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DOK hep do org0.159070100-85872015035ndeapO2 R= E PotiticA NO Brasit CONTEMPORANEO: UMA = ANALISE DOS PENTECOSTAIS E CARISMATICOS CATOLICOS Maria das Dores Campos Machado Universidade Federal do Rio de Janeiro ~ Rio de Janeito Rio de Janeiro ~ Brasil Introdugio Até 0 final dos anos 70, os estudos sobre o pentecostalismo e a Renovagio Ca- rismética Catélica (RCC) destacavam o emocionalismo, o apartamento da politica € das mobilizagSes sociais como caracteristicas comuns desses dois movimentos que, naquele contexto, pareciam envolver segmentos distintos da sociedade brasileira, os pobres e as camadas médias, respectivamente’. A politizagio dos pentecostais, entre- tanto, torou-se visfvel logo na década de 80, quando conseguiram fazer com que © rniimero de parlamentares oriundos desse segmento saltasse de dois para dezoito, nas eleigies de 1986, superando pela primeira vez o ntimero dos legisladores protestantes hist6ricos no Congresso Nacional ‘A participago dos pentecostais na Assembleia Constituinte chamou atengio dos estudiosos e resultou em duas vertentes analiticas para a explicagdo das rela- gies entre a religiao ea politica. A primeira vertente, estabelecendo analogias entre a agenda moralista dos parlamentares pentecostais com 0 movimento da Maioria Moral em evidéncia nos Estados Unidos, caracterizava esse segmento como a nova direita brasileira crista (Pierucci 1989). J4 a segunda perspectiva procurava as causas da politizagio na correlagio de forgas tanto no campo politico quanto na esfera relic 46 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 siosa, questionando a ideia de que a doutrina pentecostal s6 pudesse fomentar agdes politicas no campo conservador (Fernandes 1977; Freston 1992) engajamento de carismaticos nas agremiagSes politicas e o interesse pelos processos eleitorais s6 comecariam a ser mais perceptiveis na década de 90, mas ob- serva-se que, diferentemente dos pentecostais, os atores politicos do segmento catélic cco tendem a ser leigos ¢ numericamente menos expressivos que aqueles no Congresso Nacional (Henriques 1995, 1999; Machado 2006). Nos iiltimos anos, entretanto, observa-se uma tendéncia de crescimento de legisladores nas Camaras Municipais ¢ nas Assembleias Legislativas de diferentes estados do Brasil que se apresentam como catisméticon ‘As cincias sociais associam a ampliagao da presenga de pentecostaise carismé- ticos na politica com o processo de redemocratizagio que favoreceu a emergéncia de novos atores coletivos na cena piblica brasileira, Demonstram também que a agenda politica desses grupos cristios privilegia as questies morais e que isto seria uma forma de reacio a0 avango do feminismo e do movimento pela diversidade sexual na socie- dade (Burity 2006; Machado 2010; Mariano 2011; etc.). Nesse sentido, a despeito das divergéncias teéricas, observa-se uma forte tendéncia dos estudiosos interpretarem a participagao desses religiosos no cenério politico nfo como elemento extemporineo ‘que teima em resgatar formas pré-modernas de organizagao social, mas sim como um elemento constitutivo da propria esfera pablica brasileira (Pompa 2012). Varias anilises (Giumbelli 2004, 2011; Montero 2009, 2012; Oro 2011) tém revelado que a insergio do prinefpio da laicidade do Estado, na Constituigio de 1891, nao resultou em um afastamento radical das principais instituigSes politicas € religiosas do pats. Afinal, durante todo o século XX, a lgreja Catélica recebeu um tratamento privilegiado por parte do Estado e preservou sua condicao de importante ator politico no pais. Montero (2012) argumenta, por exemplo, que essa instituigio ajudou a configurar a esfera pablica brasileira que hoje se mostra mais ampliada com a presenga de miltiplos outros segmentos sociais ~ eliginsos e nao religiosos. Nesta perspectiva, a esfera piblica nao deve ser concebida como “uma entidade empftica cobservvel”, mas sim como “um espago que se constitui discursivamente em contea- posigdo com outras esferas” da sociedade (Montero 2012:172). Dito de outra ma- neira, diferentes atores com discursos muitas vezes contrastantes colocam-se nesse espago constituindo o que se convencionou chamar de debate piiblico. Esse debate & marcado por controvétsias e, na visio da antropéloga, a anélise dessas controvérsias poderia nos ajudar a entender o reposicionamento dos segmentos religiosos ao longo dda hist6ria social brasileira Esta linha de interpretagao, com a qual venho dialogando (Machado 2014) ¢ que apresenta pontos de contato com aquela adotada por Duarte et al. (2009) e por Vital da Cunha e Lopes (2013), tem se revelado proficua para entender os embates entre os grupos religiosos e os movimentos sociais de uma forma geral. Esclareco, ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 4 entretanto, que seguirei um caminho mais sociolégico, baseando-me nas teses das miiltiplas modemidades ¢ formas de seculatizagio que vem orientando anélises da atuagio politica de segmentos religiosos em varios pafses do mundo (Eisenstadt 2001, 2008; Casanova 2008; Berger, Davie ¢ Fokas 2008; Freston 2011) JA tratei dessa vertente teérica em artigos anteriores (Machado 2012, 2013) e cenfatizarei aqui apenas o fato de que a tese das diferenciadas formas de modernidade e de secularizagio me permite examinar os pentecostais e carismiticos catdlicos como atores sociais de um tipo de modernidade que se desenvolveu em uma sociedade mar- cada pela desigualdade de renda, pela instabilidade politica e pelo papel proeminente da Igreja Catdlica. Uma modalidade de modernidade que foi sofrendo mutagbes 20 longo do tempo e que certamente adquiriu novas caracteristicas com a Constituig3o de 1988, a chegada de partidas de centro e de esquerda no poder — PSDB e PT -, © 0 fortalecimento do idesrio dos direitos humanos e dos movimentos de minorias sexwais, Essa perspectiva permite também pensar os grupos religiosos com percepgbes proprias da modernidade, da laicidade do Estado (Mariano 2011; Vital da Cunha e Lopes 2013; Machado ¢ Burity 2014) e dos direitos humanos (Machado 2014), per- cepgées estas que se vio desenvolvendo a partir das relagdes desses grupos com os movimentos sociais e demais setores da sociedade e que podem expressar controvér- sias jf existentes, mas também gerar novas controvérsias piblicas. Nesse sentido, apresento nas préximas péginas uma anslise do processo de revisio das posigdes dos pentecostais e carismaticos em relago ao engajamento poli- tico € A participagio nos debates pablicos atuais a partir de uma pesquisa qualitativa com importantes lideres desses segmentos religiosos. Trata-se de uma investigacao’ ‘com 0 objetivo de conhecer as posigoes de liderangas religiosas em relagio a uma série de tematicas culturais (aborto, homossexualidade, etc.), politicas (partidos, elei- ‘gbes, etc.) © econdmicas (pobreza, assisténcia social, ete.). A principal técnica de investigagio do estudo em questo foi a realizacao das entrevistas semiestruturadas ccom liderangas; entretanto, procuramos complementar os dados com a leitura de documentos e monitoramento de sites das casas legislativas, dos jomnais de circulagdo nacional e dos grupos religiosos na interet. Foram realizadas entrevistas com 106 liderangas* de grupos carismiticos e pen- tecostais em sete estados brasileitos’. Cinquenta e oito lideres eram pentecostais®e, na ocasio da pesquisa (2011-2012), atuavam nas cidades de Salvador, Sao Paulo, Belo Horizonte, Brasilia, Campinas ¢ Rio de Janeiro’. Quase todos tinham cargo ecle- sidstico — pastores/as, missiondrios/as, etc. ~ e vinte entrevistados do sexo masculino acumulavam ou haviam se licenciado de seu cargo na igreja para assumir uma cadeita no poder legislativo’, Os demais eram pastores que dirigiam instituigSes assistenciais € assessores politicos com atuagdo no Congtesso Nacional. Mais da metade desses entrevistados tinham diploma universitario ou curso de teologia realizado depois do segundo grau e, embora a idade média fosse de 52 anos, apenas quatro entrevistados se encontravam em faixas etirias abaixo dos 40 anos. 48 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 Quarenta e oito lideres eram carisméticos de cidades dos estados de Sao Pau- lo, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. Como na configuragio dos entrevistados pentecostais, a maioria dos carismaticos era do sexo masculino, Entre os 36 homens ‘ouvidos, encontravam-se sacerdotes, bispos, politicos ¢ missionstios. J4 as doze mu- Iheres se apresentaram como missionérias e/ou politicas. Nesse segmento religioso, seis homens ¢ uma mulher eram parlamentares?, mas varios outros eram assessores de politicos com cargos no legislativo. Inceressa-nos em especial analisar as percepgdes das liderangas carismaticas € pentecostais sobre a relago da religiio com a politica e as estratégias adotadas pelos dois movimentos para influenciar as legislagbes brasileiras no campo da familia, da sexualidade e da reprodugdo humana. Isso porque os dados revelaram nao s6 0 empe- rho de dirigentes religiosos na formagio de quadros para atuar na politica partidéria com o intuito de conquistar posigdes nos poderes legislativo e executivo, mas tam- bém uma tendéncia de articulagao dos atores politicos oriundos dos dois segmentos religiosos em defesa dos valores cristios. Estruture este artigo da seguince forma: na pr6xima seco, analiso as opinides dos pentecostais e carismaticos acerca do importante papel da politica na preserva- ‘cdo da moral cristi na sociedade brasileira contemporanea. Em seguida, apresento as iniciativas de formagio de quadros no espectro catélico, em especial o Ministério Fé e Politica que vem sendo usado pela RCC para formar atores politicos alinhados as posigées da Santa Sé. As iniciativas dos pentecostais para formar atores politicos que possam defender a agenda politica das estruturas eclesidsticas sfo trabalhadas na terceira secio. J as atuagdes de assessores ¢ parlamentares carismaticos, bem ‘como a aproximagao desses atores politicos com os legisladores pentecostais, serdo exploradas na quarta secio. Finalmente, apresento o argumento de que, a despeito das diferengas doutrinarias ¢ da competigao por figis, os carismaticos eatélicos vém se aliando com grupos pentecostais na esfera politica para preservar o cariter cristo da moralidade publica brasileira. 