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TEUNA. VAN Dyk DISCURSO el ed hed Capi © 2008 Teun A. van Dik xo dem sia eden “Toor Coe on Fialy Ls) Monagen depeche “Soren 5 Vis Bo Revie Dani Mal aero » aan e Colgan abit (IP Palos (Camara Brasileira do Livro, SP. Brasil) a ee poder Ten A. van Diath tia Rens Pane, rg. SERS Comex 200 \Vériosclabordore ibliogria. ISBN 978-85-7244-406-4 1s ani do dca 2 Pade (i sec 3 ning Semin re gp 6 Te cos SRERAE, Fe Pane Kvn aa cpp-401.41 ‘i pa allo ei 1 Ruled dca: Comino lagers 4181 2. Disa epee hin Linen rao 4.05068 Iinrroma Cowrxto Diner esi ime Pinsky ot jo i 2 Abra ap ane (1 35838 . wi Sumario [APRESENTAGAO ISCURSO E DOMINAGAO: UMA INTRODUGAO .. Estudos Criticos do Discurso. Discurso e reprodugao do poder social Anélise do Discurso como anélise social 2 Do poder ao abuso de poder: dominacao. 2d A relevancia prética dos Estudos Criticos do Discurso, 33 IINTRUTURAS DO DISCURSO E ESTRUTURAS DO PODER.. A anilise do poder. a os Controle do discurso e modos de reprodugao discursiva, Estratégias de controle cognitivo e de reprodugdo ideolégica 46 ‘A anilise do poder e do discurso.. . ‘ler no discurso: uma revisto Conclusdes: HINCURSO, PODER E ACESSO Dimensdes da domingincia, Discurso e acesso. ‘Analisanclo padres de acess. Discurso, poder Alnus exemplos Conelusoes. 1 racismo 10, HALE Critica Do Discursc O que € Anilise Critica do Diseurso?. Hiqundies tedricos e conceitusis... Ae penguin em Andlise Critica do Discus. " us svn ipa) ry PaISCURSO E RACISA 134 Racismo . ed Discurso Es Conversagio. a Noticias jornalistieas. oe Liveos didéticos Pa Discurso politico: os debates arlamentares. a Conclusdes: (© DISCURSO E A NEGAGAO DO RACISMO ... Discurso € racismo. ‘A negagdo do racismo, Fungées politicas € sovioculturas A conversacio, A imprensa... 7 0 discurso parlamentar... Reverso Zonclusbes... ISCURSO POLITICO E COGNIGAO POLITICA.. ‘Relacionando politica, cogniyao ¢ discurse. Apresentacaéo ‘Abuso de poder. Essa é a denominacio dada por Teun van Dijk para a dominaco exercida pelas elites simbélicas. Até af, nada terfamos de muito novo, nao fosse a preocupagio do importante intelectual holandes da analise Um enquadre conceitual dle discurso, Utilizando como instrumento a Andlise de Discurso Critica, ee van Dijk conclui que as elites simbélicas, que tém acesso privilegiado Conclusdes 10s discussos piblicas, também controlam a reprodugio discursiva da IPULAGAO Jominagéo na sociedade. O livro mostra que isso ocorre na polftica, n DISCURSO E MAN : ae ase bvidia, na eiéncia na burocraca, por exemplo, ees Conhecido no Brasil por seus trabalhos anteriores jd publicados pela Manipalagio e cognigio... Fi Editora Contexto (Cognigdo, discurso ¢ interagdo ¢ Racismo e discurso snsio do discurso " Manipulando a compree 7 ‘se na América Latina), van Dijk demonstra neste Discurso e poder grande thaseada na meméria de curto pra ; 243 capacidade de petceber os fenémenos da sociedade, de modo interdisciplinar, Manipulagio episédica fe une abord: aE Fi ‘Manipulando a cognigao social «partir de uma abordagem com rafzes na lingufstica, mas que atingem as ees ciencias humanas em geral. Um exemplor a 257 Como todos os estudos de van Dijk na ADC nas tiltimas décadas, ony Blair legitimando a guerra contra o Trad " 203 também esses trabalhos so multidis Conteluses . . linares ¢ estabelecem uma relagio explicita entre discurso e sociedade por uma interf men ace cognitiva de modelos RUEPREENCIAS BIBLIOGRAFICAS. is © cognigées sociais como conhecimentos ¢ ideologias. Isso & petceptivel, por exemplo, na o AuTOR, ;produgao do racismo na sociedade, Racismo dine, avidentemente, mio & inate, mas aprendide a partir doy discursos Iniblicos na sociedade, diseutsos controlados pelas elites, Tambérm na politica [AS ORGANIZADORAS sess AGRADECIMUNTOS oss 1 relagio entre discurse, cognigao e sociedade é importante, por cxemplo, vis manipulagao da opinig publica nos discursos beligerantes de politicos para conseguir apoio da populagio e dos parlamentares para ages bélicas, seja em ditaduras, seja em democracias formats. Publicar esta obra € uma contribuigao da Editora Contexto ao aprofundamento da questio da andlise de discurso, que ranvos ¢ bons é Brasil. especialistas tém no i Fr importante notar que esta obra foi eradurida ¢ adaptada por wma cacelenteequipe da Universidade Federal de Pernambuco, coordenada por Karina Falcone e Judith Hoffnagel. Os Edivores Discurso e dominacao: uma introdu¢ao Se definirmos Critical Discourse Studies (CDS) ou, em portugues, Estudos Griticos do Discurso (ECD) como um movimento ‘eressado na Formagio de teoria ¢ na anilise ¢ iscursiva de abuso de poder, entio um éxame detal podér constitui uma ‘taréfa central dos ECD. No entanto, assim como ‘ovorre com muitas das nogées fundamentais das ciéncias sociais, também gio de poder revela-se tio complexa quanto vage. Nao € surpresa que ifico especificamente haja um vasto ndmero de livros e artigos dedicado & andlise desse conceito portanto, que focalizemos central em muitas disciplinas. E imperativo, imens6es de poder que sio diretamente relevantes ico, do discurso e da comunicagio. Entretanto, meu objeto de estudo —a saber, a “teprodugao discursiva de » de poder e desigualdade social” — também é uma nocio problematica > estuda do, uso lingui unto, também necessita de uma andlise tedrica detalhada. Em outras :t-nos investigar, por exemplo, de que modo uma entona¢io , um pronome, uma manchete jornalistica, uM tSpico, um i uma metifora, uma cor ou um Angalo de camera, entre ui palavras, interess expectti h {le owteas propre f en shsirato e gora como as relagoes de poder na sociedad foving precisamos relacionar propriedades tipicas do mictonivel da escritg, ha iy, cla intera iso € das prdticas semidticas 4 aspectos tipicos do macronivel da socicdade como grupos, organizagoes ou outras coletividades © suas relagoes dle dominagio. ‘Além do mais, os ECD nao esta meramente interessados em quialquet tipo de poder, mas especificam no abuso de poder, isto & nas formas de dominagio que re Uma nogio normativa desse tipo (abuso € ruim) requer uma noges € critérios normativos das ciéncias sociais, tais n desigualdade e injustiga sociais, ndlise em como legitimidade, que por sua vez pressupée uma ética aplicada ¢ ui filosofia moral. Assim, neste livro tratamos frequentemente da reproducio dliscursiva do racismo, e uma anilise critica de tais préticas discursivas pressupée, pelo menos do nosso ponto de vista, que o racismo ¢ errado, por cexemplo, porque priticas racistas (sexistas etc.) s40 normas inconsistentes com a igualdade social. Em outras palavras, vemos que muitos conceitos dos ECD precisam ser formulados em termos das préprias nogées fundamentais das ciéncias sociais Neste livro, tento contribuir para esse debate acerca dos fundamentos dos ECD, desenvolvendo nogées tedricas ¢ aplicando essas nogdes em exemplos concretos da anélise critica. Nesta introdugio apresento essas diferentes contribuigées dentro de um coerente quadro teérico. Estupos Criticos po Discurso Antes de apresentar ¢ quadro teérico para o estudo da reprodugao discursiva do abuso de poder, preciso primeiramente defender 0 estudo critico do discurso em termos mais gerais. Embora o rétulo Critical Discourse Analysis (CDA) ou, em portugues, Anilise Crisiea do Discurso (ACD) seja agora amplamente adotado, gostaria de propor uma mudanga dessa express40 para Critical Discourse Studies (CDS), isto é, Estudos Criticos