categorias de entrevistados


Categoria Sigla Atividades Número de
entrevistados
Agentes Políticos Eleitos AP Prefeitos, Vice-Prefeito e Vereadores 16
Agentes Políticos Comissionados AC Secretários Municipais e Servidores 9
Públicos Comissionados
Servidores Públicos Efetivos SP Servidores Públicos Efetivos 9
Sociedade Civil SC Representantes de Comudes e Coredes 9
Ministério Público MP Promotores Públicos 4
Empresas de Software TI Analistas de Sistemas 8
Total 55
Fonte: Elaborado pelo autor

A formação acadêmica dos 55 entrevistados distribui-se por 20 diferentes áreas. Destacam-se


os cursos relacionados ao desenvolvimento de software, como sistemas de informação e análise
164

de sistemas, com 10 ocorrências. A área jurídica, com o curso de Direito, vem na sequência
com 9 entrevistados. Os cursos de Ciências Contábeis, Engenharia Civil e Letras foram
declarados por 3 pessoas, em cada um deles. Em duas oportunidades foram citados os cursos
de Administração de Empresas, Economia, Jornalismo e Publicidade. Os cursos de
Desenvolvimento Rural, Educação Física, Enfermagem, Filosofia, Geografia, Gestão de TI,
Gestão Pública, Medicina, Medicina Veterinária e Teologia foram apontados por um
entrevistado. Por fim nove entrevistados declararam ter concluído apenas o ensino médio.
Alguns deles, contudo, disseram estar cursando ou concluindo um curso superior.

Os agentes políticos entrevistados, os sete prefeitos, o vice-prefeito e os 8 vereadores são


filiados a 7 diferentes partidos políticos como mostra a tabela nº 17. Alguns prefeitos estão em
seu primeiro mandato enquanto outros já desempenharam a mesma função em outras duas, três
e até quatro oportunidades. Muitos destes prefeitos já desempenharam outras funções políticas
como vereança, secretarias municipais e até o legislativo estadual. No caso dos vereadores a
situação é bastante semelhante pois alguns estão em seu primeiro mandato e um deles já está
exercendo a função pela sexta vez.

Tabela 17 Entrevistados por partido político - 2018 e 2019


Partido Político Número de entrevistados
MDB 2
PCdoB 1
PDT 4
PP 5
PPS 1
PSDB 1
PT 2
Fonte: Elaborado pelo autor

As entrevistas seguiram roteiros semiestruturados, de acordo com o tipo de atividade


desempenhada pelo entrevistado, de forma que temas mais específicos pudessem ser explorados
com mais profundidade. O quadro nº 9 apresenta os diversos roteiros e os respectivos sujeitos
para os quais foram aplicados, bem como os apêndices onde podem ser encontrados.
165

Quadro 9 Roteiros de entrevistas em profundidade


Roteiro de entrevista Sujeitos de pesquisa Apêndice
Prefeitos Municipais Prefeitos e Vice-Prefeitos C
Vereadores Vereadores e Presidentes de Câmaras D
Servidores públicos Servidores públicos, efetivos ou comissionados, E
Assessores de comunicação e Secretários
Municipais
Ministério público Promotores públicos F
Conselhos municipais e regionais Conselheiros municipais (Comudes) e regionais G
(Coredes)
Empresas de software Analistas e gestores de empresas de TI H
Fonte: Elaborado pelo autor

O projeto de pesquisa norteador deste trabalho foi submetido ao Comitê de Ética na Pesquisa
(CEP) da UNIJUI por meio do Processo nº 90954618.0.0000.5350 e aprovado pelo Parecer nº
2.790.853. Desta forma, precedendo a realização de todas as entrevistas em profundidade, foi
apresentado o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). As entrevistas somente
foram conduzidas após a aceitação dos termos e concordância do sujeito de pesquisa.

6.1.3 As categorias de análise

Os Dados Governamentais Abertos constituem um movimento significativo para a democracia.


Estão fortemente relacionados ao conceito de Governo Aberto e, deste modo, podem contribuir
para o aperfeiçoamento dos regimes democráticos. A sua disponibilização, e seu uso, conduzem
a fontes alternativas de informação significando maior transparência, maior participação e a
possibilidade de colaboração dos cidadãos. As percepções, as interpretações, as crenças e as
opiniões dos diversos atores contatados, em relação a estes elementos, nortearam, a exemplo
dos roteiros de entrevistas, a análise das entrevistas realizadas.

O processo de identificação e análise dos fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que


dificultam ou impedem a disponibilização de dados abertos em municípios do Estado do Rio
Grande do Sul foi desenvolvido, principalmente, a partir da análise dos dados obtidos nas
entrevistas. Os roteiros destas entrevistas, bem como à análise das mesmas, foram realizados
com base em categorias de análise definidos a partir dos fundamentos teóricos desenvolvidos
nos dois primeiros capítulos desta tese. O quadro nº 10 apresenta as categorias de análise
definidas.
166

Quadro 10 Categorias de análise


Categoria de análise Descrição
Transparência pública Percepção e ações relacionadas à transparência pública
Participação dos cidadãos Percepção e ações relacionadas à participação dos cidadãos
Colaboração dos cidadãos Percepção e ações relacionadas à colaboração dos cidadãos
Governo aberto Percepção e ações relacionadas ao conceito de Governo Aberto
Dados abertos Percepção e ações relacionadas ao conceito de Dados Abertos
Legislação Percepção em relação à legislação vigente
Estrutura municipal Aspectos relacionados à estrutura de TI, Software e recursos humanos
Fonte: Elaborado pelo autor

A primeira categoria de análise diz respeito à transparência pública, atributo fundamental da


democracia. Espera-se que a demanda de informações pelos cidadãos e a entrega destas pelos
governantes permeie todos os momentos e todas as formas pelas quais a democracia se
manifesta. Governos e instituições transparentes são indutores de maior liberdade, opinião
política construída livremente e implicam na diminuição da assimetria informacional.

O objetivo principal desta categoria de análise é compreender como a transparência é percebida,


entendida e como de fato se apresenta perante os cidadãos e agentes públicos. A intenção foi
identificar, na visão dos entrevistados, aspectos adicionais sobre as ações de transparência em
diversos períodos, diferentes contextos e sob influência, ou não, de instrumentos legais
vigentes. Um interesse adicional, mas alinhado ao tema, está relacionado ao portal de
transparência e o juízo formulado pelos entrevistados sobre o conteúdo e as facilidades de
acesso e navegação.

A segunda categoria de análise adotada neste trabalho está associada à participação dos
cidadãos nos assuntos de interesse público, de forma voluntária ou em conjunto com a
administração pública. Ao contrário de teóricos que atribuem pouco sentido à participação,
Pateman, a partir de Rousseau e Cole, prega a necessidade de que a sociedade seja participativa.
A democracia representativa considera apenas os processos eleitorais como momentos
reservado a todos os cidadãos e impõe diversas dificuldades para a participação.

O propósito desta categoria de análise foi captar a forma pela a participação dos cidadãos é
percebida pelos entrevistados. Também se buscou identificar o estado atual e, principalmente,
que ações foram e estão sendo desenvolvidas para incentivo e incremento à participação.
167

Procurou-se olhar, de maneira especial, qual a percepção acerca dos conselhos públicos
instalados nos municípios, sua composição e sua atuação.

A terceira categoria de análise está fundamentada nos conceitos e nas práticas relacionadas à
colaboração dos cidadãos. Embora os estudiosos da democracia não referenciem a colaboração
de forma direta, a coprodução de serviços públicos é, também, uma forma de participação dos
cidadãos. A colaboração, por outro lado, corresponde, juntamente com a transparência pública
e a participação dos cidadãos, em um dos fundamentos dos denominados Governos Abertos.
Pretendeu-se, nesta categoria, perceber qual o entendimento em relação a este conceito, como
observam o estado atual e que ações são, ou foram desenvolvidas, para fomento e incentivo à
cocriação de serviços públicos.

Um Governo Aberto é aquele que busca, de forma incessante e simultânea, desenvolver e


implementar suas políticas com a participação e colaboração dos cidadãos e baseado na
transparência de seus atos. A quarta categoria de análise foi estabelecida a partir deste conceito
e do forte relacionamento e embasamento com o movimento de dados abertos. O objetivo foi o
de determinar o nível de conhecimento e entendimento em relação ao tema, além da percepção
sobre possíveis implementações da ideia de governo aberto.

A quinta categoria de análise contempla os dados abertos, tema específico deste trabalho. As
informações apresentadas nos capítulos anteriores, sobre o oferecimento de dados abertos, tanto
no contexto nacional quanto nos municípios gaúchos, evidenciam baixas adesões ao
movimento. Por representar um assunto recente a maior preocupação, nesta categoria, foi a
compreensão de como este movimento é conhecido, entendido e o como é percebido no âmbito
dos entrevistados.

A penúltima categoria está relacionada à legislação em vigor no território nacional. A análise


destes instrumentos legais, principalmente no segundo capítulo deste trabalho, permite
estabelecer diversas interpretações, não apenas em relação à transparência pública como,
principalmente, sobre o oferecimento de dados abertos. O propósito da categoria foi o de captar
como a legislação é entendida e quais são os seus efeitos e obrigações, principalmente em
relação à transparência municipal e oferecimento de dados abertos.
168

A sétima, e última categoria, procurou observar a estrutura municipal em relação,


fundamentalmente, ao conjunto de recursos disponíveis e ao emprego das Tecnologias de
Informação e Comunicação. Considerou, por um lado, a organização das atividades de TI nas
prefeituras municipais e a disponibilidade e qualificação dos recursos humanos existentes. Por
outro lado, também considera as empresas enquanto fornecedoras de softwares para as
administrações municipais.

O quadro nº 11 consolida as categorias de análise apresentadas e o conjunto de critérios em


cada uma delas. Estes critérios de análise são importantes porque permitem diferenciar e
classificar as diversas manifestações dos entrevistados.

As pesquisas qualitativas, da mesma forma que as quantitativas, devem ser implementadas com
rigor e o emprego de softwares no processo de análise contribui para a qualificação do trabalho.
O NVivo é um software do tipo Computer-aided qualitative data analysis software (CAQDAS)
e permite que o pesquisador reúna “todos os seus materiais de pesquisa num só lugar e de
maneira segura, desde os materiais de origem até os pensamentos analíticos” (MOZZATO;
GRZYBOVSKI; TEIXEIRA, 2018, p. 582). Este processo de organização contribui para a
construção de novas interpretações a partir dos dados coletados e analisados.

O software NVivo permite representar as categorias e critérios de análise sob uma estrutura
hierárquica de nós. As entrevistas transcritas são adicionadas ao NVivo como fontes e
correlacionadas a casos, os quais representam os entrevistados. Uma primeira etapa consiste na
leitura das entrevistas (fontes) e trechos selecionados destas podem ser associados a um ou mais
destes nós. Cada nó, ou grupo de nós desta hierarquia, pode, posteriormente, ser acessado de
modo que os segmentos assinalados anteriormente, de todas as fontes, podem ser revisitados.
Por fim o software “não substitui o trabalho analítico e criativo do pesquisador, mas
potencializa os resultados da pesquisa, pois força o envolvimento do pesquisador com o
material empírico, estimulando-o a pensar acerca das informações” (MOZZATO;
GRZYBOVSKI; TEIXEIRA, 2018, p. 584).
169

Quadro 11 Categorias e critérios de análise


Categoria de análise Critérios de análise
Antecedentes das ações de transparência antes das Leis de Responsabilidade
Fiscal, da Transparência e de Acesso à Informação
O que entende por transparência pública
O uso dos portais de transparência pelo entrevistado
Transparência pública Percepção sobre o acesso ao portal da transparência
Como obtém informações para o exercício da função
Percepção sobre o estado atual da transparência
Qual o envolvimento nas ações de transparência
Quais ações foram desenvolvidas para o incremento da transparência
O que entende por participação cidadã
Percepção sobre o estado atual da participação cidadã
Quais ações foram desenvolvidas para o incremento da participação cidadã
Participação dos cidadãos Percepção sobre as funções e atuação dos Conselhos públicos
Reflexões em relação à composição dos Conselhos
Atuação dos conselhos públicos
Funções dos conselhos públicos
O que entende por colaboração dos cidadãos
Percepção sobre o estado atual da colaboração dos cidadãos
Colaboração dos cidadãos
Quais ações foram desenvolvidas para o incremento da colaboração dos
cidadãos
Qual o nível de conhecimento sobre governo aberto
Governo aberto O que entende por governo aberto
Percepção sobre o estado atual do governo aberto
Qual o nível de conhecimento sobre dados abertos
O que entende por dados abertos
Percepção sobre o estado atual dos dados abertos
Dados abertos
Quais ações foram desenvolvidas para o incremento das ações de dados
abertos
Que opinião manifesta sobre dados abertos
Qual o entendimento sobre o conjunto de leis
Legislação Qual o entendimento da lei 12.527/2011
O que o conjunto de leis obriga a fazer
Organização das atividades de TI na administração pública
Razões relacionadas aos servidores e aspectos culturais
Aquisição de software
Relação com os fornecedores de software
Estrutura municipal
Estratégias das empresas
O desenvolvimento de novos produtos de software
Recursos humanos nas empresas
Dificuldades e impedimentos
Fonte: Elaborado pelo autor

6.2 A TRANSPARÊNCIA MUNICIPAL E SEUS CONTEXTOS

O comportamento dos municípios Brasileiros em relação à transparência das ações realizadas


pelos seus governantes, especialmente àquelas relacionadas ao poder executivo, podem ser
situados em três cenários distintos, determinados, principalmente, pelo estabelecimento da
legislação nacional que regula o tema. O primeiro deles ocorre até a entrada em vigor da Lei
Complementar nº 131 de 27 de maio de 2009 (BRASIL, 2009), a denominada Lei da
170

Transparência. Neste período inicial, que inclui os primeiros movimentos das prefeituras em
direção às Tecnologias de Informação e Comunicação, a moda (no sentido estatístico) era o
segredo e a quase que completa ausência de atos dos poderes executivos municipais com o
objetivo de divulgar informações. Um Servidor Público (SP 02), com mais de 40 anos de
serviço público, foi enfático ao dizer que “nenhuma Prefeitura do Brasil tinha transparência”.
Este servidor estava se referindo, certamente, ao fato de que não eram empregados
instrumentos, principalmente de natureza tecnológica, para divulgação ativa das ações
executadas pelos entes públicos.

O acesso e a obtenção de informações, salvo alguns municípios com legislação relacionada,


não eram regulamentados. A inexistente, ou incipiente, estrutura computacional dos entes
públicos tornava este cenário ainda mais complexo. Nas décadas de 1980 e 1990 algumas
administrações públicas municipais, ao se informatizarem, ou contratavam serviços de
empresas de processamento de dados ou adquiriam computadores de capacidade limitada e
completamente desconectados entre si. O padrão, para a obtenção de informações por parte dos
servidores públicos, era a impressão de relatórios em papel que circulavam entre os diversos
setores da Prefeitura Municipal. Nestas prefeituras, como coloca um Servidor Público (SP 09),
“não tinha obrigações de entrega de relatórios, não tinha quase nada”.

A segurança nacional e o interesse do estado, transpostas para o nível municipal, somadas à


cultura patrimonialista da administração pública, além dos vícios adquiridos pelos servidores
em anos de atividades neste contexto, resultaram em entes públicos completamente fechados.
A obtenção de informações somente era possível por meio de contatos pessoais, de amigos ou
de parentes, ou ainda pela ação de contatos políticos como os vereadores, por exemplo. Um
terceiro entrevistado (AC 07) acrescenta: “Existem funcionários dentro da Prefeitura que têm
40 anos de Prefeitura trabalhando do mesmo jeito, trabalhando à base do papel e do memorando
e do... e do livro de memorando”.

O segundo cenário em que se pode observar a forma como os municípios encaminham as


questões referentes à transparência pública situa-se no período de vigência da Lei da
Transparência, com início em 2009, e prosseguindo até a instituição da Lei nº 12.527, de 18 de
novembro de 2011, denominada de Lei do Acesso à Informação (BRASIL, 2011a). Este curto
intervalo de tempo foi marcado pelo surgimento, em série, de portais municipais da
transparência naquelas localidades em que a legislação assim o exigia. Mas, apesar destas
171

iniciativas a avaliação destes portais, tanto por pesquisadores (PRADO; GARCIA LOUREIRO,
2006; RIBEIRO, 2009), quanto por órgãos da imprensa (TRIBUNA DO NORTE, 2012), já
antecipavam parte dos problemas que ainda hoje são observados.

A Lei de Responsabilidade Fiscal trouxe consigo algumas exigências sendo que, parte delas,
estão dispostas no caput do artigo 48

São instrumentos de transparência da gestão fiscal, aos quais será dada ampla
divulgação, inclusive em meios eletrônicos de acesso público: os planos, orçamentos
e leis de diretrizes orçamentárias; as prestações de contas e o respectivo parecer
prévio; o Relatório Resumido da Execução Orçamentária e o Relatório de Gestão
Fiscal; e as versões simplificadas desses documentos. (BRASIL, 2009)

Estes relatórios já eram produzidos pelos sistemas internos de controle das prefeituras e
compunham o rol de documentos que eram apresentados pelas Prefeituras Municipais aos
órgãos de controle como, por exemplo, o Tribunal de Contas do respectivo Estado da federação.
Um Servidor Público entrevistado (SP 09) confirma ao dizer “não existia quase nada, existia
muito pouco. A única... o que a gente tinha era publicações, tudo publicações. A gente já
publicava no site, já entregava toda essa prestação”.

A maior dúvida das áreas contábeis das Prefeituras Municipais estava relacionada ao inciso II
do parágrafo único do mesmo artigo 48, o qual ordenava a “liberação ao pleno conhecimento e
acompanhamento da sociedade, em tempo real, de informações pormenorizadas sobre a
execução orçamentária e financeira, em meios eletrônicos de acesso público” (BRASIL, 2009)
Um Servidor Público (SP 09) relembra os receios da época: “Bah, mas como que isso vai
acontecer em tempo real? O que é tempo real? Então, tudo isso a gente pensou. E como que os
sistemas vão trabalhar isso? até para se adaptar foi bem complicado”.

O terceiro cenário indicado inicialmente tem seu início na vigência da Lei do Acesso à
Informação e persiste até os dias atuais. Neste período de pouco mais de 7 anos, embora não
se possa afirmar categoricamente, todos os municípios Brasileiros implementaram os seus
portais (municipal, de transparência e de acesso à informação) na internet. O panorama dos
municípios gaúchos, ao menos, foi apresentado no capítulo 5 deste trabalho.

A convicção generalizada é a de que a implantação dos portais de transparência nos municípios


tem origem na exigência da legislação. As falas de alguns atores são muito claras neste sentido.
172

O Servidor Público (SP 03) diz que “Sem a lei - Com certeza, eu acho que não teria um. Sim,
tranquilamente não”. Um Agente Político (AP 15) acrescenta que “pela lei, que é exigido, e aí
foi... foi implantado”. Um entrevistado da Sociedade Civil (SC 09) conclui dizendo “se todos
os municípios têm o seu portal, foi porque a lei obrigou”.

Como deixam transparecer alguns entrevistados, as Leis de Transparência e de Acesso à


Informação, principalmente, são ainda muito recentes. Sistemas computacionais como os
portais da transparência, com usuários bastante difusos e diversificados, não seguem,
possivelmente, o mesmo ciclo de vida de outras aplicações mais restritas e mais bem definidas.
Estas questões podem ser resumidas na fala do Agente Comissionado (AC 01), “então estamos
aí, a Lei de Acesso à Informação é de 2012, então são 6 anos, é muito... a gente está
engatinhando ainda”.

6.3 A PERCEPÇÃO DOS ENTREVISTADOS À LUZ DAS CATEGORIAS DE ANÁLISE

A análise das entrevistas realizadas é apresentada considerando-se, como elemento principal,


as categorias de análise definidas. Em cada uma delas as percepções dos entrevistados serão
exibidas em conjunto, de acordo com a relevância da opinião e do significado da mesma para a
compreensão do tema.

6.3.1 A transparência pública

A palavra transparência tem um significado muito amplo. De um modo geral os 55


entrevistados apresentaram dificuldades para defini-la. Estas dificuldades não representam um
desconhecimento do termo e sim a preferência de quase a totalidade dos sujeitos da pesquisa
referir-se à transparência como algo importante, fundamental e extremamente necessária.

Algumas definições propostas, por outro lado, trazem alguns elementos importantes. Como a
apresentada pelo Agente Político (AP 03) que considera uma visão relacionada ao acesso à
informação:

Transparência é tu deixar à disposição da população todos os dados do dia-a-dia da


administração pública, seja ela municipal, estadual ou federal, e poder fazer com que
as pessoas tenham acesso à essas informações, de todos os procedimentos e processos
realizados. Terem a visão, que a população tenha visão de todos esses... desses fatos.
173

Então, é deixar de forma bem visível e aos olhos e às mãos da população o que
acontece no dia-a-dia do poder público.

O Agente Comissionado (AC 04), por sua vez, vai na mesma direção da citação anterior e
acrescenta as possibilidades, decorrentes da transparência, de empoderamento e participação
dos cidadãos.

eu entendo transparência pública como um livro aberto, como uma permanente


disponibilidade dos atos e ações do poder público, estando, ou que estejam
disponíveis à população, às pessoas, ao cidadão, de maneira que as pessoas, não só
tenham acesso a esses dados e a essas ações e a esses atos, mas como também ela
tenha poder, possibilidade de interagir das mais diversas formas, seja através da sua
representatividade pessoal ou representatividade grupal, reunidas através de
entidades, associações, enfim, organizações capazes de aglutinar pessoas com
determinadas tendências, ou por determinadas linhas de pensamento; ou ainda com
determinadas ações ou interesses por determinado assunto

Esta fala poderia muito bem ser continuada pela declaração do Agente Político (AP 07) quando
diz que “só participar sem conhecimento não significa transparência”. Por fim a fala do Servidor
Público (SP 09), que representa, acima de tudo, o reconhecimento das dificuldades encontradas
em identificar, compreender e atender os anseios dos cidadãos:

Transparência pública é isso... uma parte é isso que a gente está fazendo, que a gente
está tentando entrar e mostrar, para a população, aquilo que a gente está fazendo
aqui dentro, e, por outro lado, eu vejo que é mais, mais do que isso. Teria que
aumentar esse processo de transparência. Para ser uma coisa mais transparente não
é só mostrar salário, só mostrar relatórios. É você conseguir mostrar mais aquilo que
você faz aqui dentro, daqui a pouco a população pode buscar aquilo que ela precisa,
que... muitas vezes, a gente vê o pessoal reclamando que não consegue chegar. Pede,
pede, pede e não consegue. Talvez, a transparência também fosse isso, tu conseguir
dar mais voz para o cidadão e fazer com que ele consiga dizer o que ele quer, o que
ele está precisando hoje, e a gente consiga atender mais rápido. E também mostrar
tudo aquilo que está acontecendo.

Em contraposição à Schauer (2014) que apresenta a transparência como uma qualidade, ou


capacidade, de permitir ser observado, o sentimento predominante entre os entrevistados,
distribuídos em todos as categorias, refere-se a ela como uma obrigação decorrente da
legislação e das exigências da fiscalização. A Sociedade Civil é a categoria menos representada
nesta maioria pois, dos nove entrevistados, apenas um manifestou-se neste sentido. As demais
categorias podem ser resumidas nas falas do Agente Comissionado (AC 06) ao dizer que “na
verdade, é muito mais do que uma prestação de contas, porque hoje é algo, uma exigência legal”
e do Agente Político (AP 15) quando declara:
174

Então a gente tem que cuidar para realmente cumprir a lei, desde... normas são leis,
e essas leis todo mundo deveria cumprir de acordo com o que a lei estabelece. Então,
eu entendo mais ou menos assim, que a transparência para fazer as coisas certas,
transparente, é fazer o que é certo.

Outras manifestações são muito semelhantes pois também remetem à ideia de que a
transparência é uma obrigação só que, desta vez, em função dos desgastes imputados à classe
política. O Agente Político (AP 05) argumenta que “tem que botar para a rua o que está sendo
feito, porque o povo, ele contribui, e hoje o desgaste político está muito grande”.

Apesar das declarações acima, principalmente aquelas que pretendem definir o que significa a
transparência pública e o conjunto de ações, atitudes e intenções para viabilizá-la, um mesmo
instrumento é apontado por todos como o facilitador deste processo: o portal da transparência.
Os municípios e seus administradores, via de regra, delegam e concentram suas práticas de
transparência em seus portais os quais, relembrando, na sua quase totalidade, são desenvolvidos
por empresas privadas e adquiridos pelas regras que regem as licitações públicas.

Questionados sobre o uso deste portal em seus municípios alguns atores responderam
negativamente. O mais preocupante, contudo, é o fato de que dos cinco que assim se
manifestaram dois são Prefeitos Municipais e dois são Presidentes de Câmaras de Vereadores.
Não é uma parcela significativa, mesmo em relação aos 55 atores entrevistados, mas
representam indícios que, de fato, as políticas de transparência nos municípios são apenas
aquelas definidas na legislação e as quais são obrigados a cumprir.