1A politica a servigo da moral erista Um primeira ponto de convergéncia nos discursos das lidetangas pentecostais e carisméticas catélicas € a avaliago negativa da cultura politica brasileira. Apesar das criticas aos vicios dessa cultura, a andlise das entrevistas revela que dos dois lados do cristianismo renovado a postura de rejeicdo e apartamento da politica partidéria vem sendo substitufda por uma posicdo de ativismo politico com o propésito de res- taurar ou criar uma nova cultura politica no pais. Entre os carismaticos, observa-se a énfase na “cultura de pentecostes”, que oferece os valores que podem tomar os integrantes desse movimento no “farol ético” da sociedade brasileira. Na avaliagao dos entrevistadox, a histéria polftica do pats é marcada pela cor- rupgio, pela falta de transparéncia e pelo pequeno compromisso com a gestio do bem ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 9 publico. Diante desse contexto, o discurso hegem@nico entre os catblicos € de que © ccarismético tem o “dever moral” de participar da politica e de mudé-la. Segundo José Geraldo Bernardes (PL), vereador na legislatura de 2005-2008 na cidade paulista de Piquete, “quando os bons se afastam, os maus se manifestam” (entrevista José Geraldo Bernardes, 20/07/2011) e, sendo assim, é preciso, a um s6 tempo, combater a aversio do cidade comum em relagdo as instituigdes polfticas e introduzir novos valores na politica nacional. Nessa configuragao discursiva, a hierarquia catlica poderia estimular a cons- cigncia politica e incentivar a participagao do laicato nos debates publicos, bem coma nas disputas eleitorais. Padre Alberto Gambarini, assessor da RCC, declarou-nos que: A gente niio pode esquecer que no passado existia a Liga Eleitoral Ca- t6lica, que tinha uma lista de politicos, de todos os partidos, escolhidos pela Igreja entre as pessoas de bem. Nao acho que tenha que volear a fazer isto, mas a Igreja tem que levar os leigos a assumirem a politica, nfo somente para defender os interesses da instituigao, como algumas correntes religiosas fazem, mas para defender os principios cristaos, bus- cat o bem de todos: catdlicos, evangélicos e membros de outras religiGes (entrevista Alberto Gambarini, 17/09/2011) Embora os entrevistados nao mencionem, ocorreram outras iniciativas no ‘campo politico depois da experigneia das Ligas Eleitorais. Entre as mais importantes, encontram-se as atividades do Movimento de Acao Catélica (anos 60 e 70) e das CEs (anos 80); a mobilizagio realizada pela Conferéncia Nacional dos Bispos do Brasil durante a Assembleia Nacional Constituinte; a criagio do Movimento pela Etica na Politica (em 1992) e do Movimento de Agao da Cidadania contra Fome Pela Vida (1993-1995); e a escolha do tema Fraternidade e Politica para a campanha anual desenvolvida pela CNBB no pats (Alves 2010). Ou seja, outros segmentos da Igreja jé atuavam com o propésito de transformar a cultura politica, e essas iniciativas tiveram repercussées na Renovagio, ainda que o entendimento da politica e os ob- jetivos dos carisméticos possam ser distintos daqueles encontrados entre os catélicos alinhados com os movimentos soeiais e os partidos de esquerda no Brasil As divergéncias ideol6gicas com os setores ligados & Teologia da Libertago pa- recem fazer com que os carismaticos entrevistados preferissem apresentar o erescente interesse pela politica eleitoral mais como uma resposta as diretrizes tragadas pela Santa Sé para os eatélicos do mundo todo, do que o relacionar com as iniciativas de outros setores catélicos brasileiros e mesmo da CNBB". Trata-se, portanto, de uma tentativa de simultaneamente justficar 0 ativismo religioso em momentos eleitorais € demonstrar que a RCC vem se transformando no Brasil, com isso conseguindo deixar de ser vita como um movimento individualista e emocional. Nesse sentido, a lideran- cal! vem estimulando 0s carismaticos a se engajarem em ages coletivas e, em especial, 50 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 [..1 na organizagio de novas forgas politicas e na formago de pensa- dores que a partir do batismo no Expfrito Santo, apontem rumos para o Brasil [...] Refletir sobre a possibilidade de unir e coordenar as diversas forcas para atingirmos este objetivo. Discutir como aproveitar inclusive a diversidade de ideologias para construirmos uma altemnativa de podes, que priorize o bem comum, a pessoa humana toda. Nesta dimensao, queremos tracarcritérios de construcio da participacao politica e as for- mas de transformé-la em instrumento de construg20 de um Brasil com 6 rosto da civilizacio do amor, que dé exemplo para o mundo da acio dos cristios e da RCC como forga de influéneia e transformagao social Na interpretagio de Silva (2008), os carisméticos adotam uma “concepgao ‘medievalista” da politica que desconsidera 0 processo historico de pluralizagio insti- tucional e, mais especialmente, a separacio entre Estado ¢ Igreja. Em tal concep¢ao, a politica confunde-se com a moral religiosa, e a acdo politica transforma-se em uma “espécie de missio evangelizadora” com o propdsito de “santificar 0 mundo”. Jé os atores politicos ligados ao grupo carismatico sao vistos como os “escolhidos do Se~ nnhor” e se “imaginam executores do plano divino na ordem politica e meros instru- ‘mentos da Sua vontade...” (Silva 2008:sp) Confirmando a importincia do ideatio religioso medieval entre os carisméti- cos, Felipe de Aquino, apresentador de programa na TV e na Radio da Cangao Nova, mencionou-nos que a proposta dos dirigentes é [formar um grupo como aqueles cavaleitos religiosos, os Templiios que faziam voto de pobreza, humildade e castidade. Eles se colocavam a servigo da igreja, como soldado e anjo ao mesma tempo, para defender os peregrinos que iam para a terra santa e eram massacrados pelos mul- sumanos. [...] Mudando o que deve ser mudado, a gente quer formar uma tropa de elite crista para atuar na politica, Para chegar a qualquer parlamento, em qualquer tribuna e dizer de peito aberto: “Nés somos contra isso aqui porque é contra a lei de Deus. E contra o evangelho do Nosso Senhor”, ¢ nds temos que trabalhar e/ou votar contra isso (entre vista Felipe de Aquino, 20/07/2011). Diferentemente dos cavaleiros medievais, que protegiam os santudtios da cris- tandade e 0s catélicos que para ali se dirigiam, a nova “tropa de elite crista” ocupa- ria as instincias de poder politico, especialmente o parlamento, onde proposicées legislativas so apresentadas ¢ examinadas. E vérios depoimentos dos carisméticos demonstram esta consciéncia da importincia crescente do aparato legal na normati- zagio das condutas. Ou seja, embora o expfrito de guerreito deva ser mantido, o kécus da disputa e as armas utilizadas pelos combatentes cristios so de outra natureza. ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 5 ‘Agora os cavalheiros devem ocupar os gabinetes, elaborar leis de acordo com a cultu- ra de pentecostes e impedir a aprovagao das propostas legislativas que comprometam a hegemonia do cristianismo entre nés. Retomaremos esta ideia do politico como um cavalheiro militar quando falar- ‘mos do recrutamento e da formacio politica dos carismaticos. Antes, porém, cabe apresentar a percepcao de politica predominante entre os pentecostais. Destaco 0 carter preponderante da visio aqui analisada porque, como jf exposto em outros artigos (Machado 2013; Machado e Burity 2014), existem compreensdes distintas so- bre a relagio entre a religiao e a politica, assim como sobre o tipo de participagio dos atores religiosos — individuais e coletivos — na sociedade civil e na politica partidétia Na perspectiva hegeménica entre os pentecostas, distintamente do que iden- tificamos entre os catélicos, a participago na politica eleitoral, mais do que um dever ‘moral dos eristios, & associada a um direito de uma minoria religiosa que sempre foi preterida pelo Estado e pela elite politica, os chamados “erentes” ou evangélicos, ‘Agu, trata-se de uma busca de equiparacio com os demais segmentos sociais que se fazem representar na esfera politica ¢ atwam na definigdo das leis brasileiras (Macha- do e Burity 2014). Segundo o bispo José Wellington Bezerra, que nasceu em 1934 ¢ & presidente da Convengao Geral das Assembleias de Deus no Brasil desde 1988, “lagelo” da corrupgao é antigo na hist6ria politica brasileira e a responsabilidade no pode ser atribufda ao