do Discurso (ECD) por uma série de razbes ébvias. A principal raz4o € que os ECD ndo sio, como frequentemente sc presume — especialmente nas cltnclas socials um méfada de andlie’ do discurso, Nao existe esse tipo de método. Os ECD usam qualquer método que seja relevante para os objetivos dos seus projetos de pesquisa © tais métodos sao, em grande parte, aqueles utilizados em estudos de_ dliscurso em geral. lo De fat, ¢ pela mesma rue, Mea amdlive do discurso enn si £m pediedo; antes, constitui um dor Hqadisciplina distribulda por todas 4- Sareea Pela Meanie taste, prefiro usar 0 t6tulo Disssnrve Soudies (D) masa fd Discurso (1D) para essa disciplina, 2" SMH (DS), ou seja, Etudas Mriapos nr Estup0s (CRiTIC0S) po Dascunso Assim, tanto dentro dos estudos dis nero de i usivosem geral qu ss encontramos habitual interagao entre teoria, mécodos x 4 © Sti aplicagbes. Dessa forma, nao existe a° qnilive do discurso como um m6odo> como também nic - I * HCD em particu le ulvervayto, descrigio ow andlise, “uma” andlise ogni ‘itiva, Tanto os ED como os sce estudo Bistante dies ntes, dependendo dos objetivos | «hy investipagio, da natureza dos dads, cenudades 1voes do pesquisador, : i dos interesses ¢ das ¥em com " de outros parimetros do contexto + Anilise gramatical (Fonolégica inestica, lexical, semintica); + Anilise pragmidtica dos atos de fy, ¢ dos atos c + Anilise ret6ricas ~ * Aniilise estilisticas Aanilise de estruturas spectfica: (género etc.): narrativa, argumen- tigi, noticias jornalisticas, livre, lida ioceteres ene xe conversacional da fala 5 interacao; * Anilse semigtica de sons, imagen, © otras propri ; do discurso e da interagao. pmunicative Hsses diferentes tipos de andlise (¢servaczo, descr Ac .) di ve combinar € 5 or de So 1c) podem aneiras, de tal modo que uma ode. 5 7 pods s-concentrar Pa SSyantica da narrativa, na retética umatica dy “iética do. «lo discurso politico, na pragmética di conversagio ou na semidtica do owtilo, Dentro. de cada tipo de andlise empre hd, de novo, multas mac i ie fart-la (0 que ds.v é descrito como “métodos” ou torilagens"), como por exemplo @ a\ lise formal, a andlise funcional investi ete. que pod ver, ser bastante dite mn, por su es nas muitas teorias, evcolay ou “seitas” que conhecemos cm cada disciplina académica, Na nutioria das veres, essas anzlises serao descrigdes qualitativas dos detalhes ) da esteutura discursiva, mas, se tivermos mu dlescrigoes podem ser quantificadas. No entanto, apesar de todas essas diferengas, podemos chamar essas abordagens de maneinas de fuzer a andlise ou a descrigdo de discurso. Embors neste €aso no seja t4o comum falar de “métodos”, no sentido tradicional, ‘io hi nenhum problema sério em descrever essas “manciras de andli em termos de “métodos”. ‘Ale dessas diferentes abordagens analitcas, pesquisas em estudos do dis- curso podem recorrer aos mécodos tradicionais das ciéncias sociais, tais como: anzilises de dados, essay [+ Observacéo participante; + Métodos etnogréficos; + Experimentos, O discurso nao éanalisado apenas como um objeto “verbal” auténomo, mast ee aaa -ambém como uma inieragio situada, como uma pritica soa ar uma conversaco entte vizinhos, talvex seja necessério fazer o srabalho de campo em uma vizinhanga, observat como as pessoas falam em bares ou outros lugares puiblicos ¢ descrever muitos outros aspectos relevantes desses eventos comunicativos, tais como a sittagao temporal ou espacial, circunstincias especiais, os participantes ¢ seus papéis comunicativos e sociais, a ourras virias atividades que se realizam a0 mesmo tempo, ¢ assim por diante. Enquanto essas diferentes formas de observagio ¢ andlise so bastante tipicas das cincias sociais, muitos tipos de psicologia podem utilizar experimentos controlados de laboratério ou de campo para testar hipéteses expectficas. H4 uma grande quantidade de pesquisas sobre 0s muitos parimetros mentais que influenciam a produsio e compreensio discursiva frequentemente s6 podemos saber quais so eles e como operam 20 ‘cxaminarmos, em um experimento, como as condigées experimentais especiai (Cneunstancias, dado, tarefas et.) geram consequencias especias para o modo como falamos ou compreendemos o discurso. ou como | Em resumo, tanto os estudos do discurso quanto ay estudes criticos do discurso fazem uso de de quantidade de métodos de observagio, de coletar, cxaminar ou avaliar dados, para anilise © de outras estra pdteses, para desenvolver teorias ¢ para adquirir conhecimentos. O oc ANALITICO ESPECIAL Nos ECD {importante notar, contudo, que apesar desse pluralismo merodolégico, {hi preferéncias ¢ eendéncias em fungio do enfoque especial dos ECD sobre os sypectos de abuso de poder e, po-tanto, mais geralmente, sobre as es. consequéncias sociais da escrita e da fala. Em primeiro lugar, as pesquisas em. ECD, em geal, preferem métodos que no infringem os direitos das pessoas cstucadas e que so compativeis com os interesses de grupos sociais que sao 0 foco das pesquisas. Em outras palavras, os métodos dos ECD sao escolhidos os métodos dos E «le modo.que a pesquisa possa ssa contribuit para a apoderagao social de grupos clominados, especialmente no dominio do discuifso € da Comunicasao. Em segundo lugar, 0 méodos dos ECD concentram-se de forma «specifica nas complexas telacGes entre a estrutura social ¢ a estrutura lise cursivas ‘bem como no modo como as éstruturas discursivas podem ‘ou ser influenciadas pela estrutura social. Por exemplo, certas estruturas sintéticas oracionals so obrigatorias (tais como os artigos precedendo os substantivos em inglés), independentemente da situaco social do discurso, ©, portanto, nao vio variar diretamente em fungi do poder do falante. Se voce é da Esquerda ou da Direita, a gramatica da lingua é a mesma para todos. Em outras palavras, o abuso de poder s6 pode se manifestar na lingua onde existe a possibilidade de variacio ou escolha, tal como chamar uma mesma pessoa de “terrorist” ou de “lutador pela liberdade”, dependendo_ da posigao ¢ da ideologia do falante. Semelhantemente, noticias_na imprensa sempre tém manchetes desemy _ no um papel _na ) reprodusao le preconceitos étnicos. Assim, é antes a forma €o significado V cle uma manchere do que sua propriedade estrutural em si que podem estar ropriedade estrutural em si que podem estar relaciofiados sittacao social. Embora esse tipo de perspectiva seja, em geral, hi » ——— eee tépicos € nas fontes de noticias, ents © outras ecomendagoes — isto & na sxecugaa denormas ¢ valores profissionais gefas: Fl& podem explicitamente sugerir a climinagao Ge todas as referéncias irclevantes & etnicidade dos_ atores das noticias, especialmente as noticias negativas (crimes etc.). O mesmo ¢ verdadeiro, ¢ tem sido sugerido, para a cobertura sobre o Terceiro” Mundo ou sobre o Isla ~ da mesma maneira como tem sido repetidamente Proposto para a cobertura sobre questbes de género pela midia. 