As avaliações mais negativas são dedicadas aos portais de transparência. Todas as categorias
de entrevistados dedicaram comentários sobre diversos aspectos referentes aos portais e que
vão desde o acesso ao portal, passando pelo modo como a informação é disponibilizada e
localizada e até a interpretação das informações disponíveis.

Para muitos dos entrevistados, pertencentes às categorias dos Servidores Públicos, Sociedade
Civil e Ministério Público, os portais da transparência são incompletos pois exibem
informações por demais sintetizadas e omitem detalhes importantes. O Servidor Público (SP
09) apresenta uma situação corriqueira: “E daí, o cidadão vai olhar lá e diz: Mas... bom,
conforme anexo... eu comprei tal coisa conforme anexo. Daí, como que o cidadão vai olhar isso
e vai dizer que comprou tal bem?”. O anexo a que se refere o servidor não está disponível. O
entrevistado pertencente à categoria da Sociedade Civil (SC 05) coloca outro exemplo.
175

a gente não consegue ver o objeto específico, acho que dava para expandir um pouco
mais, para se ter maior acesso. Poderia ter além do acesso de informações
financeiras, orçamentárias, por vezes uma transparência maior do ponto de vista
documental. Então, por exemplo, para a gente poder chegar ao... o governo do Estado
pagou um valor em virtude do convênio tal. Poderia ter lá a cópia do convênio,
entendeu? Um suporte maior até em termos de... de documento, eu acho que iria
agregar mais

O Agente Comissionado (AC 01) ilustra estas situações e identifica na estrutura administrativa
dos municípios, nas questões culturais e na qualificação dos servidores públicos algumas
possíveis razões para fatos como este:

A questão é de que eu não consigo organizar aqui na gestão com todas as Secretarias
envolvidas o fluxo, por exemplo, de diárias, porque a lei diz que a diária, ela tem que
sair da Secretaria X e tem que ter lá... pelo sistema ela vai ir para a Secretaria da
Fazenda, Secretaria da Fazenda vai dar ok, vai para o gabinete do prefeito; gabinete
do prefeito vai dar ok; vai para a contabilidade; contabilidade vai lançar no sistema
e vai para o empenho, vai pagar no banco. É um fluxo que cada ponta tem um papel
nela. Mas o que acontece? Aqui na Secretaria o cara imprime... vai no sistema que
ele poderia fazer de forma on-line, aí ele pega aquele mesmo formulário que está no
sistema e ele imprime. Daí ele pega a caneta, e ele preenche o formulário todo como
ele quer, o número de diárias, para onde ele vai, o que ele vai fazer, etc., eu vou levar
o paciente em Porto Alegre, não sei o que e tal. Aí ele pega aquele formulário, leva
no secretário dele, o secretário dele assina, autoriza, ele pega, bota no memorando,
bota o negócio do protocolo e vai para a Secretaria da Fazenda, protocola e deixa
lá. Aí o secretário da Fazenda pega aquele papel, faz um outro processo, manda para
o gabinete do prefeito, o gabinete do prefeito assina, autoriza e tal, volta para a
contabilidade. Um trâmite totalmente analógico, que poderia ser digital. E quando
chega na ponta, no seu [...], que é a pessoa na tesouraria responsável por botar as
informações dentro do sistema que vão para o portal da transparência, ele olha todas
aquelas informações da diária, de onde veio, para onde foi, o que fez e o que não foi,
com um calhamaço de 500 coisas para fazer e botar, porque é só ele que bota as
ordens de pagamento para dentro do sistema. E ele vai preencher todas as
informações do portal? Não. Ele só vai preencher as importantes que não travam o
sistema. Ou seja, ele tem que dizer quem é o servidor que receber a diária, para onde
ele vai, quantas diárias são – uma e meia, meia diária, duas diárias – quando vai
voltar, quem autorizou, o valor e ponto.

Uma segunda classe de problemas, e talvez mais significativa, pode ser denominada de
dificuldades operacionais. O Agente Político (AP 01), em poucas palavras, caracteriza esta
situação ao dizer que “é que é cheio de cliques, tu tem que ir procurando onde tu quer chegar”.
O Agente Comissionado (AC 01) apresenta um exemplo:

Eu acho que para o cidadão comum, aquele cara que não tem uma facilidade com
informática como a gente tem que trabalha com isso e tal. Ele tem muita dificuldade
de achar a informação que ele está procurando ali, porque ele vai numa aba que é
sobre pessoal, ele vai outra sobre despesa, daí dentro daquela de despesa ele vai ter
que achar exatamente o assunto que ele quer, daí ele vai ter que pesquisar. Hoje, por
exemplo, o Tribunal de Contas nos obriga a colocar os contratos em outro portal.
Então se eu quiser saber sobre contratos de licitação vou ter só um link do portal da
Prefeitura, vai ter que ir lá para o Licitacom do Tribunal de Contas e pesquisar no
176

Licitacom. Então se eu quiser dados de outra questão vou ter que ir em um terceiro
portal.

Ou como sugere o Servidor Público (SP 06) quando coloca que

até é possível tu consultar, mas a... tem que ser mais prático, mas – como é que eu
vou dizer, assim? – sem muito “clique ali, clique lá”, aí pede informações tipo CPF
e endereço, coisas, enfim... que eu acho desnecessário. Tem que ser mais… mais
linear

Estas dificuldades conduzem o usuário do portal a um sentimento de confusão pelo fato de


serem pouco objetivos e extremamente complicados. A declaração do representante da
Sociedade Civil (SC 01) ilustra com clareza esta situação:

Confesso que na minha... ((acha graça)) ignorância, eu... eu me perdi. Eu não... eu


não compreendi 100%. Eu achei muito técnico. Eu acho que deveria ser um pouco
mais... isso na minha ((enfatizou)) compreensão, no meu entendimento... minha
impressão foi essa, ele poderia ser um pouco mais simples e objetivo.

Estas dificuldades de entendimento e localização são também determinadas pelo emprego, na


totalidade dos portais e em todos os seus conteúdos, de termos, palavras ou expressões
eminentemente técnicas. Esta situação foi relatada por entrevistados em todas as categorias. O
entrevistado da Sociedade Civil (SC 07), exibe um complicador inicial quando da especificação
dos parâmetros para a localização da informação:

É porque só os jovens eu acho que para acessar e captar, e mesmo muitos não vão
nem saber porque ai são códigos, números, então em si, eu acho que assim... claro,
tem o pessoal que entende, mas outros vão ter muita ((enfatizou)) dificuldade, nem
vão saber o que estão lendo.

Inclusive os profissionais de informática, que desenvolvem estas aplicações, reconhecem o uso


deste linguajar e as dificuldades de entendimento. Por exemplo o representante das Empresas
de Software (TI 02) diz:

Quando eu vou lá e boto informações sobre o orçamento, nem sempre as informações


sobre o orçamento são informações palatáveis ao público geral. E aí, a forma de
mostrar isso é muito importante. E aí, tem que evoluir para conseguir mostrar isso
de uma forma que fique mais fácil da população entender. Porque uma coisa é um
técnico especializado em orçamento público olhar a peça orçamentária, do jeito que
ela está colocada nos portais de transparência; outra coisa é uma pessoa comum, a
dona de casa entrar no portal e se entender lá dentro.
177

Os portais não são “didáticos” como diz o representante do Ministério Público (PJ 01). O
espírito da legislação, novamente referindo-se à Lei 12.527 (BRASIL, 2011a), quando
estabelece o emprego de procedimentos objetivos e ágeis e em linguagem de fácil compreensão,
na opinião dos entrevistados, não estão sendo respeitados. O resultado de todas estas
interferências nos processos de transparência pode ser extraído da fala do Agente Político (AP
08). Todos os recursos investidos e o eventual esforço dispendido não atingem os objetivos de
tornar o cidadão consciente e conhecedor das questões que envolvem sua comunidade:

Na grande maioria das pessoas, pela minha experiência, agora acompanhando, por
exemplo, a questão orçamentária, [...] de algumas comissões importantes que nós
temos na Câmara, que discutem questões relacionadas a sociedade, a gente percebe
assim, que a linguagem muitas vezes usada é uma linguagem que não permite o
cidadão formar um juízo real e verdadeiro sobre aquele assunto

O cenário descrito em todos os relatos anteriores aparenta ser um tanto desolador e,


principalmente, traz a necessidade de reflexão sobre as causa e responsabilidades de tais fatos.
De todo modo, como apresentado por Heald (2006), estas questões referentes a apresentação
de informações por demais sintéticas, com dificuldades operacionais, de localização e de
entendimento, e efetivadas por força da legislação configuram a dualidade entre transparência
nominal e transparência efetiva. Trazendo novamente as palavras de Trzesniak (1998, p. 164),
“não é a realidade, mas uma expressão incompleta de uma parte dela”.

Diversos argumentos foram apresentados sendo que a maior parte deles na direção de transferir
os encargos, ou explicações, tanto para a legislação quanto para os cidadãos. As mais comuns
dizem respeito à falta de conhecimento e interesse do cidadão, bem como suas deficiências para
interpretar e entender o conteúdo dos portais de transparência. Embora a democracia moderna
aparente considerar como cidadãos a grande maioria das pessoas, sem distinção de gênero e
classe social, a exclusão acaba se concretizando pelo nível cultural e de conhecimento. Na
democracia a igualdade política dos cidadãos é, como coloca Mill (1981), um de seus princípios
fundamentais.

Com exceção da Sociedade Civil, entrevistados das demais categorias referiram-se ao fato de
que os cidadãos não possuem nem conhecimento e nem interesse para buscar e entender as
informações disponibilizadas pela administração pública e que esta condição, de certa maneira,
justificaria todas as deficiências do portal e do próprio governo, como exemplifica o Servidor
Público (SP 02):
178

Às vezes o usuário comum quer interpretar algum balanço financeiro, aí isso já


complica porque daí vai depender de o cara entender o que que é receita, o que é
despesa, o que é que é orçamento, orçamento não é dinheiro, orçamento é uma
previsão... e que foi realizado e o que não foi realizado, então isso complica para o
usuário comum

E, também, como complementa o representante do Ministério Público (PJ 02) quando fala que
“Agora, tem que ver duas coisas: se tem interesse por isso, tem interesse por isso, e também se
a população tem o grau de cultura para acessar esses dados”. Se observada por este ângulo esta
é, certamente, uma equação difícil de resolver.

Outras justificativas são um pouco mais específicas. Como por exemplo as alegações referentes
à idade e ao conhecimento e experiência em informática dos cidadãos. O representante da
Sociedade Civil (SC 07) é sucinto quando diz que “Principalmente pessoas já da... média idade
para cima eu acho difícil” complementado pelo entrevistado da mesma categoria (SC 09) que
declara:

E que o pessoal se entende. E você entende, mas as outras pessoas que estão
acessando não conseguem entender aquele processo. E eu acho, eu acho que ninguém
parou para pensar ainda do lado da pessoa que... do leigo – digamos assim –, e nós
temos... toda uma... uma – digamos assim – uma década, uma faixa etária que eu
considero quase leigos, ou ((acha graça)) eu sempre digo, analfabetos de informática.

A partir de situações como estas, bem como as demais relatadas anteriormente, desponta uma
questão que, certamente, precisa ser respondida. A fala do representante dos Agentes
Comissionados (AC 01) apresenta esta mesma pergunta: “E aquele cidadão da cidade que não
consegue, ele nunca vai ter direito à informação, ele nunca vai ter o direito à transparência?
Como é que funciona assim... a transparência só vale para uns e não para outros?”.

Algumas respostas são apresentadas. Algumas, mais decorosas, alegam que os portais são
dirigidos a um público restrito. O Servidor Público (SP 02), por exemplo, é direto ao dizer que
“O cara que deveria consultar o Portal da Transparência que seria, esse no meu entendimento,
os presidentes de núcleo comunitário, ou... até o próprio... CDL, essas instituições de classe,
para ver se o município está indo para uma direção de gastos”. Já o representante das Empresas
de Software automaticamente exclui a parcela da população com dificuldades de acesso e
entendimento quando diz:

Nós entendemos que essa informação, ela é direcionada a um público X, um público


específico, que quer saber sobre essas informações. Então, a dona Maria, a dona de
179

casa, lá, ela não sabe interpretar essas informações, não é obrigada, e muito
dificilmente ela vai se interessar por esse assunto. Diferente de um processo
licitatório, que ela quer saber quem ganhou, que ela quer saber que produtos a
Prefeitura está comprando, diferente da informação de cargos e salários... não é? A
dona Maria, a dona de casa, lá, ela quer saber quanto é que a vizinha dela, que é
funcionária do poder público, está ganhando. Quais os benefícios que a vizinha, ali,
que trabalha lá na Prefeitura, tem, trabalhando na Prefeitura. Então, a gente
visualiza informações que uma legislação obriga publicar, porém para públicos
específicos. Então, o entendimento que a gente tem é esse. O que nos mantêm
tranquilos nesse desafio... que nem você comentaste, aí, do paradoxo, o que nos
mantêm tranquilos nesse desafio é isso. É entender que determinadas informações
são para determinado público. Por mais que seja aberto a todos, mas nem todos vão
em busca, vão querer procurar informações sobre dotações orçamentárias, se tem ou
não tem dinheiro, não é?

Outras declarações, entretanto, parecem retroceder no tempo. São todas aquelas que orientam
os cidadãos a procurar ajuda. Todas as atividades de apoio, auxilio ou tutoria sempre serão bem-
vindas, em qualquer contexto. O que os entrevistados se referem, entretanto, é aquela associada
à prestação de favores ou paternalistas, típicas de diversos períodos políticos Brasileiros. A
declaração do Agente Político (AP 04) é muito clara:

Eu acho que o cidadão comum, em certas áreas, não teria como acessar essa
informação. Mas, aí nos entramos em ação também, não é professor? Aí nos temos...
nos procura... nos temos como buscar. E se nós não conseguirmos buscar esta
informação na ação direta, nos vamos buscar pela Câmara. Nos vamos buscar
informações junto a Prefeitura Municipal buscando pedidos de informações pela
Câmara Municipal de Vereadores.

E, na mesma direção, a fala do Agente Político (AP 15) pois “tem que ter esse conhecimento,
claro, que o cidadão comum. Se ele tiver, se ele tiver alguma outra dúvida, ou pode comparecer
na Prefeitura, pode se dirigir à Câmara de Vereadores, que com certeza...”. Como já colocado
anteriormente parece não ter sido superado o tempo em que a obtenção de informações somente
era possível por meio das relações pessoais, de amigos ou de parentes, ou ainda pela ação de
contatos políticos como os vereadores, por exemplo.

De qualquer forma o que parece ser importante, em primeiro lugar, é obedecer a legislação e
obter o reconhecimento dos órgãos fiscalizadores. O Agente Político (AP 11) ilustra este
comportamento:

E uma coisa que eu já peguei é com o Tribunal de Contas os quesitos, porque eles
fazem aquela avaliação do site, das informações. Enfim. E a gente, durante esse ano,
trabalhou para que todos os itens do tribunal estejam lá respondidos, que eles fazem
uma avaliação de vários problemas do ano passado. Então esse ano a gente trabalhou
para que respondesse os quesitos de acesso à informação
180

O objetivo principal está registrado nas palavras do Agente Político (AP 01) quando diz que “O
próprio Portal da Transparência que temos hoje aberto, [...], no estado, ficou em 2º lugar no
Portal da Transparência”. Ou nos dizeres do representante de uma das Empresas de Software
(TI 01):

Em termos de produto, o nosso produto, ele atende 100% da legislação vigente. A


gente procura estar sempre alinhado com o Tribunal de Contas e os órgãos
reguladores dessa... o Portal da Transparência, o controle interno do município. No
ano de 2019, mesmo, nós tivemos o resultado da avaliação que acontece todo ano,
pelo Tribunal, e um número X, aí, de clientes atingiram nota máxima, 100% de
aderência ao Portal da Transparência.

A maior preocupação dos administradores municipais tem sido o estrito cumprimento da


legislação. De acordo com Coelho (COELHO et al., 2018) a transparência significa ir além dos
instrumentos legais de forma a permitir que os cidadãos possam monitorar e avaliar as ações
dos governos. A democracia somente será exercida na sua plenitude quando de parte dos
cidadãos, por um lado, houver a demanda por informação e prestação de contas e por outro,
funcionários políticos convencidos da necessidade de entrega-las. (LÓPEZ-AYLLÓN, 2006)

6.3.2 A participação dos cidadãos

De uma forma muito simples a participação dos cidadãos nos assuntos da comunidade poderia
ser definida a partir das palavras do Servidor Público (SP 09) quando diz que “Participar, é,
trocar ideias. Porque é um encontro. É um encontro assim, pessoalmente, é um lugar que tu
pode falar, dizer o que tu pensa”. Não envolve, necessariamente, a deliberação, mas contribui,
significativamente, nos processos de tomada de decisão. Tenório acrescenta:

O que se precisa entender é que participar é fazer política e esta depende das relações
de poder percebidas. Que participar é uma prática social na qual os inter-relações de
poder percebidas. Que participar é uma prática social na qual os interlocutores detêm
conhecimentos que, apesar de diferentes, devem ser integrados. (TENÓRIO, 1990)

Por sua vez o Agente Político (AP 16) manifesta-se a partir da ideia estabelecida por Rousseau
(PATEMAN, 1992) de que a participação tem caráter educativo:

E então eu acredito muito na participação popular, porque é um processo educativo,


como é que seria, que forma caráter, forma... forma maneiras de as pessoas
entenderem como é que a sociedade funciona, as estruturas de poder, as relações de
poder na sociedade. A participação popular, ela é importante por isso, entende?
181

E, como coloca o Agente Político (AP07), relaciona os processos participativos à constituição


da cidadania:

O cidadão, ele se torna cidadão quando ele participa. A cidadania. A participação é


cidadania. Então o homem e a mulher, participou é cidadão. É cidadão pela sua
trajetória de participação, de envolvimento. Então eu vejo que o... nós avançamos
muito.

A Constituição Federal de 1988 trouxe consigo um conjunto de mecanismos voltados à


participação da sociedade tanto nos processos de natureza legislativa quanto naqueles
relacionados à gestão, planejamento e administração pública (ALLEBRANDT, 2001). Boa
parte dos entrevistados reconhecem estas iniciativas advindas da Constituição Brasileira e da
legislação subsequente. A fala do Agente Político (AP 07) segue nesta direção:

Então a Constituição de 1988 criou muitos conselhos regionais, estaduais, federais,


mas principalmente os conselhos municipais, onde nós lutamos muito pelo Conselho
Municipal de Saúde, Conselho de Direitos da Criança, Assistência Social,
Agricultura, onde a sociedade civil, ela está seguramente paritária com 50%. Eu
acredito muito na participação coletiva das pessoas na mudança do bem maior que é
a sociedade. Então a participação tem que ser coletiva. Então nesse meio tempo todo,
houve uma participação efetiva da sociedade através das instituições organizadas e
também das representações da sociedade civil individuais nos conselhos. Este
envolvimento, ele traz benefícios para a sociedade, equilibra as políticas públicas em
diferentes áreas.

As expectativas, entretanto, parecem não estar se confirmando. Com exceção dos profissionais
que atuam nas Empresas de Software, que argumentaram não possuir informações para tanto,
quase que a totalidade dos demais (13 Agentes Políticos, 2 Agentes Comissionados, 2
Servidores Municipais, 5 representantes da Sociedade Civil e 2 Promotores Públicos) fazem
coro com a afirmação do Agente Político (AP 04) que diz “nós não temos ainda uma
participação efetiva da comunidade”

Uma situação concreta são as audiências públicas promovidas pelas administrações municipais.
Algumas são obrigatórias, como por exemplo a apresentação periódica dos resultados das
contas municipais, e outras são eletivas e abordam questões eventuais importantes nas
localidades. As do primeiro tipo evidenciam, na opinião dos entrevistados, os resultados pífios
de tal método. Na fala do Agente Comissionado (AC 07)

... tu faz audiência pública para discutir o orçamento do município, vai 5 ali. Tu faz
audiência pública para discutir o plano plurianual, vai 2 pessoas. Agora nós estamos
discutindo aqui o plano diretor da cidade, atualização do plano diretor, e, assim, a
gente vê muito pouca participação da população.
182

Em outra localidade a mesma situação. Mesmo com uma celeuma a respeito da atualização de
valores do IPTU do município o resultado não foi diferente. O Agente Político (AP 15) descreve
a situação:

Nós tivemos há poucos dias uma audiência pública que era sobre o IPTU, mas poucas
pessoas compareceram. Nós achamos que ia vir muita gente, para explicar os efeitos
desse ano na atualização de dados do IPTU. Então veio pouca gente. Mas assim, tem
outras que... as pessoas, em geral, não participam muito de audiências públicas. Nós
temos realizado várias, mas as pessoas não... não participam muito.

Este cenário pode ser apresentado de maneira mais completa. Os poucos participantes destas
audiências, em boa parte das oportunidades, são funcionários públicos cuja atividade
profissional geralmente está associada ao tema em discussão no evento. O Servidor Público (SP
09) discorre sobre casos desta natureza:

Mas, hoje, muito pouca gente vai. A gente vê que é uns gato pingado, vereador estão
lá, alguns vereadores estão... esse ano passado, a gente viu que mais se integraram a
estar lá, se integraram ao grupo, mas, antes, não tinha quase ninguém. A gente tinha,
praticamente, só o pessoal da contabilidade olhando lá. E a gente chama as entidades
e um que outro vai. E, hoje, tem um que outro vereador, ali, que vai e, ainda, já está
bem melhor. Mas ainda falta muito a população.

O Agente Político (AP 14) complementa dizendo que “chega ao ponto de, muitas vezes, não ter
pessoas da sociedade, a não ser os assessores e funcionários da própria casa para discutir um
problema que é de fundamental importância para a sociedade. Uma decisão que vai ter um
reflexo imediato ou, a médio ou a longo prazo, direto na sociedade”.

Existem exceções evidentemente. Em algumas ocasiões, principalmente quando temas


polêmicos estão em pauta, há uma mobilização maior da sociedade. O Agente Político (AP 01)
exemplifica:

Nesse sentido, oscila muito. Assim, eu dizia, por exemplo, nós aqui fizemos uma
alteração do perímetro urbano. Então fizemos audiências públicas para ouvir as
pessoas que de alguma forma iam ser, passariam de zona rural para zona urbana.
Então, houve participação muito intensa de... chegava a ter 300 pessoas nas
audiências públicas.

Em outras oportunidades, entretanto, esta movimentação acontece de forma segmentada, para


defesa de questões corporativas. O representante da Sociedade Civil (SC 01) esclarece:

Porque se percebe também, de outro lado, que quando é de interesse de um


determinado grupo de pessoas algo que vai para discussão, aí essas pessoas vão para
183

fazer uma pressão psicológica naquela reunião, ou naquele encontro. E... e inclusive,
eles me falaram que isso surte efeito nas pessoas que estão decidindo. Então, veja só,
essa... até as pessoas... não, não vou julgar ninguém que estão lá decidindo se deixam
se influenciar por uma pressão de um determinado grupo. E isso é complicado.

O Orçamento Participativo, também conhecido como Consulta Popular, no Estado do Rio


Grande do Sul é outro evento que tem como objetivo a participação dos cidadãos. Ao contrário
das audiências públicas, as quais pressupõe a presença dos cidadãos, a Consulta Popular ocorre
de forma on-line, à distância. O espaço de participação, aos olhos dos cidadãos, resume-se à
escolha de alternativas. A afluência de pessoas nos momentos de votação tem sido muito maior,
pelo menos em números absolutos, que o comparecimento às audiências públicas e aos
encontros preparatórios para a própria Consulta Popular. Estes processos, contudo, são também
fortemente marcados por grupos que atuam de forma organizada. O representante da Sociedade
Civil (SC 03) explica:

Sim. É, olha, a gente pode dividir a participação em diferentes frentes, digamos assim,
a gente vai fazer essa análise. E eu sempre vou partir do pressuposto de que a
participação, ela é uma questão que a gente precisa analisar dentro de uma forma
pontual ((enfatizou)). Eu acredito que as pessoas se organizam para participar de
forma pontual. Então, em relação a um determinado tema, a uma demanda, a um
programa de governo, uma... uma temática enfim, é pouco... é pouco... as pessoas
participam pouco do dia a dia da administração pública e é isso que faltaria mais.
Mas, por exemplo, o Estado do Rio Grande do Sul há muitos anos existe um processo
de participação para a construção do orçamento para o exercício posterior que já foi
orçamento participativo, já foi consulta popular, já foi processo de participação,
enfim, vamos usar o termo “consulta popular” que é mais comum. Então, as pessoas
se organizam a partir da sua demanda. Então segurança pública a partir das suas
necessidades, a saúde, a educação. Então a gente vê que aí... a partir daí as próprias
lideranças desse segmento acabam mobilizando as pessoas para participar por conta
da demanda, e não por conta da importância que seria o cidadão ir lá e participar
da construção do orçamento como um todo. Acho que faltaria... falta ainda esta visão
das pessoas compreender. Bom, eu estou ali para construir o orçamento do Estado,
que tem diversas frentes, diversos olhares, diversas... formas de manifestação na
minha vida, na vida do meu bairro, da minha rua, da minha cidade, enfim. Mas não
é por esta... não é por este viés que as pessoas se mobilizam, elas se mobilizam pela
sua demanda específica: “Ah, pela minha escola; pela brigada militar, pelos
bombeiros; pela universidade”... Então a gente vê que a participação se dá desta
forma.