segmento confessional que, “atemorizado pela possibilidade da contaminacao”, se manceve afastado dessa esfera na maior parte do século passado. Avinal, a sua geraglo aprendeu que a “igreja era de Deus e a politica era do ea0 ou do diabo. E que uma coisa néo devia se misturar com a outra!” (entrevista José Wellin- gton Bezerra, 21/09/2011). Por outro lado, a hierarquia de status definida culturalmente na sociedade brasileira associou durante muito tempo ~ e ainda hoje associa —o catolicismo com os segmentos brancos das camadas mais abastadas e média da populacao e, assim sendo, também com os grupos mais escolarizados, enquanto os pentecostais sio percebidos como mais pobres, menos escolarizados e com grande presenca de negros e mestigos. No discurso hegem@nico entre os pentecostais, os membros desse segmento no po- dem ser tratados de forma subordinada, uma vez que representam a segunda tradicio religiosa mais numerosa no pats e que dispoem de valores importantes para a revisio da cultura politica nacional. O sentimento de revolta com os padres de valoracio culturalmente estabelecidos aparece em virios depoimentos das liderangas pentecos- tais. O pastor da Assembleia de Deus citado acima afirmou que, nas éltimas décadas, reviu a sua posigio de rejeigao a politica eleitoral, acrescentando: “Eu reuni a minha dizetoria e disse: ‘olha pessoal, hoje nés somos alguns milhes de brasileiros, e n6s somos brasileiros tanto quanto qualquer outro, como somos para pagat impostos, também temos os nossos direitos. Entio, por que nao fazer parte do governo?”. Foi quando nés comegamos a eleger alguns deputados, né?” (entrevista José Wellington Bezerra, 21/09/2011) 52 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 crescimento numérico e a percepgao da grande capacidade de mobilizagao das comunidades pentecostais aparecem reiteradamente nas falas dos Itderes para justificar a desconstrucao da visio negativa da politica e o engajamento dos integran- tes dessas comunidades nas agremiagdes partidadrias, nos processos eleitorais € nos debates politicos. © deputado federal Ronaldo Fonseca (PR/DF), pastor da Assem- bleia de Deus, assegurou-nos saber que o sistema politico & perverso ¢ corrompido, ‘mas que “o cristo tem que estar onde tem trevas. Entao se [a politica] ¢ corrompida, tem trevas ou escuridao, nds temos que brilhar ali” (entrevista Ronaldo Fonseca, 18/04/2012). Assim, ele vem se esforcando para convencer os membros de sua igreja de que “nds somos cidadios, nés pagamos impostos, somos regidos por uma Consti- tuigZo, nds temos deveres com a nagio e temos direitos. Entio nio é justo que nés fiquemos de fora, fiquemos no mundo sem participar das demandas que afetam a todos nés” (entrevista Ronaldo Fonseca, 18/04/2012) A reconfiguragio do discurso em relagio a politica segue em ritmo e sentido diferenciados, com alguns entrevistados revelando uma visio minimalista da politica que enfatiza a representagio dos interesses dos evangélicos nos expagos de poder, € ‘outros demonstrando uma valorizagao das ages coletivas a partir da sociedade civ Mesmo entre os que trabalham com a concepgao tradicional da politica foram iden- tificadas construgées discursivas diferenciadas, com alguns Iideres apresentando a politica como um meio de resisténcia e/ou “sobrevivéncia para os cristios” que esto sofrendo com o avango do relativismo e do secularismo. Jé outros discursos apresen- tam a politica como via para a implementagio de uma hegemonia evangélica & me- dida que o segmento confessional em questio for crescendo. De qualquer maneira, verifica-se uma expectativa de que a maior participagdo dos evangélicos na politica possa transformar a sociedade. Valnice Milhomens, fundadora da Igreja Nacional do Senhor Jesus Cristo, afitmou-nos: Em 1989 eu tive uma visio, ¢ 0 Espirito Santo me disse que a redengio do Brasil viria pela Igreja. Nao que eu creia em um Estado teocritico, mas creio em cristZos que vivem os valores do reino, verdadeiramente onde eles esto. Creio que o povo de Deus vivendo o evangelho, a igreja crescendo e nds chegando as faculdades, & politica e a todos os segmen- tos da sociedade... Porque nao basta ser evangélico, o individuo tem que ter cultura, tem que set treinado, tem que ter capacidade intelectual de sair com um projeto de transformagio da nagio que realmente mude a situagio politica, econdmica e social do povo (entrevista Valnice Milho- mens, 19/04/2012). Mas é preciso deixar claro que se trata de uma ideia ainda muito vaga de projeto politico e, neste debate, assim como nas questdes relacionadas & doutrina @ as formas de governo das comunidades confessionais, nao é facil construir uma ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 53 proposta discursiva consensual, O que identificamos foram narrativas sobre a nagio cristd que ora envalvem os catélicos, ora os apresentam como os responséveis pelos vicios culturais dos brasileiros. Parece predominar, entretanto, a visio de que & ne- cessério atuar na qualificagdo dos pentecostais, formar cidadaos mais ativos e uma lideranga politica que possa ocupar os espagos do poder, propor leis e politicas pabli- cas condizentes com o idedrio cristdo. E, nesse ponto, a convergéncia com o discurso hhegeménico entre os carismaticos é muito grande. Nos depoimentos da lideranca dos dois movimentos, 0 ativismo religioso € a insergao na politica fazem-se necessérios pela situago de ameaca em que se encontram a instituigao da familia ea propria vida humana na sociedade brasileira ‘A despeito das diferengas no meio pentecostal, predomina a visio de que as demandas dos movimentos das minorias sexuais expressam essa ameaga para a “for- ‘magio da familia crista”, e as propostas de lei no Congresso Nacional com intuito de regularizar o trabalho das profissionais do sexo, descriminalizar 0 aborto ou ampliat ‘© permissivo legal, promover a equiparacio juridica das unides entre pessoas do mes- mo sexo, a adogio de criangas por casais homossexuais, etc. sao interpretadas como simais de que a batalha a ser travada pelos cristos requer a presenga deles nas casas legislativas. Deve-se destacar também que prevalece na configuragao dos politicos pentecostais a visio de que a atuacio parlamentar deve seguir 0 modelo adotado pelos demais grupos de interesse nas casas congtessuais, corroborando os achados de ppesquisas anteriores (Machado 2006; Vital da Cunha e Lopes 2013). Entre os carisméticos, observa-se igualmente a preocupacao com as propo- sigGes legislativas que mexem com os arranjos familiares tradicionais, com a sexu- alidade © com a educagio das criangas ¢ jovens na escola. Percebe-se também o reconhecimento crescente de que nao s6 é preciso eleger catdlicos carismiticos para as casas legislativas como acompanbiar se a atuagio desses politicos se dé nos marcos dos valores cristios. Segundo Raquel Silva, lider carismatica no interior do estado de ‘Sio Paulo, a plataforma politica desses legisladores “deveria ser titada do evangelho” e incluir temas como a defesa da vida, o combate eutandsia e & unio de pessoas do mesmo sexo. Hoje a gente vé gue o mundo caminha a passos largos para uma des- virtualizagdo da familia, Entio, é importante ter alguém de Deus no Congresso, onde vota leis. Nao que seja s6 0s catisméticos, mas todos esses que sio de Deus, para evitar essa desvirtualizagao e trabalhar pela familia. Trabalhar por aquilo que € importante. Porque hoje a gente vé uma mentalidade que a familia nao é tao importante. Hoje junta fulano com beltrano € o importante & que eles sejam felizes, mas sera? E no faturo! Qual o prego que nés vamos pagar por essa mudanca, por essa transformagao radical que est acontecendo? Entao, ¢ importante ter pessoas evangelizadas, pessoas que valorizem a vida, trabalhando I, 54 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 porque sao eles fos parlamentares] que fazem as leis que chegam até nés (entrevista Raquel Silva, 18/09/2011). E como fazer para garantir a presenga dos cristios nos poderes politicos e, em especial, no legislativo brasileiro? Quem so ou deveriam ser estes atores politicos cris- tos? Quais 0s critérios para definiclos? Como garantir o alinkamento desses atores com a “plataforma politica retirada do Evangelho”? Como os diferentes segmentos res- pondem ao desafio de se fazer representar na politica eleitoral e nas casas legislativas? IL— Recrutamento e preparacio da “Tropa de lite eris Existe uma vasta literatura sobre a importincia dos segmentos ligados 3 Te- ologia da Libertagao na mobilizagio popular e na formagio de quadros politicos no Brasil (Mainwaring 1989; Novaes 1997; Romano 1979; etc.), mas temos ainda pou- cos estudos sobre a atuaco dos carismaticos no campo da formacao politica, os quais se concentram em um nico estado ou apresentam um carater regional (Henriques 1999; Carranza 2000, 2011; Machado 2006). Desse modo, complementarei a litera- tura existente com algumas informagses retiradas dos documentos produzidos pelos lideres desse movimento, bem como das entrevistas realizadas e da literatura existen- te sobre o tema, Segundo Carranza (2000), as discussdes sobre a importincia de estimular a participagao dos carismaticos nas disputas eleitorais comecaram no final dos anos 70 e foram provocadas, no caso do estado de Sio Paulo, pelo Padre Eduardo Dougherty, um dos responsaveis pela introdugio da RCC no Brasil. Assim, foi