4b O PRECONCEITO £ RUIM PARA OS NEGOCIOS Além do ensino, da pesquisa e da ago politica envolvendo organizagées internacionais influentes, uma gutra estratégia importante da resistencia dos ECD afeta o centro das ideologias € priticas nedliberais: o lucia. Devlarios argumeritar € mostrar que o discurso racista ou sexista @ ruim “para 05 | negécios. Na sociedade cada vez mais multicultural dos Estados Unidos, da “uropa ou da Australia, onde muitos dos povos nao curopeus se tornaram cidadaos ¢ consumidores, é obviamente pouco inteligente contrariar esses clientes porencias com politicas, reportagens, ensino ou outras préticas iscursivas racistas. Se esses cidadaos tém uma escolha entre um jornal ou programa de televisio, escola ou firma racista ¢ um nfo racista, podemos imaginar 0 que a maioria deles escolherd, especialmente se eles mesmos Y * esto explicitamente cientes do racismo. as Diversidade entre os jornalistas pode nao ser o suficiente. Jornalistas das minorias, se recrutados de fato, sio selecionados pela semelhanca de seus valores com 0s do dono ou do editor principal dos jornais, ou porque esses jornalstas se adapram 268 colegas para poder manter seus empregos ou condigdes razodveis de trabalho. Nesse caso, éa diversidade dos compradazes de jornais que, constitu um_incentivo. poderoso para mudar-as poliicas editoriais. De forma mais geral, em tendergo a discriminar menos quando seus diretores compreendem que, tanto para o recrutamento dle pessoal qualificado como também para satisfazer seus clientes, esse preconceito é ruim para os negécios. ie ALIANCAS E COOPERACAO. A pesquisa de ECD é especialmente eficiente através de suas aliangas estratégicas com aquelas organizaées, ONGs, grupos minoricérios ou 30 v i contra dedlesigual 9 discursiva em particu instituigoes que estao engajadas n social em geral e contra a diseriminag 15 tas como © racismo, o sexismo ¢ classismo na politica, na midia, na edueagiio © na pesquisa. Isso pode nao ser todo 0 campo de operagées dos ECD, mas ¢ bastante grande para uma vasta quantidade de projetos de pesquisa e formas de cooperagio ago social. O QUE FAZER Em resumo, a relevancia pratica dos ECD pode ser encontrada especialmente na educasio critica de escudantes como fururos profissionas, no seu papel na prepatacio de especialistas para poderosas organizacoes internacionais coma também para as organizacSes-de base, ¢ac_mostrar para 0s empreendimentos empresariais que qualquer forma de discriminagio discursiva sera no fim das coi para seus negicios. " Estudiosos de ECD podem analisar criticamente livros didéticos e propor novas obras para editores e autoridades educacionais. Eles podem oferecer cursos de escrita de noticias ndo racistas para jornalistas, les podem intervir ao propor oficinas sobre inceracio no racista com clientes em muias emptesas. E assim por diante. ; Deve finalmente ser mais uma vez enfatizado que esses importantes abjetvospriticos dos ECD somente podem ser tealizados se forem baseados em uma vasta quantidade de pesquisas detalhadas sobre as préticas discursivas cruciais na sociedade e, especialmente, na politica, na midia, na educacao e na pesquisa, isto é sobre as lites simbdlicas ou discursivas e suas priticas € produtos didrios. Pretende-se que os artigos selecionados neste livro sejam tuma contribuiggo para esse esforso coletivo de pesquisa. Agradecimentos Agradego a Carmem Rosa-Caldas, Michelle Lazar ¢ Theo van Leeuwen por sua leitura critica, corregdes e sugestoes para este capitulo. (Tradugdo: Judith Hoffnagel) 7 Estruturas do discurso e estruturas do poder Este capftulo examina algumas das relagées entre discurso e poder social. Depois de uma sucinta anilise tedrica dessas relagbes, avaliaremos alguns dos recentes trabalhos nessa nova drea de pesquisa. Apesar de nos valermos de varios estudos sobre 0 poder em diversas disciplinas, nossa principal petspectiva encontra-se nas formas como esse poder é exercido, manifestado, descrita, disfarcado ou legitimado por textos e declaragées orais dent contexto social. Devotamos um atengio especial ao papel daideologia, ‘mas, a0 contrdrio da maior parte dos estudos de sociologia e ciéncias politicas, formulamos essa relagao ideolégica nos termos da teoria da cognicio social. Essa formulagio nos permite construir a indispensavel ponte tedric 0 poder societal das lasses, dos grupos ou das instituigées no nivel macro dlise ¢ 0 exercicio do p 0 € no discurso no nivel social micto, Sendo assim, nossa reviséo de outros trabalhos ness no impacto produzido por estrusuas de poder espectficas sobre vios eros dedi c suas estrun sticas., ‘A teoria da analise do discusso que fundamenta este estudo pressupe, mas também ultrapassa, meus trabalhos anteriores sobre 0 discurso (ver van Dijk, 1977, 1980, 1981; van Dijk e Kintsch, 1983), bem como outras abordagens correntes da andlise do discurso (ver as contribuigées em van rea centra- Dijk, 19854) Ou seja dando continuidade a meu trabalho sobre o disearrso, ismo nos discursos, do qual faremos u dos noticigris¢ sobre 0 a breve revisio, este gpitulo adota uma postura mais social em relagio ao discurso coferece tesenunho de um desenvolvimento mais geral rumo a um estudo ctitico da esata ¢ da fala dentro do contexto social. Nosso sinma analitico do discurso e as ébvias limitagdes de espago impostas pebfato de se tratar de um tinico capitulo significam uma série de strigoes, Princiramente, pressupomos, mas nao discutimos ou analisamos, 6s trabalhos muais sobre as relagbes mais gerais entre poder e linguagem, tema tratadoyor vatios estudos recentes (Kramarae, Shulz e O'Barr, 1984; Mey, 1985). jossa discusséo centra-se no discurso como uma forma “textual” specifica de wo da linguagem no contexto social e trata apenas de alguns dos trabalhos socilinguisticos que abordam o papel da dominancia ou do poder na variagio ero estilo lirguisticos. Em segundo lugar, jé que estamos mais inceressados m poder social ou societal e menos no poder pessoal, precisamos ignorar grané parte do campo de estudo sobre 0 poder na comunicacéo interpessoal, mn campo semelhante a este ¢ jd revisado com competéncia por Berger (185) (ver também Seibold, Cantrill ¢ Meyers, 1985). Em terceiro lugarleveros lamentavelmente nos limitar a0 papel do poder nas_ nu Portanto, deixamos de lado dados reveladores sobre 0 papel do podem outras culturas, obtidos por alguns trabalhos do campo da etnografiaie fila (Bauman e Scherzer, 1974; Saville-Troike, 1982) ou pelas pesquissatuais sobte a comunicasio intercultural. Em quarto lugar, estudos femirstas sobre o domfnio ¢ o poder masculinos na linguagem jé foram discutios ver a ampla bibliografia de Kramarae, Thorne ¢ Henley, 1983), de malo qu n0s limitaremos a revisar sucintamente as pesquisas centradas no éscurso € no poder de género. A fim de restringir ainda mais 0 tamanho da reisio aser feita aqui, hé poucas referencias aos varios estudos interessantes we tratam das relagSes entre linguagem, discurso, poder e ideologia em iversos palses europeus ¢ latino-americanos. A ANAL DO PODER ‘A anilise & poder em vérias disciplinas fez nascer um grande niimero de estudos a peito desse assunto, Entre os trabalhos recentes incluem- 40 se os estudos de Dahl (1957, 1961), Debnam (1984), Galbraith (1985), Lukes (1974, 1986), Miliband (1983), Mills (1956), ‘Therborn (1980), White (1976) ¢ Wrong (1979), entre muitos outros, Grande trabalhos opera dentro dos limites da sociologia ¢ das ciéncias pol ie desses, Nao pretendemos neste capitalo revisar ou resumir essa rica tradigao. Sclecionamos, entao, algumas das principais caracteristicas do poder social ¢ reconstruimos aquelas presentes em nosso préprio sistema tebrico. Deve-se terem mente, porém, que em nossa opiniao a nogao complexa de poder nao pode ser simplesmente esgotadz em uma definigao simples. Necessita-se de ‘uma teoria madura ¢ interdisciplinar para capturar as implicag6es ¢ aplicagies ‘mais importantes do conceito. As caracteristicas do poder que sao relevances para nossa discussio podem ser resumidas da