As opiniões dos entrevistados relatam muitos motivos para tais contextos, os baixos índices de
participação. Uma parte destas razões podem estar alinhadas ao descrédito das ações dos
governos. O representante da Sociedade Civil (SC 07) apresenta um caso específico.

o que mais a gente sente é falta de recursos por parte do governo, que nós temos
consultas populares de 2017-2018, que ainda não foram pagas. De 2018-2019 que
seria para pagar esse ano, o governo nos disse na última reunião que vai pagar dos
R$ 80 milhões, R$ 47 milhões e os outros R$ 33 milhões não vai ser pago. Definitivo,
foi categórico disse: “Os R$ 33 milhões esquece”. Então, a gente sente, a gente faz
184

um trabalho através de mídia, e tudo, e rádio, e o povo participa desses movimentos


e depois no fim, é frustrado esse trabalho. Então, a gente fica chocado, mas claro que
a gente corre atrás e procura sempre ver se consegue os recursos para ao menos
resolver algum projeto de desenvolvimento regional, e, também nos municípios, nós
estamos trabalhando para isso.

A conjuntura política também é usada para explicar o porquê de tão pouco interesse,
demonstrado pelos cidadãos, em participar. O representante da Sociedade Civil (SC 08)
manifesta

acho que perdeu bastante a credibilidade por conta do contexto todo, geral, assim,
do País, de corrupção, de falcatrua, de privilégios pessoais, ... Então as pessoas
desacreditam um pouco e elas participam pouco. Eu vejo assim. E a gente tem
participado muito dos processos da participação popular, da consulta popular, do
orçamento participativo do próprio município, ele tem uma participação pequena se
comparada há alguns anos atrás. Então, prá nós conseguir mobilizar a sociedade a
participar desses fórum e até mesmo do processo da consulta popular que traz
recursos, nós temos que motivar muito e a gente só consegue uma adesão um pouco
maior porque as áreas buscam para ter proveito próprio por área, a educação, a
saúde, a segurança,... algumas áreas que mobilizam mais, elas vão buscar no próprio
setor ... a saúde mesmo, quem é vinculado à saúde vai votar, quem é vinculado à
educação mobiliza através dos alunos que são muitos, a segurança, que eles fazem
corpo a corpo na rua, se mobilizam nas empresas,... Mas a espontaneidade das
pessoas de ir como um dever de cidadão, como exercício de cidadania, caiu muito.
Existe um descrédito, hãnn... em função do contexto geral.

O representante do Ministério Público (PJ 02) apresenta um segundo exemplo:

Eu acho que não há assim, um maior... até talvez eu acho que se acentuou... acho que
houve aquela explosão daqueles movimentos de 2013 ali, mas depois a interpretação
que eu tenho assim, é... que houve um desencanto com a política, e me parece assim,
que se pudesse traduzir, a minha percepção pessoal, é que cada um foi cuidar da sua
vida. Acho que houve um desencanto com a questão pública de uma forma geral, de
que isso não tem jeito, que isso não tem... Então, porque eu noto assim, eu vou viver,
eu vou trabalhar, eu vou cuidar da minha vida, do meu ganha-pão... e vou aguardar
as eleições. Me parece que foi isso lá atrás que desembocou agora nessa eleição
geral. Acho que... me parece que não há... eu não sei como é que vai ficar daqui para
frente. Mas eu acho assim que a participação da... da cidadania, ela podia ser bem
superior. Bem superior

As questões culturais, que incluem motivos que vão além dos episódios mais recentes da
história do País, também foram lembradas. A fala do Agente Político (AP 08) traz referências
assim.

no caso aqui do Executivo e Legislativo, em alguns assuntos específicos de decisão,


tem as chamadas audiências públicas, que nós poderíamos dizer que é um processo,
é um instrumento já da articulação propriamente dita, mas isso também esbarra um
pouco naquilo que eu falava antes, não sei se isso é falha do nosso sistema político,
organizacional da própria sociedade, talvez de uma cultura muito presidencialista, o
Brasil tem um pouco isso, cultura do presidencialismo, seja em um CTG, seja em
185

qualquer outra entidade, você elege e deixa para o presidente resolver; nós não temos
muita cultura da participação, do querer interferir, e não se estimula mesmo, os
próprios poderes acabam não estimulando muito isso, então isso dificulta.

O representante da Sociedade Civil expande estas críticas ao se referir à alienação dominante


entre à população:

Eu acho que nós estamos c... com um grande problema de... de participação, tá? Eu
sou [...], eu já fui presidente de clube de futebol, já fui presidente de associação de
estudante, já participei de tudo. E eu verifico que sempre são as mesmas pessoas que
estão participando nos mais diversos grupos. Então assim, aquela pessoa que está
participando do Rotary, é a mesma que participa do Conselho de Trânsito. Aquela do
Rotary é a mesma que participa do... da Associação Comercial, do COREDE. Tá? Eu
acho que a nossa sociedade, ela não tem um sentimento de pertencimento da
administração pública, nós não temos... a gente não desenvolveu ainda o... o interesse
público. Tá? Eu vejo isso... muito por quê? Não há um sentimento de participação,
de pessoas que querem participar.

Os próprios entrevistados sugerem algumas alternativas para superação de tal quadro. Algumas
opiniões indicam a adoção de ferramentas tecnológicas para viabilização de uma maior
participação dos cidadãos. Houve, nesta linha, manifestações apontando a implementação, nos
sites municipais, de funcionalidades que permitissem a interação entre o poder público e os
cidadãos. Em outros casos, alguns municípios já adotam esta solução, foram adquiridos e
disponibilizados à população aplicativos para smartphones. Estes programas, via de regra,
permitem acessar serviços oferecidos pelo poder público além de encaminhar demandas para
diversos setores da administração municipal. Embora estas ferramentas, tanto os sites quanto
os aplicativos, se constituam em mecanismos mais modernos de relacionamento entre a
população e os administradores municipais, desponta uma preocupação, a partir do
entendimento de muitos entrevistados, de que solicitar serviços e encaminhar demandas não
são sinônimos de participação.

As redes sociais também foram muito lembradas. E podem ser identificados tanto aqueles que
concordam de que podem viabilizar uma maior participação, quanto os que se mostram
preocupados, principalmente pela dificuldade de controlar estes instrumentos. Como um
exemplo do primeiro grupo o representante da sociedade civil (SC 05) diz:

A gente... eu identifico novas ferramentas, por exemplo, se eu pegar hoje uma rede
social como uma forma de controle, eu acho que existe. Porque se nós formos pensar
assim: “Ah, a sociedade civil, como é que ela vai controlar as ações do agente público
hoje? Vai fazer um protocolo no município?” Vai fazer... o que é que ela vai fazer?
Vai chamar uma reunião? Hoje eu acredito que as pessoas utilizam muito essas novas
ferramentas mesmo para... para fazer pressão no governo, para denunciar algo que
186

está errado. [...] Mas está ocorrendo um empoderamento dessas redes sociais como
forma de controle da administração.

O Servidor Público (SP 04) acrescenta, referindo-se à amplificação dos assuntos por meio das
redes sociais:

No que eu vejo que tem bastante participação é através do Facebook, mas o jornal lá
lança uma... uma manchete com determinado assunto relacionado a... à Câmara ou
à Prefeitura, e eu vejo que daí tem bastante repercussão ali na... no Facebook, essas
notícias. Aí a população realmente contribui bastante.

Apesar destas possibilidades envolvendo o emprego das redes sociais como instrumentos de
participação elas são utilizadas, pelo menos do ponto de vista dos administradores públicos, de
forma muito incipiente e cautelosa. Os entrevistados apontam alguns motivos para conduzirem-
se de forma moderada. Para um deles, o Agente Político (SP 02), as manifestações dos cidadãos
pelas redes sociais, em parte das vezes são influenciadas e nem sempre representam o real
pensamento da sociedade. O entrevistado diz:

Mas também, hoje, as mídias sociais, elas nos preocupam muito, porque as pessoas
têm... têm participado – digamos assim – tido uma participação muito em redes
sociais que o primeiro comentário que vem, se ele é positivo, todos vão na
positividade; se ele é negativo, todos vão num comentário negativo, sem conhecer
muitas vezes as duas versões do que é positivo ou do que é negativo.

Uma outra preocupação, e um pouco mais radical, é dada com palavras diferentes por um
entrevistado da Sociedade Civil e por um Agente Político. O primeiro, praticamente resume e
coloca tons mais suaves na fala do segundo. O representante da Sociedade Civil (SC 05) declara
dizendo que “claro que a gente tem que cuidar também para não chegar num ponto de exposição
demasiada das pessoas, cometimento de algum ilícito, algum insulto”. O Agente Político é mais
explícito:

Eu digo que hoje a internet está aí para ser usada. Tem os órgãos de oitiva, as
ouvidorias, só que isso tem um outro lado. Isso veio para dar vez e voz para a
sociedade e eu não discordo disso. Só que está sendo muito mal-usado. Estão usando
internet para ofender, para agredir, para macular pessoas de bem e isto não dá para
aceitar. Isso não dá para aceitar. A internet é um instrumento valioso, mas tem que
ser bem usado. E deu voz a pessoas inescrupulosas, que não têm nada a perder. O
seu caráter muitas vezes duvidoso, e se auto revelando o que tem no seu interior.

A questão do emprego das redes sociais, ou o seu pequeno uso, pode ser reflexo de causas mais
simples que a animosidade ou a falta de tolerância das pessoas. Uma delas é aquela muito
comum ao serviço público de um modo geral e que se concretiza, como o caso dos portais da
187

transparência, na falta de disposição para a inovação por meio de iniciativas próprias e


voluntárias. Uma outra razão, também característica das administrações municipais,
principalmente em municípios de pequeno ou médio porte, é apresentada pelo Agente
Comissionado (AC 07):

Na verdade, assim, olha, essa é uma falha nossa, porque a gente publica as matérias
a... e... tem o feedback da comunidade. Eles... só nós temos um problema sério que...
como nós temos poucos recursos humanos aqui, eu não tenho condições de... porque
a... de responder. Alguma coisa eu respondo, tento resolver, só que por nossa equipe
muito reduzida, é muita correria, então às vezes eu fico devendo.

Outro encaminhamento, mais tradicional, mas nem sempre lembrado, está presente nas falas de
muitos entrevistados. São todas as ações tanto à conscientização da sociedade quanto à
educação das pessoas, principalmente crianças e jovens em idade escolar. O Agente político
(AP 05) exemplifica

então ali a gente botou, fez um resumo do que é a Câmara, do que é Executivo, do
que é Judiciário. E aí a gente dividiu os vereadores e fomos para as escolas
municipais e estaduais explicar a função do vereador, do prefeito, do judiciário, coisa
e tal. E então, o objetivo disso era conscientizar as pessoas para que venham para a
Câmara de Vereadores para que conheçam um pouquinho e também que se
sensibilizem, que venham, porque não basta votar. Tu tem que cobrar do... eu dizia
na minha campanha: “Não adianta só votar em mim, mas tem que saber o que é que
eu estou fazendo, tem que me cobrar também”. Então esse é um desafio grande, eu
acho que tem que fazer um trabalho de base, um trabalho de campo, ir para as
escolas.

O Agente Comissionado (AC 01) não apenas discorre sobre a conscientização em relação à
importância da participação dos cidadãos como também sugere a inclusão de conhecimentos
referente a administração pública nas escolas:

Então eu acho que isso é o que nos desafia a criar ferramentas, criar formas, criar
sensibilizações e criar metodologias do cidadão entender o que é um PPA, de ele
entender o que é uma LOA, de ele entender o que é uma LDO, o papel de cada uma
dessas leis no processo orçamentário. [...]. Então de ele entender, de a gente criar e
nós não temos muito uma cultura de ensinamento de gestão, não temos, por exemplo,
a gente pega na educação, qual é a disciplina que trata de questões de gestão, de
coisas, que a gente tem no ensino médio, por exemplo, que poderia ser o primeiro
passo, primeiro momento para as pessoas já irem se acostumando com isso. A gente
só vai falar em gestão se a gente for fazer um técnico em administração, se for fazer
uma universidade que vai precisar disso, estudar isso, mas na nossa educação o tema
de gestão, como é uma lei, como não é, como tu aprova uma lei, essas questões de
cidadania não perpassam pelo currículo da educação, e a gente sempre fica nessa de
ter que estar avançando um passo e retrocedendo dois, e assim a gente vai tentando
caminhar.
188

Os entrevistados também se manifestaram sobre a prática de controle dos governos por meio
dos Conselhos Municipais. A existência destes conselhos, como exemplifica Allebrandt (2003),
remonta a períodos pré-constituição de 1988. A partir Constituição Federal em vigor,
entretanto, e de instrumentos específicos na legislação posterior, o número de conselhos nos
municípios cresceu vertiginosamente. A participação, neste caso, não envolve todos os
cidadãos, mas somente alguns representantes de entidades, associações e órgãos
governamentais. Mesmo assim, como afirma o representante da Sociedade Civil (AC 09), “acho
que essa é uma análise profunda que nós precisamos fazer, que os conselhos foram criados
como uma forma efetiva da participação da população”.

O representante da Sociedade Civil (SC 03) refere-se à importância dos conselhos municipais
ao dizer que

os conselhos, eles cumprem um papel fundamental, seja na fiscalização, seja na


proposição de políticas públicas, no acompanhamento, na... Em ajudar na execução
de políticas públicas. Então cada conselho tem a sua tarefa, tem a sua... obrigação
legal, mas para além disso tem outros deveres sociais que deveriam ser... ser
implementados.

O Agente Político (AP 07) também manifesta uma opinião positiva embora reconheça que
muitas pessoas tem uma visão e opinião bem diversa sobre os conselhos:

Conselhos têm... são... são um espaço de atuação muito grande da sociedade, onde
nós... porque eu vim com o... eu sou hoje, eu sou [...], mas eu participei muito de
Conselhos representando a sociedade civil, e vejo da importância que tem o Conselho
na vida do poder público. Então essa parceria toda nós não temos que enxergar os
Conselhos como nossos adversários. Nós temos que enxergar os Conselhos como
nossos apoiadores, mesmo que a crítica venha, sendo críticas construtivas.

Outros, contudo, referem-se aos conselhos de uma forma um pouco mais negativa, quase que
afirmando não serem úteis e nem auxiliarem a administração municipal. Um exemplo está na
fala do Agente Comissionado (AC 08):

Os conselhos são necessários, porque a lei exige. Precisa se formar um Conselho


Municipal de Turismo. Precisa se formar um Conselho Municipal de
Desenvolvimento, Conselho Municipal de Esporte, Conselho Municipal de Educação,
de saúde... mas eu não vejo muito resultado diferente do que o próprio poder público
trabalha. “Ah, vamos reunir o conselho, porque o conselho tem uma novidade, tem
uma ideia, tem alguma coisa para acrescentar”. Dificilmente isso acontece.
Normalmente, a própria administração tem que apresentar a ideia mais ou menos
pronta e o conselho, porque é exigido pela lei, vai lá e ratifica: “Vamos fazer”. Mas
eu acho que o conselho, se houvesse uma participação, um interesse maior das
pessoas que estão fora da administração, o conselho poderia, muitas vezes,
189

aconselhar, como diz o próprio nome. Poderia sugerir, poderia ter ideias novas para
apresentar. Mas, na prática, não se nota muito isso.

O Agente Político (AP 01) tem uma opinião diferente ao dizer que os conselhos, no município
em que reside, são atuantes embora reconheça que, às vezes, os administradores do município
e os conselhos enfrentam-se no debate de questões mais polêmicas:

Eu penso que teve momentos de embates. Tanto o Conselho da Saúde, quanto o


Conselho do Meio Ambiente, bem como o da Educação, porque às vezes – vamos
dizer – o conselheiro nem sempre ele tem a percepção dos limites do orçamento. Às
vezes os conselheiros: “Não, tem que fazer isso”. Nós, por exemplo, tínhamos uma
questão com relação ao número de crianças atendidas por monitora na escola
infantil. Então às vezes a observação: “Não, quanto menos... quanto mais monitor é
melhor para de fato cuidar”, mas só que aí você diz: “Poxa, mas tem um limite
também. Eu não posso colocar uma monitora para cada 2 crianças”. Então, ali
tínhamos um embate, que achavam que tinha que... nós conseguimos estabelecer um
limite, eu acho que de 1 monitora para cada 5 crianças, e que é uma coisa que custa,
você sabe disso. Então ali foi um embate.

O poder público tem responsabilidades nestas questões pois a atuação dos conselheiros, como
a de qualquer outro cidadão, a participação popular nas ações dos governos pressupõe a
existência de informações confiáveis e oportunas. Stiglitz (1999), ressalta o interesse e a
capacidade de participação dos cidadãos é minada pela ausência ou redução da quantidade de
informações disponíveis. Os representantes governamentais nestes conselhos normalmente são
detentores de uma maior quantidade e melhor qualidade da informação. Os processos de
deliberação nestes conselhos, requerem cidadãos capazes de formular juízos informados e
racionais (LÜCHMANN, 2002). O representante da Sociedade Civil (SC 03) esclarece:

O conselho poderia ser mais atuante. Mas o poder público ele não facilita também.
Ele... como se pode dizer que ele dificulta? Ele dificulta porque ele traz as prestações
de conta muito em cima da hora, com prazos exíguos prá aprová. Então, não se tem...
aliás, aliado a falta de tempo dos conselheiros e o prazo pequeno,... acaba que...
vamos aprová assim ... e vai se passando.

O ponto principal das discussões envolvendo os conselhos, entretanto, diz respeito à


composição dos mesmos. É certo que os instrumentos legais que criam e disciplinam os
conselhos estabelecem regras para a definição de seus componentes. As dificuldades, contudo,
são muito semelhantes àquelas apontadas para a participação dos cidadãos nas audiências
públicas, por exemplo. Como dizem muitos entrevistados “são sempre os mesmos”. Isto se
agrava porque tem uma face legal nesta repetitividade visto que, nos conselhos, normalmente
são as instituições que indicam seus representantes. O entrevistado da Sociedade Civil apresenta
190

um caso concreto ao dizer ”até porque tem entidades na cidade, eu cito uma, por exemplo, que
não é segredo, que é o [...] aqui é presidente há... sei lá, 20 anos.”

Os problemas envolvendo a indicação de cidadãos para um determinado conselho apresenta


outras facetas. Como diz o entrevistado representante da Sociedade Civil (SC 04) muitas vezes
estes conselhos são “chapa branca”. O Agente Político (AP 14) mostra um exemplo real:

E pessoas que participem, agora nós estávamos discutindo aqui um conselho com 27
membros. Não vai funcionar. 27 membros, onde 11 ((enfatizou)) membros são
indicados pelo prefeito municipal, mas toda a sua base administrativa faz parte,
secretário de saúde, secretário de... Todas as secretarias, e 16 da sociedade.
Primeiro, nós não recebemos, por exemplo, um documento dizendo que a [...], por
exemplo, vai participar do conselho, porque pode chegar lá, por exemplo, aprovar a
lei, chegar lá. Mas eu não... Quem autorizou colocar essa instituição aqui no meio do
conselho? E vai. Aí 11 da Prefeitura, que, com certeza, esses 11... porque são
subordinados, vão participar das reuniões. Agora os 16 da sociedade? Será que
sempre vão participar? E aí tendo 11 do prefeito, e participa 5-6 da sociedade. Quem
é que vai ganhar voto ou nas decisões? Quem é que vai ter autonomia? Ou vai ter a
soberania? Então é esse o problema que eu vejo dos conselhos, sabe?

Uma situação ainda mais preocupante é apresentada pelo representante da Sociedade Civil (SC
04) referindo-se ao fato de que muitos conselhos somente existem para legitimar ações do poder
público:

Prefeitura hoje é movida a conselhos. Tem conselho para tudo, tem que criar, e a
maioria dos conselhos a gente é frio e franco, é um livro de atas. Tenho aqui, o
Conselho de Desenvolvimento Rural, que funciona bem. O da saúde, da educação,
tem que criar conselho de habitação, conselho de saneamento básico, conselho do
meio ambiente. Eu nem me lembro mais de todos eles, mas muitos são livros de atas,
só com atas.

Quase todos os entrevistados da Sociedade civil referiram-se a contextos como estes. A


simulação da existência e do funcionamento dos conselhos municipais de forma a imprimir uma
aura de legitimidade perante as exigências da legislação e das normas estabelecidas por políticas
públicas dos Estados ou da União.

6.3.3 A colaboração dos cidadãos

Dos conceitos que sustentam a ideia de Governos Abertos, a colaboração dos cidadãos tem sido
pouco explorada, tanto no sentido acadêmico quanto no universo social e político. A parceria
entre os governos e os cidadãos é, além da vontade política, uma decorrência de administrações
públicas transparentes e da participação dos cidadãos. As dificuldades observadas nos
191

processos de participação, tanto para existirem quanto para a sua viabilidade, mostram o longo
caminho que deve ser percorrido.

O envolvimento das pessoas na solução de problemas da comunidade, na implementação de


políticas públicas e, principalmente, na produção e cocriação de serviços públicos são situações
onde os processos colaborativos podem ser concretizados. Destes modelos, a realização
conjunta de serviços de responsabilidade do poder público representa uma inovação, não apenas
na execução do próprio serviço como também na forma, na vontade, no comportamento, no
relacionamento e na interação entre governo e cidadãos.

Alguns entrevistados foram céticos ao responder sobre o tema. As alegações partem da


constatação de que as administrações são fechadas e não oferecem oportunidades para que os
cidadãos colaborem. O representante da Sociedade Civil (SC 05) fala destas situações:

Eu acho que isso é que as pessoas têm que... ser os gestores, eles conseguirem fazer
com que as pessoas se sintam donas de determinados processos, elas acabam
participando. Se o administrador público, se o prefeito municipal, cria um conselho
e deixa essas pessoas decidirem, elas acabam sentindo que elas têm pertencimento a
aquelas decisões, a aquele... a aquele local, e elas acabam tendo um esforço maior,
tá? Por isso que, como eu disse antes, eu acho que as nossas administrações públicas,
elas são muito fechadas. Se eles conseguirem abrir e a população verificar que tem
resultado, elas acabam... que era também... a consulta popular, a participação
popular, a ideia é essa, a ideia é que as pessoas possam decidir, isso o Boaventura
de Sousa Santos já disse várias vezes: “Deixe as pessoas... dá a possibilidade que as
pessoas decidam e elas vão... vão decidir”.

Houve declarações em sentido totalmente oposto. Alguns entrevistados interpretam o


sentimento das pessoas e atribuem a elas a convicção de que tudo é responsabilidade do
governo. Como diz o representante da Sociedade Civil (SC 03)

... pela sua história e tal, eu vejo que há uma... Existe uma carência nesse sentido. Eu
vejo que as pessoas... que a comunidade em si, ela delega muito ao poder público a
iniciativa e a execução das coisas. Não quer participar muito, não gosta de colaborar
muito. É uma percepção que a minha pouca trajetória de vida enxerga assim. Mas a
gente cria canais, cria possibilidades, tenta... tenta fomentar às vezes não... não tem
aquele... o resultado esperado mas eu acho que é uma... isso é uma questão que
muitos, muito se tem que avançar e muitos, muitos, muitos locais enxergar a...
enxergar a coisa pública também como parte, parte da... da sua responsabilidade
também.

Estes dois depoimentos não significam que os cidadãos, e também as administrações, estão
completamente alienados e alheios às possibilidades de ações conjuntas. Elas apenas ocorrem
em momentos muito específicos, esporádicos e envolvendo poucas pessoas e organizações.
192

Exemplos nesta direção são todas as ações sociais, ou solidárias, realizadas por voluntários e
organizações em ocasiões, geralmente, pontuais. O representante da Sociedade Civil (SC 08)
ilustra uma situação:

Vamos fazer um mutirão no bairro, chamado pelo poder público, a participação é


baixa. Vamos fazer... O que que eu vejo, ainda que é forte no poder... chamado pelo
poder público é junto ao gabinete da primeira dama, existe um histórico já de ações
que envolve bastante voluntariado, via clube de mães. Eu acho que este é um trabalho
forte que poderia servir de modelo prá... prá ampliar este trabalho, né? Eu sei que
sempre que se faz ações comunitárias em benefício de entidades, chamado pelo
gabinete da primeira dama ela tem uma participação muito grande de voluntariado

Em outro exemplo o Agente Político (AP 10) mostra a importância da participação de


Organizações Sociais neste modelo de trabalho ao dizer que:

Aqui na nossa cidade nós inclusive... a gente tem... hoje é até difícil falar, porque tem
muito voluntário que trabalha mais em ações sociais do que o próprio cidadão que é
funcionário público, a gente vê em várias árias, aqui em [...] é assim, eu falo o meu
munícipio e sou vereador dessa cidade, mas eu acho que as pessoas de [...], na
verdade elas são bem prestativas quanto a esse serviço, e muitas vezes talvez até não
fazem mais por não receber um convite, e diferente das ações da Câmara, é bem
engraçado isso, eu falo que as pessoas não vem até a Câmara, mas quando tem um
serviço voluntário as pessoas estão prontas, é uma diferença que a gente muitas vezes
não consegue dimensionar essas diferenças, mas se tu olhar várias áreas de Rotary,
clube de mães, terceira idade, se tu hoje falar com qualquer grupo dessas pessoas,
elas sempre estão prontas para ajudar.