langada a candi- datura de Salvador Zimbaldi para a Camara Municipal de Campinas, em 1982, mas ele ndo conseguiu ser eleito naquele pleito, Sidnei ©. Telles, coordenador do Ministério Fé e Pol © 2006, sugere também que aquela nio se tratava de uma iniciativa localizada e de um ou outro ator religioso em particular. Segundo o seu relato”, jé em 1985, no Encontro do Cone Sul da América Latina onde se discutiu a Teologia da Libertagio e foi realizada uma “reflexdo politica a partir da histéria da salvacio”, um dos inte~ grantes da Comissao Internacional da RCC, Oyménio Pereira, apresentou seu projeto de insergao na politica eleitoral brasileira’, Depois de se afastar da comissio interna- cional e formalizar sua candidatura de deputado federal pelo estado de Minas Gerais, esse carismitico passou a enviar “todo o material de divulgacdo para os membros cadastrados da RCC de todos os estados, em uma clara manifestagio de formag3o da consciéncia de participag3o na politica na RCC", E, embora essa lideranga no tenha conseguido se eleger para a Assembleia Constituinte, ica nos anos de 2005 [...] a sua candidatura passou a servir de pardmetro para a entrada, de uma forma mais ativa, dos membros da RCC dentro da discussio pol ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 55 a, inclusive com varias de suas liderangas participando de campanhas eleitorais e discutindo-as dentro dos diversos conselhos diocesanos, mu- nicipais, estaduais da Renovagio. Comegava uma agao mais organizada, com o objetivo de que um némero maior de pessoas com a experiéncia do batismo no Espirito Santo estivesse inserido no mundo da politica ‘Temos que ressaltar que jé havia politicos ¢ participantes da vida pabli- ca que tinham contato com o movimento, mas foi a primeira vez que a RCC mobilizou-se de uma forma mais estruturada’® Em 1990, com o apoio dos grupos de orago e da estrutura da Igreja Catélica de Minas Gerais, Osmanio Pereira conseguiu uma cadeira na Camara Federal e va- rios outros carismsticos foram eleitos para a esfera estadual do poder legislativo de diversas unidades da federagao brasileira. Neste processo de politizaciio do movimen- to, foi criada em 1995, durante o Congresso Nacional da RCC, a Secretaria Moses para tratar especificamente da relacao da fé com a politica, que em poucos meses formulou as diretrizes para a capacitagao “de formadores de outros lideres em todos os Estados brasileiros, mediante a realizacio de Seminario de Vida no Espirito 4 luz da Doutrina Social Crista, bem como na edificagao de um marco jurtdico que Ihes permita ocupar os espacos da vida piblica nacional para evangelizar essas estruturas cefvicas” (Carranza 2000:158) Essa secretaria, posteriormente, daria lugar ao Ministério Fé e Politica, que se ‘ocuparia da formacio politica dos carismaticos que evangelizariam ‘ais “estruturas cfvicas”. Aqui, uma vez mais, temos que lembrar que ja existiam Escolas de Forma- ‘Gio Politica de grupos eatélicos no carisméticos e que a primeira delas foi eriada em 1986, em uma drea de conflito rural em Rondénia. O objetivo central dos cursos ministrados por liderangas eatdlicas, naquela rea, era estimular a participagao de leigos nos movimentos populares e a militsncia politico-partiddria (Alves 2010:74). E preciso registrar também que a CNBB incluiu nas Diretrizes Gerais da Ago Evan- gelizadora da Igreja no Brasil para o perfodo de 1991 a 1995 a proposta de criagio de Escolas de Formagio Fé e Politica” e adotou a temética da Fraternidade e Politica para a campanha realizada em todo pafs no ano de 1996. Ou seja, antes mesmo da campanka implementada pela CNBB com o tema, as iniciativas de grupos mais li- gados & Teologia da Libertagao no campo de formagio de quadros catélicos para a atuagio no espago piblico ja vinham despertando interesse & mobilizando setores da hierarquia catélica. A campanha de 1996 veio estimular novas iniciativas, e uma elas seria 0 Ministério Fé e Politica da RCC (Alves 2010). Os dados acima sao importantes, porque reforcam o argumento de que as ini- ciativas com vistas a insergao de leigos catslicos na vida ptblica vio muito além da Renovagiio Carismética e expressam formas diferenciadas da CNBB e dos miltiplos movimentos catélicos responderem a politica tragada pelo Vaticano". E mais, embo- ra com uma agenda politica circunscrita aos temas motais, nao se pode deixar de re- 56 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 conhecer que a reconfiguragao do movimento carismatico politizou setores catélicos ‘que até endo pareciam indiferentes em relagio ao debate da coisa pabli De acordo com Ivan Lacerda, ex-coordenador do Ministério Fé e Politica do Rio de Janeiro ¢ atualmente assessor politico de um deputado federal ligado a0 mo- vimento carismatico: O iinico jeito de transformar a sociedade é através da politica, ea igreja {i estd vendo isto. Nao 86 a Igreja Catélica, mas também as outras deno- minagées... Tanto € que hoje nés temos pastores que so politicos por- que querem a transformagao do pafs.[..] Nés somos contra o aborto e, em Brasilia, a nossa luta foi muito grande. Q Movimento de Renovagio Carismitica arrecadou quase um milhdo de assinaturas contra o aborto e nds encaminhamos para o Congresso, ¢ Id estavam outros deputados que eram umbandistas, espiritas, evangélicos e toda ajuda nesta luta pelo bem comum é bem-vinda... (entrevista Ivan Lacerda, 02/05/2011). Para orientar a participacdo de seus membros nos pleitos eleitorais e monitorar a atuagdo destes nos cargos pablicos, dirigentes da RCC comegaram a produzir, no final da década de 1990, material bibliografico proprio como a cartilha Fé e Politica: soma proposta de Reflexao, Essa cartilha foi langada em 1998, no estado de Sao Paulo, ¢ propunha a criagao de “comunidades e grupos suprapartidarios que se dediquem a um trabalho de acompanhamento ¢ fiscalizago dos candidatos eleitos”, Posteriormente, a Coordenagio Nacional do referido Ministério divulgou a publicagao Fé e Politica, com diretrizes a serem seguidas pelo movimento carismético nas diferentes dioceses do pats Escrito por varios dirigentes, entre eles o entrevistado citado acima, o livro Fé ¢ Politica, além de reconhecer a necessidade de assessorar os politicos carisméticos no periodo pré-cleitoral, defende 0 acompanhamento do mandato daqueles atores que, recrutados nos grupos de oragio, conseguirem se eleger (Nascimento, Lacerda et ali 2007:135-136). Assim, orienta os carismaticos para que nao estabelecam competigoes centre si e obriga “o candidato manter a ética e 0 zelo pelas coisas de Deus. Isto no acontecendo, © movimento poder retirar o apoio, comunicando A Igreja o motivo desta decisio, por escrito, com a assinatura do Coordenador Estadual e Diocesano a0 qual o candidato faz parte” (Nascimento, Lacerda et alii. 2007:115-118). Observa-se ainda uma preocupagdo com a fidelidade partidéria, com a indicagao de que os polt- ticos carisméticos devem evitar as mudangas de agremiagées partidatias. De qualquer forma, o fundamental é a fidelidade aos prinefpios eristaos e & propria lereja Catélica, Deve-se registrar que, na década de 90, alguns setores da RCC apostaram na fandagdo de uma nova agtemiagao politica, o Partido Solidarista Nacional (PSN, cujo estatuto foi aprovado pelo TSE em 1996), que mudou de nome em 2000, pas- sando a se chamar Partido Humanista da Solidatiedade. A iniciativa de criagio de tuma agremiacao inspirada na doutrina social cristd e propondo a defesa dos direitos ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 5 fandamentais da pessoa humana nao parece, entretanto, ter obtido 0 sucesso espera- do, ¢ hoje se podem encontrar politicos ligados aos grupos de oragao da RCC filiados ‘ou mesmo representando partidos dos mais diferentes matizes, PT, PV, PSDB e et. ‘A gente pode até opinar, mas a escolha do partido é do candidato. O que nés orientamos é que a Igreja no tem um partido e que os par- tidos tém diretrizes que podem ser contrérias ao ensinamento cristo, de modo que o candidato tem que saber discemir bem e, se entrar no partido, mostrar aquilo que é bom ou ruim e deve ser mudado. [..] Nés precisamos ensinar as pessoas como fazer uma campanha sem criar wm passivo econdmico, compromissos que precisarao ser honrados depois das eleigdes. Temos que ensinar a fazer uma campanha sem gerat de- pendéncia de toda uma estrutura que gera corrupgo, que gera compra € venda de votos, ete. (entrevista Cleber Matheus Thomazi, Coordenador do Ministério Fé e Politica na Diocese de Lorena, 20/07/2011). As declaragées sugerem que a “cultura de pentecostes” seja levada para todos ‘09 segmentos e todas as instituigdes da sociedade, inclusive os partidos ja existentes. A presenca de “pessoas que fizeram uma experiéncia de Deus, com Jesus Cristo a par- tir da graga do batismo no espfrito e que tem uma vocagao para a vida politica” (en- trevista Cleber Matheus Thomazi, 20/07/2011) seria fundamental para o combate & cortupgio, ao fisiologismo e ao personalismo nessas instituigdes. Nesse sentido & que tum dos entrevistados fala em “infiltrar” os carismaticos nas agremiacbes partidérias ‘com 0 propéxito de que, motivados pela experiéncia de Deus, eles nao se deixem con- taminar e apresentem um comportamento parlamentar distinto que sirva de modelo para os demais. Como declarou o entrevistado acima, “o politico tem que ter medo do inferno, porque se