seguinte forma: (1) Poder social é uma caracterfstica da relacdo entre grupos, classes ou ‘utras formagées sociais, ou entre pessoas na qualidade de membros ‘Apesar de podermos fala de poder, esse poder individual é menos relevante para a nossa explicacio sistemética do papel do poder no dis. \quanto interago social. (2) Em um nivel elementar, mas fundamental da andlise, as relagdes de poder social manifestamse, ipicamente, na interagao. Desse modo, afirmamos que 0 grupo A (ou seus membros) possui poder sobre o grupo B (ou seus membros) quando as ages reais ou potenciais de A exercem um controle social sobre B. J4 que o conceito de ago em si envolve o conceito de controle (cognitivo) pelos agentes, o controle social sobre B por meio das ages de A induz a ui aco no autocontrole de B. Em outras palavras, 0 exercicio de poder por A resulta em uma limitagio da liberdade social de acio de B. caso do exercicio de uma forca fisica, 0 poder de A is ou eventuais agbes de B pressupde que A precisa ter controle sobre as condigGes cognitivas das ages de B, tais como desejos, planos e crengas. Independentement jotivos, B pode concordar com A ou aceitar fazer 0 que A deseja, ou seguir a fei, as tegras ou 0 consenso de forma a agir de acordo com (os interesses de) A. Em outras palavras, o poder social é geralmente indireto ¢ age por meio da “mente” das pessoas, por exemplo, controlando as 4 Woes OU Opinides de que precisam para planejar ou exec suas a s. A maior parte das formas de controle social da nossa sociedade implica esse tipo de “controle mental” cexercido tipicamente por meio da persuasio ou de outtas formas de comunicagao discursiva, ou resultante do medo de sangées'a serem impostas por A no caso de B nao atender aos desejos de A. E nesse ponto que nossa andlise do papel do discurso no exercicio, manutengao ou legitimagio do poder torna-se relevante. Note-se, ») porém, que essa ‘mediagio mental” do poder também deixa espaci / para graus varidves de liberdade e resistencia daqueles que subjugados pelo exercicio do poder. (4) O poder de A precisa de uma base, ou seja, de recursos socialmente disponiveis para 0 exercicio do poder, ou da aplicacao de sangies no caso de desobediéncia. Esses recursos consistem geralmente em atribucos ou bens socialmente valorizados, mas desigualmente discribuidos, tais como riqueza, posigéo, posto, status, autoridade, conhecimento, hebilidade, privilégios ou mesmo o mero pertenci- ‘mento a um grupo dominance ou majoritério, O poder é uma forma de controle social se sua base for constituida de recursos socialmente relevantes, Em geral, 0 poder ¢ intencional ow involuntariamente exetcido por A a fim de manter ou ampliar a base de poder de A ou para evitar que B 2 come. Em outras palavras, 0 exercicio de poder por A atende geralmente aos interesses de A. (5) Um fator crucial no exercicio ou na preservagio do poder é que, para A.exercer controle mental sobre B, B precisa conhecer os desejo voncades, as preferéicis ou as inten direta— por exemplo, em atos de fala, tais como comandos, pedidos Ou ameagas -, esse conhecimento pode ser inferido das crencas, das normas ou dos valores culturais, dé um compartilhado (ou contestado) consenso dentro de uma estrutura ideoldgica ou da observacio e interpretaca (6) O conttole social total nas sociedades ocidentais contempordneas limia-se ainda mais devido ao campo ¢ & extenséo do poder dos agentes de poder. Ou seja, haa possibilidade de os agentes de poder W educagaio ou qualquer contexto social especifico, tal como t ow um tribunal, De forma semelhante, a extensio das suas de ages pode limicar-se a um pequeno ntimero de pessoas ou ampliar se para uma classe ou grupo intciros de pessoas ou acbes especli B, inalmente,oindividuo poderoso pode recebe responabilidades de poder, que também envolve varias formas de compartilhamento de poder, hé a dimensio nada desprezivel da resisténcia: grupo ) dominados.e.seus membros raras vezes.se mostram totalmente / impotentes. Sob condigées socioccondmicas, hist6ricas ou culeurais /\ especificas, tais grupos podem envolver-se com varias formas de “ fesisténcia, ou seja, com o exercicio de um contrapoder, 0 que, 2 seu turno, pode tornar 0 poderoso menos poderoso, ou até mesmo. vulnerével, situagio pica das revolugdes. Portanto, o exercicio do poder ndo s¢ limita simplesmente a uma forma de ago, mas consiste em uma forma de interaco social (7) O exercicio ¢ a manutengéo_do_poder social pressup6em uma estrutura ideoldgica. Fesa estrurura, formada por cognigées fundamentais, socialmente compartilhadas ¢ relacionadas aos. interesses de um grupo seus membros, ¢ adquirida, confirmada ou alterada, principalmente, por meio da comunic: iscurso, (8) Deve-se repetir que 0 poder precisa ser analisado em relagio 3s varias, formas de contrapoder ou resisténcia vindas dos grupos dominados (ou de grupos de ago que tepresentam tais grupos), 0 que também € uma condicio para a anise dos desafios e das mudangas sociais ehistricas. CONTROLE DO DISCURSO E MODOS DE REPRODUGAO DISCURSIVA Uma condigdo importante para o exercicio do controle social por meio do discurso € 0 controle do discurso e a sua prépria produgao. Sendo as perguntas centrais s4o: quem pode falar ou escrever 0 que, para. quem, em quais situagées? Quem tem acesso aos varios géneros.e. formas do discurso + reprodugio? Quanto menos poderosa for uma pessoa menOF © Scu acesso as virias formas de escrita ¢ fala. No fim das contas, os sem-poder “nao tém nada para dizer”, literalmente, nao tém com quem falar cuprecisam ficar em siléncio quando pessoas mais poderosas falam, como no «aso das criangas, dos prisioneiros, dos réuse (em algumas culturas, incluindo sgumas vezes a nossa) das mulheres. No diaa dia, a maior parte das pessoas, sm quilidade de falantes, possui um acesso ativo apenas nas conversas com embros da familia, amigos ou colegas de trabalho. De vez em quando, en didlogos mais formais, essas pessoas podem falar como representantes ipsitucionais ou com stperiores no trabalho, mas nesse caso assumem um pupel mais passivo e reativo. Em uma delegacia de policia, em um tribunal, «num posto do servigo social, na sala de aula ou em outtas instituigoes da tusocracia social, espera-se que falem ou que deem informacdes apenas se iasadas a fazé-lo ou se ordenadas a fazé-lo. Quanto & maior parte dos tipos ée discurso formais, puiblicos ou impressos (entre os quais, os da grande nidia 05 menos poderosos figuram apenas como receptores, 0s grupos mais poderosos ¢ seus membros controlam ou tém acesso a unagama cada vez. maisampla e variada de papéis, géneros, oportunidades «eiilos de discurso. Eles controlam os didlogos formais com subordinados, dem reunioes, promulgam ordens ou leis, escrevem (ou mandam «eet) vitios tipos de relatdrio, livros, instrucbes, histérias e vatios outros dscus0s dos meios de comunicagao de massa. Nao sio apenas falantes ativos maior parte das situag6es, mas tomam a iniciativa em encontros verbais «a n0s discursos piblicos, determinam o “tom” ou o estilo da escrita ou da fla, determinam seus assuntos e decidem quem serd participante e quem se eceptor de seus discursos, Deve-se ressaltar que o poder no apenas apace “nos” ou “por meio dos” discursos, mas também que é relevance caso forga societal ‘por detrés” dos discursos. Nesse momento, a relacao cage discurso e poder € prdxima e constitui uma manifest iret do poder da classe, do grupo ou da instituigzo e da po s idaivos de seus membros (Bernstein, 1971-1975; Mueller, 1973; Schataman esirauss, 1972). 