Episódios desta natureza, combinando serviços ou atribuições dos governos municipais com
instituições e/ou cidadãos, tem ocorrido, também, de forma mais coordenada, rotineira e
incluindo, além das questões sociais, solidárias ou humanitárias, a conservação e o
melhoramento do patrimônio público. Como caracteriza o Agente Político (AP 01) “uma
espécie de PPP, Parceria Público-Privada meio informal”.

A organização e realização de eventos constitui um dos formatos destas parcerias. Estes casos
envolvem, além do próprio poder público, empresas privadas, associações de classe ou
organizações sociais. A Agente Político (AP 01), mais uma vez, ilustra ao dizer que “a [...], por
exemplo, é um caso típico. São pessoas que se envolvem, são centenas de pessoas que se
envolvem, às vezes por meses preparando, e de forma absolutamente voluntária sem receber”.

As ações conjuntas englobando as administrações municipais e os cidadãos dão-se, ainda, sob


outras formas. Sobre a conservação do patrimônio público o representante da Sociedade Civil
dá um exemplo: “Tem algumas iniciativas, mas assim, não são muitas. Tem alguns empresários,
193

nesse sentido assim, que adotam, adotam praças, adotam... Nós temos o caso do proprietário da
[...] que ele tem... ele tem o trevo da entrada da cidade, é ele que cuida.” As pessoas, na busca
por melhores instalações e equipamentos públicos, também são lembradas. O Agente Político
(AP 16) ilustra um caso

envolvendo a área... a área de esporte. Nós tivemos 3 regiões interessantes, o


município entrou com algum material e o pessoal começou a fazer ele mesmo a
reforma de alguns espaços públicos, que é uma experiência muito interessante,
porque... em 2 áreas dessas, a comunidade tinha destruído as áreas que tinha
antigamente. Porque quando eu fui [...], da outra vez, num dos casos, a gente tinha
recebido recurso do Ministério dos Esportes, por exemplo, tinha feito vestiário, tinha
feito toda uma estrutura para um campo, uma... uma... mais uma dessas academias
de ginástica, e tal. E o campo e o vestiário lá foi dizimado. Agora, com o interesse da
comunidade em retomar, a gente fez um acordo: “Não, vocês... a gente dá o material,
vocês mesmos recuperam e reformam”. Esse processo é muito emblemático, até
envolve Ijuí nisso, porque eles foram buscar em Ijuí a grama do campo do São Luís.

Por outro lado, em muitas oportunidades, estas parcerias sofrem inibições ou limitações em
decorrência de impedimentos legais que vigoram em determinadas cidades. O Agente Político
(AP 05) relata:

Aquilo foi doado por empresários, por construtores. Inclusive, passou... foi aprovado
na Casa agora, um... um projeto de... de que vem de encontro a isso que tu falaste
agora, da colaboração. As pessoas por exemplo, um município que poder receber
patrocínio, doações, porque ah, o [...] quer ajudar, quer colaborar com o município,
ele quer fazer a doação de uma praça. Ele quer fazer a doação de uma academia ao
ar livre, vamos botar numa praça. É isso. Eu acho que essa é a participação, eu acho
que isso é importante para [...], e para esse projeto, enfim. Na casa, no município,
podendo receber esse tipo de doação, as pessoas, a comunidade querendo ajudar,
querendo entrar. Nós temos várias praças que são cuidadas pelos moradores. Nós
temos canteiros centrais que são adotados pelos comerciantes. Então, o povo de [...]
já vem trabalhando nesse sentido, já vem querendo ajudar nesse sentido. E é... já
estão fazendo. São boas iniciativas, são boas iniciativas.

Um terceiro modelo em que estas parcerias são executadas relaciona-se, mais diretamente, a
ações de caráter assistencial e humanitário. Em muitos municípios o governo municipal delega,
às vezes de maneira informal, as ações de acolhimento de pessoas em tratamento de saúde e os
cuidados com animais abandonados a entidades ou associações e pessoas da comunidade. O
Agente Político (AP 08) demonstra com clareza ao dizer que

em alguns temas específicos da cidade, nós temos acho que um espírito colaborativo
grande do nosso povo. Vamos pegar, por exemplo, essa questão do cuidado com os
animais, o que tem de gente envolvida nisso, é um público muito grande, muitas vezes
fazendo coisas que é atribuição do Poder Público fazer, pô, vamos pegar questões
assistenciais, essa área de cuidado com a saúde, quantas ligas, quantos... entidades
que nós temos nessa linha, e a colaboração da sociedade normalmente é presente
nisso, ou campanhas de agasalhos e etc., que se fazem, normalmente com grande
194

êxito, sempre com um espírito colaborativo razoável da nossa sociedade. Então eu


penso assim, as pessoas até colaboram, mas elas precisam ser tocadas para
colaborar, para se sensibilizar, para participar.

A última frase da citação estabelece um dos pontos fundamentais da colaboração dos cidadãos.
Esta atitude pressupõe ausência de remuneração direta pelo poder público. Caso contrário
constituir-se-iam em um contrato de negócios ou serviços e, como tal, acarretariam obrigações
para quem executa as ações estabelecidas. O representante das Empresas de Software (TI 01)
reforça o poder da sensibilização das pessoas:

As pessoas, elas estão mais dispostas a ajudar a construir, desde que tenham o devido
apoio. Simplesmente, o poder público só esperar para que as pessoas cuidem do seu
meio-fio, então, o exemplo que a gente está usando aqui, isso não vai acontecer.
Precisa ter um estímulo, precisa ter uma motivação a mais para acontecer. E quando
o administrador público consegue fazer isso, flui mais do serviço, dentro da
comunidade.

No caso específico deste trabalho as ações de colaboração dar-se-iam, de forma preponderante,


por profissionais de informática, programadores de computadores e estudantes de computação.
O mesmo entrevistado (TI 01) sugere:

O que falta é direcionar eles: “Ó, vamos caminhar por aqui, que isso aqui é o que a
sociedade hoje está pedindo”. Esse pessoal produtor de software, principalmente as
startups, eles produzem pelo prazer de construir, pelo prazer de fazer algo. E se der
certo, se emplacar alguma coisa, show. Agora, se não emplacar, ficou lá o produto.
Nós conversávamos, agora, esses dias, com um desenvolvedor, onde ele fez N
produtos e estavam engavetados. Ele disse: “Não, eu tenho esse aqui, que está
engavetado, que na minha época de acadêmico, lá, eu desenvolvi e tal... “, eu: “Cara,
isso aí, nós temos que dar continuidade nesse produto, aí. O produto tem uma linha
de mercado esperando por ele, aí.”. Então nós somos, nós estamos nos tornando e a
cada vez mais aventurando isso aqui dentro da empresa, de ser um incentivador
dessas iniciativas. A gente precisa dessas pessoas, precisa dessas ideias que estão na
cabeça desses jovens aí, entende? [...] Falávamos, há poucos dias, numa reunião,
da... das startups. A startup, ela produz sem a mínima pretensão de ganhar dinheiro,
e sim pela satisfação de produzir algo. Agora, se ela... se tiver alguém que direcione
essa capacidade produtiva, para produzir algo que seja uma necessidade da
sociedade, acho que a gente ganha muitos quilômetros por hora, aí, na solução de
alguns problemas ou na implementação de softwares que agreguem para a sociedade.

6.3.4 Governo aberto

A adesão do Brasil, como um dos fundadores, da Parceria para Governo Aberto (OPEN
GOVERNMENT PARTNERSHIP, 2017) tem ocasionado uma série de medidas com o objetivo
de, principalmente, aumentar as ações e os índices de transparência pública. Os demais pilares
que fundamentam o conceito de Governo Aberto, a participação e a colaboração dos cidadãos,
195

continuaram restritas às iniciativas e mecanismos definidos anteriormente. O portal da


Controladoria Geral da União (CGU) detalha, em uma linha do tempo, todos os instrumentos
implementados (CGU, 2019).

A participação do Brasil nesta parceria internacional, com exceção da implementação pontual


das medidas estabelecidas, não ocasionou a inclusão deste tema na agenda de debates em nível
subnacional. Uma evidência bastante significativa é o fato de que, quando questionados, a quase
totalidade dos entrevistados afirmaram não terem ouvido e não conhecerem o que significava
o termo “governo aberto”.

Houve algumas tentativas de aproximações conceituais partindo, quase que exclusivamente,


dos Agentes Políticos e dos entrevistados da Sociedade Civil. Para os entrevistados do primeiro
grupo a palavra “aberto” influenciou as respostas fazendo com que, para alguns, o termo
“Governo Aberto” significasse abrir as portas, em expressões como se ouvia antigamente que
“o nosso governo está de portas abertas” sem deixar claro o que, exatamente, isto significa.

Outros Agentes Políticos relacionaram o termo às iniciativas de atendimento aos cidadãos,


recebendo-os em gabinete e aberto para ouvir suas demandas. Como diz o Agente Político (AP
12) “Então daria para o Prefeito uma vez por mês que seja um dia para receber a comunidade e
não ficar noventa dias para marcar uma audiência com o Prefeito. Deu noventa dias não dá,
espera mais trinta, né.”

O maior número de entrevistados, incluindo agora os representantes da Sociedade Civil


associou o termo “governo aberto” à transparência pública, talvez inspirados pela palavra
“aberto”. Um deles adicionou a participação dos cidadãos ao conceito. E apenas um deles, o
representante da Sociedade Civil (SC 03), apresentou uma definição que inclui também a
colaboração:

Um governo aberto? Bom aí gente pode estar... tem diversas possibilidades, mas
pragmaticamente falando, eu acho que é um... é um governo que... dá transparência
aos seus atos, dá transparência às despesas e aos processos que desencadeiam... aos
processos legais que desencadearam essas despesas, eh... E também o governo que
dê ferramentas para as pessoas participarem, seja para decisões orçamentárias, e
seja para decisões pontuais de política pública, enfim, de diversas áreas. Um governo
aberto para mim seria um governo que de forma participava e colaborativa, envolva
a sociedade e dê possibilidade para a sociedade não só participar como também se
apropriar das decisões e das políticas públicas que estão sendo desenvolvidas. Eu
acho que... definindo, seria isso.
196

6.3.5 Dados abertos

O cenário relativo ao conhecimento do tema relacionado aos dados abertos pode ser descrito
como um pouco mais sombrio do que aquele envolvendo governos abertos. A exemplo das
respostas dadas ao questionário enviado às administrações municipais, com poucas exceções,
o momento de questionamento na entrevista, foi a primeira vez em que se depararam com tal
ideia. Para ilustrar numericamente apenas oito entrevistados admitiram conhecer o assunto. Os
demais, ou foram taxativos em negar, ou responderam de forma que não permitiu interpretar
como ciência do conceito.

As tentativas para conceituação foram quase tão diversas quanto as pessoas que as
manifestaram, mas podem ser identificadas duas associações. De um modo geral o termo remete
à ideia de transparência, novamente influenciados pela palavra “aberto”. A segunda
aproximação traz, novamente, o ditado “nós estamos de portas abertas, nossos dados estão
abertos”. Este nível de conhecimento não é exclusivo do território gaúcho nem brasileiro. Um
estudo desenvolvido por Said-Hung, Valencia Cobos e Cancino Borbón (2019b) mostra uma
situação praticamente igual na Colômbia. O mesmo, muito possivelmente, ocorre nas demais
nações.

O conceito de dados abertos é muito pouco conhecido. Embora se possa argumentar que, por
ser um assunto relativamente técnico, não existe a expectativa de que todas as pessoas,
independentes de suas atividades e qualificações, o conheçam. Ele constitui-se, por outro lado,
em um tema social e político e, desta forma, deveria, ao menos, estar na agenda de debates.

Algumas manifestações, entretanto, são fortemente alinhadas aos princípios estabelecidos pela
comunidade de dados abertos. Como relata o Agente Comissionado (AC 01)

eu pensava, “mas o que é esse negócio de dados abertos, o que é isso de dados
abertos?”. Aí eu fui ver, “mas claro, lógico”, tu deixa tudo aberto, as pessoas vão
pegar, os programadores com aqueles dados naqueles formatos, vão conseguir criar
mecanismos e ferramentas para ajudar. E depois que a gente começou a trabalhar
com a transparência, fui estudar lei da transparência e tudo mais, fui ver o que era o
dados abertos, o conceito de dados abertos que o Governo Federal estabeleceu na
regulamentação da lei e tal, os formato de arquivos, tudo como tem que ser. Eu acho
que é o caminho, porque se eu botasse só um pdf ali, aquela informação vai ter uma
atividade para aquela pessoa só que foi buscar ela. Agora se ela tiver disponível em
pdf, em texto, em html, em xml, no formato que for, a pessoa pode pegar aquela
informação e transformar ela numa linguagem, em um jeito que vai ajudar outras
pessoas a ter aquela informação. Então eu acho que não custa nada a gente salvar
197

em um formato, guardar em um formato ou disponibilizar em todos os formatos. Hoje


é tudo informatizado.

E também como se manifesta o representante das Empresas de Software (TI 02) quando diz que
dados abertos é um conceito que não significa apenas um maior conjunto de ações referentes à
transparência pública:

Se a gente falar em transparência, não. Transparência é um dado, uma coisa que hoje
se discute muito a forma da transparência, como é que eu vou mostrar isso... agora,
dados abertos, que é uma coisa, no meu modo de ver, diferente de transparência, não
é? Porque transparência está dando a informação porque as pessoas querem auditar.
A transparência é você... é quase uma... é auditar o que está sendo feito com o
dinheiro público, na verdade, é isso. Pode resumir alguma coisa, mas é isso. O dado
aberto, não. O dado aberto é diferente, ele é mais profundo do que... ele... a ideia...
ele provoca uma discussão econômica, ele gera produto, ele é diferente do que a
transparência. Mas a transparência, eu acho que, nos últimos tempos, tem sido muito
falada e quem não tiver a transparência sofre muito na mídia e coisa. Agora, dados
abertos eu não vejo, sinceramente, eu não vejo hoje nenhuma... é uma pena, porque
eu acho que seria um processo, inclusive, importante para o país, mesmo.

As reações dos entrevistados, também aqueles que não conheciam o assunto, foram em direções
distintas. De um lado uma espécie de euforia pelas potencialidades percebidas e, de outro,
receios e preocupações com as dificuldades atuais e futuras, além das questões éticas que
certamente existirão no processo.

Uma opinião negativa é dada pelo Agente Político (AP 13): “Então, Dados Abertos para mais
gente ver, para quem entende muito bom, para quem entende? Não sei qual será a reação”. O
pequeno conhecimento sobre o tema talvez tenha motivado esta fala. É, no entanto, significativa
pois mostra também o desconhecimento em relação às atuais ações de transparência e dos seus
impactos nos cidadãos.

Outras declarações, contrárias ao tema, têm a intenção de encerrar o assunto antes mesmo de
ser conhecido e debatido pelos cidadãos. O Agente Político (AP 02) generaliza ao dizer “na
verdade eu já tinha ouvido falar nesse projeto, acho que os municípios ainda têm muito pouco...
digamos assim, interesse”. O Agente Comissionado (AC 08) é mais direto ao afirmar que “é
algo que pode até ser pensado futuramente. Mas não vejo, hoje, isso como prioridade”. É
necessário lembrar que o movimento de dados abertos tem sido conduzido, até o momento, pela
sociedade. As prioridades, assim, devem ser estabelecidas conjuntamente.
198

Alguns entrevistados apresentam situações específicas ao se manifestarem preocupados. Uma


destas, relacionada à ética no tratamento da informação, é colocada pelo Servidor Público (SP
04): “A primeira ideia que vem, assim, disponibilizar dados para qualquer pessoa fazer um
aplicativo... e processar uma informação, fica uma coisa meio... que pode haver modificações,
aí, assim, apresentar de forma incorreta para os outros”. Já o representante das Empresas de
Software (TI 01) vai na mesma direção embora a sua preocupação seja, quase que
exclusivamente, de caráter comercial. O entrevistado coloca:

Se essa abertura de dados, ela chega em determinado nível, onde... maduro, o nosso
concorrente, ou nós mesmos podemos pegar da concorrência, de uma forma muito
fácil, os dados, e acabar convertendo dados da outra empresa para a nossa de uma
forma muito mais leve. Se nós olharmos pelo viés empresarial, nós não gostaríamos
de facilitar a vida do nosso concorrente, e o nosso concorrente não tem interesse
mínimo em facilitar a nossa vida. E uma política de dados abertos, nesse formato,
iria abrir o jogo, entende? Então, ou seja, hoje você ganha um processo licitatório,
você vai lá, ganha outro processo. O cliente não precisa fazer um contrato
emergencial com o concorrente, até para nos dar tempo de converter.

Estes temores, como coloca o Servidor Público (SP 03) podem ser apenas temporários em
função, justamente, do desconhecimento em relação à dados abertos. O entrevistado faz
referências à receios manifestados anteriormente, com os portais da transparência, e que foram,
pouco a pouco, superados:

É isso aí, e você, se a gente olhar assim, desde que saiu a lei até a implantação, a
cabeça, a gente... vamos supor, em conversas aqui você via a dificuldade e o medo de
como essas informações seriam recebidas, avaliadas... então isso... e isso se vê assim
esse tipo de coisa, então é um pouco da consciência, da consciência por que não
abrir? Porque pode ser malvisto, pode ser interpretado de forma negativa, desde os
salários, como determinados gastos e não serviços. Mas que isso aos poucos foi
mudando, hoje já não se vê isso como um malefício, pelo menos, não enxergamos
tanto pelos colegas essa coisa, essa parte negativa da informação aberta. Pelo menos
em partes, isso está gradualmente alterando. Eu acho que a intenção dos dados
abertos pode vir, daqui a pouco não é tão difícil de imaginar que isso aconteça, isso
vai ser mais claro até com todos os benefícios que podem vir, como tu disse, de
aplicativos, de formas de serviços que a população poderia estar trazendo para
dentro, contribuindo para o município.

A necessidade de regulação, principalmente por instrumentos legais, também foi referenciada.


Segundo os entrevistados que assim se manifestaram, o sucesso de empreendimentos no
contexto de Dados Governamentais Abertos pode depender de algumas obrigações ou
responsabilidades de parte de quem disponibiliza os dados. Como apresenta o representante
das Empresas de Software (TI 03):
199

Alguém que pudesse usar essa informação e provocar negócio com ela, também.
Alguma coisa que o Estado não está fazendo, que tu, corretamente, honestamente,
está pegando aquele dado e vendendo aquela informação, porque também não é
proibido, a partir daquilo ali, tu trabalhar. Até tinha um compromisso... uma vez eu
vi essa discussão, não sei se isso se configurou em alguma norma. Quando começou
a se fazer discussões dos dados abertos, eu me lembro que eu cheguei a ser procurado
por algumas pessoas de Brasília, que me disseram o seguinte: “Tá bom, mas vamos
lá. Tu está me dizendo que vai postar o dado mensal”, vamos dizer. “Mensalmente,
tu vai me atualizar essa informação, diariamente”, sei lá. “Mas qual é o teu
compromisso de fazer isso? Porque, o que... esse é um compromisso de estado ou é
um compromisso de governo?”. O que eu quero dizer, agora eu vou lá, construo uma
empresa, nós três nos juntamos, e eu vivo, construo aquilo ali a partir daquele dado
que tu me informa. Muda o governo e tu diz o seguinte: “Não, eu não... não vai ser
mais desse jeito”.

O Servidor Público (SP 02) faz uma ressalva, um pouco mais genérica, mas igualmente
importante. A preocupação, neste caso, está relacionada ao grande número de municípios
existentes e das diferentes empresas de software que prestam serviços a estes municípios. Mais
uma vez, entretanto, relacionada à existência de regulamentos que disciplinem e organizem o
oferecimento de Dados Governamentais Abertos e, principalmente, estabeleçam padrões para
esta disponibilização. O servidor diz:

Fica fácil para tu padronizar o negócio no Brasil inteiro. Essa é uma ideia. E aí o
que ocorre? Saía lá no Portal da Transparência “aperte”, “pum”, “clica aqui”, ó,
aí aparecia lá umas 10 tabelas, tu baixa a tabela que tu quer, já naquele formato. É
um melzinho na chupeta para fazer isso, é muito fácil, só que enquanto não houver...
tu sabe, que o município, tudo só funciona com a espada nas costas, sem uma
legislação, não sai. Muito difícil tu chegar e dizer: “Ah, eu vou disponibilizar”, daí
eu disponibilizo de um jeito, você de outro jeito, outro de outro jeito, e daí, o que é
que ocorre? Até para os usuários, vai ser muito complexo, seria muito mais simples
tu ter um padrão e aí, o cara estuda um padrão, automaticamente serve para todos
os municípios.

As potencialidades envolvendo a disponibilização e uso de Dados Governamentais Abertos


foram percebidas do ponto de vista da reutilização destes dados pelo próprio poder público.
Como diz o Servidor Público (SP 03):

Mas a questão técnica, acho que... com os próprios sistemas, eles são complexos e...
esse foi a maior briga que eu tenho no meu serviço, porque eu preciso de informações
para trabalhar, para poder fazer uma análise. E quando eu... e muitas informações,
elas vem de uma forma que eu não consigo mexer com elas, ou que eu preciso fazer
um... montar... fazer um trabalho enorme para as vezes para poder somar uma
determinadas informações com determinadas condições, e uma... e isso é um trabalho
extremamente exaustivo para poder pegar algumas informações para poder fazer
uma análise. E aí, eu vejo essa dificuldade interna, que seria tipo, para quem está
aqui dentro, deveria ser mais fácil. Então, imagina disso para... para abrir facilmente.
200

O representante das Empresas de Software (TI 07) resume este reaproveitamento ao dizer que
“a questão dos dados abertos, ele tem uma questão muito importante, que não é só de
fiscalização. Ele é de compartilhamento de informações”. Estes aspectos relacionados ao
compartilhamento provocaram manifestações extremamente positivas por parte de um grupo
de entrevistados. Uma delas, na linha da transparência pública, é apresentada pelo Agente
Político (AP 05) ao dizer que

tu vai colocar, que tu vai disponibilizar que a sociedade, que o cidadão, ele possa
pegar isso, esse material, e disponibilizar ele, compartilhar, e que esse material ele
seja... seja lido por... por qualquer sistema operacional, qualquer sistema, que eles
chamam, eu acho que é linguagem de máquina que eles chamam. Então eu acho
importante. Eu acho que é um tema... importante, e é uma maneira de tu reforçar a
transparência de todo o processo

Ou ainda na direção da participação dos cidadãos como afirma o Agente Comissionado (AC
07) quando diz que a “população com informação, ela vai ter mais vontade de participar”. E
também na expectativa da colaboração dos cidadãos que pode ser percebida na fala do Agente
Comissionado (AC 01)

eu acho que a tecnologia vem para nos ajudar, porque nós precisamos é fazer as
pessoas se convencerem disso e colaborarem para que ela possa funcionar, porque a
tecnologia não funciona sozinha. É que nem o portal da transparência, se não tiver o
seu João botando as informações para dentro não vai ter transparência. Então juntar,
e os dados abertos [...]. Quando a gente abre os dados, qualquer pessoa pode ajudar.
Se todos os dados da Prefeitura estiverem abertos...

Por fim a declaração mais simples, mas talvez a mais promissora de todas, foi dada pelo
Promotor Público (PJ 02): “Isso vai ao infinito. Não, isso vai ao infinito”.

6.4 BARREIRAS E DIFICULDADES NOS MUNICÍPIOS GAÚCHOS

Os municípios gaúchos, no caso em estudo, não oferecem Dados Governamentais Abertos a


não ser em pouquíssimos casos. Um dos objetivos do presente trabalho é a investigação de quais
as razões porque não o fazem. Os entrevistados, em suas interpretações referentes a esta e as
demais questões, apresentam diversas possibilidades.

As alternativas demonstram muitas respostas possíveis. As mais significativas, além da


principal que é o desconhecimento do tema, residem nos recursos disponíveis nos municípios,
principalmente para o desenvolvimento de aplicações e administração das funções de
201

informática, a questão cultural que permeia os servidores públicos, as formas como as empresas
de software tratam estas questões, os aspectos legais, principalmente àqueles não existentes e,
por fim, os usuários dos dados disponibilizados.

6.4.1 Os municípios e a Tecnologia de Informação

Os dados apresentados no capítulo 5, referentes aos recursos disponíveis em Tecnologias de


Informação, mostram as dificuldades existentes nas administrações municipais para a execução
das atividades inerentes a área de TI. A percepção demonstrada por diversos entrevistados
aprofunda este debate ao mostrar que não se trata, apenas, da disponibilidade de recursos
financeiros.