no tem medo do inferno ele se corrompe” (entrevista Cleber Matheus Thomazi, 20/07/2011). Os grupos de oragdo, que se espalharam pelas cidades brasileiras e retinem cen- tenas de pessoas, aparecem nos discursos como um espace fundamental para 0 traba- Iho de sensibilizagao dos fis para a ago politica, Uma vez feito o “trabalho de ataca- do”, como diz um dos enttevistados, passa-se as consultas aos dirigentes de cada grupo para verificar quais sio os figis que apresentam o “perfil” para ocupar uma cadeira no legislativo ou no executivo. Com isso, espera-se que o indicado se comprometa em orientar a sua conduta politica segundo a doutrina social da igreja Em Siio Paulo, a capacidade de recrutamento de novos quadtos para a politica e de organizagio de cursos de formagao politica parece maior do que nos estados do Rio Grande do Sul e do Rio de Janeiro, onde também entrevistamos importantes li- derangas. Os relatos dos carismaticos paulistas sugerem articulagées em diferentes ni- veis, que vio dos grupos de oragdo de cada cidade &s diferentes dioceses ¢ englobam distintos atores catélicos: bispos, sacerdotes, professores universitérios, parlamenta- 58 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 res, prefeitos e assessores legislativos. Segundo um desses relatos, cursos jé foram ou ven sendo oferecidos em mais de 30 dioceses, mas a construgo da sede nacional da RCC na cidade de Canas acabard por levar a instalagao do Centro Nacional de For- magao para a Diocese de Lorena, tornando a regio um polo decisivo para a difusio da “cultura de pentecostes” no Brasil”. Além da construcao da sede, que permitiré a instalagao do Centro de Forma- g40, Reinaldo Alguz, deputado estadual (PV/SP), prope a criagao de um instituto {que possa criar uma pedagogia de trabalho, desenvolver um idesrio politico cristo «que sirva de inspiragio para os vereadores, deputados e prefeitos brasileiros oriundos do movimento carismético (entrevista Reinaldo Alguz, 17/09/2011). A ideia é que 0 referido instituto fosse financiado pelos saldrios recebidos pelos carismaticos durante ‘© exerefeio dos cargos politicos e preparasse uma “frente de formadores” para per- correr as cidades de diferentes estados do pais e difundir a pedagogia crista entre os vocacionados para a politica, Ou seja, que o instituto trabalhasse para criar @ “tropa de elite crista” ideologicamente coesa. A formulagao dessa proposta de criagdo do instituto é a0 mesmo tempo, re- sultado e expressio da pluralidade de posigGes no interior do movimento renovador brasileiro. Nesse sentido, alguns entrevistados revelaram desconforto com a ideia do financiamento pelos politicos, outros declararam que a duplicagio de esforgos no campo da formagio politica acabaria por provocar divisdes e competigdes no interior da Renovagio. Os argumentos contririos sugerem que existe uma disputa entre os catisméticos pelo controle do processo de recrutamento, indicagao de nomes e for- ‘magio de novos quadros para as disputas eleitorais. Observam-se também algumas tensdes entre os politicos ¢ os dirigentes do Mi- nistério Fé e Politica sobre o trabalho das “camaras de acompanhamento” junto aos parlamentares ligados av movimento. De acordo com Beatriz Vargas (RS), secretéria nacional da RCC, o Ministério de Fé e Politica havia desenvolvido alguns mecanis- mos com 0 intuito de acompanbar as pessoas eleitas com o apoio da RCC. E um deles seriam as c4maras ou pequenos nticleas em que os parlamentares, assessores e Iideres da Renovagio deveriam discutir as propostas de lei que vao ser apresentadas © os votos a serem encaminhados aos diferentes projetos em exame nas casas legislativas. © problema, argumenta essa lideranga, & que “as pessoas depois de eleitas no se sujeitam a isso” (entrevista Beatriz Vargas, 17/07/2011). ‘As cimaras de acompanhamento também foram mencionadas por Reinaldo Bezerra dos Reis, ex-presidente da RCC no Brasil que, embora tenha destacado muito mais a contribuigio que tais ncleos podem dar aos parlamentares,reiterou o papel controlador deles. Segundo suas palavras: A gente tem que apoiar [os legisladores] explicitamente, tem que ma- nifestar isso através de cmaras de acompanhamento. Eles tém que se sentir apoiados até para poder fazer valer ls critérios do evangelho... ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 59 Se ele fica sozinho, ele & engolido e nao faz nada, Entao tem que ter © respaldo, tem que mostrar que ele esté ali a mandato de alguém, que o mandato dele pertence a uma expressio religiosa: a Renovagio Cari matica (entrevista Reinaldo Bezerra dos Reis, 30/08/2011). Como sugere a citagdo anterior, existe uma expectativa de que o politico que entrou na disputa eleitoral com aprovagio e suporte dos grupos de oragio, dos bispos e sacerdotes do movimento desempenhe sua fungo parlamentar segundo o idedrio da RCC, e nfo segundo o programa partidario ou outra forma de ideologia. IIL - Propostas de formacao de lideranca politica entre pentecostais, Como ja assinalei, existem interpretagies diferenciadas sobre a relagio das esferas religiosa e politica ¢ sobre a atuagio politica das instituigées religiosas, dos dirigentes e dos figis nas sociedades democraticas contemporineas. Assim, é possivel identificar também discursos e iniciativas distintas no campo da formagao politica, Enquanto alguns poucos lideres defendem a conscientizagao dos figis para o engaja- mento em movimentos sociais, participagdo em conselhos e partidos politicos, os en- trevistados com uma visio mais minimalista da politica alegam que é preciso instruit e preparar aqueles que, mais do que receber o aval dos dirigentes, serdo apresentados aos integrantes dos grupos de oragio como “candidatos oficiais” da igreja. ‘A preocupagio dos grupos religiosos em formar atores politicos que possam de- fender os interesses das estruturas eclesisticas foi identificada por virios autores (Oro 2004; Bandini 2004; Machado 2006; entre outros) que mostraram como as candida turas dos atores politicos evangélicos foram se tornando na virada do século XX para o século XX] cada vez mais una empreitada coletiva de denominagdes como a Universal do Reino de Deus, Evangelho Quadrangular e Assembleia de Deus. Nossos entrevis- tados trouxeram informagées interessantes sobre o processo de criagio das instncias internas de debate sobre a representacao politica do grupo, as estratégias de recruta- mento e preparacao dos quadros para a disputa eleitoral e a atuagao parlamentar. deputado estadual Anténio Genaro (PSC/MG), pastor da Igreja Quadran- ular, associou a entrada na vida politica de seu irmio Mario de Oliveira e posterior ‘mente a sua propria candidatura As perseguigdes policias sofridas pelos dirigentes nas cidades onde tentavam abrir novos templos. Exercendo o sétimo mandato na Assem- bleia Legislativa de Minas Gerais, esse entrevistado relatou que tanto ele quanto seu irmio foram presos, passaram por humilhagées e foram acusados de charlatanismo nos anos 70, e que isso acahou por tornar a representacio politica do grupo uma estratégia fundamental para a Tgreja Quadrangular a partir dos anos 80%. De acordo com suas palavras, o langamento de candidaturas de integrantes da igreja foi estimulado por um jornalista mineito que Ihe disse: "Voeds evangélicos cresceram para cima como uma rvore, mas esqueceram de engrossar o tronco. Eleja um deputado estadual, um fede- oo Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 ral e um vereador para representar o mundo evangélico e representar a igreja, porque ‘quem nao tem representante softe...” (entrevista Antonio Genaro, 17/05/2012), Posteriormente, a Igreja Quadrangular criou uma estrutura propria para a for magao de quadros politicos ¢ estabeleceu normas para os postulantes as prévias de candidaturas politicas. Conforme destaca o deputado federal e pastor Jefferson Cam- pos (PSDYSP), com a eriagio da “secretaria nacional, chamada Secretaria Geral de Cidadania’, ele foi escolhido para montar e coordenar “os cursos de capacitacio dos ccandidatos da Igreja”. Assim, além de debates, seminrios e congressos realizados pela ‘Quadrangular e “que néo sio especificos para cidadania, mas ajudam a formar novos lideres, temos cursos do mandato [sobre atuagao parlamentar] e fGruns politicos para termos uma mesma linha de pensamento” (entrevista Jefferson Campos, 04/05/2012) A Secretaria também estipulou as regras para a escolha dos nomes que rece- beram suporte financeiro, assessoria e indicagio do grupo. No portal da Igreja na internet, a Secretaria Geral de Cidadania informa que os interessados em representar politicamente © grupo religioso devem apresentar certidéo negativa de débito tanto ‘com a igreja quanto com 0 Serasa ¢ o Servigo de Proteg0 a0 Consumido, assim como certidio de quitagio com as obrigagSes eleitarais. Cabe as comissdes eleitoraise a0 con- selho estadual e municipal a definigao dos nomes a serem indicados e preparados para a disputa cletoral", Segundo o responsivel pela Secretaria Nacional da Cidadania: candidato a qualquer cargo politico partidario, vereador, deputado estadual, federal, senador, prefeito, passa por uma prévia dentro da Igre- ja Quadrangular. No ambito do municipio quem vota sio os pastores titulates. No caso de Sorocaba nés temos 150 pastores com direito a voto. No caso do estado sio todos os pastores, Nés temos um colégio aproximadamente de 