0 poder é exercido ¢ expresso diretamente por meio do acesso dife. yaiado 208 varios géneros, contetidos e estilos do discurso. Esse controle = yoieser analisado de modo mais sistematico nas formas de (re)produgio ial, articula produgae do discurso, especificamente em termos d Gio, distribuigao ¢ influéneia, Dessa de massa ¢ seus (geralmente estrangeiros) proprietiri 1s condigdes financeiras quanto as tecnolégicas da producio do discurso, | por exemplo, nos jornais, nas TVs, no mercado editorial, bem como nas | cle comunicagio empre ntrolam tanto indtistrias de telecomunicag6es informatica (Becker, Hedebro ¢ Paldén, | 1986; Mattelart, 1979; Schiller, 1973). Por meio de investimentos seletivos, | controle orgamentétio, contratzgao (e demissio) de pessoal, e algumas vezes por meio da influéncia editorial direta ou diretrizes, eles podem controlar parcialmente 0 contetido ou ao menos a dimenso do consenso e dissenso da maior parte das formas de discurso puiblico. Para os meios de comuni- cago privados que dependem da propaganda, esse controle indireto pode exercer-se também por meio de empresas que sio clientes import ‘ou mesmo por meio de novos e proeminentes participantes do cendtio (geralmente institucionais) que fornecem com regularidade informagdes das quais dependem os meios de comunicagio. Esses mesmos grupos de poder também controlam os virios madas de distribuicao, especialmente 0s discursos dos meios de comunicacio de massa, ¢, por conseguinte, tam-_ bém controlam parcialmente os mecanismos para exercer influéncia sobre, aesctita ea fala piblicas. © modo de producto da atticulacio ¢ controlado pelo que se pode chamar de “dlites simbélicas”, tais como jornaliscas, escritores, artistas, diretores, académicos ¢ outros grupos que exercem 0 poder com base nq_ “capital simbélico” (Bourdieu, 1977, 1984; Bourdieu ¢ Passeron, 1977). Esses grupos possuem relativa liberdade e, por essa razio, relative poder para tomar decis r s bélico nao se limita § arriculagéo.em.si, mas também influéncia: cles podem determinar a agenda da discusséo publica, influenciar a televancia dos tépicos, controlar a quantidade ¢ 0 tipo de informagao, especialmente quanto a quem deve ganhar destaque publicamente e de que forma. Eles sio os fabricantes do conhecimento, dos padres morais, das crengas, das atituddes, das normas, das ideologias,e dos valores ptiblicos. Portanto, seu poder simbélico é também uma forma de poder ideoldgico. Apesar dos pzoblemas existentes quanto ao con lite” (Domboff e Ballard, 1968), utilizamos esse termo para nos referitmes ao conceito ampliado (aocontririo de Milis, 1956, por exemplo) que cnvolve © controle social exclusivo de um pequeno grupo. Ou que, a0 lado das elites politica, militar e econdmica, as clites simbélic clesempenham um papel essencial 20 dar sustentacio ao aparato ideolégico que permite 0 exercicio e a manutengdo do poder em nossas modernas sociedades da informagio e da comunicagio. Como, no entanto, amaior parte dessas elites é controlada pelo Estado ou por empresas particulares, elas também possuem Festri ja, defender slo, em geral,_ fundamencalmente diferentes dos interesses e das ideologias dos que pagam_, seus salios ou thes de apoio. Apenas alguns grupos (por exemplo, os | romancistas ¢ alguns académicos) dispoem da possibilidade de exercer | um contrapoder, que ainda precisa ser manifestado dentro dos limites da das elites € tipicamente escondida em termos ideol6gicos por meio dos irios valores, normas e cédigos profisionas, po por exemplo, por mio da crenga disseminada na * liberdade de expresio” nos meios de comunicé 1987; Golding ¢ Murdock, 1975 owning, 1980; Fishman, 1980; Gans, 1979; all, Hobson, Lowe e Willis, 1980). ESTRATEGIAS DE CONTROLE COGNITIVO E DE REPRODUGAO IDEOLOGICA Se a maior parte do poder discursivo presente em nossa sociedade diz respeito ao tipo persuasive exposto acima, entdo, apesar do controle essencial e muitas vezes fundamental dos modos de produgio e distribuigéo (especialmente no caso do discurso mediado através da massa), a influencia Hecisiva sobre a “mente” das pessoas dé-se por meio de um controle antes, ‘simbélico que econémico, De forma semelhante, ao reconhecer o controle ido sobre os mais fracos no dominio socioeconémico (dinheiro, cempregos, servigos de assisténcia social), um componente importante do cexercicio e da manutengao do poder ¢ ideol6gico e baseia-se em varios tipos 40 dle accitagao, negociagao, contestagao © consenso, ‘Tormase crucial, desse modo, analisar © papel estrarégico do discurso ¢ de seus agentes (falantes, escritores, editores e assim por diante) na reprodugio d hegemonia sociocultural. Dado que as elites simbélicas detém um grande controle sobre o modo de influéncia exercida por meio dos géneros, dos ‘6picos, das argumentagbes, dos estos, da retérica ou da apresentagio da cscrita € da fala piblicas, o poder simbélico delas ¢ considerdvel, embora exercido dentro de um conjunto de limitagdes. poder, o assunto merece algumas Saude apesar de ser at resumir as proposigdes cléssicas ¢ as discussdes atuais a seu respeito (ver Abercrombie, Hill Turner, 1980; Barrett, Corrigan, Kuhn e Wolf, 1979; Brown, 1973; Centre for Contemporary Cultural Studies [CCCS], 1978; Donald ¢ Hall, 1986; Kinloch, 1981; Manning, 1980). Apesar da variedade 20 conceito de ideologia, pressupde-se, ia” de um grupo explicitamente elaborada ou ndo em um sistema ideol6gico, que praticas socioecondmicas, politcas e culturais dos membros do grupo, de_ forma tal que seus interesses (do grupo ou da classe) materializam-se (em_ prinefpio da melhor maneira possvel). Tanto a ideologia em si quanto as la sto frequentemente adquitidas, exercidas ituigdes, como o Estado, os meios de comunicagao, 0 aparato educacional, a Igreja, bem como por meio de instituigées informais, como a familia, As anélises marxistas cléssicas sugerem, de forma mais especifica, que a ideologia dominance. determinado perlodo costuma ser a ideologia dos que controlam os meios de reproducio ideolégica, especificamente, a classe dominante. Isso pode implicar que certos grupos ou classes dominados desenvolveriam ip cnn distorcidas sobre sua Feversa, 05 grupos ou ‘clases dominantes tender a esconder oon ideologia conder sua C0 (6 portanto, seus intereses) e terdo por mera fazer que STIG, em geral 47 aveita como um sistema de valores, normas ¢ objetives "geral” ou “natural” Nesse caso, a reprodugio ideolégica incorpora a natureaa da formagao de consenso, ¢ © poder derivado dela oma uma forma hegeménic Deixando dé lado varios detalhes e elementos complicadores, nossa anilise da ideologia adota uma direcéo em certa medida diferente e mais especifica do que a claborada tradicionalmente (ver também van Dijk, 1987). Apesar de, inegavelmente, haver préticas ¢ instituigdes sociais que desempenham um papel importante na expresso, no exercicio ou na reprodugio da ideologia, devemos partir do pressuposto de que a ideologia “em si” no € 0 mesmo que essas priticas e instituigées. Em vez disso, | tomamos como ponto de partida o fato de a ideologia ser uma forma de cognigao social (ver, por exemplo, Fiske e Taylor, 1984, para uma introduco mais ampla sobre o estudo da cognigio social). Esse pressuposto nao significa que a ideologia compée-se simplesmente de um conjunto de crengas ou atitudes. Sua natureza sociocognitiva é mais elementar, Segundo essa anAlise, tuma