As prefeituras municipais, fundamentalmente aquelas em que não existem profissionais


dedicados ao desenvolvimento de software, o que significa dizer em quase todas, buscam suas
ferramentas computacionais na iniciativa privada. A forma de aquisição, por meio de processos
licitatórios, é também responsável por este quadro complexo.

6.4.1.1 A organização da área de informática

As Prefeituras Municipais não seguiram os mesmos modelos adotados por outras organizações,
principalmente as da iniciativa privada, em suas estruturas administrativas. Isto adquire maior
relevância quando se olha para as cidades menores e, juntamente, para a organização das áreas
tecnológicas, especificamente das Tecnologias de Informação. Como coloca o representante
das Empresas de Software (TI 03) o “nível de informatização das prefeituras pequenas é
incipiente”. O Agente Comissionado (AC 06) concorda e acrescenta:

Ela é uma organização muito incipiente. Muito incipiente. Hoje, o nosso setor de
tecnologia da informação, ele é muito mais operacional do que estratégico. Digamos,
faltou a palavra, além do estratégico. Mas ele é muito mais operacional, hoje. Ele é
muito mais responsivo, ele é muito mais na área de atuar na parte de infraestrutura.
Ele não é algo que tu pense a tecnologia da informação para o governo de uma forma
estratégica, como eu lhe disse, e talvez porque também ele, dentro dessa cultura um
pouco obsoleta da administração pública, ele também sempre foi um setor que se...
que foi delegado para ele isso: “Vocês vão ser o operacional, estragou o computador,
vocês vão lá, vão lá ver”, entendeu? Talvez falte visão nossa como gestor, para isso,
de enxergar como algo estratégico e... e não somente operacional. Mas vejo hoje ele
como algo muito incipiente.
202

A limitação no número de servidores públicos dedicados à área de TI constitui uma das


principais causas deste contexto. O Agente Comissionado (AC 01), de uma cidade com mais
de 50.000 habitantes e referindo-se à equipe, diz que “eu acho que o TI aqui na Prefeitura, ele
tem um analista de dados concursado, que é o [...]; aí tem o [...] que é o político que é esse corre
que faz tudo; e tem um grupo de três, quatro estagiários”. Em outra cidade, embora de menor
porte, aparenta ser um pouco pior pois, como diz o Agente Comissionado (AC 09)

[...] é o nome dele. Trabalha ali embaixo. Faz o quê? Eu já lhe digo, foi em setembro,
se eu não me engano, que ele foi nomeado. Antes, não tinha. Recém ele está... ele está
entrando no... no meio de tudo, que era... eu sei que é complicado, é bem complicada
essa questão aqui, na Prefeitura.

As atividades que estes servidores executam também contribui para este estado primitivo de
organização tecnológica, onde as questões estratégicas não fazem parte das atribuições normais
destes técnicos em informática. Um exemplo de casos assim é dado pelo Servidor Público (SP
07) ao dizer que

a gente não tem aquele tempo de estar acompanhando todas as tarefas. Então, a gente
apaga o fogo a hora que chega aqui, já no limite. Eu brinco que a gente faz um
pouquinho, um pouquinho de tudo e tudo de nada, porque é muita demanda. É muita
demanda de todas as áreas. Todas, todas. Então, assim, tu não consegue focar para
conseguir, sabe? Ser efetivo em determinado ponto, sabe?

As limitações, e os problemas, ultrapassam a falta de pessoal e também são latentes na estrutura


física disponível, não apenas para a área de TI, como de resto para toda a administração do
município. A manifestação do Agente Comissionado (AC 01) é elucidativa

olha se isso é estrutura para uma equipe tocar transparência numa cidade como [...].
Esse computador aqui é só para olhar dentro do sistema os pedidos, porque ele não
faz nada. E esse computador e essa impressora. Essa é a nossa estrutura. E tem
setores que é pior que nós, porque não tem. E no dia que a gente estava refletindo
sobre por que as pessoas não usavam o sistema, a pessoa dizia, “mas mano, não tem
nem um computador aqui na minha sala, eu não tenho nem internet no meu posto de
saúde”. Então se tivesse um TI organizado, articulado e com planejamento, fazia esse
mapeamento e começava a operar para tentar resolver esses problemas. Mas como o
TI é muito pequeno e tem que resolver os incêndios diários, acaba faltando tempo pra
planejamento. Talvez se tivesse um TI com alguém responsável em cada Secretaria,
daria para ter alguém aqui na Prefeitura no todo só pensando isso. Mas como eles
têm que resolver os problemas das Secretarias, de todas as máquinas da Prefeitura,
acaba não tendo tempo também de eles planejarem essa outra parte que é
fundamental.
203

A forma como se dá a organização da área de informática nas prefeituras é resultado da falta de


planejamento e do reconhecimento deste setor como prioritário nas sucessivas administrações.
O depoimento do Servidor Público (SP 02) demonstra casos desta natureza:

Quando foi criado o [...] – e depois eu tive até um problema para transformar isso
numa superintendência – isso é questão política, foram trocando, trocando, hoje o
[...] é um mero departamento subordinado à Fazenda, mas nós fizemos tudo ainda
isso. Foi solicitado à administração, no que diz respeito a tudo o que se compra passa
pelo nosso departamento. E é feito em relativos, não... nós não temos, devido ao
sistema político instaurado, cada prefeito faz do jeito que ele achar interessante.
Então hoje, até a administração passada, o [...] não tem a incumbência, mas fazia.
Entendeu? “Ah, vamos comprar tal coisa”, “Não, pergunta para o cara que
entende”. Hoje não, hoje já estão cobrando, o que é que eu vou fazer? Não tem, não
existe, porque eles tiraram antes o meu [...], ele era um... quando foi criado, ele foi
criado a nível de secretaria. Então, era até acima de uma secretaria, era prefeito,
tecnologia e as secretarias, então tudo o que passava tinha ligação direta com o
prefeito. Aí, com o tempo, passou, eles colocaram debaixo de uma secretaria, mas
por causa da cultura, que tudo perguntava, nós continuamos mantendo, mas às vezes
mais, conforme o político, ou às vezes menos, nessa administração nós estamos um
pouquinho menos.

E a mesma situação é explicitada em outras cidades dando a entender que, contextos assim,
podem ser mais comuns do que se imagina. O Servidor Público (SP 08) reforça a fala anterior:

Na verdade... na verdade, assim, ó, é um... é um setor que eu vejo pouco investimento,


eu estou há 7... quase 8 anos na Prefeitura, é um setor, assim, que não... não é que
não é visto, mas eu acho que não... não é dada a devida importância. Então, têm
muitos projetos que nós temos que, não digo que são engavetados, mas eles são
deixados para depois, por muito tempo até se defasar, e que eles seriam bem
interessantes para a máquina pública, não só de informação, mas do próprio
funcionamento interno. E o nosso parque de máquinas, a nossa própria estrutura, ele
só é investido nesse tipo de... sistema quando ele falha, quando tu tem a perda, por
exemplo, assim, nós só tivemos uma rede de fibra ótica depois que as antenas pararam
de funcionar. Todo mundo tinha uma antena via rádio, então a comunicação foi
inviável, aí se obrigou a investir. Mesma história quando tem um servidor novo ou
qualquer outro aditivo, é feito só quando já exauriu o que tinha. Não é feito um
investimento proativo.

6.4.1.2 A aquisição de softwares

Outra deficiência dos municípios, talvez como decorrência das limitações anteriores, diz
respeito aos softwares necessários para suporte às atividades administrativas. O cenário
apresentado, em relação à área de TI, fornece pistas muito claras sobre qual a forma encontrada
pelos municípios para tanto. Com poucas exceções, os municípios adquirem softwares de
empresas especializadas. Como diz o Agente Político (AP 08)
204

veja que eu acho que tem um pouco essa dependência que limita, mas também tu tens
como fugir dela, na minha opinião, ou até estimular por conta disso outras, que
venham a suprir essas que... nós vivemos em um país capitalista, nós não temos a
obrigação de fazer a ferramenta porque tem uma empresa que faz ela.

Estas aquisições, evidentemente, precisam seguir seu curso legal. O formato destes processos
licitatórios, porém, aparenta não ser adequando para compras de produtos com tais
características. Por exemplo, como julgar a questão imposta pela legislação quando diz que o
“acesso à informação, que será franqueada, mediante procedimentos objetivos e ágeis, de forma
transparente, clara e em linguagem de fácil compreensão” (BRASIL, 2011a)?

As questões não são apenas de ordem subjetivas. São práticas e, boa parte delas, decorrentes,
mais uma vez, das dificuldades estruturais enfrentadas pelos municípios. Apesar dos obstáculos
existentes, a fase inicial é, normalmente, a mais tranquila. O Agente Comissionado (SP 07)
exemplifica:

De softwares, a gente faz um acompanhamento também. É que software, assim, é de


4 em 4 anos, 5 em 5 anos. Agora, a gente acompanha também. A licitação, a última
nossa foi... Começou lá em 2010 e ficou um tempão na justiça ali, encerrou em 2015.
E agora, para o ano que vem, tem que ser licitado os sistemas também. Daí, a gente
acompanha nas secretarias, até foi formada uma comissão. Todos vão ser licitados
novamente. A nota fiscal, a AR, a declaração eletrônica de dados, contabilidade,
licitações, ali a folha de pagamento, é o PPAA, a LDO, todos vão ser licitados. O
Portal da Transparência. Agora entrou o site da Prefeitura também, que antes ele era
separado. porque qualquer... situação que talvez não esteja bem descrito, ou uma
empresa muito pequena entre aqui achando que consegue dar conta e depois tenta
migrar. [....] lá do IPTU desenvolveu as especificações dele, a [...], da contabilidade,
fez a parte dela. Então, dessa forma que eles fizeram esse ano, sabe?

O resultado final, de acordo com o Servidor Público (SP 07) não é animador pois:

Essas empresas aí, praticamente 99% das empresas no mercado, eles já vêm com um
pacote pronto, entende? Eles não vão desenvolver alguma coisa exatamente como a
Prefeitura de [...], a Prefeitura de [...] quer. Daí teria que pegar, daí uma coisa
diferente, porque eles já vêm com aquele pacote pronto deles. Se o senhor analisar,
isso ocorre com 99% das empresas. Então, muitas vezes, tem que acabar se
sujeitando, mas...

Uma atitude dos servidores em direção contrária nem sempre é estimulada visto que, até de
forma inconsciente e sem más intenções, os desenvolvedores de software têm uma resposta de
difícil contestação. Como diz, mais uma vez, o Servidor Público (SP 07):

É. Tem que ser na hora da licitação, mas daria, que nem o senhor falou ali, de fazer
uma descrição bem elaborada, pedindo o que realmente a Prefeitura quer. Corre-se
205

o risco, muitas vezes, a gente já escutou: “Ah, não. Não vamos participar porque nós
não temos o produto que vocês querem”

Uma vez implementado o produto adquirido, o cenário pode ser, de acordo com o Agente
Comissionado (AC 01), algo como “a gente paga talvez de 15 a 17 módulos desse sistema e usa
quatro ou cinco, e os outros a gente está pagando não sei por que, mas está pagando”.

Apesar destes pontos litigiosos a relação entre prefeituras e empresas desenvolvedoras de


software não é um campo de batalhas. De acordo com os entrevistados o relacionamento, como
regra geral, é tranquilo, amistoso e as demandas solicitadas, geralmente, são atendidas. É
preciso lembrar, entretanto, que são empresas privadas e que dentre seus objetivos principais
está a obtenção de lucros.

No sentido oposto são percebidas algumas dificuldades no relacionamento entre prefeituras e


empresas. O Agente Comissionado (AC 01) apresenta, na sua cidade, situações que envolvem
desde os sistemas que são comercializados como pacotes pré-concebidos e pouco flexíveis às
questões financeiras sempre envolvidas neste contexto. O entrevistado declara:

Mas é bastante difícil de tu avançar com essas empresas de tecnologia porque elas
sempre acham uma forma de te desviar. E a gente contrata os serviços por módulos.
Então módulo da transparência, módulo do serviço lá, módulo de atendimento, da
contabilidade, da não sei o quê. E é tudo engessado. Então o mesmo portal que a [...]
usa em [...] que é uma cidade totalmente diferente da nossa, é aqui em [...]. Então
essa coisa do engessado e a gente tem muita dificuldade de qualificação de pessoas
que trabalhem essa coisa do desenho, dos códigos para desenhar as páginas. [...]
quando tu quer botar uma coisa a mais para dar transparência, por exemplo, a gente
a cada 3 meses tem um relatório de gestão de cada Secretaria para as pessoas
saberem quais as dificuldades, os problemas de cada Secretaria e tal, mas nunca
funcionou, nunca deu certo. Em um ano a gente conseguiu que duas Secretarias
fizessem, a gente disponibilizou, mas eu tive que criar um pdf, botar numa aba
escondida que talvez as pessoas nem tiveram acesso, porque o portal não está
estruturado para ter essa coisa. E se for fazer pelas Secretarias, a [...] vai nos cobrar
mais uma beirada para ter aquela aba e como a gente tem problema de finanças
sempre fica para trás.

O mesmo Agente Comissionado (AC 01) apresenta uma última consideração que reforça este
contexto e que questiona o modelo atualmente empregado:

Então é um desafio. Eu acho que o próprio setor dessas empresas de softwares, eles
estão muito acostumados e acomodados nesse jeito. Então como nunca houve por
parte do poder público uma pressão para que eles melhorassem e tal, eles chegam,
vem primeiro vendedor, vende ideia, bota mirabolantes estratégias na hora de vender
ideia, depois vem os caras para instalar e tal, e depois quando tu precisar que venha
para ti, quando está em funcionamento, tu tem que pagar uma taxa X para ter uma
assessoria mais presencial.
206

6.4.2 A visão das empresas

Nas empresas que desenvolvem softwares para a administração pública, ao contrário do que se
poderia prever, o conhecimento sobre dados abertos não é generalizado. É certo que, dos grupos
de entrevistados analisados, foi o que mais demonstrou entendimento do assunto. Dos oito
entrevistados desta categoria, entretanto, apenas a metade respondeu afirmativamente se
conhecia o tema.

Por outro lado, aqueles que declararam conhecer dados abertos já os oferecem em seus
produtos. Não cabe, neste momento, analisar a forma como esta disponibilização ocorre e o
respeito, ou não, aos princípios do movimento. É importante a percepção de que iniciativas
foram produzidas e a demonstração de que as razões para o não oferecimento, principalmente
culturais e comerciais, não são verificadas em todos os lugares.

Os motivos de ordem comercial e estratégico existem e são defendidos pelas empresas. Uma
atividade que tem consumido uma grande parcela dos recursos humanos e financeiros
disponíveis por estas empresas estão sendo, ou serão, consumidos com o propósito de atualizar
seus produtos de forma a usarem a nuvem como plataforma principal de armazenamento e
operações. O representante das Empresas de Software ilustra, ao dizer que “Hoje, na verdade,
a gente tem 2 prioridades, porque a gente está migrando isso para a internet, para web, para a
nuvem”. O representante das Empresas de Software (TI 01) confirma:

Exatamente. Então, o nosso planejamento estratégico para os próximos anos é lançar


todos os nossos produtos na nuvem, é o que o... embora nós tenhamos uma opinião
formada sobre isso, mas o mercado nos empurra para isso, para a nuvem. Então, os
nossos produtos tendem a ser todos migrados para a nuvem.

A adesão das empresas à novos movimentos é determinada, principalmente, pelas razões


comerciais. Questionado sobre como a empresa reagiria diante da ideia de modificar seus
produtos ajustando-os para que também disponibilizasse as informações em modelos e formatos
diferentes, o representante das Empresas de Software (TI 01) foi categórico: “Nunca passou
[pela nossa cabeça]. Nunca passou, porque parte do pressuposto que nós somos uma empresa
que visa lucro”. Em outras palavras é necessário que alguém pague por este desenvolvimento.
207

É importante frisar que este comportamento não é nem ilegal nem ilegítimo. Ele apenas torna
evidente que movimentos como o de dados abertos, nascidos na sociedade, necessitam de muito
mais que boas intenções e receptividade para prosperarem.

A maior preocupação das empresas é o atendimento à legislação. Esta atenção representa muito
mais do que uma simples questão de respeito patriótico. Os elementos definidos nos
regulamentos legais constituem os itens mais importantes das licitações em que participam.
Também porque são os itens cobrados de forma explicita pelos órgãos de fiscalização. Como
diz o representante das Empresas de Software (TI 01):

Em termos de produto, o nosso produto, ele atende 100% da legislação vigente. A


gente procura estar sempre alinhado com o Tribunal de Contas e os órgãos
reguladores dessa... o Portal da Transparência, o controle interno do município. No
ano de 2019, mesmo, nós tivemos o resultado da avaliação que acontece todo ano,
pelo Tribunal, e um número X, aí, de clientes atingiram nota máxima, 100% de
aderência ao Portal da Transparência.

6.4.3 A legislação

As Leis de Responsabilidade Fiscal (BRASIL, 2000, 2009) e de Acesso à Informação


(BRASIL, 2011a) são as responsáveis pelo fato de todos os municípios possuírem o seu portal
de transparência. Foi, pelo menos, a partir da entrada em vigor desta última que se deu a notável
disseminação destas ferramentas em todas as localidades Brasileiras. O cenário, sem estes
instrumentos, certamente seria diferente. É o que supõe o representante da Sociedade Civil (SC
05):

Ele cumpre o que a lei diz: “Ó, se a lei diz eu fazer isso, é isso que eu vou fazer, é o
mínimo que eu vou fazer”. Infelizmente. Eu acho que falta a gente... fazer mais,
porque se não tivesse lei de transparência, não existia o Portal da Transparência até
hoje. Se não é a lei, ter um Portal da Transparência, nenhum município ia ter Portal
da Transparência. Ou um ou outro grande. Senão não ia, infelizmente os nossos
governantes, eles cumprem o mínimo legal, e isso é ruim. Isso acaba... como não tem
uma lei que diz, que obriga o município a ter uma... uma gestão compartilhada, ter
uma gestão de... participação popular, muitos não fazem. Não fazem. Só vão fazer a
partir do momento que tiver uma Emenda Constitucional, alguma coisa assim.

Uma questão que deve ser respondida está relacionada a estes mesmos instrumentos legais e foi
apresentada em diversas oportunidades neste trabalho: como julgar a questão imposta pela Lei
12.527/2011 quando diz que o “acesso à informação, que será franqueada, mediante
procedimentos objetivos e ágeis, de forma transparente, clara e em linguagem de fácil
compreensão”? (BRASIL, 2011a)
208

As respostas dos representantes da Promotoria Pública não são conclusivas. É possível que, de
fato, representem o pensamento dos demais integrantes da classe porque desde a implantação
da legislação, e dos portais, nenhuma atitude foi tomada para modificar a forma de apresentação
das informações. O representante da Promotoria Pública (PJ 03) demonstra este quadro:

É que isso é uma questão, acho que daí vai ser interpretativa, não é? É. E aí, daqui
a pouco é uma questão que teria que se discutir melhor, eu acho, porque, por ser uma
questão interpretativa, daqui a pouco vai surgir do outro lado a interpretação de que
não, de que a informação está de forma clara, mas que é uma informação técnica.

A declaração do representante da Promotoria Pública (PJ 04) reforça a dificuldade de,


novamente determinada pelo caráter interpretativo da legislação Brasileira, ter uma posição
clara e inequívoca sobre o problema pois

a aplicação ou não da... da Lei de Transparência a gente enfrenta algumas


dificuldades que é da interpretação pelos próprios tribunais daquilo que são questões
de decisão política do gestor e daquilo que é obrigação. Então existe algum espaço
da atividade do gestor do Executivo em que ele também colabora com a Lei e
ele vai ter de agir cumprindo a Lei. Existem outras situações em que a atividade do
gestor vai estar vinculada a sua escolha política e esta escolha, que nos chamamos
então, uma expressão latina de “interna corporis”, pela divisão e independência dos
poderes, o Judiciário não teria como obrigar o gestor a adotar uma determinada
medida

Outro questionamento, em relação aos instrumentos legais citados, foi ventilado: eles também
disciplinam, ou conduzem, ao oferecimento de Dados Governamentais Abertos? Os
Promotores Públicos entrevistados não têm uma posição sobre a dúvida por não terem,
fundamentalmente, se dedicado ao estudo do problema. A resposta aparenta ser, novamente,
negativa visto que tão poucos portais de Dados Governamentais Abertos existem.

Uma última interrogação vai na direção oposta das até aqui apresentadas. A legislação existente
inibe os administradores públicos de realizarem alguma atividade que a lei, explicitamente, não
obrigou? As respostas são divididas. O representante da Promotoria Pública (PJ 03) argumenta
dizendo que

acho que faz sentido se a gente compreender a lei como algo abrangente, que envolva
esses princípios. Ao agente público, só é autorizado fazer o que permite a lei, até
porque ele está atuando, não em nome próprio, em nome de uma coletividade. Acho
que sim. Isso até... tu vê, essa, esse pensamento, essa frase nos livros de direto
administrativo eles trazem. Todos eles. A gente vai ler os livros, ali, dos grandes
professores de direito administrativo, ali, Lopes Meirelles, a Maria Sylvia di Pietro,
todos trazem... o Celso Antônio Bandeira de Mello, que é um dos mais conhecidos aí,
todos trazem essa frase, agora um pouco mais modernizada, que é, aqui,
209

compreendendo, nesse conceito de legalidade da lei, não só a lei stricto sensu, mas
os princípios da administração pública. Mas eu acho que ainda é atual essa...

O Promotor Público (PJ 02), por sua vez, rebate:

Faz sentido. Mas acontece que tu tem que interpretar isso. Antigamente isso tinha um
sentido estrito e formal, hoje dá para dizer o seguinte, ó: não é que o administrador
só pode fazer tudo o que a lei permite, é tudo o que o princípio da juridicidade
permite. Porque a lei tem um sentido muitas vezes muito restrito, muito formal, e ela
não pega toda a principiologia do sistema. Entendeu? Não tenho nenhum exemplo
para te dar aqui, mas a ideia é essa. Então às vezes tu te apega na lei, por exemplo,
uma lei, e na verdade tu está esquecendo o princípio da proporcionalidade, está
esquecendo o princípio da razoabilidade, está esquecendo o princípio da eficiência,
está esquecendo o princípio da moralidade administrativa. Tu entendeu? Sim, o
balizamento é isso aí. Só que a lei não, num sentido antigo que diziam, a lei no sentido
formal. Hoje dá para dizer o seguinte, modernamente, que a administração não está
vinculado ao princípio da legalidade, está vinculado ao princípio da juridicidade. Tu
tem que ver a lei e aí tu vê se essa lei está de acordo com toda a ordem incondicional
dos valores.

6.4.4 Os usuários de dados abertos

Os usuários, ou possíveis utilizadores de dados abertos, compreendem toda a sociedade.


Qualquer cidadão, qualquer organização, inclusive o próprio governo, constituem-se naqueles
que tem a prerrogativa de reutilizar os dados produzidos, processados e mantidos pelo poder
público.

Este trabalho optou por examinar uma pequena parcela que representa aqueles capazes e
qualificados para a tarefa de programar computadores sendo esta uma atividade significativa
dentro do movimento de dados abertos. Uma nova restrição foi acrescentada em função da
abrangência desta classe ficando a investigação, desta forma, circunscrita à atividade de
formação destes profissionais por meio da análise e questionamento aos cursos superiores na
área de informática.

Foram analisados dois instrumentos distintos. O primeiro compreende os Projetos Políticos


Pedagógicos destes cursos. A partir dos portais institucionais na internet foram identificados 21
PPP, de 9 diferentes instituições de ensino estabelecidas no Estado do Rio Grande do Sul. Estes
cursos representam cinco diferentes áreas de formação em computação, a saber: Análise e
Desenvolvimento de Sistemas, Ciência da Computação, Engenharia de Software, Sistemas de
Informação e Tecnologia em Sistemas para Internet.
210

O questionamento básico em relação ao PPP foi se, e de que forma, o curso o projeto faz
referências às questões sociais, comunitárias e relacionadas à cidadania e ao desenvolvimento
local e regional. Pode-se imaginar que estas são as condições necessárias para a formação de
cidadãos e que os estudantes destes cursos, uma vez formados, farão parte daquele grupo que
participa e colabora nas questões públicas.