4.500 pastores que votam secretamente no estado de Sao Paulo. Um ano antes da eleigao, reza 0 nosso estatuto, qualquer membro ou pastor que queira se habilita. Apresenta suas certides © & analisado pelo *ficha limpa’ que nés temos hi muitos anos. Fazemos uma convengao um ano antes e escolhemos quem € 0 nosso representante para o préximo pleito. E as igrejas io instadas estatutariamente a apoiar aquele que foi escolhido (entrevista Roberto Jefferson, 04/05/2012) E interessante salientar que, distintamente do segmento catélico que prioriza a formagio politica de leigos, © que temos encontrado com mais frequéncia no segmento pentecostal € a transformagio de pastores em politicos e, em alguns casos, sem abrit mio de suas fungées religiosas. O préprio Jefferson Campos relatou-nos que foi con- sagrado pastor com 23 anos, em 1985, e disputou a sua primeira eleigao em 1992, mas 's6 conseguiu se eleger para o cargo de vereador da cidade de Sorocaba em 1996, Na ocasifo da entrevista, Jefferson exercia seu terceiro mandato na Cmara Federal e conciliava o trabalho de legislador em Brasflia com as atividades pastorais da Qua- ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 6 drangular em Sorocaba (SP). Mas ele nao 6 0 tinico integrante de sua familia que, uma ver religioso, decidiu entrar na carreira politica, como demonstra as palavras abaixo, Eu tenho um cunhado, que foi vereador por quatro mandatos consecu- tivos em duas cidades diferentes. Foi vereador e presidente da Camara de Catanduva. Mas ele & pastor ¢ a igreja o transferiu para Assis. Lé ele se elegeu mais duas vezes para o cargo de vereador. Tenho outro cunha- do que foi vereador de Sorocaba de 2004 a 2008 ¢ foi reeleito em 2008. Em 2010 se elegeu junto comigo deputado estadual em Sao Paulo, 0 Pastor Carlos Cesar (entrevista Jefferson Campos, 04/05/2012). Ronaldo Fonseca (PRYDE), que coordenou por varias anos o que ele classi- ficou como “o projeto politico da Assembleia de Deus”, também comentou sobre 0 recrutamento e a formagio de quadros para a representagio dos interesses da Igreja, ‘Segundo informa, em 2001 comecou a ser implementado, na Assembleia de Deus, tum projeto para “despertar a cidadania da membresia” e estimular a participagio nas disputas eleitorais pelas cadeiras das casas legislativas, onde as leis sio definidas e as bases cristas da sociedade “precisam” ser defendidas. Se, no passado, candidaturas de assembleianos ja haviam mobilizado algumas igrejas, agora se trata de criar me- canismos de controle sobre as candidaturas ¢ a atuagao parlamentar daqueles que se elegem ou se elegeram com o amparo logistico da denominacio, A gente idealizou esse Projeto pra disciplinar isto [o langamento de can- didatura] e foi assim que criamos um Conselho Politico Federal © as Comissdes Politicas Federais e Estaduais. © Conselho Politico cuidava dessas Comisses, as Comissses Estaduais cuidavam das indicagoes do Deputado Estadual e de Vereador, ¢ a Comissio Federal cuidava de De~ putado Federal e Senador (entrevista Ronaldo Fonseca, 18/04/2012). Aqui, como no caso dos carismaticos, a expectativa é que o legislador, durante ‘o exercicio de seu mandato politico, defenda os ideais cristaos e trabalhe para ampliar a capacidade de influéncia da denominacao na sociedade. Embora esse entrevistado enfatize o papel de “despertar as vocagées” dos integrantes da igreja para a politica, pode se constatar a predomindncia de atores politicos com cargos religiosos no con- junto dos deputados federais da legislatura de 2011-2015 que sio vinculados 3 Igreja. ‘Ou seja, assim como o que ocorre na Quadrangular e na Universal, a maioria dos que so escolhidos para as disputas eleitorais e obtém sucesso nessa empreitada é consti- tufda de pastores/as e/ou missionéios. Os depoimentos dos politicos com mandatos nas Assembleias Legislativas es- taduais corroboram a afitmagao da preferéncia dos pentecostais pelas candidaturas de autoridades religiosas, com a maior parte dos entrevistados declarando ter assumi- a Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 do fungoes religiosas em suas igrejas antes de se aventurar pela politica partidéria, Os que no foram consagrados como pastores so missionstios, parentes de pastores ou tém posicao privilegiada no meio empresarial evangélico. Quando abordam as atividades preparat6rias das denominagies, os entrevista- dos mencionam palestras, debates e prelegées feitas pelos dirigentes religiosos sobre ‘3 vicios da cultura politica brasileira, a necessidade de mudar as instituigdes politicas e, consequentemente, a contribuicio que os evangélicos podem dar nesse processo. O envolvimento de um grande niimero de legisladores pentecostais nos escindalos econdmicos de meados da década de 2000 indica, contudo, dificuldades enfrenta- das por aqueles que pretendem tirar do plano da retérica a proposta de renovagio da cultura politica. Legisladores eleitos com o apoio de varias igrejas tiveram seus rnomes arrolados em processos de investigacao policial, o que de certa forma ajudou a enfraquecer o discurso da ética evangélica como alternativa aos males brasileiros. De qualquer maneira, estamos tratando de um campo religioso plural e heterogéneo, no «qual algumas denominacées se destacam pela capacidade de organizagio, formagio de novos quadros e mobilizagio politica IV ~ As aliangas dos carismaticos e pentecostais nas casas legis fas Ainda que tenham concepgoes diferenciadas da polftica, projetos genunos de formagio de quadros, ¢ mesmo interesses especificos e conflitantes, as agendas politicas dos carisméticos e dos pentecostais sobrepdem-se quando se trata da mora- lidade sexual e do tema da familia, Vérias entrevistas assinalaram a aproximagao dos atores politicos carismaticos com os legisladores de identidade religiosa pentecostal ro Congresso Nacional. Ages conjuntas foram mencionadas tanto por assessores & ativistas como pelos préprios parlamentares dos dois movimentos cristaos. A missio- naria Rosingela Justino, da Igreja Batista, mencionou-nos que visita os gabinetes de todos os parlamentares na companhia de um sacerdote catélico, conclamando-os a votar contra as propostas de ampliago do permissivo para os casos do aborto e dos direitos dos homossexuais, acrescentando: és nos juntamos & rede Pré-vida e Pré-familia, onde atuam instituigdes catdlicas e espiritas. A gente faz congressos, faz reuniées para estudar, para discutir e para se unit mais. Nas igtejas evangélicas, por exemplo, a gente nio tinha a bandeira do aborto, mas hoje tem. Eu tenho feito cursos com os eatslicos de ajuda a mulheres que abortatam e também de prevensio ao aborto; assim, quando faco palestras dentro das igrejas, eu agora falo deste tema (entrevista Rosangela Justino, 19/04/2012), A politica de aproximagio, de acordo com o depoimento de Elias Castilho, se- cretério executivo da Frente Parlamentar Evangélica no Congresso Nacional, foi uma ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 6 iniciativa de catélicos enviados pela Conferéncia Nacional dos Bispos do Brasil (entre- vista Elias Castilho, 08/02/2012). Um fato que teria favorecido essa politica foi o parecer contririo, emitido em 2008 pelo deputado federal Jorge Tadeu Mudalem:? (PFL/SP), a tum projeto de lei com a proposta de suprimir do Decreto-lein® 2.848, de 1940, o artigo «que caracteriza crime o aborto provocado pela gestante ou com seu consentimento, Tra- tavase do PL 1135/1991", ¢ 0 parecer do deputado pentecostal foi endossado pelos de- ‘mais integrantes da Comissio de Seguridade Social e Farntlia do Congresso Nacional © acompanhamento da atuagdo parlamentar desses polfticos confirma esta politica de aliancas no Congresso Nacional. Assim, observou-se que parlamentares oriundos da RCC, como Salvador Zimbaldi (PDT/SP), aparecem como coautores de propostas de lei elaboradas por politicos pentecostais ~ Roberto Lucena (PV/SP) ¢ Joao Campos (PSDB/GO) ~ na contramao das demandas dos movimentos feministas e pela diversidade sexual, Exemplar nesse sentido é o Projeto de Decreto Legislativo (PDC) de n® 56/2012, que tinha como objetivo sustar “a aplicagio da decisio do Supremo Tribunal Federal proferida na Arguigio de Descumprimento de Preceito Fundamental - ADPF 54”. Trata-se de uma reacao articulada dos setotes cristios & decisio do judiciério de ampliar o permissivo legal do aborto para os casos de anen- cefalia cerebral, uma demanda feminista que dificilmente seria aprovada no poder legislativo em virtude da posicio conservadora de grande parcela dos parlamentares que integravam a 54* Legislatura (2011-2015). Na configuragao dos entrevistados que atuam nas Assembleias Estaduais tam- ‘bém se observa uma plataforma politica centrada nas questies relacionadas a0 aborto = com a defesa intransigente da vida - e no controle da comportamento e educacio sexual, de modo que se verifica a tendéncia de replicar na esfera estadual iniciativas legislativas existentes no Congresso Nacional, como a Frente em Defesa da Vida e em Combate ao Aborto, com integrantes carismaticos € pentecostais. No caso da Asssembleia Legislativa do Rio de Janeiro, os politicos desses dois grupos cristdos esto igualmente juntos na luta contra os projetos de lei que tentam ampliar os diteitos dos segmentos homossexuais na esfera estadual. ‘A articulagao dos parlamentares carisméticos e pentecostais parece relacio- nada com o esforco