ideologia é uma estrutura cogniciva complexa que controla a formasio, transformacio ¢ aplicagao de outros tipos de cognisao social, tais como o conhecimento, as opiniGes e as posturas, ¢ de representagbes sociais, como_ 9s preconccitos sociais. Essa estrutura ideolégica em si consiste em normas, valores, metas e principio: socialmente relevantes que siv sclecionados, combinados e aplicados de forma tal a favorecer a petcepsao, interpretacdo_ € agao nas préticas sociais que beneficiam os interesses do grupo tomado como um todo. Dessa forma, uma ideologia proporciona cocréncia 3s atitudes sociais, que, por sua vez, codeterminam as priticas sociais. Deve-se sublinhar que 9s cognigdes sociais ideolSgicas nao sio sistemas de crencas ou, ‘pinides individuais, mas essencialmente as cognigdes sociais de membros de formagoes ou instituigdes sociais. De forma semelhante, segundo essa andlise, ‘no usamos termos como “falso” a fim de denotar ideologias especificamente “tendenciosas”. Todas as ideologias (incluindo as cientificas) en a. (re)construsao da realidade social dependente de interesses. (Um critério apropriado para a avaliagao de uma tal construcéo seria sua relevancia ou cficiéncia para as préticas sociais das formacGes sociais e de seus membros na realizagao de suas metas ou interesses.) ‘A aquisigéo de uma ideologia, no entanto, nao se guia pelos “interesses objetivos” de cada grupo ou classe, apesar de, em muitas ocasies, e 18 nua OUTS historicamente, esses interesses poderem eventualmente sup! Entao, 0 dise condigdes de (re)produgio ideold picagao, segundo sugerimos, desempenham um papel central na (trans)formag da idcologia. Dessa perspectiva, é realmente crucial exam ieio de quais processos, controla os meios ou as instituigées da (re)producio idcoldgica, tais como os meios de comunicagao ¢ as instituigdes de ensino. Apesar de a formagao da estrutura sociocognitiva fundamental da ideologia set um processo bastante complexo, ela precisa ao menos de uma base de crengas (verdadeiras ou falsas). Este capitulo tenta mostrar que o discurso, © em especial o discurso de instituiges e de grupos poderasas, é a prética social essencial capaz de mediar e administrar essas crencas (Roloffe Berger, 1982). Diferentemente da maioria das abordagens adotadas nas ciéncias sociais ¢ politicas a respeito da ideologia, pretendemos realizar uma andlise sociocognitiva mais sistematica das estruturas ideoldgicas e dos processos. cenvolvidos em sua (trans)formagao e utilizagao. Esse objetivo significa que as ideologias precisam ser elaboradas em detalhe e que se deve mostrar como tais cognigies grupais influenciam as construgées sociais da realidade, as praticas sociais e, por conseguinte, a (trans)formag&o das estruturas societais. De forma semelhante, precisamos de uma andlise explicica das estrut estratégias € processos do discurso ¢ de das ideologi rand asp a ideologia deriva das macroandlises tipicas da sociedade, negligenciando quem, ¢ por as _estruturas € os processos reais no_nivel micro do funcionamento da. ideologia. Fssa abordagem global e superficial também impede que se faga a ligacao entre as ideologias societais ¢ grupais (¢ as estruturas de poder que as determinam, escondem ou legitimam) com as praticas sociais concretas da interacio intra ¢ intergrupais, incluindo 0 papel especifico do discurso_ nas (trans)formagées ideol igicas. ‘DISCURSO E REPRODUGAO IDEOLOGICA ‘A fim de desenvolver ¢ mudar suas ideias, as pessoas usam uma va- riedade de discursos ~ entre os quais os interpessoais — ¢ de informagoes tiradas deles. Observe-se, porém, que a complexidade do processamento de textos e da formagio de atitudes no permite, obviamente, que se realizem. ‘ransformacées imediatas nas crengas e opiniées publicas, muito menos 49 is atdes ¢ ideologias altamente organizadas (Petty ¢ Cacioppo, 1981; Roloti, Miller, 1980; van Dijk ¢ Kintsch, 1983). E, ainda assim, cabe A lite siahglica ¢ a seus discursos controlar os tipos de discurso, os tdpicos, os tipye a quantidade de informagao, a selegio e a censura dos argu- mente a natureza das operacées ret6ricas. Essas condigées determinam, em esigcia, os contetidos ¢ a iizagio do conhecimento piiblico, as hicrargias de crenga ¢ a amplitude do consenso, que em troca s40 fatores. poderts na formacao ¢ na reproducao de opinies, atitudes e ideologias (Burtoye Carlen, 1979). a = Naincios de comunicacio jornalisticos, essa estratégia de controle do conheynento ¢ por meio da selegio restritiva de assuntos ¢, mais geralmye, por meio de reconstrugées especificas das realidades sociais e politica (Hall et al., 1980; Tuchman, 1978; van Dijk, 1987b, 1987c). Esse process¢ dirigido por um sistema de valores ¢ de ideologias profissiona sobre anorcias ¢ sobre 0 que deve ou nio ser noticia, algo que costuma direcioy: 9 foco ¢ o interesse para virios dos participantes da elite: atores, SFuposclasses, insticuigbes, paises e regiGes (Galtung e Ruge, 1965). O acess0 ty cobertura privilegiados (sejam negativos ou positivos) a tespeito de protionists das noticias é um fator importante da reproducao do poder | social ayyal é mediada pelos meios de comunicagio de snassa (Brown et. , al., 198), © mesmo-vale para 0 setor educacional, em que o curriculo, os livros dijcicos, os materiais de ensino e as aulas também sio ditigidos por objetivo, assuntos, temas estrarégias de aprendizagem que, em sua maioria, | costumay coadunar-se com os valores e interesses dos vérios grupos de poder dite (Apple, 1979; Lorimer, 1984; Young, 1971). Em vista disso, | ercebeyos que as elites simbélicas que controlam 0 estilo ¢ 0 contetido do disctso midiético ¢ educacional também sao as que detém 0 controle Patcial, wy sociedade, sobre os modos de exercer influéncia e, portanto, sobre a tprodusio ideolégica, a a AS cies simbélicas, conforme sugerimos aqui, nao sio independentes dos outs grupos de poder, em sua maioria econémicos e politicos (Bagdikig, 1983). Pode haver um conflito e uma contradigao entre os Interessg¢, consequentemente, entre as ideologias desses respectivos grupos de poderfsses outros grupos de poder nao apenas possuem os meios diretos_ € inditeys para controla: a producao simbélica como também possuem 50 ata Fabrica Ds mein suas preiprias estrateygias ps w da opiniao, Quanto Comunicagito, essas estratégias consistem no fornecime favordveis) na forma de releases, entrevis orpanizacional de informagoes entrevistas individuais, vazamentos de informagio ou out formas de acesso privilegiado 20s que sio noticia. Os habitos jornalisticos dao-se de tal forma que essas pré-formulagées possuem mais chances de serem reproduzidas do que out:os tipos de fonte de discurso (Collins et al., 1986; Gans, 1979; Tuchman, 1978; van Dijk, 19876) No setor educacional, o constrangimento global no sentido de evitar questbes “polémicas’ censura as opiniGes sociais ¢ politicas m: radicais, inconsistentes com as ideologias sociopoliticas dominantes. Mais concretamente, a5 organizagdes oficiais ou as empresas podem fornecer materiais educacionais gratuitos, pecas de propaganda em revistas sobre pedagogia, ou dispor de outras formas para influenciat os professores ¢ 0 contetido dos textos didaticos (Domhoff, 1983). De forma semelhante, as elites do poder também possuem acesso a manobras para controlar a dissidéncia ¢ a resisténcia, entre is a contratacao de pessoal e na decisao sobre realizar processos de selega ‘pagar patrocinios, impondo formas mais ou menos