As impressões iniciais podem parecer surpreendentes. Em praticamente todos os Projetos


Políticos Pedagógicos estas referências existem. Alguns cursos, como exemplo, apresentam
como objetivos ou estratégias para a formação de seus profissionais:

Formação profissional para a cidadania: nosso egresso deve adquirir a consciência


de que participa de uma sociedade e a elas deve satisfações pelo investimento que
representa sua passagem por uma universidade pública. Nosso terceiro preceito
busca imprimir isto na personalidade do Curso. (PPP 01)

Através dela, o curso de Ciência da Computação propõe-se a formação do


profissional como cidadão íntegro e politicamente capaz de conduzir e posicionar-se
diante de fatos, de forma coerente, diante de uma sociedade complexa e competitiva.
(PPP 02, 03, 04, 06)

Entende-se que os cursos de graduação têm por função preparar indivíduos para o
exercício de uma profissão, porém, aliado ao conhecimento técnico, está a formação
humanística, sendo ambos o compromisso da instituição para a formação de um
cidadão crítico, reflexivo e consciente de seu papel na sociedade. (PPP 07, 08)

O curso tem como missão educativa capacitar indivíduos para exercer a cidadania,
promovendo a consciência social, formando profissionais competentes e atuantes na
sociedade, colaborando assim para o desenvolvimento de novas tecnologias para a
resolução de problemas nas mais diversas áreas do conhecimento. (PPP 12)

Incentivar a atuação do aluno junto à comunidade regional, como forma de, não
apenas prover o atendimento às necessidades da comunidade, mas também de tomar
consciência da importância da Computação como instrumento de transformação
social e de construção da cidadania; (PPP 14)

Estas definições e especificidades dos cursos de graduação parecem fazer parte de um texto
padrão. A pergunta que surge, a partir de então, é de que forma o curso pretende dar conta de
tais proposições. As respostas aqui são mais raras. Em poucos casos há a apresentação de um
ou outro componente curricular genérico como, por exemplo, as disciplinas cuja ementas são:

Análise da sociedade brasileira em seus componentes econômicos, políticos,


culturais, científicos e tecnológicos, investigando as raízes da atual situação e as
saídas possíveis para os problemas nacionais. Análise de formas de participação
política e da construção da cidadania nos dias atuais. (PPP 02, 03, 04, 06)
211

Conhecer os desafios da Computação no Brasil. Analisar e problematizar o papel


social da Computação. Desenvolver habilidades de trabalho em grupo e de
comunicação e expressão. Reconhecer o papel social da Universidade. Elaborar
projetos de extensão. (PPP 15, 16)

É legítimo esperar que componentes curriculares como estes possam imprimir o desejo e a
inspiração de participação e colaboração nos processos democráticos. São, entretanto,
demasiados amplos e não relacionados aos demais elementos do curso.

Os estágios e os projetos especiais presentes nos currículos dos cursos superiores podem,
também, constituírem espaço para o desenvolvimento, no respectivo curso, de trabalhos que
visem a formação de cidadãos conscientes e responsáveis. Por exemplo, extraído do (PPP 09):

O Estágio Supervisionado no Curso de Ciência da Computação caracteriza-se por se


não obrigatório, orientado pelos princípios metodológicos da Universidade e pela
Lei nº 11788, de 25/9/2008. Considerado ato educativo vivenciado no ambiente de
trabalho, portanto em contato com a realidade social, econômica, ambiental e
cultural.

Os estágios visam ao aprendizado de competências próprias da atividade profissional


e a contextualização curricular, objetivando o desenvolvimento do educando para a
vida cidadã e para o trabalho

Como a própria citação afirma, contudo, não são obrigatórios e dependem, portanto, do
interesse manifestado pelos alunos antes de que uma atividade incentivada pelo curso.

A investigação complementar, realizada por meio de questionário on-line, foi respondida,


embora algumas tenham ocorrido de forma parcial, por 33 cursos superiores na área de
informática ou computação. Os pontos principais, neste questionamento, estavam relacionados
justamente às possíveis implementações dos objetivos e estratégias estabelecidas nos Projetos
Políticos Pedagógicos.

Algumas respostas são diretas: o curso não trabalha, ou não tem previsão de trabalhar, com
práticas ou eventos envolvendo Dados Governamentais Abertos. Outras respostas repetem o
que já havia sido observado nos PPP dos cursos. As discussões relacionadas aos dados abertos
podem, eventualmente, ocorrer nos projetos de pesquisa e de extensão, palestras, atividades
complementares e, com maior probabilidade, nas semanas acadêmicas. A participação,
entretanto, sempre será opcional e decidida pelo discente.
212

Apenas uma das respostas trouxe uma perspectiva diferente, embora aparente não ser uma
atividade constante. A declaração abaixo foi apresentada por um curso de Engenharia da
Computação:

O uso de dados abertos é ainda limitado, tipicamente feito dentro das disciplinas de
Projeto Integrador I, II e III. É nessas disciplinas que um projeto com duração de um
semestre inteiro é desenvolvido por pequenos grupos de alunos, quando algumas
vezes demandas da sociedade e de organizações do poder público são trabalhadas.
Em outros momentos o uso de dados abertos ocorre por iniciativa individual de
alunos, em seus Trabalhos de Conclusão de Curso.

Há uma dissonância clara entre o que se diz nos Projetos Políticos Pedagógicos, e nos demais
documentos produzidos pelas instituições de ensino superior e as práticas de implementação e
realização destes cursos. A formação de cidadãos comprometidos com suas comunidades,
participantes das decisões comunitárias e colaborativos nas ações de responsabilidade do poder
públicos exigirá ações mais concretas, nesta direção.

6.5 RAZÕES PARA O NÃO OFERECIMENTO DE DADOS ABERTOS

O conjunto de razões, ou motivos, pelos quais os municípios, na sua grande maioria, não
disponibilizam dados abertos pode ser estabelecido a partir das percepções dos entrevistados
sobre os diversos temas abordados. Uma tentativa de sintetizar estas percepções, em relação à
transparência pública, a participação e colaboração dos cidadãos, governos e dados abertos,
bem como referentes às barreiras e dificuldades apresentadas pelos municípios pode ser
visualizada nos quadros a seguir.

O quadro nº 12 apresenta uma possível visão sobre transparência pública, participação e


colaboração dos cidadãos, elaborada a partir da percepção dos diversos sujeitos de pesquisa
(prefeitos e vice-prefeitos, vereadores e presidentes de câmaras, servidores públicos efetivos ou
comissionados, assessores de comunicação e secretários municipais, promotores públicos,
conselheiros municipais e regionais e analistas de sistemas e gestores de empresas de TI). Para
cada um dos temas em exibição são apresentados como os entrevistados os conceituam, como
os veem na realidade e como cada um destes contextos pode ser explicado.
213

Quadro 12 As percepções sobre transparência pública, participação e colaboração dos


cidadãos
Tema Elemento Descrição
Conceito Os agentes políticos, de um modo geral, entendem a transparência como algo
importante, fundamental e extremamente necessária. Os agentes sociais, por
sua vez, a definem como uma obrigação decorrente da legislação e das
exigências da fiscalização e que também ocorre em função dos desgastes
imputados à classe política.
Realidade As ações de transparência, nos municípios, estão concentradas nos portais de
transparência. Estes portais, em praticamente todos os municípios, são
desenvolvidos por empresas privadas e adquiridos pelas regras que regem as
licitações públicas. O acesso à informação por meio destes portais é uma
Transparência
atividade complexa e, geralmente, conduzida com dificuldades. Estas
pública
informações estão incompletas e são de difícil compreensão por boa parte dos
cidadãos.
Explicação A maior preocupação dos administradores municipais tem sido o estrito
cumprimento da legislação. O que parece ser importante é obedecer a legislação
e obter o reconhecimento dos órgãos fiscalizadores. Esta é uma das explicações
para o atual contexto da transparência pública. A responsabilidade é também
atribuída à falta de conhecimento, experiência com tecnologias e interesse do
cidadão, bem como suas deficiências para interpretar e entender o conteúdo dos
portais de transparência.
Conceito A cidadania ocorre, de fato, pela participação dos cidadãos. Os encontros,
mesmo os virtuais, promovem a troca de ideias e conduzem a cidadãos mais
conscientes de seu papel nas democracias. Os processos participativos estão
relacionados à constituição da cidadania. As administrações municipais
confundem, entretanto, participação com demanda por serviços.
Realidade Com exceção dos conselhos municipais não se verifica a participação efetiva
dos cidadãos em qualquer dos espaços constituídos a partir da Constituição
Brasileira de 1988. Os conselhos exibem dificuldades para sua composição e,
em diversos casos, existem apenas formalmente. Na maioria das ocasiões em
Participação
que a participação é direta os participantes dos diversos eventos são ou
cidadã
funcionários públicos ou segmentos da população atuando de forma
corporativa. O espaço de participação, nos processos mais concorridos, resume-
se à escolha de alternativas sem a possibilidade do debate aberto.
Explicação O pequeno índice de participação é creditado ao descrédito das ações dos
governos, à conjuntura política e as questões culturais associadas à história
política do país. Os governos municipais não disponibilizam alternativas além
daquelas exigidas pela legislação, não incentivam práticas educativas e,
também, não adotam alternativas inovadoras como as redes sociais ou outros
recursos tecnológicos.
Conceito Constitui-se em conceito pouco explorado e pouco conhecido. A realização
conjunta de serviços de responsabilidade do poder público representa uma
inovação, não apenas na execução do próprio serviço como também na forma,
na vontade, no comportamento, no relacionamento e na interação entre governo
e cidadãos.
Realidade Atividades que representem a realização conjunta de serviços públicos são
observadas apenas em situações bastante específicas. Manifestam-se,
Colaboração
geralmente, por meio de ações sociais, solidárias ou humanitárias, bem como a
cidadã
conservação e o melhoramento do patrimônio público.
Explicação Uma convicção generalizada é a de que tudo é responsabilidade do governo. As
questões culturais, além da ausência de iniciativas e oportunidades
proporcionadas pelo poder público também explicam este contexto. Em outras
oportunidades as parcerias entre governos municipais e cidadãos sofrem
inibições ou limitações em decorrência de impedimentos legais que vigoram
em determinadas cidades.
Fonte: Elaborado pelo autor
214

O quadro nº 13 exibe, de maneira bastante sucinta, os pensamentos e as visões dos entrevistados


em relação aos conceitos de governos abertos e dados abertos. Muito pouco pode ser dito, a
partir das entrevistas, em relação a estes dois temas, fortemente relacionados entre si. O debate,
abordando tanto governos quanto dados abertos, não tem incorporado nem as administrações
nem as comunidades que vivem nos municípios incluídos no trabalho.

Quadro 13 As percepções sobre governos e dados abertos


Assunto Descrição
Governo O conceito de governo aberto é pouco conhecido no nível municipal. Embora o Brasil participe de
aberto organização internacional acerca do tema o debate não tem chegado ao nível subnacional. A
aproximação conceitual observada relembra práticas paternalistas que lembram portas abertas
para, principalmente, a apresentação de demandas.
Dados O desconhecimento sobre o assunto é quase absoluto. As tentativas de conceituação são
abertos semelhantes ao tema governo aberto agora no sentido de disponibilização de informações.
Fonte: Elaborado pelo autor

O quadro nº 14, por fim, condensa a percepção dos entrevistados sobre possíveis barreiras e
dificuldades existentes nos municípios e que tornariam a disponibilização de dados abertos uma
tarefa complexa e de difícil encaminhamento, mesmo que o conhecimento sobre dados abertos
fosse maior e envolvesse mais pessoas, principalmente nas administrações municipais. Estas
barreiras estão situadas na organização e recursos existentes para a área de TI, na forma que as
prefeituras municipais adquirem seus softwares, na forma como as empresas estabelecem suas
estratégias e desenvolvem seus produtos, nas características da legislação e no pequeno
contingente e na formação de usuários aptos a utilizar estes dados.

Os municípios do Estado do Rio Grande do Sul, em relação ao oferecimento de Dados


Governamentais Abertos, podem ser distribuídos em três diferentes grupos: o primeiro é
composto apenas por Porto Alegre e Pelotas e oferecem dados abertos por meio de um portal
específico. Os 23 municípios do segundo grupo (apresentados na figura nº 24) disponibilizam
uma API para acesso direto aos dados municipais e têm em comum um mesmo fornecedor de
software para seus sistemas de informação. Alguns vestígios deixados por servidores públicos
destas localidades indicam, entretanto, que este oferecimento não é intencional e determinado
pela administração pública. Consiste, simplesmente, em uma funcionalidade que acompanha o
software que adquiriram. No último grupo, por fim, os restantes 472 municípios onde não se
verificam quaisquer evidências de disponibilização de Dados Governamentais Abertos. Pode-
se dizer que, com exceção dos dois municípios do primeiro grupo, o tema relacionado aos
Dados Governamentais Abertos praticamente não está presente em qualquer agenda de
215

discussões, em qualquer debate público e em qualquer ação estabelecida pelas administrações


municipais no Estado do Rio Grande do Sul.

Quadro 14 Barreiras e dificuldades nos municípios gaúchos para a adoção de dados


abertos
Barreiras Dificuldades
A organização A área de Tecnologia de Informação, nas prefeituras municipais, não faz parte de qualquer
da área de escala de prioridades. O nível de informatização é pequeno visto que transferem para
informática terceiros a administração de seus dados e sistemas. São poucos os servidores públicos
atuando nesta área e executam, via de regra, atividades operacionais.
A aquisição de Os municípios adquirem softwares de empresas especializadas com as quais, em geral,
softwares mantém um bom relacionamento. A aquisição de softwares segue as regras legais vigentes
para os processos licitatórios, pouco adequados a produtos como sistemas computacionais
onde nem todos os critérios para avaliação são objetivos. Os portais da transparência, que
apresenta estas características, são um exemplo claro de atendimento a todos os requisitos
legais, mas pouco efetivos para atender as necessidades dos cidadãos.
A visão das As empresas privadas, no desenvolvimento de seus produtos direcionados às administrações
empresas públicas, norteiam-se por critérios legais, estratégicos e comerciais. Assim novos produtos
ou funcionalidades somente são incorporados se atenderem a estes critérios. Por outro lado,
em empresas onde se verifica a existência de conhecimento sobre dados abertos, estes estão
incorporados em seus produtos.
A legislação As Leis de Responsabilidade Fiscal (BRASIL, 2000, 2009) e de Acesso à Informação
(BRASIL, 2011a) são as responsáveis pelo fato de todos os municípios possuírem o seu
portal de transparência. Muitos de seus elementos, na forma como são interpretados, fazem
com que os resultados obtidos sejam parciais e não atinjam a todos os cidadãos. São
exemplos a predominância de termos e formatos técnicos empregados nos portais da
transparência e a disponibilização de dados abertos.
Os usuários de A sociedade, e o próprio governo, são os potenciais usuários de dados abertos. Àqueles que
dados abertos programam computadores formam uma classe destes usuários. Os cursos superiores que
qualificam estes profissionais dedicam pouca atenção à formação cidadã de seus discentes.
As atividades que estes alunos realizam são, via de regra, opcionais e eventuais.
Fonte: Elaborado pelo autor

As entrevistas realizadas, os questionários respondidos e as observações efetuadas sobre os


portais conduzem a algumas razões para tanto. Podem ser apontadas como tal as dificuldades
apresentadas pelos municípios nas atividades relacionadas às tecnologias de informação, aos
recursos humanos disponíveis e ao modo pelo qual os softwares são adquiridos. Os dois motivos
principais, entretanto, e aos quais os demais estão relacionados, são o desconhecimento do
assunto e a inexistência, ou ineficácia, de instrumentos legais que direcionem os municípios
para o oferecimento de dados abertos.

Não são muitos os municípios que investiram em recursos humanos qualificados e estruturaram
adequadamente a área de tecnologia de informação. De um modo geral os servidores públicos
desta área dedicam-se a atividades operacionais, notadamente a manutenção de equipamentos
e instalação de softwares. Os municípios foram conduzidos para tal padrão em função das
exigências e dos prazos impostos pela legislação, principalmente a Lei de Acesso à Informação.
216

Tornou-se muito mais eficaz, e simples, a aquisição de softwares ao invés de desenvolvê-los


internamente.

Os sistemas de informação utilizados pelas administrações municipais, de forma específica


àqueles adquiridos de empresas especializadas, mantém conjuntos de dados significativos.
Parte deles, como já descrito, é disponibilizado aos cidadãos por meio dos portais da
transparência. São dados sistêmicos onde a interação humana, na sua captura e processamento,
é muito reduzida, às vezes nula. Os dados apresentados exibem casos onde, por exemplo, uma
única empresa fornece para 112 diferentes prefeituras. É relativamente simples imaginar o
efeito multiplicador se esta empresa ajustar os seus produtos para que os dados por eles
mantidos sejam também disponibilizados em formatos abertos, que permitam a sua reutilização
pela sociedade.

Este modelo, baseado no fornecimento de ferramentas computacionais por terceiros, pode


parecer lógico e perfeitamente justificável, tanto sob o ponto de vista legal quanto financeiro.
Os resultados, entretanto, foram exibidos em diversas oportunidades ao longo deste trabalho.
Embora os servidores municipais não demonstrem insatisfações acentuadas com estes
softwares, é sob a ótica dos cidadãos que as deficiências se tornam evidentes.

A aquisição de softwares por órgãos públicos deve seguir, e respeitar, o regramento legal em
vigor. Os processos de licitação orientam-se, fundamentalmente, por meio de critérios
essencialmente objetivos, tal como o menor preço verificado. Por outro lado, avaliar um
software requer, em muitas oportunidades, considerar elementos subjetivos, como por exemplo
a utilização de linguagem de fácil compreensão. A forma como a lei disciplina as licitações, no
Brasil, não considera aspectos desta natureza.

O fato de que o movimento de dados abertos não se constitui em tema de domínio e


conhecimento público pode ser explicado de muitas formas. É, inicialmente, um movimento
relativamente novo, mas sua expansão, não apenas no Brasil, tem seguido um ritmo não
compatível com os mecanismos e tecnologias disponíveis para comunicação, tanto entre as
pessoas como entre as diversas organizações. Mesmo aplicando um filtro mais específico,
olhando por exemplo empresas de software e cursos superiores formadores de profissionais em
computação, o conhecimento sobre o tema é limitado.
217

O pequeno, ou nenhum, conhecimento em relação aos dados abertos, por si só, não explicam
um nível tão pequeno de ocorrências nos municípios gaúchos e brasileiros. Exemplos como a
transparência pública e participação cidadã corroboram a ideia de que outros elementos são
necessários, além do conhecimento, para que as administrações públicas municipais
implementem políticas públicas. Em um dos exemplos, os administradores públicos, bem como
os demais atores políticos, apresentam opinião formada sobre a participação popular e se
declaram favoráveis e esperançosos de que ela ocorra com maior intensidade. São raras as ações
concretas, contudo, que oferecem novas e melhores oportunidades e canais para que aconteçam.
O exemplo relacionado à transparência, por sua vez, é mais elucidativo. O cenário anterior à
Lei de Acesso à Informação, contraposto ao contexto atual, e mesmo com todas as deficiências,
ilustra a forma com que as administrações públicas se movimentam.

A legislação estabeleceu a obrigação de que todos os municípios implementassem seus portais


da transparência e, desta forma, modificou o cenário no país. O regramento legal, contudo,
parece não ser suficiente. Todos julgam a transparência fundamental e importante, mas a
implementação é deficiente e só o fazem porque a lei obriga e somente o que a lei obriga. A
interpretação das normas legais é um privilégio do poder público e das empresas produtoras de
softwares. Não há espaço para que as demais pessoas contribuam na construção ou no
aperfeiçoamento dos instrumentos utilizados para a transparência pública. Ao cidadão resta,
quando não consegue acessar ou compreender a informação, ser responsabilizado em função
de seus conhecimentos ou de seu nível cultural e, na melhor das hipóteses, pode ser ajudado,
de forma paternalista, por agentes políticos ou servidores públicos.

Todas as declarações, nas entrevistas, deixam claro de que estes portais foram criados e
mantém-se ativos por conta de imposições legais. Pode-se tentar um paralelo entre os portais
da transparência dos municípios e a disponibilização de dados abertos. Os primeiros, sem a lei,
como estariam? De outra forma, quantos seriam? O oferecimento de dados abertos, sem
legislação específica, sabe-se como está.
218

7 CONSIDERAÇÕES FINAIS

A legislação estabelecida no Brasil a partir do início do século XXI trouxe, para as


administrações públicas de todos os níveis, um conjunto de exigências direcionadas ao
incremento, especialmente, da transparência governamental. Estas novas obrigações dos
municípios foram as responsáveis, fundamentalmente, pela expansão dos portais municipais na
internet, principalmente, os portais da transparência. O que se observou, entretanto, é que estas
ferramentas tem sido implementadas de modo que parte da população tem dificuldades tanto
em acessar quanto em entender as informações ali exibidas.

Tem sido percebido, por outro lado, um movimento com origem na sociedade e que preconiza
a disponibilização, principalmente pelos governos, dos conjuntos de dados sob sua
responsabilidade. Os chamados dados abertos dizem respeito à livre utilização, reutilização e
redistribuição destes dados por qualquer pessoa. Estes princípios permitem associar a adesão
dos governos a este movimento a um incremento da transparência, participação e colaboração
dos cidadãos.

Apesar das iniciativas do Governo Federal e de alguns Governos Estaduais na disponibilização


de dados abertos, poucos governos municipais foram identificados como adeptos do
movimento. Estes municípios, que representam uma parcela ínfima dos 5.570 municípios do
Brasil, resumem-se naqueles de maior porte, principalmente as capitais dos Estados Brasileiros.
Estas considerações conduziram à realização desta tese, que teve como objetivo central a
identificação e análise dos fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que dificultam ou
impedem a disponibilização de dados abertos municipais.

Os Dados Governamentais Abertos e suas repercussões nos processos de transparência são


particularmente importantes nas democracias, forma de governo com um avanço significativo
durante o século XX. Este desenvolvimento não ocorreu de forma linear. Houve momentos
distintos onde a democracia expandiu-se e houve outros onde retrocedeu. O saldo, mesmo após
uma última onda de autocratização, ainda é positivo. Um maior número de pessoas, em um
maior número de países, vive sob o regime democrático. Não se trata, contudo, de um valor
universal.
219

São muitos os conceitos pelos quais a democracia pode ser caracterizada. A partir da tradicional
referência ao governo do povo, pelo povo e para o povo são inúmeros os modelos pelos quais
a democracia se manifesta. Para os objetivos deste trabalho, entretanto, é suficiente tipificá-la
nas suas formas mais elementares: a democracia direta, nascida com os Gregos, a democracia
representativa, surgida em função das características e dificuldades do mundo moderno e as
democracias participativas e deliberativas, tidas como formas socialmente justas de governo.

As democracias representativas, participativas e deliberativas consideram, por um lado, a


recondução ou substituição dos governantes e, por outro, as possibilidades de debates que
conduzam ao conhecimento pleno dos assuntos da sociedade. A transparência pública, desta
forma, é o atributo da democracia que solidifica ambos os contextos.

A transparência tem sido objeto de políticas públicas em grande parte das nações. O avanço
destes conjuntos de regras e determinações conduziu, rapidamente, ao estabelecimento de que
a informação é um direito humano fundamental e condicionante da democracia. O Brasil,
alinhado a estes princípios, definiu, já no século XXI, um conjunto de instrumentos que
norteiam todos os entes públicos no tocante à disponibilização e ao acesso à informação.

A transparência pública também pode ser concretizada por meio dos Dados Governamentais
Abertos. O movimento, que nasceu na primeira década do século XXI, tem se expandido e hoje
um número significativo de governos, notadamente nacionais, tem aderido e disponibilizado
dados sob esta perspectiva. A sociedade pode reutilizar, modificar e compartilhar estes dados,
de forma livre e sem qualquer tipo de restrição, como também para qualquer finalidade. Assim,
podem ser esperados benefícios relacionados a inovações comerciais e econômicas, bem como
novas formas de exibição dos dados públicos que possam contemplar e atender um maior
número de pessoas, independendo de suas qualificações e habilidades técnicas, conhecimentos
e nível cultural.

Dados Governamentais Abertos constituem um suporte para os denominados Governos


Abertos, filosofia de governo que considera, como fundamentos de sua atuação, serem baseados
na transparência pública, na participação e na colaboração dos cidadãos. São governos
comunicativos e transparentes, atentos às manifestações da sociedade e que buscam e permitem
a ajuda dos cidadãos no encaminhamento e solução dos problemas da comunidade.
220

As Tecnologias de Informação e Comunicação (TICs) são viabilizadoras e impulsionadoras


destes processos. O desenvolvimento dos computadores, a expansão vertiginosa da internet, as
novas plataformas baseadas em equipamentos móveis e o número quase que incalculável de
aplicações para eles e, especialmente, as redes sociais, estabeleceram uma nova dinâmica de
comunicação e interação entre o governo e a sociedade. Estes instrumentos permitem toda sorte
de relacionamentos, seja entre o governo e os cidadãos, entre os próprios cidadãos e entre os
diversos setores do governo, normalmente incomunicáveis entre si.

O desenvolvimento dos Dados Governamentais Abertos ocorre com maior intensidade entre os
governos nacionais e visíveis em todos os poderes. Estas evidências são notadas com este viés
principalmente porque as diversas organizações que monitoram estas iniciativas o fazem quase
que exclusivamente para o nível mais alto dos governos. Nas administrações subnacionais,
entretanto, o progresso do movimento se fez com menor intensidade, especialmente em se
tratando dos municípios e governos locais. Mesmo no âmbito internacional sobressaem
somente as cidades de grande porte. Do lado da sociedade a evolução também foi modesta. O
uso dos dados abertos disponibilizados não tem seguido qualquer modelo de organização nem
contemplado uma variedade muita grande de áreas beneficiadas pelos aplicativos
desenvolvidos.