de aproximagio de instituicées catélicas e evangélicas que jé resultou na eriagio de duas novas redes interdenominacionais: 0 ENCRISTUS e a Frente Nacional Cristi de Aco Social e Politica. O Encontro de Cristéas em Busca de Unidade e Santidade (ENCRISTUS)® foi ctiado em 2008, na cidade de Lavrinhas (MG), com o objetivo de: LL favorecer o encontro de evangélicos e catélicos, que desejam buscar a santidade e a unidade frarernalmente, movidos pela efusdo do Esptti- to Santo que experimentam em suas Comunidades. Este encontro tem um sentido espiritual, discipular, bfblico € apostélico. Nao se trata de uma “comissio” interconfessional, nem de uma instincia representati- 4 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 vva dos dirigentes das Comunidades participantes ~ embora algumas se fazem representar por presidentes, bispos ou delegados oficiais. Trata- se, sobretudo, de um encontro de irmfios e irmas que se reconhecem chamados pelo Senhor Jesus Cristo a uma vida de santidade e unidade, conforme o Evangelho". Contando com o apoio da CNBB e da RCC, o ENCRISTUS jé realizou varios encontros de carter nacional ¢, segundo o material de divulgagao na internet, os seus “animadores” sio basicamente dos estados de Sao Paulo e do Rio de Janeiro. Na cocasiio da pesquisa, dois lideres carismiticos entrevistados, os sacerdotes Elias Wolf ¢ Marcial Maganeiro ~ membro da Comissio Pontificia para o Dislogo Religioso do Vaticano e assessor da CNBB -, prestavam assessoria oficial ao ENCRISTUS. ‘A proposta de criacio de uma Frente Nacional Crista de Aco Social e Politica foi nos relatada por Wilton Acosta, pastor da Igreja Sara Nossa Terra, sugerindo tam- ‘bém aliancas entre evangélicos e catélicos e a criacio de novas formas de interven- ‘Glo na arena politica (entrevista Wilton Acosta, 07/02/2011). Deve-se registrar que za primeira metade da década passada os evangélicos criaram o Forum Evangélico Nacional de Agio Social e Politica (FENASP) que, desde seus primrdios, foi diri- sido pelo entrevistado citado acima. Segundo documentos dessa entidade, o Forum atuava “em todo o tertitério brasileiro com programas de treinamento de Iideres e parlamentares”, desenvolvendo “intimeros projetos com foco na conscientizacio da ‘comunidade crista para uma maior participagio do pablico religioso em ages cida- is”. Além disso, acompanhava “a execucio de politicas publicas e a aplicabilidade da legislagao vigente, se destacando como autora de dentineias de violacio de ditei- tos humanos, do direito a vida e do direito 8 liberdade religiosa no Brasil” De acordo com as declaragdes do Pr. Wilton, a decisio de alterar 0 nome do Forum Evangélico para Frente Nacional Crista de Acio Social e Politica foi tomada em 2011 com o intuito de atraic os eatdlicose resultou das negociagies com a propria CNBB. E preciso esclarecer, entretanto, que, nos anos posteriores & entrevista em questo, foram encontrados registros de atividades do FENASP em vérios estados do Brasil, fato que permite levantar duas hipéteses néo excludentes: a primeira seria a de insucesso ou de dificuldades dos atores religiosos em viabilizar a Frente Crista; e a segunda, de que mesmo investindo em uma politica de aproximacdo com ‘5 catslicos, os evangélicos nfo abriram mao de seu Férum original, para manter sua capacidade de pressio e de mobilizacio de recursos na érea social. ‘Ademais, queria chamar atengio para o fato de que, & medida que o idesrio dos direitos humanos vai se fortalecendo em nossa sociedade com o reconhecimen- to dos direitos reprodutivos e sexuais, as instituigdes religiosas se vem obrigadas a adequar seus posicionamentos, lancando mao de novas estratégias e argumentos de ‘outros campos discursivos. E nesse ponto concordo totalmente com a afirmagao de Montero (2012:176) de que, “quando os agentes religiosos tém que agir publicamen- ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo 6 te, eles se veem obrigados a aprender, em cada situaglo especifica, a gramatica ea se- mantica relacionada ao modo de organizagdo de cada cultura pablica em particular”, ‘A cleigdo em 2013 do deputado federal Marco Feliciano, pastor de uma igre- ja pentecostal, para a presidéncia da Comissio de Direitos Humanos da Camara Federal foi uma demonstracao clara de que rapidamente os pastores entenderam a méxima de que em politica ndo existe espago vazio®. Demonstrou também que os aliados histéricos do movimento LGBT, em especial os representantes do Partido dos ‘Trabalhadores na legislatura em questio, tinham outras priotidades ou subestimaram a capacidade de mobilizacao dos parlamentares de identidade religiosa em uma co- missdo de trabalho fundamental para a ampliagao da cidadania das minorias sexuais, Consideragées finais O objetivo deste artigo era confrontar as percepgdes politicas ¢ as iniciativas de lideres carisméticos e pentecostais para a formagio de quadros politicos no Brasil. Nese sentido, tentei demonstrar que, atentos aos movimentos culturais que ques- tionam a ordem de género e a moralidade sexual crista e percebendo a importincia crescente da normatividade legal ¢ do ideério dos direitos humanos na sociedade contemporanea, pentecostais e carismaticos se esforgam para readequar seus discur- 308 € suas formas de atuagdo na sociedade mais ampla. Trata-se de reagies que adqui- rem contomos especificos, dadas as caracteristicas distintivas desses segmentos, em especial a desvalorizagio social dos pentecostais pela elite politica e pela sociedade. No caso dos carismaticos, a politica & vista como mais um entre muitos outros Iécus de evangelizagao; j para os pentecostais & um espago a um s6 tempo de resistencia aos movimentos das minorias sexuais e de ampliaco dos direitos da propria minoria evangélica, cujos integrantes so percebidos como cidadios de “segunda classe” quando comparados aos catslicos. A politica de formagao de quadros para a atuagao nos poderes legislativo e exe- cutivo também apresenta caracteristicas distintas, com os pentecostais priorizando o recrutamento de pastores/as € missionérios/as, enquanto que, entre os carisméticos, 1 figis sio convocados para integrar a "Tropa de Elite Crista” e, por isso, requerem tuma preparagio de carder mais espiritual. Como nos tevelou Rogério Soares, coor- denador da RCC em Sio Paulo: L..] 0 Ministério de Fé e Politica tem por finalidade a evangelizagio das pessoas que atuam na frea politica. A proposta é fazer com que o evan- gelho seja pregado, anunciado a essas pessoas que possuem a vocagio politica. Entao a renovagao tem essa visio que ela precisa contribuir na formagio espiritual das mentes, do conhecimento, do intelecto daqueles que hoje esto governando ou sero amanha governantes (..] (entrevi ta Rogério Soares, 17/07/2011). 66 Religito e Sociedade, Rio de Janeito, 35(2) 45-72, 2015 ‘A preocupagio com uma atuagao parlamentar alinhada com o idesrio cristao também aparece nos depoimentos de alguns pentecostais que, para além de deslo- car pastores/as e missiondrios/as para o trabalho de representagao politica do grupo (pessoas com conhecimento da doutrina religiosa, portanto}, procuram desenvolver mecanismos de controle do grupo sobre os atores politicos. Além disso, visam am- pliar sua capacidade de influéncia nas casas legislativas inserindo-se em grupos de trabalho de carter supradenominacional, como a Frente Parlamentar Evangélica ea Frente Parlamentar em Defesa da Vida. ‘A despeito do discurso pentecostal de minoria religiosa, constatou-se a ten- déncia de didlogo e de estabelecer aliangas polfticas entre os legisladores ¢ assessores parlamentares dos dois segmentos confessionais para defender os valores cristos no campo da sexualidade ¢ da familia. Essas aliangas tém 0 aval da CNBB e da Frente Parlamentar Evangélica. Cabe acrescentar ainda que, embora fagam criticas ao cor- porativismo de alguns politicos pentecostais, Ifderes carisméticos admiram a forma apaixonada como aqueles defendem os valores cristios e enfrentam os movimentos sociais € 0 poder executivo. Essa admiragio legitima a atuagao alinhada dos parla- ‘mentares que integram a “Tropa de Elite Crista” com os pastores politicos no Con- srresso Nacional e nas Assembleias Legislativas Estaduais Finalmente, deve-se assinalar que a descontinuidade observada nas configu: ragGes discursivas dos dois segmentos religiosos com a avaliagio positiva da insergi0 dos cristios na politica contemporiinea atualiza a associagio da evangelizacio a uma forma de batalha, na qual os que nao seguet o cristianismo devem ser combatidos, (Ou seja, © discurso predominante tanto entre carismaticos quanto entre pentecos- tais parece advir da teologia da guerra ao mal que, em diferentes momentos da his- téria ocidental, gerou perseguigdes as minorias culturais. Esta vertente teol6gica ja foi bastante explorada na literatura especializada (Matiz 1999), permitindo-me aqui apenas assinalar que o espirito de intolerdncia nela presente também se faz sentir nas posigoes de muitos pentecostais e carisméticos sobre os movimentos de minorias sexuais na contemporaneidade. Este fenémeno, que, como vimos, é fruto da demo- cratizagio da sociedade, paradoxalmente cria dificuldades para o aprimoramento da democracia, mas advogo que esse desafio pode ser superado com o fortalecimento das aliangas dos movimentos sociais com os demais setores da sociedade, inclusive com 1 catélicos e evangélicos menos ortodoxos. Referéncias Bibliogréficas ALVES, AntOnio Aparecido. (2010), Bscolas de Formas Fé e Politica: Um esudo woligico a pant do Esino Social da Iga eda Teologalaino-amerisana. Rio de Jancir: Tese de Doutorado em Teologia, PUC-Rio. BANDINI, Claudizene A. (2004), Relgitoe Pltica: a paripagdo politica dos penecostas nas elites de 2002. 