confessas de censura, recorrendo a campanhas de difamagao ¢ a outros mecanismos pat: silenciar os “radicais” ¢ os seus meios de comunicag4o (Domhoff, 1983; Downing, 1984; Gamble, 1936). Por isso, em muitos paises ocidentais, | basta que alguém seja taxado de “comunista’, ou como uma pessoa contrdria 20 nosso tipo de “liberdade” ou a um valor dominante similar, para ser desqualificado como um formulador sério de contraideologias. | Essa é uma estratégia poderosa para manter a prdpria elite simbélica sob ‘Controle, tanto interna quanto externamente. Em outras palavras, hd uma vatiada gama de estratégias econémicas, culturais e simbdlicas por mei das quais 0s Varios grlipos de poder podem, de forma paralela ¢ algumas vezes nao sem algum tipo de conflito ou contradi¢ao mtitua, ger ° conhecimento a informacio, disseminar os valores e metas dominant 6, assim, prover as pegas formadoras das ideologias dominantes. O poder. dessas ideologias, capaz-de moldar o consenso, fornece as candigfes que rornam desnecessdfia qualquer “conspiragao” dess c = 5I A ANALISE DO PODER EDO DISCURSO Dentro de um quadro bastante genérico do poder social e do controle do dliscurso, podemos agora nos concentrat mais especificamente nas muitas ma- neiras pelas quais o discurso relaciona-se com essa forma de controle social GENEROS DE DISCURSO E DE PODER ‘Daremos inicio a nossa andlise com uma tipologia dos caminhos pelos quais © poder ¢ exercido através do discurso como forma de interagao soci (1) Qbtém-se um controle direto sobre a acéo por meio de discursos que possuem fungbes_pragmdticas diretivas (forca ilocutéria), tais | dos, ameacas, leis, regulamentos, instrugées ¢, mais indiretamente, por meio de recomendagGes e conselhos. Os falantes _~ costumam tet um papel institucional ¢ seus discursos apoiam-se ‘com frequéncia no poder institucional. Nesse caso, consegue-se a /:quiescéncia muitas vezes através de sancdes legais ou de outros pos de sanso institucional. (2) Os tipos persuasivos de discurso, tais como os amtincios publicicérios ¢as propagandas, também pretendem influenciar as agées futuras dos receptores, Seu poder baseia-se nos recursos econdmicos, financciros ‘ou, em geral, empresariais ou institucionais e exerce-se por meio do acesso aos meios de comunicagio. Nesse caso, a aquiescéncia ¢ fabricada por mecanismos retéricos, por exemplo, por meio da repeticao ou da argumentagio. Mas, claro, com o apoio dos imecanismos tradicionais de controle de mercado. (3) Para além dessas formas prescritivas de discurso, as agGes fucuras tambéii podem ser influenciadas por deserigoes dos acontecimentos, 6 it ras ou eventuais; por exemplo, em previsdes, 3s, cendrios, programas ou alertas,algumas vezes combinados com diferentes formas de conselho. Os grupos de poder envolvidos nesses processos sio geralmente profissionais (expert) e sua base de poder assenta-se muitas vezes sobre 0 controle do con 0 ¢da tecnologia (Pettigrew, 1972). Os meios retéricos consistem, getalmente, na argumentagio e na descri¢ao dos cursos alternativos ¢ indesejados da aga, Mais implicitamente, relatérios académicos sobre o desenrolar econdmico ¢ social podem ter influéncia sob agao futura dos individuos (4) Viirias modalidades de narrativas por vezes comuns e, portanto, po velmente influentes, tais como romances ou filmes, podem descrever carga (in)desejavel de agdes futuras e podem recorter a uma ret6rica com apelos dramdticos ou emocionais, ow a varias formas de origina- lidade estlistica ou temtica. Os grupos de poder envolvidos nesse rocesso formam o que se costuma chamar des elites simbélicas, Um_ processo forms caso lessa clase de discurso sio as reportagens jornalisticas dlivulgadas pelos meios de comunicagao, que nao apenas descrevem 08 eventos atuais € suas possfveis consequéncias como apresentam ‘esgencialmente as agGes e representam as opiniGes das elites politica, econdmica, milicar.¢ social do poder. Basicamente, € por meio desse. eeutsa que se fabrica.a base consensual da pader e que o piblico em. getaLfica sabendo quem possui poder e o que desejam os poderosos. Essa € uma condigao crucial para o desenvolvimento da estrutura oldgica que dé sustentagio ao poder, mas também para as varias Formas de resistencia (“conhece teus inimigas”) A primeira tipologia mostra que o exercicio discursive do poder dé-se pre- dominantemente pela via persuasiva. Os grupos ou instituigdes de poder apenas ramente precisam prescrever 0 que os menos poderosos devem fazer, apesar de, em iiltima instancia, haver a possibilidade de essas diretivas serem decisivas no controle de tetceiros, como € 0 caso especifico do controle estaal. im vez clisso, eles argumentam oferecendo justificativas econdmicas, politicas, sociais ‘c morais, e administrando o contole das informagdes relevantes. Dessa forma, © teor da comunicago pode ser distorcido por meio da divulgacao seletiva de informagdes que favoregam a elites do poder ou por meio da limitacio do acesso « informagbes desfavordvels a tis elites, O Cumprimento dessas metas pode set facilitado recomendo-se a varios meios retéricos ¢ atisticos. male in ODA | ‘Uma segunda dimensio vai além da simples tipoldgia dos géneros de discurso e de suas contribuigées para o controle social. Ela apresenta os varios NIVEIS DE DISCURSO E DE PODER jl | 53 niveis de discurso que podem favorecer, manilestar, expressir, deserever, sinalizar, esconder ou legitimar as relagoes de poder entre os participantes do discurso ou entre os grupos aos quais pertencem. Portanto, como jé vimos antes, 0 poder pode ser exercido primeiro no nivel pragmdtico, por meio do acesso limitado a atos de discurso ou do Controle desses atos, tais como comandos, acusagées formais, indiciamentos, absolvigbes ou outros atos institucionais de fala. Em segundo lugar, na interagao conversacional, um dos participantes pode controlar ou dominar_ a toca de tumos, as estratégias de auroapresentagdo ¢ 0 controle sobre quaisquet outros nfveis de fala espontanea ou de dislogo formal. Em terceiro, a selegio do tipo ou género de discurso pode ser controlada pelos falantes mais poderosos, por exemplo, na sala de aula, nos tribunais ou dentro” de ambientes empresariais: algumas vezes, abre-se espago para histérias contendo experiéncias pessoais; no entanto, com maior frequéncia, elas tendem a ser censuradas em favor de géneros de discurso controlados que tratam do assunto em questio, como, por exemplo, nos interrogatérios. Quarto, excluidas as conversas do dia a dia, os temas deixam-se controlar, geralmente, pelas regras da situacio comunicativa, mas sua iniciagio, mudangas ou variagbes 0 controladas ou avaliadas na maior parte das vvezes pelo falante mais poderoso. O mesmo vale para o estilo ¢ a retérica, DIMENSOES DO PODER A andlise das estruturas de poder permite-nos arrolar outras categorias relevantes, especificamente aquelas dimensdes do poder que podem ter algum impacto sobre o discutso e sobre suas estruturas: as varias instituigGes de poder, as estruturas internas de poder dessas instituigdes, as relagbes de poder entre os diferentes grupos sociais ¢ a abrangéncia ou o dominio do exercicio do poder por (membros de) essas instituig6es ou grupos. Abrindo mao de uma andlise mais detida sobre essas estruturas e dimensdes do poder social, argumentaremos acui, simplesmente, que elas também se manifestam varias estruturas de escritas e falas “poderosas’. Nessa lista, encontramos primeiramente as grandes instituigBes de