O cenário brasileiro é ainda mais incipiente. Afora o próprio governo nacional, tanto a
administração direta quanto a indireta, bem como os poderes legislativo e judiciário, são
restritos os casos onde a disponibilização de dados abertos é aparente. Podem ser citados alguns
governos estaduais, algumas capitais de estados e poucas cidades, notadamente aquelas com
maior população. O desenvolvimento de aplicativos no Brasil, também, é quase nulo, com
pouquíssimas iniciativas e escassos casos de sucesso.

O Estado do Rio Grande do Sul, assim como os demais Estados Brasileiros, é constituído,
sobretudo, por pequenos municípios tanto sob o ponto de vista populacional quanto com base
em suas extensões territoriais. Estes 497 municípios que tão pouco aparecem nas estatísticas
envolvendo Dados Governamentais Abertos, apresentam diversas limitações, além daquelas de
caráter financeiro. Os municípios demonstram severas restrições na composição e qualificação
dos recursos humanos que compõe seus quadros de servidores públicos, as quais refletem-se
nas suas estruturas de Tecnologia de Informação e na forma como seus sistemas administrativos
e demais ferramentas de software são obtidas, principalmente os seus portais na internet, em
221

especial o portal de transparência. Estes entraves conduzem os municípios a aquisição de todos


estes instrumentos na iniciativa privada, em empresas desenvolvedoras de softwares para a área
pública.

Os resultados de tal contexto se fazem sentir, particularmente, naqueles recursos destinados à


efetivação da transparência pública. Poucas empresas fornecedoras de softwares concentram
um grande número de localidades como clientes. Isto faz com que os problemas, e as virtudes
eventualmente existentes, se repitam em um grande número de municípios. Em se tratando dos
portais de transparência isto é extremamente significativo pois os relatos e observações
mostram que estes são pouco efetivos e contemplam, via de regra, os aspectos técnicos
relacionados às informações disponibilizadas.

Se as TICs são empregadas de forma intensa para a transparência públicas e oferecimento de


serviços aos cidadãos, pouco se pode dizer de seu uso em direção a processos que estimulem e
viabilizem a participação popular. Quase não se observam indícios pelo emprego de
ferramentas específicas, muito menos nos portais dos municípios. Sobram algumas iniciativas
nas redes sociais, com pouca efetividade, visto, mais uma vez, as limitações de pessoal para seu
monitoramento e encaminhamento das demandas e dos debates.

A abordagens destas questões foi aprofundada por meio de entrevistas com atores sociais que,
de algum modo, estão relacionados aos temas propostos. A opinião, e a percepção, de Prefeitos
e Vereadores municipais, servidores públicos efetivos e comissionados, integrantes de
conselhos municipais e regionais, promotores públicos e representantes das empresas que
produzem os softwares utilizados nos municípios, confirmou muitas das concepções já
existentes, bem como trouxeram novos elementos associados às ações de transparência pública,
participação e colaboração dos cidadãos. Também deixaram mais claros os motivos pelos quais
tão poucos municípios estão engajados no movimento de dados abertos.

Os portais da transparência estão disponíveis em todos os municípios Brasileiros em função das


exigências da legislação. Não é possível estimar quantos existiriam caso o conjunto de
instrumentos legais, implantados no Brasil a partir do início deste século, não existissem. De
qualquer modo entrevistados de todas as categorias reconhecem as dificuldades na localização,
compreensão e interpretação das informações existentes. O linguajar excessivamente técnico é
222

o vilão deste quadro, sendo necessário acrescentar que muitos não tinham conhecimento pelo
simples fato de que não acessam, ou nunca acessaram, este tipo de portal.

Boa parte dos governos visitados afirmam serem participativos, embora reconheçam a apatia
dos cidadãos. Em outras palavras, a responsabilidade é da população. As iniciativas que
apontam, entretanto, são aquelas que, ou permitem que a população demande serviços via
aplicativos, por exemplo, ou as redes sociais que não são monitoradas, acompanhadas e nem
respondidas pelo poder público. A falta de pessoas e as preocupações políticas impedem um
uso mais adequado destes instrumentos.

A situação se torna particularmente preocupante quando o foco é transferido para as ideias de


governos e dados abertos. O motivo, anterior a qualquer posicionamento e dificuldades de
oferecimento, é o desconhecimento. São temas que, absolutamente, não estão na agenda de
debates a nível local. Uma vez apresentados aos conceitos, com duas ou três exceções, acham
o movimento oportuno e importante. Elencam, entretanto, diversas dificuldades e limitações,
as quais são fundamentadas, mais uma vez, nas deficiências orçamentárias, nos recursos
humanos, na estrutura organizacional, nos processos licitatórios e nos interesses comerciais das
empresas produtoras de software.

Os objetivos estabelecidos para o presente trabalho, na visão deste pesquisador, foram


atendidos. Os objetivos secundários, observados individualmente, foram respondidos nas
diversas seções que compreendem esta tese. Estes objetivos, no conjunto, compreendem a
resposta para o objetivo principal.

O primeiro objetivo diz respeito à caracterização dos dados abertos governamentais no contexto
municipal, identificando possibilidades de sua aplicação na promoção da transparência pública,
da participação, do controle social e da cidadania. O segundo capítulo deste trabalho aborda o
contexto democrático no mundo atual de forma a descrever algumas linhas fundamentais em
seus conceitos e, principalmente, discute a importância destes atributos (transparência pública
e participação) nos regimes e formas de democracia existentes. Os Dados Governamentais
Abertos constituem uma alternativa concreta aos instrumentos disponíveis e empregados para
a transparência, tal como os portais da transparência. Esta possibilidade não deve ser encarada
como uma escolha e sim como uma complementação. Se os portais da transparência exibem
muitas informações, as aplicações e análises desenvolvidas sobre os dados brutos
223

disponibilizados podem fazer com que estas informações cheguem aos cidadãos de forma mais
simples e mais compreensíveis.

O segundo objetivo secundário conduz à necessidade de mapeamento e análise do marco legal


existente. A legislação sobre transparência pública e acesso à informação é suficientemente
clara e, aparentemente, seguida por todos os entes públicos no Brasil. Algumas determinações,
entretanto, são controversas. A maior deficiência observada, e relatada, sobre os portais da
transparência está relacionada às formas e linguagem empregadas, as quais são técnicas, de
difícil localização e compreensão. Embora os instrumentos legais especifiquem o oposto, trata-
se, principalmente, de acordo com os entrevistados que atuam nesta área, de uma questão de
interpretação. O certo é que pouquíssimos cidadãos são beneficiados com tais ferramentas.

Se os portais se tornaram obrigatórios em função das leis vigente não se pode afirmar o mesmo
em relação aos Dados Governamentais Abertos. As leis estabelecidas até fazem referência à
formatos abertos, mas, pelo menos até o momento, nenhuma interpretação foi na direção de que
os entes públicos devem, obrigatoriamente, disponibilizar seus dados sob formatos abertos,
como pressupõe os princípios estabelecidos pelo movimento. Esta é, certamente, uma das
razões pelo qual os municípios, e muitos outros entes públicos, não abrem seus dados.

O objetivo seguinte conduziu à verificação de se, e como, os municípios disponibilizam dados


abertos. No Estado do Rio Grande do Sul a resposta, pode-se dizer desta forma, é negativa.
Afora dois municípios que possuem portais específicos, e que estão sendo reformulados, um
pequeno grupo de localidades (pouco mais de 2% dos municípios do Estado) atendem
parcialmente aos princípios do movimento de dados abertos. Estes municípios do segundo
grupo não tornam público este oferecimento, porque não tem conhecimento desta
funcionalidade em seus portais da transparência. É preciso salientar, deste modo, que não é uma
iniciativa dos municípios. A empresa de software responsável pelas especificações e
desenvolvimento dos seus sistemas criou estas possibilidades. Muitos argumentos, assim, da
necessidade de lucro destas empresas, e como tal, nada fazer além de atender a legislação,
podem ser contestados por meio de exemplos como este.

O penúltimo objetivo levou à realização de entrevistas em profundidade que permitissem


verificar e analisar a percepção dos diversos atores (públicos, privados e da sociedade civil) em
relação à transparência pública, participação, colaboração e à disponibilização de dados abertos
224

municipais. Algumas percepções são categóricas. Todos os municípios são transparentes, todos
os agentes políticos desenvolveram ou desenvolvem ações que conduzem a uma maior
transparência no ente público em que desempenham suas funções políticas. A impressão,
ouvidos estes agentes políticos, é a de que os portais da transparência, principal instrumento
para efetivação da transparência pública, é resultado de ações pessoais. A legislação, entretanto,
aparece nos depoimentos dos demais atores restaurando a veracidade em relação a estas
ferramentas.

A participação dos cidadãos, ou a precariedade desta participação, não é de responsabilidade


dos agentes políticos. É o que estes mesmos agentes deixam transparecer. Não é possível
identificar, contudo, ações efetivas dos poderes públicos que incentivem, estimulem, organizem
ou viabilizem atos de participação cidadã.

Pouco se pode dizer em relação à colaboração da população em relação às atribuições do poder


público municipal. Esta colaboração acontece, mas não é coordenada e somente tem caráter
assistencialista e humanitário. Estas ações, evidentemente, são elogiáveis e desejáveis, mas não
significam um alinhamento às ideias de governos abertos. De outra forma, poderiam acontecer
em qualquer regime de governo, não apenas nas democracias e não somente nos governos
abertos. Não são realizadas, portanto, nesta direção.

Os dados e governos abertos, assim como o movimento que ocorre no exterior e no Brasil, não
são de domínio público. Não existe, evidentemente, a exigência de que atores políticos e sociais,
principalmente estes últimos, o conheçam. O fato de destes conceitos não serem conhecidos,
entretanto, constitui, provavelmente, o principal fator para que sejam oferecidos por tão poucos
entes públicos, notadamente os municípios.

A mobilização em torno dos Dados Governamentais Abertos deve abranger outros atores, além
dos simpatizantes que hoje se aglutinam em torno da ideia. A adesão dos municípios somente
será possível com o conhecimento e o convencimento de uma maior parcela da sociedade. É
conveniente, talvez, mais do que simplesmente investir em eventos específicos, com o objetivo
de desenvolvimento de soluções, construir um caminho pela educação. Há um terreno fértil nos
cursos superiores de áreas tecnológicas, políticas, administrativas e da comunicação.
225

Finalmente o quinto e último objetivo secundário conduziu à identificação das dificuldades dos
municípios e que levaram ao atual estado da transparência pública e não oferecimento de Dados
Governamentais Abertos. Mesmo que o conceito de dados abertos fosse de entendimento de
uma fatia maior, ou de toda a população, as restrições observadas na estrutura administrativa e
tecnológica dos municípios seria um fator bastante complexo e custoso para ser superado. O
fato de as administrações municipais não conduzirem, por conta própria, o processo de
desenvolvimento de softwares ocasiona a dependência das empresas das quais adquirem estes
produtos.

O objetivo principal desta pesquisa foi estabelecido como identificar e analisar os fatores
políticos, burocráticos e tecnológicos que dificultam ou impedem a disponibilização de dados
abertos municipais. As respostas são muitas e envolvem todos os atores envolvidos. A mais
evidente delas, e que é percebida nas administrações municipais, nas empresas de software e na
sociedade civil, é o escasso conhecimento acerca do tema. Este fator é fundamental para que
haja evolução no movimento de Dados Governamentais Abertos. As pessoas, de um modo
geral, não sabem que existe, o que significa e quais as finalidades deste movimento. O debate
sobre dados abertos está apenas ao alcance de poucas pessoas.

Os fatores burocráticos estão relacionados às administrações municipais, sua estrutura e seus


recursos. O primeiro é, possivelmente, a questão cultural associada aos servidores públicos e a
maneira conservadora e tradicional como desempenham suas funções. Estes aspectos vão desde
a qualificação dos servidores até os costumes clientelistas e paternalistas de antigamente. A
relevância e autoridade atribuída a área de TI, onde se inclui o número de servidores existentes
e as funções que desempenham, complementam este cenário. Pode-se incluir neste contexto,
ainda, a aquisição dos softwares pelas prefeituras. A legislação e os costumes referentes aos
processos de licitação ocasionam uma atenção muito pequena aos requisitos associados à
transparência pública e ao entendimento dos cidadãos. As empresas que desenvolvem estes
softwares, sem a iniciativa e demanda por parte das administrações municipais ou sem a pressão
da concorrência, dificilmente se movimentarão para a incorporação, em seus produtos, de
funcionalidades que implementem o oferecimento de dados abertos.

Os fatores tecnológicos são, ao mesmo tempo, simples e complexos, e estão fortemente


relacionados às questões burocráticas. Os recursos computacionais existentes nas prefeituras
municipais são extremamente limitados, geralmente desatualizados e têm o propósito de
226

atender aos funcionários públicos servindo como estação de trabalho pessoal. De qualquer
forma suas configurações não permitem o seu uso de forma direta na atividade de
disponibilização de dados abertos. Mesmo que os equipamentos fossem atualizados o modelo
adotado pelas administrações municipais, adquirindo softwares de terceiros, não criaria as
condições necessárias para tal oferecimento.

Por fim, os fatores políticos, os quais, em conjunto com o desconhecimento do tema, são
determinantes da pequena adesão ao movimento de dados abertos. Estes motivos envolvem,
certamente, a vontade dos agentes públicos, a formação de profissionais comprometidos com
as questões da cidadania e o interesse da sociedade. Todos estão em níveis muito baixos. É a
legislação, entretanto, a maior responsável por este quadro, ou por não existir instrumento legal
específico, ou pelo arcabouço legal existente não estar suficientemente claro. A legislação em
vigor em vigor, principalmente a Lei 12.527/2011, não referência de forma explícita os dados
abertos e, como tal, é passível de interpretações. Por outro lado, tanto as administrações
municipais, quanto as empresas que produzem software, baseiam-se fundamentalmente na lei
para a tomada de decisões e para a execução de qualquer ação específica.

A superação destas dificuldades exigirá não uma única, mas um conjunto de ações de parte de
todos os atores. Um dos aspectos principais consistirá no combate ao desconhecimento do tema.
Este papel caberá, fundamentalmente, aos ativistas que devem incrementar e interiorizar os
debates e às instituições de ensino superior pela inclusão, nos currículos de seus cursos, de
conteúdos relacionados à cidadania e aos dados abertos. Quanto maior for o número de pessoas
que conheçam o assunto maior será a demanda por disponibilização e maior será a utilização
de Dados Governamentais Abertos.

As empresas privadas que desenvolvem estas aplicações visam, via de regra, o lucro. Assim
não é possível esperar que, sem incentivos financeiros, principalmente das administrações
municipais, os produtos que comercializem reflitam os princípios pregados pelo movimento de
dados abertos. Uma alternativa que poderia ser considerada é a união dos municípios, formando
consórcios. Este agrupamento pode ser formado naturalmente pelas localidades que adquirem
suas aplicações de uma mesma empresa. Este custo, desta forma, poderia ser significativamente
diluído.
227

Na mesma direção pode ser considerado o princípio de aberto por padrão. Esta opção, muito
possivelmente, somente será possível por meio de iniciativas legais, vide o reflexo causado pela
legislação atual e o estabelecimento de portais de transparência em todos os entes públicos. A
abertura por padrão traria como consequência a concepção de que qualquer dado armazenado
nos sistemas administrativos, excetuando-se àqueles protegidos pela legislação referentes ao
sigilo e à proteção de dados, pudesse automaticamente ser fornecido com os princípios,
características e formatos prescritos pelo movimento de dados abertos.

Os dados governamentais abertos podem constituir um novo percurso para a qualificação dos
processos de participação, de colaboração e de controle social. A base para tanto é construída
sobre uma maior transparência dos atos da administração pública. Um dos pressupostos da
disponibilização de dados abertos é o incremento da transparência pública como resultado de
novos processos e novas perspectivas a partir dos dados públicos.

A disponibilização de dados governamentais abertos é um movimento recente. Os poucos anos


de existência ainda não permitiram uma maior assimilação por parte dos agentes públicos,
principalmente os Prefeitos Municipais. Assim como os portais da transparência, que passaram
a existir em todos os entes públicos somente após o advento das Leis de Responsabilidade Fiscal
e do Acesso à Informação, o oferecimento de dados governamentais abertos talvez necessite de
instrumentos legais que induzam os entes públicos a realizarem maiores iniciativas em tal
direção.

A participação dos governos não é suficiente para a obtenção de benefícios a partir de dados
abertos. Se assim fosse estaria se replicando os atuais portais da transparência. É fundamental,
neste tema, a participação e a colaboração da sociedade, tanto os cidadãos operando de forma
individual quanto o envolvimento das organizações civis ou mesmo empresariais e comerciais.
É a visão e a atuação da sociedade que adiciona valor a estes dados públicos. Não é possível,
desta forma, um comportamento passivo esperando que os entes públicos tudo forneçam,
principalmente as informações sobre eles mesmos.

Ainda são muito poucos os dados e aplicativos disponíveis. Também são poucos, e assíncronos,
os movimentos para que mais entes públicos participem deste movimento. A adesão voluntária,
como vem ocorrendo, num universo de 26 estados e 5570 municípios exigirá espaço de tempo
significativo para a obtenção dos benefícios imaginados. O engajamento de novos atores é
228

essencial para a consolidação deste movimento, essencialmente àqueles capazes de produzir


informações sobre os dados públicos, por meio da construção de novos aplicativos que
contribuam com o enriquecimento das informações que chegam aos cidadãos. A sociedade,
deste modo, tem um papel preponderante neste caminho.

Os processos participativos e de controle social podem ser qualificados na medida em que,


tantos os atores sociais que se incluem nestes processos quanto os que pesquisam sobre, tenham
acesso e possam expandir o seu próprio conhecimento. A informação relativa aos atos e
recursos públicos não é propriedade e privilégio de técnicos e governantes. A disponibilização,
ou o esforço para incrementar este movimento de dados abertos, é um caminho para diferentes
visões sobre assuntos públicos.
229

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244

APÊNDICE A – ESTRUTURA DE TI, SOFTWARES E DADOS ABERTOS NOS


MUNICÍPIOS

Este questionário é parte integrante da pesquisa de doutorado "DADOS ABERTOS COMO


INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA E DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS
BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS". O objetivo é a
obtenção de informações municipais em relação às ações, sistemas e serviços envolvendo as
Tecnologias de Informação bem como identificar nos municípios iniciativas sobre
transparência, participação e oferecimento de dados governamentais abertos.

Seja bem-vindo. Este questionário deve ser respondido por V. Sa. (ou por quem V. Sa. delegar),
de forma on-line, sendo que as respostas não serão divulgadas e nem tratadas individualmente.

A pesquisa compreende, além deste questionário, diversos outros instrumentos. Para não
comprometer a realização das próximas etapas solicitamos que a sua resposta ocorra nas
próximas duas semanas. Na ocorrência de qualquer dificuldade por favor entre em contato por
e-mail ou por telefone.

Agradecemos o seu interesse e a sua participação

Prof. Reneo Pedro Prediger

Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt (Orientador)

Existem 54 questões neste questionário.

1 Este questionário faz parte de uma pesquisa cujo título é “DADOS ABERTOS COMO
INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA E DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS
BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS” e é fruto de
trabalho de doutoramento (Tese) em Desenvolvimento Regional na Universidade
Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul – UNIJUI.

A sua participação não é obrigatória. Se estiver interessado em participar, você deve


assentir ao final da leitura deste termo.

Esta pesquisa se justifica pela importância que os temas relacionados à transparência,


colaboração, participação e ao controle social e, de forma específica, os dados abertos
governamentais, representam para a cidadania e sociedade brasileira e têm como objetivo
identificar e analisar os fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que dificultam ou
impedem a disponibilização de dados abertos municipais e propor modelos ou estratégias
para superá-los.

Os pesquisadores garantem que seu anonimato está assegurado e as informações obtidas


serão utilizadas apenas para fins científicos vinculados a este projeto de pesquisa.

O pesquisador (Reneo Pedro Prediger) e seu orientador (Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt)
245

assumem toda e qualquer responsabilidade no decorrer da investigação e asseguram que


as informações somente serão utilizadas para esta pesquisa, podendo os resultados vir a
ser publicados.

Em qualquer eventualidade o(a) Sr(a) pode entrar em contato com o pesquisador:

Reneo Pedro Prediger

O(A) Sr(a) consente livremente em participar desta pesquisa?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não

2 Agradecemos a sua participação, mesmo que V. Sa. tenha declinado do convite. Caso
mude de ideia e queira responder o questionário basta modificar a resposta da questão
anterior ou entrar em contato por e-mail ou por telefone que enviaremos novamente o
convite.

3 Nome do município *

Informe o nome do município

4 URL (Endereço do portal municipal na internet) *

Informe o endereço na internet do portal municipal. Por exemplo:

http://www.municipio.rs.gov.br

5 Nome do respondente

Informe o seu nome.

6 Cargo/Função

Informe o cargo ou função que ocupa na Administração Municipal.

7 Telefone

Informe o telefone para contato.

8 E-mail

Informe o seu e-mail.

9 Organização das atividades envolvendo as Tecnologias de Informação (TI)

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:


246

• Unidade específica (Uma unidade concentra todas, ou grande parte, das atividades que
envolvem as Tecnologias de Informação)
• Dispersas em diversas unidades/Secretarias

Defina se existe uma única unidade (ou unidade central) que gerencia e dá suporte às
atividades envolvendo as Tecnologias de Informação ou se estas atividades estão dispersas em
diversas unidades ou secretarias

10 Denominação da unidade que concentra as atividades envolvendo as Tecnologias de


Informação

Informe o nome da unidade (ou secretaria, departamento, etc) onde estão concentradas as
atividades de TI

11 Subordinação da unidade

A qual secretaria ou unidade está subordinada a unidade que concentra as atividades de TI

12 A Prefeitura Municipal (em qualquer de suas secretarias e unidades) desenvolve


softwares para utilização em seus serviços ou atividades?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não

A unidade que concentra as atividades de TI, ou qualquer das demais unidades, desenvolve
softwares ou aplicações (Sistemas de informação, Sites, aplicativos para smartphones, etc.).

13 Número de servidores dedicados ao desenvolvimento de software

Informe o número de servidores que se dedicam ao desenvolvimento de software em toda a


administração municipal. Pode ser um número aproximado,

14 Sistemas de Informação (softwares) desenvolvidos localmente, por servidores da


administração municipal.

Sistema de informação (Serviço, atividade, etc.)


01
02
03
Informe os serviços, ou atividades, que são realizadas com apoio de software desenvolvido
por profissionais do próprio município.

15 Sistemas de Informação (Softwares) adquiridos de empresas desenvolvedoras de


softwares para Prefeituras Municipais.
247

Empresa Sistema de informação (software,


fornecedora serviço, atividade, etc.)
01
02
03
Informe o nome da empresa e do software (serviço, atividade, etc.)

16 Armazenamento de dados

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Computadores do ente público


• Computadores de terceiros
• Ambos

Identifique o modo de armazenamento das informações processadas pelos sistemas


informatizados

17 Cópia de segurança (Backup)

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não

Informe a realização (ou não) de cópias de segurança das informações

18 Periodicidade do backup

Informe a periodicidade com que são realizadas as cópias de segurança.

19 Portal municipal na internet

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim, desenvolvimento próprio


• Sim, desenvolvimento por terceiros (especificar abaixo)
• Não tem
• Não sei

Identifique a existência e a forma de desenvolvimento do portal municipal na internet

20 Empresa fornecedora do portal municipal na internet

Informe o nome da empresa fornecedora do portal municipal na internet

21 Portal da transparência

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:


248

• Sim, desenvolvimento próprio


• Sim, desenvolvimento por terceiros (especificar abaixo)
• Não tem
• Não sei

Identifique a existência e a forma de desenvolvimento do portal de transparência municipal na


internet

22 Empresa fornecedora do portal da transparência

Informe o nome da empresa fornecedora do portal da transparência

23 Portal Lei de acesso à informação

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim, desenvolvimento próprio


• Sim, desenvolvimento por terceiros (especificar abaixo)
• Não tem
• Não sei

Identifique a existência e a forma de desenvolvimento de portal na internet para tratamento


das demandas relacionadas à Lei de Acesso à Informação

24 Empresa fornecedora do portal da Lei de Acesso à Informação

Informe o nome da empresa fornecedora do portal da Lei de Acesso à Informação

25 Serviços disponibilizados pela internet aos cidadãos

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Ouvidoria
• Enquete de projetos
• Segunda via de boletos (IPTU, ISS, etc.)
• Contas públicas
• Licitações
• Acompanhamento escolar
• Matricula escolar
• Pesquisa de opinião
• Agendamento de consultas
• Solicitação de serviços
• Agenda de projetos
• Outros (Especificar abaixo)

Marque os diversos serviços que podem ser acessados pelos cidadãos por meio da internet

26 Outros serviços disponibilizados pela internet


249

Informe outros serviços ou atividades não listadas na questão anterior que podem ser
acessados pelos cidadãos

27 Existe alguma normativa municipal específica sobre transparência governamental

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim (especificar abaixo)


• Não
• Não, porém está na agenda de discussões
• Não sei

Identifique a existência de lei, decreto, regulamento, etc. referente às ações de transparência


no governo municipal

28 Informações adicionais sobre as normas municipais (Leis, Regulamentos, Portarias,


etc.) que regulam as questões envolvendo a transparência pública.