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Wilton Acosta, 07 de feversiro de 2011 70 Religie e Sociedade, Rio de Janeiro, 35(2): 45-72, 2015, Notas Sou grata ao CNPq pela ols de provide no projet de pesquisa "Relig ¢ Frmagi de Lide- rancas Polticas no Bras” Pata os pentecostais, vee Wills (1967), DEpinay (1970), Relim (1990); para os carimtcos, ver Olivia (1975, 1977) ¢ Olivia et al (1978). “intate do projet intrlado “Pentecostal Leaders in Latin Amerie: Political and Socio-Economic ‘Avtitues,fnanciado peo Pentecostal and Charismatic Research Iniative (PCRD da University of Souther Caria desenvolvida pela suitors em conjunto com os profestores Pol Presto, Joi ci Bui, Ac Oz, Cefia Loreto Mars e Brenda Caranen Tniciaimente,frmlou-se uma lita com mais de eem nomes de evangglicos ecatlcos que atsavam 1a midi, a politica, os espagos de formagio teligica, nos movimentos socials ena hteatura nacional: Into & pessoas com capaciade de nfugneia no meio cristo. Nem todos que integravam alist claboraram com o estado, mas posterioresindicagdes dos enrevintads e itsagies expec, omo encontos com concentagio de carsmSticos ou repetdas vista casas lepltva, posi taram a aces a outs lees. As entevistas foram reazadas pela professors eitaos na nota 36 por Robson Souza e Aline Siiprand, olsistas do pojeto Como tishamos um grande ntmeo de entevisase de menses seem eraathadss, acabamos adotando o programa de inforica N-Viv para a andlie dos dades colewaos. O ideal era que fivGaemos feito so anes do inicio das entrevista, atentindo para gue todos os entevistados se poscionasem sobee os temas de nosso intetese. Mas mesmo assim, elaboramos uma “Arvore de 6s" a paride principais questes da pes as 106 entrevista foram cadifcadas A anise do contetido das enerevistas deus apart dos relatos gerados em fungin das temic. “Assembla de Deus (17); Batista Renovada (11); Betta @); Bola de Neve (2); Brasil Para Cristo (2); Comunidades Evangicas (5); Camuniades Terapduicas (2); Crazada Mundial de Mises (1); Tngja Crists Nova Vida (2); Tea ApostlizaTncemacional (2); pela do Evangetho Quadranular (4) lea do Nazaeno (I); leeja Misionia Evangélice Maranata(D); lgteja Nacional do Senor Jesus Casto (1); lgrja Univeral do Reino de Deus 2); Ministerio Koinonia (I); Nova Vida 2); Prsbiteriana (3); Sara Nossa Tec (1) * Grande pare das entevstas com os Deputados Federals foram realizes em Brash, no Cangzeso Nacional. Por questo orgamentri, at demais entrevista foram reaizada com liderangae que Vi ‘vam nas cdades dos pesquisadores que inteztavam a equine do projeto (Os parlamentarespertenciam aos seguints partis: PSC B), PR B), PSD (3), PSDB @), PRB (2), PV (I), PROS (1), PMDB (1), PT do B (i), PDT (1) eFP (0), Estavam fliaos aos seguintes partidos: PV @), PDT @2), PSC (2), DEM (1) e PROS (). Em discurso proferid, em 14 de margo de 2002, para ideranga da Renovagio Catélica que vistava o Vaticano, 2 Papa Joo Paulo Tafenou que a eultura do Penecoates€ a Gnica que pode fcundar a civiizagio do amor eda eonvivéncia enze os powos [1 Ve: hupafarwnevaian.vaholyfaee! Job _paullspeeches/2002/marchidocumentih_jpilspe_20020314 rinnovamento-p {0 pobre. Acess em: 01/07/2014 Ver: heplwnnenccbrslogboartigo.phptartigo=99. Aces em 2006/2014 © Em 2006, Tlls fo substitutdo na conrdenagSo por Marizte Nascimento, pois we candidatou so cargo tie deputado federal pelo Parand, mas ni fo elit, Desde 2010, 0 coardenador ¢ Sérgio Zavani csposo da presidente da Renovagio Catsiea Nacional, Kia Zavan © Ver: hepewezechrasl ogee phptarigo~$5. Aceso en 23/04/2014 * Ese avr politica exereeu quato mandatos a Cimara Federal entte 1990 e 2006, Sobre sua primeira clcigio, vero documento" Relig pola: MeméraeHisria da RenovagSo Carsmtica Catia em Maing (PR)" (Siva 208). © Ver: hepwnncchrsl org beara photon © Tem 5, Acesso em: 23/04/2014. ‘Maciavo: Religio e Politica no Brasil Cancemporineo um 1 Em 1995 foi crada, no Rio Grande do Sul, a Escola Crsté de Educago Politica de Santa Mara "© ComoaRRC, o Movimenta Cursilho de Cristandade e o Movimento dos Focolaes desenvovem tivasde formacio de leigos. Asiniciativas do primeito so encaminhadas pelo Movimento Fée Politica do Cursilho de Crstandade, e as do segundo pelo Movimento Politico pela Unidade (Alves 2010) Oslegisladores catdicosligados 3 RCC revelaram em suas entrevista trem sido estimuladas por pa Ares ¢leigos do Ministério Fé e Poltica as fiir e dsputareligSes para o legislative. Eses entrevis- «adas passaram por virios cursos de formacio de liderancas oferecidos pelo Ministtioe no tinham vinculos anteriores com mavimentos socais,sejam os de categoria protssional, sejam os de carter twhano ou identi, ® Este sentimento favareceu a desenvolvimento do dscurso de minoria disriminada e perseguida pela clite brasileira, Ver Machado e Buity (2014). © Ver hrepvww.portalgrejaquadrangulacom bnportalinovidadescidadania.asp Acesso em: 0402/2014 No easo do escindalo do “mensalio”, constatou-se o envolvimento do paslamentar Carlos Rodrigues (PLR), na ocasio Bispo da Igeja Universal do Reino de Devs, que renunciowe fo ulgado e conde nado pela justiga brasileira. No chamado escindalo dos "sanguessugas", o nmero de patlamentares evangélics denunciados pela CPI do Congreso Nacional ultrapassou duas dezenas, segundo a midia nacional. Eram politicos vincvladas as Imes Internacional da Graga de Deus, Quadrangula, Batis «a, Metodista, Universal do Reino de Deus ¢ Assembléia de Deus, as chama atengio 0 nlimero de pestores da Universal (13) e da Assemble (10) arrolados pela CPL. Ver os nomes em: http/iwww. folha.uol.comriflha/brasilult96u81238 shtml. Acesso em: 20/052014, Vincilado 3 lgreja Internacional da Graga de Deus e um dos representantes do estado de Sia Paulo rnaguels legislatura. 2% 0 PL 1135/1991 foi apresencado pelos deputados Eduardo Jorge e Sandea Stating. Ver ups wurecamara.goubs/intemetlordemdodia/ordemDetalheReumiaaCom.asplcodReuniso= 17828. ‘Acesso em: 30/05/2014, % OENCRISTUS ¢ um desdobramento, na América Latina, do tabalfo da Comunita di Ges, uma as- sociagdo privads pertencente ao movimento de RenovagSo Carita e gu foi fundada por Matteo Calis, no sul da Iti. Ver: hrep//comunidadedejesustio. blogspot.com br/2012/08/macteo-pregando: nno-eneristus-2012.huml. Aceso em: 30/08/2014, Ver. brtpllvwcencristuscom.br}dinamicindex.phploption-com,_contentSiew = 4Bltemid=56, Acesso em: 12/08/2014, ® Ver: hep:/wmoibfatibata.orgbrinoticia/Lidretoria-da-frente-nacional-ersta-de-acao-soclalde-sp .-eleta-em-congresso. Acesso em: 21/06/2012. » Fm 2013, ocorreuo | Enconteo do FENASP em Roraima com a presenga do Presidente Wilton Acos- ta. Ver: hep: ew fatoreal blog brpoltia/ale-re-sedia-i-congresso-do-forum-evangelico-necional ‘Acesso em: 18/05/2014. E em 2014, o Pr. Wile esteve no Congresso Estadual do FENASP em Sio Paulo, que € presidido, desde 2011, pelo deputado federal e pastor da lreja Brasil para Cristo Roberto Lucena. Ver: hetp.|iwiwradioricospospel.com-briblog/416/. Acesso em: 12/04/2014, ® Agradego a Brenda Carranza o comentivi de que a Matcha da Fania realicada pouco tempo depois (05/06/2013), que reunia milhares de pessoas nas russ de Brasilia eve o Pastor Silas Malan entre ‘os seus mobilizadores, também expressa esta rendncia de ocupat os espagos na esfera pablica sticleSi- Recebido em novembro de 2014, “Aprovado em mango de 2015 Maria das Dores Campos Machado (mddem@uol.combr) Professora do Programa de Pés-Graduaco em Servigo Social da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Doutora em Sociologia pelo Instituto Universitario de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). 2 Religie e Sociedade, Rio de Janeiro, 35(2): 45-72, 2015, Religido e Politica no Brasil Contemporaneo: uma anélise dos pentecostais, ¢ carismiticos catélicos Exte artigo analisa as percepgies e atitudes de liderancas carismaticas e pentecostais, com o objetivo de esclarecer o interesse crescente desses grupos pela esfera politica. (Os dados indicam a criagdo de espagos de formagao de liderangas para a politica par- sidévia em diferentes agremiagSes pentecostas, bem como no movimento eatismético, ce demonstram a tendéncia dos leyisadores desses segmentos de apresentar, em con- junto, projetos de lei que contrariam as demandas atuais dos movimentos feministas € hhomossexuals no campo dos direitos sexuais e reprodutivos. Palavras-chave: Brasil, religio, ideranga politica. Abstract: Religion and Politics in Contemporary Brazil: An Analysis of Pentecostal and Catholic Charismaties This article analyzes the perceptions and attitudes of Charismatic and Pentecostal leaders to explain the increasing interest of these groups towards the political sphere. ‘The data indicate the creation of spaces for training political party leaders in both mo- vernents, as well as the tendency to submit draft laws together, in conflict with present homosexual and feminist demands in the feld of sexual and reproductive rights, Keywords: Brazil, religion, political leadership,

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