poder, tais como os governos, os parlamentos, os érgios publicos, o judicidrio, os militares, as grandes empresas, os partidos politicos, os meios de comu v G0, os sindicatos, as igrejas e as instituig6es de ensino. Cada uma essay insti igoes pode associar-se com seus génetos de disc so expecitives, eventos comunicativos, tépicos, estilos ¢ retéric hicrarquia tradicional de posigio, poste ou. nplicam diferentes aros de fala, géneros ou estilos, por exemplo, os que sinalizam autoridade ou comando. Em segundo lugar, hi as instituigOes m cerceiro lugar, de forma paralela ou algumas vezes combinada com cosas instituig&es, encontramos relagbes de poder entre grupos, taisc «que hd entre ricos ¢ pobres, homens € mulheres, adultos ¢ criangas, brancos «negros, nacionais ¢ estrangeiros, os que possuem formagao superior e os a possuiem, os heterossexuais ¢ os homossexuais, os religiosos © os io teligiosos, os moderados e os radicais, os saudaveis ¢ os doentes, os famosos e 05 desconhecidos, ¢, em termos gerais, as relagbes de poder enie és Ele, Tanto nas interagde: institucionais quanto nas interagdes do dia a dia, essas relagGes de poder podem ser estruturalmente exercidas pelos membros dos respectivos grupos dominantes. Como no caso dos membros ticucionais, os membros de um grupo dominante podem fazer provir 0 poder exercido pessoalmente do poder geral do grupo a que pertencem, O efeito sobre o discurso, nesses casos, se mostraré particularmente dbvio no controle desigual do didlogo, de troca de turnos, dos atos dc fala, da escolha_ de t6pico e de estilo. Em quarto lugar, é poss(vel analisar 0 exercicio do poder quanto a seu dominio ou abrangéncia de agio ¢ tipo de influéncia. Algumas instituig6es ou seus integrantes lideres podem realizar atos discursivos que afetam, por inteiro, pases, estados, cidades ou grandes organizagées, ou podem determinar avida ea morte, a satide, a liberdade pessoal, o trabalho, a educagio ou a vida que na particular de outras pessoas, enquanto outras instituig6es ¢ seus membros exercem um impacto menos amplo ¢ menos sério sobre outras pessoas. “Finalmente, podemos distinguir encre os vitios tipos.de legitimidade ara essas formas de controle social: os que tém um controle total imposto ou mantido pela forca, como em uma ditadura e;-em alguns dominios, sambém num sistema democrético de governo; eos que exercem um controle ‘parcial, sancionado ou por uma elite, uma maioria, ou por um co7senso ‘mais ou menos geral, Essas diferencas (graduais) refletem as possibilidades de sangao dos poderosos, bem como.a accitagio ou a resisténcia dos.que se sujeitam a0 exercicio do poder. Essay difere festam as nos modos de legitimagae também se diferentes 0, assuntos, estilos de discurso, As discussoes, as argume ‘ses € os debates, por exemplo, nio so caracteristicos do discurso ditator Dafa importancia da quantidade e natureza da legitimacio discursiva nessas diferentes modalidades de sistemas de poder. Pode-se prever que cada istema politico, considerado como uma insticucionalizasio do poder, por exemplo, por meio do Estado, esté ligado a seus préprios e caracteristicos arranjos ou modos de discurso. Ja que os prineipias (normas, regras, valores, metas) de_ \egitimidade encontram-se mergulhados em uma ideologia, os processos de legitimacio também vao surgir como. processos discursivos. ABORDAGENS ALTERNATIVAS Tendo essas varias dimens6es do poder em mente, deverfamos ser capares de dar 0 prBtimo passo € estabelecer relagées sistemaéticas entre cssas dimensées e Soars dimen Ses estruturais do discurso. No entanto, isso poderd ser realizado de formas diferentes e com base em perspectivas diferentes, complementares. Por isso, 0 cientista social pode comesar com uma andlise das dimens6es do poder social mencionadas acima e, depois investigar por meio de quais discursos ou propriedades discursivas expressam- se, exercem-se ou legitimam-se essas estruturas de poder. Essa abordagem (macto) favorece uma anélise mais geral e incegrada de varios géneros € propriedades do discurs0 relacionados com uma classe, uma instituigéo ou um grupo (por exemplo, o discurso do sistema juridico ou o do poder patriarcal dos homens sobte as mulheres). De outro lado, o sociolinguisca comecari normalmente com uma andlise das propriedades especificas dos uusos da linguagem ou do discurso € tentar mostrar como esses usos podem variar ou depender de diferentes posicionamentos, relagdes ou dimensdes sociais; por exemplo, os de classe, género, grupo étnico ou situagao, Essa perspectiva, em geral, dedicard uma atencio maior as propriedades linguisticas do texto e da fala e adoraré uma visio mais geral a respeito das varias “circunstancias” sociais de tais propriedades, ~ Nés optamos por uma abordagem que combina as vantagens dessas dluas alternativas, especificamente a andlise dos (sub)géneros discursivos ¢ dos eventos comunicativos emi situagées sociais (Brown e Fraser, 1979). lal “anillise de situagées” requer uma integracao da andlise discursiva com _ 7 1 anitlise social. Por meio de um estudo interdisciplinar das conversagoes cotidianas, dos didlogos em sala de aula, das entrevistas para emprego, dos encontros entre prestadores de servigo e seus clientes, das consultas médicas, «lay audigncias nos tribunais, das reunides de diretores de empresas, dos dlebates parlamentares, dos relatos de noticia, da publicidade ou da elaboragio > dle leis, entre muitos outros eventos comunicativos, estamos aptos a avaliar nto as estruturas relevantes do discurso quanto as estruturas relevantes da dominincia edo controle no contexto social. Ou seja, compreender esses x6neros comunicativos exige uma andlise da representacdo participativa, das cstratégias de interagdo, da troca de curno, da selegéo de t6picos e cédigos, clos registros estilisticos, das operagGes retdricas e também uma anidlise dos ' papéis, das relagdes, das regras, das normas ¢ de outras restrigdes sociais que governam a interagZo dos participantes na qualidade de membros de um sgrupo social. Dessa forma, apreendemos tanto as propriedades quant processos de escrita ¢ fala, ¢ os micromecanismos da interacao social e da cstruitura societal: Além disso, esse nivel e escopo de andlise permitem uma_ waliagio sociocognitiva do conhecimento, opinides, atitudes, ideologias ‘ouuras representagbes sociais que garantem o controle cognitivo dos agentes ‘que atuam em tais situagées. Finalmente, essas microestruturas sociais (por exemplo, uma aula) podem, por sua vez, estar relacionadas (por exemplo, por comparacio ou generalizagio) a macroestruturas sociais relevantes, tais como as instituigdes (por exemplo, a escola, o sistema educacional e stias ideologias) ou as relagées sociais gerais (por exemplo, o dominio dos brancos sobre os negros) (Knorr-Cetina e Cicourel, 1981) PODER NO DISCURSO: UMA REVISAO Nas seges anteriores, apresentei uma sucinta andlise teérica do conceito de poder e suas ligagoes com o discurso ea comunicacao. Testemunhamos como os poderosos tém acesso a Virias estratégias capazes de permitir-lhes controlar a producéo material e simbélica da escrita e da fala e, assim, parte dos processos cognitivos que subjazem & administragao cognitiva fabricagio de consenso entre os menos poderosos. Em varias oportunidad essa discussio mencionou algumas propriedades do discurso que sio afetadas especificamente por esse processo de controle (re)produtivo, como, 57

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