Descreva ou relacione novas informações sobre as normas municipais (Leis, Regulamentos,


Portarias, etc.) que regulam as questões envolvendo a transparência pública.

29 Quais ferramentas a administração municipal utiliza para ser mais transparente

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Portal municipal
• Portal da transparência
• Serviço de Informações ao Cidadão (LAI)
• Blog´s
• Wiki´s
• Redes sociais
• Whatsapp
• Emissoras de rádio
• Jornais
• Televisão
• Outros (especificar abaixo)

30 Informe outras ferramentas empregadas pela Administração Municipal para a


transparência pública

31 Atribua uma nota ao conjunto de ações do ente municipal em relação à transparência


(1 - Nada exitosas e 5 - Totalmente exitosas)

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• 1
• 2
• 3
• 4
• 5
250

32 Quais ferramentas de participação cidadã a administração municipal utiliza

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Portal municipal
• Portal da transparência
• Serviço de Informações ao Cidadão (LAI)
• Blog´s
• Wiki´s
• Redes sociais
• Whatsapp
• Emissoras de rádio
• Jornais
• Televisão
• Outros (especificar abaixo)

33 Informe outras ferramentas empregadas pela Administração Municipal para a


participação cidadã

Por favor, coloque sua resposta aqui:

34 Atribua uma nota às ações de participação cidadã em seu ente público. (1 para nada
exitosas e 5 para totalmente exitosas)

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• 1
• 2
• 3
• 4
• 5

35 Você conhece o assunto "Dados Abertos"

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim, em profundidade
• Sim, superficialmente
• Não conheço

Identifique se você conhece algo em relação ao tema "Dados Abertos"

36 O Open Data Handbook (ODH), portal que reúne conceitos, exemplos e possiblidades
envolvendo dados abertos governamentais mostra que as instituições governamentais
coletam quantidades significativas de dados. Dados governamentais, pela legislação, são
públicos e, deste modo, podem ser abertos e disponibilizados para que a sociedade possa
utilizá-los. Para o ODH “Dados abertos são dados que podem ser livremente usados,
reutilizados e redistribuídos por qualquer pessoa, sujeitos, no máximo, à exigência de
atribuição da fonte e compartilhamento pelas mesmas regras” (OPEN KNOWLEDGE
INTERNATIONAL, 2017)
251

O objetivo da abertura de dados é que a sociedade pode tirar proveito destes dados. Um
pressuposto importante é que o ente público que os disponibiliza não pode, não quer ou
não tem a capacidade de analisá-los. Colocá-los à disposição da sociedade faz com
qualquer pessoa ou organização possa construir sobre eles novas ideias que resultem em
novos dados, conhecimentos ou serviços (CONCHA; NASER, 2012). Ramírez-Alujas
(2011) complementa que os impulsos ao movimento de dados abertos, por um lado,
promovem a inovação, pois os dados públicos são catalisadores de novas aplicações e
serviços e, por outro, devolvem aos cidadãos seus próprios dados e informações sobre as
ações governamentais aumentando, desta forma, a transparência pública. Os dados
públicos abertos podem ser considerados como um instrumento para a transparência, a
participação e a colaboração, elementos fundamentais dos governos abertos.

O portal brasileiro de dados abertos (http://dados.gov.br/) e o W3C


(http://www.w3c.br/pub/Materiais/PublicacoesW3C/Manual_Dados_Abertos_WEB.pdf)
contém informações acessíveis para uma introdução ao tema, envolvendo dados abertos
governamentais.

Referências bibliográficas

OPEN KNOWLEDGE INTERNATIONAL. Open Data Handbook. Disponível em: .


Acesso em: 15 ago. 2017.
CONCHA, G.; NASER, A. Datos abiertos: Un nuevo desafío para los gobiernos de
RAMÍREZ-ALUJAS, Á. V. Gobierno Abierto y Modernización de la Gestión Pública:
Tendencias actuales y el invitable camino que viene. Reflexiones Seminales. Revista
Enfoques, v. IX, n. 15, p. 99–125, 2011. la región. CEPAL - Serie Gestión pública, v. 74, p.
1–35, 2012.

37 A Prefeitura Municipal disponibiliza dados abertos?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não, mas está na agenda de discussões
• Não
• Não sei

Identifique se a Administração Municipal disponibiliza, de alguma forma, informações sob a


forma de dados abertos

38 Porque a Prefeitura Municipal não disponibiliza dados abertos?

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Desconhecimento do assunto
• Indisponibilidade da equipe técnica
• Não há benefícios
• Falta de interesse
• Pressão sobre o sistema
• Dificuldades relacionadas aos fornecedores de software
252

• Tamanho do ente público


• Perda da confiança em virtude da ocorrência de erros
• Ausência de controle sobre o uso destes dados
• Custo
• Desconhecimento legal
• Desconhecimento da qualidade dos dados
• Aversão ao risco
• Desconhecimento técnico
• Outros (Especificar abaixo)

Identifique o(s) motivo(s) pelos quais não são disponibilizados dados municipais abertos

39 Descreva os outros motivos pelos quais a Prefeitura não disponibiliza dados


municipais abertos.

Por favor, coloque sua resposta aqui:

40 Existem previsões para disponibilização de dados abertos?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim, no próximo ano


• Sim, sem data definida
• Não
• Não sei

Assinale a intenção do município em relação à disponibilização de dados abertos

41 Quantos conjuntos de dados o município já disponibiliza?

Informe o número de conjunto de dados (arquivos) disponibilizados sob o formato de dados


abertos.

42 Em qual dos seguintes tópicos o município já disponibiliza conjuntos de dados?

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Finanças e economia
• Meio ambiente
• Saúde
• Energia
• Educação
• Emprego
• Transporte
• Infraestrutura
• População
• Eleições
• Legislação
• Planos governamentais
• Outros (Especificar abaixo)
253

Assinale a(s) alternativa(s) que se aplicam à disponibilização de dados abertos.

43 Outros tópicos onde o município disponibiliza dados abertos

Informe os tópicos onde são disponibilizados dados abertos

44 Quantos técnicos estão envolvidos com a disponibilização de dados abertos?

Informe o número de profissionais que desempenham funções relacionadas à disponibilização


de dados abertos.

45 Como a Prefeitura Municipal decidiu quais dados/informações estão


disponibilizadas?

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Consulta à comunidade
• Consulta a potenciais usuários
• Facilidades para liberação dos dados
• Custo para produção e adequação dos dados
• Base em outros entes públicos
• Outros (Especificar abaixo)

Assinale a(s) alternativa(s) adequadas à forma como foram escolhidos os conjuntos de dados a
serem disponibilizados.

46 Outras formas de escolha dos conjuntos de dados a serem disponibilizados de forma


aberta

Informe as formas de escolha para disponibilização de dados abertos

47 Que padrões são adotados para disponibilização dos dados/informações?

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• CSV
• TXT
• XML
• JSON
• ODS
• Outro (Especificar abaixo)

Assinale a(s) alternativa(s) adequadas em relação ao padrão dos arquivos que contêm dados
municipais abertos.

48 Outros padrões de arquivos para disponibilização de dados abertos

Informe os padrões de como são disponibilizados dados abertos

49 Como a Prefeitura Municipal disponibiliza os dados abertos?


254

Por favor, escolha as opções que se aplicam:

• Portal específico para esta finalidade


• Portal do ente público
• Portal da transparência
• Portal de terceiros
• Outro (Especificar abaixo)

Assinale a(s) alternativa(s) adequadas em relação ao local de disponibilização de dados


abertos.

50 Outros locais de disponibilização de dados abertos

Informe os outros locais onde são disponibilizados dados abertos

51 Qual a periodicidade de atualização dos dados abertos?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• A cada modificação dos dados


• Diariamente
• Semanalmente
• Mensalmente
• Outro (Especificar abaixo)

Assinale a alternativa que representa o período de atualização dos dados disponibilizados sob
o formato aberto,

52 Informe a periodicidade adotada para atualização dos dados disponibilizados de


forma aberta.

Informe a periodicidade adotada para atualização dos dados disponibilizados de forma aberta.

53 A Prefeitura Municipal exige identificação do usuário para acesso aos dados abertos?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não

Identifique a necessidade, ou não, de identificação para acesso aos dados municipais abertos.

54 Você chegou ao final do questionário. Se julgar necessário pode acrescentar qualquer


comentário, sugestão ou crítica em relação ao próprio questionário ou sobre o tema
"Dados abertos", objeto desta pesquisa.

Obrigado por responder este questionário.

Os resultados serão tabulados e incluídos na pesquisa de doutorado. Caso tenha interesse em


obter o documento final, entre em contato por e-mail ou por telefone.
255

Mais uma vez, agradecemos o seu interesse e a sua participação

Prof. Reneo Pedro Prediger

Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt (Orientador)


256

APÊNDICE B – DADOS ABERTOS NOS CURSOS SUPERIORES EM


COMPUTAÇÃO

Este questionário é parte integrante da pesquisa de doutorado "DADOS ABERTOS COMO


INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA E DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS
BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS". O objetivo é a
obtenção de informações municipais em relação às ações, sistemas e serviços envolvendo as
Tecnologias de Informação bem como identificar nos municípios iniciativas sobre
transparência, participação e oferecimento de dados governamentais abertos.

Seja bem-vindo. Este questionário deve ser respondido por V. Sa. (ou por quem V. Sa. delegar),
de forma on-line, sendo que as respostas não serão divulgadas e nem tratadas individualmente.

A pesquisa compreende, além deste questionário, diversos outros instrumentos. Para não
comprometer a realização das próximas etapas solicitamos que a sua resposta ocorra nas
próximas duas semanas. Na ocorrência de qualquer dificuldade por favor entre em contato por
e-mail ou por telefone.

Agradecemos o seu interesse e a sua participação

Prof. Reneo Pedro Prediger

Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt (Orientador)

Existem 31 questões neste questionário.

1 Este questionário faz parte de uma pesquisa cujo título é “DADOS ABERTOS COMO
INDUTORES DA TRANSPARÊNCIA E DO CONTROLE SOCIAL EM MUNICÍPIOS
BRASILEIROS: UM ESTUDO A PARTIR DE MUNICÍPIOS GAÚCHOS” e é fruto de
trabalho de doutoramento (Tese) em Desenvolvimento Regional na Universidade
Regional do Noroeste do Rio Grande do Sul – UNIJUI.

A sua participação não é obrigatória. Se estiver interessado em participar, você deve


assentir ao final da leitura deste termo.

Esta pesquisa se justifica pela importância que os temas relacionados à transparência,


colaboração, participação e ao controle social e, de forma específica, os dados abertos
governamentais, representam para a cidadania e sociedade brasileira e têm como objetivo
identificar e analisar os fatores políticos, burocráticos e tecnológicos que dificultam ou
impedem a disponibilização de dados abertos municipais e propor modelos ou estratégias
para superá-los.

Os pesquisadores garantem que seu anonimato está assegurado e as informações obtidas


serão utilizadas apenas para fins científicos vinculados a este projeto de pesquisa.

O pesquisador (Reneo Pedro Prediger) e seu orientador (Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt)
257

assumem toda e qualquer responsabilidade no decorrer da investigação e asseguram que


as informações somente serão utilizadas para esta pesquisa, podendo os resultados vir a
ser publicados.

Em qualquer eventualidade o(a) Sr(a) pode entrar em contato com o pesquisador:

Reneo Pedro Prediger

O(A) Sr(a) consente livremente em participar desta pesquisa?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Sim
• Não

2 Agradecemos a sua participação, mesmo que V. Sa. tenha declinado do convite. Caso
mude de ideia e queira responder o questionário basta modificar a resposta da questão
anterior ou entrar em contato por e-mail ou por telefone que enviaremos novamente o
convite.

3 Nome do respondente

Informe o seu nome.

4 Formação acadêmica

Descreva, resumidamente, a sua formação acadêmica

5 E-mail

Informe o seu e-mail.

6 Nome do curso

Informe o nome do curso

7 Instituição

Informe o nome da instituição (Universidade, Faculdade, etc.)

8 URL do curso (Endereço do site do curso na internet)

Informe o endereço na internet do site do curso. Por exemplo:

http://www.universidade.edu.br/curso
258

9 Área do curso

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:

• Ciência da computação
• Engenharia da computação
• Sistemas de informação
• Engenharia de software
• Licenciatura em computação
• Cursos Superiores de Tecnologia (Descreva a seguir)
• Outra (Descreva a seguir)

Informe a área em que o curso se enquadra

10 Especifique uma subárea, em relação aos Cursos Superiores de Tecnologia, em que o


curso se enquadra

Por favor, coloque sua resposta aqui:

11 Especifique a área do curso:

Por favor, coloque sua resposta aqui:

12 Localização do curso

Informe a localização (Cidade, Estado) do curso

13 Número de semestres:

Informe a duração do curso (em semestres, carga horária, etc.)

14 Carga horária:

Por favor, coloque sua resposta aqui:

15 Número de alunos matriculados (2019/1)

Número, aproximado, de alunos matriculados no primeiro semestre de 2019

16 Número anual de formandos

Número, aproximado, de alunos que concluem o curso a cada ano

17 Ano de entrada em vigor

Por favor, coloque sua resposta aqui:

18 O Projeto Pedagógico do Curso (PPC) pode ser acessado externamente?

Favor escolher apenas uma das opções a seguir:


259

• Sim
• Não

19 Informe o endereço (URL) para download do PPC

Por favor, coloque sua resposta aqui:

20 Anexe (se possível) o PPC do curso

21 De que forma os temas relacionados à cidadania e à formação do cidadão estão


previstas no Projeto Pedagógico do Curso?

Por favor, coloque sua resposta aqui:

22 Relacione os componentes curriculares onde os temas relacionados à cidadania e à


formação cidadão são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:

23 Relacione as atividades complementares onde os temas relacionados à cidadania e à


formação cidadão são trabalhados

Informe quais atividades complementares realizadas pelos alunos do curso estão relacionadas
à temática da cidadania, participação e colaboração cidadã previstas no currículo do curso.

24 Relacione os eventos promovidos pelo curso onde os temas relacionados à cidadania e


à formação cidadão são trabalhados

Descreva em quais oportunidades o curso participou (como simples participante, organizador,


realizador, etc.) de atividades ou eventos relacionados ao uso de dados abertos.

25 Relacione outras atividades onde os temas relacionados à cidadania e à formação


cidadão são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:

26 De que forma os temas relacionados aos dados governamentais abertos estão


previstos no Projeto Pedagógico do Curso?

Por favor, coloque sua resposta aqui:

27 Relacione os componentes curriculares onde os temas relacionados aos dados


governamentais abertos são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:

28 Relacione as atividades complementares onde os temas relacionados aos dados


governamentais abertos são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:


260

29 Relacione os eventos promovidos pelo curso onde os temas relacionados aos dados
governamentais abertos são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:

30 Relacione outras atividades onde os temas relacionados aos dados governamentais


abertos são trabalhados

Por favor, coloque sua resposta aqui:

31 Você chegou ao final do questionário. Se julgar necessário pode acrescentar qualquer


comentário, sugestão ou crítica em relação ao próprio questionário ou sobre o tema
"Dados abertos", objeto desta pesquisa.

Obrigado por responder este questionário.

Os resultados serão tabulados e incluídos na pesquisa de doutorado. Caso tenha interesse em


obter o documento final, entre em contato por e-mail ou por telefone.

Mais uma vez, agradecemos o seu interesse e a sua participação

Prof. Reneo Pedro Prediger

Prof. Dr. Sérgio Luís Allebrandt (Orientador)


261

APÊNDICE C – ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - PREFEITOS


MUNICIPAIS

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Naturalidade:
3 – Idade:
4 – Formação:
5 – Profissão:
6 – Partido Político:
7 – Experiência pública:

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a transparência?
Que ações são realizadas pelo ente público para incremento da transparência
governamental?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência no ente público?
Como obtém as informações?
Usa o portal da transparência?
Qual o seu envolvimento no incremento da transparência pública?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre participação cidadã?
Que ações são realizadas (canais de interação) pelo ente público para incremento da
participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação no ente público?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Que ações são realizadas (Canais de interação e oportunidades) pelo ente público para
incremento da colaboração cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração no ente público?

Bloco: Controle Social


262

Qual a sua opinião (o que entende) sobre controle social?


Que ações são realizadas pelo ente público para incremento do controle social pela
comunidade?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do controle social no ente público?

Bloco: Governo aberto


Qual a sua opinião (o que entende) sobre governo aberto?
Que ações são realizadas pelo ente público para incremento do governo aberto?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do governo aberto no ente público?

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos
O ente público disponibiliza dados abertos?
Se o ente público disponibiliza dados abertos
Que ações são realizadas para oferecimento de dados abertos?
Como o ente público decidiu quais dados/informações estão disponibilizadas?
Origem e motivação
Ameaças ao oferecimento?
Benefícios esperados
Qual a sua percepção sobre o estado atual do oferecimento de dados abertos pelo
ente público?
Se o ente público não disponibiliza dados abertos
Porque?
Questões políticos e sociais, econômicas, operacionais ou técnicas que possam
estar influenciando
263

APÊNDICE D - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA –


VEREADORES

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Naturalidade:
3 – Idade:
4 – Formação:
5 – Profissão:
6 – Partido Político:
7 – Experiência pública:

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a transparência?
Que ações são realizadas pelo ente público para incremento da transparência
governamental?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência no ente público?
Como obtém as informações?
Usa o portal da transparência?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre participação cidadã?
Que ações são realizadas (canais de interação) pelo ente público para incremento da
participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação no ente público?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Que ações são realizadas (Canais de interação e oportunidades) pelo ente público para
incremento da colaboração cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração no ente público?

Bloco: Controle Social


Qual a sua opinião (o que entende) sobre controle social?
264

Que ações são realizadas pelo ente público para incremento do controle social pela
comunidade?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do controle social no ente público?

Bloco: Governo aberto


Qual a sua opinião (o que entende) sobre governo aberto?
Que ações são realizadas pelo ente público para incremento do governo aberto?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do governo aberto no ente público?

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos
O ente público disponibiliza dados abertos?
Se o ente público disponibiliza dados abertos
Qual a sua percepção sobre o estado atual do oferecimento de dados abertos pelo
ente público?
Se o ente público não disponibiliza dados abertos
Porque?
Questões políticos e sociais, econômicas, operacionais ou técnicas que possam
estar influenciando
265

APÊNDICE E - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - SERVIDORES


PÚBLICOS

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Formação:
3 – Profissão:
4 - Cargo/ Função:
5 - Vínculo com o ente público (Cargo administrativo, Cargo político, Consultor externo,
Outro)
6 – Que atividades (descreva) realiza no ente público?

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a transparência?
Que ações são realizadas pelo ente público para incremento da transparência
governamental?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência no ente público?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre participação cidadã?
Que ações são realizadas (canais de interação) pelo ente público para incremento da
participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação no ente público?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Que ações são realizadas (Canais de interação e oportunidades) pelo ente público para
incremento da colaboração cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração no ente público?

Bloco: Tecnologia de Informação


Como você interpreta a forma como a TI está organizada?
Como é o relacionamento com os fornecedores de software?
266

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos
O ente público disponibiliza dados abertos?
Se o ente público disponibiliza dados abertos
Que ações são realizadas para oferecimento de dados abertos?
Como o ente público decidiu quais dados/informações estão disponibilizadas?
Origem e motivação
Ameaças ao oferecimento?
Benefícios esperados
Qual a sua percepção sobre o estado atual do oferecimento de dados abertos pelo
ente público?
Se o ente público não disponibiliza dados abertos
Porque?
Questões políticos e sociais, econômicas, operacionais ou técnicas que possam
estar influenciando
De que forma a organização da TI ou Empresa de Software está influenciando?
267

APÊNDICE F - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA -


PROMOTORES PÚBLICOS

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Formação:
3 – Profissão:
4 - Cargo/ Função:
5 – De que forma a sua atuação está relacionada ao ente público?

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a transparência?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência no ente público?
Como obtém informações?
Usa o portal da transparência?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação no ente público?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração no ente público?

Bloco: Controle Social


Qual a sua opinião (o que entende) sobre controle social?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do controle social no ente público?

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos
O Sr(a) tem conhecimento de dados abertos disponibilizados pelo ente público?

Bloco: Aspectos legais


268

Qual a sua percepção sobre a legislação em vigor e as questões de transparência,


participação e colaboração pelos cidadãos?
Qual a sua percepção sobre a legislação em vigor e a disponibilização de dados abertos
pelos entes públicos?
Qual o seu conhecimento (percepção, entendimento) sobre a Lei nº 12.527/2011 (Lei de
Acesso a Informação)?
Qual a sua Percepção sobre o:
Art. 8º. É dever dos órgãos e entidades públicas promover,
independentemente de requerimentos, a divulgação em local de fácil acesso,
no âmbito de suas competências, de informações de interesse coletivo ou
geral por eles produzidas ou custodiadas.
§ 2º. Para cumprimento do disposto no caput, os órgãos e entidades públicas
deverão utilizar todos os meios e instrumentos legítimos de que dispuserem,
sendo obrigatória a divulgação em sítios oficiais da rede mundial de
computadores (internet).
I - conter ferramenta de pesquisa de conteúdo que permita o acesso à
informação de forma objetiva, transparente, clara e em linguagem de fácil
compreensão;
II - possibilitar a gravação de relatórios em diversos formatos eletrônicos,
inclusive abertos e não proprietários, tais como planilhas e texto, de modo a
facilitar a análise das informações;
III - possibilitar o acesso automatizado por sistemas externos em formatos
abertos, estruturados e legíveis por máquina;
IV - divulgar em detalhes os formatos utilizados para estruturação da
informação;
....
§ 4o Os Municípios com população de até 10.000 (dez mil) habitantes ficam
dispensados da divulgação obrigatória na internet a que se refere o § 2o,
mantida a obrigatoriedade de divulgação, em tempo real, de informações
relativas à execução orçamentária e financeira, nos critérios e prazos previstos
no art. 73-B da Lei Complementar no 101, de 4 de maio de 2000 (Lei de
Responsabilidade Fiscal).

Pode-se pressupor obrigatoriedade?


269

APÊNDICE G - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - CONSELHOS


MUNICIPAIS E REGIONAIS

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Formação:
3 – Profissão:

Bloco: Identificação do ente público


1 – Município:
2 – Conselho:
3 – Função:
4 – Qual a sua percepção sobre as atividades e as funções do conselho?
5 – Como você percebe a sua participação no conselho?

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a transparência?
Que ações são realizadas para incremento da transparência governamental?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência do ente público?
Como obtém informações?
Usa o portal da transparência?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a participação cidadã?
Que ações são realizadas (Canais de interação) para incremento da participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação no ente público?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Que ações são realizadas (Canais de interação) para incremento da colaboração cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração no ente público?

Bloco: Controle Social


Qual a sua opinião (o que entende) sobre controle social?
270

Que ações são realizadas para incremento do controle social pela comunidade?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do controle social no ente público?

Bloco: Governo aberto


Qual a sua opinião (o que entende) sobre governo aberto?
Que ações são realizadas para incremento do governo aberto?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do governo aberto no ente público?

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos
O ente público disponibiliza dados abertos?
Se o ente público disponibiliza dados abertos
Que ações são realizadas para oferecimento de dados abertos?
Como o ente público decidiu quais dados/informações estão disponibilizadas?
Qual a sua percepção sobre o estado atual do oferecimento de dados abertos pelo
ente público?
Se o ente público não disponibiliza dados abertos
Porque?
Questões políticos e sociais, econômicas, operacionais ou técnicas que possam
estar influenciando
271

APÊNDICE H - ROTEIRO SEMIESTRUTURADO DE ENTREVISTA - EMPRESAS


DE SOFTWARE

Bloco: Perfil do entrevistado


1 - Nome:
2 – Formação:
3 – Profissão:
4 – Idade:
5 - Cargo/ Função:
6 – Atuação em softwares (produtos) para municípios:

Bloco: Transparência
Qual a sua opinião (o que entende) sobre transparência pública?
Que funções são disponibilizadas nos produtos da empresa para a transparência
governamental?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da transparência dos entes públicos?

Bloco: Participação
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a participação cidadã?
Que funções são disponibilizadas nos produtos da empresa para a participação cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da participação nos entes públicos?

Bloco: Colaboração
Qual a sua opinião (o que entende) sobre a colaboração dos cidadãos?
Que funções são disponibilizadas nos produtos da empresa para a colaboração cidadã?
Qual a sua percepção sobre o estado atual da colaboração nos entes públicos?

Bloco: Sistemas de Informação


1- Sistemas de informação desenvolvidos pela empresa

Bloco: Desenvolvimento de serviços de Internet


1 – Portal municipal

2 – Portal da transparência
272

3 – Acesso à informação

Bloco: Tecnologias de desenvolvimento


Tecnologias usadas na empresa para projeto, desenvolvimento e integração de sistemas

Bloco: Dados abertos


Qual a sua opinião (o que entende) sobre dados abertos?
Os produtos disponibilizados pela empresa estão aptos para a disponibilização de dados
abertos? De que forma?
Não existência da possibilidade
Porque?
Dificuldades
Possibilidades

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